PDF Português - Revista Adolescência e Saúde

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ARTIGO ORIGINAL
Karen Soto Perez Panisset1
Vera Lucia Mota da Fonseca2
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Patologia cervical na gestante
adolescente
HPV infection and development of genital lesions in pregnant adolescents
Resumo
O papilomavírus humano (HPV) é uma fonte significante de morbidade e mortalidade em todo mundo. A infecção pelo HPV é uma
das doenças sexualmente transmissíveis (DSTs) mais comuns em mulheres. Os fatores de risco primários para a aquisição do HPV
são geralmente associados à atividade sexual. Evidências sugerem que o preservativo fornece alguma proteção contra a infecção e a
progressão da doença, mas qualquer contato genital é suficiente para a transmissão. Ele é um vírus tão comum e transmissível, que
ter apenas um parceiro sexual frequentemente resulta em infecção. As taxas de prevalência cumulativa são da ordem de 82% entre
adolescentes de populações seletas. Quase todas as adolescentes sexualmente ativas e grávidas possuem alto risco de adquirir HPV.
Infecção persistente dos genótipos de alto risco (tipos 16 e 18) é considerada necessária para o desenvolvimento do câncer de colo
uterino, ao passo que a infecção pelos HPVs de baixo risco (tipos 6 e 11) se associa ao desenvolvimento dos condilomas genitais e a
lesões genitais de baixo grau. A maioria das infecções é assintomática e eficientemente debelada pelo sistema imunológico. Do mesmo modo, tanto as lesões de baixo quanto as de alto grau causadas por HPV podem regredir nas adolescentes, gestantes adolescentes
e adultas jovens. Os protocolos de tratamento permitem a observação de adolescentes, incluindo as grávidas, que desenvolvem
lesões de baixo grau. Essa conduta é preferível à colposcopia imediata nessa população. Apesar disso, uma pequena porcentagem
de gestantes adolescentes desenvolverá lesões intraepiteliais que podem progredir para câncer invasivo. As adolescentes, mesmo
grávidas, devem receber educação apropriada sobre o HPV e os riscos associados à infecção. Elas devem ser encorajadas a obter
acompanhamento ginecológico apropriado após o início da atividade sexual. Este artigo discute a infecção pelo HPV e o seu papel no
desenvolvimento de lesões de baixo e alto graus, câncer cervical e condilomas genitais em adolescentes grávidas.
Unitermos
HPV; gestante adolescente
Abstract
Human papillomavirus (HPV) is a significant source of morbidity and mortality worldwide. HPV is the most common sexually transmitted
infection (STI) in female. The primary risk factors for acquiring HPV are generally associated with sexual activity. Evidence suggests that
condoms provide some protection against infection and disease progression, but any genital contact is sufficient for HPV transmission. HPV is
so common and transmissible that having just one sexual partner often results in infection. Cumulative prevalence rates are as high as 82%
among adolescent women in select populations. As such, nearly all sexually active adolescents and pregnant adolescent are at high risk for
acquiring HPV. Persistent infection with high-risk HPV types (types 16 or 18) is considered necessary for the development of cervical cancer,
whereas infection with low-risk HPV types (types 6 or 11) is associated with the development of genital warts and other low-grade genital
abnormalities. Most infections are asymptomatic and are efficiently cleared by the immune system. Similarly, both low- and high-grade
lesions caused by HPV can regress in adolescent, pregnant adolescent and young adult women. Treatment guidelines allow for observation
of adolescent women who develop low-grade lesions rather than immediate colposcopy. Nonetheless, a small percentage of pregnant
adolescents will develop precancerous lesions that may progress to invasive cervical cancer. Adolescents and pregnant adolescents should
be given appropriate education about HPV and the dangers associated with infection. Adolescents should also be encouraged to obtain
appropriate gynecological care after initiating sexual activity. This article discusses HPV infection and the causal role that HPV plays in the
development of low- and high-grade genital lesions, cervical cancer, and genital warts in pregnant adolescents.
