Caderno de resumos - Instituto Winnicott

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COLÓQUIO
Ontologia e Psicanálise
29 e 30 de março de 2017
2
Colóquio Ontologia e Psicanálise (1. : 2017 : São Paulo)
Ontologia e Psicanálise : [caderno de resumos e programa do] Colóquio
Ontologia e Psicanálise/ Caroline Vasconcelos Ribeiro (Org.). - São Paulo:
Instituto Brasileiro de Psicanálise Winnicottiana, 2017.
65p.
ISSN 1984-9591
1. Winnicott, D. W. (Donald Woods), 1896-1971. 2. Psicanálise.
I. Ribeiro, Caroline, Vasconcelos. II. Título.
21 CDD 150.195
Índice para catálogo sistemático
Psicanálise
150.195
3
Índice
Apresentação5
Programa7
Conferências10
Comunicações24
4
5
Apresentação
O Colóquio Ontologia e Psicanálise objetiva promover um debate
entre os resultados de pesquisas e projetos em desenvolvimento do
Grupo de Pesquisa em Filosofia e Práticas Psicoterápicas (GrupoFPP/
Unicamp/CNPq) - centrados no estudo da psicanálise de Winnicott e
guiado pela teoria dos paradigmas de Kuhn e a ontologia fundamental de Heidegger - e outros olhares sobre a relação das diferentes
formulações da ontologia com as distintas edições da psicanálise. A
sua importância se deve à tentativa de socialização do conhecimento produzido no interior do GrupoFPP em franco debate com outras
formas de abordagem da relação entre a ontologia e a psicanálise. Em
função disso, a comissão organizadora do evento prezou por convidar
especialistas responsáveis pelo desenvolvimento de diferentes linhas
de investigação em relação à interface entre estes campos de saber.
Esperamos que um debate plural e interdisciplinar aconteça durante a
realização do Colóquio Ontologia e Psicanálise.
Zeljko Loparic
Caroline Vasconcelos
Conceição Aparecida Serralha
Suze Piza
6
7
Programação
quarta-feira, 29
08h00 às 09h40 sessões de comunicação
10h00 às 11h00 conferência de abertura
A ontologia fenomenológica ante o desafio clínico
Irene Borges Duarte
11h00 às 11h20 debate
11h20 às 12h20 conferência
Ontologia e os paradigmas do tratamento psicanalítico
Zeljko Loparic
14h30 às 15h30 mesa redonda
14h30 às 15h00
Ética e continuidade de ser em Winnicott e Foucault
Suze Piza
15h00 às 15h30
Sloterdijk e a semântica para dualidades arcaicas
Juliano Pessanha
15h30 às 16h00 debate
16h00 às 16h20 intervalo
16h20 às 18h00 mesa redonda
16h20 às 16h50
Psiquiatria fenomenológica e psicanálise winnicottiana: O caso Anne
Elsa Oliveira Dias
16h50 às 17h20
O corpo à luz da ontologia heideggeriana e da psicanálise
winnicottiana: afinidades e distanciamentos
Caroline Vasconcelos Ribeiro
17h20 às 18h00 debate
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quinta-feira, 30
08h00 às 09h40 sessões de comunicação
10h00 às 10h40 conferência
Ontología relacional, ontología de substancia y posibilismo ontológico
en el psicoanálisis
Leticia Olga Minhot
10h40 às 11h10 debate
11h10 às 12h35 mesa redonda
11h10 às 11h40
Representação e linguagem em Freud: considerações
ontológico-metodológicas
Carlota Ibertis
11h40 às 12h10
Uma proposta de ontologia hermenêutica na psicanálise: a psicanálise
aplicada de Winnicott
Éder Soares Santos
12h10 às 12h40 debate
14h40 às 16h35 mesa redonda
14h45 às 15h15
A Natureza do psíquico para Freud
Fátima Caropreso
15h15 às 15h45
Princípio do prazer como regulador de uma civilização em declínio
Franscisco Verardi Bocca
15h45 às 16h20 debate
16h15 às 16h40 intervalo
16h40 às 18h20 mesa redonda
16h40 às 17h20
Lacan contra a ontologia
Daniel Perez
99
17h20 às 18h00
A psicanálise como “filosofia da carne”:
Merleau-Ponty e os pressupostos ontológicos freudianos
Richard Theisen Simanke
18h30 lançamento
Pluralismo na Psicanálise
Organizadores:
Eduardo Ribeiro da Fonseca
Franscisco Verardi Bocca
Rogério Miranda de Almeida
Zeljko Loparic
10
Conferências
Carlota Ibertis
Graduada em Filosofia na Universidad de
Buenos Aires (UBA), Mestre e Doutora em
Filosofia pela Universidade Estadual de
Campinas (UNICAMP), Pós-doutorado em
Paris 1 Panthéon-Sorbonne. Professora no
Departamento de Filosofia da Universidade Federal da Bahia (UFBA), membro do
Programa de Pós-graduação em Filosofia
da mesma universidade, ex-coordenadora
do GT “Filosofia e Psicanálise” da ANPOF
(2011-2012), membro do Colégio de
Psicanálise da Bahia. Tem experiência na
área de Filosofia com ênfase em Filosofia
e Psicanálise e sua vinculação com o pensamento moderno, abordando principalmente
os temas de memória, representação,
identidade, cultura e moralidade na teoria
freudiana.
Representação e linguagem em Freud:
considerações ontológico-metodológicas
Em Sobre a concepção das afasias: um
estudo crítico, Freud apresenta as noções
complementares de representação-palavra
e representação-objeto para dar conta do
fenômeno das afasias do ponto de vista mentalista por oposição à concepção
localizacionista predominante à época.
Nesse texto, ele propõe a noção de representação-palavra como um complexo
construído com base em um intrincado
processo de associações visuais, acústicas
e cinestésicas. Do complexo de palavra
distingue-se um outro correspondente
às imagens sensíveis − visuais, táteis,
auditivas, olfativas, de sabor e cinestésicas
− do objeto mentado. Em outros termos, o
objeto, − entendido como o conjunto das
sensações que desperta − é referido pela
palavra à qual se encontra ligado através
da imagem de som, do lado da palavra,
e da imagem visual, do lado do objeto. O
propósito da apresentação é o de examinar
aspectos dessas teses do ponto de vista
ontológico e metodológico bem como tecer
considerações acerca das suas relações
com o empirismo moderno.
1111
Caroline Vasconcelos Ribeiro
Graduação em Psicologia pela Universidade
Federal de São João Del Rey (UFSJ) Mestre
em Filosofia pela UFPB e Doutora em Filosofia pela Universidade Estadual de Campinas.
Pós-doutoranda em Filosofia pela Unicamp.
Co-editora da Revista Natureza Humana e
membro do Instituto Brasileiro de Psicanálise Winnicottiana e do GT de Filosofia da
Psicanálise da ANPOF. Organizadora, junto
com Suely Aires, do livro Ensaios de Filosofia e Psicanálise e do dossiê “Filosofia e
Psicanálise” da Revista Ideação. Professora
Titular da Universidade Estadual de Feira de
Santana.
O corpo à luz da ontologia heideggeriana e
da psicanálise winnicottiana: afinidades e
distanciamentos
Na obra Seminários de Zollikon Martin Heidegger dedica-se a pensar ontologicamente
o que ele nomeia de “problema do corpo”
(Leibproblem). A partir de uma conferência
do médico e professor R. Hegglin sobre a
psicossomática, o filósofo alemão indica
como a concepção científica de corpo ancora-se em pressupostos modernos, posto
que o entende como Körper, ou seja, em sua
materialidade, enquanto coisa ou substância (res). Ao problematizar esse modo
de conceber o corpo e a maneira como a
ciência médica pensa a relação entre corpo
e psique, Heidegger nos apresenta uma meditação sobre o sentido de corpo como Leib
e, além de diferenciá-lo da materialidade
da noção de Körper, relaciona-o a um modo
de ser do ente que nós mesmos, o Dasein.
Winnicott também faz uma discussão sobre
a temática do corpo e de suas relações com
o psiquismo ao formular a sua concepção
de psique-soma. Para o psicanalista inglês,
não é frutífero pensar o adoecer humano a
partir de categorias como mente e corpo,
sempre pressupostas como entidades separadas. Em função disso, Winnicott nos fala
de um alojamento da psique no corpo e da
conquista de uma existência psicossomática. Por entendemos que o tema do corpo
aparece como uma questão ao pensamento
dos dois autores almejamos, com essa comunicação, explanar sobre o modo como a
psicanálise winnicottiana aborda a tarefa de
personalização – de alojamento da psique
12
no corpo – e sobre a maneira heideggeriana de meditar sobre o problema
do corpo (Leibproblem). Além disso,
pretendemos examinar em que medida
a abordagem ontológica e a winnicottiana se afinam e se distanciam ao
tematizarem o corpo.
13
Daniel Omar Perez
Professor de filosofia na Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), pesquisador
PQ 1D no CNPQ com pesquisas sobre o
sujeito e a linguagem a partir de Kant.
Também desenvolve um projeto sobre A
constituição do sujeito a partir das relações
de identificação. Uma abordagem entre a
filosofia kantiana e a psicanálise freudiano-lacanaina. Em 2012 realizou um estágio
de pós-doutorado na Bonn Universität (ALEMANHA) onde desenvolveu parte do projeto
sobre antropologia em Kant e avançou na
tradução das Reflexões de Antropologia de
Kant (trabalho iniciado com Valerio Rohden
em 2008). No ano de 2007 realizou outro
estágio de pós-doutorado na Michigan State
University (EEUU) com o apoio da Capes.
Concluiu o doutorado em 2002 na Universidade Estadual de Campinas (BRASIL) com
o apoio da Capes. Obteve o título de licenciado em filosofia em 1992 na Universidade
Nacional de Rosario (ARGENTINA). Publicou
artigos científicos em revistas nacionais e
internacionais, livros e capítulos de livros
sobre filosofia e psicanálise. Orientou
numerosas pesquisas no nível de iniciação
científica, trabalho de conclusão de curso
de graduação, especialização, mestrado e
doutorado na área de filosofia e de psicanálise. É membro da Sociedade Kant Brasileira.
Também atua como psicanalista.
Lacan contra a Ontologia
Diante da pergunta pela ontologia da psicanálise, Lacan responde com uma ética da
psicanálise. Este aparente desvio se justifica
na tarefa da psicanálise como uma prática
clínica que procura acolher a experiência de
desejo e não como uma teoria explicativa
da realidade. Para sustentar esta proposição
apresentaremos o dispositivo conceitual
com o qual Lacan aborda, em O Seminário
7, a história de Antígona. Em função disto, 1.
Mostraremos a diferença entre uma ontologia e uma ética; 2.a distinção entre as éticas
do bem e a possibilidade de pensar uma
ética do desejo; 3.destacaremos a distinção
entre a noção de coisa (Sache) e a noção
de Coisa (Ding) mostrando o aspecto Real
da Coisa; 4. Introduziremos (extemporaneamente segundo a ordem cronológica dos
seminários) a noção de objeto pequeno (a);
5. Apresentaremos a fórmula da ética do
desejo para além ou aquém da noção de
vontade; 6. Mostraremos que Antígona, ao
não ceder de seu desejo é movida por ele
involuntariamente.
14
Eder Soares Santos
Graduação em Filosofia pela Universidade
Estadual de Campinas (1997), mestrado
em Filosofia pela Universidade Estadual de
Campinas (2001), doutorado sanduíche em
Filosofia - Universitat Freiburg (Albert- Ludwigs) (2005), doutorado em Filosofia pela
Universidade Estadual de Campinas/SP
(2006) e pós-doutorado na BergischeUniversität Wuppertal (2015). Tem experiência na
área de Filosofia, com ênfase em Filosofia
da Psicanálise, atuando principalmente nos
seguintes temas: filosofia da psicanálise,
fenomenologia existencial, teoria dos paradigmas em Kuhn, teoria do amadurecimento
pessoal. Publicou o livro “Winnicott e Heidegger: aproximações e distanciamentos”.
São Paulo: DWW Editorial/FAPESP, 2010. Foi
coordenador do Programa de Pós-graduação em Filosofia entre outubro de 2009 e
fevereiro de 2015. Atualmente é professor
adjunto no Departamento de Filosofia na
Universidade Estadual de Londrina - Paraná.
Uma proposta de ontologia hermenêutica
na psicanálise: a psicanálise aplicada de
Winnicott
Pretende-se esboçar como poder-se-ia ler
a psicanálise de Winnicott à luz de outra
ontologia científica Intenciona-se, assim,
apresentar a psicanálise de Winnicott como
uma ciência ôntica para o homem em
sentido positivo que o trata qua homem. A
fundamentação dessa ciência será fenomenológica hermenêutica, de inspiração
heideggeriana, isto é, sua base ontológica
estará fundada na compreensão do homem
enquanto ser e não no seu entendimento
enquanto um mero objeto da natureza.
