C apítu lo Elementos de Hidrometeorologia 3 1. FATORES CLIMÁTICOS A hidrologia de uma região depende principalmente de seu clima e secundariamente de sua topografia e geologia. A topografia influencia a precipitação, a ocorrência de lagos, pântanos e a velocidade do escoamento superficial. A geologia, além de influenciar a topografia, define o local de armazenamento da água proveniente da precipitação, ou seja, na superfície (rios e lagos) ou no subsolo (escoamento subterrâneo ou confinada em aqüíferos) (Villela, 1975). O clima de uma região é altamente dependente de sua posição geográfica em relação à superfície terrestre. Os fatores climáticos mais importantes são a precipitação e o seu modo de ocorrência, umidade, temperatura e ventos, os quais diretamente afetam a evaporação e a transpiração. 1.1. UMIDADE Existe sempre alguma água, na forma de vapor, misturado com o ar por toda a atmosfera. A condensação deste vapor é que origina a maioria dos fenômenos do tempo: nuvens, chuva, neve, nevoeiro, orvalho e etc., assim a compreensão do estudo do vapor d’água na atmosfera é de grande importância para a hidrologia. A quantidade de vapor d’água no ar expressa-se simplesmente pela relação peso/volume (ex.: gramas/m3) Existe um limite para a quantidade de vapor d’água que um dado volume de ar pode suportar, e quando esse limite é alcançado, diz-se que o ar está saturado. O ar quente pode suportar mais vapor do que o ar frio, para cada grau de elevação da temperatura, verifica-se, também um aumento do conteúdo do vapor d’água para a saturação. A pressão atmosférica decorre de uma composição de pressões parciais exercidas pelos gases que a constituem. A parcela de pressão devida a presença do vapor d’água é denominada pressão de vapor d’água (e). Suponha uma superfície de água em evaporação, em um sistema fechado, envolta em ar. Cap. 3 Elementos de Hidrometeorologia 2 Sob a ação de uma fonte de calor, a água vai sendo evaporada até o estado de equilíbrio, quando o ar está saturado de vapor e não pode mais absorvê-lo. As moléculas de vapor d’água exercerão então uma pressão, denominada pressão de saturação de vapor d’água (es), para determinada temperatura do sistema. O valo de es muda com a temperatura como mostra a figura 1. Figura 3.1 – pressão de saturação de vapor (Fonte: Wilson, 1969) A figura 1 mostra que ocorre com a parcela de ar P, com pressão de vapor “e” e temperatura “t”. Uma vez que o ponto “P” se encontra abaixo da curva de pressão de saturação de vapor, está claro que a massa de ar pode absorver mais umidade. Teoricamente a saturação do ar pode se dar por três processos básicos: 1. Processo isotérmico – a temperatura é mantida constante e o vapor d’água é incorporado ao ar para suprir sua deficiência de umidade (ds). ds = es - e Cap. 3 Elementos de Hidrometeorologia 3 2. Processo isobárico – a pressão é conservada constante e o ar é submetido a um resfriamento até interceptar a curva de saturação de vapor. Está temperatura corresponde a temperatura do ponto de orvalho (t d). 3. Livre saturação – se a água evapora livremente dentro da massa de ar, a saturação é atingida a pressão e temperaturas diferentes das que tinha inicialmente, uma vez que a evaporação necessita de calor (calor latente de evaporação), que é retirado do próprio ar. Assim a medida que a umidade e a pressão aumentam, a temperatura diminui. O ponto P irá se mover na diagonal até atingir a curva de saturação a uma temperatura t w denominada de “temperatura do bulbo úmido”. 