Ercivan Gomes de Oliveira, Adoréa Rebello Albuquerque

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VI Seminário Latino-Americano de Geografia Física
II Seminário Ibero-Americano de Geografia Física
Universidade de Coimbra, Maio de 2010
ANÁLISE SÓCIO-TEMPORAL DOS IMPACTOS AMBIENTAIS NA BACIA
HIDROGRÁFICA DO ESPÍRITO SANTO (BR) A PARTIR DE 1990.
ERCIVAN GOMES DE OLIVEIRA Geógrafo/Mestrando em Geografia – UFAM
[email protected]
ADORÉA REBELLO ALBUQUERQUE Dra. Geografia Física – UFRJ/UFAM
[email protected]
INTRODUÇÃO
Nas últimas décadas os ambientes naturais das pequenas e médias cidades
brasileiras foram atingidos por diversas mudanças, tais mudanças estão associadas ao
aumento das taxas populacionais em áreas urbanas, que por sua vez, se relaciona aos
fatores de ordem socioeconômica como: a descentralização da produção industrial,
visando à redução de custos com transportes de matéria prima, o beneficiamento de
produtos no local de extração e a abundância de mão de obra barata. Este quadro tem
contribuído para modificar a paisagem muitas vezes de forma negativa.
O resultado destas mudanças é visualizado, a cada ano, mediante aos seguintes
aspectos: aumento do número de deslizamentos nas encostas, processos erosivos
acentuados e catástrofes agravadas por enchentes, principalmente no perímetro
urbano, onde é maior a concentração de pessoas e empreendimentos. Estes
indicadores denotam a necessidade de incluir, durante as fases de elaboração do Plano
Diretor das cidades, análises sobre as condições geomorfológicas locais, estudos de
bacias hidrográficas e manutenção de espaços verdes, para organizar a ocupação e
conservação dessas áreas.
Face ao exposto, esta pesquisa contextualiza os antecedentes de ocupação da Bacia
do Espírito Santo, localizada na cidade de Coari/Amazônia (Brasil), mediante a
existência de impactos, derivados da exploração de petróleo executada pela
PETROBRAS (Petróleo Brasileiro S.A) a partir de 1990. O objetivo é reconhecer os
principais impactos socioambientais refletidos nos canais fluviais urbanos, por meio da
análise interpretativa de três indicadores: a) Política Nacional de Recursos Hídricos
(Legislação ambiental); b) condições de saneamento e c) aspectos da dinâmica
geomorfológica do canal, valendo destacar que estes indicadores foram relacionados
às condições de espaço e temporalidade no período proposto, ou seja, desde 1990 até
2009.
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Tema 3 - Geodinâmicas: entre os processos naturais e socioambientais
A análise integrada dos elementos físicos e as ações sociais nos limites da área da
bacia possibilitaram a visualização dos problemas ambientais, providenciando
parâmetros para a elaboração de Planos Diretores, que no futuro, possam assegurar a
qualidade dos recursos hídricos no Brasil. Essa linha de abordagem procurou incluir a
bacia hidrográfica como unidade espacial (ambiental) integrando atividades humanas
e elementos do meio. A bacia estudada foi classificada como uma célula de análise
ambiental, para permitir a elaboração de um diagnóstico socioambiental e, ao mesmo
tempo, evidenciar a necessidade de gerenciar os multipolos usos da área e da água.
CARACTERIZAÇÃO FÍSICA DO MUNICÍPIO E PROCESSO DE OCUPAÇÃO
DA BACIA HIDROGRÁFICA
Coari1 está localizado na sub-região do Rio Negro/Solimões na Microrregião do
Médio Amazonas - Região Norte do Brasil. A cidade é situada entre o lago do Mamiá e
do lago de Coari na mesorregião do centro amazonense. As coordenadas geográficas
desta localidade são: 4° 06' 22'' Latitude Sul e 63° 03' 21'' W à altitude de 40m acima
do nível do mar.
