Geibson Cândido M. Rezende

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MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS
Comarca de Goiânia
EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA ___ VARA
DA FAZENDA PÚBLICA MUNICIPAL DA COMARCA DE GOIÂNIA - GO.
“...podemos fixar as linhas de um novo direito social em formação,
representado pelo direito que tem cada homem de participar ativamente no
processo de desenvolvimento de sua comunidade. Não se trata apenas de
receber os benefícios do progresso, mas de ‘tomar parte’ nas decisões e no
esforço para a sua realização. Em lugar de ser tratado como ‘objeto’ das
atenções paternalistas dos detentores do Poder, o homem passa a ser
reconhecido como ‘sujeito’ e ‘agente’ no processo de desenvolvimento. Tratase de uma exigência decorrente da natureza inteligente e responsável da
pessoa humana” (MONTORO, André Franco, in Introdução à
Ciência do Direito, 20ª ed., Ed. RT, pág. 11).
O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS,
através do Núcleo de Defesa do Meio Ambiente, pelos promotores de justiça infra
assinados, no uso de suas atribuições legais, embasado no Inquérito Civil Público em
anexo, vem propor,
AÇÃO CIVIL PÚBLICA AMBIENTAL, com pedido de
concessão de MEDIDA LIMINAR, em desfavor de
AMERICEL S.A., pessoa jurídica de direito privado,
concessionária do serviço público de telefonia móvel celular na área geográfica dos
estados de Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Goiás, Tocantins, Rondônia, Acre e
Distrito Federal (área de concessão), situada à SEP/SUL – 702/902, Lote “B”, Edifício
General Alencastro, Brasília- DF, inscrita no CGC/MF sob o n.01.685.903/001-16.
E também movida em desfavor de:
TCO CELULAR S/A, pessoa jurídica de direito privado,
concessionária de serviço público de telefonia celular móvel também na área geográfica
supra mencionada, situada à Av. República do Líbano, 1875- 4 e 5 andar- St. Oeste,
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Comarca de Goiânia
Goiânia-Go – Brasil – CEP: 74.125-125, pelos fatos e fundamentos jurídicos abaixo
enumerados.
1. DOS FATOS
O Ministério Público do Estado de Goiás após inúmeras
reclamações que chegaram às Promotorias de Justiça especializadas em meio ambiente
desta capital, instaurou o Inquérito Civil Público n. 004-C/2001, consoante narrativa e
abaixo-assinados
de
fls.
07/12/13/14/15/16/17/18/19/20/46/90/91/92/90-
103/120/121/337-343/348-350 do IC.
Dita irresignação tem por objetivo a instalação, pelas rés, de
forma desordenada e descontrolada em nossa capital de um sem número de ERB’s
(Estações de Rádio Base) de telefonia celular sem a observância de critérios relacionados
ao patrimônio cultural, histórico, urbanístico; ao licenciamento ambiental; aos riscos à
saúde pública (ver estudos científicos em anexo); bem como os critérios relacionados ao
plano diretor de nossa cidade.
Consta no Inquérito Civil que instrui a presente inicial que as
investigadas têm instaladas e ainda por instalar várias antenas de transmissão de telefonia
celular móvel na região metropolitana de Goiânia, sendo que muitas delas estão situadas
em zonas predominantemente residenciais (motivo maior da irresignação), o que vem
causando preocupação dos moradores desta cidade (docs. anexo supra mencionados),
receosos dos possíveis malefícios que as radiações eletromagnéticas podem causar à
saúde.
Como se não bastassem as antenas estarem localizadas em
zonas predominantemente residenciais, as rés, com aquiescência criminosa do município
de Goiânia, instalou e ainda instala seus equipamentos de forma aleatória ao lado ou bem
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Comarca de Goiânia
próximo a prédios residenciais, pátios de escolas públicas e privadas, ao lado das redes de
transmissão elétrica de alta tensão, clínicas, centros de saúde, hospitais, assemelhados etc,
conforme demonstrado no levantamento fotográfico de fls.358/368 do IC.
A disposição desordenada das ERB’s, além de causar perigo
concreto à segurança da população goianiense, causa evidente dano estético e urbanístico
em nossa cidade, pois em meio às construções supramencionadas, emergem corpos
estranhos, contrastando, de forma prejudicial, com a paisagem de nossa cidade, agredindo
o observador e depreciando o valor dos imóveis localizados em seu entorno.
Goiânia, desta forma, de uma hora para outra, transformouse em um grande paliteiro, em face o erguimento de Estações de Rádio-Base de Telefonia
Celular, em alturas consideráveis, prejudicando os aspectos paisagísticos e urbanísticos da
cidade.
O somatório desses fatores leva, sem dúvida, à necessidade
de re-localização das estações em áreas compatíveis.
O próprio Município, baseando-se no artigo 19 do Código de
Posturas (Lei Complementar 031/94), por seu secretário de planejamento, em 27 de maio
do corrente ano, editou a instrução normativa 001/2002 (doc. fls. 226 a 233),
estabelecendo normas mínimas para a instalação e funcionamento das ERB’s, exigindo-se,
entre outras, o cumprimento das seguintes condições:
“I - A localização e instalação de Antenas de
Telecomunicações com estrutura em Torres ou similares,
somente serão admitidas, mediante análise prévia e parecer
conclusivo o Órgão Municipal de Planejamento, observando o
atendimento das seguintes exigências:
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a)
Localizar-se a uma distância mínima de 100,00 (cem)
metros dos limites de Escolas de Ensino Fundamental e médio,
Asilos, Hospitais e Maternidades;
b)
Não
localizar-se
nas
ZONAS
ESPECIAIS
AEROPORTUÁRIAS (ZEAS);
c)
Não possuir altura inferrior a 30,00 (trinta metros);
d)
Não localizar-se em Áreas Públicas Municipais, exceto
em áreas de fundo de vale – ZONAS DE PROTEÇÃO
AMBIENTAL (ZPA), ouvido o Órgão Público competente;
e)
Obtenção de resultado favorável junto a população
vizinha, mediante pesquisa de opinião pública a qual deverá
atingir um raio de abrangência de 30,00 (trinta metros) do
local requerido e consulta superior a 50 % dos imóveis
habitados;
Nas Zonas de Média e Alta Densidade, as Antenas de
Telecomunicações com Estrutura de Torres ou similares –
Antenas das Instalações Rádio-Base (ERB’s), não poderão ser
instaladas com transmissão frontal entre si, devendo o sinal
ser transmitido através de cabos óticos;
(...)
