VI Seminário Latino Americano de Geografia Física II Seminário Ibero Americano de Geografia Física Universidade de Coimbra, Maio de 2010 VULNERABILIDADE AMBIENTAL DOS SISTEMAS LACUSTRES DO LITORAL CEARENSE: O CASO DA LAGOA DAS ALMÉCEGAS, PARAIPABA, TRAIRI – CE, BRASIL Francisca Leiliane Sousa de Oliveira(1) Maria Lucia Brito da Cruz(1) Lutiane Queiroz de Almeida(2) Geyziane Lima de Castro(1) (1)UNIVERSIDADE ESTADUAL DO CEARÁ – UECE; (2)UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA “JÚLIO DE MESQUITA FILHO” – UNESP, Rio Claro, SP [email protected]; [email protected]; [email protected] ; [email protected] Introdução O Estado do Ceará possui uma linha de costa de 573 km, apresentando paisagens compostas principalmente por praias arenosas, campos de dunas, estuários, manguezais, lagoas costeiras, falésias e tabuleiros. Possui um dos maiores adensamentos litorâneos do Brasil, apresentando uma densidade demográfica de 178,13 hab/km2, mais de três vezes superior à média do Estado, que é de 51,70 hab/km2. Os problemas mais graves da zona costeira cearense estão relacionados a esta concentração populacional, gerando a ocupação desordenada em áreas frágeis e suscetíveis a degradação de seus recursos naturais, causando diferentes impactos e conflitos de uso. No final do século XX, esta ocupação e degradação dos espaços litorâneos teve crescimento continuo, comprometendo ainda mais o patrimônio natural e a qualidade de vida da população costeira. Nesse contexto, os sistemas lacustres são analisados neste trabalho, na perspectiva de seu potencial geoambiental, limitações ao uso, incluindo as condições ecodinâmicas e quadro de vulnerabilidade ambiental. Para o estudo de caso da Lagoa das Almécegas, localizada entre os limites municipais de Paraipaba e Trairi, foi atrelada a classificação sistêmica do ambiente ao uso das técnicas de sensoriamento remoto e de geoprocessamento, através da interpretação de fotografias aéreas cedidas pelo IPECE, 2007 de escala 1:25.000, 1 Tema 3- Geodinâmicas: entre os processos naturais e socio-ambientais dispostas em mosaico e, posteriormente analisadas e vetorizadas, identificando a bacia de drenagem da lagoa e o processo de uso e ocupação da terra, resultando na confecção de figuras e tabelas . A Lagoa das Almécegas expressa impactos característicos dos demais sistemas lacustres presentes na zona costeira cearense, dentre os quais está o uso intensificado desse sistema para o turismo, dando destaque a restaurantes, barracas, cultivos e residências instaladas nas margens da lagoa infringindo a lei do Código Florestal. Localização e caracterização da área de estudo As planícies fluviais ocorrem indistintamente, ocupando faixas com larguras variadas entre os níveis dos tabuleiros pré-litorâneos, nos diferentes setores da costa do Ceará. Constituem as faixas de acumulação aluvial das planícies do baixo curso dos rios Jaguaribe, Acaraú, Coreaú, Aracatiaçu, Choró, Pirangi, dentre outros. As aluviões são compostas de areias finas e médias, com inclusões de cascalhos inconsolidados, siltes, argilas e eventuais ocorrências de matéria orgânica em decomposição. (AQUASIS/SEMACE, 2003). Os solos aluviais são profundos, mal drenados, possuem textura indiscriminada e fertilidadenatural média a alta. A drenagem imperfeita, ao lado do encharcamento e excesso de água durante a estação chuvosa, constituem os principais fatores limitantes ao uso, além das restrições de natureza legal. Os planossolos solódicos são solos rasos a medianamente profundos, têm drenagem imperfeita e são susceptíveis a encharcamentos sazonais e à erosão. Têm baixa a média condições de fertilidade natural e problemas de salinização. (AQUASIS/SEMACE, 2003) A Lagoa das Almécegas, localizada entre os limites municipais de Paraipaba e Trairi, no litoral oeste do Estado do Ceará, com distancia aproximada de 129 km de Fortaleza, faz parte da bacia litoral, na planície flúvio-lacustre (Figura 02). 2 VI Seminário Latino Americano de Geografia Física II Seminário Ibero Americano de Geografia Física Universidade de Coimbra, Maio de 2010 Figura 01 – Localização da Lagoa das Almécegas Sistemas Ambientais Os sistemas lacustres são analisados neste trabalho, na perspectiva de seu potencial geoambiental, limitações ao uso, incluindo as condições ecodinâmicas e vulnerabilidade ambiental. As lagoas costeiras, em estudo de caso a Lagoa das Almécegas, são fundamentais para o abastecimento hídrico como também fator de atividade turísticas do litoral cearense. (Figura 3) 3 Tema 3- Geodinâmicas: entre os processos naturais e socio-ambientais Figura 02 – Destaque dos municípios da Zona Costeira Cearense, com lagos e lagoas. A delimitação dos sistemas adotados para análise da área objeto de estudo, levou em consideração a ecodinâmica das paisagens proposta por Tricart