Essa ciência do homem seria, dessa forma,
uma ciência da experiência. Isso significa
dizer que seria uma ciência que parte da
resolução dos problemas da vida cotidiana,
do ente que vive na sociedade contemporânea, conduzida com todo rigor, porém sem
a necessidade de ser submetida à mensuração e ao cálculo.
15
Elsa Oliveira Dias
Psicanalista e professora do Instituto
Brasileiro de Psicanálise Winnicottiana
(IBPW) . Mestre em Filosofia pela PUCSP e
doutora em Psicologia Clínica pela PUCSP,
com a tese “A teoria das psicoses de D. W.
Winnicott”. Membro do Grupo de Filosofia e
Práticas Psicoterápicas (GrupoFPP/Unicamp/
CNPq). Fundadora, em 2001, do Centro Winnicott de São Paulo (CWSP) e, em 2005, da
Sociedade Brasileira de Psicanálise Winnicottiana (SBPW). Em 2015, fundou e preside,
com Zeljko Loparic, o Instituto Brasileiro de
Psicanálise Winnicottiana (IBPW). É, ainda,
vice-presidente da InternationalWinnicottAssociation (IWA). Autora dos livros A teoria do
amadurecimento de D. W. Winnicott (2014,
3ª edição) Sobre a confiabilidade e outros
estudos (2011) e Interpretação e manejo na
clínica winnicottiana (2014), editados todos
pela DWW editorial.
Psiquiatria fenomenológica e psicanálise
winnicottiana: o caso Anne
Com este artigo, viso traçar pontos de
aproximação e de distanciamento entre a
psiquiatria fenomenológica, representada
neste estudo por Blankenburg, e a teoria
e a clínica dos distúrbios psíquicos, em
especial das psicoses, de D. W. Winnicott,
baseadas em sua teoria do amadurecimento. À luz do projeto fenomenológico de
Blankenbug e de sua teoria da esquizofrenia entendida como perda radical da evidência natural, examina-se o caso da moça
esquizofrênica, Anne, e o sentido terapêutico que orienta o seu tratamento, levado
pelo autor-analista, e coteja-se a compreensão e o trajeto terapêutico empreendidos
por este com o que seria a compreensão e
o procedimento terapêutico decorrentes do
pensamento e da clínica winnicottianos.
16
Fátima Caropreso
Graduada em Psicologia (1999) pela Universidade Federal de São Carlos (UFSCar).
Mestre em Filosofia e Metodologia das
Ciências (2002) e Doutora em Filosofia
(2006) pela mesma instituição. Realizou
estágio de pós-doutoramento (20072009) no Instituto de Filosofia e Ciências
Humanas (IFCH) da Universidade Estadual
de Campinas (UNICAMP). É autora, entre
outros trabalhos, de “O nascimento da
metapsicologia: representação e consciência na obra inicial de Freud” (EDUFSCar
e FAPESP, 2008), “Freud e a natureza do
psíquico” (Anna Blume e FAPESP, 2010)
e “Entre corpo e consciência: ensaios de
interpretação da metapsicologia freudiana” (EDUFSCar, 2011, co-autoria com
R. T. Simanke). Atualmente é professora
adjunta do Departamento de Psicologia, do
Programa de Pós-Graduação em Psicologia e do Programa de Pós-Graduação em
Filosofia da Universidade Federal de Juiz
de Fora (UFJF). As suas principais áreas
de atuação como pesquisadora e docente
do ensino superior são epistemologia e
história da psicologia e da psicanálise.
Bolsista de Produtividade em Pesquisa do
CNPQ (nível 2).
A Natureza do Psíquico para Freud
No “Projeto de uma psicologia”
(1895/1950), um dos textos inaugurais da
metapsicologia freudiana, Freud propõe
que os processos psíquicos inconscientes
sejam, em última instância, processos
cerebrais e tenta formular uma teoria sobre
esses processos em termos neurológicos.
Portanto, nesse momento inicial do pensamento freudiano, a metapsicologia é explicitamente uma neuropsicologia. Nos textos
metapsicológicos posteriores, essa referência explícita à neurologia desaparece quase
completamente, e Freud passa a formular
suas teses usando principalmente termos
psicológicos. Nessa palestra, pretendemos
abordar a questão da natureza do psíquico
e do estatuto da metapsicologia para Freud
a partir da análise de suas concepções
sobre a representação, a consciência e
o inconsciente elaboradas ao longo de
seus textos metapsicológicos. Argumentaremos que, para o autor em questão, a
abordagem puramente psicológica dos
processos mentais inconscientes era algo
que ele acreditava ser momentaneamente
necessária, devido à impossibilidade de
abordá-los, então, em termos físicos. No
entanto, a questão a respeito da natureza
da consciência apresenta-se mais complexa e obscura e coloca problemas para a
definição da posição ontológica de Freud.
17 17
Francisco Verardi Bocca
Graduado em Arquitetura e Urbanismo pela
PUCCAMP (1985); bacharel e licenciado
em Filosofia pela UNICAMP (1997); mestre
em Filosofia pela UNICAMP (1994) e doutor
em Filosofia pela UNICAMP (2001). Pósdoutor em Filosofia pela UFSCar (2009)
e pela Universidade de Paris VII - Denis
Diderot (2014). Professor Titular do Curso
de Filosofia e do Programa de Mestrado
e Doutorado em Filosofia da Pontifícia
Universidade Católica do Paraná. Atua
nos seguintes temas: filosofia da história,
psicanálise, literatura e ética. Compõe e
coordena a linha de pesquisa Filosofia da
Psicanálise, Compõe e lidera o grupo de
pesquisa Filosofia da Psicanálise (PUCPR)
cadastrado no CNPQ. Compõe ainda os
grupos de pesquisa Filosofia e Psicanálise
(UFSCar) e Filosofia e Práticas Psicoterápicas (UNICAMP) cadastrados no CNPQ. No
biênio de 2008 a 2009 ocupou a coordenação do G. T. Filosofia e Psicanálise da
ANPOF.
Princípio do prazer como regulador de uma
civilização em declínio
Esta conferência, em lugar do frequente
pessimismo, identifica em Freud um ponto
de vista declinista sobre o homem, a civilização e seus destinos, conforme o ponto de
vista entrópico das ciências naturais. Para
isto, recorre, sem cronologia, a várias obras
de Freud onde apresenta seu ponto de vista
conjectural que colocou em perspectiva
continuísta os fatos históricos em ordem de
progressos e avanços culturais, mas também como produtora de mal estar, de intolerância e de declínio civilizatório. Assim,
põe em discussão a questão fundamental e
de extrema pertinência relativa à atribuição
de validade da segunda lei da termodinâmica para além dos sistemas físicos inertes.
Com o reconhecimento de toda dificuldade,
atribuímos a Freud a consideração de que a
entropia se aplica aos sistemas biológicos e
por extensão às sociedades humanas.
18
18
Irene Borges Duarte
Professora associada na Universidade
de Évora e investigadora no LabCom.IFP/
UÉ, onde coordena a linha de investigação em Fenomenologia. Foi docente na
Universidade Complutense de Madrid
(1992/1996), onde se doutorou, em 1994.
Formação nas universidades de Lisboa,
Madrid (Complutense), Mainz e Freiburg
imBreisgau. Actividade investigadora no
horizonte de uma Ontologia hermenêutica
e fenomenológica, com especial atenção à
questão e prática da tradução (com vários
projectos financiados pela Fundação para
a ciência e a Tecnologia, sob a designação
global de “Heidegger em Português”),
à Filosofia da Técnica, à Psicanálise e à
Análise existencial de raiz heideggeriana.
Directora do Curso de Doutoramento em
Filosofia na UÉ. Presidente da Direcção
da Associação Portuguesa de Filosofia
Fenomenológica (AFFEN).Selecção de
publicações:Arte e Técnica em Heidegger
(Lisboa, 2014); Fenomenologia e Ciência.
Actas do IIIº Congresso Luso-Brasileiro de
Fenomenologia(Org. em col.; 2014); A Morte e a Origem. Em torno de Heidegger e de
Freud (Org.;. Lisboa, 2008); A natureza das
coisas e as coisas da Natureza. Um estudo
da Crítica da Razão Pura(Lisboa, 2006);
Heidegger, Linguagem e Tradução (Org. em
col.; Lisboa, 2004). La presencia de Kant
en Heidegger. Dasein, Transcendencia,
Verdad. (Madrid, 2001)
A ontologia fenomenológica ante o desafio
clínico
Partindo da orientação originariamente
prática da filosofia, o presente trabalho
pretende colocar, no actual contexto da
ontologia fenomenológica, muito especialmente na de raiz heideggeriana,a questão
da relevância da prática clínica, de que a
psicanálise pode ser considerada exemplar. Trata-se de entender como o agir e
compreender o agir a partir das dificuldades e, inclusive, das patologias da realização vital quotidiana se converteu numa
das questões incontornáveis da ontologia,
na sua herança heideggeriana. Sendo a
prática clínica uma via de pesquisa do ser
à maneira humana, que, ao contrário da
tradição teorética, não parte dos conceitos
mas do seguimento sempre casuístico dos
factos, tratar-se-á também de questionar
se este percurso de intersecção oferece
suficientes garantias de cientificidade.É
neste ponto de intersecção entre a conceptualidade científica e a casuística da sua
aplicabilidade que se situa a importância
do desafio que a prática clínica da psicoterapia, nas suas diferentes vias, constitui
para a filosofia fenomenológica. Procederse-á, portanto, a definir e identificar aquilo
que a clínica possa oferecer à meditação
filosófica; para, posteriormente, referir e
identificar alguns instrumentos conceptuais
nascidos no contexto da prática clínica, que
possam revelar-se operatórios no contexto
transversal da abordagem fenomenológica
de questões filosóficas.
19
Juliano Pessanha
Possui graduação em filosofia pela Universidade de São Paulo (1986) e mestrado em psicologia clínica pela Pontifícia
Universidade Católica de São Paulo (2009).
Doutor em Filosofia na Universidade de São
Paulo (2017). Autor da trilogia Sabedoria
do nunca (1999), Ignorância do sempre
(2000) e Certeza do agora (2002), também
publicou Instabilidade perpétua (2009),
todos reunidos em nova edição sob o título
Testemunho transiente (Cosac Naify, 2015),
vencedor do Prêmio APCA, Grande Prêmio
da Crítica, categoria Literatura.
Sloterdijk e a semântica para dualidades
arcaicas.
A partir da leitura da obra de Sloterdijk será
abordada a redescrição da antropogênese
em termos da teoria dos pares e da ideia
de consubjetividade. Se pretende mostrar
que esse empreendimento filosófico tem
matrizes winnicottianas.
20
Letícia Olga Minhot
Doctora en Filosofía por la Universidad Estadual de Campinas, Licenciada en Filosofía por la Universidad Nacional de Córdoba.
Profesora Titular de la disciplina Concepciones Filosóficas en la Escuela de trabajo
Social de la Facultad de Ciencias Sociales
y Profesora Adjunta de la disciplina Problemas Epistemológicos de la Psicología
en la Facultad de Psicología, ambas en la
Universidad Nacional de Córdoba. Autora
del libro “La mirada Psicológica. Um análisis kuhniano Delpsicoanálisis de Freud.”
Directora del proyecto de investigación:
Transgresión y cuidado: la comunidad
solidaria. Subsidio Secyt-UNC. Editora de
la revista Representaciones. Revista de
EstudiossobreRepresentacionesem Arte,
Ciencia y Filosofía. SircaPublicaciones.
ISSN 1669-8401. Línea de investigación:
filosofía de la ciencia, filosofía política de la
ciencia, en particular del psicoanálisis.
Ontología relacional, ontología de substancia y posibilismo ontológico en el psicoanálisis.
En este trabajo buscamos comprender una
nueva ontología: el posibilismo ontológico.
En este trabajo aspiramos a elucidar el
concepto “posible” en el que se basa esta
ontología. Para ello, se presentan algunas
nociones del concepto. Luego, mostramos
cómo éstas se diferencian de la que traza
la nueva ontología. En este trabajo se
tratará de pensar el llegar a ser desde el
posibilismo ontológico y ver cómo impacta
esta ontología en contraposición con el
determinismo psíquico de Freud. Tratar de
comprender el psicoanálisis winnicottiano
desde esta ontología nos abre nuevas puertas para pensar el psicoanálisis.
21
Richard Theisen Simanke
Graduado em Psicologia pela Universidade
Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS),
Mestre em Filosofia e Metodologia das
Ciências (UFSCar) e Doutor em Filosofia
(USP). Professor do Departamento de
Filosofia e Metodologia das Ciências da
UFSCar de 1994 a 2012 e Professor do Departamento de Psicologia da Universidade
Federal de Juiz de Fora (UFJF) desde 2012.
Atualmente é professor e orientador de
mestrado e doutorado do PPG em Psicologia da UFJF, atuando na linha de pesquisa
em História e Filosofia da Psicologia. Autor
de “A formação da teoria freudiana das
psicoses” (Ed. 34, 1994; 2.ed. Loyola,
2009), “Metapsicologia freudiana: os anos
de formação” (Discurso Editorial, 2002) e
“Entre o corpo e a consciência: ensaios de
interpretação da metapsicologia freudiana”
(EDUFSCar, 2011; com Fátima Caropreso),
além de diversos outros trabalhos na área
de história e filosofia da psicologia e da
psicanálise. Bolsista de Produtividade em
Pesquisa (CA Filosofia) desde 2002.