Uma área territorial de 57.277.90 km² com osseguintes limites: Anori ao Leste,
Tapauá ao Sul, Tefé e Maraã a Oeste e ao Norte Codajás, com uma população segundo
IBGE (2007) de aproximadamente 65.222 habitantes, cuja sua distribuição é de 67% na
área urbana e 33% na zona rural. O clima da região é quente e úmido sem estação
seca, atingindo total pluviométrico 2.500mm anuais, temperatura média anual de 28ºC
a 35 ºC, a vegetação é composta de árvores grande porte e arbustos na terra firme e
vegetação de porte menor na planície de inundação.
A rede de drenagem em Coari é formada por três bacias: Pêra, Espírito Santo e
Bucuará (Figs. 1 e 2). As bacias do Pêra e Bucuará ocupam parcialmente a área de
perímetro urbano, a do Espírito Santo está integralmente inserida na malha urbana. É
característica geográfica de todas as cidades amazônicas, a densa rede hidrográfica,
onde o sítio urbano é entrecortado por diversos canais. As temperaturas médias na
cidade podem variar de 28ºC mínima e máxima 34ºC com abundante pluviosidade
característica da região durante todo ano.
A partir de 1990 o município de Coari vem passando por várias transformações
tanto positivas quanto negativas, que se refletem na paisagem. Em 19862 com a
descoberta de Petróleo e Gás natural na bacia do rio Urucu situada a 280 km da sede,
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Fonte: Município da Amazônia Brasileira (IBGE, 2007).
Fonte: Gawora (2003).
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a cidade sofreu várias transformações e, atualmente concentra mais de 60% da
população em área urbana. Nesse período a instalação de várias empresas incentivou
a vinda de migrantes do interior do estado e, de outras regiões do país em busca de
emprego e melhores condições de vida. Todavia, a oferta de trabalho não atendeu às
demandas de mão de obra, em função dos baixos ou até inexistentes níveis de
qualificação. Quadro que acarretou diversos problemas de ocupação urbana que nos
últimos tem agravado a degradação ambiental nas bacias hidrográficas.
Figuras 1 e 2. Localização do município e delimitação da área de estudo.
Fonte: Oliveira, 2010.
Em 1988 se inicia a exploração de gás e petróleo, mas é somente em 1996, com a
construção do Terminal Solimões (T-SOL), base próxima à sede do município, que
grandes transformações econômicas, sociais e ambientais ocorrem na cidade. Esta
obra instrumentaliza a estrutura de distribuição e transporte de gás por meio de um
gasoduto linear de 400 km que saí da bacia de Urucu, passa pelo terminal do rio
Solimões e chaga até Manaus. O gás transportado atingirá a vazão de
10.500.000m³/dia e será beneficiado na Refinaria Isaac Sabbá ou Refinaria de ManausAM (REMAM).
A construção desse terminal providenciou aumentos dos tributos e royalties. Assim
sendo — um grande número de migrantes oriundos de municípios adjacentes e de
outros estados da federação — vislumbraram na cidade de Coari melhores condições
de vida e emprego. Este quadro providenciou a necessidade de mudanças na infraestrutura urbana como a construção de praças, ginásios, comércios e serviços de
banco até antes inexpressivos.
Tais mudanças ofereceram a expansão da rede de serviços, entretanto impactos
oriundos dessas transformações atingiram a cidade de Coari, durante as duas últimas
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Tema 3 - Geodinâmicas: entre os processos naturais e socioambientais
décadas, revelando pontos de forte degradação ambiental visualizados principalmente
em canais urbanos. Esses pontos representam a poluição dos meios hídricos — por
excesso de resíduos sólidos e deficiente sistema de esgotamento sanitário — a
destruição da vegetação ciliar e as ocupações irregulares em áreas de vales e faixas d
declives acentuados, como as encostas. Face ao exposto, as margens das bacias que
drenam a cidade, são ocupadas por comércios, casas de show e residências.
Para a execução dos procedimentos metodológicos, foram aplicados 100
questionários para a composição de uma amostragem de levantamentos realizados a
cada 5 domicílios registrados, para famílias residentes na bacia do Espírito Santo. Os
dados obtidos foram disponibilizados pela Secretaria Municipal de Assistência Social
do Município. O objetivo deste levantamento em março de 2009, era coletar
informações dos moradores quanto suas condições de renda e moradia, momento em
que o Estado do Amazonas passava pela maior cheia de sua história.
