Universidade Estadual de Montes Claros – UNIMONTES Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Social–PPGDS Casamento e Poder: Quantas Hipóteses Vaena Caroline Martins Ribeiro1 Maria da Luz Alves Ferreira2 Resumo O presente artigo vislumbra analisar as relações de casamento heterossexuais a partir do livro Contrato Sexual da autora Carole Petman, com ênfase no antagonismo existente entre domínio e subordinação que se perpetua entre os vínculos conjugais. Diante do exposto, buscar-se-á relacionar a ideia supracitada à dinâmica de nupcialidade no século XXI frente às transformações ocorridas na sociedade moderna. Para tanto, a discussão será baseada em pesquisa bibliográfica, bem como, outras análises que imbuídas da temática: casamento e relações de gênero corroboram ou refutam ideias consolidadas como hegemônicas pelo bojo cultural e histórico. Palavra Chave: Gênero, Casamento, Relações Conjugais Abstract This article sees analyze the relationships of heterosexual marriage from the book Sexual Contract of Carole Petman author, emphasizing the antagonism between domain and subordination that is perpetuated between marital bonds. Given the above, will seek to relate the above-idea of the dynamics of nupicialidade in the twenty-first century from the changes taking place in modern society. Therefore the discussion will be based m bibliographic analysis and other analyzes that imbued the thematic marriage and gender relations, corroborate or refute ideas as consolidated by the hegemonic cultural and historical bulge. Keyword: Gender, Marriage, Marital Relationships 1 Mestranda no Programa de Pós Graduação em Desenvolvimento Social – PPGDS pela Universidade Estadual de Montes Claros – UNIMONTES - Minas Gerais – Brasil. 2 Coordenadora associada e professora doutora no Programa de Pós Graduação em Desenvolvimento Social - PPGDS pela Universidade Estadual de Montes Claros – UNIMONTES – Minas Gerais – Brasil. 1 - INTRODUÇÃO Ao longo da história se percebe uma grande confusão no que se refere a real identidade das relações conjugais, bem como, seus objetivos e finalidades. A autora Carole Petman em seu livro O Contrato Sexual, busca elucidar, ou em suas próprias palavras, recontar a história do contrato original, para que a partir daí possa iniciar o descortinamento sobre a história do contrato sexual. Ainda de acordo com a autora, este foi negligenciado pelos autores clássicos do contrato, o que se percebe é um grande silêncio por parte dos pensadores quanto ao tema é a esfera privada, principalmente no que se refere ao papel da mulher, ou melhor, da esposa em meio às relações contratuais. Diante disso, “O contrato social é uma história de liberdade; o contrato sexual é uma história de sujeição. O contrato original cria ambos, a liberdade e a dominação. A liberdade do homem e a sujeição da mulher derivam do contrato original e o sentido de liberdade civil não pode ser compreendido sem a metade perdida da história, que revela como o direito Patriarcal dos homens sobre as mulheres é criado pelo contrato.” (Petman, 1993, p.16). O patriarcado é entendido como a relação do pai com os filhos e o contrato original vem romper a dinâmica de hereditariedade, tornando os homens civilmente livres e autônomos quanto ao desejo de estabelecer certos contratos, amparado e legislado pelo Estado, da melhor maneira que o convier. Então, a partir disso, retira-se o poder patriarcal e começam a serem desempenhadas relações inerentes a uma sociedade moderna. Porém essa universalização não foi estendida às mulheres ou às esposas. O papel de submissão permanece atrelado ao sexo feminino, ao ponto de serem oferecidas, a partir de registros do ano de 1500, como mercadoria em função das necessidades e normas estabelecidas pelo contrato. Petman apud Meneffe destacam, “(...) a venda de mulheres aliviava as tensões da vida social, solucionado os problemas inter-relacionados ao casamento, do divórcio e do sustento. Baseado nos conhecidos mecanismos de mercado, com vários paralelos simbólicos, a venda de mulheres casadas representou uma solução conservadora e tradicional para