A psicanálise como “filosofia da carne”:
Merleau-Ponty e os pressupostos ontológicos freudianos
A ontologia desenvolvida por Merleau-Ponty nos estágios finais de sua obra está
centrada no conceito de carne (chair) e dá
a essa noção seu alcance mais geral ao
complementar a ideia de uma “carne do
corpo” com a de uma “carne do mundo”.
Este trabalho pretende, primeiramente,
avaliar a possibilidade de interpretar essa
filosofia da carne como uma ontologia materialista. Com esse propósito, considera-se
a possibilidade de compreender o conceito
de carne como uma nova figura da matéria,
apesar das afirmações de Merleau-Ponty
que parecem excluir essa interpretação.
Também, em seus últimos escritos e notas
de trabalho, Merleau-Ponty sugeriu a
possibilidade de interpretar a psicanálise
freudiana, ela mesma, como uma “filosofia
da carne”. Assim, um segundo objetivo
é seguir essa sugestão e discutir a qual
visão da teoria de Freud essa leitura pode
conduzir, sobretudo com relação a uma
interpretação materialista de seus pressupostos ontológicos.
22
Suze Oliveira Piza
É professora de Filosofia na UFABC.
Docente no Programa de Pós-Graduação
em Filosofia na linha de pesquisa em Ética
e Filosofia Política. Pesquisadora de pósdoutorado e professora colaboradora no
Departamento de Filosofia (IFCH) UNICAMP.
É Doutora e Mestre em Filosofia pela
Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP). Tem diversos artigos e livros publicados na área de Filosofia. É pesquisadora
junto ao Grupo de pesquisa em Filosofia
e práticas psicoterápicas da UNICAMP, no
Grupo Perspectivas críticas da filosofia
moderna e contemporânea da UFABC e
LAPEFIL - Laboratório de ensino de Filosofia. Atua principalmente nos seguintes
temas: pensamento ético-político moderno
e contemporâneo, filosofia contemporânea,
ontologia, filosofia na América Latina e
interfaces entre Filosofia e Psicanálise. É
bolsista da CAPES como coordenadora do
projeto PIBID-Filosofia.
Ética e continuidade de ser em Winnicott e
Foucault
Antes e independente de qualquer coerção
externa a criança cria a capacidade de
concernir, isto é, sente-se culpada e responsável por outras pessoas. Aí está para
Winnicott a origem da Ética, não uma Ética
normativa, mas uma Ética do cuidado vinculada necessariamente a continuidade de
ser. Aquilo que Foucault denominou, a partir
do fenômeno cultural grego, de cuidado de
si e cuidado dos outros, uma série de práticas, modos de vida que servem de condições para a emergência da possibilidade
singular de ser humano. A fim de explicitar
o sentido desse cuidado exploraremos a
contribuição tanto de Winnicott quanto do
último Foucault na vinculação entre Ética e
ontologia, modos de viver e modos de ser.
23
Zeljko Loparic
Doutor em filosofia pela Universidade
Católica de Louvain (1982). É professor
da Unicamp e da PUCPR. De 198e a 1985
foi coordenador do Centro de Lógica da
Unicamp. Entre 1989 e 1994 presidiu
a Sociedade Kant Brasileira. Em 2005,
em colaboração com Elsa Oliveira Dias,
fundou, e desde então preside, a Sociedade Brasileira de Psicanálise Winnicottiana
(SBPW). Em 2013, fundou e assumiu a
presidência da Internacional WinnicottAssociation (IWA). Em 2015, promoveu a criação do Instituto Brasileiro de Psicanálise
Winnicottiana (IBPW). É autor de livros Heidegger réu (1990), Ética e finitude (1995,
2a. ed. 2004), Descartes heurístico (1997),
A semântica transcendental de Kant (2000,
3ª edição 2005), Sobre a responsabilidade
(2003), Heidegger (2004), Winnicott e Jung
(2014) e organizador de várias coletâneas,
entre outras Winnicott e a ética do cuidado
(2013), além de ter publicado numerosos artigos sobre história da filosofia,
epistemologia e filosofia da psicanálise em
revistas brasileiras e estrangeiras.
Ontologia e os paradigmas do tratamento
psicanalítico
De início, o presente trabalho se propõe a
expor a maneira como Kant substituiu a
ontologia tradicional pela teoria do valor
objetivo das determinações universais
teóricas dos objetos da natureza (semântica a priori das categorias) e dos princípios
universais do agir humano (pragmática a
priori da autodeterminação e autoprodução
do homem). Na segunda parte, será examinada a tentativa de Heidegger de recuperar,
contra Kant, o sentido ontológico originário,
não tradicional e, ao mesmo tempo, présemântico e pré-pragmático, das estruturas
do existir e do agir humano (ontologia
fundamental). Na terceira parte, será
estudada a possível relevância das teses de
Kant sobre o fim da ontologia tradicional e
a proposta heideggeriana da ontologia fundamental para as diferentes modalidades
de tratamento psicanalítico de distúrbios do
pensamento, do agir e do existir humanos.
Ênfase especial será dada à avaliação da
função do que, na linguagem de Kuhn, pode
ser chamado de “componente ontológico”
dos paradigmas de Freud e de Winnicott.
24
Comunicações
Martin Heidegger e a escrita da história
Martin Heidegger é um dos cânones do
pensamento filosófico, com discussões
longe de serem esgotadas e publicações
que ainda estão por vir a lume. Contudo,
na história ele é um autor praticamente
esquecido, tanto na esfera de formação, na
graduação, quanto na pesquisa. São poucos
historiadores que possuem nas suas obras
clássicas citações e discussões adensadas
sobre Heidegger. Minha proposta de apresentação tem como objetivo mostrar como
o círculo hermenêutico de Heidegger oferece uma alternativa diferente da ideia de
representação, bastante comum na escrita
da história. A capacidade de interpretação
e narração são vistas aqui como características ontológicas do Dasein, de modo que
o homem vive e narra suas experiências
ao mesmo tempo, sem que a narrativa seja
uma construção puramente analítica ou
ficcional, como pressupõem as visões mais
céticas sobre representações. Essas visões
entendem que há um distanciamento entre
o que é visto e o que é dito, de modo que a
narrativa ou o discurso, nunca poderão ser
condizentes com os fatos, porque são construções linguísticas sem nenhuma correlação direta com o campo da experiência. A
exemplo disso, Hayden White problematizou
a história na sua questão estética e afirmou
que não existem aspectos históricos em si,
porque toda narrativa, supostamente, seria
guiada por protocolos linguísticos. Então,
por exemplo, quando um historiador narra
Alesson Rota
Tem graduação em história pela
Universidade Federal do Rio Grande;
fez graduação sanduíche pela Universidade de Coimbra, onde desenvolveu
pesquisas sobre a escrita da história
diante de Estados autoritários, no
Centro de Estudos Interdisciplinares
do Século XX; também em Coimbra
iniciou suas indagações sobre a Hermenêutica Filosófica sob orientação
de Maria Luísa Portocarrero; é mestrando em história pela Unicamp, onde
problematiza a escrita da história na
década de 1930. Possui alguns artigos
publicados nas áreas de teoria da
história e educação.
25
um evento, como a Segunda Guerra
Mundial, o efeito no leitor, seja de
melancolia, revolta ou tristeza, depende
das figuras de linguagens empregadas
pelo autor e não da experiência do
passado. Tal proposta é encontrada de
alguma maneira na maioria dos autores
que operam no campo da representatividade ou do discurso, como Foucault.
Diferente a tudo isso, a filosofia de
Heidegger oferece para a história uma
forma de pensar o fazer história de
modo diferente e pouca explorado no
ambiente historiográfico.
26
Michel Henry: a fenomenalidade da vida
a partir dos pressupostos de Husserl e de
Heidegger e aportes à clínica
A fenomenologia da vida, em Michel Henry,
considera que a fenomenologia tradicional,
leia-se Husserl e Heidegger, deixa na indeterminação os seus próprios pressupostos.
Partindo de algumas das instalações de
Nathan Sawaya – o grito, auto-retrato, a
música, o saxofone – que fizeram parte da
exposição The Art of the Brick - 2016, e
das análises que dela fizemos com Florinda
Martins, mostraremos como é que Michel
Henry levanta essa indeterminação em
Husserl e em Heidegger para em seguida
mostrarmos a sua operacionalidade na
refundação da psicanálise. De Husserl
mostraremos a importância de passar da
fenomenalidade do como do fenômeno para
a fenomenalidade desse mesmo como.
De Heidegger mostraremos a passagem
da negatividade da fenomenalidade do
inaparente para a positividade da fenomenalidade do sentir. Fazendo referência à
obra de Nathan Sawaya o ser aí - o grito, o
auto-retrato, a música, o saxofone – remetem a mim mesmo como: eu sou o meu
grito, eu sou esta dilaceração, eu sou a
música que canto, eu sou o instrumento
que toco. Deste modo é a própria tradição filosófica de Descartes e Kant que é
repensada e com ela as possibilidades de, à
luz das questões trazidas hoje à discussão
pelas neurociências, pelas psicanálises e
demais ciências da saúde, a possibilidade
de uma psicologia transcendental a partir
da fenomenalidade dos sentidos. Em Michel
Henry o ser aí se manifesta como afeto,
Andrés Eduardo Aguirre Antúnez
Psicólogo. Professor Livre-Docente do
Departamento de Psicologia Clínica e
Vice-Diretor do Instituto de Psicologia,
Universidade de São Paulo. Membro
do GT Psicologia e Fenomenologia –
ANPEPP. Co-coordenador do Núcleo
de Pesquisas e Laboratório Prosopon.
Membro do protocolo de Investigação
em rede Internacional ara Divulgação
da obra de Michel Henry na lusofonia,
UCP, Porto.
Julio César Menéndez Acúrio
Psiquiatra. Faculdade de Ciências
Médicas da Santa Casa de São Paulo.
Membro do Núcleo de Pesquisa e
Laboratório Prosopon.
José Tomás Ossa Acharán
Psicólogo. Doutorando do Programa de
Pós-Graduação em Psicologia Clínica,
Instituto de Psicologia, Universidade
de São Paulo. Bolsista CAPES. Membro
do Núcleo de Pesquisa e Laboratório
Prosopon.
Erika Rodrigues Colombo
Psicóloga. Mestranda do Programa de
Pós-Graduação em Psicologia Clínica,
Instituto de Psicologia, Universidade
de São Paulo. Membro do Núcleo de
Pesquisa e Laboratório Prosopon.
27
todavia é à potencialidade afetiva inerente ao afeto que o fenomenólogo da vida
presta atenção no paciente que comunica suas vivências. É essa potencialidade que
habita qualquer afeto – o temor como a simpatia – que está em jogo na terapia: o
terapeuta não precisa sentir o que o outro sente, mas precisa aperceber que o outro
está a sentir temor ou dilaceramento. Para Henry é inessencial a distinção entre
normal ou patológico, essencial é não sucumbirmos às determinações do afeto. No
Romance O filho do rei, a doença não é manifestada por ser sensível a tudo o que
se passa no mundo, mas a doença é quando se sucumbe a essa sensibilidade. O
psicanalista a partir destas reflexões é aquele que ajuda o outro a não sucumbir. A
ontologia da Michel Henry é feita a partir da fenomenalidade dos pressuspostos da
fenomenologia do Husserl e de Heidegger. Assim, mostraremos que inerente à intencionalidade há uma fenomenalidade não intencional e inerente à fenomenalidade
do ser-aí há a fenomenalidade da ipseidade e que é a partir dessa fenomenalidade
que os processos da vida se tecem; por isso é nela que também esses processos
se alteram, o que veremos na Genealogia da psicanálise. Henry mostra como opera
a fenomenalidade no trabalho para que o indivíduo resgate sua individualidade em
comunidade, como pode ser visto nas obras de arte apresentadas. Não há negação
da representação, mas segue o movimento fenomenológico, sua fenomenalidade
afetiva. Tal como a pulsão, na intencionalidade, segue o movimento não intencional.
Assim, a fenomenologia da vida assinala a um fundamento seguro da ontologia e à
essência dos cuidados psicanalíticos.
