TLME-2.2 —1— MÁQUINAS ELÉCTRICAS II ** 2001 / 2002 ** SE FEUP LEEC TLME-2.2 — 1. Máquina Eléctrica de Indução Introdução A máquina eléctrica de corrente alternada mais simples é um transformador — consiste num circuito magnético que interliga dois conjuntos de circuitos eléctricos. Um dos conjuntos – o enrolamento primário – é excitado por uma tensão alternada, enquanto que no outro enrolamento — o enrolamento secundário – se induz uma força electromotriz alternada. Quando o transformador está em carga, no circuito primário há um consumo de energia enquanto que no circuito secundário há uma produção de energia; isto é, há uma transferência de energia eléctrica do primário para o secundário através do campo electromagnético. Quando o enrolamento secundário não está fixo, como no caso do transformador, mas pode rodar livremente, e quando esse circuito secundário está fechado e, portanto, nele circula uma corrente eléctrica, haverá o aparecimento de um efeito mecânico que manterá o enrolamento em movimento. Este efeito mecânico é utilizado no motor de indução. Neste caso há uma conversão de energia eléctrica em energia mecânica. Verifica-se que o transformador e o motor de indução são máquinas eléctricas do mesmo tipo — máquinas eléctricas de indução. Desde 1895 que, com Charles P. Steinmetz, se considera uma máquina eléctrica construída como um motor de indução com o rotor bobinado como uma máquina de indução generalizada. Mas, numa máquina de indução rotativa não há só transformação de energia eléctrica em energia mecânica, há também uma alteração das características das grandezas alternadas, como a amplitude, a frequência e o ângulo de fase. Considerando que uma máquina de indução trifásica é perfeitamente equilibrada e simétrica, o seu estudo pode ser feito através do estudo de uma fase, atendendo à ligação entre as diferentes fases na definição das condições de estudo. Considera-se, também, que o circuito magnético funciona na parte rectilínea da característica de magnetização, e portanto afastado da saturação magnética. θ Numa fase de uma máquina de indução generalizada trifásica, em que o enrolamento secundário pode rodar, a aplicação de uma tensão no circuito primário U1 é responsável pelo aparecimento de um fluxo magnético indutor que interliga o enrolamento primário ao enrolamento secundário. Como se trata de uma máquina de indução rotativa trifásica, devido ao sistema trifásico de grandezas eléctricas de alimentação e à posição relativa das bobinas das três fases no espaço, o fluxo magnético indutor é girante (isto é: tem uma amplitude ou valor máximo constante, apesar de ter uma variação sinusoidal no tempo e no espaço φ(t, α) = φm·cos(ωt – α). Este fluxo magnético tem uma parte que sendo criada pela acção do enrolamento primário envolve completamente as bobinas do enrolamento secundário — o fluxo de magnetização, e uma outra parte que sendo criada pela acção da passagem da corrente eléctrica apenas envolve o enrolamento que o cria — o fluxo de fugas. 1 2 O fluxo de fugas de um qualquer enrolamento tem a maior parte do seu percurso pelo ar, o que permite considerar que a sua acção resulta da passagem da corrente do enrolamento numa bobina com um coeficiente de auto–indução constante — o coeficiente de auto-indução de fugas do enrolamento, Lσ. © Manuel Vaz Guedes, 1996, 2002 TLME-2.2 —2— Os dois enrolamentos, representados pelas respectivas bobinas de uma fase estão distribuídos ao longo da periferia interior e exterior do entreferro, e têm um comportamento equivalente ao de um enrolamento concentrado com um número efectivo de espiras N1 e N2. O fluxo magnético comum aos dois enrolamentos é responsável pela indução de uma força electromotriz no enrolamento primário, E1 = 4,44·f1·φm·N1 e, como a variação do fluxo magnético no enrolamento do secundário depende da velocidade relativa do fluxo girante e do enrolamento, tem a mesma amplitude, mas devido à posição relativa no espaço dos dois enrolamentos (θ) tem um ângulo de fase diferente, resulta que a amplitude da força electromotriz secundária é, E2 = 4,44·f2·φm·N2 = 4,44·s·f1·φm·N2 em que, s = f2/f1 é o