moda comprometida com a sustentabilidade ecológica e social

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MODA COMPROMETIDA COM A SUSTENTABILIDADE
ECOLÓGICA E SOCIAL
Maria Izabel Costa
Mestre em Engenharia de Produção-UFSC,
[email protected]
Universidade do Estado de Santa Catarina- UDESC
Maristela de Toledo Soares
Especialista em Moda Criação e Produção-UDESC
[email protected]
Universidade do Estado de Santa Catarina- UDESC
Resumo: Na indústria do vestuário, o principal resíduo sólido, são as aparas de tecido. A
disposição destes resíduos em aterros sanitários ou a céu aberto ocasionam prejuízos à
natureza, a empresa, aos setores públicos e a comunidade. Estabelecendo-se uma relação entre
a moda e exemplos de práticas de negócio com consciência ecológica, este artigo objetiva
apresentar os princípios da ecologia contemporânea no âmbito da área têxtil. Enfoca propostas
que apresentam preocupações ecológicas tanto no processo produtivo, como no
desenvolvimento de novas fibras têxteis ecologicamente corretas, como na diminuição de
resíduos por outros setores industriais e sociais, através do reaproveitamento.
Palavras-chave: Moda; Indústria têxtil; Sustentabilidade.
1. INTRODUÇÃO
Frente a constatações levantadas pela Ecologia referente à capacidade de suporte da
biosfera que é finita, tanto como fonte de todos os materiais que alimentam a economia, como
o lugar de despejo de seus rejeitos, a indústria da moda não pode ficar alheia a essa realidade.
Nesse sentido, está sendo construído um novo modelo de desenvolvimento e novas
práticas de negócio comprometidas com os princípios ecológicos.
E uma nova concepção de empresa, deve levar-se em consideração a problemática dos
resíduos industriais. O material descartado como resíduo do produto principal deve ter atenção
especial,pois pode tornar-se matéria-prima para ser reutilizado em novos produtos com valor
agregado. Cria-se com isso, um ciclo de materiais de forma a minimizar o descarte, gerar mais
fonte de renda e postos de trabalho, ganhando novos mercados com produtos eco-favoráveis.
A preocupação com os resíduos sólidos da indústria do vestuário está levando os
profissionais da moda a tomarem outra postura. Ao criarem suas coleções, procuram priorizar
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matérias primas biodegradáveis e prever novo uso para os tecidos confeccionados com fibras
químicas após utilização e descarte pelo consumidor.
Diante deste contexto, apresenta-se, a seguir, algumas experiências no campo da moda a
partir do levantamento dos princípios da ecologia contemporânea.
2. A CAMINHO DE UMA POSTURA ECOLÓGICA
Sendo a Ecologia uma ciência e não uma religião, encontra-se nas palavras de Capra
(1996:231) o primeiro passo na busca de uma postura ecológica no mundo da Moda:
“Precisamos nos tornar, por assim dizer, ecologicamente alfabetizados. Ser ecologicamente
alfabetizados, ou“eco-alfabetizados”, significa entender os princípios de organização das
comunidades ecológicas (ecossistemas) e usar esses princípios para criar comunidades
humanas sustentáveis – duradouras.”
2.1 Breve histórico: a interação homem-natureza
Conforme Camargo (2002), a interação homem-natureza percorre três momentos distintos
na história da humanidade, tendo as revoluções científicas como marco divisório de cada
momento e a revolução industrial contribuindo para sua efetivação.
Desde os primórdios da história, o homem atravessou muitos milhares de anos sob o
temor das interferências de entidades sobrenaturais, estivesse enquadrado numa cultura
politeísta ou em culturas monoteístas. Ao homem, cabia evitar as tendências de
comportamento destes deuses furiosos (que provocavam tempestades, pestes, etc.) ou
agradecê-los por sua generosidade (boas colheitas, por exemplo). De qualquer modo, o
fundamental era temê-los sempre. Pois, eles eram os donos do destino, os regentes da vida
humana (AQUINO et al.,1999).
Assim, no início, o homem tem uma visão sacralizada da natureza, sendo por ele
considerada onipotente, imprevisível e indomável. Conhecer a natureza não era explicá-la
racionalmente, mas sim aceitar seus desígnios e adorá-la (CAMARGO,2002).
Aos poucos, com os físicos gregos e depois com o judaísmo-cristão, o homem adota uma
postura interrogativa, contemplativa, mas não de culto à natureza.