III – Nas Zonas de Média e Alta Densidade, as Antenas de
Telecomunicações com Estrutura em Torres ou similares –
Antenas das Instalações Rádio Base (ERB’s), não poderão
serem instaladas com transmissão frontal entre si, devendo o
sinal ser transmitido através de Cabos Óticos;
IV – Será obrigatório a urbanização e manutenção
permanente, de todas as áreas onde serão instaladas as
Antenas de Telecomunicações com Estrutura em Torres ou
similares, segundo diretrizes fixadas pelo Órgão Municipal de
Planejamento;
V – A Licença de Operação, bom como sua renovação anual,
expedida pela Secretaria Municipal do Meio Ambiente –
SEMMA, somente será fornecida após o atendimento do
estabelecido no item anterior;
VI – Para implantação e Operação dos equipamentos de que
trata esta instrução, serão adotadas as recomendações técnicas
publicadas pela Comissão Internacional para proteção contra
radiações, NÃO IONIZANTES – ICNIRP, ou outra que vier a
substituí-la em conformidade com as orientações da Agência
Nacional de Telecomunicações – ANATEL;
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VII – A Licença para localização e operação de Antenas de
Telecomunicações em fachadas das edificações será
ADMITIDA, desde que;
a)
As emissões de ondas eletromagnéticas não sejam
direcionadas para o interior das edificações na qual se
encontram instaladas,
b)
Seja promovida a harmonização estética com a referida
fachada;
VIII – A Licença para localização e operação de Antenas de
Telecomunicações no topo de edifício será ADMITIDO desde
que:
a)
As emissões de ondas eletromagnéticas não sejam
direcionadas para o interior das edificações na qual se
encontram instaladas;
b)
Sejam garantidas condições de segurança para as
pessoas que acessarem o topo do edifício;
c)
Seja promovida a harmonização estética dos
equipamentos de transmissão com a respectiva edificação.
IX – Nos locais onde a densidade de potência total ultrapasse
os limites estabelecidos pela ANATEL, as emissões deverão ser
imediatamente enquadradas de forma atender os parâmetros
estabelecidos, sob pena de ser determinada a desativação da
antena;
(...)
XI – Os níveis de ruídos emitidos pelo funcionamento dos
equipamentos da Estação de Transmissão serão avaliados,
sempre que julgados necessários pelo Órgão Público
competente, para enquadramento nos limites prescritos na
Legislação Ambiental em vigor;
(...)
XIII – As Antenas de Telecomunicações com estrutura em
torres ou similares, instaladas sem autorização dos Órgão
Municipais competentes serão imediatamente desativadas, até
que seja obtida a licença devida;
XIV – O não atendimento das exigências estabelecidas nesta
Instrução implicará na aplicação de multa variável de 5.000
(cinco mil) a 20.000 (vinte mil) UFIRs de acordo com a
gravidade da infração e nas reincidências as multas serão
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cobradas em dobro, sem prejuízo da aplicação de outras
penalidades”. (grifo nosso)
Tal Instrução Normativa, entretanto, não se aplica às ERB’s
já instaladas, só regulamentando a instalação das atividades que entrarem em operação
após a data de sua publicação. Ao que parece as antenas em operação permaneceram sem
nenhuma fiscalização ou controle por parte o poder público local.
Por outro lado, no que tange às antenas existentes na cidade,
os documentos que instruem o Inquérito, demonstram, de maneira inequívoca, que as
investigadas não apresentaram e nem demonstram a intenção de apresentar qualquer
laudo ou estudo similar idôneo capazes de apontar se as radiações de suas Estações de
Radio Base instaladas e a serem instaladas na capital estão ou estarão em conformidade
com os limites aplicáveis para a exposição do público em geral especificados nas
recomendações da ICNIRP, bem como em consonância com as normas e critérios
adotados pela organização mundial de saúde e pela ANATEL.
Desenvolvem as rés, repito, com a aquiescência omissiva do
Município de Goiânia, atividade potencialmente poluidora que necessita, nos termos da
legislação pátria vigente, de prévio licenciamento ambiental, já que estudos nessa área
revelam que parte da radiação é absorvida pelo corpo humano e pode causar efeitos
térmicos e não térmicos, induzindo alterações estruturais e funcionais em seres vivos,
como efeitos biológicos produzidos nos olhos, nos testículos e os de ordem neurológicas.
Ademais, em que pese a inexistência de norma federal,
estadual ou municipal disciplinando a localização e o modo de operação das ERBs, os
documentos do Inquérito Civil (fls. 12-20, 31-32, 34, 88-89, 113-114, 116, 212-217,
218/224) comprovam as irregularidades nas construções pretendidas pela empresas-rés,
bem como a suposta nocividade da atividade face ao suposto acúmulo de radiação não
ionizante a que já estão submetidos tanto os moradores das adjacências, como qualquer
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pessoa que freqüente os lugares situados nas imediações (docs. Fls. 11, 104, 123-124, 234333).
Várias são as matérias, jornalísticas ou científicas, juntadas ao
inquérito civil que dão conta da lesividade da radiação emitida pelas ERBs de propriedade
das rés. Às fls. 104 do Inquérito Civil consta uma reportagem que representa a
materialização do perigo material que as irregularidades nas construções podem ocasionar.
Na citada reportagem, uma barra de ferro de cerca de 3,5 metros e uma outra menor, de
aproximadamente 80 centímetros, caíram das mãos do montador Leandro Ferreira
Gomes, de 26 anos, que estava trabalhando na construção de uma plataforma da antena
de celular da Telegoiás Centro-Oeste (TCO), no Setor Pedro Ludovico, próximo à
Serrinha, quando se desequilibrou. As barras caíram no quintal da vizinha ocasionando o
afundamento do piso de concreto e comprometendo a tranqüilidade do seu ambiente
familiar.
Demonstram os autos de Inquérito Civil Público que instrui a
presente inicial que o Município, responsável direto pelo licenciamento, fiscalização e
controle de instalação e funcionamento das referidas estações, não possui nenhum dado a
este respeito em suas secretarias especializadas (SEPLAN, SEFUR, SEMMA). Não sabem
sequer quantas antenas foram instaladas por cada uma das rés dentro do Município (doc.
fls. 21/32, 88/89, 113/114, 116). A omissão e o descontrole do poder público local nesta
questão são evidenciados a partir do momento em que o próprio município, através do
órgão responsável pelo licenciamento (SEMMA) precisa recorrer à ANATEL para ter
conhecimento de quantas e quais são as antenas instaladas na capital (doc. fls. 115).
