discurso de posse - Incor

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Discurso do Prof. Dr. Fábio Jatene em cerimônia de posse como
membro titular da Academia Nacional de Medicina, agradecendo o
reconhecimento
10 de março de 2015, na Academia Nacional de Medicina
Excelentíssimo Senhor Presidente da Academia Nacional de Medicina
Acadêmico, Pietro Novellino.
Excelentíssimo Senhor Doutor Arthur Chioro, Ministro de Estado da
Saúde do Brasil.
Excelentíssimo Senhor Doutor Geraldo José Rodrigues Alckmin Filho,
Governador do Estado de São Paulo.
Excelentíssimo Senhor Professor Doutor David Everson Uip, Secretário
de Estado da Saúde do Estado de São Paulo.
Excelentíssimo Senhor Professor Doutor Jorge Felippe, Presidente da
Câmara Municipal do Rio de Janeiro.
Excelentíssimo Senhor Doutor Marco Antonio Zago, reitor da
Universidade de São Paulo.
Excelentíssimo Senhor Professor Doutor José Otávio Costa Auler Junior,
Diretor da Faculdade de Medicina da USP e Presidente do Conselho
Deliberativo do Hospital das Clinicas da Faculdade de Medicina da USP.
Excelentíssimo Senhor Professor Doutor Roberto Kalil Filho, Presidente
do Conselho Diretor do Instituto do Coração do Hospital das Clinicas da
Faculdade de Medicina da USP.
Excelentíssimo Senhor Professor Doutor Jorge Kalil, Diretor do Instituto
Butantan de São Paulo e Presidente do Conselho Curador da Fundação
Zerbini.
Excelentíssimo Senhor Doutor José Antonio de Lima, Diretor-Presidente
da Fundação Zerbini.
Excelentíssimo Senhor Doutor Florentino de Araújo Cardoso Filho,
Presidente da Associação Médica Brasileira.
Excelentíssimo Senhor Doutor Marcelo Cascudo, Presidente da
Sociedade Brasileira de Cirurgia Cardiovascular.
Excelentíssimo Senhor Doutor Darcy Ribeiro Pinto Filho, Presidente da
Sociedade Brasileira de Cirurgia Cardiovascular.
Excelentíssimo Senhor Doutor Américo Fialdini Júnior, Diretor Presidente
da Fundação Conrado Wessel.
Excelentíssimos Senhores Membros da Diretoria da Academia Nacional
de Medicina.
Excelentíssimas Senhoras Acadêmicas e Senhores Acadêmicos.
Excelentíssimos Professores.
Excelentíssimas Senhoras e Senhores Convidados.
Meus queridos e ilustres amigos.
Meus irmãos Marcelo, Ieda e Iara e meus familiares.
Minha querida mãe Aurice Biscegli Jatene.
Meus amados filhos Rodrigo, Guilherme, Melina e as noras Ana Beatriz e
Gabriela.
Meus adorados netos Pedro, Bruno e Luisa.
Minha querida e amada esposa Silvana.
Este é um dos momentos mais importantes de toda a minha vida. Ser
aceito nesta centenária e tradicional casa e tomar posse perante todos
os senhores é algo que me honra muito, ao mesmo tempo em que me
preocupa, pela magnitude do que isto representa. Poder participar das
atividades da Academia Nacional de Medicina e opinar, em um Fórum de
tão alto nível, sobre os assuntos mais importantes relacionados à
Medicina e a vida brasileira, se por um lado muito me envaidece, por
outro, me reveste de um misto de sentimentos de responsabilidade e de
necessidade de participação, para buscarmos novos e mais promissores
caminhos para o nosso país.
Posso dizer aos senhores que iniciei minha trajetória para pertencer a
esta casa, há 25 anos, quando meu pai, aqui neste salão, foi empossado,
na cadeira de número 40. Naquele dia, a aura magistral desta casa me
marcou para sempre e pertencer a esta Academia foi um sonho que
acalentei por todos estes anos, buscando qualificação por um lado e
aguardando a oportunidade de se apresentar, por outro. Nesta noite ao
ver concretizado este sonho, meu coração se enche de alegria, rodeado
e prestigiado pelo carinho e pela presença ilustre e amiga de todos os
senhores. Confesso que daquelas pessoas tão queridas e que não
puderam aqui comparecer, por motivos diversos, a que mais falta me faz
é a figura de meu pai. Gostaria imensamente poder abraçá-lo forte nesta
noite e mostrar a ele que o sonho acalentado por 25 anos finalmente se
materializou. A última vez que ele esteve neste salão e nesta casa foi
para participar da eleição em que fui escolhido para ocupar a cadeira 29
e que por feliz sugestão do Acadêmico Sérgio Augusto Pereira Novis, ele
foi o primeiro a depositar seu voto na urna. O destino não permitiu que
sentássemos lado a lado, pai e filho, uma vez sequer, nas tribunas desta
casa, mas caprichosamente nos permitiu que a sucessão familiar fosse
mantida na Academia que ele tanto amava. Ao final deste discurso, tenho
convicção que ele aplaudirá como se aqui fisicamente estivesse e me
envolverá no seu abraço e me beijará a face, satisfeito e feliz, assim
como esteve ao final da apuração, no dia da minha eleição.