deslizamento. Considerando que, devido ao carácter linear assumido para as propriedades do circuito magnético e ao desprezo de alguns fenómenos físicos, as grandezas eléctricas têm uma variação sinusoidal no tempo, e utilizando a notação simbólica, pode-se escrever as equações que regem o funcionamento da máquina de indução generalizada: U1 = (R1 + jωL1)·I1 – E1 s·E2 = (R2 + j s·ωL2)·I2 + U2 com U2 = (RL + j s·XL)·I2 Verifica-se que: E2 = E1/a I2 = e s ⋅ E2 − U 2 R 2 + js ⋅ X 2 I1 = Io + I’1 I1 = E1 I’1= –I2/a = com com a = N1/N2 E2 (R 2 + R L ) /s + j (X 2 + X L ) Io = E1/Zo E1 + a 2 ⋅ ((R 2 + R L ) /s + j (X 2 + X L )) Atendendo aos diversos valores que o deslizamento s pode tomar consegue-se caracterizar os diversos modos de funcionamento da máquina de indução generalizada: transformador (em vazio, em carga), variador de fase, motor de indução (em vazio, em carga), gerador de indução. Zo N. B. — 2. Este trabalho necessita de uma preparação prévia à sua execução no laboratório. Objectivos O objectivo deste trabalho de Laboratório é a caracterização dos diversos modos de funcionamento da máquina eléctrica de indução generalizada, relacionando-os com os diversos tipos de máquinas eléctricas industriais e atendendo à sua aplicação. 3. Bibliografia Carlos C. Carvalho; “Transformadores”, pp. 70–71, AEFEUP, 1983 Carlos C. Carvalho; “Máquinas Eléctricas II”,, FEUP, 1983 (B_FEUP) Manuel Vaz Guedes;“O Motor de Indução Trifásico – modelização”, M. Kostenko L Piotrosvky; “Máquinas Eléctricas”, Vol. II FEUP, 1994 4. Trabalho a Efectuar 4.1. Material Necessário – Motor de Indução Trifásico (rotor bobinado) – Wattímetro © Manuel Vaz Guedes, 1996, 2002 – Voltímetro CA – Banca de Ensaio – Amperímetro CA – Osciloscópio TLME-2.2 A — Transformador —3— (s = 1) Nestas circunstâncias não existe movimento relativo entre o enrolamento do primário e o enrolamento do secundário. As forças electromotrizes induzidas no enrolamento primário E1 e o no enrolamento secundário E2 têm a mesma frequência — a frequência da rede de alimentação. As equações do transformador são: U1 = (R1 + jωL1)·I1 – E1 E2 = (R2 + jωL2)·I2 + U2 com U2 = (RL + j XL)·I2 Verifica-se que a razão de transformação a coincide com a razão das tensões em vazio U1/U2o, porque I1 = Io: E2 = E1/a A .1. e I’1= –I2/a com a = N1/N2 Montagem a Realizar Alimentar o motor de indução com rotor bobinado pelo estator através do auto-transformador. Utilizar o freio de Prony para travar o rotor do motor. A M V 3 V ~ Medir as grandezas eléctricas necessárias para determinar: razão de transformação, frequência da força electromotriz secundária, esfasamento entre força electromotriz primária e força electromotriz secundária. 0 Travar o rotor do motor de indução Com a aparelhagem de medida disponível – Realizar a montagem de medida ☎ ➚ Chamar o docente para verificação ➠ Ler os valores das grandezas Elevar LENTAMENTE a tensão do auto-transformador até à tensão nominal ✍ Tomar nota dos valores e de todos os pormenores importantes ✎ Desenhar as formas de onda relevantes ➷ Diminuir a tensão no auto-transformador ▲ Desligar a alimentação do circuito P&R ?1 Qual a grandeza física cujo valor condiciona a segurança desta experiência (ou a sobrevivência da máquina eléctrica) ? Qual o valor limite para essa grandeza ? ?2 Porque tem a impedância de magnetização da máquina de indução generalizada Zo (como transformador) um valor superior a um correspondente transformador estático ? Justifique. B — Variador de fase (s = 1; ∆θ) Continuando a máquina de indução travado, desloca-se a barra do freio de Prony, alterando a posição relativa do eixo da bobina primária e do eixo da bobina secundária. Pretende-se detectar a variação do ângulo de fase da força electromotriz secundária com o movimento do rotor. © Manuel Vaz Guedes, 1996, 2002 TLME-2.2 0 —4— Com o rotor do motor de indução travado Com a aparelhagem de medida disponível – Realizar a montagem da aparelhagem ☎ ➚ Chamar o docente para verificação ↕ Elevar LENTAMENTE a tensão do auto-transformador até à tensão nominal Alterar a posição do rotor ∆θ através do braço do freio de Prony ✍ Tomar nota de todos os pormenores importantes ✎ Desenhar as formas de onda relevantes ➷ Diminuir a tensão no auto-transformador ▲ Desligar a alimentação do circuito P&R ?3 Como varia a amplitude da força electromotriz secundária com a posição do rotor? Justificar, através de considerações físicas, a forma da curva dessa variação E(θ). ?4 Num esquema equivalente simplificado por fase para a máquina eléctrica de indução generalizada (como variador de fase), quais os parâmetros cujo valor varia com o ângulo de posição ? Justifique C — Motor de Indução (0 < s < 1) Nestas circunstâncias existe movimento relativo entre o enrolamento do primário e o enrolamento do secundário. As forças electromotrizes induzidas no enrolamento primário E1 e o no enrolamento secundário E2 não têm a mesma frequência . As equações do motor de indução são: U1 = (R1 + jωL1)·I1 – E1 s·E2 = (R2 + j s·ωL2)·I2 + U2 com U2 = (RL + j s·XL)·I2 Verificar a razão de transformação através da razão das correntes eléctricas. Verificar a diferença de frequências das grandezas rotóricas e estatóricas. O motor de indução funcionará em vazio. C .1. Montagem a Realizar Alimentar o motor de indução com rotor bobinado pelo estator através do auto-transformador. A M V 3 ~ Medir as grandezas eléctricas necessárias para determinar: razão de transformação, a frequência das grandezas secundárias. ~ Desfazer a anterior montagem retirando o freio © Realizar a nova montagem, curto-circuitando os terminais do circuito rotórico U2 =0 W Chamar o docente Com a aparelhagem de medida disponível – Realizar a montagem. ☎ ➚ Chamar o docente para verificação Elevar LENTAMENTE a tensão do auto-transformador até à tensão nominal ✍ Tomar nota dos valores e de todos os pormenores importantes © Manuel Vaz Guedes, 1996, 2002 TLME-2.2 ✎ —5— Desenhar as formas de onda relevantes ➷ Diminuir a tensão no auto-transformador ▲ Desligar a alimentação do circuito P&R ?5 Quais as grandezas físicas cujo valor condiciona a segurança desta experiência (ou a sobrevivência da máquina eléctrica) ? Qual o valor limite para essas grandezas ? ?6 Quais as considerações, omissas neste texto, que se podem fazer sobre as perdas de energia da máquina de indução generalizada (funcionando como motor) ? ?7 Não poderia provocar a carga mecânica do motor de indução ? Como ? (faça um esquema de ligação). Se quiser repita esta alínea do trabalho para três situações de carga do motor de indução. D — Gerador de Indução (s ≤ 0; s > 1) Para a máquina de indução funcionar como gerador necessita que lhe seja fornecida energia mecânica. A máquina tem de ser accionada por uma máquina primária para que a velocidade seja igual (s = 0) ou superior à velocidade de sincronismo (s < 0, hipersincronismo), ou para que tenda a rodar no sentido contrário ao do movimento de rotação do motor (frenagem) (s > 1). Nesta caso, o motor de corrente contínua acoplado á máquina de indução accionará a máquina de indução. Quando a máquina é accionada com uma velocidade superior à velocidade de sincronismo funciona como um gerador com o circuito secundário como induzido, podendo a energia de deslizamento ser devolvida à rede através de um conversor. Quando a máquina é accionada com uma velocidade de sentido contrário ao movimento do motor (freio) funciona como um gerador com o circuito primário como induzido. Verificar os diversos modos de funcionamento do motor de indução como gerador. Accionar o motor de indução pelo motor de corrente contínua. D .1. Montagem a Realizar Alimentar o motor de indução com rotor bobinado pelo estator através do auto-transformador. A M V 3 ~ Medir as grandezas eléctricas necessárias para caracterizar este modo de funcionamento. ~ Desfazer a anterior montagem retirando o freio © Realizar a nova montagem, curto-circuitando os terminais do circuito rotórico W Chamar o docente – Provocar o arranque do motor de corrente contínua Com a aparelhagem de medida disponível – Realizar a montagem. ☎ ➚ Chamar o docente para verificação Elevar LENTAMENTE a tensão do auto-transformador até à tensão nominal Para diversos valores da velocidade (3) do motor de corrente contínua ➠ Ler os valores das grandezas ✍ ➷ Tomar nota dos valores e de todos os pormenores importantes Diminuir a tensão no auto-transformador © Manuel Vaz Guedes, 1996, 2002 TLME-2.2 ▲ —6— Desligar a alimentação do circuito P&R ?8 Qual a grandeza física, ou grandezas, cujo valor caracteriza as diversas situações de funcionamento da máquina de indução generalizada (funcionando como gerador) ? ?9 Quais as aplicações conhecidas do gerador de indução ? Quais as vantagens na sua aplicação ? 