1.1.1. UMIDADE RELATIVA Em geral o ar não está saturado; contém apenas uma fração do vapor d’água possível. Essa fração, expressa em percentagem, é denominada umidade relativa (ur ). ur = 100 e (%) es Tabela 3.1 – Conteúdo de vapor d’água no ar em várias umidades relativas (Fonte: Forsdyke, 1969) Conteúdo de vapor d’água (g/m3) Temperatura 59,3 34,0 18,7 9,8 4,9 40°C 100% 57% 31% 17% 8% 30°C --- 100% 55% 29% 14% 20°C --- --- 100% 52% 26% 10°C --- --- --- 100% 50% 0°C --- --- --- --- 100% Cap. 3 Elementos de Hidrometeorologia 4 1.2. PSICRÔMETRO Instrumento empregado para a medição da umidade atmosférica. Ele consiste de dois termômetros – o de bulbo úmido e o de bulbo seco. Figura 3.2 – Diagrama de um psicrômetro, mostrando o princípio do termômetro de bulbo úmido. (Fonte: Villela, 1975) O valor de “e” para uma dada temperatura é obtido pela equação: (e w − e ) = γ (t − t w ) Onde: t w – Temperatura do termômetro de bulbo úmido t – Temperatura do termômetro de bulbo seco ew – Pressão de vapor correspondente a temperatura tw (Tabela 3.2) γ – Constante do psicrômetro (γ = 0,66 se e (mb), t (°C) e velocidade do ar entre os bulbos de 3m/s) (γ = 0,485 se e (mmHg) ) Cap. 3 Elementos de Hidrometeorologia Tabela 3.2 – Pressão de saturação de vapor (e s ) em mmHg em função da temperatura em °C. t (o C) es 0.1 0.2 0.3 0.4 0.5 0.6 0.7 0.8 0.9 -10 0.0 2.15 -9 -8 -7 2.32 2.51 2.71 2.30 2.49 2.69 2.29 2.47 2.67 2.27 2.45 2.65 2.26 2.43 2.63 2.24 2.41 2.61 2.22 2.40 2.59 2.21 2.38 2.57 2.19 2.36 2.55 2.17 2.34 2.53 -6 -5 -4 2.93 3.16 3.41 2.91 3.14 3.39 2.89 3.11 3.37 2.86 3.09 3.34 2.84 3.06 3.32 2.82 3.04 3.29 2.80 3.01 3.27 2.77 2.99 3.24 2.75 2.97 3.22 2.73 2.95 3.18 -3 -2 -1 3.67 3.97 4.26 3.64 3.94 4.23 3.62 3.91 4.20 3.59 3.88 4.17 3.57 3.85 4.14 3.54 3.82 4.11 3.52 3.79 4.08 3.49 3.76 4.05 3.46 3.73 4.03 3.44 3.70 4.00 -0 ------0 4.58 ------4.58 4.55 ------4.62 4.52 ------4.65 4.49 ------4.69 4.46 ------4.71 4.43 ------4.75 4.40 ------4.78 4.36 ------4.82 4.33 ------4.86 4.29 ------4.89 1 2 3 4.92 5.29 5.68 4.96 5.33 5.72 5.00 5.37 5.76 5.03 5.40 5.80 5.07 5.44 5.84 5.11 5.48 5.89 5.14 5.53 5.93 5.18 5.57 6.97 5.21 5.60 6.01 5.25 5.64 6.06 4 5 6 6.10 6.54 7.01 6.14 6.58 7.06 6.18 6.54 7.11 6.23 6.68 7.16 6.27 6.72 7.20 6.31 6.77 7.25 6.36 6.82 7.31 6.40 6.86 7.36 6.45 6.91 7.41 6.49 6.96 7.46 7 8 9 7.51 8.04 8.61 7.56 8.10 8.67 7.61 8.15 8.73 7.67 8.21 8.78 7.72 8.26 8.84 7.77 8.32 8.90 7.82 8.37 8.96 7.88 8.43 9.02 7.93 8.48 9.08 7.98 8.54 9.14 10 11 12 9.20 9.84 10.52 9.26 9.90 10.58 9.33 9.97 10.66 9.39 10.03 10.72 9.46 10.10 10.79 9.52 10.17 10.86 9.58 10.24 10.93 9.65 10.31 11.00 9.71 10.38 11.08 9.77 10.45 11.15 13 14 15 11.23 11.98 12.78 11.30 12.06 12.86 11.38 12.14 12.95 11.75 12.22 13.03 11.53 12.96 13.11 11.60 12.38 13.20 11.68 12.46 13.28 11.76 12.54 13.37 11.83 12.62 13.45 11.91 12.70 13.54 16 17 18 13.63 14.53 15.46 13.71 14.62 15.56 13.80 14.71 15.66 13.90 14.80 15.76 13.99 14.90 15.96 14.08 14.99 15.96 14.17 15.09 16.06 14.26 15.17 16.16 14.35 15.27 16.26 14.44 15.38 16.36 19 20 21 16.46 17.53 18.65 16.57 17.64 18.77 16.68 17.75 18.88 16.79 17.86 19.00 16.90 17.97 19.11 17.00 18.08 19.23 17.10 18.20 19.35 17.21 18.31 19.46 17.32 18.43 19.58 17.43 18.54 19.70 22 23 24 19.82 21.05 22.27 19.94 21.19 22.50 20.06 21.32 22.63 20.19 21.45 22.76 20.31 21.58 22.91 20.43 21.71 23.05 20.58 21.84 23.19 20.69 21.97 23.31 20.80 22.10 23.45 20.93 22.23 23.60 25 26 27 23.75 25.31 26.74 23.90 25.45 26.90 24.03 25.60 27.05 24.20 25.74 27.21 24.35 25.89 27.37 24.49 26.03 27.53 24.64 26.18 27.69 24.79 26.32 27.85 25.08 26.46 28.00 25.09 26.60 28.16 28 29 30 28.32 30.03 31.82 28.49 30.20 32.00 28.66 30.38 32.19 28.83 30.56 32.38 29.00 30.74 32.57 29.17 30.92 32.76 29.34 31.10 32.95 29.51 31.28 33.14 29.68 31.46 33.33 29.85 31.64 33.52 5 Cap. 3 Elementos de Hidrometeorologia 6 1.3. TEMPERATURA Geograficamente, há uma tendência de elevação de temperatura a medida que se aproxima do Equador. Verifica-se, entretanto, que a topografia e a vegetação pode comprometer este comportamento. Durante o dia, a incidência da radiação solar provoca o aquecimento