Revascularização Transmiocárdica com Laser de CO2. Experiência

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Arq Bras Cardiol
volume 72, (nº 4), 1999
Oliveira
e cols.
Artigo
Original
Revascularização miocárdica com laser
Revascularização Transmiocárdica com Laser de CO2.
Experiência Clínica Inicial
Sérgio Almeida de Oliveira, Luis Alberto Oliveira Dallan, Luiz Augusto F. Lisboa,
Maria Cristina Chavantes, Luiz Antonio Machado Cesar, Miriam M. Pardi, Adib D. Jatene
São Paulo, SP
Objetivo - Análise clínica inicial de pacientes com doença coronariana obstrutiva acentuada e difusa, submetidos à revascularização transmiocárdica a laser (RTML).
Métodos - De fevereiro/98 a fevereiro/99 no Instituto
do Coração do HC FMUSP, foram operados 20 pacientes
com RTML de CO2, como procedimento isolado, ou em
associação com a cirurgia convencional. Todos apresentavam coronariopatia acentuada e difusa, com angina de
repouso ou aos pequenos esforços e que não respondiam
ao tratamento clínico. Foi realizada RTML como procedimento isolado, em 14 pacientes, e associada às pontes de
veia safena em 6, sendo que a metade destes já havia sido
previamente operada, com cirurgia clássica ou submetida
à angioplastia coronariana. A idade dos paciente variou
de 45 a 74 (média de 60,7) anos.
Resultados – Todos pacientes eram portadores de lesões coronarianas triarteriais, com função ventricular
normal ou levemente comprometida. Não houve óbitos
imediatos ou tardios . O tempo de seguimento pós-operatório foi de 1 a 13 (média 6,6) meses. A angina melhorou
consideravelmente após a operação, ficando 85% dos
pacientes livres de angina e 15% permanecendo com angina, mas referindo melhora em relação ao pré-operatório. Ao lado da melhora da angina os pacientes referiam
melhor tolerância aos esforços físicos.
Conclusão - Os autores acreditam que esta técnica
possa ser aplicada com baixo risco e ser muito útil para
um grupo selecionado de pacientes.
Palavras-chave:
revascularização do miocárdico, cirurgia
a laser, isquemia miocárdica
Instituto do Coração do Hospital das Clínicas - FMUSP
Correspondência: Sérgio Almeida de Oliveira – Incor – Av. Dr. Enéas C. Aguiar, 44
2º - 05403-000 – São Paulo, SP
Recebido para publicação em 1/3/99
Aceito em 3/4/99
Atualmente, existe um grande número de pacientes
muito sintomáticos, com doença coronariana obstrutiva
acentuada e difusa, com miocárdio isquêmico, mas ainda
viável, alguns já previamente submetidos a um ou mais procedimentos de revascularização miocárdica, por cirurgia ou
por angioplastia, e que não são mais passíveis de tratamento pelos métodos tradicionais.
Desde a descrição dos sinusóides miocárdicos no coração humano por Wearn e cols. 1 muitas técnicas de
revascularização miocárdica foram desenvolvidas, procurando corrigir a isquemia através desta peculiaridade da
angioarquitetura da circulação coronariana. A operação
descrita por Vineberg 2, com o implante da artéria torácica
interna no miocárdio isquêmico, foi a que alcançou maior
sucesso, embora abandonada com o advento da cirurgia de
revascularização direta das artérias coronárias pelas pontes de veia safena 3 ou de artéria torácica interna 4.
Estudos de anatomia comparada mostraram que, em
corações de alguns répteis, a nutrição e oxigenação do
miocárdio é obtida, na maior parte, por canais que comunicam, amplamente, a cavidade ventricular com os espaços
sinusoidais, muito desenvolvidos nesses animais. A criação de canais, comunicando a cavidade ventricular com os
sinusóides, no miocárdio humano, foi inicialmente tentada
por Sen e cols. 5, usando agulhas para a perfuração do
miocárdio. A utilização do laser para a obtenção destes canais foi iniciada por Mirhoseini e cols. 6, que testaram vários
tipos de laser e concluíram que o laser de CO2 produzia menor dano ao miocárdio, possibilitando a maior durabilidade
dos canais.Com estas informações, Mirhoseini e cols. 7 empregaram, pioneiramente, o laser de CO2, usando-o em associação com a cirurgia de revascularização miocárdica pelos métodos convencionais.