Neste ponto, peço venia para transcorrer a resposta
endereçada ao município de Goiânia às fls. 123, na qual a própria AGÊNCIA
NACIONAL DE TELECOMUNICAÇÕES (ANATEL) reconhece os malefícios da
radiação não-ionizante e faz algumas recomendações ao Município para permitir a
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instalação da ERBs, inclusive quanto à competência municipal par o licenciamento, senão
vejamos:
“Senhor Secretário
...com relação às antenas existentes em Goiânia e sua localização, informamos
que anexamos a este ofício 2 (duas) listagens, uma da Telegoiás Celular S/A,
referentes aos Estados de Goiás e Tocantins, outra da Americel, referente aos
Estados da área 7 de Concessão do Serviço Móvel Celular, contendo o número,
endereço e o município de instalação da Estação, atualizada em 15/03/2002.
Com relação aos critérios adotados para a liberação da licença
da referidas antenas, informamos que nos artigos 37 a 42 do Regulamento dos
Serviços de Telecomunicações, aprovado pela Resolução 73, de 25 de
novembro de 1998, doc. anexo, constam as exigências feitas à todas as
prestadoras quando da instalação de Estações de Telecomunicações até o dia
21 de março de 2000.
A partir desta data, para emitir a Licença de Funcionamento
de Estações, a Anatel passou a exigir também que os interessados
apresentem DECLARAÇÃO assinada por profissional habilitado, baseada
na avaliação das características técnicas da estação, de que sua operação no
local pretendido não submeterá a população a campos eletromagnéticos de
valores superiores aos limites adotados, conforme cópia de Ofício Circular n.
190/2000/PVGPA/PVCP/SPV-Anatel, de 21 de março de 2000.
Os campos magnéticos associados à operação das estações,
têm sido objeto de estudos por diversas instituições internacionais e vem
sendo acompanhados pela Anatel. Ao mesmo tempo em que as estações são
essenciais para a restaçao de diversos serviçosde telecomunicações, é
necessário que sua utilização não venha a trazer prejuízos à saúde da
população. Neste sentido, a Anatel decidiu adotar, como referência para
referênci` para avaliação de exposição humana a campos eletromagnéticos
de radiofreqüência, até que seja elaborada regulamentação técnica
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específica sobre o assunto, os Limites Propostos pela Comissão Internacional
de Proteção Contra Radiação Não Ionizante (ICNIRP), doc. anexo.
Lembramos ainda que os aspectos civis da instalação de
estações transmissoras, tais com, afastamento de outras edificações,
ordenamento e ocupação de solo, questões ambientais e urbanísticas,
dependem da legislação local, conforme artigo 30 da Constituição Federal.”
(grifo nosso).
O fato se torna mais grave quando consideramos o disposto
nos arts. 54 e 60 da Lei 9.605/98 que elevou à categoria de crime a conduta desenvolvidas
pelas rés na instalação das antenas.
Dispõe o art. 54 supra mencionado: “Causar poluição de
qualquer natureza em níveis tais que RESULTEM OU POSSAM RESULTAR em
danos à saúde humana, ou que provoque a mortandade de animais ou a
destruição significativa da flora: (...)Pena – reclusào, de um a quatro anos, e
multa”
A conduta das rés AMERICEL E TELEGOIÁS CELULAR
(TCO), enquadra-se perfeitamente neste artigo, já que o crime nele referido é meramente
de perigo e, ainda mais, de perigo abstrato, pois basta que cause perigo à saúde humana
para se consumar.
Já o artigo 60 diz que é crime “construir, reformar, ampliar,
instalar, ou fazer funcionar, em qualquer parte do território nacional,
estabelecimentos, obras ou serviços potencialmente poluidores sem licença ou
autorização dos órgãos ambientais competentes, ou contrariando as normas legais
e regulamentares pertinentes”.
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A atividade das rés é sem duvida uma atividade
potencialmente poluidora e não há nos autos qualquer prova do licenciamento ou do
alvará de instalação (doc. fls. 31/32, 88/89, 113/114, 116) das atividades por parte do
órgão competente fato que, isoladamente, é bastante para provar já na esfera criminal,
como ultima ratio, a ocorrência do dano ambiental, pois trata-se, no último caso, de crime
de mera conduta.
Se referido fato é considerado crime, logo,
conclui-se que o ilícito civil é evidente em matéria ambiental.
O Município de Goiânia, além de não possuir nenhum
controle das antenas transmissoras instaladas e por instalar, não possuía antes da edição
da Instrução Normativa supra mencionada nenhuma regulamentação a respeito de tais
atividades, o que permitia e facilitava, sem sombra de dúvidas, a proliferação desordenada
de tais equipamentos dentro da zona urbana residencial de Goiânia. Peca, pois, o
Município por sua omissão na qualidade de guardião do meio ambiente ecologicamente
equilibrado conforme determina o art. 225 da Constituição Federal.
Importante ponderar: o que se pretende com a propositura da
presente demanda não é impedir o crescimento e desenvolvimento de serviços de extrema
utilidade pública como é a telefonia celular, mas obstaculizar a instalação de fontes
poluentes em locais impróprios, conforme demonstrado acima, sabedores que nas áreas
onde estão instaladas poderão trazer danos à saúde pública, bem como ocasionar
situações que ofereçam alto grau de periculosidade.
Cumpre-se, assim, o ordenamento constitucional, que em seu
art. 170, inciso VI, dispõe que a ordem econômica deverá observar o respeito ao meio
ambiente.
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O ajuizamento da ação vem, também, precipuamente, em
socorro dos cidadãos (nunca ouvidos e sempre ignorados) que no espaço da palavra e
da ação (José Eduardo de Faria), têm alguma parcela de responsabilidade na tarefa de
construção do Estado Democrático de Direito, tal como delineado na Constituição
Federal.
Nos dizeres de Antônio Augusto Mello de Camargo Ferraz:
“A ação civil pública encarna,
nesse aspecto, o esforço de uma sociedade ainda
bastante desarticulada e carente (no que tange ao
respeito aos seus direitos fundamentais) no sentido
de se contrapor ao poder político e econômico
exercido por minorias muito fortes” (in Ação Civil
Pública, Ed. Revista dos Tribunais, 1ª ed., 2.001,
pág. 98).
2. DO DIREITO
2.1. Do dano ambiental e risco à saúde pública
Evidencia-se o risco eminente à saúde pública, que encontrase configurado pela quantidade de radiação não ionizante lançada no ar pelas antenas que
já se encontram instaladas na cidade de Goiânia, bem como pela instalação de futuras
Estações Rádio-Base (ERBs) e de Mini-Estações Rádio-Base (Mini ERBs).
As antenas são a grosso modo transmissores e receptores de
radiação, emitida sob a forma de ondas eletromagnéticas.