os dilemas enfrentados pelos indivíduos, aliviando a tensão no tecido social com um mínimo de violência para o status quo comunitário” (Meneffe, 1993, p. 183). A ruptura com as relações pré-modernas patriarcais deram lugar a uma suposta modernidade a partir do contrato. No entanto, o que de fato ocorreu foi a perda do poder do pai sobre os filhos (homens), não do homem sobre a esposa. Petman (1993) é taxativa ao afirmar que Patriarcado se refere a um poder político e é entendido como único conceito que está ligado, especificamente, a sujeição da mulher. E que todos os homens exercem pelo simples fato de serem homens. Pimentel (2005) vem corroborar com essa perspectiva ao afirmar que as proibições positivadas pelo contrato se instalam pelo código sexual, em que a mulher se torna refém, pois toda a intolerância e rigidez se voltam contra ela, deixando o homem muito mais livre para transgredir. Cabe aqui ressaltar que, o objetivo desse trabalho se refere à compreensão do contrato de matrimônio ou como Petman (1993) chama contrato sexual, porém se torna inviável se não analisarmos, ainda que minimamente, as hipóteses que norteiam o nascimento do contrato original e as relações patriarcais inseridas no contexto em questão. Sendo assim, pensar o contrato original é analisar uma das maiores instituições das relações sociais, tanto no que se refere a relação capitalista e trabalhador quanto de homens e mulheres. Porém se percebe uma total invisibilidade das mulheres e do contrato sexual, além do enaltecimento do contrato de matrimônio como um tipo de contrato social, bem como todas as suas características de poder do homem sobre a mulher, que é visto como algo natural, ou seja, “o ideal de ser mulher”. “As análises atentavam ao fato de que os teóricos clássicos construíram uma versão Patriarcal da masculinidade e da feminilidade, do que é ser macho e fêmea. Somente os seres masculinos possuem toda a capacidade e atributos necessários para participar do contrato, dentre os quais o mais importante é a posse da propriedade em suas pessoas, quer dizer, somente os homens são indivíduos” (Petman, 1993 p.21). Partindo dessa perspectiva, podemos analisar o contrato de matrimônio a partir de regras e normas estabelecidas entre duas pessoas que, em tese, compartilham os mesmos deveres e direitos. Porém, como foi dito anteriormente o contrato parte do pressuposto de liberdade masculina, haja vista a total invisibilidade da mulher e/ou esposa que Petman chega a comparar a uma escrava. Sendo assim, de que forma um ser (mulher) tão inferiorizado por uma sociedade tipicamente masculina, branca e burguesa se percebe no contrato de matrimônio? Uma vez que, a esfera privada, que inserem as relações de casamento foi totalmente negligenciada pelos autores clássicos do contrato, o que de fato a mulher significa nesse tipo de relação contratual? As respostas a estes questionamentos, infelizmente, não possuí respostas matematicamente estáticas, mas podemos presumir que está diretamente ligado à naturalização das relações inerentes à esfera privada, ou seja, um espaço visto como pouco relevante pelos teóricos, e se caracteriza como alicerce natural da vida pública desde sempre. “A origem da esfera privada continua sendo, desse modo, um mistério. O mistério aprofunda-se porque as discussões sobre a teoria do contrato social quase sempre passa direitamente do século XVIII para o presente, e para as reformulações da história do contrato (social) contemporâneo feitas por Jonh Rawe” (Petman, 1993,p.29) 2. O CONTRATO SEXUAL E O PODER DO MACHO Apesar de alguns autores afirmarem que houve uma época em que a mulher e o poder matriarcal dominavam a sociedade, enquanto os homens se submetiam a essa ordem social, o que nos remete imediatamente aos contos mitológicos das Amazonas. Mas fato é que, o que se tem de mais concreto é justamente o contrário. Onde o poder do homem pode ser comparado ao macho alfa de uma matilha de lobos, ou seja, o que um homem diz é lei independente onde esteja, seja na ocupação de um monarca, um sacerdote, um presidente ou um marido. Sendo assim, a ideia