modernidade e a diferença na geografia.

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Anais Semana de Geografia. Volume 1, Número 1. Ponta Grossa: UEPG, 2014. ISSN 2317-9759
MODERNIDADE E A DIFERENÇA NA GEOGRAFIA.
NABOZNY, Almir
Introdução
Este trabalho é oriundo do projeto de pesquisa “Abordagens emergentes na Geografia
brasileira: uma compreensão”. Por meio da discussão teórico-metodológica efetuamos leituras
compreensivas de projetos de pesquisas em Geografia.
A organização do texto compreende a exposição da constituição de “um objeto” e os
debates qualitativos oriundos dos expedientes de investigação que sustenta os argumentos
tecidos no resumo.
Objetivo:
Problematizar debates entre escolhas metodológicas e leituras de “projetos
geográficos” articulados nas relações de identidade e espaço.
Metodologia:
Na constituição de um corpus de pesquisa, foram selecionados:
a) projetos de pesquisas vinculados aos Programas de Pós-Graduação em Geografia
credenciados pela CAPES, tendo como base o relatório Data-CAPES do ano de 2009.
Projetos os quais possuíssem discursos enunciativos atrelados a “cultura”. Totalizando a
leitura compreensiva de 95 (6%) projetos, de um total de 1591 (100%). Dos programas com
informações totalizamos quarenta e um, sendo que 51% desses ofertavam apenas o curso de
mestrado e 49% ofereciam o curso de mestrado e doutorado;
b) As “teses” principais que são debatidas configuram-se por uso de “linguagens
compreensivas” da produção social do espaço geográfico e ancoradas em metodologias
qualitativas.
Os objetos-fenômenos constituídos, são compreendidos mediante uma teorização, que
articula a dimensão interna da ciência e seus contextos objetiváveis. Na representação
conceitual são observados “os projetos do espaço” e as espacialidades dos projetos. As
discussões enfatizam a diferenciação espacial (política das identidades) e as questões de
poder, essa última sustentada em uma discussão da Modernidade e da Geografia.
Resultados e discussões
Nas escolhas teórico-metodológicas dos trabalhos destacamos tanto a importância das
tramas locais fundando um ordenamento quanto os sentidos apontados nas práticas de
pesquisas preconizadas, constituindo-se por leituras geográficas arraigadas aos lugares dos
quais são enunciadas as pesquisas, na tradução de emoções e sensações em paisagens e
territórios de identidades. Esse entrelaçamento entre problemas de investigação e conceitos é
enveredado por um reencantamento com a natureza, explorando diversas linguagens, tais
como a literatura, cinema, artes plásticas, entre outros, tanto para a construção dos objetos,
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quanto para a expansão das “leituras geográficas de mundo”.
As incursões em geral são qualitativas e delineiam procedimentos de pesquisas em que
os sujeitos-objetos devem produzir colaborativamente as representações científicas dos(as)
geógrafos(as). Comportam os trabalhos em termos de princípios científicos, as incertezas e as
recursividades no âmbito da construção dos saberes. A linguagem majoritariamente expressa
nos textos analisados é a compreensiva, evitando-se nuances projetivas e taxionômicas.
Assim, como “projetos do espaço”, identificamos planejamentos comunitários
atrelados a uma propedêutica do desenvolvimento sustentável, a uma política da alteridade, de
valorização das comunidades, grupos em suas lutas pelo espaço. Aspectos elementares de uma
política das identidades ou da diferença.
Não obstante, para Castro-Gómez (2005), há uma mudança na sociedade global com a
reorganização do capitalismo apoiado na produção da diferença. Então, os discursos do
híbrido, da multiplicidade, das identidades também se apoiam nos motes da globalização da
economia.
A tese central é a transformação da Modernidade como “crise de um dispositivo de
poder que construía o 'outro'” (CASTRO-GÓMEZ, 2005, p.169). Esse ordenamento repressor
foi sustentado pelos seguintes “atores”: a ciência (razão e escrita), colonialidade e/ou primeira
globalização e a fundação do Estado-Nação-Moderno-Colonial, tendo como fundamento o
poder centralizado e o controle do território (CASTRO-GÓMEZ, 2005). Sendo assim, o
“outro” é algo a ser produzido em um formato padrão, cumprindo um papel na sociedade
capitalista.
De forma rápida, postulamos uma formação de concepção de natureza, do homem e
outro na ordenação do mundo. Nesse ínterim, o tempo e o espaço absoluto newtoniano
cumprem um papel estratégico, as coisas no espaço, tempo e as leis como “exclusiva relações
de massa, extensão e tempo […]. as transformações são consideradas apenas manifestações
periódicas de uma natureza imutável e eterna” (ARAUJO, 2003, p.22). Configuram-se duas
categorias de inteligibilidade de mundo e de construção das coisas: são elas o tempo e o
espaço. Desse modo, quais seriam os fundamentos dessas identidades das diferenças? Para
Castro-Gómez (2005), trata-se de uma mudança da Modernidade. Todavia, em consonância
com o papel destacado da ciência na produção dos “sujeitos-padrões”, interroga-se sob quais
seriam as forças atuantes na produção do sujeito-diferente e suas respectivas “utilidades” na
reprodução do modo de produção capitalista.
Nisso, detectamos nos trabalhos um forte apreço para as questões que envolvem
identidades, fundados em concepções de cultura que sinalizam para uma totalidade.
