atendimento pedagógico hospitalar, informática e

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ATENDIMENTO PEDAGÓGICO HOSPITALAR, INFORMÁTICA E
CIDADANIA PARA CRIANÇAS HOSPITALIZADAS: A EXPERIÊNCIA
DO HOSPITAL UNIVERSITÁRIO JÚLIO MÜLLER EM CUIABÁ/MT
RAMALHO*, Maria de Fátima
[email protected]
Resumo
O trabalho tem como objetivo relatar a experiência da Classe Hospitalar do Hospital
Universitário Júlio Müller em Cuiabá/MT e o processo de integração com o Projeto EICHOSPITAIS (Escola de Informática e Cidadania para crianças hospitalizadas), ambos
implantados no ano de 2004. As autoras apresentam um breve histórico de cada um dos
projetos e as suas contribuições para a humanização da assistência à criança hospitalizada.
Conclui-se que a integração promove a continuidade do acompanhamento do currículo
escolar, a inclusão digital e a promoção da cidadania de crianças hospitalizadas.
Palavras – chave: Classe Hospitalar; Humanização; Informática em saúde;
A Classe Hospitalar do Hospital Universitário Júlio Müller
A Classe Hospitalar do Hospital Universitário Julio Muller (HUJM) teve seu inicio de
modo informal a partir do reconhecimento da necessidade de cumprimento deste direito das
crianças internadas. Começou com o trabalho voluntário de uma auxiliar de enfermagem da
Pediatria formada em Pedagogia e motivada pelas proposições da Política Nacional de
Educação Especial.
Em 2003, após uma visita a classe hospitalar do Hospital das Clínicas da Faculdade de
Medicina de Ribeirão Preto, o projeto pôde ser construído em bases práticas. Com o apoio de
diversas pessoas do HUJM, o projeto da Classe Hospitalar foi construído e apresentado a
Secretaria de Estado de Educação de Mato Grosso (SEDUC-MT) no início de 2004, sendo
aprovado após algumas recomendações. Tornou-se realidade em setembro de 2004 e hoje já
possui uma escola vinculadora, a Escola Estadual Dr.Fenelon Müller.
A Classe Hospitalar é uma modalidade da Educação Especial que visa o atendimento
pedagógico às crianças e adolescentes, devido as condições especiais de saúde, encontram-se
hospitalizadas.
*
Pedagoga. Classe Hospitalar do HUJM
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As principais leis que referendam este serviço são a Constituição Federal – artigos número
197, 198, 205 e 214; Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (artigo 5 - parágrafo 5,
artigo 23, artigo 59; Resolução do Conselho Nacional de Educação número 2, de 11/09/2001.
Também representam apoios para a sua implantação, o Estatuto da Criança e do Adolescente
(BRASIL, 1990) e a Resolução do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do
Adolescente número 41 de 17/10/1995 - Direitos da Criança e do Adolescente Hospitalizados.
A criança e o adolescente gozam de todos os direitos fundamentais inerentes à
pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata esta Lei,
assegurando-se-lhes, por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e
facilidades, a fim de lhes facultar o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual
e social, em condições de liberdade e de dignidade – Artigo 3º do ECA (BRASIL,
1990).
A criança hospitalizada tem direito a desfrutar de alguma forma de recreação,
programa de educação para a saúde, acompanhamento do currículo escolar durante
sua permanência hospitalar - item 9 da Resolução CONANDA n. 41 de 17/10/1995
(BRASIL, 1995).
Os objetivos da Classe Hospitalar são oferecer às crianças e adolescentes
hospitalizados, de acordo com os limites e prescrição médica, uma melhor qualidade de vida,
integração social e emocional, de modo a permitir a continuidade das atividades escolares.
Além disso, a classe hospitalar também tem como finalidade proporcionar às crianças
hospitalizadas o direito ao ano letivo e conseqüentemente evitar a evasão, repetência escolar e
a exclusão social. Também tem como função resgatar a auto-estima, amenizando o sofrimento
e reduzindo o tempo de internação das crianças e adolescentes.