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Considera-se poluição a presença e lançamento ou liberação
nas águas, no ar ou no solo de toda e qualquer forma de matéria ou energia com
intensidade, em quantidade que possam tornar a água, o ar ou o solo:
- impróprios ou ofensivos à saúde
- inconvenientes ao bem estar público
- prejudiciais à segurança, ao uso e gozo da propriedade e às atividades normais da
comunidade.
A Lei Federal nº 6.938, de 31 de agosto de 1.981, que dispõe
sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, estabelece em seu artigo 3º e incisos, o que
se segue:
"Art. 3º - Para fins previstos nesta Lei, entende-se por:
I - Meio Ambiente: o conjunto de condições, leis, influências e
interações de ordem física, química e biológica, que permite, abriga e rege a vida em
todas as suas formas:
II - Degradação da qualidade ambiental: a alteração adversa
das características do meio ambiente;
III - Poluição: a degradação da qualidade ambiental resultante
de atividades que direta ou indiretamente:
a) prejudiquem a saúde, a segurança e o bem estar da
população;
(...)
e) lancem matérias ou energia em desacordo com os padrões
estabelecidos."
Na mesma toada, a Lei Estadual nº 8.544/78, que dispõe
sobre o controle de poluição do meio ambiente:
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“Art. 2º. Considera-se poluição do meio ambiente a presença,
o lançamento ou liberação, nas águas, no ar, no solo, de toda e qualquer forma de
matéria ou energia, com intensidade, em quantidade de concentração ou com
características em desacordo com as que forem estabelecidas em lei, ou que tornem ou
possam tornar as águas, o ar ou o solo:
I - impróprios, nocivos ou ofensivos à saúde;
II - inconvenientes ao bem-estar público;
III - danosos aos materiais, à fauna e à flora;
IV - prejudiciais à segurança, ou uso e gozo da propriedade e
às atividades normais da comunidade”.
Desta maneira, os efeitos da radiação não ionizante – espécie
de energia produzida na atividade ora combatida, que pode configurar, simultaneamente,
poluição e defeito do produto – podem sim provocar diversos malefícios à saúde das
pessoas.
Cumpre informar que nos Estados Unidos da América,
Canadá, e diversos países da Europa, as autoridades se preocuparam em estabelecer
limites máximos de radiação, visando não expor à perigo a vida das pessoas, ou seja,
muitos países estão se antecipando e impondo normas mais restritivas à exposição de
pessoas à radiação não ionizante.
No Brasil esta preocupação, infelizmente, ainda não
sensibilizou as nossas autoridades, inobstante um número cada vez maior de cientistas
admitirem a incidência de efeitos não térmicos (os efeitos térmicos já estão
comprovados!).
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Os estudos nesta área já revelaram que parte da radiação não
ionizante é absorvida pelo corpo humano e pode causar efeitos térmicos e não térmicos
induzindo alterações estruturais e funcionais em seres vivos. Em 132 (cento e trinta e
dois) artigos técnicos de publicações internacionais foram mencionados 98 (noventa e
oito) efeitos biológicos de reações eletromagnéticas no ser humano, dentre eles: dores de
cabeça e tonturas, danos no sistema nervoso e central, interferência em alguns
marcapassos e aparelhos auditivos; perda de memória, aumento de estresse; diminuição da
eficiência do sistema imunológico; a indução de cataratas; o aumentm de leucemia; a má
formação de fetos; a diminuição da fertilidade nos homens; o câncer; o aborto; Mal de
Alzheimer, o Mal de Parkinson e outros.
Ademais, faz parte do inquérito civil (fl.11), uma reportagem
da revista Isto é que relata a polêmica das torres de sustentação para as estações de rádio
base (ERBs), em que as retransmissoras de sinais de celular seriam tão nocivas quanto o
próprio aparelho. O acúmulo de antenas podem ter um efeito similar à radioterapia –
afirma o professor da Faculdade de Engenharia Elétrica e Computação da Unicamp, Vítor
Baranauskas – acrescenta ainda que um dos efeitos conhecidos da radiação é a hipotermia,
aquecimento excessivo que produz diferentes temperaturas nas diversas partes do corpo e
que tanto esse como o cérebro podem ter a sua atividade elétrica alterada.
Obviamente algumas variantes deverão ser observadas:
tempo de exposição à radiação, proximidade do campo que emite a radiação, etc.
Estaríamos sendo omissos se expuséssemos à risco a saúde
das pessoas e permitíssemos o dano efetivo ao meio ambiente apenas porque ausente a
devida regulamentação no Brasil do assunto, ou porque os estudos são inconclusivos na
elaboração de generalizações sobre os efeitos produzidos no homem e no meio.
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Assim, tem-se que ANATEL adota os parâmetros de
segurança propostos pelo ICNIRP, cuja observância, segundo o consenso científico atual,
asseguraria a inocorrência de efeitos nocivos à saúde humana ligados aos efeitos térmicos
da radiação não-ionizante. Porém, ainda que respeitados os limites de exposição
propostos pelo ICNIRP, a ciência não pode assegurar a ausência de riscos à saúde
humana diante da existência de dúvida científica acerca da nocividade dos efeitos não
térmicos da radiação não-ionizante.
Na dúvida, a preservação da vida e do meio ambiente
ecologicamente equilibrado deverão prevalecer. Impossível sujeitar a atual geração à
exposição de radiações não-ionizáveis enquanto se aguarda um estudo definitivo e
conclusivo sobre o tema. Isto poderá levar dezenas de anos. Até lá, inúmeras
consequências à saúde coletiva e individual poderão surgir. Os poderes do Estado não
podem enxergar o Direito do Ambiente como protetor do futuro. O presente urge, e
exige ser agraciado por tal atenção.
Como afirma o relatório da Agência Ambiental (fl. 89) “o
assunto em pauta, trata-se de um novo tipo de empreendimento, sobre o qual ainda não
foi firmado nenhum consenso técnico ou científico, com relação ao risco potencial à
saúde pública, bem como, dos procedimentos necessários para o licenciamento ambiental
e técnicas aplicáveis de controle.” Nada sobre essa matéria está definida, portanto,
qualquer alegação que afirme estar dentro daquilo que se considere totalmente seguro
estará destituída de veracidade e consistência.
A OMS (Organização Mundial da Saúde), face ao crescente
número de estudos que indicam a potencialidade lesiva das radiações não ionizantes, tem
publicado critérios de saúde ambiental que estão, de certa maneira, indicando o aumento
de restrições sobre a utilização de tais fontes. A regra mais simples ditada pela OMS, além
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de outros órgãos ambientais sensivelmente preocupados com os níveis cada dia mais
elevados de radiação não ionizante produzida pelas fontes artificiais, diz o seguinte:
“...exposições do público em geral devem ser
mantidas o mais baixas quanto possível. E os limites devem ser inferiores aos
destinados a exposição de caráter ocupacional”.