Chego aqui após 36 anos de trabalho ininterrupto e intenso,
curiosamente com a mesma idade e o mesmo período de exercício
profissional de quando meu pai adentrou a esta casa. Tive e tenho
intenso envolvimento entre assistência, ensino e pesquisa e, na última
década, agregou-se também a atividade administrativa inerente aos
cargos de direção por mim ocupados. Oitenta por cento da minha
atividade até hoje se desenvolve em Serviço Público, no Hospital das
Clínicas e no Incor, onde obtive toda a minha formação e que considero
a minha segunda casa. Ressalto ainda que outras instituições foram
também importantes na minha formação e desenvolvimento profissional
e destaco aqui os Hospitais Sírio Libanês, HCor, Albert Einstein e
Oswaldo Cruz, onde atuamos com uma unida e coesa equipe há 20
anos. Hoje me apresento a esta casa depois de uma longa jornada,
tendo sido guiado, amparado e suportado, portanto por muitas pessoas,
de diferentes instituições, com as quais quero dividir esta conquista.
É desnecessário dizer que eu convivi com a Medicina desde o início da
minha vida e essa influência do pai médico sempre esteve presente em
casa e, dos quatro irmãos, três formaram-se médicos. Entretanto, essa
forte influência nunca foi exercida de forma direta. Meu pai nunca disse
ou fez entender que era sua vontade que seguíssemos a sua profissão,
mas a Medicina sempre teve intensa presença entre nós. A dedicação do
meu pai à profissão sempre foi total e aprendi a conviver com médicos,
enfermeiros, estudantes de Medicina e o ambiente hospitalar desde
pequeno e, meus irmãos e eu, desde cedo, aprendemos o significado de
termos como centro cirúrgico, evolução, extracorpórea, alta e tantos
outros. Aprendemos, ainda, que era uma profissão de muito trabalho e
intenso envolvimento, pois nosso pai saía sempre muito cedo, não
almoçava nunca em casa e, muitas vezes, quando íamos dormir, ele
ainda não havia chegado. Entretanto, a imagem que nos foi passada,
nesse período, tanto por meu pai quanto pela minha mãe, acostumada a
esse ritmo, foi de que o exercício profissional estava acima de tudo e o
paciente era sempre o que mais importava.
Aprendemos ainda que a profissão deve ser exercida com muita
naturalidade, confiança, satisfação e na sua plenitude. Outro fator que
certamente nos influenciou muito foi o de acompanharmos, em casa, a
busca constante do aprendizado, da atualização, do aperfeiçoamento e a
importância desses valores. Conhecemos, também muito cedo, termos
como congressos, jornadas, mesas redondas, bem como aprendemos a
frequentar esses eventos. Portanto, a despeito de não ter havido em
nenhum momento uma solicitação ou pedido formal para que nos
encaminhássemos para a Medicina, diria que isso era desnecessário.
A faculdade cursada foi a de Medicina do ABC, em Santo André, SP,
que, se por um lado era uma escola nova, teve o mérito de me fascinar
pela profissão, tal era a garra dos seus professores e tamanho era o
companheirismo entre os alunos. Procurei interessar-me por todos os
cursos de maneira geral, embora tivesse, desde o início, forte tendência
pela área cirúrgica. Assim, aproximei-me de atividades nessa área, tendo
uma lembrança particularmente marcante, que foi a possibilidade de, a
partir do terceiro ano, frequentar o enorme centro cirúrgico do Hospital
Beneficência Portuguesa, para auxiliar operações após o término das
aulas na faculdade, nos fins de tarde e à noite. Na cirurgia geral, fui
introduzido pelo Prof. Dr. Renato Andretto, ao qual sou eternamente
grato e do qual guardo uma recordação inesquecível, para qualquer
cirurgião: foi ele quem me ensinou como lavar as mãos, calçar avental e
luvas e me introduziu na arte da cirurgia, auxiliando as suas operações,
de estômago, vesícula, cólon e tireoide.
Nos anos de internato sofri forte influência de outro grande mestre, Prof.
Dr. Dario Birolini, que me ensinou os meandros da metabologia cirúrgica
e das unidades de terapia intensiva, ambas as áreas ainda incipientes,
mas destinadas a ocupar espaço central no tratamento e evolução de
doentes cirúrgicos. Os contatos semanais que mantivemos por esse
período me marcaram para sempre e sua capacidade didática e
dedicação moldaram a minha estrutura médica para os próximos anos.
Ao final da faculdade, já estava completamente decidido pela prática da
Cirurgia e o próximo passo era fazer residência médica. Ao final dos dois
anos fui reconhecido como o residente que mais se destacou no Pronto
Socorro Cirúrgico, tendo recebido o prêmio Mário Ramos de Oliveira, do
qual muito me orgulho até hoje. E estava decidido pela Cirurgia Torácica
e Cardiovascular. Neste período, a minha formação médica foi
novamente influenciada por um professor, recentemente falecido, aos 92
anos, Prof Nagib Curi. Pessoa extremamente modesta e capaz
respeitava o paciente como poucos e centrou a sua vida e a sua atuação
profissional a formar discípulos e atender aos pacientes com atenção,
carinho e um senso humanitário ímpar. Cirurgião de grande destaque,
dentre sem incontáveis ensinamentos, repetia como um mantra que o
que caracterizava um bom médico não era o conhecimento acumulado,
mas a atenção verdadeira dedicada ao doente, ao seu diagnóstico e
tratamento. A partir de 1983, me fixei no Instituto do Coração (Incor),
sendo aí possível atuar tanto em Cirurgia Torácica quanto
Cardiovascular. Pouco tempo após, por concurso, fui contratado para
vaga de Assistente pelo HCFMUSP e indicado para auxiliar de ensino da
Disciplina de Cirurgia Torácica e Cardiovascular, sendo complementado
pela Fundação Zerbini para permanecer em tempo integral no Complexo
HCFMUSP. Estas rápidas palavras prestam um tributo e uma justa
homenagem a meus grandes mestres na fase inicial da minha formação
profissional, dentro da área cirúrgica, moldando meu comportamento, me
impondo limites e mostrando horizontes, criando alicerces para meu
desenvolvimento profissional.
