Recuperação/Restauração de áreas alteradas/degradadas na Amazônia brasileira Luiz Antonio de Oliveira(1); Maricleide Maia Said(2); Juliana Moreno da Silva(3) (1) Pesquisador do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia - INPA C.Postal 478, 69011-970, Manaus, Amazonas, bolsista do CNPq e Professor de PG do INPA, UFAM e UEA [email protected]; (2) Rede CTPetro Amazônia - INPA -C.Postal 478, Manaus, AM, CEP 69011-970 - [email protected]; (3) Mestranda do Curso de Pós-Graduação em Botânica – INPA – C. Postal 478, Manaus, AM, CEP 69011-970. [email protected] (2) RESUMO – Mais de 65% dos solos cultivados no planeta eram originalmente ocupados por florestas e a sua conversão em cultivos anuais/semianuais ao longo das décadas resultou, muitas vezes, em áreas degradadas e susceptíveis à erosão. Na Amazônia, as áreas desmatadas já ultrapassaram 13% de sua superfície, correspondendo a mais de 70 milhões de hectares, com boa parte deles apresentando situações variadas de degradação. Historicamente, cerca de 95% das áreas desmatadas na região foram utilizadas para a agricultura e pecuária, com a mineração e exploração de petróleo e gás natural respondendo pelos outros 5%. Restaurar a vegetação original que se encontrava no local ou recuperar essas áreas para a produção agroflorestal exige planejamento e educação dos envolvidos no processo. Os termos “recuperar” e “restaurar” nem sempre são a mesma coisa. Recuperar significa reflorestar não necessariamente com as mesmas espécies e freqüências encontradas antes do desmatamento. Restaurar, por outro lado, é devolver à área desmatada, a mesma vegetação de floresta que estava lá antes da ação antrópica ter modificado o local. Nas áreas desmatadas para a mineração e exploração de gás e petróleo, a legislação recomenda que se efetive o processo de restauração ambiental, visando devolver ao ecossistema, a mesma situação encontrada antes. Nas áreas exploradas pela agricultura e pecuária, a recuperação é a mais indicada, exceto nas situações de recomposição dos ecossistemas, em que se deve proceder a restauração da área antropizada. Quando a área degradada for destinada a plantios agroflorestais, investimentos na recuperação da fertilidade do solo através de adubação química e orgânica são essenciais, uma vez que os produtos comercializados carregam consigo para fora da área, macro e micronutrientes contidos nos frutos, sementes, madeiras, etc. PALAVRAS-CHAVE-: reflorestamento, áreas degradadas, revegetação. INTRODUÇÃO – Mais de 65% dos solos cultivados no planeta eram originalmente ocupados por florestas e a sua conversão em cultivos anuais/semianuais ao longo das décadas resultou, muitas vezes, em áreas degradadas e susceptíveis à erosão. Na Amazônia, as áreas desmatadas já ultrapassaram 13% de sua superfície, correspondendo a mais de 70 milhões de hectares, com boa parte deles apresentando situações variadas de degradação. Historicamente, cerca de 95% das áreas desmatadas na região foram utilizadas para a agricultura e pecuária, com a mineração e exploração de petróleo e gás natural respondendo pelos outros 5%. Restaurar a vegetação original que se encontrava no local ou recuperar essas áreas para a produção agroflorestal exige planejamento e educação dos envolvidos no processo. Os termos “recuperar” e “restaurar” nem sempre são a mesma coisa. RESULTADOS E DISCUSSÃO – Quando discutidos assuntos sobre questões ambientais, existem muitas palavras e termos utilizados nas últimas décadas, bem como novas expressões criadas e/ou substituídas, sendo usadas algumas vezes de forma incorreta. Assim, constatou-se a necessidade de abordar algumas definições de algumas palavras utilizadas, como reflorestamento, revegetação, regeneração, recuperação e restauração ambiental. De acordo com a Conference of the Parties 2001 (COP, 2001), reflorestamento (ou florestamento) é a ação direta do homem na conversão de terras que não tenham sido florestadas por um período de no mínimo 50 anos para terras florestadas por plantação, semeadura e/ou ação humana promovendo semeadura natural. Nas florestas plantadas no Brasil, os gêneros predominantes são Pinus e Eucalyptus, espécies exóticas nas regiões. Na Amazônia, a Companhia Vale do Rio Doce possui uma área de 387 hectares onde foram investidos US$12 milhões com o plantio de eucalipto (Gazeta mercantil, 2001). Para Alencar (2008), a revegetação, ou recomposição florestal, é um processo para devolver à área a cobertura vegetal mais equilibrada, em termos de estabilidade ecológica, e se possível, com finalidades de atender as necessidades socio-econômicas regionais, a fim de promover a formação de uma renda adicional. Na revegetação procura-se utilizar espécies que tenham propriedades físicas e mecânicas adequadas para o produto desejado; e quantificar o crescimento