Indubitável,
portanto,
a
necessidade
de
que
sejam
estabelecidos limites criteriosos para a realização de tal atividade, tendo em vista a
inqüestionável existência de efeitos danosos aos seres humanos.
Assim, a radiação não ionizante constitui sério
problema no tocante à aspectos do meio ambiente, saúde e suas interações, merecendo
enfoque interdisciplinar sobre todos os ângulos da atividade humana.
Diante deste contexto, faz-se mister que medidas urgentes
sejam tomadas, evitando-se, assim, que danos maiores venham a ocorrer. Segundo
assevera Paulo Afonso Leme Machado:
"Não podemos estar imbuídos de otimismo inveterado,
acreditando que a natureza se arranjará por si mesma, frente a todas as degradações
que lhe impomos. De outro lado, não podemos nos abater pelo pessimismo. A luta
contra a poluição é perfeitamente exeqüível, não sendo necessário para isso amarrar o
progresso da indústria, pois a poluição da miséria é uma de suas piores formas". (in
Direito Ambiental Brasileiro, 3ª ed., Ed. Revista dos Tribunais, pág. 296).
Imprescindível, desta forma, harmonizar o desenvolvimento
sócio-econômico de uma região com as atividades de proteção da qualidade do meio
ambiente, controlando-se adequadamente a poluição ambiental.
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MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS
Comarca de Goiânia
A mera potencialidade lesiva justifica a tomada de medidas a
evitar danos ao meio ambiente, mediante a aplicação do princípio da precaução.
Trata-se de princípio básico do Direito Ambiental, tendo em
vista que os objetivos deste são primordialmente preventivos. Por conseguinte, volta-se
para momento anterior à da consumação do dano – o do mero risco. Isto porque o dano
ambiental, muitas vezes, pode ser compensável, mas, sob a ótica da ciência e da ética,
irreparável. Édis Milaré discorre que:
“O Princípio da prevenção é basilar em Direito Ambiental,
concernindo à prioridade de deve ser dada às medidas que evitem o nascimento de atentados ao ambiente,
de molde a reduzir ou eliminar as causas de ações suscetíveis de alterar a sua qualidade (“Direito do
Ambiente”, São Paulo, ed. Revista dos Tribunais, 2000, p. 102)”.
Tal princípio, também denominado princípio da prevenção,
consta expressamente do princípio 15 da “Conferência da Terra” (ECO 92) que assim
estabelece:
“Com o fim de proteger o meio ambiente, os Estados
deverão aplicar amplamente o critério de precaução conforme suas capacidades.
Quando houver perigo de dano grave ou irreversível, a falta de certeza científica
absoluta não deverá ser utilizada como razão para se adiar a adoção de mediadas
eficazes em função dos custos para impedir a degradação do meio ambiente”.
Disto pode-se concluir que milita, em favor do meio
ambiente, a incerteza ou indefinição da ciência. Ao interessado em uma dada atividade
deverá, por ônus que corre para si, a prova de que as intervenções por ele pretendidas não
trarão conseqüências indesejadas ao meio considerado.
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Passada a análise deste princípio, faz-se necessária a leitura de
outro, conhecido como princípio do direito ao desenvolvimento sustentável. A
conferência já noticiada anteriormente adotou o princípio nº 04, que informa:
“Para se alcançar o desenvolvimento sustentável, a proteção do meio
ambiente deve constituir parte integrante do processo de desenvolvimento e não pode ser considerada
isoladamente em relação a ele.”
Em outras palavras, existente é o direito de desenvolver-se e
realizar potencialidades, mas há o direito (que também acumula o papel de dever) de
assegurar às gerações futuras as mesmas condições favoráveis que hoje existe.
A
Comissão
Mundial
sobre
Meio
Ambiente
e
Desenvolvimento define-o como aquele que atende às necessidades do presente, sem
comprometer a possibilidade das gerações futuras em atenderem suas próprias
necessidades. Ainda, com o sentido de melhorar a qualidade da vida humana dentro dos
limites da capacidade de suporte dos ecossistemas.
Como resultado da união dos princípios até agora
comentados, pode-se concluir que o equilíbrio ambiental deve ser assegurado para todos
os seres que formam os vários ecossistemas, desde logo. Se a atividade apresentar risco,
não pode ser continuada. Tal defluí do fato de que, para o futuro, se pode ter a certeza de
que causará, ou não, danos ambientais, ou seja, estará protegida a geração futura.
Contudo, não se pode deixar expor a atual geração, que não findará no momento em que
surgir a próxima, mas a acompanhará durante longo período.
Quer dizer, precaução e desenvolvimento sustentável
acompanham-se. Consta na Agenda 21:
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“A humanidade se encontra em um momento histórico de definição. Nós
nos deparamos com a perpetuação das disparidades entre nações e no interior delas próprias, com o
agravamento da pobreza, da saúde precária e do analfabetismo, e com a permanente degradação dos
ecossistemas dos quais depende nosso bem-estar. Todavia, a integração das questões ambientais e do
desenvolvimento conduzirá à satisfação das necessidades básicas, a uma qualidade de vida mais digna, a
uma conservação e manejo mais adequados dos ecossistemas e a um futuro mais seguro e promissor para
todos. Nenhum país poderá conseguir essa interação por iniciativa própria. Porém, através de uma
parceria global conseguiremos atingir, juntos, o desenvolvimento sustentável”.
O ambiente ecologicamente equilibrado é um bem comum
ao uso do povo, chamado difuso, indisponível. Não podendo ser preterido por um
interesse meramente patrimonial, disponível por seu titular. Surge assim uma ordem
pública ambiental, pela qual o Estado (em sua ampla concepção, integrado por todos os
seus poderes) assegurará o equilíbrio harmonioso entre o homem e seu ambiente.
Prevalecendo, quando há dúvida, em favor dos interesses do meio ambiente, ou seja, in
dubio pro ambiente.
Conclui-se, portanto, que não pode haver o privilégio de um
interesse patrimonial puro, disponível, em detrimento de um interesse público (ambiente
e incolumidade pública), intransigível, possibilitando-se que este mesmo direito
patrimonial imponha regras de vida e modos de conduta, desorganizando a vida social,
para, apenas, obterem o lucro ao final.
O progresso e a tecnologia deverão ser utilizados para
melhoria da vida dos seres humanos, não como forma de causarem-lhes mais transtornos
e prejuízos, bem como aos seres vivos. O que se quer, nesta Ação Civil Pública, não é
obstaculizar o crescimento e o desenvolvimento de serviços de extrema utilidade pública
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como a telefonia celular, mas sim, sujeitar as atividades econômicas à garantia da
qualidade de vida dos cidadãos.