Segundo Fernando Pessoa, “O valor das coisas não está no tempo que
elas duram, mas na intensidade com que acontecem. Por isso, existem
momentos inesquecíveis, coisas inexplicáveis e pessoas incomparáveis”.
Indubitavelmente, essas pessoas foram ou são incomparáveis.
Mas sem dúvida alguma, meu grande mestre foi meu pai, em todos os
sentidos. Na vida e na profissão. Orientações de um humanista, de um
homem sábio, de um profissional competentíssimo, com quem conviver e
trabalhar foram um privilégio inimaginável. Qualquer tentativa de
expressar isto em palavras será muito pouco, diante da sua magnitude e
da sua envergadura. Ele nos deixou um legado imenso de sabedoria, de
conhecimento, de ética, de profissionalismo e de retidão de caráter. Por
ocasião de sua morte, há alguns meses, muitas foram as homenagens
recebidas, e vou me permitir reproduzir aqui um trecho do artigo escrito
pelo Prof. Paulo Pêgo Fernandes: “O Prof. Adib foi um pensador brilhante
e um trabalhador e inovador incansável na busca de respostas às
questões cruciais da sociedade de seu tempo. Reconhecido como
cientista, cirurgião e professor admirável, também foi um gestor público
audacioso (como Secretário de Estado da Saúde de São Paulo e Ministro
da Saúde) e chefe de uma família exemplar. Ouso opinar que todas
essas suas qualidades têm a nascente em uma de suas características
mais marcantes e geniais: o olhar sempre jovial para as coisas da vida
(ele invariavelmente descobria algo inusitado onde a maioria enxergava
apenas o óbvio) e a paixão pelo ser humano. Sim, o olhar compassivo
para seus semelhantes fez do Prof. Adib Jatene, exemplo de uma elite
intelectual que tem um compromisso verdadeiro com o país e seus
cidadãos. Seu esforço incessante e sua busca da perfeição, possível em
todos os seus atos, nada mais foram do que a sua aspiração, sempre
presente, de ajudar as pessoas que sofrem a se sentirem melhores. Não
foram poucas as vezes em que, em conversas reflexivas, o Prof. Jatene
citou a frase de madre Tereza de Calcutá para explicar a chama que
deve guiar a inteligência para a busca de solução dos mais diferentes
aspectos da vida humana: “Sem fé não existe amor, sem amor não existe
entrega de si, e quem não for capaz de fazer a entrega de si, não está
preparado para tratar dos que sofrem”. “Médico, ser humano, chefe de
família, amigo, cientista, liderança inovadora, cidadão e homem público
exemplares. Assim foi o Prof. Adib. Foi? Não. Ele ainda é, pois um bom
exemplo assim é eterno. O Prof. Adib Jatene continua a ser uma grande
inspiração para todos nós e para as gerações futuras.”
Excelentíssimo Senhor Presidente da Academia Nacional de Medicina,
Acadêmico Pietro Novellino, a partir de seu exemplo de liderança, que
por três oportunidades presidiu esta tradicional e egrégia instituição,
tenha certeza que adento esta casa, imbuído de um interesse verdadeiro
em contribuir com o que estiver ao meu alcance para seguirmos
avançando e construir uma Medicina melhor e um país melhor, para as
nossas futuras gerações. Sou muito grato ao senhor, pela forma isenta,
mas ao mesmo tempo receptiva, austera, mas ao mesmo tempo fidalga
com que tratou a minha pretensão de vir a pertencer a esta casa. Foi um
contato que me fez admirar mais a sua figura e a investidura do cargo
que Vossa Excelência ocupa.
Aproveito ainda o momento para agradecer a todos os senhores ilustres
acadêmicos que tornaram possível o meu ingresso nesta casa e que de
várias maneiras me receberam, incentivaram, apoiaram, orientaram e até
mesmo guiaram meus passos para que o caminho trilhado fosse o mais
correto possível e eu conseguisse chegar ao meu destino. O momento
da campanha e das visitas acadêmicas foi para mim um dos momentos
mais enriquecedores da minha existência. A possibilidade de conhecer e
poder interagir com os mais ilustres médicos do nosso país, me marcou
para sempre. Em que outra situação eu teria tido a oportunidade de ser
recebido por um número tão grande de colegas com tamanha influência,
qualificação e responsabilidade e poder expressar meus pensamentos,
colocar meus pontos de vista, debater ideias e expandir meus
horizontes? Grande momento pessoal, profissional e como experiência
de vida. Agradeço ainda a forma tão correta e atenciosa com que fui
tratado. Mais formal em algumas situações, menos em outras,
cerimoniosa até em algumas, mas de uma correção e atenção sem
precedentes para comigo.
Faz parte da tradição desta casa que um novo Acadêmico faça um
retrospecto dos que já ocuparam esta cadeira, a de número 29, que
passarei a ocupar a partir de agora. Antes, porém, lembro que a atual
Academia Nacional de Medicina foi fundada em 30 de junho de 1829,
com o nome de Sociedade de Medicina do Rio de Janeiro, sob a
presidência de Joaquim Cândido Soares de Meirelles. Um ano mais
tarde, por decreto do Imperador passou a se chamar Academia Imperial
de Medicina e, em 1889, com o advento da República, passou a se
chamar Academia Nacional de Medicina. Ao longo da sua história, mais
de 657 ilustres médicos tiveram o privilégio de pertencer a esta casa e
participar dos seus destinos.