adaptada por SOUZA (2000), seguindo as categorias de sustentabilidade e vulnerabilidade ambiental, considerando taxonomia contida na proposta metodológica de BERTRAND(1969) em função das ordens de grandeza, os sistemas e subsistemas ambientais. Considerando a diversidade dos geossistemas, de acordo com Souza (2000) e Aquasis/Semace (2003) foram delimitadas as unidades elementares contidas em um mesmo sistema de relações, destacando-se desta forma, as geofácies. Sob esse aspecto, a concepção de paisagem assumiu um significado para a delimitação das subunidades, em função da exposição de padrões relativamente homogêneos. A partir dos critérios descritos acima, foram identificados os principais geossistemas da Zona Costeira do Ceará e as suas respectivas geofácies. Planície litorânea Faixa praial; campo de dunas móveis; dunas fixas e paleodunas; espelhos d’água lacustres; e planícies flúvio-marinhas com manguezais. Na faixa praial predominam as areias quartzosas com níveis de minerais pesados, fragmentos de conchas e minerais micáceos. Os sedimentos eólicos que formam os campos de dunas têm predominância de areias quartzosas bem selecionadas, com 4 VI Seminário Latino Americano de Geografia Física II Seminário Ibero Americano de Geografia Física Universidade de Coimbra, Maio de 2010 granulometria que varia de fina a média e de colorações claras. Os solos apresentam uma associação predominante de solos imaturos e pouco desenvolvidos com areias quartzosas marinhas, areias quartzosas e solos indiscriminados de mangues. As areias quartzosas ocorrem nas dunas fixas e paleodunas e nas faixas de transição para os tabuleiros. Planícies Fluviais Depósitos sedimentares aluviais com areias e outros sedimentos finos bordejando calhas fluviais, sujeitas a inundações periódicas, com solos aluviais predominantemente revestidos por matas ciliares. Os aluviões são compostas de areias finas e médias, com inclusões de cascalhos inconsolidados, siltes, argilas e eventuais ocorrências de matéria orgânica em decomposição. A associação predominante de solos é composta por solos aluviais e planossolos solódicos, com eventuais ocorrências de vertissolos. Os solos aluviais são profundos, mal drenados, possuem textura indiscriminada e fertilidade natural média a alta. As planícies fluviais são ambientes típicos dos carnaubais, onde a carnaúba (Copernicia prunifera) é a espécie mais freqüente, associando-se a outras plantas de porte arbóreo e a gramíneas. Sobre a dinâmica ambiental dos sistemas fluviais considerou-se os seguintes ambientes ecodinâmicos descritos em SOUZA (2000): Ambientes estáveis: potencial erosivo reduzido devido estabilidade morfogenética. A cobertura vegetal protege o solo por conta de seu estado conservado ou pouco degradado. Ambientes de transição: marcado pela preponderância de processos morfogenéticos ou pedogenéticos favorecendo outra condição ao ambiente sendo estável ou instável. Ambientes instáveis: evidencia de atividades de elevado poder erosivo comprometendo a capacidade produtiva dos recursos naturais e por consequência comprometimento do contingente vegetacional. Cada um dos ambientes determinados está relacionado ao comportamento sustentável e à vulnerabilidade das condições geoambientais em função dos impactos acionados por processos de degradação expostos em SOUZA(2000). Quanto às categorias qualitativas privilegiou-se o atual potencial dos recursos naturais em: - Sustentabilidade moderada: capacidade produtiva razoável, aproveitamento satisfatório dos recursos hídricos com possibilidade de uso dos potenciais paisagísticos. 5 Tema 3- Geodinâmicas: entre os processos naturais e socio-ambientais - Sustentabilidade alta: áreas com boa capacidade produtiva mas com limitações mitigáveis com tecnologias simples, considerando os recursos hídricos e seu escoamento superficial. Ainda com base no atual potencial dos recursos naturais foram consideradas as seguintes categorias de vulnerabilidade: - Vulnerabilidade Baixa: áreas que apresentam características contidas nos setores de sustentabilidade alta. - Vulnerabilidade Moderada: áreas que apresentam características contidas nos ambientes com sustentabilidade moderada. - Vulnerabilidade Alta: áreas cujas condições de sustentabilidade se enquadram nas categorias de sustentabilidade baixa e muito baixa. A possibilidade de se detectar o grau de vulnerabilidade do ambiente com enquadramento dos geossistemas em uma determinada categoria de meio, serve de base para indicar condições favoráveis ou limitantes para o uso dos recursos naturais. Resultados e discussões Os lagos e lagoas naturais da Zona Costeira Cearense têm tido seu uso intensificado nos últimos anos. O turismo e o abastecimento de empreendimentos que se instalam no litoral são os principais motivadores da intensificação do uso destes corpos d’água. (AQUASIS/SEMACE, 2003). Problemas que afetam a zona litorânea do Ceará são detectáveis de modo conspícuo. Alguns são comuns a toda a zona costeira, como: migração de dunas, erosão da linha da costa, desmatamentos de manguezais e de matas ciliares, assoreamento ou aterramento de lagoas ou de áreas de acumulação inundáveis, poluição dos recursos hídricos superficiais, deposição de resíduos sólidos, entre outros, são alguns problemas que afetam e impactam a zona costeira (SOUZA, 2003). 