De acordo com Ribaut (1997), a ciência medieval oscilava entre a razão e a fé. A
finalidade fundamental era compreender o significado das coisas que aconteciam. O que não
se entendia pela razão se colocava no campo do sobrenatural, da fé. E o que acontecia sem
uma explicação conhecida se chamava “milagre”.
Neste primeiro momento da história, a relação homem-natureza segue o modelo orgânico
de mundo, dentro dos princípios metafísicos e divinos (op. cit.).
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Já o segundo momento foi construído no seio da cristandade ocidental, decorrente da
revolução científica no século XVII e concretizada com a revolução industrial
(CAMARGO,2002).
O modelo orgânico medieval foi substituído pelo modelo de máquina – mecanicista. Esta
mudança radical foi realizada pelas novas descobertas em física, astronomia e matemática
(CAPRA, 1996).
Segundo Ribault (1997), esta mudança de concepção orgânica, de Terra-mãe, para a
mecanicista do Mundo-máquina foi completada por dois nomes da ciência : René Descartes e
Isaac Newton.
Descartes é considerado por muitos o fundador da filosofia moderna, por criar um novo
sistema de pensamento que permitiu a elaboração de uma ciência da natureza. Seu método do
pensamento analítico, consiste em quebrar fenômenos complexos em pedaços a fim de
compreender o comportamento do todo à partir das propriedades das suas partes (CAPRA,
1996).
O universo material, incluindo a natureza, é considerado uma máquina que pode ser
completamente entendido analisando-o através de suas menores partes.
Aquino (et al.,1999) considera que a principal característica da mutação mental que
ocorreu foi a afirmação do homem como sujeito e a realidade como seu objeto. E que isso
implicou na valorização do elemento fundamental desse sujeito : aquilo que faz do homem um
homem, um ser inteligente – a Razão. Já a natureza, o universo, eram compreendidos como
coisas mutáveis, a ser dominada, explorada e pesquisada pelo homem.
Como na época estava no auge o processo de mecanização das indústrias (a revolução
industrial), a ciência considerava o universo uma máquina que funciona com as leis mecânicas
, segundo o sistema matemático do mundo (RIBAULT, 1999). O corpo humano, os animais,
as plantas, bem como todo universo, funcionam igual a qualquer máquina fabricada pelos
homens que intitulam-se senhores e possuidores do conhecimento.
Porém, uma nova concepção de natureza vem despontando desde o século XIX com o
movimento Romântico na arte, na literatura e na filosofia com William Blake, Goethe,
Immanuel Kant e outros (CAPRA, 1996).A visão romântica da natureza como “um grande
todo harmonioso”, na expressão de Goethe, levou alguns cientistas daquele período a estender
sua busca de totalidade a todo o planeta, e a ver a Terra como um todo integrado, um ser vivo,
conforme cita Capra (1996).
No século XX, a ciência trouxe a perspectiva holística da natureza, do universo como um
todo, conhecida como pensamento sistêmico, que emergiu simultaneamente em várias áreas
como a biologia, a física e a psicologia. E, posteriormente, surgindo a nova ciência: a
Ecologia.
Conforme Capra (1996), a mudança ocorre na ênfase dada das partes para a ênfase dada
ao todo. A natureza passa a ser vista como uma teia interconexa de relações cujas propriedades
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essenciais nenhuma das partes possui estando isoladas. Pois, a essência está nas relações de
organização destas partes, por haver sistemas aninhados dentro de outros sistemas, onde tudo é
igualmente importante. Ao longo de todo mundo vivo nada funciona de forma isolada, não
sendo possível conhecer a natureza através da análise de uma parte dela.
A emergência do pensamento sistêmico representou uma profunda revolução na história
do pensamento científico ocidental que vem refletindo em vários segmentos da sociedade
(AQUINO et al., 1999).
Enquanto a visão cartesiana baseia-se na certeza do conhecimento científico e na
superioridade do homem, a visão sistêmica reconhece que todos os conceitos e teorias
científicas são limitadas e aproximadas. E que a ciência nunca pode fornecer uma
compreensão completa e definitiva da realidade (RIBAULT, 1997).
Em suma, neste terceiro estágio, a humanidade deveria se relacionar com a natureza da
mesma forma que os outros sistemas vivos-interdependente. Isto é, visando o equilíbrio do
todo. Contudo, na relação sociedade ocidental-natureza, instaurou-se um monólogo onde uma
das partes – a natureza – é concebida e tratada como um objeto , como uma matéria-prima a
ser dominada, apropriada, usufruída como se fosse uma fonte inesgotável.