A perda da qualidade do recurso hídrico é indicada principalmente no Gráfico 01,
que aborda o destino do lixo. Dados revelaram que no entorno da bacia, 70% desse
lixo é coletado, entretanto à medida que, as residências adentram na faixa do canal,
30% é lançado diretamente no rio. Fatores como as dificuldades de acesso
impossibilitam a coleta, por outro lado, a ausência de políticas de educação ambiental
e a falta de atribuições e responsabilidade de órgãos públicos e moradores, é uma
realidade (Fig.3).
Gráfico 1. Destino do Lixo.
Figura 3. Lixo depositado lançado na bacia.
Fonte: Oliveira, 2009.
Fonte: Oliveira, 2009.
Ações públicas não foram suficientes para criar mecanismos de fiscalização e
monitoramento constante nessas áreas.
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Outro dado importante é que grande parte dos trabalhadores são dos municípios
adjacentes à Coari ou de outras unidades da federação, tornando inexpressivo o
número de trabalhadores oriundos do próprio município. O Gráfico 2 reúne dados
sobre a naturalidade dos moradores indicando que 78% são do próprio município, 30%
são da zona rural, 19% das cidades próximas ao município e 3% de outros estados.
Estes aspectos remetem às seguintes interpretações: o número que representa maior
quantidade de trabalhadores locais, quando relacionado aos dados de graus de
instrução, indica que esta população está inserida nos valores de 53% (Ver Gráfico 3)
dos pesquisados que possuem somente ensino fundamental incompleto, evidenciando
baixos níveis de qualificação. Como grande parte das frentes de trabalho é temporária,
este contingente que migrou das zonas rurais e de cidades adjacentes não consegue
retornar, restando-lhes a opção de residir em áreas inadequadas, principalmente as
margens dos canais fluviais urbanos.
Gráfico 2. Naturalidade dos moradores.
Fonte: Oliveira, 2009
O resultado do nível de instrução dos moradores se apresentou como muito baixo
mesmo daqueles de outros Estados, dado revelado no Gráfico 3 que representa a
escolaridade dos residentes, onde 53% possui apenas ensino fundamental incompleto
e 28% não é alfabetizado. Os moradores dessas áreas não recebem nenhuma
informação sobre a necessidade de preservar o recurso hídrico, contribuindo para a
degradação ambiental e posteriormente para sua degradação da sua própria qualidade
de vida Figura 4.
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Tema 3 - Geodinâmicas: entre os processos naturais e socioambientais
Gráfico 3. Nível de escolaridade.
Figura 4. Residências a margem esquerda da bacia.
Fonte: Oliveira, 2009.
Fonte: Oliveira, 2009.
Os impactos ambientais surgem com mais intensidade em 1997, com a construção
do Terminal Solimões, mediante a grande oferta de empregos. Junto ao crescimento
econômico e populacional somou-se um crescimento urbano desregulado na área
central e zonas periféricas, acompanhado por remoção de matas ciliares, devastação
de áreas verdes e poluição dos cursos d’água.
Esses impactos ocorreram e continuam a ocorrer principalmente às margens da
Bacia do Espírito Santo. Dentre os fatores que propiciam a ocupação intensa do local
estão incluídos: a inserção da mesma na área central da cidade e a proximidade à rede
de oferecimento dos serviços urbanos. Essas ocupações, ainda que intensificadas em
1997, já aconteciam acerca de 22 anos — período que corresponde à exploração de
petróleo e gás na cidade de Coari — acarretando impactos que atingem 23,9 km de
extensão da bacia.
O processo migratório está associado principalmente à inserção da política
exploratória de gás e petróleo, estabelecida pela Petrobras para a cidade de Coari.