Esta cadeira 29, já teve ocupantes notórios e tem para mim uma feliz e
rara coincidência.
O seu primeiro ocupante foi o Acadêmico Joaquim Antônio de Oliveira
Botelho, que nasceu em Salvador, em 1827, e colou o grau de doutor em
Medicina, em 1850, pela Faculdade de Medicina da Bahia.
Foi sucedido pelo Acadêmico Daniel de Oliveira Barros D’Almeida, que é
o patrono da cadeira 29. Nascido em Recife, em 1858, o Acadêmico
Barros D’Almeida cursou medicina na Faculdade do Rio de Janeiro e
tomou posse na ANM em 1901. A sua memória, apresentada à época da
sua admissão denominava-se “A peste Antiga e a Peste Moderna”.
Segundo Jorge Dória, desfrutava do julgamento exato e rápido, produto
preciso da experiência e da lúcida intuição. Ninguém até então havia
conseguido aliar, com maior sabedoria, o bom senso ao tino clínico. Teve
de Deus a dádiva de possuir, como ninguém, a intuição da coisa
cirúrgica. E foi por essa razão, que diante de um quadro clínico
alarmante, declarava, sem receio, o termo cunhado por ele e que ficou
muito conhecido à época: “É um operoma, a situação é de urgência, a
intervenção se impõe, não percamos tempo”. Ele foi de fato um farol que
iluminou por muito tempo o difícil e trabalhoso caminho da nossa
medicina e é, sem contestação, um dos nomes tutelares da nossa
Academia. Faleceu no Rio de Janeiro, em 1919, sendo sucedido pelos
Acadêmicos João Marinho de Azevedo e Jorge Moutinho Dória, ilustres
Acadêmicos, na arte da Cirurgia.
A coincidência que havia referido aos senhores, vem agora, pois conheci
muito o próximo ocupante da cadeira 29 e também tinha grande apreço
por ele. Quando iniciei na Cirurgia Torácica e fui ao meu primeiro
congresso da especialidade, em 1981, fiquei muito impressionado com a
sua postura, experiência e influência sobre seus pares. Era o Acadêmico
Professor Jesse Pandolpho Teixeira. Tinha assistentes com enorme
experiência e foi formador de grandes cirurgiões torácicos, líderes de
vários serviços pelo país. Aos poucos me aproximei dele e passei a
receber da sua parte um tratamento sempre muito cordial e amigo. Tive
grande admiração e respeito por ele e o acaso fez com que pudesse, um
dia, ocupar a cadeira, que tão brilhantemente havia sido ocupada por ele.
Ele costuma dizer que no seu aerviço, nenhum paciente era rejeitado,
seja pela gravidade da doença, seja pela sua situação econômica. O
professor Jesse tornou-se membro da Academia em 1971 e faleceu em
1994. Nesta ocasião, o Acadêmico José Camargo, meu grande amigo
aqui presente escreveu: Jesse Teixeira morreu. Foi uma agonia lenta e
sofrida, mas ele enfrentou o sofrimento e a morte com a mesma
dignidade com que vivera. Aquela altivez que distingue os homens
superiores, que são assim especiais, porque parecem naturalmente
dignos, sem se esforçar. Foi uma perda dolorosa para mim em particular
e, sem dúvida, para mais da metade dos cirurgiões de tórax que atuam
no país e que tiveram o privilégio de sua tutoria fidalga e paternal... Não
importa a extensão da dor que a morte do professor provoque nas
pessoas. Enquanto existir algum cirurgião de tórax que trabalhe com
seriedade e que busque obstinadamente a inalcançável perfeição e que
valorize a dignidade e elegância, Jesse Teixeira continuará vivo. O corpo
que enterraram lá no Caju é a parte menos importante da história de um
grande homem e esta não morrerá. Morremos um pouco nós todos que
aprendemos a querê-lo e a respeitá-lo. Lamento os que não puderam
privar de sua amizade e, mais ainda, os que tiveram a oportunidade e
não souberam valorizá-la. Que o exemplo de dignidade que caracterizou
a sua vida sirva de consolo para os que lamentarão a sua morte.
O Acadêmico que o sucedeu o professor Jesse e que me antecedeu foi o
professr Donato D’Angelo, que nasceu em Petrópolis (RJ), no ano de
1919 e formou-se pela Faculdade Fluminense de Medicina, em 1939. Era
doutor pela Faculdade Nacional de Medicina (UFRJ) e foi chefe de
Clínica do Serviço de Ortopedia e Traumatologia do Hospital Santa
Teresa, em sua cidade natal.
Em sua vida profissional, exerceu os cargos de chefe do serviço de
ortopedia do Instituto de Aposentadorias e Pensões dos Comerciários do
Hospital de Ipanema, do Hospital São Zacharias e do Hospital Santa
Tereza de Petrópolis.
O professor D'Angelo ocupou o cargo de professor titular de ortopedia da
Faculdade de Medicina de Petrópolis, desde 1967. Entre os anos de
1971 a 1998, foi editor chefe da Revista Brasileira de Ortopedia. Foi
membro fundador da Sociedade Brasileira de Reumatologia, da
Sociedade Brasileira de Cirurgia da Mão e da Sociedade Brasileira de
Medicina e Cirurgia do Pé. Exerceu a presidência da Sociedade de
Medicina de Petrópolis, no biênio 1963-1964. Como se pode notar, atuou
como protagonista no desenvolvimento da ortopedia moderna em nosso
meio.
