10° Seminário de Extensão INTERPRETAÇÃO SOBRE A FOME E A

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10° Seminário de Extensão
INTERPRETAÇÃO SOBRE A FOME E A MISÉRIA: UMA EXPERIÊNCIA ATRAVÉS DA
PESQUISA PARTICIPANTE
Autor(es)
JOSE CYPRIANO DE OLIVEIRA JUNIOR
Co-Autor(es)
FRANCISCO NEGRINI ROMERO
Orientador(es)
FABÍOLA CRISTINA RIBEIRO DE OLIVEIRA
1. Introdução
O desenvolvimento brasileiro é marcado por processos e modelos econômicos que aprofundaram as
injustiças sociais, geradores de graves problemas sociais. O elevado grau de desigualdade está presente no
país desde a economia colonial até os dias atuais. A desigualdade, em especial a desigualdade de renda, é
tão parte da história do país que adquire caráter de coisa natural (BARROS, HENRIQUES e MENDONÇA,
2000, p. 15).
Estudos como de Barros, Henriques e Mendonça (2000) e de Hoffmann (2006) mostram que no final da
década de 1990, a desigualdade de renda ainda apresenta-se em patamares elevados e com uma
indesejável estabilidade. Há evidências de que a desigualdade é o principal determinante do elevado
contingente de pessoas se encontram em situação de pobreza (ou mesmo de indigência).
Com relação à Piracicaba, esta possui características de uma cidade moderna, dinâmica e diversificada.
Entretanto, também apresenta aspectos de um Município com vários problemas sociais e de
desenvolvimento, ligado à pobreza e à falta de oportunidades. Martins e Gallo (2001) revelam que entre
1930 e 1970 a cidade passou por importantes mudanças econômicas, sociais e políticas. Essas mudanças
estavam ligadas fundamentalmente à expansão do Complexo Agroindustrial Açucareiro, processo associado
ao surto de industrialização de São Paulo. Nos anos 1970, Scarfon (1979) mostra que em torno de 8.000
famílias que viviam em Piracicaba dependiam do auxílio de Programas Assistenciais para a satisfação das
necessidades mais básicas.
Ainda existem muitos bairros periféricos, onde vivem pessoas e/ ou famílias em condições precárias de
sobrevivência. Há grande massa de trabalhadores com renda muito baixa, pois, além dos desempregados,
existem todos os serviços pessoais não qualificados, que vão desde o serviço doméstico até o comércio de
rua, assim como as atividades artesanais pré-capitalistas.
Para respaldar essa afirmação, informações do Plano Diretor de Piracicaba (2003) mostram que a
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espacialização da concentração da riqueza e da pobreza na cidade indicou que mais de 50% dos chefes de
família com rendimento superior a 10 salários mínimos moram na área central consolidada. Bairros das
regiões Oeste, Sul e Norte são os que concentram a pobreza, a precariedade habitacional e a presença de
imóveis sub-normais.
Diante disso, julga-se importante fazer um diagnóstico participativo das diferentes possibilidades
interpretativas sobre a questão da fome e da miséria que os moradores, jovens e adultos, do bairro Parque
Piracicaba possuem, considerando-se os determinantes sociais referentes a origem social, condições de
classe e vivências no mundo do trabalho. Destaca-se que o Parque Piracicaba é um bairro que pertence à
região Norte da cidade.
2. Objetivos
Esse artigo tem como objetivo mostrar as diferentes interpretações sobre questões ligadas à pobreza e
miséria, num contexto de análise e diagnóstico das condições de vida dos moradores do Parque Piracicaba
(Balbo).
3. Desenvolvimento
As informações discutidas neste trabalho foram coletadas por meio da aplicação de questionários
estruturados nos domicílios do bairro Parque Piracicaba que se propuseram a participar da coleta de dados.
De acordo com o Censo de 2000, a população censitária do bairro é de 8.575 pessoas. Participaram da
amostra desse estudo 211 domicílios, que continham no total 986 pessoas. Trata-se de uma amostra com
mais de 11,5% da população, o que é bastante representativo do ponto de vista estatístico, para uma
pesquisa desta natureza.
