REPORTAGEM | REPORT Orcas nos Açores Encontros inéditos São raras nas águas portuguesas, mas de tempos a tempos vão aparecendo nos Açores, dando o ar da sua graça… e da sua espécie Por onde andam… O registo de orcas no Atlântico Norte estende-se desde o Árctico, até ao sul das Caraíbas, aos Açores, Madeira, Canárias e ocasionalmente às águas perto do Mediterrâneo. No entanto, a sua observação é mais frequente nas águas do Árctico e do subÁrctico. Os reduzidos estudos sobre esta espécie, no Atlântico, não permite estimar o número de indivíduos existentes na região norte deste oceano. Graças a um número mais elevado de pesquisas entre a Islândia e as ilhas Faroe, sabe-se que a população, desta pequena região do Atlântico, encontra-se entre os 3,500 e os 12,500 indivíduos. Devido aos escassos registos e estudos efectuados na região do Arquipélago dos Açores, é impossível estimar o número de indivíduos que periodicamente passam pelas águas do arquipélago. Mais frequentemente observada em Portugal, é a espécie Pseudorca crassidens (falsa-orca), possível de encontrar tanto no continente português, como nas ilhas dos Açores e Madeira. Esta espécie é facilmente distinguida da orca pois apresenta um comprimento máximo de 6 metros, um corpo muito esguio, quase na totalidade de cor preta e um comportamento mais sociável. ORCAS IN THE AZORES AN UNHEARD-OF ENCOUNTER Rare in Portuguese waters, orcas do occasionally show up in the Azores, gracing its waters with their presence Texto text Rita Bento | Fotos photos Nuno Sá www.photonunosa.com 36 Orcinus orca Esta espécie é a maior representante da família Delphinidae, apresentando um macho adulto o comprimento máximo de 9 metros - cerca de 25% maiores que as fêmeas adultas. Os machos chegam a pesar cerca de 8 toneladas, o dobro do peso verificado nas fêmeas adultas, 4 toneladas. Outra diferença sexual visível, entre adultos desta espécie, é o tamanho da barbatana dorsal. Os machos apresentam uma barbatana dorsal triangular, muito alta, podendo chegar aos 2 metros de altura, enquanto que as fêmeas, juvenis e adultas, têm uma barbatana dorsal de menor comprimento com um formato tipo foice. A maturidade sexual dos machos é atingida aos 15 ou 16 anos, enquanto que nas fêmeas, a maturidade sexual é atingida mais cedo, nos 8 ou 10 anos. O corpo das orcas é caracterizado pela intensa cor preta, apresentando também uma mancha cinzenta atrás da barbatana dorsal, bem visível quando o indivíduo emerge, à superfície, para respirar. Junto, e atrás, do olho verificase também uma distinta e pequena mancha branca, que sobressai na forma cónica preta da parte frontal do corpo. A zona peitoral do corpo é de cor branca tendo, lateralmente, as grandes barbatanas peitorais arredondadas. As orcas vivem em grupos geralmente muito estáveis e complexos, verificando-se durante um longo período, um forte relacionamento entre as fêmeas e as suas crias - que pode durar mais de um ano. Após uma gestação de 12 meses, a cria nasce com cerca de 220 centímetros e cerca de 180 quilos. O número de indivíduos num grupo é variável, sendo comum O ARQUIPÉLAGO DOS AÇORES É CONHECIDO PELA diversidade de espécies de cetáceos que se podem observar nas suas águas. Desde o tempo da caça à baleia à actual observação de cetáceos, as nove ilhas dos Açores são procuradas, principalmente, pela possibilidade de um encontro com estas fascinantes criaturas. Nas águas do Atlântico, que circundam os Açores, é possível observar 26 espécies de cetáceos, desde golfinhos, a baleias de dentes e baleias de barbas. Embora as espécies observadas, com maior frequência, sejam os cachalotes (Physeter macrocephalus), o golfinho-comum (Delphinus delphis), o roaz-corvineiro (Tursiops truncatus), o golfinho-pintado (Stenella frontalis), a baleia-comum (Balaenoptera physalus), entre outros… o encontro com as Orcas (Orcinus orca) é sempre o que comporta maior excitação pela tripulação das embarcações de “whale-watching”. As orcas são raras nas águas portuguesas sendo, no entanto, há já algum tempo, observadas nas águas dos Açores. Inicialmente, os registos foram efectuados por pescadores que, ao saírem para o alto mar na pesca do atum, observavam, por vezes, pequenos grupos de orcas ou indivíduos solitários. Com o aparecimento do “whale-watching”, e o aumento do número de embarcações a trabalharem neste ramo, o registo de orcas no arquipélago aumentou, passando a ser frequente a observação anual de um pequeno número de indivíduos, em algumas ilhas do arquipélago. 