Key words
HPV; pregnant adolescent
1Médica do Serviço de Ginecologia do Hospital Universitário Clementino Fraga
Filho da Universidade Federal do Rio de Janeiro (HUCFF/UFRJ); professora de pósgraduação lato sensu em Videoendoscopia Ginecológica do Instituto Fernandes
Figueira da Fundação Oswaldo Cruz (IFF/FIOCRUZ).
2
Chefe do Setor de Patologia do Trato Genital Inferior do HUCFF/UFRJ; mestra em
Ginecologia pela UFRJ.
Adolescência & Saúde
volume 6 ■ nº 4 ■ outubro 2009
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Patologia cervical na gestante adolescente
Introdução
A adolescência é um período complexo na
vida do indivíduo e de sua família, cercado de modificações físicas e emocionais, que termina com a
chamada maturidade reprodutiva(18). É um processo dinâmico que não se restringe às transformações
corporais com a aquisição de um corpo adulto,
pois engloba também o desenvolvimento de novas
habilidades cognitivas e de um novo papel social.
A atenção à saúde do adolescente deve considerar a complexidade desse momento. Deve-se
tentar antecipar-se às questões físicas e emocionais
relacionadas com as novas experiências. Por outro
lado, o comportamento de risco do adolescente
envolve a exposição ao sexo desprotegido, com
a possibilidade de gravidez não planejada e suas
complicações. É exatamente nesse contexto, na
gravidez na adolescência, que serão discutidas as
principais afecções cervicais(13, 18).
Mudanças hormonais na
puberdade
A puberdade descreve as mudanças fisiológicas, morfológicas e de comportamento que ocorrem
em uma criança, à medida que suas gônadas maturam desde o estado infantil até o adulto, que afeta
a maioria dos órgãos do corpo em ambos os sexos.
Essas mudanças fisiológicas podem ser divididas em dois grupos principais: de crescimento e
hormonal. No contexto do estudo das principais
afecções cervicais da gestante adolescente, possuem maior relevância as mudanças hormonais
que, por essa razão, serão detalhadas a seguir.
As mudanças hormonais da puberdade geram
dois efeitos principais: amadurecimento do ovário e
desenvolvimento das características sexuais secundárias (mamas, pelos axilares e pubianos). Ambos concorrem para a maturidade reprodutiva. É provável
que esses eventos sejam iniciados pela maturação do
hipotálamo e pelo início da secreção do hormônio de
liberação das gonadotrofinas (GnRH). Entretanto, até
o momento, não é possível determinar a sequência
exata dos eventos que dão início a esse processo(6, 13).
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Colo uterino
O colo uterino é a porção mais distal do útero, situando-se no fundo vaginal. É separado do
corpo uterino na porção ístmica, onde se encontra
o orifício interno. Possui um canal que comunica a
cavidade uterina com a vagina e termina no orifício
externo. O canal cervical é revestido por um epitélio colunar simples, com células ciliares produtoras
de muco. Externamente, o colo é revestido por um
epitélio escamoso, estratificado, composto de células basais, parabasais, intermediárias e superficiais.
A ectocérvice é a região externa do colo que
se inicia no orifício externo, indo até os fundos de
sacos vaginais. A endocérvice se estende do orifício externo até o orifício interno do colo. A junção
escamocolunar (JEC) é a linha que se situa entre
os dois epitélios que revestem o colo, escamoso
e colunar. Ela pode estar tanto na ecto como na
endocérvice, dependendo do status hormonal da
mulher. Na infância e no período pós-menopausa,
geralmente a JEC se encontra dentro do canal cervical. No período de menacma, quando ocorre
produção estrogênica, geralmente a JEC está ao
nível do orifício externo ou fora dele(12).