Estas evidências se apresentam nos resultados obtidos no Gráfico 4, que foi utilizado
para análises sobre o tempo de residência na área. Durante as entrevistas 28%
declararam residir na “área limite” da bacia hidrográfica entre 11 a 19 anos —
intervalo de tempo que coincide com a primeira fase de implantação das frentes de
trabalho da Petrobras — outros 28% declararam residir na mesma localidade no
período de 1 a 4 anos — este último intervalo corresponde à fase de consolidação e
construção do gasoduto Coari-Manaus. Estas interpretações permitem identificar duas
fases distintas de ocupação nas margens do Espírito Santo (Fig.5), considerando-se que
os entrevistados compõem um universo totalizado em 56%, ou seja, a grande maioria.
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Gráfico 4. Tempo de residência na área.
Figura 5. Casas no canal de drenagem da bacia.
Fonte: Oliveira, 2009.
Fonte: Oliveira, 2009.
A faixa mais degradada da bacia vai da área central até a sua foz ou outlet, entre os
bairros do Centro, Chagas Aguiar, Duque de Caxias, Itamarati e Espírito Santo, nesta
faixa possível visualizar processos de assoreamento causados principalmente pela
quantidade de lixo no leito e retirada de mata ciliar para a construção de comércios e
moradias.
Quanto às condições de emprego dos moradores, foi possível observar que estas
estão associadas ao grau de escolaridade, ou seja, há um número expressivo de não
alfabetizados e pessoas que possuem apenas o ensino fundamental incompleto (Ver
Gráfico 5). Junto às precárias condições de instrução, associam-se às dificuldades de
garantia de trabalho e obtenção da renda familiar. Verifica-se que as rendas reduzem
substancialmente com término das obras, induzindo os trabalhadores a seguir em
direção ao mercado informal.
Gráfico 5. Condições atuais de emprego. Figura 6. Comércios na margem esquerda da bacia.
Fonte: Oliveira, 2009.
Fonte: Oliveira, 2009.
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Tema 3 - Geodinâmicas: entre os processos naturais e socioambientais
Levantamentos de campo permitiram constatar drásticas mudanças no padrão de
drenagem da bacia induzidas — em decorrência das fases de ocupação das duas
últimas décadas — por uma grande quantidade obras de infraestrutura que se
disseminou por toda a cidade. O resultado dessas ações foram mudanças significativas
na configuração do canal. Algumas causas podem ser indicadas como relevantes para
essas mudanças como, a construção de aterros para construção de bairros e obras de
vias urbanas a montante e a jusante da bacia.
As mudanças na morfodinâmica do canal são visíveis. A retirada da mata ciliar
produz incisões erosivas cada vez mais presentes nas margens dos canais. Essas
intervenções propiciaram impactos ambientais a cada ano mais agravantes. Áreas de
transbordamento da bacia podem ser visualizadas na Figura 7.
Figura 7. Área de transbordamento da bacia.
Fonte: Oliveira, 2009.
Em 2008 iniciou-se a construção do gasoduto Coari-Manaus, obra que até o
momento (2010) está sendo finalizada com a construção do poliduto que deverá
chegar até a cidade de Manaus na refinaria Isaac Sabbá.
Propor alternativas de planejamento ambiental a partir das bacias requer o
conhecimento do problema de modo integrado, junto à legislação ambiental e hídrica.
Este conhecimento visa à fiscalização e o monitoramento, de modo mais atuante
nessas áreas, procurando reduzir a degradação socioambiental. Diante de tal contexto
discutiremos as leis que regulamentam as bacias hidrográficas como células de análise
ambiental, numa perspectiva de mitigar os problemas ambientais nos corpos hídricos.
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LEGISLAÇÃO HÍDRICA EM PERÍMETRO URBANO E SEUS CONFLITOS
LEGAIS
A legislação ambiental instituída pelo código florestal, Lei 4.771 de 15 de setembro
de 1965 regulamenta no Art. 1 inciso II as áreas de preservação permanente (APPs),
sendo áreas protegidas nos termos dos arts. 2o e 3o desta lei, cobertas ou não por
vegetação nativa, com a função ambiental de preservar os recursos hídricos, a
paisagem, a estabilidade geológica, a biodiversidade, o fluxo gênico da fauna e flora,
proteger o solo e assegurar o bem-estar das populações humanas.