de que todos nascem livres e que hoje parece premissa do senso comum, já foi visto como subversivo e ofensivo à ordem social. O casamento nada mais era que um contrato formulado de maneira parcial, em que os homens representavam as mulheres. Ou seja, duas criaturas se encontram, mantém relações sexuais, a mulher dá a luz e o homem busca meios para a subsistência deste núcleo de semelhantes, a partir de então nasce um micro reinado onde o mais forte domina os mais fracos e estes são totalmente submissos ao líder, sendo esta uma forma bem minimalista do casamento. Os teóricos do contrato insistiam que somente o homem tem aptidão de indivíduo livre, enquanto as mulheres nascem dentro da sujeição. Diante disso, o contrato de casamento, na verdade, é um contrato sexual. E uma das partes, neste caso o homem, possui acesso irrestrito ao corpo da mulher. De acordo com Petman (1993) - ao contrário do que muitas feministas apontam que este tipo de contrato se assemelha a um contrato de servidão relacionado à dinâmica entre trabalhador e empregador – o contrato sexual é um modelo de escravidão, que aparentemente expõe uma relação de troca, onde o macho oferta proteção enquanto a mulher “oferece” livre acesso dele sobre seu corpo, quando e da melhor maneira que o convier. E ao aceitar essa proteção a mulher abdica de qualquer direito ou autonomia de si mesma. “Tornar-se um marido é obter o direito patriarcal em relação a sua esposa. Seu direito diminuiu bastante atualmente em relação ao amplo poder que eles desfrutavam em 1825, mas mesmo se um homem não tirar proveito da Lei do sexo masculino, sua posição de marido reflete a institucionalização dessa Lei dentro do casamento. O Poder ainda está lá, mesmo se, num caso especifico, ele não for utilizado.” (Petman, 1993, p.237). Então ao levarmos em consideração que o poder exercido pelos homens sobre as mulheres é algo internalizado por ambos, talvez isto possa justificar o silêncio nos debates sobre o rompimento de certos paradigmas que perpassam pela fonte de dominação do macho. Ou seja, essa relação torna os mais humilhados no mundo público, verdadeiros soberanos no âmbito privado. 2. 1 - HOMEM E MULHER X SENHOR E SERVA Então se o contrato é uma história de liberdade, que parcela cabe ao sexo feminino? Mesmo o casamento sendo chamado de contrato pela maioria dos teóricos clássicos, de acordo com as feministas esta afirmação não passa de uma falácia. A relação entre homens e mulheres no âmbito privado é algo totalmente arbitrário e parcial, em que a mulher ao se tornar esposa, passa a ser propriedade e perde qualquer poder sobre si mesma. Seria ingenuidade pensar que algo construído por uma parcela da sociedade que possui um senso de soberania e superioridade, iria de alguma forma conceder tanta liberdade ao ponto de que isso causasse implicações ao seu status de dominador. Petman (1993) aponta que todas as anomalias em torno do papel da mulher na sociedade e no contrato trazidas à luz da história do contrato sexual permanecem obscurecidas. De acordo com a autora, “Até o final do século XIX a condição civil e legal de uma esposa se assemelha a de um escravo. Pela doutrina legal comum do casamento, uma esposa, assim como um escravo estava civilmente morta” (1993,p. 180). Tal afirmação nos soa como algo inconcebível nos dias atuais, porém, apesar do movimento feminista ter alcançado inúmeras vantagens para as mulheres e o modo de produção capitalista ter possibilitado os descortinamento das mulheres frente ao mercado de trabalho, que por sua vez, viabilizou ao sexo feminino certa autonomia no espaço doméstico em função da complementação da renda familiar, ainda assim a desigualdade entre os sexos é um fato marcante até os dias de hoje. Uma vez que, o marido ainda detém o poder sexual sobre suas esposas, através força física para fazer valer suas vontades. A frase “Você é minha mulher” possuí um poder inimaginável. Em uma pesquisa realizada por Glaucia R. S. Diniz, pela Universidade de Brasília – UNB, intitulada Gênero Casamento e Família, com mulheres de meia idade, migrantes, pobres e com varias jornadas de