6 VI Seminário Latino Americano de Geografia Física II Seminário Ibero Americano de Geografia Física Universidade de Coimbra, Maio de 2010 Figura 03 – Lagoa das Almécegas - pontos cotados em campo destacando a presença de barracas, plantação de coqueiros, barramento da Lagoa, trilha (Fotografia aérea - IPECE, 2007) O destaque para a ocupação da lagoa está na distribuição dessa ocupação, pois, na margem a qual pertence o município de Paraipaba, foi observado em campo que é instalado um restaurante estruturado para a recepção de turistas, enquanto que na porção pertencente ao município de Trairi as instalações são de pequenas residências e barracas dos próprios moradores. (Figs.03,04,05,06 e 07) 7 Tema 3- Geodinâmicas: entre os processos naturais e socio-ambientais Figuras 04 e 05 - Lagoa das Almécegas em Paraipaba, observar as diferenças entre a estrutura para o turismo em relação ao lado da Lagoa que fica em Trairi. Figuras 06 e 07 - Lagoa das Almécegas Trairi, moradores utilizam a água para atividades domésticas (2009). Os impactos ambientais ocasionados pelos conflitos de uso da terra, afetam a organização do espaço impedindo sua auto organização e recuperação, ou seja, quanto maior o grau de ocupação, mais vulnerável será o ambiente implicando em uma menor capacidade de suporte. De acordo com Souza (2000) os ecossistemas costeiros são complexos e de alta produtividade, têm sido bastante explorados e degradados, podendo produzir efeitos negativos no recrutamento de espécies de importância à pesca e na manutenção de barreiras naturais contra a erosão costeira. De acordo com a tabela 01 tem-se um esboço da caracterização e impactos ambientais nas unidades morfológicas da área em estudo. 8 VI Seminário Latino Americano de Geografia Física II Seminário Ibero Americano de Geografia Física Universidade de Coimbra, Maio de 2010 TABELA I – CARACTERIZAÇÃO E IMPACTOS AMBIENTAIS NAS UNIDADES MORFOLÓGICAS Unidades Morfológicas Impactos ambientais Riscos Vulnerabilidade Elevada vulnerabilidade à expansão urbana e ao tráfego de veículos; Ocupação em áreas de dunas Contaminação da construção de vias de promovendo a água armazenada no Campo de acesso. Vulnerabilidade desconfiguração da paisagem aqüífero dunar; dunas móveis elevada do aqüífero dunar; Implantação de vias extinção do campo e fixas quanto ao incremento da de acesso; acúmulo de lixo; de dunas; danos à exploração do recurso Impermeabilização do solo. fauna e flora. hídrico e problemas de saneamento dos efluentes domiciliares. Ocupação das margens por Danos à empreendimentos turísticos biodiversidade, e de moradores de baixa qualidade da água Elevada vulnerabilidade Lagoas renda; Agricultura ; Fragmentação das ao uso e ocupação de interdunares Psicultura ; lançamento de lagoas devido à suas margens e leitos. esgotos e desmatamento da agricultura.Danos à mata ciliar. fauna e flora local. Tabela 01 : Baseada em SOUZA(2002) e AQUASIS/SEMACE(2003) Nesse sentido, a paisagem da Lagoa das Almécegas, encontra-se fortemente impactada pela forma desordenada com que as atividades econômicas têm se desenvolvido, tal fato pode ser verificado em outras áreas do Estado cearense, denotando uma tendência insustentável de uso e ocupação da Zona Costeira, agravado pelo crescimento populacional, causando grandes prejuízos para a população. 9 Tema 3- Geodinâmicas: entre os processos naturais e socio-ambientais Referências Bibliográficas AQUASIS/SEMACE. 2003. A zona costeira do Ceará:Diagnóstico para a gestão integrada. Fortaleza-Ce. BERTRAND, G. 1972.13 caderno de ciências da terra – Paisagem e geografia física global. Universidade de São Paulo Instituto de geografia. MEIRELES, A. J. A., VICENTE DA SILVA, E. 2002.Abordagem geomorfológica para arealização de estudos integrados para o plenejamento e gestão em ambientes flúvio-marinhos. Scripta Nova. Revista electrónica de geografía y ciencias sociales, Universidad de Barcelona, vol. VI, núm. 118. http://www.ub.es/geocrit/sn/sn118.htm [ISSN: 1138-9788]. SILVA, R. L. 2007.Evolução morfodinâmica e hidrológica direcionada ao manejo de Lagoas Costeiras Tropicais. Estudo de caso: Lagoa das Almécegas, ParaipabaTrairi/Ce.Dissertação, UFC. SOUZA, M.J.N. et al. 2000. Compartimentação Territorial e Gestão Regional do Ceará. Fortaleza: FUNCEME, pg. 01 – 96. 10