5. Temas de Desenvolvimento A Justificar, completamente, a variação do ângulo de fase com a alteração da posição da bobina solidária com o rotor travado do motor de indução trifásico. B Desenvolver o tema: “Utilização do regulador de indução para regular a tensão de uma central com muitos circuitos de saída”. C Apresentar, justificando, um quadro completo com as diferentes modos de funcionamento da máquina eléctrica de indução generalizada, quanto ao deslizamento, à potência mecânica e à potência eléctrica do primário e do secundário. — TLME-2. 2 — Resenha Histórica A apresentação da comunicação intitulada “Theory of the General Alternating Current Transformer” em 1895 sobre a máquina eléctrica de indução generalizada por Charles P. Steinmetz {(1865–1923) engenheiro e inventor no Laboratório da General Electric Company, Schenectady desde 1894} permitiu a ocorrência de um diálogo interessante com Michael I. Pupin {(1858–1935) físico e inventor professor de electromecânica em Columbia College, New York, e frequente crítico do trabalho de C. Steinemetz} no final dessa apresentação. Eis a transcrição das partes relevantes desse diálogo: Dr. M. I. Pupin: — … Eu vi uma máquina na Exposição de Frankfort, {em 1891} a qual, se eu me recordo correctamente, era construída pela Schückert {empresa alemã construtora de máquinas eléctricas}. Ela dava uma corrente alternada difásica, uma corrente trifásica, ou qualquer coisa que desejasse, e por essa razão era designada por “feita para todo o serviço”. A teoria das máquinas de corrente alternada que o Sr. Steinmetz nos ofereceu pode ser chamada de “feita para todo o serviço” nas máquinas de corrente alternada, porque ela dá informação não só sobre o transformador de corrente alternada, mas também sobre o gerador de corrente alternada e sobre o motor de indução de corrente alternada. Talvez que o Sr. Steinmetz construa qualquer dia uma máquina que possa ser utilizada ao mesmo tempo como um gerador de corrente alternada, como um motor de indução, transformador ou qualquer outra coisa que a ocasião peça. … Mr. Steinmetz: — … Voltando agora à outra proposição feita pelo Dr. Pupin para projectar um motor “feito para todo o serviço” o qual faz tudo, eu tenho uma tal máquina em funcionamento na nossa fábrica, e tenho-a usado intensamente para trabalho experimental ao longo de um ano e meio. Foi originalmente construída como um motor de indução experimental, e depois de completar as experiências com ela, é agora utilizada de acordo com as circunstâncias, quer como transformador, ou variador de frequência, ou como um motor de indução para produzir energia mecânica ou como um gerador para obter correntes a uma frequência que eu não possa obter directamente por outra forma, digamos 250 ciclos por segundo {hertz}, ou para transformar de trifásico para monofásico, ou de monofásico para trifásico, etc. Eu ficarei contente por mostrar a máquina a qualquer um dos senhores presentes, que visite Schenectady {local das fábricas e do departamento de cálculo da empresa General Electric Company em 1895}. Dr. Pupin: — … Agora quanto ao segundo ponto eu gostei de ouvir que há uma máquina do tipo descrito. Eu gostava de ter uma, para que pudesse mostrar aos alunos numa só máquina toda a teoria e prática das correntes alternadas: e eu penso que se essa máquina não é muito cara eu encomendarei uma. Se a General Electric Company realmente tem esta máquina, eu proponho então, em atenção a esse facto, que o título da comunicação seja “Theory of the General Electric Alternating Current Transformer” {gozando com o título original ”Theory of the General Alternating Current Transformer”}. Em Niagara Falls, 25 de Junho de 1895 © Manuel Vaz Guedes, 1996, 2002