Na adolescência, o colo normal, na maioria
das vezes, apresenta uma ectopia com zona de
transformação imatura. Na menacma, 20% das
mulheres apresentarão o que chamamos de colo
padrão, isto é, presença de epitélio escamoso original e colunar, com a JEC no orifício externo. É
comum a presença de ectopia com zona de transformação imatura ou madura, principalmente nas
usuárias de contraceptivos hormonais.
Colpocitologia/colposcopia/
biópsia
O tripé citologia/colposcopia/histologia define a localização das lesões cervicais, seu grau
histológico, sua extensão em profundidade e sua
ocupação glandular. A conduta terapêutica depende totalmente dos resultados dessa avaliação. Os
métodos que permitem o estudo histopatológico
são preferidos.
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Citologia
A colpocitologia fornece informações sobre a
higidez ou o estado patológico do colo uterino. Ela
é recomendada para todas as mulheres sexualmente ativas, independente da idade(4, 5).
Na solicitação do exame, são necessários alguns cuidados. Devem constar idade da paciente,
dados clínicos e epidemiológicos de importância,
data da última menstruação, número de gestações,
ou se é gestante, uso de dispositivo intrauterino
(DIU), sangramento pós-menopausa e cirurgias
ginecológicas anteriores. Alguns cuidados devem
ser tomados para se efetuar uma coleta adequada e confiável: não-utilização de duchas vaginais
aproximadamente 48 horas antes do exame; abstinência sexual nas 48 a 72 horas que precedem
à coleta; não-utilização de cremes vaginais nos
sete dias precedentes ao exame e não-utilização
de qualquer espécie de lubrificante no espéculo.
A coleta preconizada pode ser tríplice ou apenas da ectocérvice e da endocérvice. O Manual
do Ministério da Saúde (MS), Falando sobre o
Câncer de Colo Uterino – 2002, recomenda apenas a coleta de amostra da ectocérvice e endocérvice. Segundo o manual, o material contido no
fundo de saco vaginal possui baixa qualidade para
o diagnóstico oncótico. No entanto, muitos serviços de excelência realizam a coleta tríplice (fundo de saco vaginal, ectocérvice e endocérvice).
Cabe aqui salientar que nas grávidas, incluindo as adolescentes, a coleta endocervical está indicada. Entretanto, deve ser realizada de maneira cuidadosa, com correta explicação do procedimento
e de sua importância. A paciente deve ser informada de que um pequeno sangramento pode ocorrer
após a coleta. Algumas situações a contraindicam,
como os casos de ameaça de abortamento e placenta prévia total. No pós-parto, é recomendável
aguardar seis a oito semanas para que o colo uterino readquira suas condições normais(3, 5, 8, 9).
O intervalo entre as coletas pode variar de um a
três anos, com base na presença dos fatores de risco. A
periodicidade do exame citológico recomendada pelo
MS é de três anos após a obtenção de dois resultados
negativos com intervalo de um ano. No entanto, nas
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mulheres em que tenha sido identificado algum fator
de risco, como por exemplo, a infecção pelo vírus
da imunodeficiência humana (HIV), o rastreamento
pelo exame citopatológico deve ser anual(3, 8, 9, 11).
A detecção precoce do câncer do colo do útero em mulheres assintomáticas (rastreamento), por
meio do exame citopatológico, permite a descoberta
das lesões precursoras e da doença em estágios iniciais, antes mesmo do aparecimento dos sintomas(4, 5).
Colposcopia
As orientações de tratamento em gestantes
adolescentes admitem o acompanhamento de lesões de baixo grau antes de se indicar a colposcopia. Ela é formalmente indicada para as pacientes
com lesão de alto grau(18).
Colposcopia e gravidez
Na gestante, o epitélio cervical sofre profundas modificações decorrentes das alterações hormonais e metabólicas. Há proliferação intensa, principalmente, das células da camada intermediária,
com aumento do volume celular, com citoplasma
rico em glicogênio, que se cora fortemente pelo
iodo. Como resultado dessa proliferação, há maior
necessidade de aporte sanguíneo, que confere
uma vascularização superficial mais evidente. O
epitélio colunar apresenta também hiperplasia e
hipertrofia com metaplasia. É comum a presença
de ectopia com congestão e sangramento fácil.