Diante deste contexto, as interpretações legais para rios de pequeno porte drenam
a maioria das cidades brasileiras, estariam protegidos contra diversas atuações
antrópicas. O limite legal para apropriação destas áreas se dá a partir da largura do
canal de drenagem, sendo que, para rios com 10m de largura a área mínima a ser
preservada é de 30m das margens esquerda e direita. Contudo o parágrafo único do
Art. 2 prediz que, em caso de áreas urbanas, os critérios serão definidos por lei
municipal, através dos planos diretores e leis de uso e ocupação do solo, respeitados
os limites estabelecidos pela lei.
No entanto, o que se constata nos municípios do Estado do Amazonas é uma
grande concentração da população residente nas áreas centrais das cidades, em
função das diversas atividades econômicas estabelecidas nestas áreas. Com relação a
este assunto o Art. 3 prevê a supressão total ou parcial com autorização do poder
público federal quando for necessária a execução de obras, planos, ou projetos de
utilidade pública e de interesse social nestas paisagens.
A Política Nacional de Recursos Hídricos (PNRH) na Lei 9.433 institui no Art. 1, inciso
V que as bacias hidrográficas são unidades territoriais de gestão e planejamento dos
recursos hídricos. No inciso IV regulamenta que essas ações sejam descentralizadas
com a participação do Poder Público, dos usuários e das comunidades envolvidas. No
art. 3, incisos III e V rege que a gestão dos recursos hídricos deve estar interrelacionada a gestão ambiental e associada aos diversos usos do solo.
Observa-se com base nos parâmetros legais que e gestão dos recursos hídricos é
descentralizada, no âmbito Regional, Estadual e Municipal, ou seja, a degradação
ambiental ocorre principalmente, onde é outorgado o uso das áreas de limites da
bacia. Somente uma fiscalização eficaz fornecerá subsídios concretos para equacionar
os problemas de modo local e integrado aos diversos agentes atuantes na bacia.
Um aspecto que merece destaque na legislação ambiental e hídrica é que para a
aplicação da lei, se estabelecem desconexões, pois os instrumentos de outorga e
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Tema 3 - Geodinâmicas: entre os processos naturais e socioambientais
fiscalização estão desarticulados (União, Estados e Municípios) dos aspectos locais.
Estes aspectos se explicitam quando agentes públicos Estaduais regulamentam as
outorgas em áreas fiscalizadas pelos municípios. Um procedimento muito comum no
planejamento ambiental em bacias urbanas do Estado do Amazonas.
Como as dimensões hidrográficas são muito extensas, é praticamente impossível
para os órgãos de outorga monitorar e fiscalizar o Estado e ainda, percorrer toda a
área de abrangência das bacias. Aos Comitês de Bacias Hidrográficas (CBH) instituídos
no cap. III, art. 38 compete aos CBH no âmbito de sua área de atuação nos incisos:
I- promover o debate das questões relacionadas a recursos hídricos e articular a
atuação das entidades intervenientes;
II- arbitrar em primeira instância administrativa os conflitos, relacionados aos
recursos hídricos.
Na vasta rede hídrica amazônica, existe apenas um comitê de bacias urbanas no
Amazonas, o Comitê do Tarumã-Açu localizado em Manaus. Estes aspectos
demonstram o descaso e a inaplicabilidade da legislação hídrica, que na maioria das
vezes, justifica a complacência dos gestores públicos em amparar legalmente diretrizes
políticas, que se inserem nas inoperâncias dos órgãos de fiscalização e monitoramento
das bacias hidrográficas urbanas do Estado.
Nos municípios do interior do estado não é diferente e, em Coari essa realidade é
muito presente, apesar de ser o município que ganhou a maior pontuação no plano
diretor em 2007, prêmio julgado pelo Mistério das Cidades. A cidade é atingida pelos
mesmos problemas de regulamentação e fiscalização nos canais de drenagem.