28
As origens do senso moral em H. Arendt e
D.W.Winnicott
Em Eichmann em Jerusalém, H. Arendt
denuncia um tipo de mal manifesto na
sociedade contemporânea. Abandonando a consagrada formulação kantiana de
mal radical, Arendt contraria uma tradição
consolidada do pensamento moral, da qual
ela mesma é devedora, e forja o conceito de
mal banal, onde a superficialidade do agente e a superfluidade das vítimas é notória. A
filósofa faz uma investigação sobre a nossa
capacidade de julgar, para ela condição do
nosso pronunciamento sobre as coisas do
mundo e de discernimento entre o bem e o
mal. Para Arendt as atrocidades cometidas
por Eichmann é um exemplo do mal banal
e sua origem está na incapacidade do
indivíduo de pensar, de se comunicar com o
pensamento alheio, de assumir responsabilidade e sentir culpa pessoal. Na obra A vida
do Espírito Arendt defende que o pensar
está ligado à atribuição de sentido ao
mundo e só esse pensamento poderia evitar
esse mal. Todavia, esse pensamento não
pode ser ensinado e nem aprendido, então
buscamos pesquisar qual era a origem do
senso moral, do discernimento entre o bem
e o mal ou do pensamento . É inegável a
presença de Kant na obra de Arendt, mas
a concepção antropológica de ambos não
é a mesma, o que tornou infrutífero buscar
respostas a essa questão em Kant. Arendt
também não dá resposta suficiente. Partimos da influência manifesta de Heidegger
na obra de Arendt para traçar a noção de
condição humana e recorremos à psicanálise de Winnicott (cujo modelo filosófico
Carolina Aparecida Cajaíba
Psicóloga e acompanhante terapêutica. Mestranda no programa de
Filosofia na UFABC.
29
1
fundante
é o de Heidegger) e sua teoria do amadurecimento onde há a descrição
da aquisição da capacidade humana de se preocupar e se envolver com o outro,
de desenvolver o sentido de bom e mau, da aquisição da responsabilidade, cuja
base é um sentido de culpa: o estágio do concernimento. O que será apresentado
nessa comunicação é o exame preliminar do conceito de pensamento de Arendt, na
correlação com os conceitos de mal banal, discernimento, responsabilidade e culpa,
e o denominado estágio do concernimento de Winnicott.
7Na acepção arendtiana.
8 Isso não significa dizer adoção irrestrita do Dasein, tal como descrito por Heidegger; ao ser-para-a-morte, Arendt
responderá com o nascimento; ao solipsismo existencial, ela responderá com a pluralidade, à crítica à impessoalidade, ela responderá com o amor mundi e com o enobrecimento das relações humanas na esfera pública.
30
Habitar o inóspito: estudo sobre a condição
de desabrigo a partir de Martin Heidegger e
Sigmund Freud
“Na angústia, ele sente-se ‘‘estranho’’”,
escreveu Martin Heidegger, naquela que
é conhecida por ser uma das obras mais
notáveis do século XX, a saber, Ser e Tempo
(1927). Apresentando a angústia como uma
abertura ao estranho, o filósofo anunciava a
inospitabilidade do Dasein. Não se tratava,
todavia, de um simples lampejo poético
do autor em meio a uma obra marcada
pela aridez de linguagem. Ao contrário, a
frase proferida no §40 revela, sobretudo, a
condição fundamental do existir humano.
Iniciar por ela, portanto, além de nos lançar
de imediato para o tema central da presente pesquisa, especificamente, a condição
de indeterminação revelada pelo afeto da
angústia, também nos oferece um ponto
de partida para pensarmos um possível
diálogo entre suas preocupações ontológicas e aquelas que, suspeitamos, ocuparam
o psicanalista Sigmund Freud. Este, ao
desenvolver os alicerces da metapsicologia, concedeu ao inconsciente e ao seu
elemento estranho, as pulsões, um papel
central. Assim, se para Freud as pulsões
são marcadas pela indeterminação de seu
objeto e estão no fundamento do aparelho
psíquico, para Heidegger, o nada é o lugar
onde se sustenta o existir humano. Em todo
caso, parece que para ambos é o estranho
que está em questão quando a angústia
se manifesta. Por meio deste afeto fundamental, portanto, vemos a possibilidade de
se conquistar um solo comum de diálogo
entre o filósofo e o psicanalista. Assim, esta
Caroline Garpelli Barbosa
Graduação em Psicologia (Unesp-Bauru). Mestre em Psicologia do
Desenvolvimento e Aprendizagem
(Unesp-Bauru). Doutoranda no Programa de Pós-Graduação em Psicologia
do Desenvolvimento e Aprendizagem
(Unesp-Bauru). Docente e supervisora
clínica da Universidade Paulista (Unip),
na área de Psicologia Fenomenológico
-Existencial. Psicoterapeuta.
31
pesquisa de natureza teórica e conceitual, parte da hipótese de que tanto nos textos
de Heidegger, quanto nos de Freud, há uma concepção de angústia que se assenta
num lugar fundante da existência humana, o qual poderia ser articulado sob um
vértice comum que denominamos como condição de desabrigo. Entendemos que,
seja na perda de familiaridade revelada pela angústia ontológica descrita em Ser e
Tempo, seja no desamparo fundamental anunciado pela angústia enquanto expressão privilegiada da pulsão descrito por Freud, é a condição de desabrigo que vem
à tona. Para tanto, em Freud pretende-se analisar em que medida o conceito de
angústia originária esboçada em Inibição, Sintoma e Angústia (1926), em articulação com o conceito de pulsão, aponta para uma dimensão de desamparo fundamental sobre a qual o psiquismo se sustenta e que é da ordem do irrepresentável e,
portanto, do estranho. E em Heidegger pretende-se analisar em que medida o afeto
fundamental da angústia revela o estatuto ontológico da existência caracterizado
pelo estranhamento e pela falta de familiaridade. Ao propor este ponto de articulação entre dois autores de matrizes teóricas distintas, não se trata de defender que
entre eles exista um lugar epistemológico comum, mas sim, conduzir um diálogo
entre ambos no sentido de privilegiar uma discussão de sentido ético e que aponte para uma dimensão ontológica do ser humano que não pode estar de fora dos
debates acerca da praxis psicológica da atualidade.
32
O Corpo E As Três Dimensões Da Sexualidade Na Fenomenologia De Maurice Merleau
-Ponty
Dos estudos que Maurice Merleau-Ponty dedica à corporeidade, este trabalho
versa sobre os modos como sexualidade
e existência podem ser compreendidas
à luz de obras como a Estrutura do Comportamento (1942) e a Fenomenologia da
Percepção (1945). Num primeiro momento,
veremos como o corpo não se confunde
com aquilo que se pode pensar dele a partir
de perspectivas objetivistas ou subjetivista, e sim como diz respeito à nossa forma
ampla de inserção no mundo da vida. Na
junção entre natureza e liberdade, não é da
ordem do “eu penso”, mas do “eu posso”
– é potência exploratória. Ser corpo é estar
amarrado a certo mundo, pois é por ele que
o ser vai ao mundo. O corpo é, enfim, veículo do ser no mundo. Todavia, se assim for,
seremos obrigados – agora já num segundo
momento de nossa proposta – a salientar
que o mesmo só pode ser compreendido
quando, para além de uma experiência
para mim, temos em conta suas relações
com outras realidades sensíveis; o que nos
leva a considerar a sexualidade como parte
constituinte do nossa lida habitual, corpórea
e mundana. De fato, se n’algum momento
desejamos trabalhar com a ideia do corpo
como ser-no-mundo sem necessariamente
abdicar de seu horizonte afetivo, esse não
poderá mais figurar como um objeto de
contemplação, mas sim como vivência que
expressa nosso co-pertencimento num
mundo inter-humano. A sexualidade emerge, pois, como modo de ser que expressa
Diego Luiz Warmling
Mestrando do Programa de
Pós-Graduação em Filosofia da
Universidade Federal de Santa
Catarina (PPGFil UFSC), com
enfoque em fenomenologia,
existencialismo e psicanálise.
Ocupa-se com os diálogos
possíveis entre a psicanálise
freudiana e a fenomenologia
de Maurice Merleau-Ponty
acerca de temas como a teoria
das pulsões, a corporeidade
e a sexualidade. Atualmente,
é também co-coordenador do
Grupo de Estudos em Filosofia
Fenomenológica Francesa
(GEFRAN UFSC), oferecido em
ação conjunta entre o PPGFil
UFSC e o Programa de PósGraduação em Psicologia da
UFSC (PPGP UFSC).
33
nossa relação de autonomia e dependência com as coisas. Evitando certos postulados segundo os quais a sexualidade figura como fonte representacional condicionante das demais esferas da vida, revela-se aqui uma atmosfera que não é nem
transcendência da vida humana, nem imagem de representações conscientes ou
inconscientes, mas promiscua à nossa infraestrutura existencial. Sendo, portanto,
interprete e crítico da psicanálise freudiana, para Merleau-Ponty nossa vida sexual
não apenas devolve o ser à sua vivência de mundo, como dissolve a ideia de uma
síntese objetiva detentora de todos os significantes possíveis, pois – sendo corpo
no mundo em relação com a alteridade – a sexualidade será sempre implícita e
misteriosa. Enquanto modo de ser que evidencia nossa relação com as coisas, revisitaremos, enfim, os debates datados entre 1942 e 1945 acerca do corpo sexuado e
veremos como este a) nos abre para o outro, b) revela o nosso estilo de ser e c) nos
mostra a promiscuidade entre existência e vida sexual.
34
Sartre leitor de Freud
Sartre faz uma série de objeções ao projeto
psicanalítico freudiano sendo o foco de suas
críticas o conceito de inconsciente. Em sua
obra O Ser e o Nada, Sartre se preocupou
em retirar da consciência qualquer resquício ontológico essencial. Seguindo tal ideia,
vemos que na quarta parte Ter, Fazer e Ser,
ele apresenta argumentos voltados para a
tese de que o inconsciente não pode habitar
o campo do sujeito, pois isso levaria a uma
série de predeterminações que romperiam
com sua proposta de uma consciência
nadificada. Postular uma instância que
determine a consciência, que não seja ela
própria e que participe diretamente em
suas escolhas intencionais implica, segundo
Sartre, um consciente-inconsciente, ou seja,
uma contradição. Por outro lado, podemos
ver que nas leituras de Sartre em relação
à psicanálise freudiana, o autor francês
tece certos elogios, demonstrando que não
busca um distanciamento total, mas sim,
uma renovação dos modos pelos quais a
psicanálise se aplica ao sujeito. Sartre quer
evitar determinações que sejam conflitantes
com o sujeito intencional, como se mostra a
proposta freudiana do inconsciente. Para a
psicanálise existencial o sujeito decide por
si através de seus atos intencionais livres,
não havendo determinantes ontológicos que
possam delimitar tais atos. Sendo assim,
nossa busca será apresentar a crítica que
Sartre faz à psicanálise freudiana, focando
em conceitos chave como o inconsciente, a
má-fé e a intencionalidade, tendo o devido
cuidado de entender que as críticas que
Sartre faz a Freud também devem passar
Diego Rodstein Rodrigues
Possui graduação em Filosofia pela
Universidade Federal de Santa Catarina (2011) e mestrado em Filosofia
pela Universidade Federal de Santa
Catarina (2014). Atualmente cursando
doutorado na Universidade Federal de
Santa Catarina com enfoque em Fenomenologia, Existencialismo e Filosofia
da Psicanálise.
35
por uma investigação minuciosa.
Do Eu-pele ao corpo próprio: corporeidade e
subjetividade em Anzieu e Merleau-Ponty
O nosso trabalho foi desenvolvido e estruturado tendo como finalidade a investigação
da corporeidade na constituição subjetiva a
partir de uma interlocução entre a psicanálise de Anzieu e a fenomenologia ontológica
de Merleau-Ponty. No decorrer da nossa
pesquisa, são contemplados os principais
aspectos das teorias do Eu-pele e do corpo
próprio, o que nos possibilita compreender
a relevância das experiências sensíveis
para a aurora psíquica.
Inicialmente, realizamos uma retomada
histórica do conceito de corpo e percebemos que a corporeidade desde sempre
foi marcada por fortes ambiguidades. Um
exemplo disto são os avanços científicos e tecnológicos que trouxeram maior
conhecimento a respeito dos mistérios da
vida, transformando a maneira com que
entendemos a saúde e a doença, a vida e a
morte. No entanto, tais avanços não apenas
permitiram estudar o corpo cada vez mais
a fundo, mas também modificá-lo incessantemente. Percebemos, assim, que estas
e outras transformações se colocam como
uma constante exigência de se repensar o
ser humano e as suas relações.
Sabendo disso, nos parece essencial, se
quisermos compreender a condição humana, empreender, primeiramente, um estudo
acerca do papel do corpo na constituição
do Eu. Nosso estudo do corpo próprio e
Fernanda Brockmann Vanassi
Mestranda em Psicologia Clínica pela
Pontifícia Universidade Católica do Rio
de Janeiro, dedicando-se à linha de
pesquisa “Psicanálise: Clínica e Cultura”. Possui Bacharelado e Licenciatura
em Filosofia pela Universidade de
Caxias do Sul (2013). Na graduação,
foi bolsista de iniciação científica em
Filosofia da Mente (2011) estudando o conceito de pessoa em Daniel
Dennett. Além disso, desenvolveu o
trabalho monográfico sobre os temas
fenomenologia da percepção e corporeidade com base na obra de Merleau-Ponty, cujo foco do estudo foi a
compreensão dos conceitos de corpo
e sujeito. Atualmente, dedica-se aos
estudos de Psicanálise, Antropologia e
Filosofia, com ênfase nos conceitos de
corporeidade, subjetividade e cultura.