No estroma ocorrem hipervascularização, edema
e reação decidual. Tudo isso resulta em hipertrofia
global do colo uterino com congestão ou cianose.
A zona de transformação é aumentada em extensão, com vascularização superficial mais evidente,
com vasos dilatados, calibre e ramificações regulares, normalmente com trajeto paralelo à superfície
com orifícios glandulares às vezes hipertrofiados e
volumosos cistos de Naboth(12).
Na gravidez, é difícil a gradação dos achados colposcópicos anormais, pois eles podem ser
exacerbados mesmo na presença de lesão histológica de grau menor. Em geral, o quadro mais encontrado é de deciduose, isto é, aparecimento de
modificações semelhantes àquelas que se verificam
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fisiologicamente em nível de endométrio na gravidez, no estroma do colo uterino. Essa reação aparece em torno da 12a semana de gestação e tende
a desaparecer um mês após o parto.
No puerpério, os fenômenos de hipertrofia e
congestão regridem. No entanto, a avaliação não é fácil, pois existe um estado distrófico difuso semelhante
ao que ocorre na pós-menopausa. Assim, o momento
ideal para se fazer um controle colposcópico é quando
a mulher volta a apresentar ciclos menstruais regulares.
Papilomavírus humano
Considerações gerais
O HPV é o vírus de maior prevalência no
aparelho genital, acarretando desde infecção inaparente até lesões grosseiras benignas e malignas.
Sua presença é o principal fator de risco para o
desenvolvimento de atipias na zona de transformação, responsável por 99% dos casos de câncer de
colo. Trata-se de um parasita intracelular capaz de
acelerar a velocidade das mitoses celulares, o que
aumenta a chance de desenvolvimento de atipias.
Epidemiologia
A literatura revela que a incidência das infecções pelo HPV vem aumentando significativamente no mundo ocidental. É a infecção sexualmente
transmitida mais comum do trato genital feminino.
Não existem dúvidas de que, em alguns países, o
aumento da promiscuidade sexual, a diminuição
da idade da primeira relação sexual e a abolição
do uso de camisinhas a favor da contracepção oral
aumentam a frequência de infecção por esse vírus.
Evidências sugerem que o uso do camisinha confere alguma proteção contra infecção e a progressão
da doença, mas qualquer contato genital é suficiente para sua transmissão(16).
As taxas de prevalência cumulativa da infecção
são altas, chegando a atingir 82% das adolescentes
em populações seletas. No Brasil, os dados estatísticos
são escassos e não traduzem a verdadeira magnitude
da infecção induzida pelo HPV. No entanto, confirmam a tendência mundial de avanço da virose(13, 18).
O vírus pode acometer pessoas de qualquer
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idade, mas é mais frequente na faixa compreendida entre 20 e 40 anos, período de maior atividade
sexual(13, 18).
Subtipos de HPV
Existem mais de 100 subtipos de HPV. Os
subtipos 6 e 11 são os mais relacionados com os
condilomas vulvares. Os subtipos 16 e 18 são responsáveis por aproximadamente 70% de todos os
carcinomas cervicais, por serem os mais mitogênicos. O tipo 16 é o mais prevalente e o mais frequente entre os carcinomas de células escamosas.
O tipo 18 é o responsável por 20% dos tumores de
colo e o mais comum entre os adenocarcinomas.
Os outros subtipos estão associados a infecções
transitórias, que normalmente se resolvem em dois
a cinco anos(14, 16).
Vacinas
Duas vacinas estão aprovadas no Brasil: a quadrivalente (HPVs tipos 6, 11, 16, 18) e a bivalente
(tipos 16, 18).