de cada espécie arbórea (qualitativa e quantitativamente ) conforme o objetivo fixado, aplicando as técnicas de rendimento sustentado para manter o capital produtivo natural. Estas florestas devem garantir a estabilidade do ecossistema, sendo implantadas em termos de estrutura da vegetação original da região, utilizando espécies nativas que tenham maior Índice de Valor de Importância (I.V.I.). Finol (1969) relata que regeneração natural é caracterizada apenas com as plantas superiores a 10 cm de altura e DAP inferior a 10 cm. Entretanto, Rollet (1969) considerou todos os indivíduos com DAP inferior a 5 cm. Outros autores como Klein (1980), Saldarriaga & Uhl (1991), definem regeneração florestal como o processo pelo qual a floresta perturbada atinge características da floresta madura o que pressupõe, segundo Budowski (1965), Gómez-Pompa & VásquezYanes (1981), Whitmore (1991), Kappelle et al. (1996), modificações nas características da comunidade e mudanças direcionais na composição de espécies. Conforme Whitmore (1990) e Guariguata & Dupuy (1997) a velocidade de regeneração da floresta tropical depende da intensidade da perturbação sofrida. O tempo de regeneração de algumas florestas tropicais americanas foi estimado entre 150 e 200 anos (UNESCO/PNUMA/FAO, 1980). Saldarriaga & Uhl (1991) estimaram que sejam necessários, aproximadamente, 140 a 200 anos para que a floresta tropical de terra firme, estabelecida em áreas de cultivo abandonadas, apresente valores de biomassa similares aos da floresta madura na Amazônia venezuelana. A regeneração florestal, após um distúrbio natural, como a abertura de clareiras pela queda de árvores, ocorre através da contribuição das árvores remanescentes via produção de sementes ou rebrota, pelo recrutamento das plântulas sobreviventes à perturbação (regeneração avançada), e pelo recrutamento de sementes presentes no banco de sementes do solo e/ou provenientes da chuva de sementes (Uhl et al., 1981; Young et al., 1987; Whitmore, 1991). Em áreas sujeitas à perturbação antrópica, a contribuição relativa dessas diferentes fontes de regeneração frequentemente se altera. Mudanças na estrutura (área basal, densidade, estratificação do dossel), riqueza e composição de espécies, e no funcionamento florestal (ciclagem de nutrientes, produtividade primária líquida, luminosidade) ocorrem através de uma seqüência de eventos e processos após o abandono da terra (Guariguata & Ostertag, 2001). Segundo o IBAMA (2010), “recuperação” é a restituição de um ecossistema ou de uma população silvestre degradada a um condição não degradada que pode ser diferente de sua condição original. Assim, Recuperação Ambiental é quando o sítio (local) degradado será retornado a uma forma de utilização de acordo com o plano preestabelecido para o uso do solo. Significa também que o sítio degradado terá condições mínimas de estabelecer um novo equilíbrio dinâmico, desenvolvendo um novo solo e uma nova paisagem. Por outro lado, ainda segundo o IBAMA (2010), o termo “restauração” é aplicado na situação em que ocorre a restituição de um ecossistema ou de uma população silvestre degradada o mais próximo possível da sua condição original. Para que a restauração seja eficaz, há alguns princípios básicos a serem seguidos, segundo Oliveira (2009): a) Identificar as espécies e a freqüência (número de indivíduos por hectare) na floresta adjacente à área degradada que se propõe restaurar. b) Com base nessa informação, coletam-se sementes das árvores dessa floresta e produz-se mudas suficientes para serem introduzidas na área degradada em uma freqüência 5-10 vezes a observada na floresta, distribuindo-as aleatoriamente (nunca dois indivíduos da mesma espécie plantados um ao lado do outro) na clareira a ser restaurada. c) As espécies devem ser distribuídas de acordo com suas adaptações edafoclimáticas e topográficas. Devem ser colocadas no topo, as que se encontram nos lugares mais altos do terreno e, nas baixadas ou em solos alagados, as adaptadas a essas condições, como o buriti (Mauritia flexuosa), sempre encontrado dentro ou nas margens dos igarapés e lagos, mas às vezes plantada em ambiente não adequado (Fig. 1). d) Esse plantio adensado permite melhor cobertura inicial da área desprotegida, minimizando a ação negativa do sol e da chuva, responsáveis pelas altas temperaturas e erosão superficial do solo. e) As espécies “pioneiras” devem ser introduzidas primeiro na área, com as “climáxicas” sendo plantadas apenas quando as primeiras estiverem com crescimento mínimo de 1 m. Essa seqüência de plantio cria um clima de sombreamento relativo para as f) g) h) i) j) “climáxicas” se adaptarem com mais facilidade ao novo ambiente. À medida que as mudas crescem, faz-se podas das excedentes, até que as remanescentes se estabeleçam numa floresta secundária