2.2. Da necessidade de licença ambiental
As empresas requeridas carecem de licenciamento ambiental
em relação a algumas antenas que já se encontram instaladas, caracterizando, assim, a
irregularidade do empreendimento.
Consta dos autos, segundo informações proferidas pela
SEDEM que a empresa-ré Americel apresenta instalada no Município de Goiânia 59
(cinquenta e nove) torres, das quais apenas 38 (trinta e oito) unidades são licenciadas,
sendo que em relação a também requerida Telegoiás Celular não foi sequer verificada a
existência de qualquer licenciamento que autorizasse a instalação das antenas já existentes.
A ausência do licenciamento ambiental denota a inadequação
e ilegalidade da atual instalação, uma vez que não foi apresentado qualquer projeto técnico
de implantação, nem tampouco, foi realizado qualquer estudo prévio técnico para se
averiguar o potencial dos danos ambientais.
Diz o artigo 23, da Constituição Federal, in verbis:
"Art. 23. É competência comum da União, dos Estados, do
Distrito Federal e dos MUNICÍPIOS:
(...)
VI - proteger o Meio Ambiente e combater a poluição em
qualquer de suas formas"
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O art. 225 da Constituição Federal, em seu inciso IV,
estabelece para as obras que causem danos ao ambiente a exigência prévia de elaboração
do estudo de impacto ambiental, "in verbis":
"Art.225 - Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente
equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida,
impondo-se ao poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as
presentes e futuras gerações.
Continua o § 1º, inciso IV, do citado artigo:
“IV - exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou
atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente,
estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará publicidade"
O artigo 10 da mesma Lei de Política Nacional do Meio
Ambiente (Lei nº 6.938/81) diz, in verbis:
“Art. 10 - A construção, instalação, ampliação e
funcionamento de estabelecimentos e atividades utilizadoras de recursos ambientais,
considerados efetiva e potencialmente poluidoras, bem como capazes, sob
qualquer forma, de causar degradação am`iental, dependerão de prévio
licenciamento do órgão estadual competente, (...), sem prejuízo de
outras licenças exigíveis.” (Grifo nosso).
A responsabilidade das requeridas pelos danos causados ao
meio ambiente é objetiva, não limitada casuisticamente, de forma que os poluidores ou
predadores, além de cessar a atividade nociva têm a obrigação de recuperar e indenizar os
danos causados (artigo 14, parágrafo 1º, c.c art. 4º, inciso VII, da Lei 6.938/81).
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Tratando-se, ainda, de concessionárias de serviço público a
responsabilidade é objetiva (art. 37, § 6º, da Constituição Federal), independentemente do
disposto na Lei nº 6.938/81 e no Código de Defesa do Consumidor.
Constatada na cidade de Goiânia a presença de agentes
poluentes – radiação não ionizante – potencialmente lesivos ao meio ambiente e, por
conseguinte, à saúde humana, a necessidade de licenciamento ambiental é medida que se
impõe.
Isto porque, a utilização do meio ambiente, por ser
patrimônio público, prescinde de ato do Poder Público, a quem compete protegê-lo,
segundo normas legais e constitucionais.
Desta maneira, o licenciamento ambiental, instrumento da
Política Nacional do Meio Ambiente (art. 9a, inciso IV, da Lei n. 6.938/81), constitui, em
verdade, instrumento de gestão do ambiente, tendo em vista que por seu intermédio
“busca a Administração Pública exercer o necessário controle sobre as atividades humanas que interferem
nas condições ambientais, de forma a compatibilizar o desenvolvimento econômico com a preservação do
equilíbrio ecológico” (Édis Milaré, in Direito do Ambiente, ed. Revista dos Tribunais, pág.
313).
A Resolução Conama 237/97, em seu art. 1º, inciso I, assim
conceitua o Licenciamento Ambiental:
“procedimento administrativo pelo qual o órgão ambiental
competente licencia a localização, instalação, ampliação e a operação de
empreendimentos e atividades utilizadoras de recursos ambientais, consideradas efetiva
ou potencialmente poluidoras ou daquelas que, sob qualquer forma, possam causar
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degradação ambiental, considerando as disposições legais e regulamentares e as normas
aplicáveis ao caso”.
Uma singela análise do “trâmite” do licenciamento, nos
permite concluir da sua extrema necessidade, senão vejamos:
1. requerimento da licença e sua publicidade;
2. publicidade do recebimento do EIA/RIMA ou estudo similar;
3. realização, se necessário for, de audiência pública;
4. eventual emissão da licença requerida, que se dará mediante a expedição sucessiva de
licença prévia, licença de instalação e licença de operação.
As três primeiras fases asseguram, dentre outros benefícios, a
participação da comunidade no processo de decisão.
Neste diapasão, esclarece-se que o princípio da participação
comunitária, que pressupõe o envolvimento do cidadão no equacionamento e
implementação da política ambiental, foi consagrado no art. 225, caput, da Constituição
Federal ao prescrever ao Poder Público e à coletividade o dever de defender e preservar o
meio ambiente para as presentes e futuras gerações, bem como foi objeto da Declaração
do Rio de 1.992.
Somente desta maneira, viabiliza-se a intervenção dos
cidadãos e de associações ambientalistas, que muito podem contribuir, no processo de
decisão.
De outra banda, facultar a participação da sociedade in casu,
além de certa forma legitimar o exercício da atividade pelas empresas rés, também é
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decorrência lógica do Estado Democrático de Direito, ou seja, a comunidade é a gestora
primária dos seus interesses e de seu patrimônio.
Inegável que a melhor maneira de tratar questões ambientais
é assegurar a participação dos cidadãos, ou seja, oportunizar a estes a participação em
processos de tomada de decisões.
Decisões não podem ser tomadas em razão apenas de
imagens delimitadas por satélites, que arvorados em exclusivos detentores do saber,
delimitam a melhor área destinada à futura instalação da antena, em desconsideração ao
elemento humano.
Cabe, portanto, ao Poder Público, não só permitir como
estimular a conscientização e a participação pública, minimizando os efeitos maléficos do
Poder econômico que aviltam o exercício da cidadania.
A eventual realização de evento que possibilitasse a
participação dos cidadãos poderia dirimir dúvidas que estão angustiando e preocupando a
comunidade local, bem como permitiria a coleta de críticas e sugestões a respeito.