No início dos anos 90 foi desenvolvido um laser de
CO2 de alta potência (Heart Laser, PLC Medical Systems
Inc., Franklin, MA - USA), possibilitando sua aplicação em
corações batendo, dispensando o uso da circulação
extracorpórea. Um estudo piloto, realizado em 15 pacientes,
mostrou que esta técnica, usada como tratamento isolado,
era segura e melhorava os sintomas dos pacientes. A se-
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guir, um grande ensaio clínico, não randomizado, foi realizado em oito centros médicos, sendo operados 201 pacientes
com angina classe funcional (CF) III e IV, considerados não
adequados para cirurgia convencional ou angioplastia. Os
resultados foram favoráveis, mostrando mortalidade imediata de 9%,sobrevida de 83% após um ano e melhora acentuada da angina em 75% dos pacientes 8. Com esses resultados favoráveis, em 1995 um novo estudo prospectivo, randomizado e multicêntrico foi iniciado, comparando a revascularização transmiocárdica a laser (RTML) com o tratamento clínico continuado 9. Nesse estudo todos os pacientes
tinham angina CF III e IV e não eram candidatos à cirurgia
convencional ou angioplastia. A transferência do grupo clínico para o grupo cirúrgico era permitida em caso de agravamento dos sintomas, exigindo internação em unidade de tratamento intensivo, por mais de 48h. Esse estudo, após 12
meses de seguimento, mostrou a superioridade da RTML em
comparação ao tratamento clínico, com significativa melhora
da angina, da qualidade de vida e da perfusão miocárdica 9.
Em 1998 a Food and Drug Administration (FDA) aprovou
a utilização do RTML de CO2 para tratamento de pacientes
com angina intensa não adequados para cirurgia convencional ou angioplastia. No Brasil, a RTML foi iniciada por
Galantier e cols. 10 em 1995 e os resultados apresentados
durante o 23° Congresso Nacional de Cirurgia Cardíaca.
Neste trabalho apresentamos os resultados iniciais de
uma série de 20 pacientes, operados no Instituto do Coração do HC da FMUSP,com RTML de CO2, como procedimento isolado ou associado à cirurgia de revascularização
direta das artérias coronárias.
Métodos
De fevereiro/98 a fevereiro/99, foram operados 20 pacientes, sendo 16 homens e 4 mulheres, com idades variando de 45 a 74 (média de 60,7) anos, todos com lesões multiarteriais e fração de ejeção do ventrículo esquerdo (FEVE)
>45%. As lesões coronarianas eram acentuadas e difusas
não sendo, portanto, adequadas para cirurgia ou angioplastia. Doze pacientes tinham angina estável e oito angina
instável (fig. 1). Em 14 casos, a revascularização com laser foi
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o único procedimento realizado, enquanto que nos outros 6,
antecedendo à aplicação do laser, haviam sido realizadas
anastomoses sistêmico-coronarianas, em artérias ainda viáveis para revascularização direta. Dez pacientes tinham se
submetido, anteriormente, à cirurgia de revascularização
miocárdica (tab. I).
Todos os pacientes apresentavam angina de CF III ou
IV não controlada com medicação. Isquemia miocárdica foi
demonstrada através da cintilografia miocárdica com tálio
201 e pela ecocardiografia com estresse farmacológico.
Não foram aceitos para o tratamento com laser, os pacientes com infarto transmural recente, com doença pulmonar obstrutiva crônica grave, arritmias ventriculares graves
não controladas por medicamentos e pacientes com FEVE
<45% ou com insuficiência cardíaca congestiva grave.
As operações foram realizadas sob anestesia geral
com entubação orotraqueal com sonda de único lúmen. Todos os pacientes foram monitorados, logo após a indução
anestésica, com cateter de Swan-Ganz e um sensor esofágico para ecocardiografia, com a finalidade de monitorar o
desempenho cardíaco. O ecocardiograma foi também utilizado para se assegurar, que o canal criado pelo laser, havia
penetrado na cavidade ventricular esquerda. O acesso ao
coração, nos pacientes que apenas receberam a aplicação
do laser, foi através de minitoracotomia ântero-lateral esquerda, no 4° ou 5° espaços intercostais. Nas operações
combinadas, o acesso foi através de esternotomia mediana
anterior. Nas toracotomias ântero-laterais, o pericárdio
parietal foi incisado, anteriormente, ao nervo frênico, com exposição das faces anterior, lateral e inferior do ventrículo esquerdo. Nos pacientes com cirurgia combinada do laser com
a revascularização miocárdica, o acesso e a técnica utilizados
para a cirurgia de revascularização, com os enxertos arteriais
ou venosos, foi a clássica, sendo a aplicação do laser realizada após interrompida a circulação extracorpórea e revertida a
heparinização pela administração do sulfato de protamina.