trabalho. E tinha o objetivo de dar voz a mulheres de modo a compreender as relações de poder inerentes aos vínculos conjugais. Uma das entrevistadas apresenta claramente a hipótese apontada acima, “Eu fui pro quarto dormir, naturalmente né, porque apesar de tudo eu era obrigada a dormir junto; ele sempre dizia ‘Você é minha mulher e é obrigada a fazer o que eu quero, e o importante é o homem sentir prazer, porque a mulher é submissa ao marido’ (...).Tinha vezes que ele praticamente me estuprava; ele chegava assim e tinha que se aquilo e ponto. (Diniz, 2005, p.4) Na atualidade, o casamento tem fundamentações afetivas, mas diante dos pontos já apresentados anteriormente, a relação conjugal implica, inevitavelmente, em uma relação de poder. A partir do avanço da legislação que defende os interesses das mulheres e de certa forma protege as esposas, o que desencadeou a possibilidade de debates intrafamiliares com o intuito de lidar com as necessidades individuais de ambos os sexos, com objetivo do bem da família dos filhos e da relação. De acordo com Rebolsas (2010), ao se basear no pensamento de Foucault, o casamento e a família se caracterizam como espaços privilegiados de interação e de construção de relacionamentos, nos quais o poder perpassa os discursos e as ações, cotidianamente, como acontecimentos políticoestratégicos das interações dos casais. Ainda de acordo com o autor, “Maridos e mulheres exercem seu poder de formas diversas e distintas, marcadamente influenciadas pela cultura, pelo gênero e por papéis ainda impostos pelo sistema patriarcal, embora mesclados com novas concepções de igualdade, geradas pelas recentes mudanças ocorridas nas relações entre os gêneros.” (Rebolsas, 2010, p. 16) O que se percebe então, é que com advento das modificações sociais do século XXI, as relações conjugais também passaram por transformações importantes que elevam a mulher a um estrato superior se comparado aquele descrito por Carole Petman nos anos de 1800. E o sexo passa a ser, em alguns casos, moeda de troca importante no processo de conquista de algum tipo de beneficio na relação conjugal. Então essa nova dinâmica entre os sexos na relação de nupcialidade, finalmente se assemelha a um contrato social, parecido com o realizado entre homens, baseado em um jogo de interesses, concessões e barganhas? Ou na verdade, reforça ainda mais o conceito de que o casamento é mesmo um contrato sexual e as mulheres viram nisso a possibilidade de um certo tipo de controle sobre os homens? De acordo com Pimentel (2005) a função do sexo, a partir do momento que se tornou consequência do casamento e este passou a ser um sacramento protegido pela igreja, seu único objetivo é a perpetuação da espécie. Então a autora destaca, “Este seria o primeiro sentido imposto ao casamento: estabelecer uma relação com Deus, ou seja, com o sagrado, desculpabilizando uma prática que de outra forma seria investida pelo pecado.” (2005,p.25). Estas hipóteses e indagações foram apresentadas aqui com intuito de tentar compreender o desenvolvimento do contrato de matrimonio, diante das alterações ocorridas na sociedade e que implicam no modo como homens e mulheres se relacionam. E principalmente no processo de dominação e subordinação que historicamente marcam as relações conjugais. Diante disso, podemos compreender que o contrato de casamento está diretamente ligado ao contexto cultural da história que se insere. Ou seja, de acordo com os paradigmas utilizados pela sociedade e a realidade social vigente, as relações sociais implícitas a nupcialidade sofrerão modificações, mesmo a esfera privada e a dinâmica ali existente serem caracterizadas pelos autores clássicos do contrato como pouco relevante, bem como, inserida em um processo natural entre os seres humanos. 