Nesse contexto, o Plano Diretor do município propõe no tópico 2.3.3 a gestão do
meio ambiente, visando à compatibilização do desenvolvimento econômico-social com
a preservação do meio ambiente incluindo a proteção dos mananciais hídricos e, a
necessidade de criação de comitês de bacias hidrográficas em consonância aos
mecanismos de regulamentação Estadual. Esses parâmetros se aplicam nas áreas
rurais, todavia em áreas urbanas, onde a degradação é mais visível, não existem
mecanismos de monitoramento e fiscalização destes espaços, aspectos que
inviabilizam o planejamento ambiental, tanto no perímetro urbano de Coari, como na
maioria das cidades brasileiras.
Essas desarticulações da lei têm se refletido nos indicadores de degradação
socioambiental, explícitos principalmente nas bacias hidrográficas urbanas, onde o
poder público e os atores institucionais (Órgão Estadual e, Municipais), não assumem a
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responsabilidade de executar uma política pública, para mitigar problemas de
enchentes, erosão, poluição hídrica e deslizamento de vertentes.
IMPACTOS SOCIOAMBIENTAIS
A desarticulação dos órgãos de gestão e planejamento assim como os de
fiscalização e monitoramento desses espaços, tem acarretado diversos impactos
socioambientais, uma vez que, suas regulamentações não ultrapassem a esfera legal.
Mesmo instituídas pela PNRH e amparadas pelo código florestal nos Arts. 2 e 3 como
áreas de preservação permanente em perímetro urbano, a conservação desses
espaços tão essenciais ao equilíbrio natural e social, ainda não se efetivou.
Este trabalho colocou em discussão as divergências da legislação de proteção das
Bacias e com base neste tem, propõe reformulações na gestão das leis e, suscita que
novos indicadores sejam adotados na gestão e planejamento dos mananciais hídricos
nas cidades brasileiras, considerando-se a desconexão entre os atores institucionais. O
planejamento hídrico, a partir das bacias de forma agregada aos órgãos de gestão,
planejamento, fiscalização e monitoramento pode contribuir para reduzir a
degradação ambiental nas paisagens urbanas.
Se medidas mais eficazes não forem tomadas urgentemente continuaremos a
presenciar em jornais, revistas e noticiários as catástrofes ocorrerem. A realidade do
município de Coari não é diferente, mesmo tendo uma população abaixo de 100 mil
habitantes, a poluição hídrica se faz presente na bacia Espírito Santo, como podemos
observar na Figura 8. Isto pode ser indicado pela ausência de saneamento básico ou
tratamento revelado no Gráf. 6.
Gráfico 6. Esgoto sanitário das águas servidas Figura 8. Situação do esgoto sanitário das casas.
e dos banheiros.
Fonte: Oliveira, 2009.
Fonte: Oliveira, 2009.
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Tema 3 - Geodinâmicas: entre os processos naturais e socioambientais
Os impactos ambientais foram aqui analisados, numa perspectiva não apenas da
degradação ambiental visível, mas daquela construída também a partir das relações de
produção de cada espaço. Os atores locais, ou seja, os residentes dessas áreas
constituem de certa forma, o resultado dos diversos processos de apropriação dessas
unidades ambientais. A ausência de fiscalização e omissão das políticas públicas para
as leis vigentes são fatores que mais propiciam impactos negativos nos canais de
drenagem urbanos e rurais.
Diante destas proposições este trabalho, recomenda que para o planejamento
dessas áreas, deverá ocorrer uma integração dos órgãos de gerenciamento,
planejamento, execução e fiscalização nas três esferas (Federal, Estadual e Municipal),
a maior autonomia para cada Estado da federação, considerando-se que as realidades
de um país continental como o Brasil, são as mais diversas.
CONCLUSÃO
Este trabalho propôs, por meio de análise socioambiental de bacias hidrográficas,
uma visão integrada dos elementos do meio e das condições sociais. Neste sentido,
mais que o planejamento dos recursos hídricos em bacias hidrográficas urbanos está à
perspectiva de que o recurso hídrico é indispensável seja para satisfazer necessidades
biológicas básicas como a dessedentação de grupos humanos e animais, como para os
mais diversos tipos de produção econômica. Neste sentido, o planejamento hídrico
viabilizado legalmente por meio das bacias, como célula de análise ambiental permitirá
decisões equilibradas, para o uso dos recursos naturais e das atividades econômicas e
sociais que se estabelecem nas paisagens.
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