36
do Eu-pele demonstra que a dimensão da corporeidade, fundamental ao nosso
desenvolvimento psíquico, pressupõe uma outra: tanto Anzieu quanto Merleau-Ponty consideram que a psicogênese se desenrola a partir da vivência intersubjetiva.
Através da experiência do outro adquirimos um corpo próprio, saímos de uma
vida puramente orgânica e entramos para o registro da subjetividade. Concluímos,
a partir das nossas investigações, que para ambos autores, o corpo é o veículo
através do qual tomamos posse de uma existência encarnada que nos coloca em
contato com outras subjetividades, com o mundo natural e humano além de garantir o nosso acesso ao pensamento reflexivo. Fazendo um resgate da própria teoria
freudiana podemos afirmar o seguinte: é a partir do contato com o mundo que o Eu
poderá delimitar as suas fronteiras. Desta forma, é possível compreender a psicanálise como uma clínica que trabalha em vista de reconstruir os limites do eu. Esta
investigação abriu os nossos olhos para o fado de que, assim como a psicanálise,
que realiza uma verdadeira arqueologia do corpo em busca de desvendar o que há
de mais arcaico na experiência subjetiva, a fenomenologia ontológica de Merleau
-Ponty visa descrever a experiência primitiva de todo ser humano. Na psicanálise,
o analista, com o seu pincel arqueológico, vai descobrindo os vestígios e as marcas
deixadas pela experiência infantil, refazendo o percurso até a origem dos fantasmas, a fim de reconstruir a história do sujeito. Em Merleau-Ponty, isto significa se
voltar para o momento do encontro entre o corpo e o mundo, entre o Eu e o outro, o
qual ocorre tendo a carne como solo de toda experiência subjetiva.
37
O conceito freudiano de inconsciente: um
olhar à luz da ontologia de Martin Heidegger
Com essa comunicação pretendemos apresentar a crítica tecida por Martin Heidegger
ao naturalismo presente na psicanálise de
Freud, para tanto, tomaremos como foco de
análise a posição do filósofo em relação ao
conceito freudiano de inconsciente. Além
disso, almejamos indicar que Winnicott,
ao reformular o conceito de inconsciente
e considerar o amadurecer humano sem
recorrer à metapsicologia, aponta uma
via possível para pensarmos a natureza
humana sem pressupostos naturalizantes. Inicialmente examinaremos a crítica
heideggeriana dirigida à Freud na obra
Seminários de Zollikon. Nessa obra Heidegger enquadra a psicanálise freudiana no
rol das ciências da natureza e afirma que o
conceito metapsicológico de inconsciente
está a serviço da explicabilidade do psiquismo. Nessa perspectiva, ao cumprir a função
do preenchimento das lacunas presentes
na memória consciente, o conceito de
inconsciente asseguraria a conexão causal
entre os atos psíquicos. Considerando essa
abordagem heideggeriana almejamos, com
essa comunicação, tematizar as seguintes
questões: ora, se Freud rompe com a visão
de que somos apenas consciência e postula
que o psiquismo não se reduz ao consciente, por que Heidegger o considera um
cientista natural, ao invés de avaliá-lo como
um pensador que rompe com os imperativos deste tipo de ciência? Por que o filósofo
alemão, à luz de sua ontologia fundamental,
afirma que Freud objetifica e naturaliza o
psiquismo, se o pai da psicanálise – ao
Fernanda de Jesus Almeida
Graduanda em Psicologia pela Universidade Estadual de Feira de Santana
(UEFS/BA). Atuou como bolsista do
Programa Institucional de Bolsas de
Iniciação Científica (PIBIC) por três
anos (2013-2016), com o apoio do
Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e da
Fundação de Amparo à Pesquisa do
Estado da Bahia (FAPESB). Desenvolveu as pesquisas na linha Filosofia
da Psicanálise, com foco na filosofia
heideggeriana e na psicanálise de
Freud.
Caroline Vasconcelos Ribeiro
(orientadora)
Professora Titular da Universidade
Estadual de Feira de Santana (UEFS).
Psicóloga pela Universidade Federal
de São João Del Rey (UFSJ), Mestre
em Filosofia pela Universidade Federal da Paraíba (UFPB), Doutora em
Filosofia pela Universidade Estadual
de Campinas (UNICAMP). Membro do
Instituto Brasileiro de Psicanálise Winnicottiana (SBPW) e do GT de Filosofia
da Psicanálise da ANPOF (Associação
Nacional de Pós-Graduação em Filosofia). Organizadora, junto com Suely
Aires, do livro “Ensaios de Filosofia
e Psicanálise”. Co-editora da revista
Natureza Humana- Revista Internacional de Filosofia e Práticas psicoterápicas. Membro do Grupo de Pesquisa
em Filosofia e Práticas Psicoterápicas
(Unicamp/CNPq). Pós-doutoranda em
Filosofia pela Unicamp.
38
destronar a tese de que o psíquico equivale à consciência – parece ter rompido
com pretensões de objetividade cativas às ciências da natureza? Exporemos que,
para Heidegger, a psicanálise freudiana aborda os fenômenos psíquicos ancorada
numa linguagem fisicalista que reduz o campo psíquico ao funcionamento de uma
máquina movida por forças antagônicas: as pulsões. Indicaremos de que maneira,
na perspectiva heideggeriana, o conceito freudiano de inconsciente afina-se com o
perfil explicativo das ciências naturais. Em contrapartida, almejamos indicar em que
medida Winnicott pensa o termo inconsciente sem recorrer à especulação metapsicológica e à linguagem fisicalista. O que implicaria numa maneira de pensar os
fenômenos do amadurecer humano sem os mesmos pactos ontológicos da psicanálise freudiana.
A diferenciação da noção de ego na metapsicologia freudiana da noção de self e ego
na teoria do amadurecimento pessoal de
Winnicott e algumas de suas consequências
clínicas
Os conceitos em psicanálise, conforme
determinado enfoque, constituem não apenas um quadro conceitual que precisa ter
uma consistência interna a uma teoria. Os
conceitos definem também modos de interpretação e intervenção do psicanalista que
os utiliza e, portanto, constituem diferentes
direções da cura no processo psicanalítico
e efeitos terapêuticos no paciente. O objetivo desta comunicação é, em um primeiro
momento, a compreensão do conceito de
ego na metapsicologia freudiana e sua diferenciação da noção de self e ego na teoria
do amadurecimento pessoal de Winnicott.
Em uma segunda consideração, a reflexão
de como a perspectiva metapsicológica do
aparelho psíquico freudiano e o ego como
uma instância psíquica da mente-máquina, um servo submetido a três senhores
exigentes – id, superego e mundo externo –
torna-o um fraco, determinado pela dinâmi-
Flávia Maria de Paula Soares
Psicóloga e psicanalista. Professora de
psicologia na Faculdade Dom Bosco e
PUC-PR. Mestre em Psicologia Clínica
pela PUC-SP e doutoranda no Programa de Pós- Graduação em Filosofia
PUC-PR.
39
ca psíquica pulsional. De outro modo, a dimensão implicada no conceito de ego na
teoria winnicottiana se insere numa noção mais ampla de culmina na integração de
um self de característica existencial: como uma continuidade no existir, de ser, que
abre as possibilidades espontâneas e criativa do indivíduo em se sentir real. O ego
pode ser a nomeação de apenas uma parte do self, que se apresenta como intelecto, mas também, pode ser a terminologia que nomeia a tendência a formar uma
unidade: um si-mesmo (self). Se o ego freudiano se constitui pela diferenciação pelo
contato do id inicial com o mundo externo, para Winnicott, o self é construído pelo
encontro de disposições inatas com um ambiente facilitador em que a mãe tem
uma peculiar condição de se adaptar às necessidades do bebê e promove a base
da saúde deste. O ser si-mesmo (self), como possibilidades de sentido, só se torna
possível através da relação de cuidado do outro em relação ao indivíduo, no mundo.
A consequência direta destas configurações conceituais freudianas é que o ego permanece fraco e infantil, sempre submetido às exigências de instâncias pulsionais
e do mundo externo, e, portanto determinado como um joguete nas mãos de seus
exigentes senhores. Na análise freudiana, o psicanalista deve se aliar ao paciente
para vencerem a resistência do ego e enfrentar as “batalhas” com o id. O ego sempre fracassa. O self em Winnicott se mostra em sua potencialidade de amadurecimento pessoal em cada fase da vida, como sinal de saúde do indivíduo. Algumas
consequências diretas desta perspectiva teórica na clínica psicanalítica podem ser
consideradas: uma delas é poder viver a vida como uma continuidade de sentidos
de si-mesmo em necessárias transformações conforme a fase da vida, como um
si-mesmo que supera a dependência inicial em direção à autonomia adulta, ou seja,
amadurece; e, em uma segunda consideração, a intervenção e manejos do psicanalista em relação ao paciente assumem a função de cuidados que sustentam um
ambiente facilitador para que o amadurecimento ocorra.
40
A Estranheza De Freud Diante Do “Espectro
Da Morte”
Em nossa comunicação destacaremos, em
Mais além do princípio do prazer, de 1920,
o que Freud definiu como a característica geral das pulsões. Com ela expôs em
definitivo sua perspectiva conservadora
da natureza da vida, a pulsão de morte
circunscrita como uma tendência de todo o
ser vivo ao retorno para um estado anterior.
No entanto, logo após a conclusão declara
que tal concepção soa estranha, pois já nos
habituamos a ver nele [instinto/pulsão] o
fator que impele à mudança e ao desenvolvimento. Entendemos que a construção
do novo jogo pulsional, e sua natureza
mortífera, exigiram um empenho intelectual
intenso de Freud e, por isso, sua declaração
nos surpreende. Sendo nosso propósito
maior investigar o estatuto da pulsão de
morte na teoria de Freud, decidimos, ainda
que de modo restrito, rastrear a presença
de princípios reguladores do funcionamento
do aparelho psíquico, arrazoando que a
noção de aparelho revela automatismo, por
seu modo de funcionamento, (submetido
princípios), por sua estrutura e finalidades.
Para isso, destacamos também argumentos do texto Projeto para uma psicologia
científica, de 1895, por considerarmos ser o
propulsor da metapsicologia freudiana. Pretendemos apreender a presença do ponto
de vista econômico-dinâmico neste ensaio
e sua permanência, por hora, ‘reconfigurada’, como regulação inercial, justamente em
trabalho posterior, 1920, no qual declara a
‘estranheza’ conforme citamos no parágrafo
acima. É verdade que o estranhamento de
Francisco Verardi Bocca
Graduado em Arquitetura e Urbanismo
pela UNICAMP (1985); bacharel e
licenciado em Filosofia pela UNICAMP
(1997); mestre em Filosofia pela UNICAMP (2001). Pós-doutor em Filosofia
pela UFSCar (2009) e pela Universidade de Paris VII-Denis Diderot (2014).
Professor Titular do Curso de Filosofia
e do Programa de Mestrado e Doutorado em Filosofia da PUCPR. Atua nos
seguintes temas: filosofia da história,
psicanálise, literatura e ética. Compõe
e coordena a linha de pesquisa Filosofia da Psicanálise (PUCPR) cadastrado
no CNPq. Compõe ainda os grupos de
pesquisa Filosofia e Psicanálise (UFSCar) e Filosofia e Práticas Psicoterápicas (UNICAMP) cadastrados no CNPq.
Entre outras publicações, é autor do
livro “DO ESTADO À ORGIA”.
Rosana Grushenka Nader da
Rocha
Graduada em Pedagogia com habilitação em Educação do Def. Mental
(1986); graduada em Orientação
Educacional(UFPR 1992); Especialista
em Educação Especial (PUCPR 1989);
Especialista em Psicopedagogia (PUCPR 1999); mestre em Educação (UTP
2003). Doutorado em andamento em
Filosofia, linha de pesquisa Filosofia
da Psicanálise (PUCPR). Compõe
o grupo de pesquisas Filosofia da
Psicanálise (PUCPR) cadastrado no
CNPq. Professora no Ensino Superior,
Diretora Auxiliar na modalidade de
Educação Especial e Psicanalista
Clínica. Investiga: Educação Inclusiva
e Psicanálise.