Ante ao quadro catastrófico do planeta, percebe-se que o homem ainda não aderiu a este
novo estágio: o novo paradigma, como se verá posteriormente. Porém, para desenvolver-se
práticas no âmbito da moda e da indústria têxtil com consciência ecológica precisa-se,
inicialmente, compreender os conceitos e princípios fundamentais da Ecologia. Precisa-se
aprender a linguagem da natureza.
2.2 Conceitos e princípios da ecologia
De acordo com Capra (1996), esta ciência (Ecologia) emergiu da escola organísmica da
Biologia durante o século XIX, quando os biólogos começaram a estudar comunidades de
organismos.
O estudo da Biologia apresenta uma seqüência natural que obedece a sucessivos e
crescentes níveis de organização biológica, assim definidos por Odum (1985) : “ célula,
tecido, órgão, sistema, organismo, população, comunidade, ecossistema e biosfera”.
A Ecologia, como parte da Biologia, tem por objetivo o estudo das populações, das
comunidades, dos ecossistemas e da biosfera.
A palavra Ecologia foi criada pelo biólogo alemão Ernest Haeckel em 1866. Ele reuniu
duas palavras gregas : “oikos” que originou em português o prefixo “eco”, significa casa –
ambiente; “logos”, raiz do sufixo “logia” que se traduz por ciência – estudo (CAPRA, 1996).
Para Odum (1985), Ecologia é uma super ciência que estuda a estrutura e a função da
natureza, do planeta Terra como um todo. É ainda uma ciência que integra os processos físicos
e biológicos e serve de ponte de ligação entre as ciências naturais e as ciências sociais.
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De acordo com Capra (1996), a Ecologia contemporânea estuda as relações que
interligam todos os membros do “Lar Terra”; concebe e percebe o mundo vivo como uma rede
de inter-relações, como uma “teia da vida”.
A Ecologia procura, então, conhecer as leis da natureza, o como a biosfera se organiza e
assim guia os valores que mantém a vida (GOLDSMITH, 1995).
Desta forma, para entender o estudo da Ecologia, torna-se importante conhecer os
conceitos das principais áreas que ela abrange, como:
— Biosfera, é a camada de vida que circunda o planeta, a soma de todos os ecossistemas
da Terra. Constitui-se no maior sistema biológico e o que mais se aproxima da autosuficiência. Inclui todos os organismos vivos da Terra que interagem entre si e com o
ambiente físico como um todo, a fim de manter um equilíbrio auto-ajustável (ODUM, 1985).
— Ecossistema, é o conjunto de elementos bióticos (seres vivos) e abióticos (fatores
diversos do ambiente) de uma determinada área, que trocam entre si influências notáveis, com
a transferência de matéria e energia, visando a um equilíbrio estável ( MARCONDES &
SOARES, 1991). São os mecanismos da natureza que mantém a vida na Terra (EHRLICH,
1993). Branco (1989) ressalta que ecossistema não é sinônimo de meio ambiente, pois nele
não está incluído o homem, a não ser em sua forma primitiva. Na visão de Montagnier (2000),
a humanidade está inserida em outro sistema biológico, que se organiza de forma diferenciada
de todos os outros sistemas vivos, pois ainda não encontrou meios de equilibrar sua relação
com a Terra. Portanto, o homem é considerado como parte do meio ambiente e dos sistemas
humanos e não dos ecossistemas. Dentro de cada ecossistema existe as comunidades de
organismos.
— Comunidade, é o conjunto de organismos de espécies distintas que convivem numa
mesma área, harmoniosamente integrados no funcionamento do todo (CAPRA, 1996). Cada
comunidade é composta por populações.
— População, é um conjunto de organismos da mesma espécie convivendo numa área
comum e mantendo ou não um certo grau de isolamento em relação a grupos de outras regiões
(MARCONDES & SOARES, 1991).
Em suma tem-se uma noção do que abrange o estudo da Ecologia.
Com base no estudo dos ecossistemas e da biosfera como um todo a Ecologia elaborou os
princípios fundamentais para a sustentabilidade de uma comunidade. Pois, durante mais de
três bilhões de anos de evolução, os ecossistemas do planeta tem se organizado de maneiras
sutis e complexas, a fim de maximizar a sustentabilidade (CAPRA, 1996).