O laser utilizado foi o Heart Laser de CO2 com 800W
(PLC Medical Systems, Milford, MA - USA). A aplicação do
laser foi sempre sincronizada com o eletrocardiograma
(ECG), sendo o disparo iniciado, imediatamente, após o pico
da onda R, atingindo o coração durante o período refratário
do ciclo cardíaco, eliminando o risco de indução de arritmias
e permitindo que o laser atingisse a cavidade ventricular
durante a diástole. O laser tem baixa penetração na água, de
modo semelhante, quando atinge o sangue na cavidade
ventricular, a energia se dissipa, produzindo um efeito, visto
F=4
M = 16
Tabela I - Procedimento cirúrgico realizado em 20 pacientes
submetidos a revascularização transmiocárdica com laser (RTML)
de CO2, laser isolado ou laser combinado com a revascularização
do miocárdio clássica.
1ª Operação
Reoperação
Total
Fig. 1 - Distribuição demográfica, pré-operatória, de 20 pacientes submetidos a
revascularização transmiocárdica com laser de CO2.
442
Laser
Combinada
Total
6
8
14
4
2
6
10
10
20
RTML: Procedimento cirúrgico
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pelo ecocardiograma como se fossem bolhas gasosas, permitindo deste modo a confirmação de que o canal perfurado
havia atingido a cavidade ventricular. A energia de pulso
utilizada foi de 20 a 30 joules. O número de canais ou perfurações efetivas variou de 15 a 51 com média de 31 perfurações por paciente (fig. 2). No local da perfuração houve um
sangramento que cessou rapidamente por leve compressão
externa. Raramente, houve necessidade de ser dado um
ponto para hemostasia. A aplicação do laser é dirigida para
as áreas isquêmicas, evitando-se que os tiros atinjam as artérias coronárias epicárdicas mais calibrosas, assim como
também as veias maiores.
Durante todo o procedimento cirúrgico e nas primeiras
24h de pós-operatório, o paciente recebe nitroglicerina por
via venosa. A permanência na unidade de cuidados intensivos depende do procedimento realizado, sendo de um dia
para os pacientes submetidos a aplicação isolada do laser,
ou de dois dias nas operações combinadas.
Resultados
Os resultados iniciais desta série foram bons. Não
houve óbitos imediatos, nem durante a evolução pós-operatória que se estendeu de 1 a 13 (média de 6,6) meses de
seguimento. Nenhuma complicação maior foi observada
nestes pacientes, não ocorrendo infarto do miocárdio e nenhum paciente necessitando ser reoperado por sangra-
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mento. Um paciente com cirurgia de pontes de veia safena,
realizada numa primeira operação e que apresentava uma
ponte pérvia para a 1ª artéria diagonal, mas com lesões degenerativas graves, teve no 2° dia de pós-operatório um episódio prolongado de angina, mas não houve elevação de CKMB e nem aparecimento de onda Q ao ECG. Este episódio foi
interpretado como provável oclusão de antiga ponte. Todos
os pacientes foram reestudados no pós-operatório imediato
com cintilografia pelo tálio 201 e cinco pacientes submeteram-se ao estudo ecocardiográfico com estresse farmacológico, sendo que em nenhum foi possível detectar alguma melhora evidente da perfusão miocárdica. Um paciente,
com revascularização miocárdica prévia, além de angioplastia coronariana foi submetido a nova cinecoronariografia
três meses após a cirurgia. Nesta operação foi apenas realizada a RTML e nenhuma modificação expressiva foi observada. Este paciente ainda apresenta angina, embora com
melhora em comparação ao pré-operatório. Um paciente com
angina não controlada e insuficiência cardíaca, compensada
antes da operação, necessitou ser reinternado no 2º mês de
pós-operatório para compensação de novo episódio de insuficiência cardíaca, rapidamente compensada. Era diabético, muito obeso e não teve mais angina, nem mesmo quando da internação para tratamento da insuficiência cardíaca.
Observação de grande significado clínico foi a da evolução da angina. Todos os pacientes apresentaram melhora da
CF. Na figura 3 pode-se verificar que no pré-operatório todos
os pacientes apresentavam angina CF III ou IV. Após a operação, observamos que 17 pacientes estavam sem angina e que
somente três ainda apresentavam angina aos grandes ou médios esforços, mas todos referem melhor desempenho nas atividades físicas. Dos três pacientes que continuam sintomáticos, dois foram submetidos à cirurgia isolada com o laser e um
já era revascularizado previamente. Ainda devemos assinalar
que, embora o tempo médio de seguimento seja ainda pequeno, a melhora da angina referida pelos pacientes tem sido
progressiva, isto é, tem melhorado com o passar do tempo.