Explicações que entrecruzam utopias com estética e projetam uma integração entre diversos
planos e desejos de um “outro mundo”. Do ponto de vista epistemológico, as pluralidades
(utópicas, temáticas, etc.) apresentaram-se arraigadas nas mudanças de escalas de análises.
Entretanto, não há totalmente respostas em relação àquilo que permitirá ou às justificativas de
poder em que se permite ou produz uma sociedade pautada na política diferença.
Se já sinalizamos os projetos, as discussões teóricas, e uma mudança no mundo, a
nossa saída para finalizar essa compreensão estabeleceu-se pela dimensão política econômica,
um tensionamento pelo viés estrutural, uma extrapolação de cruzamentos de campos
(BOURDIEU, 2004). Nisso, encontramos a corrosiva crítica de Smith (2007) que, em relação
à Geografia Cultural anglofônica, o geógrafo advoga que o fundamento das políticas das
identidades em muito se perde da relação da política econômica, em nome de um pósestruturalismo, de uma crítica à teoria social crítica por meio de uma essencialização cultural
que se efetua como um estrabismo sobre aquilo que os hegemonizam. No mundo identitário
que a sua máxima manifestação é a desproporcionalidade das relações de classe.
Portanto, de fato há uma nefasta estratégia de poder fundamentada na relação
permissiva da identidade, na intensificação da existência, quando não da fabricação do outro,
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artificialização das relações sociais. Esse mecanismo é, sobretudo, verdadeiro naqueles
expedientes em que esses arranjos fabricados fundamentam uma ingênua ou perversa inserção
nas relações globais. Por meio da pseudo-resistência, estabelecem paisagens, espacialidades
para adentrar num circuito de oferta e procura, no caso dos projetos analisados, por meio do
turismo.
Por outro lado, advogamos que a relação de apropriação territorial, os planejamentos
comunitários, as demarcações de terras em comunidades tradicionais também remetem a um
fundamento da sociedade de classes, isto é, a propriedade privada da terra. A terra, nesse
processo, transcende uma essência, em que a identidade atrelada à territorialidade e ao
território demarca uma propensão para o efetivo humano, uma apropriação de poder sobre
suas próprias condições de existência.
Considerações finais
A política do engajamento múltiplo (identidades) conforma um esquema em que a
verdade racional (universal) é rearranjada na possibilidade das múltiplas narrativas territoriais.
Em contraposição ao antagonismo da luta de classes que visam a um caráter de superação,
formula-se a aceitação da aparência/diferente que, por um lado, tem um fim destacado pelo
consumo específico, por outro, tem o papel da tolerância desde que mantidas as distâncias
sustentadas pelos diferentes territórios. Disso, se a construção das “verdades” funda-se ao
acesso específico do mundo (identidades situadas e teoria pós-colonial), ainda é válido buscar
um sentido coletivo/universalidade (colonialidade e modernidade do saber).
Então, a leitura geográfica enfatizada preconiza romper com um possível relativismo
cultural e a um universalismo totalitário. O primeiro, por vezes, atrelado a essências aventadas
em compreensões determinísticas. O segundo fundamentado nas forças da subjetivação
capitalista e da injusta divisão territorial do trabalho, que em alguns casos, por exemplo,
derivam numa crítica niilista das potencialidades de ações do Estado. Por assim dizer, o
entendimento da complexidade espacial das “diferenças” buscou estabelecer leituras
conceituais, quanto fundamentar ações, em geral por meio de políticas em que se possa
articular uma identidade dos indivíduos humanos enquanto “portadores de uma dignidade
essencial” (SOUZA, 2001, p.157). Portanto, mais que um domínio do espaço que assegura
uma identidade como lealdade a tradição, orquestrar o universalismo moderno a “cultura
essencial”, pode configurar um horizonte harmonizo em que a diferença atue no
reconhecimento de si e junto “autonomia racional” remeter-se ao outro.
Referências
ARAUJO, Frederico Guilherme Bandeira. Saber sobre os homens, saber sobre as coisas.
História e tempo, Geografia e espaço, ecologia e natureza. Rio de Janeiro: DP&A, 2003. 368
p.
BOURDIEU, Pierre. Os usos sociais da ciência: Por uma sociologia clínica do campo
científico. São Paulo: UNESP, 2004. 86 p.
CASTRO-GÓMEZ, Santiago. Ciências Sociais, Violência Epistêmica e o Problema da
Invenção do Outro. In: LANDER, Edgardo (org). A colonialidade do saber eurocentrismo e
ciências sociais. Perspectivas latino-americanas. Buenos Aires: Clacso, 2005. p.169-189.
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SMITH, Neil. The Diversion of Culture, the Politics of Cultural Geography. In: NceHu 5/08,
15 p. 2007.
Disponível: <http://www.elistas.net/lista/humboldt/archivo/indice/9521/msg/9778/>. Acesso
em dezembro de 2010.
SOUZA, Marcelo José Lopes de. Território do outro, problemática do mesmo? O princípio da
autonomia e a superação da dicotomia universalismo ético versus relativismo cultural. In:
CORRÊA, Roberto Lobato; ROSENDAHL, Zeny (orgs.). Religião, identidade e território.
Rio de Janeiro: EdUERJ, 2001, p.145-176.
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