A Terra sempre foi um sistema altamente dinâmico, e as profundas alterações que sofreu
ao longo de sua história ressaltam sua aptidão para construir estabilidades novas.
Compreendê-la é estar em sintonia com aspectos como inter-relações, diversidade,
complexidade, mudança e dinamismo.
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Os sistemas ambientais do globo são sistemas interativos, ricos em circuitos de
retroalimentação. Correspondem a um ciclo infinito de causa e efeito típico de qualquer
sistema dinâmico, cujas mudanças de um componente acarretarão alterações em todos
(PAULI, 1999).
Compreendendo assim o funcionamento da biosfera como um todo, compreende-se sua
capacidade de auto-suficiência que garante a sua sobrevivência. Conforme Capra (1996) a
manutenção da vida no planeta tem os seguintes princípios básicos que norteiam toda
estrutura, organização e relação entre os sistemas vivos :
— O princípio da interdependência, que consiste na dependência mútua de todos os
processos vitais dos organismos. O comportamento de cada membro vivo do ecossistema
depende do comportamento de muitos outros. Assim, o sucesso da comunidade toda depende
do sucesso de cada um de seus membros, enquanto que o sucesso de cada membro depende do
sucesso da comunidade como um todo.
— O princípio da reciclagem que diz que em função da natureza cíclica dos processos
ecológicos, o ecossistema não produz resíduos, porque os detritos de uma espécie é alimento
para a outra. A matéria movimenta-se em um ciclo infindável pela “teia da vida”, através dos
laços de realimentação dos ecossistemas.
— O princípio da parceria onde em um ecossistema os intercâmbios cíclicos de energia e
de recursos são sustentados por uma cooperação generalizada entre os organismos vivos e não
vivos em prol da coevolução.
— O princípio da flexibilidade, que é uma conseqüência dos múltiplos laços de
realimentação dos ecossistemas, que tendem a levar o sistema de volta ao equilíbrio sempre
que houver um desvio com relação a norma, devido as condições ambientais mutáveis.
— O princípio da diversidade, onde um ecossistema diversificado terá maior
flexibilidade para manter o equilíbrio, pois contém muitas espécies com funções ecológicas
sobrepostas que podem, parcialmente, substituir uma às outras. Com a biodiversidade, uma
comunidade ecológica é mais elástica, tornando capaz de sobreviver e de se reorganizar em
situações ambientais mutáveis.
Nesse sentido, estes princípios são válidos para a espécie humana, uma vez que ela faz
parte da grande comunidade dos seres vivos. Embora possua autonomia de existência, não é
independente em relação à natureza, uma vez que habita o mesmo ambiente físico (PAULI,
1999). Assim, para esta espécie exercer uma ação ecológica implica em saber agir dentro do
mesmo modelo de organização e estrutura comuns a todos os sistemas vivos. O como estes
sistemas se organizam, se estruturam e se relacionam é a questão motriz da perpetuação do
planeta, conseqüentemente da humanidade.
2.3 “Novo paradigma”: o paradigma ecológico
Para Capra (1996), a crise ecológica é uma crise complexa, multidimensional, cujas
facetas afetam todos os aspectos da vida humana. Para que haja um equilíbrio entre a estrutura
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natural do globo e a estrutura sócio-econômica humana é imperativo uma verdadeira
revolução de valores, uma nova visão de mundo, inserir o homem num novo modelo de
pensamento, denominado de “novo paradigma” _ o paradigma ecológico.
Neste novo paradigma, as empresas são vistas como sistemas vivos, cuja compreensão
não é possível apenas pelo prisma econômico e sim pelo prisma ecológico (CALLENBACH et
al.,1995).
De acordo com Merico (l996), a empresa é um sistema microeconômico, que se ocupa
como regra, da análise custo/benefício de uma atividade, definindo a escala ótima de produção
e fluxo monetário. Porém, dentro do prisma ecológico é avaliado o uso sustentável dos
recursos naturais e a capacidade dos ecossistemas em geral suportar a carga imposta pelo
funcionamento econômico.
A empresa enquanto um sistema microeconômico passa a depender não só da
macroeconomia e sim de um sistema ainda maior que é a biosfera. E, levando-se em conta que
a biosfera é finita (fonte de materiais, energia e como receptora de resíduos industriais e
urbanos), deve-se considerar seus limites e sua capacidade de suporte. Desta forma, o que
antes era considerado serviço proporcionado gratuitamente pela natureza, um preço terá que
ser pago pela degradação ambiental e pelo consumo de recursos naturais (que em sua maioria
não são renováveis).