Discussão
A utilização do laser, como método de revascularização miocárdica, iniciado há pouco tempo, teve um rápido
Fig. 2 - Intra-operatório mostrando os canais criados pelo laser de CO2 no ventrículo
esquerdo.
Fig. 3 - Evolução da classe funcional da angina em 20 pacientes submetidos a
revascularização transmiocárdica a laser de CO2. Comparação entre o pré e o pósoperatório (seguimento médio de 6,6 meses).
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desenvolvimento, antes mesmo que as bases científicas
desta técnica fossem adequadamente conhecidas, ocorrido, provavelmente, como conseqüência dos bons resultados relatados em vários ensaios clínicos, para grupos selecionados de pacientes, e, sobretudo, pela existência de um
grande número de pacientes que hoje sobrevive com doença coronariana obstrutiva grave, após submetido previamente a vários procedimentos cirúrgicos ou de angioplastia. Estes pacientes, com miocárdio isquêmico viável e com
angina não controlada clinicamente, são um desafio para os
médicos que necessitam encontrar uma maneira de minorar
o sofrimento, frente a impossibilidade de serem submetidos
a um novo procedimento cirúrgico convencional.
Em nossa série, não ocorreu nenhum óbito, concordando com a literatura, que refere que o risco de morte imediata está relacionado sobretudo a instabilidade das manifestações clinicas, sendo tanto maior o risco, quanto mais
próximo dos episódios agudos forem realizadas as operações. March 9 relata mortalidade imediata de 27% quando os
pacientes foram operados dentro de um a sete dias de um
episódio de angina instável, caindo para 16% quando o intervalo foi de 8 a 14 dias e para 1% nos operados com mais
de 15 dias. Em nossa série, embora oito pacientes tivessem
o diagnóstico de angina instável, nenhum estava em unidade de terapia intensiva e sob o uso endovenoso de nitroglicerina e heparina. Ainda nesse trabalho9, que é referente ao
estudo multicêntrico que comparou RTML com o tratamento
clinico, observou-se que 60% dos pacientes primeiramente
alocados no grupo clinico, precisaram ser operados por
agravamento das condições clinicas. A cirurgia realizada
nesses pacientes, durante episódio de angina instável, teve
taxa de mortalidade imediata mais elevada, quando comparada com a dos pacientes operados após, pelo menos 15 dias,
do episódio agudo de insuficiência coronariana.
Mais destacável em nossa série, foi a importante melhora da angina, presente antes da operação, em repouso ou
aos pequenos esforços, e desaparecida em 85% ou diminuída de intensidade e freqüência nos demais, num seguimento
pós-operatório de um a 13 meses. Ao lado do alívio da angina, os pacientes referem maior tolerância aos exercícios físicos. Em relato com casuística maior e com mais longo tempo
de seguimento pós-operatório vem sendo observado que a
melhora da angina é progressiva no 1º ano e que persiste em
acompanhamento de até três anos 11.
Melhora da perfusão miocárdica após a RTML tem sido
descrita por vários autores. Cooley e cols. 12 têm referido
melhora da perfusão miocárdica em estudos com Positron
Emission Tomography. Muito interessante foi a observação
no estudo prospectivo e randomizado, que comparou o resultado da RTML com o tratamento clínico, quanto à
perfusão miocárdica. Estudos seriados da perfusão miocárdica, nesses pacientes, com tálio 201 durante estresse com
dipiridamol, mostrou para o grupo operado melhora de 20%
na perfusão miocárdica, enquanto no grupo tratado clinicamente, piora de 27%, na avaliação de 12 meses de pós-operatório comparativamente aos achados do pré-operatório 9.
Existe ainda grande controvérsia a respeito dos meca444
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nismos de ação do laser e da longa permanência da perviabilidade dos canais, comunicando a cavidade ventricular
com os sinusóides do miocárdio e, também, se eles teriam a
capacidade para transportar sangue, suficiente para melhorar a perfusão miocárdica. A perviabilidade a longo prazo
tem sido confirmada por alguns autores 13 e negada por outros 14,15. Muito importante parece ser o achado freqüente
em casos de necropsia ou nos trabalhos em animais de laboratório, da estimulação da angiogênese pela aplicação do
laser no miocárdio. Vários trabalhos têm mostrado evidências de que a RTML pode favorecer a angiogênese no
miocárdio isquêmico 16-19 e admitida a hipótese de que a lesão miocárdica, criada pelo laser, induz uma resposta inflamatória no miocárdio que, por sua vez, libera numerosas
citocinas e fatores de crescimento, além de estimular os receptores destes fatores 16. Também tem sido questionado se
esta reação inflamatória, induzida pelo laser e que estimula a
neoangiogênese, não é uma reação inespecífica a diferentes
traumas do miocárdio. Chu e cols. 20 testaram, em porcos, a
hipótese de que a revascularização transmiocárdica mecânica, com agulhas, poderia induzir resposta angiogênica similar àquela vista com o laser. Esses autores observaram que
a resposta foi semelhante, mas que foram necessários três
vezes mais perfurações com as agulhas, para se obter a
mesma densidade angiogênica.