41
Freud também causou perplexidade em seus leitores. Certamente que tal perplexidade não se vincula simplesmente à narrativa, por vezes ambígua, mas também
ao fato de em sua construção, numa atitude apenas aparentemente surpreendente, Freud ter se afastado extraordinariamente das orientações cientificistas que
o guiaram inicialmente. Por outro lado, relativo ainda à perplexidade dos leitores,
Freud reconheceu nesta obra que; Para muitos de nós pode ser difícil abandonar a
crença de que no próprio homem há um impulso para a perfeição (2010, p. 209). Na
verdade, admitia ele próprio abandonar a ideia de um usufruto dos prazeres pelos
homens que se daria em perfeita harmonia. Ora, a noção de exaustão (escoamento
de estímulos) já havia sido tratada por Freud em 1895; ao estabelecer a pulsão de
morte (e o princípio do prazer como seu regulador) apenas retomou o argumento
de que a quantidade de excitações e as sucessivas sensações, num dado ritmo e
intensidade, provocam o desprazer por sua potencialidade intolerável, sendo que a
eliminação de tal perturbação, regulada pela inércia na vida orgânica, deve recuperar o estado de prazer no escoamento. Marcou deste modo, e mais uma vez, o jogo
pulsional com o sinal da negatividade do prazer. Em tudo, contrário aos que tendem
a ler na narrativa freudiana uma concepção positiva do prazer, conforme conclui
Monzani. (1989, p. 205). Nosso percurso segue a orientação da leitura feita por
Monzani (1989). Para nós as palavras de Freud, são objeto de estudo que, necessitam serem tomadas no movimento espiralado revelado em sua plasticidade. Com
esta inspiração, julgamos necessário apreendermos a obra de Freud em sua integralidade, segundo uma visão de conjunto, uma vez que é a lógica interna da obra
que dá visibilidade especialmente à autonomia e à criatividade teórica de Freud.
42
A “Psicanálise da Natureza” à luz de uma
“filosofia da carne”
Maurice Merleau-Ponty (1908-1961) parece
ter sido o único filósofo francês contemporâneo a travar um diálogo ininterrupto com
o pensamento freudiano ao logo de toda a
sua obra. Mais de uma vez a teoria psicanalítica desempenhou um papel de destaque
nos momentos decisivos das inflexões e
deslocamentos temáticos de sua filosofia.
Não obstante, se por um lado os comentários de Merleau-Ponty sobre Freud nos
anos 1940 denotam a esperança de uma
rearticulação entre os domínios físico e psíquico amparada em noções psicanalíticas,
por outro, exprimem também a decepção
do filósofo diante da incapacidade que a
psicanálise tinha de extrair, dessas mesmas noções, as consequências ontológicas
que a reflexão filosófica esperava. Daí sua
postura crítica, denunciando repetidamente
os equívocos do causalismo psicológico e
do idealismo que pervadem a obra freudiana. Chama a atenção, porém, que em suas
últimas obras, notas de trabalho e textos
publicados postumamente, compareça
uma reavaliação positiva acerca da psicanálise que culmina com a célebre frase de
novembro de 1960: “Fazer uma psicanálise
da Natureza: é a carne, a mãe” (O Visível
e o Invisível, 1964). Quais os motivos de
tal reavaliação? Como compreender uma
sentença formulada de forma tão hermética? Fazer uma “psicanálise da Natureza”
implicaria identificar noções ou conceitos
comuns à fenomenologia merleau-pontyana
e à psicanálise freudiana no interior de um
mesmo projeto epistemológico? Reconhe-
Gleisson Roberto Schmidt
É Professor de Filosofia e pesquisador
na Universidade Tecnológica Federal
do Paraná (UTFPR), campus Curitiba
(PR). Docente do Programa de PósGraduação em Tecnologia e Sociedade
(PPGTE) daquela instituição, é líder
do Grupo de Estudos e Pesquisas em
Filosofia e Ensino de Filosofia (FEF).
Doutor em Filosofia pela Universidade
Federal de Santa Catarina (2014),
Mestre em Filosofia pela Pontifícia
Universidade Católica do Paraná
(2010) e Bacharel em Filosofia pela
Universidade Federal do Paraná
(2010), seus interesses de pesquisa
incluem Epistemologia, Metafísica e
Ontologia, bem como o pensamento
final de M. Merleau-Ponty e a recepção do freudismo na fenomenologia
francesa. Seu projeto de pesquisa atual, intitulado “O conceito de Natureza”,
versa sobre as concepções acerca da
Natureza articuladas pelas tradições
filosóficas e científicas ocidentais.
43
cendo a multiplicidade de interpretações possíveis acerca do projeto da “psicanálise da Natureza” e sua incontornável referência aos estudos acerca do conceito
de Natureza que Merleau-Ponty realiza no Collège de France entre os anos 1956
e 1960, sustentamos que é no esclarecimento da noção de carne que é possível
encontrar o sentido de tal projeto. Afinal, lemos em nota do mesmo ano de 1960
(esta, datada de dezembro): “A filosofia de Freud não é uma filosofia do corpo, mas
da carne” (id.). É a reflexão sobre o corpo que estabelece a unidade do pensamento
de Merleau-Ponty ao mesmo tempo em que permite perceber que é na generalização ao mundo do modo de ser do corpo próprio e identificando nele a atestação
de um sentido novo do Ser que Merleau-Ponty constitui sua ontologia. Tendemos a
ver, nesse movimento que amplia à carne a dinâmica própria ao esquema corporal,
a investigação acerca da origem libidinal dos comportamentos intencionais espontâneos no interior do campo fenomenal. Fazer uma “psicanálise da Natureza” nos
termos de uma “filosofia da carne” implicava, àquela altura, fazer aquilo que foi a
intenção do filósofo com a crítica que dirigiu à psicanálise, isto é: extrair da teoria
psicanalítica consequências filosóficas de certa ordem - neste caso, no domínio da
ontologia (algo que Freud não foi capaz de fazer) -, a fim de descrever o modo de
unidade entre expressão e percepção, verdade e experiência. Para compreendê-lo,
pretendemos descrever as razões que fazem do estudo da Natureza uma propedêutica à ontologia do sensível e, interpretando a “psicanálise da Natureza” à luz de
uma “filosofia da carne”, identificar na teoria freudiana um tratamento não-idealizante nem reducionista da imbricação recíproca entre idealidade e sensibilidade.
44
Ao Gozo com Carinho
Esse trabalho é resultado de uma reflexão
sobre o conceito de gozo a partir do estudo
sistemático do seminário XX intitulado
Mais, ainda de Jacques Lacan, trabalhado
no curso de Leituras dirigidas da obra do
mesmo autor realizado em curso de extensão na Unicamp no ano de 2015 junto ao
Prof. Dr. e psicanalista Mário Eduardo Costa
Pereira em articulação com o conceito de
“produção de presença” de Hans Ulrich
Gumbrecht (Produção de presença – o que
o sentido não consegue transmitir). Em seu
livro, Gumbrecht rediscute a tradicional
polaridade entre sujeito e objeto e oferece um modelo de análise e produção de
saber que destaca processos de oscilação
entre construção de sentido e produção de
presença. É a partir desse acento sobre a
produção de presença em detrimento dos
saberes correntes cujo predomínio está em
atribuir sentido aos fenômenos que se busca um diálogo com a noção de corpo para
a psicanálise e gozo em Lacan. A reflexão
encontrada no trabalho se inicia com a conferência 35, texto de 1933 de Freud chamado: A Questão de uma Weltanschauung para
inicialmente pensar algumas dificuldades
da construção do conhecimento e posteriormente articular as críticas contidas no
Título da Letra (Nancy e Labarthe) a respeito
do sistema de pensamento lacaniano. Os
embates de Freud com o corpo biológico,
assim como com o “animal” humano como
ancoragem ontológica de suas construções
teóricas aparecem no texto a partir de Além
do Princípio do Prazer e o exemplo do FortDa culminando na ruptura radical de Lacan,
Gustavo Florêncio Fernandes
É psicanalista, formado na instituição
TRIEP (Trabalhos de Investigação e
Estudos em Psicanálise) em Jundiaí,
onde reside e trabalha, atendendo
em seu consultório a oito anos. Atuou
durante seis meses exercendo um
trabalho de análise institucional junto
a Daisy Lino no Ambulatório de Moléstias infecciosas de Jundiaí. Atualmente
acompanha o curso de extensão do
professor Mário Eduardo Costa Pereira
na Unicamp. Atualmente é membro do
TRIEP e participa na transmissão da
psicanálise no curso de formação do
TRIEP com outros colegas.
45
para quem a psicanálise contempla um conhecimento e um fazer clínico que inclui
o Real, justamente a característica primordial que torna possível mantê-la com
seu caráter subversivo de um conhecimento sempre incompleto, marcando uma
diferença radical com outros sistemas de pensamentos. O conceito de produção de
presença de Gumbrecht, contrapondo-se à produção de sentido, torna possível o
principal debate encontrado no texto ao se articular com o conceito de Real lacaniano e consequentemente ao conceito de gozo. O artigo procura proporcionar um
debate onde o conceito de gozo seja apresentado de maneira a qual este não se
torne uma hipótese superior dominante para a psicanálise, estancando assim as
possibilidades criativas tão marcantes nas construções teóricas da mesma.
Heidegger e a metapsicologia de Freud:
uma discussão ontológica
Na obra Seminários de Zollikon Heidegger
problematiza a metapsicologia freudiana
com o objetivo de apontar os pactos ontológicos que subjazem a esta parte especulativa da psicanálise de Freud. Segundo o
filósofo alemão, a metapsicologia de Freud
foi formulada tendo como suporte a filosofia
neokantiana e a objetividade das ciências naturais. Alguns textos de Freud, em
contrapartida, apresentam argumentos que
parecem escapar à crítica heideggeriana,
demonstrando afinidade com um vocabulário que se serve de metáforas e analogias
e faz menção a bruxas e feiticeiras para
dar conta da complexidade dos conceitos
abstratos de sua metapsicologia. No texto
Ansiedade e Vida Pulsional, por exemplo,
Freud refere-se à teoria das pulsões como
sua mitologia e à pulsão como uma entidade mítica. Já no escrito Análise Terminável
e Interminável o psicanalista qualifica a
metapsicologia como uma espécie de
feiticeira, algo que estaria ao nível de uma
fantasia. O aparelho psíquico, da obra A Interpretação dos sonhos, é comparado a um
Jilvania de Jesus Barbosa
Estuda Psicologia na Universidade
Estadual de Feira de Santana. Foi bolsista durante três anos (2013/2016)
através do Programa Institucional de
bolsa de Iniciação Científica apoiado
pela Fundação de Amparo a Pesquisa
do Estado da Bahia (FAPESB), sob
orientação da prof.ª Drª. Caroline
Vasconcelos Ribeiro. Durante este
período desenvolveu pesquisas dentro
da linha Filosofia da Psicanálise,
estudando principalmente os teóricos
Martin Heidegger e Freud. É integrante
do Grupo de Estudos em Filosofia e
Psicanálise (GEFIP), supervisionado
pela professora Caroline Vasconcelos.
Caroline Vasconcelos Ribeiro
46
telescópio e assumido como uma especulação sem base anatômica. Os questionamentos que almejamos levantar com essa comunicação são os seguintes: como
Freud seria afinado às Ciências da Natureza, se seus textos versam sobre conceitos
imprecisos e postulam abstrações para tornar inteligível o funcionamento psíquico?
Quais os fundamentos que sustentam a crítica de Heidegger à presença de uma
cientificidade natural na psicanálise de Freud? Em que medida é possível localizar
uma herança ontológica de matriz neokantiana nas formulações metapsicológicas
de Freud? Com tais questionamentos pretendemos refletir sobre a relação entre a
teoria metapsicológica e o horizonte ontológico que lhe subjaz, tal como apontado
por Heidegger na obra Seminários de Zollikon.
A Melancolia Como Um Sintoma Na Obra
Freudiana.
Parte-se da ideia da melancolia na obra
freudiana analisada como um sintoma
constituinte, originário, na própria estruturação do psiquismo do melancólico. Para
tanto, faz-se necessário estudar e ampliar o
conceito de sintoma no trabalho do psicanalista vienense. O objetivo é entender
em Freud um psiquismo estruturado como
um sintoma e, a partir disso, apresentar
um olhar sobre a melancolia que permita
enxergá-la como um sintoma na sua estruturação psíquica. Assim, através de uma
análise teórica foi observado que, segundo
o psicanalista austríaco, o sintoma é uma
formação de compromisso, resolução de
conflito entre os sistemas psíquicos e uma
forma substitutiva de satisfação. O que é
interessante notar em Freud é que esta
concepção de sintoma não muda ao longo
de toda sua obra, apesar de mudar sua
compreensão sobre o aparelho psíquico.
Este passa a ser entendido como dividido
– primeiramente em Consciente, Pré-Consciente e Inconsciente; e, posteriormente
em Eu, Isso e Super-Eu -, afastando a ideia
Julia Joergensen Schlemm
Doutoranda em Filosofia pela Pontifícia
Universidade Católica do Paraná (PUCPR) na linha de filosofia da psicanálise - bolsista CAPES -, início março de
2016. Mestre em psicologia na linha
de psicologia clínica na Universidade
Federal do Paraná (UFPR) - bolsista
CAPES -, conclusão em março de
2016. Formada em psicologia pela
UFPR, no ano de 2013. Atua na clínica
psicanalítica.
Eduardo Ribeiro da Fonseca
Professor de Filosofia, membro do
PPGF da PUCPR. Avaliador de livros
para a CAPES (2016-17). Psicólogo,
CRP 08/08064-2. Graduado em
Psicologia pela Universidade Tuiuti do
Paraná (1994), mestre em filosofia
moderna e contemporânea pela UFPR
(2003) e doutor em filosofia moderna
e contemporânea pela USP (2010).