A proposta metodológica da constituição da amostra deste estudo é baseada na Pesquisa Participante
Conscientizadora (PPC). A PPC procura acompanhar uma comunidade que tenha um problema e que se
proponha por ela mesma realizar um estudo sistemático de tal maneira que ela adquira uma consciência
critica de seu entorno e novos elementos de controle. Diferentemente da pesquisa clássica, se propõe a um
tripé de inversão: a) de sujeito interpretado, a população se torna sujeito interpretador; b) de objeto de
clarificação, a coletividade torna-se fonte de clarificação; c) de instrumento de informação, a base adquire
poder através da informação. O princípio da pesquisa é a confrontação-dialógica que realizam os grupos de
pesquisadores em encontros que buscam percepções diferenciadas do problema, levando em conta a
participação popular, pois a PPC se propõe a:
Conhecer a sua própria realidade. Participar da produção deste conhecimento e tomar posse dele.
Apreender a escrever sua história de classe. Aprender a reescrever a história através da sua história. Ter no
agente que pesquisa uma espécie de gente que serve. Uma gente aliada, armada dos conhecimentos
científicos que foram sempre negados ao povo, aqueles para quem a pesquisa participante – onde afinal
pesquisadores e pesquisados são sujeitos de um mesmo trabalho comum, ainda que com situações e
tarefas diferentes – pretende ser um instrumento a mais de reconquista popular (Brandão, 1999).
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A investigação das condições de vida dos moradores da Balbo é fundamentada, neste estudo, em
procedimentos de análise exploratória de dados, respaldados em métodos de estatística descritiva.
Conforme Toledo e Ovalle (1985), a estatística descritiva é um instrumento indispensável, na medida em que
se procura investigar uma determinada situação e, para isso, dispõe-se de muitos dados, o que torna difícil
captar todas as informações e padrões de comportamento das mesmas. A estatística descritiva é utilizada
com o intuito de que as informações sejam reduzidas, através do uso de certas medidas-sínteses, de modo
que os dados possam se reduzir a proporções ou padrões mais facilmente interpretáveis. A análise
descritiva é desenvolvida com auxílio de índices, gráficos e tabelas, para resumir e apresentar relações
relevantes da situação e condição de vida das pessoas moradoras no Parque Piracicaba.
4. Resultado e Discussão
Os dados da pesquisa revelam que as famílias que moram na Balbo e que participaram da pesquisa, são
compostas por cerca de 4,66 pessoas por domicílio, sendo que as casas com 3 a 4 pessoas representam
46% (quase a metade) do total de pessoas por domicilio. A idade média de tais moradores é de 29,4 anos,
mas há 19,0% de crianças de 0 a 9 anos de idade, 19,4% de jovens e adolescentes de 10 a 20 anos e
19,2% de adultos com idade entre 21 e 30 anos. O percentual de pessoas idosas com mais de 61 anos de
idade é de 7,4%.
É importante destacar que o número médio de pessoas por domicilio entrevistado é muito elevado, pois
ultrapassa o valor médio nacional. Segundo Farid (2007), do jornal online Estadão, em 2006, o número
médio de pessoas por domicílio no país foi de 3,4 pessoas. O valor é mais elevado até do que no norte do
país, onde viviam cerca de 4,0 pessoas por domicílio.
Uma informação bastante relevante é a de que cerca de 30,4% do total de moradores migraram de outros
estados e de outras cidades do interior de São Paulo. Mas, quando se considera a população mais adulta,
representada pelos pais e pelas mães dos domicílios entrevistados, verifica-se que entre os homens 49,4%
não nasceram em Piracicaba. Os principais locais de origem desses chefes domiciliares são outras cidades
do estado de São Paulo (48,9%), seguida por estados que compõem a região nordeste (21,6%). Dentre o
grupo de mães, por volta de 44,2% vieram de outros lugares. Entre esse grupo de mulheres, a maioria é
migrante do próprio estado de São Paulo (53,8%) e da região nordeste (19,8%). Essas famílias já estão em
Piracicaba há cerca de 25,8 anos, e fixaram-se na Balbo há 19,6 anos em média.