O público alvo são crianças e adolescentes do ensino fundamental que se encontram
hospitalizados no HUJM. São atendidas também crianças de Educação Infantil, as que não
freqüentam a escola e também os pais que, espontaneamente, procuram participar do
atendimento pedagógico.
O projeto é realizado em uma sala anexa à Pediatria, com mesinhas, cadeiras,
computadores, ar condicionado, vários brinquedos e livros. Funciona em um dos períodos
(manhã ou tarde), de segunda a sexta feira.
O perfil das crianças é diversificado em vários aspectos, como idade, tipo de patologia,
nível de escolaridade, cultura, procedência, entre outras.
O trabalho pedagógico é desenvolvido por uma pedagoga especialista, efetiva e cedida
pela SEDUC-MT.
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O trabalho é desenvolvido através de estratégias multi e interdisciplinares, juntamente com
outros projetos de humanização em Pediatria, com destaque para o Projeto EIC-HOSPITAIS
que é apresentado a seguir.
O Projeto EIC-HOSPITAIS
O Projeto EIC-HOSPITAIS traz a prática inédita de utilizar a Tecnologia da
Informação e Comunicação (TIC) como uma ferramenta a mais para ajudar crianças e
adolescentes a enfrentarem o processo de hospitalização. Através de Escolas de Informática e
Cidadania (EICs) instaladas em unidades de Pediatria de hospitais públicos, o projeto tem
utilizado a tecnologia em favor da construção de um espaço mais humano e educativo para as
crianças hospitalizadas.
O Projeto EIC-HOSPITAIS tem como tema a promoção da saúde de crianças e
adolescentes em situação de hospitalização, configurando-se como uma estratégia para a
efetivação dos seus direitos.
Assim como a Classe Hospitalar, o Projeto foi elaborado tendo como fundamentação o
Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA (BRASIL,1990) e os Direitos da Criança e do
Adolescente Hospitalizados (BRASIL, 1995).
O projeto fundamenta-se também na pedagogia de Paulo Freire, segundo a qual a
educação deve acontecer através de um processo crítico-reflexivo (FREIRE, 1987).
Os objetivos das EICs - Hospitais são: desenvolver atividades educativas, lúdicas e
lúdico-terapêuticas com crianças hospitalizadas com a utilização do computador; promover a
interatividade entre crianças hospitalizadas; construir conhecimentos através do intercâmbio
interinstitucional; promover a reflexão de temas que abordem a cidadania e combater a
exclusão digital.
O Projeto EIC-HOSPITAIS começou em 2002 com a iniciativa da psicóloga Mírian
Sewo, então coordenadora pedagógica do Comitê para a Democratização da Informática do
Paraná, CDI-PR, junto a crianças internadas no Hospital Infantil Pequeno Príncipe em
Curitiba, Paraná. Naquele mesmo ano, a convite do CDI-PR, o projeto começou a ser
discutido entre a sua coordenação pedagógica e enfermeiras docentes da Universidade Federal
de Mato Grosso, UFMT, e da Universidade Estadual do Oeste do Paraná, UNIOESTE
(SEWO; RIBEIRO; COLLET, 2003).
Em 2003, foi firmado um convênio entre o CDI-PR, o Hospital Universitário do Oeste
do Paraná, HUOP, da cidade de Cascavel e o Hospital Universitário Júlio Müller, HUJM, de
Cuiabá para o desenvolvimento e implantação do projeto. O CDI-PR ofereceu o apoio
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pedagógico e as máquinas em regime de comodato (cinco computadores, notebooks e
impressora) e os hospitais com o restante da estrutura (educadores, manutenção, sala, rede,
etc).
O projeto vem sendo executado desde dezembro de 2003 no HUOP em Cascavel e
desde fevereiro de 2004 no HUJM em Cuiabá. Em agosto de 2004 o Hospital do Trabalhador
em Curitiba também passou a fazer parte do projeto.