Ambas as vacinas compõem-se de partícula
semelhante ao vírus (VLP). Tais partículas ocas não
contêm o DNA infectante do vírus, mas sim seu
capsídeo viral, a proteína L1 do HPV sem poder infectante. Essas VLPs são produzidas em um fungo
(Saccharomyces cerevisiae). Cada tipo viral tem uma
VLP correspondente para uso como vacina. Assim,
uma vacina bivalente tem duas VLPs (16, 18), já
uma vacina quadrivalente, quatro (6, 11, 16, 18)(10).
A via de administração de ambas as vacinas é
intramuscular (IM) (0,5 ml). A vacina quadrivalente
é administrada em três doses: data escolhida (1ª
dose), 60 dias (2ª dose) e 180 dias (3ª dose) após a
primeira. A vacina bivalente também é administrada em três doses: data escolhida (1ª dose), 30 dias
(2ª dose) e 180 dias (3ª dose) após a primeira.
A Agência Nacional de Vigilância Sanitária
(ANVISA) aprovou a vacina quadrivalente para uso
em meninas e mulheres com 9 a 26 anos e a bivalente para administração a meninas e mulheres na
faixa etária de 9 a 25 anos.
Após administração de dose da vacina contra
HPV por via IM, acontece uma enorme produção
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de anticorpos circulantes no sangue periférico,
que se mantêm em níveis elevados durante anos.
Atualmente sabe-se que a proteção, após esquema
vacinal completo (três doses), possui duração de mais
de cinco anos. Ainda não está definido se haverá necessidade de uma quarta dose de reforço. Já existe um
estudo em andamento, mas será necessário aguardar seus resultados para uma resposta definitiva(10).
Não foram descritos efeitos colaterais graves.
Os efeitos adversos mais descritos foram mal-estar
tipo gripe e dor no local da injeção, porém de leve
intensidade.
Até a presente data, não há qualquer relato
de dano para o feto caso a mulher engravide durante esquema vacinal contra HPV. No entanto, é
preciso aguardar mais evidências para evitar conclusões precipitadas. A maioria dos especialistas
recomenda que uma mulher que queira engravidar após administração das doses de vacina contra
HPV espere, pelo menos, um mês depois da aplicação da terceira dose. Caso ocorra gravidez entre os
intervalos das doses, o médico deve ser avisado.
É importante salientar que ambas as vacinas
não fazem parte do calendário nacional de vacinação em virtude de seu alto custo e que não substituirão a citologia quanto ao impacto na saúde pública.
Até o momento, não é possível definir com
certeza qual das vacinas apresenta o maior benefício para uso corrente na população brasileira.
Formas clínicas
Após a exposição, o vírus coloniza todo o epitélio do trato genital inferior. Pode, então, existir
ampla variação individual de manifestações clínicas, que, provavelmente, são reguladas pela resposta imunológica local ou sistêmica do hospedeiro, além da presença ou ausência de cofatores.
A infecção pelo HPV pode ter diferentes evoluções(14):
• cura espontânea, com desaparecimento do vírus;
• persistência do vírus associada à citologia normal ou a alterações citopáticas discretas;
• alterações celulares transitórias que desaparecem espontaneamente;
• alterações celulares que, apesar de persistentes,
não progridem;
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• alterações celulares que evoluem para carcinoma in situ ou invasivo.
A infecção clínica consiste na presença de
condilomas (verrugas), isto é, tumorações únicas e
múltiplas, papilares ou micropapilares, com epitélio
superficial queratinizado, que surgem preferencialmente nas áreas sem pelos. As localizações mais frequentes são nos pequenos lábios, intróito vaginal.
Entretanto, podem ocorrer também em regiões pilosas, onde são bem mais queratinizadas. A localização no colo uterino é rara e deve fazer diagnóstico
diferencial com carcinoma verrucoso do colo. Os
condilomas genitais são mais comuns em pessoas
sexualmente ativas, entre 20 e 24 anos, independente do tipo de HPV. Esse período apresenta maior
atividade sexual, gestações, utilizações de anovulatórios e riscos maiores de infecções genitais(1, 2).