Assim, no novo paradigma, as empresas devem substituir a ideologia do crescimento
econômico pela sustentabilidade ecológica, fazendo da Ecologia parte integrante de todas as
estratégias e operações da empresa. Implica em ter uma cultura que abarca diferentes
percepções, idéias, valores e comportamentos. Esse novo pensamento estabelece uma
concepção de empresa que valoriza a conservação e não a expansão, valoriza a qualidade e
não a quantidade e valoriza a parceria - não a dominação (CALLENBACH et al.,1995).
O gerenciamento ecológico de uma empresa envolve a passagem do pensamento
mecanicista do mundo como uma máquina, para a percepção do mundo como sistema vivo
(denominada como visão sistêmica) – a visão do mundo como um todo integrado, e não como
um conjunto de partes dissociadas (op. cit.).
Partindo dessas novas bases de negócio, a empresa estabelece uma responsabilidade
ambiental por processos e produtos que envolve um relacionamento diferente, compartilhado,
com fornecedores e consumidores, no que se refere à prevenção da poluição, à minimização
dos resíduos e a proteção dos recursos naturais. A essa responsabilidade, deve-se adicionar
outras, por questões ambientais mais difusas, como o bem-estar dos trabalhadores, da
comunidade e até de gerações futuras (AGENDA 21, 1995).
Como um sistema vivo, a empresa deve manter um fluxo cíclico em relação a processos e
produto: utilizando os recursos naturais e sociais, processando a matéria-prima e gerando
produtos e rejeitos de forma que retornem ao meio social e natural enquanto um benefício que
re-alimenta o ciclo.
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Operando uma empresa desta forma, tudo que retornar para o meio social e natural deve
servir para gerar vida para outros sistemas e assim, manter o equilíbrio global. Conforme
Venzke (2002), deve-se empreender um esforço criativo e utilizar tecnologias ambientais para
desenvolver novos produtos para novos mercados, seja através do reaproveitamento ou
reciclagem de resíduos ou o desenvolvimento de produtos com atributos ambientais. Na visão
de Pauli (1999), deve-se agregar, ainda, algum valor extra sobre o material original não
utilizado no produto principal, considerando as sobras um sub-produto e não resíduo a ser
descartado.
O gerenciamento ecológico tem como motivação e funcionamento os valores e os
princípios da Ecologia contemporânea. Assim, seu sucesso dependerá da medida em que o
paradigma ecológico estiver refletido na cultura empresarial (CALLENBACH et al.,1995).
Para reforçar, em relação ao mercado da Moda, Callenbach (op. cit.:62) faz referências a
duas grandes consultoras de tendência :
“A Promostyle e a Trend Union, atribuem importância capital
às preocupações ambientais. Um recente livro da Promostyle
dirigido ao comércio, tendo por tema o “eco-estilo”, sustenta
que o ambientalismo vai mudar radicalmente a nossa estética.
Em conferências promovidas pela Promostyle em Nova York,
Toquio e Paris, reunindo associações comerciais, fabricantes
varejistas, os debatedores, pertencentes a empresas como a
Patagonia, Nike e Esprit, discutiram a cultura da empresa
ecológica, a necessidade de ser mantida uma fatia do mercado
para as roupas ecológicas, inovações em desenho e produção,
e a mudança das relações entre a Terra e o varejista, o cliente
e o varejista, os fabricantes e os desenhistas”.
3. MODA COMPROMETIDA COM A SUSTENTABILIDADE ECOLÓGICA SOCIAL
Atendendo à tendência de valorização do meio-ambiente e qualidade de vida, muitos
empresários, associações e cooperativas tem voltado suas ações para o desenvolvimento da
moda comprometida com a sustentabilidade ecológica e social.
Na indústria têxtil, observa-se o desenvolvimento de novas fibras como a lyocell que
utiliza a celulose a partir da polpa de madeira (retirada de árvores cultivadas através de
reflorestamentos) e oxido de amina como matérias-primas para a sua produção (BRADDOCK
& O`MAHONY,2000). Ao contrário das fibras artificiais de Viscose e Acetato, que também
partem da celulose como base orgânica, mas que empregam no processo de fiação química,
respectivamente, o hidróxido de sódio e ácido acético (substâncias químicas tóxicas), o lyocel
utiliza um solvente não tóxico que além de não trazer malefícios à natureza é reutilizado em
novos ciclos de produção.