Em Cuiabá, a EIC-HUJM é coordenada por docentes da Faculdade de Enfermagem da
UFMT. O projeto tem a participação de acadêmicos de vários cursos que atuam como
educadores, desenvolvendo atividades lúdicas e educativas com crianças hospitalizadas
utilizando o computador. Alunos de computação também participaram no início do projeto
fazendo a manutenção dos equipamentos, suporte e desenvolvendo softwares a serem
aplicados no com as crianças e banco de dados.
O projeto também é desenvolvido na sala de recreação da unidade de Pediatria ou no
próprio quarto da criança. A sala conta com cinco computadores conectados à Internet e
impressora que dividem a sala com os demais brinquedos. O projeto possui também seis
notebooks que são usados nos leitos quando as crianças estão impossibilitadas de irem até a
sala de recreação. Os equipamentos são provenientes de doações e cedidos pelo CDI-PR.
Os educadores são preparados para atuar com as crianças através de visitas à Pediatria,
discussões e dinâmicas de grupo com o objetivo de adaptá-los ao ambiente hospitalar e ao
trabalho com as crianças doentes. São também orientados quanto às medidas de biossegurança
como a proteção individual e os procedimentos para evitar a contaminação ou disseminação
de infecções através dos equipamentos. A pedagoga da Classe Hospitalar também apóia os
educadores, trabalhando em parceria.
As atividades realizadas com as crianças são divididas em: atividades lúdicopedagógicas, atividades interativas e atividades de informática e cidadania. Para as
atividades lúdico-pedagógicas são usados jogos em CD ou on-line, desenhos no Paint e
outras. As atividades interativas incluem envio de e-mails, cartões e bate-papo por meio do
programa Messenger (MSN) ou em sala de chat específica com as crianças internadas nos
hospitais parceiros do projeto das cidades de Curitiba e Cascavel. O bate-papo é mediado por
uma enfermeira pediatra e, além de proporcionar diversão e interação entre as crianças,
promove a expressão de sentimentos em relação à doença e a troca de experiências. As
atividades de informática e cidadania são desenvolvidas através de ferramentas
computacionais usuais como o editor de texto, apresentações, desenhos e sites infantis e
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linguagem de programação, trazendo conteúdos que promovam a reflexão de temas que
abordem a cidadania e o desenvolvimento de atitudes positivas.
Na EIC de Cuiabá, as crianças participantes do projeto são, em sua maioria,
provenientes do interior do estado de Mato Grosso. Têm idade escolar, são portadoras de
doenças crônicas, permanecem muito tempo hospitalizadas ou se reinternam e não tiveram
contato anterior com o computador. Para elas, as atividades desenvolvidas no Projeto EICHOSPITAIS têm contribuído para uma maior interação com as demais crianças e com a
equipe de saúde. Além disso, elas dizem se sentirem mais alegres e que podem ‘melhorar
mais rápido’. Para os profissionais e acompanhantes, as atividades têm proporcionado mais
alegria e otimismo às crianças. O Projeto EIC-HOSPITAIS contribui significativamente para
a transformação do ambiente hospitalar, tem auxiliado as crianças a enfrentar o processo de
hospitalização de forma menos traumática e contribuído para a inclusão digital (VIEIRA et al,
2004).
Os
resultados
demonstram
que
o
Projeto
EIC-HOSPITAIS
é
contribui
significativamente para a transformação da hostilidade do ambiente hospitalar. O projeto tem
um grande potencial de replicação e a possibilidade de se criar uma rede entre as crianças
hospitalizadas é bastante viável considerando que diversos hospitais tem instalação da rede
física que permite a conexão de computadores na Internet, bastando apenas que o modelo do
presente projeto seja disponibilizado (RIBEIRO et al, 2004). Além disso, o Projeto EICHOSPITAIS oferece um espaço para a valorização da criança hospitalizada como sujeito de
direitos e, portanto, merecedora de respeito.