A infecção subclínica corresponde à presença de lesão visualizada somente à colposcopia. Em
geral, são lesões planas sem formações papilares
ou micropapilares.
A infecção latente descreve a presença de
vírus sem alterações morfológicas, ou seja, não
ocorrem alterações citológicas, não são visíveis à
colposcopia e, por fim, são diagnosticadas somente por biologia molecular.
A infecção persistente é a que está relacionada com maior possibilidade de transformação maligna. Ela são influenciada por: idade da paciente,
HPV de alto risco, infecções por múltiplos tipos de
HPV e deficiência imunológica(15).
A maioria das mulheres adquire o HPV nos
primeiros anos de início da atividade sexual, ficando na forma latente, sem manifestações clínicas ou
subclínicas. Uma minoria desenvolverá a lesão na
forma subclínica ou de condiloma, ou seja, a maior
parte apresentará uma infecção passageira. A minoria exibirá infecção persistente, que poderá ficar
anos sem manifestação. O tempo necessário para o
surgimento de lesões não é conhecido(15).
HPV e gravidez
Na mulher grávida ocorrem redução natural
da imunocompetência e produção maior de hormônios esteroides, o que leva à proliferação celular
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intensa, principalmente nas camadas intermediárias
e superficiais de epitélio escamoso, o que propicia
um ambiente muito favorável à replicação viral.
É comum a formação de condilomas gigantes
ou a rápida evolução para lesões neoplásicas de grau
mais acentuado. No pós-parto ocorre o inverso, há regressão espontânea na maioria das lesões verrucosas.
A associação HPV-HIV ocorre frequentemente
e a recidiva das lesões é quase uma constante. Por
essa razão é recomendável uma vigilância maior
nessa população(12).
Diagnóstico
As lesões exofíticas hiperplásicas são facilmente identificadas à inspeção, porém recomenda-se a
confirmação histológica.
As lesões do epitélio escamoso da ectocérvice
são menos óbvias e, em geral, surpreendidas em
colpocitologia de rotina. Uma vez identificadas,
na dependência do tipo de lesão, estão indicados
acompanhamento citológico ou realização de colposcopia com biópsia da área alterada.
No caso de condiloma acuminado do colo
uterino, por mais típica que possa parecer a lesão,
a confirmação histopatológica é recomendável.
Além dos exames colposcópico e histológico,
é possível a realização de testes para identificação
do subtipo viral a partir do seu DNA, na tentativa de
estabelecer um prognóstico. No entanto, ainda não
está claro o valor da tipagem viral na prática clínica(15).
Tratamento
O objetivo principal do tratamento do HPV
não é a erradicação do vírus, pois não estão disponíveis drogas ou métodos capazes de alcançar esse
objetivo. Até o momento, o objetivo do tratamento
é a destruição da lesão que o vírus está causando.
Sabe-se que a simples presença do vírus, sem
ocasionar lesão, não necessita de tratamento. Por
outro lado, boa parte das lesões, principalmente condilomas pequenos e lesões de baixo grau,
possui grande potencial de regressão espontânea.
No entanto, existem vários motivos para se
pensar no tratamento do HPV(12, 17):
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• e rradicação dos condilomas acuminados: é
importante por questões estéticas, para evitar infecções secundárias e prevenir possível
malignidade. E mais, apesar de os condilomas
estarem associados principalmente ao vírus de
baixo risco (tipos 6 e 11), em 5% dos casos podem estar associados também aos de alto risco;
• prevenção da evolução para malignidade;
• prevenção da transmissão vertical e redução da
possibilidade de formação de condilomas gigantes, que poderiam obstruir o parto vaginal.