47
de que esta divisão ocorreria apenas em patologias. O sintoma não é mais visto
apenas como um “problema”, mas é também, todavia, uma parte do psiquismo
que apresenta uma linguagem própria, a qual revela difusamente nossos desejos
mais íntimos. Surge na obra como fruto de uma ressignificação e fixação em um
trauma já recalcado, isto é, surge como o retorno do recalcado. Este trauma, como
o autor explica (1908), passa a ser entendido como uma fantasia sexual infantil
juntamente com a necessária – por exigências internas e externas - Versagung, o
“abrir mão”, do objeto de satisfação pulsional, ambos representando um excesso
libidinal que traumatiza o psiquismo. Por conta desta retirada de satisfação, regridese a satisfações, a traumas anteriormente fixados, precisando-se do sintoma como
apaziguador entre a pulsão e o mundo externo, representado pelo Eu. O sintoma é
entendido como solução de conflito e satisfação neurótica, mas, ao longo da obra
com a introdução da sua segunda estruturação psíquica, Freud (1923) passa a mostrar como o Eu de forma genérica, não somente na neurose, estrutura-se entre seus
“senhores” – Isso, Super-Eu e mundo externo -, tentando solucionar um conflito,
sendo um compromisso da mesma forma que um sintoma. Analisando a filogênese
em Freud, entende-se que o psiquismo humano surge através de um trauma: a
perda de objeto de satisfação (FREUD, 1915), a Versagung. Para o psicanalista, o ser
humano surge angustiado a partir de um desamparo traumático que precisou ser
recalcado, revivendo em sua ontogênese a filogênese, (FREUD, 1915). Pode-se dizer
assim que o sujeito é o que ele faz do retorno deste recalcado. O que se pretende
demonstrar neste trabalho é que o melancólico é aquele que se sente um nada, um
insignificante, sem valor, que sabe que perdeu algo (FREUD, 1917) e que constantemente revive esta perda por fixar-se na perda de objeto inicial racalcada à qual se
regride e é ressignificada diante de novas perdas.
48
Psicanálise e Psicanálise existencial: Freud,
Sartre e a Escolha Original
A filosofia da liberdade de Sartre é fenomenológica, tematiza o ‘homem-no-mundo’; o ser humano consciente de seu ser
(‘consciência intencional’, livre) é o princípio
fundante do existencialismo, ser-homem é
ser consciência de ponta a ponta (cogito reflexivo e pré-reflexivo). E, não é demasiado
dizer, é desse princípio que decorre todas
as peculiaridades do ‘existencialismo ateu’,
sobretudo a ‘liberdade humana absoluta’.
Ora, como afirmar a liberdade e desviar-se
do espinhoso assunto do inconsciente? A
filosofia de Sartre é levada imediatamente
a se haver com Freud, no intuito de mostrar as incongruências de ‘todo’ possível
humano inconsciente: a ontologia e os
textos menores que a antecedem cuidam
de mostrar que a consciência é translúcida,
é negaçãode ser e, assim, que ela é uma
unidade sintética (o homem é seu futuro,
ao modo de não o ser ainda, e seu passado,
ao modo de não mais sê-lo). Ser homem
é ser projeto, que ele mesmo elege e traz
ao mundo, e mesmo esse projeto de ser é
eleito livremente, ou seja, para a filosofia
da liberdade toda causa ou razão para
além da consciência torna-se indesejável,
e tudo o que tenda a limitar a liberdade
deverá ser combatido. É assim que se pode
entender sua crítica à religião, ao marxismo, ao estruturalismo, ao capitalismo, à
sociologia... e à psicanálise. Curiosamente,
as críticas de Sartre a Freud se limitam a
negar que possa haver qualquer instância
– sobretudo eletiva – para além da consciência; afora isso, Sartre dirige rasgados
Luciano Donizetti da Silva
Possui graduação em Filosofia pela
Universidade Federal do Paraná
(1999), mestrado em História da
Filosofia Moderna e Contemporânea
pela Universidade Federal do Paraná
(2002), doutorado em História da
Filosofia pela Universidade Federal
de São Carlos (2006), estágio pósdoutoral na Lyon 3 – Jean Moulin
(2016). É professor de Filosofia na
Universidade Federal de Juiz de Fora,
MG, no Instituto de Ciências Humanas,
Departamento de Filosofia, e professor
no Programa de Pós-Graduação em
Filosofia da UFJF. Tem experiência
na área de Filosofia, com ênfase em
Filosofia Contemporânea Francesa,
atuando principalmente nos seguintes temas: Fenomenologia (Husserl);
Fenomenologia e Ontologia (Husserl-Heidegger); Ontologia e Existência
(Husserl-Heidegger-Sartre-Merleau-Ponty); Herança ‘existencialista’
(autores franceses recentes).
49
elogios ao método psicanalítico e, por fim, propõe ele mesmo a criação de uma
‘Psicanálise existencial’ que em nada difere metodologicamente daquela freudiana;
mas mantém uma diferença irreconciliável: para Sartre não pode haver escolha
inconsciente, donde toda e qualquer eleição exija liberdade para vir ao mundo;
todos os casos em contrário serão considerados atos de ‘má-fé’, e não há nenhuma
exceção. A psicanálise existencial não visa uma determinação inconsciente que
será desvendada a partir de dicas apresentadas no discurso do paciente; ela parte
do presente, daquilo que cada analisado escolhe presentemente, ou seja, o que é
almejado é a escolha original que se realiza atual e conscientemente. Isso porque,
conforme revela a ontologia fenomenológica, apenas a liberdade poderá estar no
princípio do agir: não se trata de inconsciente como pensara Freud, mas de ‘Escolha
Original’. Com razão o psicanalista deverá exigir ‘provas’ de que é assim e não de
outro modo; mas como fazer ver que tudo aquilo que foi comumente considerado
como determinações inconscientes é resultado de livre escolha? A obra de Sartre
apresenta quatro casos: Mallarmé, Baudelaire, Genet e Flaubert, escritores que
foram submetidos à Psicanálise Existencial; e cada caso mostra que no princípio,
ainda na infância, cada um desses homens escolheu originariamente (ontologicamente) aquilo que seriam no mundo; e que é essa escolha original que matiza cada
uma de suas escolhas presentes; a escolha original como alternativa ao inconsciente é o tema dessa comunicação. A psicanálise existencial não visa uma condição
humana e recorremos à psicanálise de Winnicott (cujo modelo filosófico fundante é
o de Heidegger) e sua teoria do amadurecimento onde há a descrição da aquisição
da capacidade humana de se preocupar e se envolver com o outro, de desenvolver
o sentido de bom e mau, da aquisição da responsabilidade, cuja base é um sentido
de culpa: o estágio do concernimento. O que será apresentado nessa comunicação
é o exame preliminar do conceito de pensamento de Arendt, na correlação com os
conceitos de mal banal, discernimento, responsabilidade e culpa, e o denominado
estágio do concernimento de Winnicott.
50
A Perversão Na Reontologização Do Ser
Humano Na Contemporaneidade
A tecnologia, ou meio de satisfazer às
necessidades, têm conduzido o ser humano
pelo caminho de sua libertação do determinismo das leis da natureza, retirando-o da
condição de ser natural. Desde o domínio
do fogo, considerado como primeiro ato
histórico, o ser humano iniciou sua saída da condição de unilateralidade para a
de omnilateralidade, apropriando-se do
real como um ser universal. Freud (1913)
considera isso uma ruptura da animalidade
para a humanidade, a qual é marcada pela
interdição do incesto e a estruturação da
linguagem, lida pela antropologia evolutiva
e bioantropologia como a revolução criativa
humana. Esta universalidade com a qual o
ser humano interage com a Natureza, complexifica, ad infinitum, as relações nas quais
ele se implicou, face à contínua, crescente
e cada vez mais enriquecida produção de
tecnologias. Mas, as tecnologias, extensão
do criador, o ser humano, são demarcadas
por seus atributos e, também, são incorporadas pelo ser humano na aplicação destes.
Contudo, há um processo reverso pelo qual
o ser humano é condicionado pela lógica
de produção da vida material e imaterial,
a qual vem cada vez mais intensificando a
alienação, e assim, o seu estranhamento
com a própria espécie. Um dos problemas
mais sérios deste fenômeno é a auto-alienação realizada por alguns indivíduos, os
quais são impelidos, por diversas forças, a
mergulharem na perversão como estilo de
vida. Nessa perspectiva, a Inteligência Artificial, a Web Semântica e a Deep Web, apa-
Dinani Amorim
Graduação em Ciência da Computação pela Universidade Católica de Pernambuco (1988), Especialização
em Ciência da Computação pela Universidade Federal
de Pernambuco (1993) e doutorado em Electrónica
y Computación pela Universidad de Santiago de
Compostela (2007) - reconhecido como Ciências da
Computação e Matemática Computacional pela Universidade de São Paulo (USP) (registrado, processo nº
2009.1.19269.1.3). Atualmente é professora adjunto
da Universidade do Estado da Bahia e professora
titular da Faculdade de Ciências Aplicadas e Sociais
de Petrolina. Tem experiência na área de Inteligência
Artificial com ênfase em Redes Neurais Artificiais e
representação de conhecimento e web Semântica
na Educação, atuando principalmente nos seguintes
temas: Aprendizado de Máquina, Reconhecimento
de Padrões, Padrões de Metadados Educacionais,
Learning Objects, e nas relações sócio tecnológicas existentes entre seres humanos e máquinas,
estabelecidas em uma infoesfera na perspectiva de
uma ecologia digital. Participa de corpo editorial e
como revisora de periódico internacional/nacional e
conferências.
Juracy Marques dos Santos
Educador, Psicanalista e Escritor, com doutorado em
Cultura e Sociedade pela UFBA e pós-doutorado em
Ecologia Humana pela Universidade Nova de Lisboa
(UNL-Portugal) e em Antropologia pela UFBA. Atualmente é professor titular da Universidade do Estado
da Bahia (UNEB), onde integra o quadro permanente
dos docentes dos mestrados em Ecologia Humana
(PPGECOH) e em Educação, Cultura e Territórios
Semiáridos (PPGESA). É membro da Sociedade
Brasileira de Ecologia Humana (SABEH). Seu principal
interesse de pesquisa centra-se na dinâmica da espécie humana e suas relações com o mundo, daí seu
destacado interesse pela Ecologia Humana. Lecionou
em programas de pós-graduação em Portugal e
Espanha e já esteve participando de congressos em
diversos países como França, Itália, Grécia, Alemanha,
Estados Unidos, Cuba, Paraguai, entre outros.
51
recem assim como recursos tecnológicos que permitem àqueles indivíduos
mergulharem nas mais diversas formas
de perversão da condição humana.
Neste sentido, devemos nos perguntar:
Estaríamos ante uma experiência de
reontologização do ser humano, que
em certos indivíduos vem se dando
por meio de um processo de crescente
perversão do psiquismo? As máquinas
que são, ou o próprio corpo humano
ou uma extensão dele, servem aos
humanos como um meio de encontro
com o seu desejo? Particularmente as
redes sociais, sustentada em suportes
técnicos inteligentes (computadores,
Tablets, SmartPhones, etc), configuramse, também, como plataformas para
o exercício dos aspectos obscuros da
personalidade. A indissociabilidade entre as máquinas (mídias) e os humanos,
ao tempo em que marcaram a fisionomia das sociedades modernas, intensificou o abismo deste sobre sua própria
existência. A cibernética, a engenharia
genética e a Inteligência Artificial são os
novos oráculos da era contemporânea,
dando as cartas quando o assunto é
responder à pergunta: o que é o ser humano? Ciborgues, novos seres em uma
Ecologia de Máquinas? Em nenhum
momento da história, a questão do
desejo humano, o sentido para significar o real da própria existência, afetou
tanto as pessoas, vítimas de uma
demanda superegóica pelo gozo numa
perspectiva da impossível satisfação. A
métrica dessa regra tem sido intensos
Ricardo Amorim
Possui graduação em Ciência da Computação pela Universidade Católica
de Pernambuco (1989), mestrado em
Engenharia de Produção com ênfase
em Mídia e Conhecimento pela Universidade Federal de Santa Catarina
(2002) e doutorado em Electrónica
y Computación pela Universidad de
Santiago de Compostela (2007) reconvalidado como Ciência da Computação pela Universidade Federal
de Pernambuco (registrado, processo
nº 009949/2009-SRD). Atualmente
é professor adjunto da Universidade
do Estado da Bahia e professor titular
da Faculdade de Ciências Aplicadas e
Sociais de Petrolina. Seus principais
interesses de pesquisa estão centrados na área de Inteligência Artificial
com ênfase em representação de conhecimento, Engenharia de Software
e Web Semantica na Educação; e, nas
relações sócio tecnologicas existentes
seres humanos e máquinas, estabelecidas em uma infoesfera na perspectiva de uma Ecologia Digital.