da superfície, que alcança sua temperatura máxima algumas horas após o sol ter alcançado o seu zênite. As camadas inferiores da atmosfera são aquecidas pela radiação de onda longa emitida pela superfície terrestre. Devido a diversos processos de troca de calor no sistema Terra-Atmosfera, existe uma distribuição de temperatura também segundo a direção vertical, conhecida como gradiente vertical de temperatura (-0,65°C/100m). O estudo desse gradiente é importante para a influência da estabilidade atmosférica. Associados aos processos de evolução do ar, são definidos três gradientes teóricos: 1. Gradiente de temperatura adiabática seca (α α d) • Parcela de ar ascendente • Se expande devido ao decréscimo de pressão • Temperatura decresce (-1°C/100m) 2. Gradiente de temperatura adiabática saturada (α α s) • Quando a parcela de ar em ascensão atinge o nível de condensação, a pressão continua decrescente. • Gradiente menor (-0,54°C/100m) 3. Gradiente de temperatura pseudo-adiabático. 1.4. ESTABILIDADE E INSTABILIDADE Uma vez que ar aquecido decresce em densidade, ele tende a se tornar mais leve. Entretanto a superfície terrestre não é homogênea e faz com que o ar seja aquecido de forma desigual, o que resulta no aparecimento de camadas de ar com diferentes densidades; surgem então forças ascendentes que elevam o ar mais quente (mais leve) através do ar vizinho mais frio (mais denso). Cap. 3 Elementos de Hidrometeorologia 7 Obviamente, o gradiente de temperatura dentro de uma camada atmosférica é diferente daqueles referentes a adiabática seca e a adiabática saturada. A relação entre o gradiente e a temperatura do ambiente atmosférico ( γ ) e o gradiente da adiabática seca é que determina a umidade convectiva do ar. Seja, por hipótese, que uma partícula de ar seco em equilíbrio térmico com o meio ambiente seja levada, por algum motivo, a uma altitude maior que a inicial. O movimento ascendente da partícula não modifica a estrutura da atmosfera circunvizinha. Como a parcela sob verticalmente, ela esfria a uma taxa (Γ) (adiabática seca), enquanto que a temperatura ambiente decresce a uma taxa ( γ ). Se γ < Γ : Γ (parcela) tparc < tamb γ (amb) mais frio, mais denso parcela desce (ESTÁVEL) Se γ > Γ : γ (amb) Γ (parcela) tparc > tamb mais quente, menos densa (INSTÁVEL) Figura 3.3 – Estabilidade e Instabilidade convectiva (Fonte: VILLELA,1975). Cap. 3 Elementos de Hidrometeorologia 8 Caso a parcela não esteja saturada, começará, no inicio a comportar-se como ar seco em ascensão (α α d). entretanto, em um dado momento, chegará à temperatura de ponto de orvalho e passará a comporta-se como ar saturado (α α s). A umidade que foi condensada do ar resfriado em ascensão torna-se visível como nuvem, sendo a sua base representativa do nível de condensação. O topo da nuvem continua a se desenvolver até alcançar uma camada estável. Figura 3.4 – Ascensão do ar úmido. (Fonte: FORDSDYKE,1969). Figura 3.5 – Formas de precipitação. (Fonte: Raudikivi,1979). Cap. 3 Elementos de Hidrometeorologia 9 1.5 VENTO O ar esta em movimento e isto é sentido como vento. Ele influencia processos hidrometeorológicos, uma vez que, ao retirar a camada de ar saturado próxima ao solo e substituí-la por uma com menos umidade, faz com que o processo de evaporação seja contínuo. São precisos dois fatores para especificar o vento: direção e velocidade. Devido a sua posição em relação a circulação geral da atmosfera, o Nordeste tem vento prevalecentes do sudeste, que podem se tornar mais zonais de acordo com a época do ano (estação chuvosa). Figura 3.6 – Direção média dos ventos de superfície em janeiro. (Fonte: Raudikivi, 1979) Cap. 3 Figura 3.7 – Elementos de Hidrometeorologia Campos de umidade relativa, movimento vertical (500mb) e campos de vento (200mb e 850mb) (Fonte: NMC/SAD). 10