A quarta etapa, por sua vez, assegura a efetivação do Poder
Público como “guardião do meio ambiente”, bem como um maior monitoramento e
fiscalização da atividade licenciada, principalmente com base na análise de “laudo técnico”
ou estudo similiar acerca da atividade objeto do licenciamento almejado.
Nem se diga que qualquer estudo de “mediação dos níveis de
radiações não ionizantes emitidas pelas estações rádio-base do sistema de telefonia
celular”
realizado
pela
ABRICEM
(Associação
Brasileira
de
Compatibilidade
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Eletromagnética), em outra Estação Rádio Base, poderá elidir a ausência de laudo
radiométrico específico no presente caso.
Isto porque, no procedimento de medição do espectro na
ERB, leva-se em conta, dentre outros fatores, as fontes de emissões eletromagnéticas já
existentes, a intensidade do campo, o índice de aglomeração urbana, etc.
Por todo o exposto, impossível não condicionar o exercício
do direito das empresas rés em desempenhar a atividade em comento à anuência da
autoridade ambiental competente.
Em síntese, pleiteia-se o licenciamento ambiental para que se
atenda a finalidade precípua de satisfação às exigências legais imprescindíveis, tais como a
participação dos cidadãos (princípio da participação comunitária) e elaboração de laudo
comprovando-se a ausência de risco à saúde.
Este esclarecimento é necessário diante da possibilidade de
serem tomadas outras medidas judiciais para garantir o necessário equilíbrio e a melhoria
das condições de vida das pessoas que residem e freqüentam as localidades afetada com a
emissão da poluição gerada pela radiação não ionizante.
Os princípios regedores da Ação Civil Pública outorgam
poder ao juiz para, acolhendo a ação, dispor no sentido de que o comanda da sentença
atinja de forma mais eficaz a tutela do interesse difuso objetivado, ou seja, a correlação
entre a causa petendi e sentença há que ser vista com certos temperamentos.
2.3. Dos danos à paisagem.
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De outra banda, preocupa-se o autor com os danos à
paisagem de Goiânia que vem sendo agredida com a proliferação dessas ERB’s, as quais
estão convertendo a nossa cidade em um paliteiro.
Uma concepção moderna da expressão MEIO AMBIENTE
abarca tanto o meio ambiente natural, quanto o cultural e o artificial. Na lição de José
Afonso da Silva, “o conceito de meio ambiente há de ser, pois, globalizante, abrangente de toda a
natureza original e artificial, bem como os bens culturais correlatos, compreendendo, portanto, o solo, a
água, o ar, a flora, as belezas naturais, o patrimônio histórico, artístico, turístico, paisagístico e
arqueológico”.
O direito fundamental à paisagem está tutelado pela Lei da
Política Nacional do Meio Ambiente (L. 6938/81) e pela Constituição Federal, nos arts.
216 e 225. A paisagem é bem inalienável, e revela a memória cultural de uma sociedade.
Nossa paisagem está se deteriorando. Ao contrário do que
ocorre na maior parte das cidades européias e norte-americanas, nossos parâmetros no
mundo ocidental, as ERB’s de Goiânia não são camufladas.
Como se pode constatar o Poder Público Municipal,
infelizmente, mantém-se inerte ao exercício do devido controle a respeito dos danos
paisagísticos e, na prática, as empresas não tem dado qualquer tratamento paisagístico às
suas ERB’s. Para comprovação disto basta um breve passeio pelas ruas da cidade com os
olhos bem voltados para o alto.
2.4. Da afronta à função social da propriedade.
Outro
argumento,
ainda,
merece
ser
invocado.
A
Constituição Federal consagra a função social da propriedade. Não se aceita mais o direito
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absoluto do proprietário de usar, gozar e dispor da coisa, ao arrepio dos interesses da
coletividade, máxime quando há normas específicas proibindo determinados modos de
fruição. LÉON DUGUIT (“in” “Les Transformations générales du droit privé depuis le
Code Napoléon”, 19ème èdition, Paris; Félix Alcan, p. 151), ainda em 1920, criticando
pioneiramente a noção individualista de propriedade, concluía que a propriedade privada
possuía uma função social.
À folha 158 da mesma obra, DUGUIT é categórico ao dizer:
“todo indivíduo tem a obrigação de cumprir na sociedade uma certa função, na razão direta do lugar que
nela ocupa. Ora, o detentor da riqueza, pelo próprio fato de deter a riqueza, pode cumprir uma certa
missão que só ele pode cumprir. Somente ele pode aumentar a riqueza geral, assegurar a satisfação de
necessidades gerais, fazendo valer o capital que detém. Está, em consequência, socialmente obrigado a
cumprir esta missão que só será socialmente protegida se cumpri-lá e na medida que o fizer. A
propriedade não é mais um direito subjetivo do proprietário; é função social do detentor da riqueza”.
O fundamento da função social da propriedade, conclui-se,
repousa no interesse social da coletividade, como um todo. Nas palavras sábias de José
Nilo de Castro ( “in” Direito Municipal Positivo, Ed. Del Rey, p. 232, 1992), “O
ordenamento jurídico pode e deve impor ao proprietário, para se alcançar a existência
digna do homem e a justiça social, obrigações de fazer consistentes na própria utilização
da coisa em prol da sociedade”.
Cabe ao “dominus” utilizar a sua propriedade de acordo com
o ordenamento jurídico. Cumpre ao Ministério Público, a seu turno, zelar pelo respeito a
esse mesmo ordenamento, fazendo uso das vias judiciárias cabíveis, quando necessário for
adequar esse uso ao interesse coletivo.
Não se pode deixar, desta forma, que o interesse patrimonial
imponha regras de vida e modos de conduta, ameaçando a segurança, salubridade,
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conforto e estética da cidade, bem como desorganizando a vida social, para, apenas,
obterem o lucro ao final. Deve-se, ao contrário, zelar pela preservação do ambiente e pela
incolumidade pública.
3. DA NECESSIDADE DA MEDIDA LIMINAR
Em razão dos argumentos ora aduzidos, a concessão de
medida liminar é imprescindível para que cessem os danos e não acarrete maiores
prejuízos ao meio ambiente e à saúde da coletividade.
Visualiza-se, pois, pelo exposto, a urgência de solução da
problemática causada pelas empresas requeridas e pela posição omissiva o município,
estando presentes os requisitos necessários para a concessão da medida pleiteada, quais
sejam: fumus boni iuris, consistente nos dispositivos legais retro mencionados e o
periculum in mora, presentes no agravamento da situação e a ocorrência dos danos daí
decorrentes.
Destarte, quando das instalações das ERB’s, ignoraram
aspectos a serem considerados, como aspectos urbanísticos, paisagísticos e exposição da
população a campos elétricos magnéticos.