Os casos de condilomatose durante a gravidez
aumentam significativamente a possibilidade
de transmissão durante a passagem do canal
de parto, que pode ocasionar a papilomatose
juvenil recorrente;
• prevenção da transmissão horizontal, pois a
infecção pelo HPV é uma doença sexualmente transmissível (DST) e a destruição das lesões
clínicas e subclínicas diminui a possibilidade de
transmissão a outros contatos.
Como em toda infecção, estão indicadas medidas gerais como higiene, recomendação do uso
de preservativo nas relações sexuais, encaminhamento do parceiro para investigação e orientação,
e tratamento das infecções secundárias.
Há três opções de tratamento: químico, cirúrgico e uso de imunomoduladores. A escolha vai
depender de número, gravidade e tamanho das lesões, disponibilidade de recursos, eficácia e efeitos
adversos, estado imunológico da paciente, capacidade técnica do médico e aceitação pela paciente.
Na gravidez, o tratamento consiste basicamente no uso do ácido tricloroacético, que pode ser usado com segurança nessas pacientes. Trata-se de uma
substância cáustica que atua localmente e ocasiona
desnaturação proteica tanto em tecido sadio quanto
nos infectados pelo HPV. Deve ser aplicado cautelosamente, sob visão colposcópica e em casos selecionados, com aplicadores de tamanho proporcional
ao tamanho das lesões, evitando atingir as áreas sadias. Utilizado principalmente em lesões pequenas,
recentes, pouco queratinizadas, na concentração
de 80% a 90%, não é absorvido e não apresenta
efeitos sistêmicos, mas leva à ulceração local(12, 17).
A podofilina ou os antiblásticos são proscritos
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na gravidez, pois são drogas comprovadamente
teratogênicas.
A interrupção da gestação por via alta só está indicada nos casos de condilomas gigantes, que obstruem
o canal de parto, ou por problemas obstétricos outros.
A cesárea não protege o recém-nascido da infecção,
pois o vírus pode ser encontrado em líquido amniótico, secreção da nasofaringe ou lavado gástrico de recém-nascidos de parto cesáreo com bolsa íntegra(11).
Neoplasias benignas cervicais:
deciduose
As neoplasias benignas do colo uterino podem se apresentar de várias formas. Podem ser assintomáticas ou exibir sinais como corrimento e até
sangramento vaginal. Na gestante, merece destaque a deciduose, que é uma lesão tumor-símile(12).
Histologicamente, a diferenciação é feita pela
ausência de atipias nucleares relevantes. Os pólipos
que ocorrem na gestação podem também sofrer
processo de decidualização.
Neoplasia intraepitelial cervical
As neoplasias intraepiteliais cervicais (NICs)
consistem em lesões nas quais parte ou todo o epitélio é substituído por células com graus variados
de atipias, que alteram a arquitetura do estroma
sem romper a membrana basal e sem ocorrer
invasão do estroma. São lesões precursoras do
carcinoma invasor do colo uterino, isto é, lesões
pré-neoplásicas que, se não abordadas adequadamente, podem evoluir para o câncer. Podem atingir
tanto o epitélio escamoso quanto o glandular(7).
Infelizmente, não estão disponíveis informações sobre a prevalência das NICs nas gestantes
adolescentes.
O diagnóstico definitivo da NIC é dado pela
histologia. A suspeita inicial acontece por meio da
citologia de Papanicolaou, utilizada como método
de rastreamento. A mulher com citologia sugestiva
de NIC deverá ser encaminhada a um serviço secundário para ser submetida a colposcopia e biópsia, quando necessária.
É consenso na literatura que a gravidez, por
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si, não influencia a evolução dessas neoplasias. O
risco de progressão é mínimo e a possibilidade de
regressão no pós-parto, significativa. Yost et al.(19)
observaram 153 gestantes portadoras de NIC 2 e
NIC 3 e verificaram que 69% tiveram regressão espontânea no pós-parto, e nenhuma das pacientes
apresentou progressão para lesões mais graves.