Outro exemplo de nova fibra é a Ingeo, desenvolvida pela empresa norte-americana
Cargill Doll LLC (www.ingeo.com), lançada mundialmente em 2003. Esta fibra é produzida a
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partir da fermentação do milho (http://www.tecnicelpa.com/ciencia.htm). Em janeiro de 2005,
85 companhias no mundo, desde fabricantes de roupas como a Diesel, ou produtos têxteis
como a Faribault Woolen Mills, estavam a formar uma parceria empresarial para desenvolver
novos produtos com a fibra patenteada, Ingeo. As americanas Farm Fresh e Wild Oats, alem
da japonesa Sony, estão embalando alimentos frescos e minidiscs com plástico de milho.
Companhias como Eddie Bauer, Faribault Mills, Versace Sport e Armani, tem feito roupas,
acessórios e cobertores com a fibra Ingeo. Nas olimpíadas de Sidney, em 2000 e nos jogos
olímpicos de inverno de Salt Lake City, em 2002, a americana Biocorp fabricou “copos de
milho” para a coca cola. No Brasil, a empresa Santista desenvolve a fabricação de jeans com
esta fibra.
Observa-se, também, os avanços das pesquisas científicas da Embrapa Algodão
(www.cnpa.embrapa.br) relacionadas ao algodão colorido que, em 2002, lançou a cultivar
BRS Verde e prevê, para os próximos anos, o lançamento de outras cultivares em tons de
vermelho, aumentando as alternativas de tonalidade e padrões para a indústria têxtil.
Utilizando o algodão colorido, um grupo de empresários do setor têxtil de Campina Grande –
Paraíba criaram o consórcio de exportação Natural Fashion. Produzindo tecidos, roupas e
acessórios com esta matéria–prima, conseguiram realizar um negócio reunindo moda,
tecnologia, respeito ambiental e desenvolvimento econômico auto-sustentável
(CASTRO,2004).
O Casulo Feliz ( fiação artesanal no Noroeste do Paraná) é outro exemplo de empresa que
está se preocupando com a ecologia. Está aproveitando casulos amassados, e os já
abandonados pela crisálida ao virar borboleta (que normalmente são rejeitados na linha da
produção industrial por apresentarem os filamentos rompidos), para desenvolver tecidos
artesanais com valor agregado. Neste projeto, empregam também a coloração 100% vegetal
utilizando folhas, raízes, sementes, cascas e flores (FAÇANHA, 2004).
A fibra de bambu também tem sido procurada pelas empresas de confecção e estilistas
que estão cada vez mais ecologicamente corretos no desenvolvimento de suas coleções. Ela é
formada de celulose produzida através de métodos de processamento que incluem em seu
tratamento vapor e fervura. As fibras de bambu naturais são extraídas diretamente das varas do
bambu e são completamente distintas da viscosa de bambu que se obtém através de seu
processamento químico. A fibra não contém nenhum aditivo químico. Tem propriedades
químicas antibacterianas, desodorantes, de coloração, elasticidade, flexibilidade y
durabilidade.
A fibra protéica de soja, SPF, é a única fibra protéica do mundo de origem botânica.
É uma fibra “verde”(ecologicamente correta), que possui qualidades superiores à muitas
fibras naturais e sintéticas. Ë produzida a partir de uma pasta (resíduo da semente após a
extração do óleo) usando-se uma nova tecnologia de bioengenharia. Primeiramente a proteína
esférica é destilada do bolo da semente e refinada. Em segundo, sob o funcionamento de um
agente auxiliar e de uma enzima biológica, a estrutura espacial da proteína muda, o líquido é
complementado com a adição de altos polímeros, e finalmente o líquido é cozido. Fibras de
0,9 a 3,0 dtex são produzidas nos fiadores, estabilizada por acetilização, e finalmente cortada
após ondulação e termofixação (www.forumtextil.com.br). A SPF tem a China como líder de
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desenvolvimento (década de 1990), sendo este trabalho desenvolvido pelo Dr. Li Guanqi
diretor da organização Harvest SPF Textile Co.