Recebeu diversos prêmios ao longo de sua carreira, com destaques para
a Medalha da Ordem do Mérito Naval, o título de Médico Benemérito do
Estado do Rio de Janeiro e Moções Congratulatórias pela Câmara
Municipal de Petrópolis. O Colégio Brasileiro de Cirurgiões concedeu-lhe
o título de Membro Emérito, em 1991, por suas realizações profissionais.
Donato D'Angelo faleceu aos 95 anos, no dia 24 de abril de 2014. Fico
muito honrado e agradecido com o comparecimento de sua viúva,
senhora Wanda D’Angelo a esta solenidade. Esteja certa que tentarei
honrar da melhor maneira possível esta cadeira, tão brilhantemente
ocupado pelo querido professor D’Angelo.
Para Carlos Drummond de Andrade, "Eterno, é tudo aquilo que dura uma
fração de segundo, mas com tamanha intensidade, que se petrifica, e
nenhuma força jamais o resgata".
Também é tradição desta casa que uma comissão introduza o novo
Acadêmico ao salão. Embora tivesse recebido, por parte de todos os
acadêmicos da casa, durante o período de visitas acadêmicas, uma
atenção que superou em muito as minhas expectativas, alguns deles se
mostraram tão participativos e envolvidos com a minha campanha, que
integrar esta comissão foi um passo natural dos acontecimentos. A cada
um deles, de maneira muito especial o meu mais profundo
agradecimento.
Inicio pelo Acadêmico Ivo Abrahão Nesralla que conheço e admiro há
muitos anos. Ele foi um dos responsáveis por fazer do Instituto de
Cardiologia de Porto Alegre um centro cardiológico de referência
nacional e internacional, pela sua excelência e grandeza. Quando soube
da minha ida a Porto Alegre, como parte da Campanha à Academia, teve
a gentileza de promover um almoço, acompanhado por sua esposa
Paula Anita, em sua residência e convidar outros acadêmicos, para que
lá pudéssemos interagir, conhecê-los melhor e me apresentar. Foi de
fato de uma atenção ímpar para comigo.
O Acadêmico José de Jesus Peixoto Camargo é grande amigo desde
quando eu era residente e ele já um dos mais respeitados cirurgiões
torácicos do país, apesar de muito jovem. É portador de uma das
inteligências mais argutas e vivas que conheço e só sinto que a distância
que nos separa fisicamente me impeça de encontrá-lo mais vezes e
partilhar mais da sua experiência e brilhantismo. Dono de uma
capacidade de trabalho ímpar, construiu um enorme centro de cirurgia
torácica e é detentor de uma das maiores experiência mundiais de
transplante pulmonar e pioneiro desta operação em nosso país. Na
minha visita acadêmica, que parecia um pouco desnecessária a ambos,
tal a nossa proximidade, ele gastou duas horas me mostrando a
resolução de casos complexos de cirurgia traqueal. Ao final, foi intimado
por mim a publicar este material, que reputo o mais rico do mundo, pois
desconheço uma série tão impressionante de casos tão difíceis com tão
bom resultado. E além de tudo é um escritor brilhante!
O Acadêmico Paulo Niemeyer Soares Filho é a demonstração viva de
que uma grande amizade não precisa ser antiga. Nos conhecemos à
relativamente pouco tempo, em uma visita de trabalho à Israel e a partir
daí observamos a presença de uma grande afinidade no nosso
relacionamento. Suas orientações foram muito importantes em relação
ao ritual da campanha, a melhor maneira de me comportar e me
conduzir, sempre com a redobrada atenção de me contatar, de tempos
em tempos, para alimentar minha confiança e dissipar eventuais
desânimos.
O Acadêmico Raul Cutait, apenas poucos anos à minha frente, na
residência médica é integrante de uma das turmas da Faculdade de
Medicina da USP conhecida por ser uma das que produziu o maior
número de cirurgiões de grande destaque em um só ano e ele
naturalmente contribuiu para a notoriedade desta turma. Dele recebi
desde cedo uma contribuição à minha vida profissional. Disse-me ele um
dia: Fábio, alguns médicos e principalmente os cirurgiões tem o péssimo
hábito de visitar os pacientes no pós-operatório, de forma muito rápida,
às vezes permanecendo poucos minutos no quarto e em pé. Quando
você for visitar um paciente, procure sentar. Isto demonstra que você vai
gastar um pouco mais de tempo com ele e reforça a confiança do
paciente em você. Nestes 36 anos de exercício profissional tenho
procurado seguir à risca este ensinamento tão simples e tão profundo no
seu significado e quando entro em um quarto já vou logo procurando um
lugar onde me sentar! Conversamos sobre o meu ingresso na Academia
em várias oportunidades, sempre vendo meu interesse crescer e a minha
ânsia de participar mais viva e presente.