Outro possível mecanismo sugerido para explicar a
melhora clínica dos pacientes submetidos a RTML é o da
denervação do miocárdio. Trabalho experimental em cães
realizado por Sundt e Kwong 21, conclui que a RTML, usando o holmium YAG laser destrói fibras nervosas cardíacas,
podendo contribuir para a melhora da angina observada,
precocemente, em pacientes submetidos a este tratamento.
Embora não sendo possível afastar esta possibilidade, fica
difícil explicar que a denervação possa ter um papel importante. A destruição de nervos poderia causar uma grande
preocupação, porque, sem a angina, o paciente estaria mais
exposto aos riscos da isquemia, levando ao aparecimento de
maior número de infartos do miocárdio ou de mortes súbitas,
o que não tem sido observado entre os pacientes operados.
Uma outra possibilidade para explicar a melhora dos
sintomas é o do efeito placebo, que, embora não possa ser
afastado, é pouco provável, pois seus benefícios não permaneceriam por um ano ou mais e, também, não seria esperada uma melhora progressiva dos sintomas .
Assim é possível que os benefícios da RTML sejam
devidos a vários mecanismos, como, por exemplo, a perfusão através dos canais, a angiogênese, a destruição das fibras nervosas, ou mesmo o efeito placebo. Por isto já estão
sendo iniciadas as investigações para o emprego simultâneo da RTML e da terapia genética, com injeção miocárdica
de fatores de crescimento angiogênicos 22. Com o progresso
das investigações sobre a terapêutica com o laser e com a
angiogênese, é possível que estas duas modalidades poderão ser aplicadas, conjuntamente, para se obter um efeito
mais intenso devido ao sinergismo destes métodos 23.
Muito interessante são também os resultados de um
estudo multicêntrico, prospectivo e randomizado que com-
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Revascularização miocárdica com laser
parou a cirurgia de revascularização direta das artérias
coronárias, como procedimento isolado, contra esta mesma
técnica usada em associação com RTML (holmium YAG
laser). Nesse estudo foram identificados para cirurgia clássica 221 pacientes, que apresentavam uma ou mais áreas de
miocárdio viável, mas não passiveis de serem tratadas pelas
pontes sistêmico-coronarianas. Os pacientes foram
randomizados em dois grupos: o 1º recebendo as pontes
para as áreas com artérias passíveis de serem revascularizada, mais a aplicação do laser nas áreas não viáveis; o 2º recebendo apenas as pontes para as áreas adequadas, enquanto que os territórios não passíveis de revascularização convencional foram deixados sem revascularização. A mortalidade (hospitalar ou 30 dias) previsível, determinada pela
análise de Parsonnet foi de 8,8% e 8,4%, respectivamente.
Entretanto, a mortalidade observada após a cirurgia foi, significativamente, menor para o grupo com a revascularização
associada a RTML (0,9%) do que a observada para a cirurgia isolada (7,0%), concluindo que a RTML, como método
complementar à cirurgia convencional, é segura e acarreta
diminuição da mortalidade em pacientes que não podem ter
revascularização completa pela cirurgia clássica isolada 24.
O presente trabalho não contou com um grupo controle,
entretanto é necessário salientar que os pacientes selecionados para a cirurgia de RTML estavam, a longo prazo, submetidos a rigoroso tratamento clínico sem obter melhora da angina.
Existe, portanto, uma grande expectativa sobre estas
novas modalidades terapêuticas, para um grupo crescente
de pacientes em estados avançados da doença obstrutivas
coronarianas, para os quais algumas esperanças começam a
aparecer.
Concluindo, a RTML isolada ou em associação com a
cirurgia convencional pode oferecer bons resultados para
um grupo selecionado de pacientes. Importante melhora da
angina, assim como maior tolerância aos exercícios, foram
observados em todos os pacientes. Assim, a RTML pode se
tornar uma boa alternativa para pacientes muito sintomáticos, que pela intensidade das lesões obstrutivas das artérias coronárias não sejam passíveis de correção cirúrgica pelas técnicas habituais.
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