Como já foi dito, é recomendado realizar o
rastreamento citológico no primeiro trimestre. Caso
haja necessidade de avaliação colposcópica, ela também é mais bem realizada nesse período. A partir do
segundo trimestre, a realização do exame colposcópico torna-se mais difícil em decorrência das mudanças ocasionadas pela gravidez, como deciduose, congestão, aumento da vascularização, invasão
das paredes vaginais no campo visual e espessamento do muco cervical por ação da progesterona.
A biópsia é necessária na suspeita citológica e
na presença de alterações colposcópicas. É segura
e pode apresentar sangramento aumentado, que
na maioria das vezes cessa apenas com compressão. Está indicada principalmente para confirmar
ou afastar a possibilidade de invasão.
O objetivo principal no manuseio das lesões
intraepiteliais na gestante é identificar casos raros
de invasão ou microinvasão. A conduta é expectante, com realização da citologia e colposcopia a cada
três meses. A conduta final é determinada com citologia e colposcopia quatro a seis meses pós-parto. A conização, quando indicada, deve ser realizada até a 20ª semana de gestação, em virtude dos
índices de complicações como hemorragia, abortamento espontâneo e trabalho de parto prematuro.
A única indicação para conização durante a gestação é a suspeita diagnóstica de microinvasão(7, 12).
A presença de neoplasia intraepitelial de qualquer grau não é indicação para cesariana. Em outras palavras, é totalmente admissível o parto por
via vaginal, e a indicação de cesariana é baseada
somente em motivos obstétricos(7, 11, 12).
Neoplasia invasiva do colo
uterino na gestante adolescente
O câncer de colo uterino é definido pela alteração maligna no epitélio de revestimento que
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rompe a camada basal em direção ao estroma. Esse
processo é lento e evolutivo das NICs.
Os fatores de risco para o câncer invasivo do colo
uterino estão relacionados com aqueles que aumentam a incidência das NICs, a saber: HPV, tabagismo,
múltiplos parceiros sexuais, início precoce da atividade
sexual, DST prévia, imunodeficiência, entre outros.
Novamente, não estão disponíveis dados epidemiológicos sobre prevalência e incidência das neoplasias invasivas do colo uterino na gestante adolescente. Em geral, sua ocorrência nessa faixa etária é
excepcional. O câncer invasivo do colo durante a gestação é uma situação especial a ser considerada. Um
achado citológico alterado nessa fase é indicação absoluta de avaliação colposcópica para afastar doença
invasiva, que encontra taxas de 0,05% nesse grupo.
O diagnóstico muitas vezes é difícil por se atribuírem à gestação os sangramentos que acometem
a mulher nessa fase. O parto por via vaginal é totalmente proscrito na doença invasiva devido à possibilidade de sangramento abundante. O prognóstico da doença parece não se alterar com a gestação.
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Extensão da doença, idade gestacional e desejo
materno devem ser avaliados. A conduta terapêutica
do câncer de colo uterino diagnosticado na gestação
pode ser resumida conforme os seguintes estágios(12):
• IA 1: espera-se o parto ou a vitabilidade fetal
com monitorização rigorosa. Após o parto, está
indicada abordagem terapêutica definitiva;
• IA 2 e II A: o diagnóstico antes da maturidade
fetal impõe a realização de histerectomia tipo III
mais linfadenectomia com útero cheio. No caso
de feto viável, é realizada cesariana corporal, seguida de cirurgia de Wertheim-Meigs;
• II B a IV: antes da vitabilidade fetal, é indicada
radioterapia. Pode-se aguardar o abortamento espontâneo ou realizar esvaziamento uterino, com a complementação do tratamento
posteriormente. Com a vitabilidade fetal,
impõe-se a cesariana corporal e, após quatro
semanas, radioterapia. Pode ser utilizada quimioterapia neoadjuvante com o objetivo de
prevenir a progressão da doença e até mesmo
a vitabilidade fetal.
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volume 6 ■ nº 4 ■ outubro 2009
Adolescência & Saúde
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