Conheci o Acadêmico Ricardo José Lopes da Cruz há relativamente
pouco tempo. O conheci em uma visita à Academia, quando me
preparava para pleitear uma vaga e aproveitar para conhecer melhor a
Academia e seus membros. Fui, em um destes dias, surpreendido por
uma aula magistral, ministrada pelo acadêmico Ricardo Cruz. Apesar de
eu estar afeito a alguns dos procedimentos cirúrgicos talvez mais
complexos de toda a cirurgia, fiquei muito impressionado com o alto nível
de suas operações e procedimentos. Como um dos membros recentes
da Academia, penso que ficou apreensivo com meu desconhecimento de
parte dos acadêmicos e passou a me auxiliar. As minhas visitas ao Rio
de Janeiro, onde mora a maior parte dos acadêmicos, sempre se iniciava
pelo seu consultório a partir de onde traçávamos uma estratégia
geográfica, a partir da qual seguia meu caminho, sendo várias vezes
acompanhado por ele, quando julgava importante a sua participação na
minha apresentação ao acadêmico. Sou muito grato por toda esta
atenção e dedicação para comigo, fundamental para o sucesso da minha
campanha.
Os Acadêmicos Samir Rasslan e José Osmar Medina de Abreu Pestana
foram os que mais dialogaram comigo sobre os aspectos práticos da
campanha, alertando-me quanto a possíveis dificuldades que teria e o
dia a dia desta etapa, sempre com incentivos e sugestões. Afinal nem só
de rosas são feitos os caminhos.
Segundo Ralph Waldo Emerson, escritor, filósofo e poeta americano,
nascido no início do século XIX, “A glória da amizade não é a mão
estendida, nem o sorriso carinhoso, nem mesmo a delícia da companhia.
É a inspiração espiritual que vem quando você descobre que alguém
acredita e confia em você”.
Tive ainda a inestimável honra de ter sido saudado nesta casa pelo
Acadêmico Professor Silvano Raia. O Prof. Silvano foi um dos meus
mentores durante a minha trajetória profissional. Grande parte da ligação
e proximidade que tenho com transplantes de coração e pulmão vem do
convívio com o professor Silvano nos primórdios do transplante de fígado
no nosso país, onde participei, estimulado por ele. Grande amigo de meu
pai, o conheço e admiro há muito tempo. O seu espírito muito vivo, de
uma jovialidade impressionante, são invejáveis e a sua capacidade
inovadora, aliada a um espirito organizador é extraordinária. Há homens
que envelhecem ainda jovens quando abrem mão de seus sonhos e
convicções e há homens que atingem a idade avançada permanecendo
jovens de alma e fiéis aos sonhos e convicções da juventude. Tivemos
grandes conversas e bons projetos que resultaram delas e tem sido um
privilégio poder participar da sua amizade, dos seus ensinamentos e da
sua persistência em tentar materializar os seus sonhos. Tenho uma
passagem que exemplifica bem o nosso convívio. Eu ainda residente me
deparei na enfermaria de doenças do fígado, dirigida pelo professor
Silvano, com um paciente portador de um grande tumor hepático,
diagnosticado como hemangioma, tão grande cujas dimensões eram as
do fígado normal. A indicação cirúrgica se impunha em contraponto ao
enorme risco operatório, pelo sangramento copioso, previsto. Os
métodos diagnósticos eram ainda precários e não se conseguia
determinar os limites da massa tumoral e do parênquima hepático
normal. Preparamo-nos para uma verdadeira batalha, que seria a
operação. O professor Silvano conseguiu fios importados, inexistentes no
nosso meio; instrumentos cirúrgicos inéditos para poder coibir o
sangramento anunciado. Curioso que à medida que nos preparávamos
mais e mais nos sentíamos mais seguros e a confiança com o resultado,
antes muito pessimista foi se tornando mais evidente. No momento da
operação, entretanto, com o paciente deitado na mesa de operações, já
anestesiado, e o abdômen protuberante pelo avantajado tumor a nossa
confiança, confesso, esmoreceu um pouco. Após a abertura do
abdômen, saltou pela incisão um tumor enorme, com um enovelado de
vasos evidentes e calibrosos que imediatamente reconhecemos como
inoperável. Professor Silvano não se abalou. Manuseou o tumor, para lá
e para cá e para nossa surpresa ele não fazia parte do fígado e era sim
um apêndice do mesmo, de 2 quilos, ligado ao fígado por um pedículo,
composto de calibrosos vasos, de onde vinha seu suprimento sanguíneo.
Inacreditável! Foi uma operação de 5 minutos, tempo gasto para ligar o
pedículo e retirar o tumor, com sangramento zero! Lições aprendidas
com professor Silvano, a partir deste caso, para toda a vida de um
cirurgião: organize-se ao máximo; prepare-se para o pior; minimize as
chances de erro; respeite seus limites; proteja o paciente. Pode até ser
que a sorte do professor Silvano te acompanhe!
Segundo Churchill, primeiro-ministro do Reino Unido durante a Segunda
Guerra Mundial, “Vivemos com o que recebemos, mas marcamos a vida
com o que damos”. E eu recebi muito do professor Silvano, assim como
seus pacientes, seus alunos e a comunidade médica brasileira. Assim,
neste momento, só tenho que lhe agradecer.
Ao longo destes 36 anos de trabalho incessante no Complexo Hospitalar
do HC, sendo 32 dedicados ao Incor, tive a oportunidade de conviver
com realidades muito distintas dentro de um mesmo hospital público. Em
2014, obtivemos resultados que vínhamos perseguindo desde o início do
programa de transplantes do Incor há 27 anos: o recorde nacional em
números absolutos em transplante de coração e pulmão; a sétima
colocação mundial em relação ao número de transplantes cardíacos
realizados e resultados comparáveis aos melhores centros do mundo.
