2.3 A VARIABILIDADE DO CLIMA NO PASSADO 2.3.1 A HISTÓRIA DO CLIMA Nesta seção, vamos primeiro rever alguns dos registos e mudanças climáticas no passado, descrever as causas dessas mudanças e os meios técnico usados para determinar o clima do passado. Paleoclima Refere-se ao clima da Terra no período que antecede o início da civilização humana e que se estende até os últimos bilhões de anos, se não mesmo para o início da história da Terra. O clima mundial era muito mais quente do que agora. Estas condições foram interrompidas, talvez por sete breves períodos de glaciação. A mais recente é a 4ª era Glaciar (referida como Idade do Gelo), cerca de 2 milhões de anos atrás. Essas oscilações de temperatura e cobertura de gelo são chamados períodos glaciais/interglacial e tipicamente duraram cerca de 100.000 anos. Durante um período glacial uma enorme quantidade de água é transferida a partir do oceano para terra. Uma estimativa da quantidade de gelo depositado nas calotas sugere que, durante o glacial o nível do mar tenha sido 120 metros abaixo do nível atual. Pela definição da idade de gelo como um período geológico em que extensas calotas existem em ambos os hemisférios, ainda estamos na última glaciação, mas em um interglacial quente. Na verdade, essas condições quentes têm permitido a civilização humana, uma vez que se insere integralmente no Holoceno. Dados dos núcleos da Groenlândia mostram que a tendência de aquecimento do último período glacial até ao Holoceno foi interrompida à cerca de 12.900 anos atrás, quando a temperatura global caiu de repente e as condições glaciares voltaram à Eurásia e América do Norte. Esta onda de frio durou cerca de 1.300 anos e é conhecida como Younger-Dryas ou Big Freeze. O final deste período veio com um aumento abrupto da temperatura que poderá ter sido causada por uma interrupção da circulação termohalina do Atlântico Norte. No Holoceno, desde há 9.000 a 5.500 anos aC, um período relativamente húmido registou-se no Norte de África. Nesta fase, o período húmido Africano, pradarias cobriram a Região do Saara / Sahel, e muitos lagos e pântanos surgiram. O fim deste período correspondeu ás mais dramáticas mudanças climáticas, onde grande parte do norte da África equatorial e passou a uma paisagem de deserto. Uma excursão importante da temperatura acompanhou o final deste período, ligeiramente mais quente, que durou dois milênios e que é chamado de meio-Holoceno máximo, conhecido como o Holoceno climático ótimo, devido ao crescimento da vegetação. O último milénio Temperaturas médias ao longo do Hemisfério Norte nos últimos 1300 anos Várias causas têm sido propostas para as variações de temperatura, como a atividade vulcânica e a atividade solar. Estas variações também são interpretadas apenas como uma consequência da inerente variabilidade natural do sistema climático. O clima dos últimos 150 anos Registro anual da temperatura global desde 1850: Sabemos que a temperatura varia de dia para dia e de estação para estação, mas aqui estamos considerar as variações anuais significativas na temperatura média global. A variabilidade da temperatura de ano para ano ou de década para década também é percetível. Um período mais quente entre 1900 a 1945, com um aumento da temperatura média de 0,5 ° C, é seguido por uma tendência de arrefecimento de 25 anos ou mais. A partir de meados dos anos 70 até 2006, a figura mostra uma clara tendência de aquecimento com um aumento da temperatura de cerca de 0,7 º C. As linhas retas coloridas mostram uma tendência de aquecimento dos últimos 150, 100, 50 e 25 anos. Comparando a linha vermelha (150 anos) com a linha amarela (25 anos), verificamos um aquecimento acelerado. 2.3.2 CAUSAS DA VARIABILIDADE CLIMÁTICA Muitas teorias tentam explicar as variações climáticas tanto de curto tempo como de longo tempo. A dificuldade reside na compreensão das complexas interações entre os vários elementos que compõem o sistema climático. Como vimos, o clima global reflete o balanço da energia solar que entra e da energia que é expelida pela Terra. Existem vários mecanismos naturais que forçam o sistema climático a mudar, quando este é perturbado por algum tipo de agente forcing, responde positiva ou negativamente, ampliando ou diminuindo os efeitos dessa perturbação – feedback. Um exemplo de feedback positivo – snow-albedo (reflexão luminosa da neve) num planeta frio. Estes mecanismos de feedback podem interagir com os outros de forma que os efeitos produzidos não se podem resumir apenas a um deles. No entanto, ainda que não se verifique um forcing externo, o clima terrestre tende a mostrar variações/flutuações que se podem dever a causas internas - variabilidade natural (movimento dos oceanos, a atmosfera ou a interação entre os dois). Exemplos destas flutuações: ciclo irregular entre a fase quente (El Niño) e a fase fria (La Niña) da Oscilação Sul do El Niño (ENSO) – ocorre em intervalos irregulares de cerca de 5 anos e origina grandes inundações ou secas. A questão é: se as causas internas são suficientes para explicar o atual aquecimento global ou se é necessário incluir agentes forcing exteriores? Assim, o registo da temperatura do último milénio é importante pois dá-nos indicações da amplitude dessas variações num período em que dispomos de dados suficientes para determinar a magnitude desses forcings. Uma forma de avaliar as variações internas são os modelos climáticos globais que mostram como deverá evoluir o sistema climático se forem anuladas esses forcings externos. Alternativamente, pode-se estudar os acontecimentos climáticos na história para avaliar se certa alteração climática é consequência de uma causa externa. Vamos analisar como os forcings externos podem explicar alterações climáticas e avaliar se essas alterações desempenham um papel significativo