semelhante à original. Nesse processo de poda, exclui-se primeiro as pioneiras e posteriormente as “climáxicas”, deixando-as nas mesmas freqüências encontradas na floresta adjacente. Recomenda-se que o solo da área a ser restaurada apresente pH, fertilidade e teores de matéria orgânica semelhantes aos observados na floresta adjacente, permitindo às mudas, condições de adaptação rápida à nova situação. Quando a área degradada for destinada a pastagens (Fig. 2) ou plantios agroflorestais, investimentos na recuperação da fertilidade do solo através de adubação química e orgânica são essenciais, uma vez que os produtos comercializados carregam consigo para fora da área, macro e micronutrientes contidos nos frutos, sementes, madeiras, carne (gado nas pastagens), etc. Uma ação extremamente importante para o sucesso da recuperação/ restauração de áreas degradadas na Amazônia e pouco utilizada é o treinamento e conscientização da população humana envolvida no processo. Sem isso, os resultados positivos dificilmente serão consistentes e de longo prazo. Envolver as comunidades rurais e/ou integrantes de empresas responsáveis pelo desmatamento no processo de recuperação/restauração faz com que esse se consolide e se efetive totalmente, tornando áreas inúteis e sem possibilidades de uso, numa nova área produtiva ou floresta secundária. CONCLUSÕES As áreas desmatadas na Amazônia provenientes da exploração antrópica devem ser reflorestadas, revegetadas, recuperadas ou então, restauradas, de acordo com as definições corretas desses termos e a utilização após a exploração. Aspectos relacionados com as características dos solos, da fauna e da flora devem ser conhecidos e observados nesse processo de reversão da degradação, de preferência, envolvendo as empresas e/ou comunidades que participaram diretamente na exploração. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Alencar, J.C. 2008. Amazônia: Manejo de florestas naturais em regime de rendimento sustentado. Manaus: Impresa oficial do estado do Amazonas. Budowski, G., 1965, Distribution of tropical American rain forest species in the light of successional process. Turrialba, 15: 40-2. COP 2001. Conference of the Parties. The marrakesh accords & the marrakesh declaration. 245p. Finol, V.H. 1969. Possibilidades de manejo silvicultural para las reservas forestales de La region occidental. Rev. For. Venez., 12 (17): 81100. Gazeta mercantil. 2001. Vale tem projeto ambiental. Disponível em: http:// www.forumclima.gov.br/. Gómez-Pompa, A.G.; Vázquez-Yanes, C. N., 1981. Successional studies of a rain forest in Mexico, pp. 247- 266. In: D. C. West, H. H. Schugart & D. B. Botkin (eds.), Forest concepts and application, Springer-Verlag, New York. Guariguata, M. R.; Dupuy, J. M., 1997, Forest regeneration in abandoned logging roads in lowland Costa Rica. Biotropica, 29: 15-28. Guariguata, M.R.; Ostertag, R. 2001. Neotropical secondary succession: changes in structural and functional characteristics. Forest Ecol. Manag. 148:185-206. IBAMA. 2010. Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis. Ministério do Meio Ambiente – MMA. www.ibama.gov.br Kappelle, M., Geuze, T., Leal, M.; Clef, M., 1996. Successional age and forest structure in a Costa Rica upper montane Quercus forest. J. Trop. Ecol., 12: 681- 698. Oliveira, L.A. 2009. Princípios básicos para a recuperação/restauração de áreas degradadas na Amazônia brasileira. Conservação do solo. Folder. CTPetro Amazônia. Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia. Manaus-AM. Rollet, B. 1969. La regeneration naturelle em foret dense humide sempervirente de plaine de la Guyane Venezuelienne. Bois For. Trop., 124:19-38. Saldarriaga, J. G.; Uhl, C., 1991, Recovery of forest vegetation following slash-and-burn agriculture in the upper rio Negro, pp. 303-312. In: A. Gomez-Pompa, T. C. Whitmore & M. Hadley (eds.), Tropical rain forest: regeneration and management, Blackwell, New York. Uhl, C., Clark, K., Clark, H.; Murphy, P. 1981. Early plant succession after cutting and burning in the upper Rio Negro region of the Amazon basin. J. Ecol. 69: 631-649. UNESCO/PNUMA/FAO, 1980. Ecosistemas de los bosques tropicales. UNESCO/CIFA, Paris. Whitmore, T.C. 1990. An Introduction to Tropical Rain Forests. Oxford, Clarendon Press, 225 p. Whitmore, T. C., 1991. Tropical rain forest dynamics and its implications for management, pp. 67-89. In: A. Gómez-Pompa, T. C. Whitmore & M. Hadley (eds.), Tropical rain forest: regeneration and management, Blackwell, New York. Young, K.R., Ewel, J.J. & Brown, B.J. 1987. Seed dynamincs during forest succession in Costa Rica. Vegetation 71:157-163. Figura 1. Buriti plantado em área elevada, com o solo seco, um ambiente ao qual ele não está adaptado. Figura 2. Pastagem degradada, com exposição quase total do solo ao sol e chuva.