São números que enchem de orgulho qualquer brasileiro, pois isto é uma
representação objetiva e palpável da nossa capacidade em superar
dificuldades e obter os melhores resultados possíveis. Portanto, somos
capazes de chegar lá, apoiados pelo nosso sistema público, nos seus
diferentes níveis de poder e de atenção. Entretanto e paralelamente a
isso, somos confrontados diariamente, no mesmo Incor, com dificuldades
para organizar o atendimento aos pacientes de emergência, que vem ao
nosso pronto socorro, que por sinal está em reforma para ampliação: são
tantos e de tamanha gravidade que o Incor poderia fechar todos os seus
demais setores de ambulatório e pacientes externos, que seria
tranquilamente alimentado e estaria totalmente lotado, com os pacientes
oriundos exclusivamente da emergência ou pronto socorro. Portanto,
simultaneamente ao sucesso em alguns setores há deficiências
importantes em outros. E este exemplo que temos em casa se repete em
outras tantas situações: o primor em imunização e atendimento à AIDS
em contraste à carência de leitos de UTI em várias regiões do país. E
tantos outros exemplos semelhantes podem ser identificados.
É também inegável que vivemos dentro da área médica do nosso país
um momento de grandes transformações e mudanças, algumas cujo
impacto já estamos absorvendo e outras que se apresentarão ao longo
dos próximos anos. Dentro deste raciocínio o tema escolas médicas
surge quase que naturalmente na discussão. Se por um lado temos
carência de médicos no nosso país particularmente em algumas regiões,
há enorme preocupação com o processo deflagrado para tentar formar
estes médicos, com abertura recente de novas faculdades. Nos últimos
20 o número de escolas médicas triplicou e há hoje perto de 250 escolas
em funcionamento. Se por um lado se impõe a necessidade deste
crescimento, por outro há forte preocupação com o controle da qualidade
destes egressos das escolas médicas, principalmente das mais recentes.
É conhecido todo o processo a que estas novas faculdades tem que se
submeter, mas é imperioso que os mecanismos de controle estejam
muito ativos e vigilantes, presentes e eficientes, para garantir protocolos
de qualificação compatíveis com o bom exercício profissional e a garantia
de um atendimento seguro aos nossos pacientes. Se no cenário anterior
a 2000 esta preocupação era real, é perfeitamente legítimo considerar
que esta preocupação deverá aumentar e muito, a partir de agora.
Há alguns meses, em uma visita a esta casa, tive a oportunidade de
fazer uma apresentação sobre um assunto que gostaria de discorrer
rapidamente aos senhores. Trata-se do impacto das novas tecnologias
na área médica. Na minha área, cirurgia cardiotorácica isto é
particularmente sensível, mas é algo que afeta praticamente todas as
demais áreas. A inovação tecnológica pressupõe o desenvolvimento e a
introdução de novas drogas, dispositivos e procedimentos, visando novas
formas de cuidado aos pacientes, através de melhores opções
diagnósticas e terapêuticas. E qual é o problema que isto tem em relação
ao nosso país e aos nossos profissionais de saúde? O problema é que
durante as últimas décadas o desenvolvimento de tecnologias mais
sofisticadas foi um privilégio de países e centros mais desenvolvidos,
onde nosso país não se inclui. Ou seja, tecnologia foi e é desenvolvida
para auxiliar e melhorar a vida das pessoas, mas infelizmente temos
dificuldade de acesso a ela. São na sua maioria equipamentos caros e
importados, difíceis de serem obtidos e quando aqui chegam, com muita
frequência, há a defasagem tecnológica, ou seja, recebemos produtos de
uma geração anterior àquela que já está em uso nos países que
desenvolveram os equipamentos. Entretanto, está muito claro que há
forte apelo para a utilização destes equipamentos e drogas, proveniente
dos próprios profissionais de saúde e da própria população usuária hoje
muito mais informada sobre os avanços e inovações. E qual é o impacto
que esta nova tecnologia apresenta sobre os sistemas de saúde? É
enorme. Apenas para exemplificar, os gastos anuais com cuidados de
saúde nos Estados Unidos aumentaram de 2 trilhões de dólares em 2005
para 4 trilhões em 2015 e no Brasil mais que triplicou, no SUS, entre
2000 e 2010. E parte deste aumento de custos pode ser atribuída à
incorporação de novas tecnologias. Se tomarmos o exemplo do nosso
país podemos observar que os gastos com saúde são desiguais e feitos
de maneira muito heterogênea entre nós. O gasto per capita é cerca de 4
vezes maior entre os pacientes do sistema de saúde suplementar
(basicamente convênios) do que no sistema público (SUS). Se nós
consideramos que o próprio sistema de convênios já apresenta muita
limitação, particularmente no que diz respeito ao fornecimento de novas
tecnologias, o que dizer do SUS, onde os recursos são ainda mais
limitados? Podemos, portanto reconhecer que o emprego de tecnologias
é feito no nosso país de uma forma heterogênea e que a maioria da
nossa população não tem acesso a tecnologia de ponta. E basicamente
qual é o problema? O problema é que novas tecnologias são muito
caras. A realidade é que não se conhece nenhum produto, dispositivo ou
medicamento novo que seja de baixo custo. Não há, não existe. Produto
novo, de alta tecnologia é de alto custo, é caro. Foi desenvolvido ao
longo de muitos anos, muita pesquisa, muito trabalho. E isto custa muito.
Estamos, portanto, diante de um dilema: não temos acesso porque é
caro e difícil de ser obtido, mas por outro lado a não utilização nos faz
ficar cada vez mais distantes das melhores formas de diagnóstico e
tratamento. Isto para não levar em conta a pressão que é feita pela
indústria que desenvolve os produtos. Ou seja, todos querem ser
tratados com o que há de melhor e mais moderno, mas a pergunta é:
quem vai pagar por isto e onde está o recurso para tal? A resposta é
simples: não há este recurso, não pelo menos no montante necessário.