2.2 - CASAMENTO NO SÉCULO XXI A importância do movimento feminista é incontestável no que se refere às transformações no universo feminino, bem como, a abertura de profundos debates quanto à função social das mulheres na cultura patriarcal. No entanto, ainda é perceptível o aprisionamento de homens e mulheres em estereótipos pautados na questão do natural. Mesmo a partir das transformações sociais, ainda hoje as mulheres foram e são ensinadas a sacrificar e a negligenciar suas próprias necessidades para atender os desejos do macho e da prole pautados pela tradição, que no caso do Brasil vem desde a época da colonização através da influência europeia. Diniz destaca, “O esquecimento de si e a dedicação ao cuidar do outro passam a ser marcas registradas de seu comportamento. O exercício destas funções está de tal forma entretecidos no cotidiano da vida, que as mulheres se tornam invisíveis. Assim aos poucos, sua própria história e sua identidade vão se tornando também invisíveis , diluídas na vida de outros membros da família.” (Diniz, 2005, p. 02) A autora Miriam Adelman, através de pesquisa intitulada, No caminho da igualdade? Relações de gênero e poder no casamento, apresenta questionamentos extremamente relevantes quanto a partilha de direitos nas relações conjugais, uma vez que, o acesso das mulheres ao emprego passa a ser um critério de nivelamento entre os sexos no âmbito doméstico. O modo de produção capitalista consegue modificar as relações da sociedade como um todo, e até mesmo do âmbito privado, que como foi dito anteriormente, sempre foi tratado como algo natural não passível de debates. Ou seja, essa ordem social distingue os seres pelo que eles têm não pelo que eles são. Então, o sexo feminino, que outrora foi considerado uma mera propriedade ou como apresentado por Carole Petman (1993), uma escrava doméstica, se transforma em um agente possuidor de voz e vez na sociedade considerada moderna. Ainda de acordo com Adelman (2000), além da questão financeira, outros fatores simbólicos afetam a dinâmica de nupcialidade. A reconstrução de Mentalidade modifica a forma como os cônjuges de percebem e principalmente como se valorizam dentro do casamento. Então pensemos, a partir dessa nova anatomia do casamento e das reações conjugais, o processo tradicional desse tipo de contrato perde força ao passo que a metade negligenciada pelos teóricos clássicos recebeu um novo papel mais condizente com a ordem social vigente. Podemos então presumir que o casamento é uma escolha das duas partes do contrato de matrimonio, ou seja, assim como os demais contratos os envolvidos analisam, constroem e reconstroem as normas para que ambos sejam bem representados e tenham suas necessidades atendidas, caso contrário, simplesmente abrem mão de legalizar tal relação contratual. Sendo assim, se pode afirmar que o contrato de matrimonio, no século XXI, se tornou apenas um apelo da tradição patriarcal? O Instituo Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) registrou uma aumento na taxa de casamentos nos últimos anos, em 2012, foram registrados 1.041.440 casamentos no Brasil, um aumento de 1,4% em relação a 2011. Se partirmos do questionamento supracitado, fica claro compreender que a questão tradicional, que implica na necessidade dos seres se casarem e constituírem família, a partir do modelo: marido, esposa e filhos; é perceptível que está bem mais vivo na sociedade moderna. E mesmo com essa suposta ascensão do poder de escolha da mulher, ainda assim a internalização do poder patriarcal que se refere ao poder do macho sobre a esposa, ainda é algo muito marcante e que apenas recebeu uma nova roupagem, para que atendesse às necessidades da sociedade vigente. Petman apud Mill faz uma afirmação reveladora, “Ele supõe que quando as mulheres tiverem as mesmas oportunidades de educação e consequentemente o “poder de ganhar”, e o casamento for reformado de modo a não mais sancionar legalmente o marido como senhores de escravos, ainda assim uma mulher, em virtude de ter se tornado uma esposa, escolherá permanecer em casa, protegida pelo seu marido” (Petman, 1993, p. 243). Talvez essas hipóteses possam ser respondidas através das implicações religiosas que ainda são muito marcantes na cultura brasileira. Ou seja, a imposição de estar mais próximo de Deus faz com que a união entre homens e mulheres pelo modelo tradicional, influenciem a mentalidade da sociedade através de processo cultural, passado de geração em geração. 