Com relação aos aspectos sobre o mercado de trabalho, verifica-se que 69,7% das pessoas
economicamente ativas e ocupadas , encontram-se trabalhando no setor de serviços. É valido destacar que
sob essa sigla, agregam-se todos os serviços pessoais não qualificados, que vão desde o serviço doméstico
até o comércio de rua, assim como as atividades artesanais pré-capitalistas. Esse elevado percentual de
pessoas ocupadas nesse segmento da economia de Piracicaba dá sinais de certa precariedade do trabalho
de muitas famílias que vivem em bairros periféricos, como é o caso do Parque Piracicaba. Dentre os
entrevistados, apenas 21,6% trabalham no setor industrial. Quando se analisa essa informação do setor de
atividade segundo o gênero, observam-se as condições pioradas de inserção feminina no mercado de
trabalho, pois 82,6% das mulheres encontram-se ocupadas no setor de serviços. Considerando-se ainda, as
que trabalham no comércio (11,4%), por volta de 94% das mulheres que trabalham na Balbo, são ocupadas
no setor terciário da economia piracicabana.
Conforme ilustra a Figura 1, apenas 18,2% dos trabalhadores da Balbo auferem remuneração acima de 3
salários mínimos. Mais da metade dos trabalhadores, quase 55%, ganham até 2 salários mínimos . Entre os
homens, em torno de 43,7%, ganham salários mensais acima de 3 salários mínimos. Já entre o universo
feminino, apenas 19,6% ganham salários iguais ou maiores do que 3 salários mínimos. Esse indicador de
salário reforça a hipótese de que a mão-de-obra feminina, que mora na Balbo, encontra-se empregada em
atividades com baixos níveis de qualificação, e, conseqüentemente, de remuneração. São em sua maioria
empregadas domésticas, diaristas, costureiras, etc.
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Apesar da aparente precarização das relações de trabalho, da baixa qualificação dos moradores e
trabalhadores dos domicílios que contribuíram para o diagnóstico participativo, não se captou nenhum
domicílio que declarasse problemas diretos com a forme e a desnutrição. Mas, as famílias puderam opinar e
revelar a sua interpretação sobre a fome e miséria. Conforme a Figura 2, a maior causa apontada como
determinante da fome e da miséria é o antigo problema estrutural da economia brasileira, ou seja, está
voltado para aquilo que se chamou de desigualdades sociais, em que se englobam problemas relacionados
à má distribuição de renda e à falta de oportunidades sociais. Outros dois problemas apontados foram os
baixos salários, sendo que as famílias respondentes devem conviver com esse tipo de problema, conforme
constatado logo acima, e a falta de emprego.
5. Considerações Finais
Os resultados obtidos pela Pesquisa Participante mostraram que muitas famílias na Balbo são migrantes de
outros estados e regiões brasileiras. Mas essa migração é um processo que ocorreu há mais ou menos 26
anos, e estão consolidadas no bairro há quase 20 anos. Vieram para Piracicaba em outros momentos
econômicos, quando a cidade passava por uma série de transformações e a indústria, em pleno processo de
expansão era capaz de absorver grande quantidade de trabalhadores. Parece existir um grande contingente
de jovens no bairro, mas a população ocupada ainda apresenta baixa remuneração e qualificação. Apesar
de um quadro que reflete condições de vida precária, a pobreza absoluta não parece um problema de tais
moradores, pois não apresentaram problemas relativos à fome e desnutrição. E apontam como principal
determinante da fome e da miséria a desigualdade social, especialmente à ligada a desigualdade de renda.
Essas informações ainda contribuirão para as próximas etapas de desenvolvimento do projeto no bairro,
dando subsídios às ações sócio-educativas no âmbito da educação popular.
Referências Bibliográficas
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TOLEDO, G. L. e OVALE, I. I. Estatística Básica. 2. ed. Atlas: São Paulo, 1985.
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