Portanto tenho insistido que a incorporação tecnológica, em países com
o nosso perfil tem que ser feita de forma inteligente e não a qualquer
custo, sob o risco de inviabilizar o processo. Quando me deparo com
alguém que diz: você pode usar o equipamento, porque a fonte pagadora
vai se responsabilizar pelo pagamento, já sei que a conta será cobrada
mais adiante, de alguma forma. Reforço que devemos buscar propostas
eficientes e inovadoras para encaminhar tal questão. Disseminação
desse conceito nas escolas médicas, para que haja consciência desse
assunto, desde o início da formação profissional; mecanismos que
propiciem o fortalecimento de tecnologia própria nacional e
desenvolvimento de centros de excelência, para utilização controlada e
monitorada de equipamentos de alta tecnologia, com avaliação de custo
efetividade, são possíveis soluções para o encaminhamento dessas
questões. E temos tantos outros exemplos, como a dificuldade no
atendimento a cardiopatas pediátricos, só para citar mais um.
Estes exemplos servem para retratar que há um sem número de
problemas que se interpõem para que a medicina brasileira possa atingir
um nível de excelência almejado por nós e disponível para a toda a
população brasileira, indistintamente. Não uma medicina dos que podem
pagar por ela e uma dos que não podem. Uma medicina única,
competente, abrangente e igualitária. Entendo, com toda a humildade
que procuro ter neste momento, que isto só será alcançado através de
uma união verdadeira dos vários setores interessados e responsáveis
pelo encaminhamento destas questões: governos, entidades
acadêmicas, associativas, conselhais e da sociedade civil. E não prego
esta união como algo vazio, mas sim como um mecanismo eficiente do
encaminhamento das soluções de problemas tão complexos. Tenho
certeza que a Academia Nacional de Medicina, na qual orgulhosamente
me incluo a partir de agora seguirá colaborando na atenção a estes
problemas, que são permanentes e só serão superados ou minimizados
com muita união de todos os setores envolvidos. Tenho convicção que
propostas unilaterais terão muito mais dificuldade de encaminhamento
que propostas coletivas e previamente acordadas.
Ao final, quero agradecer, mais uma vez, a todos pela presença e
prestígio que emprestam a esta solenidade. Em especial à minha família,
que foi o início de tudo: à minha mãe, Aurice, diuturnamente ao nosso
lado, zelando em cada detalhe para que pudéssemos nos desenvolver
da melhor maneira e crescêssemos moral e profissionalmente,
emprestando seu amor incondicional a cada um de nós. Meu pai, muitas
vezes ausente de casa, pelo seu grande envolvimento profissional,
sempre dizia que quem havia criado e moldado o caráter dos seus filhos
era ela. A meus irmãos Ieda, Iara e Marcelo, cunhados, Bia, Binder e
meus sobrinhos, meus agradecimentos por todo nosso companheirismo
e união. À minha querida esposa Silvana, todo o meu agradecimento e o
meu amor, por estar sempre ao meu lado, com a sua força e a dedicação
de uma vida, que nos possibilitou criar uma linda família composta pelos
nossos queridos filhos Rodrigo, Guilherme e Melina, minhas noras/filhas
Ana Beatriz e Gabriela e nossos netos queridos, Pedro, Bruno e Luisa,
razão das nossas vidas. Acompanhar a evolução de vocês, como pais e
mães dedicados e profissionais competentes e vê-los crescer, nos enche
de orgulho, tornam as nossas existências completas e nos faz
humildemente agradecer a Deus por isso, todos os dias de nossas vidas.
Antes de encerrar gostaria de reproduzir um pequeno trecho do discurso
que meu pai proferiu neste majestoso salão há 25 anos, por ocasião da
sua posse. Não posso deixar de fazer isto, porque isto talvez alivie um
pouco a falta e a saudade que sinto dele, neste momento.
“Se tudo mudou nas últimas décadas e se a medicina também mudou,
não mudou o homem, que diante da doença continua inseguro, aflito e
com medo. Quando diante do sofrimento da doença lhe falta a certeza de
poder contar com alguém que lhe desperte a confiança e a fé.
O oposto do medo não é a coragem, é a fé. Fé que justifica, conforta e
alivia. Fé que faz superar as dificuldades, os insucessos, as amarguras.
O homem deve ser movido por alguma coisa mais que o prêmio ou o
castigo. Alguma coisa que o engrandeça e o dignifique, diante de seus
próprios olhos. O prazer de combater o bom combate, sem esperar
recompensa e sem temer o castigo, apenas pelo prazer de cumprir uma
missão sublime. E essa missão os médicos a cumprem.
Costumo dizer que somos um grupo de privilegiados, porque temos a
oportunidade de sentir o sentimento mais nobre, que é o da gratidão e de
sermos agasalhados pela esperança e pela confiança dos que se
entregam aos nossos cuidados.
Não há recompensa material que supere o sentimento de lealdade que o
médico sente quando responde a essa entrega que o doente faz do seu
destino e da sua própria vida.
Todo o trabalho, todo o esforço e todo o sacrifício da profissão não
almeja prêmio nem teme castigo. Tudo é feito porque acreditamos que a
missão de aliviar, confortar e curar é uma dádiva que nos engrandece e
nos enobrece, porque cuidamos do que a pessoa tem de mais nobre,
que é a sua própria vida”.
Muito obrigado.
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