A relevância do fundamento da demanda se encontra na
franca colaboração no possível aumento considerável de poluição proveniente da difusão
das ondas de radiação não ionizante em área habitada e com grande movimentação de
pessoas.
Violar princípios é mais danoso do que violar normas
positivadas,
pois,
ocupam
posição
de
preeminência
e
“exercem
função
importantíssima dentro do ordenamento jurídico-positivo, já que orientam,
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condicionam e iluminam a interpretação das normas jurídicas em geral, aí incluídos
os próprios mandamentos constitucionais” (Roque Antonio Carraza, in Curso de
Direito Constitucional Tributário, 14ª ed., Ed. Malheiros, pág. 36).
Pondere-se que os cidadãos goianienses não podem ser
obrigados a suportar o aumento de poluição radioativa que lhes será imposto pela
atividade das requeridas aguardando, ainda, que após decorrido determinado lapso de
tempo possamos considerar que os danos advindos de tal atividade são impossíveis ou de
difícil reparação.
O que deve prevalecer na análise e apreciação da liminar é o
fato de estarmos diante de interesses considerados como difusos, pertencentes a todos,
onde a saúde, a dignidade e a vida são a lei suprema que deve prevalecer e se sobrepor
sobre qualquer argumentação.
Daí a presença indelével do "fumus boni juris" e do
"periculum in mora", realçando que o primeiro materializa-se na demonstração
inequívoca do direito alegado e o segundo na inocuidade da imediaticidade do pedido, vez
que a situação requer medidas rápidas e salvaguardoras.
Faz-se necessário pois a concessão da medida liminar para:
1 – determinar ao Município de Goiânia, como obrigação de não fazer, não permitir a
instalação de qualquer ERB’s em áreas residenciais sem o devido licenciamento ambiental
o qual deverá ser precedido de estudo conclusivo sobre a inofensividade da radiação nãoionizante emitida pelas antenas;
2 – determinar ao Município de Goiânia que seja procedida a relocação das antenas
instaladas em zona residencial dentro de prazo não superior a 6 (seis) meses, após findo o
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prazo concedido às duas primeiras rés para a apresentação de laudo conclusivo acerca da
inofensividade da radiação não-ionizante produzido pelas antenas. Neste caso o
Município de Goiânia só se obrigará a relocação se os laudos forem desfavoráveis ou não
forem apresentados dentro dos prazos estipulados por vossa excelência;
3 – determinar ao Município de Goiânia que, antes mesmo de verificado o cumprimento
dos pedidos enumerados nos itens 1 e 2, proceda a notificação da empresas AMERICEL
E TELEGOIÁS CELULAR (TCO), a darem cumprimento aos requisitos exigidos na
resolução 001/2002 da SEPLAN em relação às antenas já instaladas, para que possam
continuar em operação provisória até a apresentação e aprovação o laudo supra
mencionado.
4 – determinar a Americel e a TELEGOIÁS CELULAR (TCO) que não procedam a
instalação de nenhuma antena transmissora dentro da zonas residenciais, bem como na
distância mínima de cem metros de escolas, hospitais, asilos, creches, maternidades e
similares deste Município, sem o devido licenciamento a ser expedido pelo órgão
municipal competente, o qual deverá estar instruído com o laudn conclusivo à cerca da
não lesividade da radiação não ionizante produzida pelas antenas;
5 – determinar às rés Americel e TCO, como obrigação de não fazer, em estrito
cumprimento aos princípios da prevenção e precaução mencionados nesta inicial e
insculpidos na AGENDA 21 em seu princípio 15º e ainda na legislação pátria, lei
6.938/81, que apresente o laudo conclusivo supra mencionado sobre a inofensividade ou
não da radiação não-ionizante das antenas instaladas na zona residencial em prazo não
superior a 6 meses, o qual somente terá validade se devidamente aprovado por três
instituições de renome nacional ligadas à área, a exemplo da UNICAMP, USP, UNB,
CNEN e UFG, a critério de vossa excelência.
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7 – determinar à AMERICEL E TELEGOIÁS CELULAR (TCO) a desativação de todas
as antenas de transmissão de celular, em prazo não superior a trinta dias, das ERB’s que
não se enquadrarem nos requisitos exigidos na resolução 001/2002 da SEPLAN, mesmo
antes da conclusão e aprovação do Laudo mencionado no item 2 supra.
4. DO PEDIDO
Ante o exposto, o Ministério Público requer:
1 – a concessão da liminar nos termos supra mencionados;
2 – a citação dos réus para, querendo, contestarem a ação,
sob pena de revelia e confissão quanto à matéria de fato;
3 – a produção de todos os meios de prova em direito
admitidos, notadamente a prova testemunhal, pericial e documental, bem como
depoimentos pessoais dos representantes legais das requeridas;
4 – a procedência dos pedidos para condenar:
4.1 – o Município de Goiânia em nas seguintes obrigações de fazer e não fazer:
a) não permitir instalação e funcionamento de qualquer estação de rádio base (ERB’s)
dentro do perímetro urbano de Goiânia sem o devido licenciamento ambiental;
b) não proceder o licenciamento para a instalação e funcionamento de antenas
desprovido do laudo conclusivo, atestando a inofensividade da radiação, como
mencionado no item 4 do pedido liminar, bem como, não autorizar a instalação e
funcionamento das ERB’s que estejam em desacordo com a legislação local de uso do
solo e instrução normativa 001/2002 da SEPLAN;
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c) promover a relocação das antenas transmissoras, já instaladas, nos moldes do pedido
liminar;
4.2 – as demais rés nas obrigações de fazer e não fazer:
a) a não instalação de novas antenas e a relocação das antenas já existentes na zona
residencial de Goiânia, em caso de não comprovada a radiação não-ionizante emitida
por seus equipamentos, nos moldes da liminar requerida, bem como as que não
atendam as exigências da Instrução Normativa 001/2002;
b) pagamento da importância de R$10.000,00 (dez mil reais) por cada uma das antenas
instaladas e em funcionamento, a título de indenização pelos danos já experimentados
pela população, a ser revertido para o Fundo Municipal do Meio Ambiente;
5 – pagamento de multa diária no valor de R$50.000,00
(cinqüenta mil reais) em caso de desobediência ou descumprimento das obrigações acima.
6 – a publicação de Edital para se dar conhecimento a
terceiros interessados e à coletividade, tendo em vista o caráter erga omnes da Ação Civil
Pública.
Embora seja de valor inestimável, dá-se a presente causa o
valor de R$ 500.000,00 (quinhentos mil reais).
Goiânia, 19 de setembro de 2002.
GEIBSON CÂNDIDO M. REZENDE
Promotor de Justiça
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