3 - CONSIDERAÇÕES FINAIS As relações conjugais perpassam por vários conceitos ligados a tradição, o sagrado e principalmente a relação de dominação e subordinação entre os sexos. E a história nos apresenta hipóteses, que visam desenhar o nascimento do contrato original como fonte de mudanças nas relações sociais, inclusive na esfera privada em que homens e mulheres se relacionam a partir de laços núpciais. O contrato original se desdobra em vários tipos de contratos, e diante disso, chamamos a atenção para as relações contratuais de matrimonio. Pois mesmo sendo uma fonte inesgotável de controvérsias e de bastante relevância para a compreensão do contrato social, foi totalmente omitido pelos teóricos clássicos do contrato e os ativistas políticos do século XVII e XVIII. A partir de fontes bibliográficas, levantamos alguns questionamentos quanto ao silenciamento de tudo que se refere à esfera privada, uma vez que, de acordo com Petman (1993), algumas feministas acreditam que as relações conjugais se assemelham a um contrato de servidão, enquanto que os teóricos – com tendências socialistas ou mais ortodoxos – deixam claro que o âmbito doméstico é palco de relações naturais e que ali o interesse seria apenas na perpetuação da espécie e na dominação absoluta do macho, enquanto que todos os outros atores ali envolvidos (filhos, esposa, escravos) não passam de propriedade do homem. No entanto, as relações capitalistas de produção ultrapassam o fluxo de mercado e trazem implicações também no âmbito doméstico. O descortinamento das mulheres por meio de sua inserção no mundo civil público, através do emprego, fez com que a dinâmica marido e esposa, tivesse que se adaptar às novas necessidades, não só da família, mas também da ordem social vigente. É válido ressaltar que, essas modificações não implicaram em uma maior participação dos maridos nos cuidados dos filhos ou nos afazes domésticos, muito pelo contrário. No mundo chamado globalizado, o que se percebe são mulheres vivendo em múltiplas jornadas de trabalho, tanto no espaço público quanto no privado e não perderam a obrigatoriedade de satisfazerem sexualmente seus maridos. E isto culmina em uma série de desdobramentos que influenciam drasticamente o cotidiano feminino, questões como falta de planejamento quanto à fertilidade, violência doméstica e até mesmo sofrimento mental. Porém, como já foi destacado anteriormente o numero de casamentos legais aumentou, e se a celebração deste tipo de contrato, que implica em gastos às vezes exorbitantes alcançou crescimento, podemos presumir que as relações não legais, como a união estável também seguem pelo mesmo caminho. Se o casamento traz consigo uma série de atribuições à mulher, atividades estas que podem ser danosas, então qual seria o motivo pelo qual elas aceitam assumir esse novo papel de esposa, levando em consideração que na modernidade o “sim” é apenas uma escolha? Infelizmente este estudo, por si só, não é capaz de responder de forma categórica a este e outros questionamentos do universo das relações de casamento. No entanto, análises como estas se tornam pertinentes no intuito de buscar hipóteses para a compreensão do contrato de casamento, bem como sua influência na Mentalidade de mulheres e homens quanto ao mistério que se esconde no mundo privado das relações. REFERÊNCIAS ADELMAN, Miriam. No caminho da igualdade? Relações de gênero e poder no casamento. 18 -45, 1998. Disponível em: <www.ufpr.br>. Recuperado em: 22 dez. 2014. BORIS, Georges Daniel Janja Bloc. As múltiplas facetas do poder nas relações conjugais. 01-19, 2012. Disponível em: <www.scielo.br>. Recuperado em: 10 nov. 2014. PETMAN, Carole. Contrato Sexual. São Paulo: Paz e Terra, 1993. 347 p. Tradução de: Marta Avancini. PIMENTEL, Helen Ulhôa. O Casamento no Brasil Colonial: historiográfico. Em Tempos de História, Brasília, p.20-37, ago. 2005. Um ensaio R.S.DINIZ, Gláucia. Gênero, Casamento e Família: interações entre velhos e novos modelos e papéis. Modos de Ser Feminino, Relações de Gênero no Brasil, Brasília, v. 12, n. 01, p.19-27, mar. 1998.