Estes exemplos visam uma produção com a utilização de materiais mais limpos onde a
preocupação centra-se na escolha de matérias primas obtidas diretamente da natureza e que,
por isso, trazem consigo características biodegradáveis importantes nas etapas de produção, de
descarte e reciclagem dos materiais.
Além das propostas que enfocam a preocupação ecológica no processo produtivo, outras
agregam a preocupação com a diminuição dos resíduos por outros setores industriais, através
do reaproveitamento. Como exemplo, cita-se a utilização de garrafas PET na fabricação de
fibras têxteis bem como o reaproveitamento de aparas têxteis resultantes das empresas de
confecções. Neste sentido, o Projeto Alya Eco, desenvolvido pela parceria entre a Rhodia-ster,
(que criou em 1995 a Recipet, maior empresa de reciclagem de garrafa PET da América
Latina), Santista Jeanswear (empresa têxtil que lançou a linha Ecol Denim) e o estilista Carlos
Mielle (da M.Officer), reuniu a tecnologia, o meio ambiente, a moda e a responsabilidade
social no desenvolvimento de novos produtos. Incorporando o trabalho da COOPA-ROCA
(Cooperativa de Trabalho Artesanal e de Costura da Rocinha, RJ), utilizando os tecidos
fabricados pela Santista Jeanswear, produzido com fibra de PET, os envolvidos no projeto
mostraram como é possível desenvolver moda dentro do novo paradigma do gerenciamento
ecológico.
No contexto internacional, cita-se o exemplo da empresa Esprit International sediada na
Alemanha, que foi destacada por Callenbach (et al., 1995) por estar sistematicamente na
vanguarda das inovações, numa autêntica fusão de preocupações ambientais, sociais e de
sustentabilidade.
Esta empresa tem uma coleção denominada “ecoleção” que obedece aos rigorosos
padrões no tocante a direitos humanos, proteção dos trabalhadores e critérios ambientais de
produção. Começando pelo próprio estilo da coleção, a empresa adota o clássico pois não
pretende estimular o modismo, nem o consumismo.
Quanto a matéria-prima, utiliza tecido e malha de fibras naturais. Os botões são de noz de
tágua adquiridos de cooperativas de povos indígenas de florestas tropicais e botões de madeira
pintados à mão por cooperativas de mulheres apalaches. As etiquetas são confeccionadas à
partir da reciclagem de sobras dos tecidos. O tingimento é feito com corantes naturais e de
baixo impacto. Adotam, também, o algodão orgânico já colorido. Utilizam o mínimo de
embalagens e o máximo de material reciclado.
Quanto aos fornecedores, a empresa se recusa a fazer negócios com fabricantes que
empregam o trabalho infantil e o trabalho escravo. Ou mesmo, com empresas que
proporcionam condições de trabalho inseguros e insalubres ou operam em noções onde as
violações dos direitos humanos são generalizados.
Quanto aos empregados e a comunidade, a Esprit tem o programa Ecodesk que é
responsável por um amplo leque de ações, dentre os quais destaca-se: as doações a instituições
de caridade; oferecimento de clubes de saúde completos, nas dependências da empresa, com
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aulas de aeróbica e ioga; os empregados são reembolsados por várias horas de trabalho
voluntário que prestam em instituições de caridade locais;os empregados têm direito a um dia
adicional de férias por cada 30 dias que vão ao trabalho usando transporte coletivo ou
bicicleta;a empresa paga parte do ingresso para eventos culturais aos empregados e oferece
palestras e cursos aos empregados sobre temas sociais e ambientais.
Como mencionado anteriormente, o reaproveitamento de matérias têxteis é uma atividade
que deve ser entendida como postura correta no gerenciamento ecológico. Desta forma, sita-se
como exemplo, projetos desenvolvidos em alguns cursos de moda, como o “Eco-Fashion:
consolidação de uma tendência de moda” da Universidade do Estado de Santa Catarina que
prima pelo desenvolvimento de produtos ecologicamente corretos. Como resultado de sua
atuação apresentou, no I Veg Fashion (evento de moda com desfiles e exposições, que
aconteceu durante o 36 Congresso Mundial de Vegetarianismo), todos os produtos de moda
sem a utilização de matéria-prima de origem animal, bem como trabalhou com a reutilização
de tecidos arrecadados em campanhas de doação (SCHULTE, 2006).
A pesquisas de transformação de tecidos e a utilização do Pachwork como técnica de
reaproveitamento dos materiais têxteis em produtos de moda, passam também a constituir-se
alternativas em prol da ecologia.