no atual contexto. Variações na atividade solar Desde 1978 que se fazem medições diretas da atividade solar que mostram variações de cerca de 1% (entre o máximo e o mínimo de um ciclo solar) na atividade solar (ciclos de 11 anos). A energia solar é correlacionada com as medições das manchas solares, também em ciclos de 11 anos, desde a sua descoberta em 1610 por Galileu. Mínimo de Maunder - Período entre 1645-1715 em que foram registadas muito poucas, se é que algumas, manchas solares. Este mínimo verificou-se na era da Pequena da Idade do Gelo, pelo que os cientistas sugerem a redução da atividade solar como sua causa. Outro indicador da atividade solar são os índices de carbono-14 (presente nas árvores) que tem mostrado uma constância nos últimos 2000 anos. Parece difícil que uma variação tão pequena (0,1%) da irradiação solar seja a causa da Pequena Idade do Gelo. De facto, o motivo das temperaturas do último ciclo de 11 anos parece estar mascarado pelo efeito de estufa. Erupções vulcânicas A presença de aerossóis (partículas líquidas e sólidas) altera a turvação da atmosfera. Alguns aerossóis são libertados para a atmosfera através de processos naturais (incêndios, tempestades de areia, erupções vulcânicas), mas a atividade humana também é geradora de aerossóis, principalmente na troposfera. Tempo de vida dos aerossóis – varia de dias a semanas na troposfera e de anos na estratosfera e parece não produzir efeitos a longo prazo no clima. Durante as erupções vulcânicas, cinzas, partículas de pó e gases são lançados para a estratosfera que, combinados com o vapor de água (proveniente da irradiação solar), formam os aerossóis. Estes aerossóis (estratosfera) absorvem e refletem parte da radiação solar. Estes efeitos das erupções vulcânicas podem durar anos permanecendo os aerossóis em suspensão durante esse período. Correlação entre descidas de temperatura e atividade vulcânica – o efeito depende da quantidade de material libertado para a atmosfera (ex. erupção do Monte Tambora em 1815 e o frio extremo em 1816. A combinação de um aumento na atividade vulcânica e uma diminuição da radiação solar pode ter contribuído para Pequena idade do Gelo, se não como uma causa direta, pelo menos como a faísca que iniciou uma instabilidade climática. Em qualquer caso, o efeito de qualquer enfraquecimento ou fortalecimento da radiação solar atual seria compensado pelo efeito estufa. Variações na órbita terrestre Teoria Milankovitch (1930). Existem 3 ciclos astronómicos que afetam a quantidade e distribuição de radiação solar que entra na Terra – forcing solar: O primeiro ciclo é a variação da excentricidade da órbita (desvio de ser um círculo perfeito e antes de forma mais elíptica) – variações na distância do sol O segundo ciclo é a época do ano em que o perihelio da Terra (o ponto em que é mais próximo do sol) ocorre. O terceiro ciclo está relacionado com a inclinação do eixo da Terra, a obliquidade, que varia entre 22,1º e 24,5º - Quanto menor o ângulo de inclinação menor variação sazonal entre o verão e o inverno nas regiões de média e alta latitude. Todos os três ciclos se combinam para produzir variações na quantidade de radiação solar recebida sobre a superfície da terra, mas, mais importante, na distribuição do fluxo de energia sobre a superfície. Apesar do sucesso desta teoria, surgem algumas dificuldades pelas observações efetuadas: o intervalo de variabilidade do clima parece ser muito maior do que o que seria esperado. A forte correlação entre o dióxido de carbono e as concentrações de metano na atmosfera com a temperatura média sugere que o efeito de estufa é o mecanismo impulsionador para as variações de volume de gelo. Mas, mais uma vez, as variações na concentração desses gases, não são suficientes para causar um grande arrefecimento ou aquecimento. Tem-se argumentado que estas variações rápidas se devem ao facto da Terra não aquecer nem arrefecer de forma global. Segundo a teoria de Milankovitch estamos em período de pequenas variações e, portanto, num período interglacial anormalmente longo. O cenário é voltarmos para um período de avanço glacial. As estimativas do próximo período glacial variam entre 6000 e 50.000 anos ; o relatório do IPCC (2007) diz ser muito improvável que a Terra entre numa era glacial em menos de 30 mil anos. Mudanças nos padrões de circulação dos oceanos circulação oceânica à escala global (corrente transportadora) À medida que a água quente do Golfo do México segue para o norte, arrefece e por meio de evaporação aumenta a salinidade (concentração de sal) – traduz-se na densidade progressiva dos oceanos. Quando a água na superfície é mais densa do que a água debaixo dele, há um afundamento. Esse deslocamento faz com que o fluxo circule na profundidade Oceano Atlântico para o sul contornando a África em direção ao Pacífico e Índico, onde, eventualmente, sobe novamente para a superfície. A parte mais quente desta corrente oferece uma importante quantidade de calor intertropical ao Atlântico Norte. A circulação Termohalina produz significativas alterações na distribuição da temperatura global: uma circulação forte traz invernos relativamente húmido ao norte da Europa, enquanto que se essa circulação for enfraquecida, os invernos na Europa serão muito mais frios e podem produzir um aumento de calor no hemisfério sul. A interrupção da circulação Termohalina tem sido proposta como a causa do Big Freeze rápido período de frio durante o período de aquecimento após o fim da última era do gelo) O degelo de icebergs resulta em fluxos de água doce de baixa salinidade, grandes o suficiente para alterar as correntes oceânicas. Em qualquer caso, esta circulação parece desempenhar um papel crucial nestas abruptas mudanças climáticas, pois é um exemplo importante no mecanismo de transporte de calor.