34 THE AZORES ARCHIPELAGO IS KNOWN FOR THE diversity of cetaceans inhabiting it. From the time of whale huntings to the current whale watching, the nine isles of the Azores are sought after for the mere possibility of an encounter with these fascinating creatures. In the waters of the Atlantic surrounding the Azores, one might spot 26 species of cetaceans, from dolphins to toothed and bearded whales. Even though the most often spotted species are the sperm whale (Physeter macrocephalus), the common dolphin (Delphinus delphis), the bottlenose dolphin (Tursiops truncatus), the Atlantic spotted dolphin (Stenella frontalis), the fin whale (Balaenoptera physalus), and many others… Nevertheless, an encounter with the orca (Orcinus orca) always elicits the most excited reactions from all whale watching crews. Killer whales are rare in Portuguese waters, even though they’ve often been spotted in the Azores’ waters. Initially, their appearances were recorded by fishermen, who occasionally saw them at high sea when fishing for tuna. With the advent of whale watching and the increasing number of vessels working in that specific area, there has been an increase in the records of spotted orcas in the archipelago, and nowadays one can at least count on an annual visit by a small number of individuals in a few isles. MAIO/MAY • JUNHO/JUNE • 2008 VEGA Why in the Azores? It is assumed that the geographical location of the Azores constitutes an excellent place for migratory species to pass through. The existence of several underwater banks, where nutrients are abundant, and consequently a high maritime biodiversity, which is in itself a possible reason for the observation of maritime migratory species in the area. Several expeditions carried out by the DOF (Department of Oceanography and Fishing of the University of the Azores) to the S. João de Castro bank, which is located between the São Miguel and Terceira isles, have allowed for an observation of orcas in this particular bank, as well as basking sharks (Cetorhinus maximus), whale-sharks (Rhincodon typus), porpoises (Phocaena phocaena) and blue whales (Balaenoptera musculus). The orca generally boasts an extraordinary behavioural diversity, such as jumping, beating the water’s surface with its caudal and pectoral fin, and “spyhopping” - when an individual positions itself perpendicularly to the water surface line, exposing its whole frontal body. All these behaviours have been recorded by several cetacean observational companies in the Azores’ Archipelago. Non-predatory association with other cetaceans, such as the minke whale (Balaenoptera acutorostrata) and several species of dolphins, is also common. Thanks to the DOP’s fishing observation program, some of these interactions have actually been registered REPORTAGEM REPORT 37 REPORTAGEM REPORT 39 Será a “baleia” assassina? As orcas apresentam uma das dietas mais variadas de todas as espécies de cetáceos. A dieta varia desde lulas e peixes (ex: bacalhau, salmão, bonito, arenque, carapau) a pássaros, tartarugas, pinípedes (focas, morsa e leões marinhos) e outros cetáceos. É devido a esta diversidade na sua dieta que a orca é injustamente conhecida como “baleia-assassina”. Diversos estudos, efectuados no Oceano Pacífico, sugerem que grupos migradores de orcas alimentam-se principalmente de mamíferos marinhos, enquanto que grupos residentes de orcas alimentam-se principalmente de peixes. A nível mundial, a predação de orcas a tartarugas é bem conhecida e referenciada em estudos desde 1969, por Caldwell & Caldwell, até aos dias de hoje, por Pitman & Dutton. Devido à raridade deste predador, nas águas portuguesas, o registo destes acontecimentos não são muito frequentes. No entanto, Paulo Reis, da Blue Water Expeditions (ilha de Santa Maria), registou em Abril de 2006 um grupo de orcas a alimentaremse de tartarugas-bobas (Caretta caretta). Este acontecimento foi também registado por uma equipa do DOP, em Maio de 2001, no canal entre a ilha do Faial e a ilha do Pico. A passagem de orcas pelo Arquipélago dos Açores é um acontecimento esperado, com ansiedade, por toda a comunidade açoriana que “vive do mar”. O registo fotográfico nem sempre é fácil e a aproximação correcta, da embarcação, ao grupo de orcas tem de ser efectuado com bastante perícia. Quando é possível observar o comportamento do grupo, as especificidades de cada indivíduo, e conseguir distingui-los entre si, podemos dizer que houve um pequeno avanço no conhecimento desta espécie, deste gigante do mar que, ao mesmo tempo que aterroriza, apaixona e inspira tantas almas de marinheiro. a observação de algumas dezenas de orcas por grupo. Esta espécie encontra-se em todos os oceanos, existindo dois tipos diferentes de grupos: os grupos migradores, que se deslocam sazonalmente entre áreas, e grupos residentes, que se mantêm, ao longo do ano, sempre na mesma área. REPORTAGEM REPORT MAIO/MAY • JUNHO/JUNE • 2008 VEGA The “killer” whale? Orcas have one of the most varied diets of all cetaceans, varying from squids to fishes (such as cod, salmon, herring and mackerel), to birds, turtles, pinipedes (seals, walruses and sea lions), as well as other cetaceans. It is due to this diversity that the orca is rather unjustly known as the killer whale. Several studies carried out in the Pacific Ocean suggest that migratory groups of orcas mostly feed on sea mammals, while resident groups prefer fish. The orca’s predations on turtles is known worldwide, and has been referenced in several studies since 1969, by Caldwell & Caldwell, to our days, now carried out by Pitman & Dutton. Due to this predator’s rarity, such occurrences aren’t common in Portuguese waters. However, Blue Water Expeditions’ Paulo Reis, from Santa Maria isle, recorded in 2006 a group of orcas feeding on loggerhead sea turtles (Caretta caretta). This event was also recorded by a DOf team in May 2001, on the channel between the Faial and Pico isles. The passage of orcas through the Azores Archipelago is an event eagerly anticipated by the Azorean community which “lives off the sea”. It isn’t always easy to take a picture, and the correct approach of the vessel to the orca group must be carried out with skill. When it is possible to observe the group’s behaviour, the traits of each individual, and to distinguish one from another, only then may one claim that there has been progress in our knowledge about this giant of the seas that terrorizes and captivates many sailor souls in like measure. 40 Orcinus orca This species is the largest representative of the Delphinidae family, with males measuring up to 9m, being about 25% larger than adult females. There are records of males weighing up to 8 tons, twice as much as the adult females. Another visible sexual difference of this species is the size of the dorsal fin. Males boast a tall, triangular dorsal fin, which can reach heights of up to 2m, whereas young and adult females have a scythe-shaped one, which is also shorter. Males reach their sexual maturity at 15 or 16 years of age, while females reach it in a much earlier stage: 8 to 19 years. The body of killer whales is characterized by its intense black colour, with a gray spot behind the dorsal fin, which becomes quite visible when the individual emerges on the surface to breathe. Close to and behind its eye, there is also a small and distinct white spot, which stands out in the cone-shaped front of its body. The pectoral area is white, and the lateral pectoral fins are rounded in shape. Orcas live in generally stable and complex groups, in which there is a strong bond between females and their offspring, which can last over a year. After a 12 months long gestation period, the baby orca is born, measuring about 220 centimetres, and weighing around 180 kilos. The number of individuals in a group is highly variable, and usually number is the dozens. This species can be found in all oceans, and consists of two groups: Migrant groups, who seasonally roam between areas; and resident groups, which remain in the same area throughout the year. MAIO/MAY • JUNHO/JUNE • 2008 VEGA Where they go... Records of orcas in the North Atlantic stretch all the way from the Arctic to the southern Caribbean, to the Azores, Madeira, Canary Islands, and occasionally waters near the Mediterranean. However, they’re most frequently spotted in Arctic and sub-Arctic waters. Studies carried out on these species in the Atlantic don’t allow for a precise guesstimate of their numbers in the northern region of this ocean. Thanks to a greater amount of research carried out in Iceland and the Faroes, it sis currently known that the population on that particular region of the Atlantic numbers between 3.500 and 12.500 individuals. Due to scarce registries taken in the region of the Azores, it is impossible to guess the number of individuals which frequently pass by the archipelago’s waters. More frequent in Portugal is the fake killer whale (Pseudorca crassidens), which is to be found both around the Portuguese continent, Madeira and the Azores. One can easily tell this species apart from the orca, for its slender body doesn’t exceed 6m of length, is almos wholly black, and it has a more sociable behaviour. Porquê nos Açores Pensa-se que a localização geográfica dos Açores constitui um excelente local de passagem para diferentes espécies migratórias. A existência de diversos bancos submarinos, onde se verifica um afloramento de nutrientes e consequentemente um elevado número de biodiversidade marinha, constitui também um dos possíveis motivos para a observação de espécies marinhas migratórias na região. Diversas expedições realizadas pelo DOP (Departamento de Oceanografia e Pescas da Universidade dos Açores) ao banco D. João de Castro, localizado entre as ilhas de São Miguel e Terceira, permitiram a observação de orcas neste banco, bem com a observação de tubarões-frade (Cetorhinus maximus), tubarões-baleia (Rhincodon typus), botos (Phocaena phocaena) e baleiasazuis (Balaenoptera musculus). A orca apresenta, em geral, uma enorme diversidade de comportamentos, tais como saltos, batimentos com a barbatana caudal e peitoral na superfície da água e “spyhopping” – quando o indivíduo se posiciona perpendicularmente à linha de superfície da água, apresentado, fora de água, toda a parte anterior do corpo até aos olhos. Todos estes comportamentos foram já registados por diversas companhias de observação de cetáceos no Arquipélago dos Açores. São também frequentes as associações, não predadoras, com outros cetáceos, como a baleia-anã (Balaenoptera acutorostrata) e diversas espécies de golfinhos. Graças ao projecto POPA (Programa de Observação para as Pescas dos Açores) do DOP, foram também registados, no arquipélago dos Açores, algumas destas interacções. 35 38 MAIO/MAY • JUNHO/JUNE • 2008 VEGA