A integração da Classe Hospitalar com o Projeto EIC-HOSPITAIS
Nos quatro anos de experiência de integração da Classe Hospitalar com o Projeto
EIC-HOSPITAIS, verificou-se que os projetos têm sido mutuamente potencializados. Para a
Classe Hospitalar, os recursos computacionais têm se mostrados úteis para a prática
pedagógica, para a realização de pesquisas e tarefas escolares. Alguns jogos pedagógicos são
utilizados e funcionam como um reforço e um estímulo para as crianças, considerando que
atraem as mesmas. Para o Projeto EIC-HOSPITAIS, a experiência e o suporte pedagógico
profissional da Classe Hospitalar tem enriquecido as atividades de informática e cidadania.
Um exemplo de integração entre os dois projetos pode ser demonstrado pela produção
da poesia de uma criança internada que, estimulada pela professora da Classe Hospitalar a
falar sobre a experiência de estar hospitalizada, escreveu sobre o medo:
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O medo sem fim
O medo sem fim!
Esse medo é assim,
Eu tenho, você tem,
Mas quem não tem?
Medo de aranha
Medo de avião
Medo de fantasma
Medo de ladrão
Medo o que é então?
Quem tem medo?
Até o valentão,
Diz que tem coragem, mas não sei não!
O medo também tem suas artimanhas,
Quando a gente fica com medo
Uma mosca é uma aranha!
Assim é o medo!
Na prática, a sala de recreação onde são desenvolvidas as atividades dos projetos, tem
sido freqüentada por todos os profissionais da Pediatria quando precisam abordar as crianças
que, muitas vezes, para lá se dirigem de modo a não interrompê-las durante as aulas.
Os projetos têm favorecido o desenvolvimento cognitivo, afetivo e social das crianças.
Também tornam as crianças mais receptiva ao tratamento e aos profissionais que cuidam dela,
modificando o ambiente, trazendo alegria, auto-estima e otimismo. Além disso, têm
favorecido a comunicação, a socialização e a recuperação das crianças.
Conclui-se que a integração dos projetos Classe Hospitalar e EIC-HOSPITAIS
promovem a continuidade do acompanhamento do currículo escolar, a inclusão digital e a
promoção da cidadania de crianças hospitalizadas.
REFERÊNCIAS
BRASIL. Estatuto da criança e do adolescente. Brasília: Senado Federal, Subsecretaria de
Edições Técnicas, 1990.
BRASIL. Ministério da Justiça. Resolução nº 41 de 13 de outubro de 1995. Dispõe sobre os
direitos da criança e do adolescente hospitalizados. Diário Oficial da União. Brasília (DF),
Seção I, p. 16319-16320, 17/10/95.
RIBEIRO, Rosa Lucia Rocha. ; SEWO, Mirian Toshiko ; VIEIRA, Maria Aparecida ;
FARIAS, Luciana Correia Lima Gonçalves de ; SANTOS, Eunice Pereira dos; MARTINS,
Cláudia Aparecida ; VIERA, Claudia Silveira ; OLIVEIRA, Beatriz Rosana Gonçalves de ;
4494
COLLET, Neusa . Projeto EIC-HOSPITAIS: primeiros resultados. In: Rosiane Correia de
Freitas. (Org.). Inclusão digital: pressupostos teóricos. 1 ed. Curitiba: CDI-PR, 2005, v. , p.
38-45.
SEWO, Mirian T.; RIBEIRO, Rosa L.R., COLLET, Neusa, (orgs.). EIC-Hospitais. Curitiba
(PR): CDI-PR. Digitado, 2002.
VIEIRA, Maria A. et al. Escola de informática e cidadania para crianças hospitalizadas. In:
56º Congresso Brasileiro de Enfermagem, 2004, Gramado, Anais ..., ABEn-RS, 2004.
Disponível em: < http://bstorm.no-ip.com:2048/php/aben/revista.php?letra=E > Acesso em
02/05/2007.
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