Patchwork é uma palavra que em inglês significa trabalhar com retalhos. Esta técnica
consiste em unir pedaços de tecidos de diferentes cores e padronagens costurando-os de forma
que o resultado final assemelha-se a um mosaico. Não há uma regra que determine o tipo de
desenho formado, mas os vários motivos existentes variam conforme o momento histórico de
cada povo e da expressão pessoal do artesão. Em épocas onde os tecidos eram bens muito
valiosos, as classes ricas utilizavam o Patchwork para criar obras de arte, tanto para a
indumentária de faraós e reis como para adornos dos palácios. Já nas classes pobres, devido a
dificuldade de acesso a estes bens, o Patchwork servia como forma de reaproveitamento dos
restos de roupas velhas para transformarem em novas roupas ou mesmo utilitários para o lar.
Como se vê, esta técnica que tem registros de sua existência em torno de 3.400 a.C,
representada em uma estatueta esculpida em marfim e encontrada no Egito (MINETTO,
2004), não é nova. Veio sendo utilizada por várias regiões do mundo mas perdeu sua
característica primordial de reaproveitamento de tecido velho com o surgimento da tecelagem
industrial. No entanto, segundo Búrigo (2003), somente nos anos sessenta, com o movimento
hippie, o Patchwork se popularizou novamente. Este quebra-cabeça de retalhos coloridos que
formavam detalhes geométricos encantaram alguns estilistas como Yves Saint Laurent que
passou a utilizar a técnica em luxuosas peças criadas nos padrões da alta-costura. Até hoje,
verifica-se nas coleções internacionais e nacionais construções têxteis com referências nesta
técnica milenar.
O reaproveitamento de aparas têxteis está sendo também utilizado para a produção de
nãotecidos. O nãotecido “ é um tipo de tecido produzido por tecnologia própria, diferente do
processo convencional de entrelaçamento de fios através da utilização de teares. Basicamente,
refere-se à consolidação de véu ou manta de fibras ou filamentos através de processos que
podem ser mecânicos, químicos, físicos, térmicos, ou a combinações deles” (COSTA, 2003).
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A indústria de nãotecidos tem crescido nos últimos anos tanto em volume de produção
quanto em colocação de novos produtos no mercado. O emprego deste substrato têxtil para
aplicação em moda ainda é recente, mas pesquisas na área do design têxtil estão sendo
realizadas no sentido de agregar valor modificando sua cor, textura, estrutura, etc contribuindo
com a qualidade técnica/estética deste produto. Acredita-se que, futuramente, a indústria do
nãotecido poderá contribuir de modo significativo no gerenciamento ecológico na área têxtil
desenvolvendo, também, tecidos mais rebuscados para serem aplicados em moda a partir do
reaproveitamento dos resíduos das indústrias de fiação, tecelagem, malharias, bem como da
transformação através da reciclagem das peças de roupas em desuso.
Com relação a transformação têxtil, estão sendo desenvolvidas pesquisas que têm por
objetivo a criação de novos produtos através de Procedimentos de Transformação Têxtil –
estrutural, construtivo, colorístico e combinado – que possibilitam a modificação da estrutura e
superfície, tanto de tecidos novos como de tecidos já usados (COSTA,2004). Esta prática tem
contribuído para a utilização de materiais que, por saírem de moda, seriam rejeitados mas que,
ganham uma nova estética ao serem modificados através do design têxtil de maneira
alternativa, criativa e competente.
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Mesmo sendo a moda um fato consumado na sociedade moderna, vinculada a idéia de
mudanças, que se materializa na rapidez com que as coleções do vestuário alternam-se a cada
estação (até mesmo no meio delas), ela não precisa ser considerada uma ameaça ao meio
ambiente e a sociedade. Há necessidade, sim, de uma postura comprometida com os princípios
ecológicos.
Uma discussão consistente sobre o desenvolvimento sustentável, dá margem a que se
reflita, então, sobre os vários aspectos da sociedade moderna, entre eles, a moda e a indústria
que a viabiliza. Sua maneira de produção, a maneira de consumo, os estilos de vida que
favorece. A produção de variedades excessivas de artigos e o uso indiscriminado de energia,
por exemplo, não são compatíveis com regras de sustentabilidade. Claramente, aqui cabe
pensar sério e propor mudanças no estilo de vida vigente. Uma filosofia da finitude e de autorestrição assume grande relevância neste contexto.
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