Luciano Sérgio Ventin Bomfim
Graduações em Geografia UCSAL/1982), Pedagogia (Faculdade
de Educação da Bahia/1986) e
Direito UNEB/2010), especialização
em Metodologia do Ensino Superior (Faculdade de Educação da
Bahia/1987), Mestrado em Ciências da
Educação (UFSC/1997) e Doutorado
em Filosofia pela Gesamthochschule
Kassel/Alemanha/2001). Atualmente é
professor Adjunto B do Departamento
de Tecnologias e Ciências Sociais do
Campus III da UNEB. Tem como tema
52
estados de solidão e infelicidade num
mundo caracterizado pela interligação
das relações humanas por intermédio
de máquinas.
de pesquisa desde o Mestrado concluído em
1997 a Ontologia Humana sob a perspectiva
marxiana, bem como a temática da Cibernética
na contemporaneidade. É professor dos Cursos
de Engenharia de Bioprocesso e Biotecnologias
e Direito do DTCS, e do Mestrado em Ecologia
Humana e Gestão Sócio-ambiental deste Departamento, onde leciona a disciplina obrigatória
Gestão Sócio-Ambiental, bem como é professor
do Programa de Pós-graduação em Educação,
Territórios, Educação e Cultura do Semi-árido
do Departamento de Ciências Humanas deste
mesmo Campus.
A Psicanálise Como Abertura À Metafísica
Pós-Moderna
Observações preliminares em torno da
apropriação ontológico-relacional da psicanálise lacaniana pela metafísica pós-moderna de Christos Yannaras
Manuel Moreira da Silva
Trata-se de uma verificação preliminar da
tentativa de Christos Yannaras, antigo aluno
de Heidegger e eminente teólogo e filósofo
grego, em mostrar, conforme seus próprios
termos, “os horizontes abertos para questões ontológico-antropológicas pelas declarações (baseadas em observação clínica) de
Lacan”, nas lições II e XV de O Seminário
11. Os quatro conceitos fundamentais da
Psicanálise. Mais propriamente, busca-se
responder à provocação de Yannaras, quando, em Relational Ontology (Massachusetts:
Holy Cross Orthodox Press, 2011 [2004], p.
123), ao fim de uma nota à sua citação (à
p. 21) dos enunciados abaixo transcritos,
o filósofo afirma que suas discussões, a
partir dos mesmos, sobretudo em Postmodern Metaphysics (Massachusetts: Holy
Professor Adjunto da UNICENTRO/PR.
Doutor e Mestre em Filosofia, pela
UFMG e pela UNICAMP, com respectivas tese e dissertação sobre o Sistema e a Lógica de Hegel confrontados
com o pensamento contemporâneo.
Membro fundador do GT-HEGEL e da
Sociedade Hegel Brasileira, bem como
de suas coordenações e diretorias
entre 2002 e 2011; conferencista convidado na Universidade de Coimbra
(2011), UCA Buenos Aires (2014) e
Inca Garcilaso, Peru (2016). Publicou
Interpretações da Fenomenologia do
Espírito de Hegel (2014), com Leonardo Vieira, e Ser e pensar, inícios (2016)
[no prelo], além de artigos e capítulos
de livros. Investiga a emergência da
metafísica pós-moderna, com publicações na área desde 2014 e incursões
em Daseinsanalyse e Psicanálise.
Aluno da Formação em Psicanálise da
53
Sociedade Psicanalítica do Paraná, SPP, desde
2016.
Cross Orthodox Press, 2004 [1993]), “ainda aguardam confirmação ou refutação
crítica”. Em vista disso, o presente trabalho se concentrará em tematizar a seguinte
formulação: “O sujeito (racional) nasce no campo do Outro; quando o sujeito nasce
no campo do Outro, o significante se manifesta; o inconsciente é construído como
linguagem”. Isso, em primeiro lugar, na forma como cada enunciado é formulado
individualmente em Lacan, bem como apropriado em Postmodern Metaphysics; em
segundo lugar, de acordo com sua reconstrução na formulação acima, verificando-a
nos capítulos 3 e 4 de Relational Ontology. Feito isso, o trabalho se voltará para a
questão de fundo da problemática de Yannaras, posta imediatamente na sequência
da formulação indicada. Ei-la: A suposição e a recepção destas formulações de
Lacan pela antropologia filosófica nos obrigam a aceitar uma visão naturalística e
uma interpretação da racionalidade humana, da existência humana como pessoal?
No cerne dessa questão está o problema central da proposição de Christos Yannaras de uma metafísica pós-moderna e de sua determinação ontológico-relacional, a
tese ou, antes disso, a hipótese indicada em Relational Ontology (p. 20-21), de que
o caráter erótico (da relação universal, do intercurso) do desejo pela vida (desire for
life) define a alteridade do modo de existência humana. No caso, a referencialidade
relacional (relational referentiality) que distingue um ser humano de qualquer outra
coisa existente que tenha vida; quando, nas pegadas de Heidegger, mas também
dos neoplatônicos, Yannaras concebe a referencialidade relacional como o êxtase
(ecstasy, do grego ek-stasis, “standing out”) da existência, logo, como o movimento implicado pela transposição da necessidade instintiva da autopreservação
na demanda do desejo pela vida-como-relação (life-as-relation). Situação em que
tal movimento, para Yannaras, tem o sentido de uma resposta ao significante que
manifesta, ou se refere a, uma relação universal possível, um “ser-com” (syn-ousia).
Eis o que se impõe confirmar ou refutar; isso, no quadro teórico da questão assim
formulada: Pode a psicanálise constituir-se como abertura para as questões fundamentais (ontológico-antropológicas) de uma metafísica pós-moderna?
54
Analítica Existencial como fundamento às
ciências: Antropologia Filosófica e Psicanálise Winnicottiana
As diversas abordagens psicológicas e
psicanalíticas sempre foram uma questão àqueles que se perguntam por uma
compreensão mais unificada e estruturada
sobre o homem. Qual a ideia de homem que
as fundamentam? Tendo como horizonte,
especificamente, a psicanálise winnicottiana que parte de um paradigma não mais
objetificante pensamos ser relevante promover uma reflexão desta com a Ontologia
Fundamental de Heidegger. Haja visto ser, a
ontologia heideggeriana, uma fundamentação à todas as ciências, inclusive a Antropologia Filosófica. Neste sentido, de pensar
possíveis fundamentos antropológicos à
psicanalise winnicottiana, propomos um
primeiro passo nesta direção desenvolvendo a distinção entre Antropologia Filosófica
e Analítica Existencial. Por que a analítica
do Dasein não é uma antropologia filosófica? Problematizaremos à luz do autor o que
vem a ser uma antropologia mais adequada
ao homem pensado como Dasein. Esclarecimento este que nos possibilitará uma
tentativa de distinção entre antropologia
e analítica existencial. Mostrando também que a analítica é uma descrição das
estruturas ontológicas do existir humano
em sua cotidianidade. Intentamos investigar
este paralelo entre antropologia e ontologia
fundamental com vistas a uma reflexão
sobre os fundamentos à uma psicanálise
winnicottiana. Perceberemos que a ideia de
uma antropologia filosófica do Dasein irá
ao encontro da teoria do amadurecimento
Márcia Guimarães Rivas
Psicóloga Clínica, Mestranda do
departamento de Filosofia da Unicamp
e Mestre em Ciências da Religião
pela PUC-SP. Membro da Sociedade
Brasileira de Psicanálise Winnicottiana (SBPW). Atende em consultório
particular desde 2000.
55
de Winnicott, onde a teoria do amadurecimento protege o indivíduo de um olhar
fechado e determinado.
Uma ontologia da rejeição ao outro na
contemporaneidade: interlocuções entre
a Filosofia e a Psicanálise em torno do
holocausto
Adorno (1965/1995) defendia que Auschwitz, uma das maiores tragédias contemporâneas, não se restringia ao povo judeu
– antes constituía um sinal do retorno da
Humanidade à barbárie, dado que oferecia
um modelo de eliminação da diferença que
poderia ser aplicado a qualquer grupo conforme os interesses da classe dominante:
“Amanhã pode ser a vez de outro grupo que
não os judeus, por exemplo, os idosos, que
escaparam por pouco do Terceiro Reich,
ou os intelectuais, ou simplesmente alguns
grupos divergentes” (p.124). As configurações de laços sociais atuais, submetidas à
influência do discurso capitalista que segrega aqueles considerados como “impróprios”
sejam por sua religião, opção sexual, racionalidade, ou por de alguma maneira não
se adaptarem aos imperativos econômicos
vigentes, ratificam as palavras de Adorno.
Dado o que Agamben (2008) pondera sobre
a biopolítica moderna ter favorecido a
sistematização da segregação nos campos
de concentração, propomos uma breve
reflexão sobre o que o holocausto, tomado
como sintoma, nos revela do mal estar contemporâneo: a inabilidade de se lidar com
a diferença, pois entendemos que antes de
se pensar em uma educação possível que
previna novas tragédias, tal como Adorno
(1995/1965) propõe, é preciso compreender
Mariana Rodrigues Festucci
Ferreira
Psicanalista, Psicóloga. Doutoranda
em Psicologia Clínica pela Universidade de São Paulo (USP), onde é
pesquisadora membro do núcleo de
pesquisa “Psicanálise e sociedade”;
mestre em Psicologia Social pela
PUCSP; especialização em Psicanálise
e Linguagem pela PUCSP; título de
especialista em Psicologia clínica pelo
Conselho Federal de Psicologia; promove grupos de estudos na temática
de Psicanálise e supervisão clínica.
56
as questões subjetivas que alimentam a intolerância ao outro. Para tanto, propomos
uma interlocução entre uma linhagem de pensadores críticos que se debruçaram
sobre a questão do holocausto (Adorno em Educação após Auschwitz? e Giorgio
Agamben em O que resta de Auschwitz?) e a Psicanálise (a partir das considerações
de Freud em Psicologia das Massas e Análise do eu e O mal estar na civilização e
de Lacan no Seminário, livros VII, X, XI, e na Preposição de 9/10/67). Tal interlocução
aponta para um movimento de rechaço da fragilidade da unidade identitária (condição humana que gera angústia, estranhamento) que vê no outro uma ameaça de
desligitimação do próprio eu, tornando qualquer um que soe destoante suscetível de
eliminação. O retorno da humanidade à barbárie, como indica Adorno, se traduz na
tentativa de uniformização da diferença, que por sua vez, descaracteriza o humano.
Do útero ao mundo: diálogos entre Peter
Sloterdijk e Otto Rank
O filósofo Peter Sloterdijk, em sua obra O
Estranhamento do Mundo, descreve a vinda
ao mundo do humano dedicando-se à discussão da passagem do espaço fetal para
o ambiente mundano. A partir disso, o autor
discute a constituição do eu em diferentes
modos, ressaltando o caráter indeterminado de nossa espécie ao estar no mundo,
onde poucas certezas nos são oferecidas,
em oposição à experiência de proteção
oferecida pelo espaço uterino. O filósofo
estabelece diálogo com o psicanalista Otto
Rank, e sua obra O Trauma do Nascimento,
ao abordar a violência desta mudança do
conforto fetal para as incertezas do mundo.
Este trabalho pretende estabelecer o diálogo entre estes dois autores, indicando como
Sloterdijk proporciona uma nova leitura dos
escritos de Rank, avançando diante das
críticas apresentadas por Freud e Winnicott.
Para ambos, o bebê ainda é incapaz de
sentir o que se denomina “angústia”, portanto, não deveria se dizer em “trauma” do
nascimento. Para Sloterdijk, a preocupação
Renan S. Carletti
Psicólogo graduado pela Universidade
Federal de São Paulo (UNIFESP) e
mestre pela Pontíficia Universidade
Católica de São Paulo (PUC-SP) com
dissertação a respeito da obra de
Fiódor Dostoiévski e ceticismo grego.
Recentemente, tem-se dedicado as
interlocuções entre psicanálise e fenomenologia a partir do filósofo alemão
Peter Sloterdijk. Possui experiência
como docente em ensino superior.
Atua em consultório particular e é
membro do Instituto Dasein de São
Paulo.
57
não é afirmar o que bebê é ou não capaz de sentir. Mas sim, dentro de sua proposta
fenomenológica, estabelecer as diferenças nos sentidos encontrados ao habitar o
útero e, posteriormente, o mundo, enfatizando a brutalidade desta mudança como
traço fundamental na constituição da experiência humana.
Os diferentes sentidos para o termo objeto
e a aquisição do sentido de realidade na
Psicanálise Winnicottiana
O termo objeto faz parte do jargão psicanalítico desde Freud que atribuiu a ele
diversos sentidos, tais como objeto da pulsão, objeto de amor, entre outros. M. Klein,
teórica das relações objetais, trabalhou com
a noção de objeto interno, mas, com uma
significação desenvolvida por ela, baseada
na interação do mundo interno do indivíduo
com o mundo externo. Como não poderia
deixar de acontecer, em virtude do uso que
Winnicott fez do termo objeto, este acabou
por ganhar sentidos bastante específicos,
obviamente distintos daqueles que encontramos na obra de seus mestres e, mesmo,
de outros teóricos da psicanálise. O fato de
o psicanalista inglês conceber o contato
com a realidade como uma aquisição que
se dá paulatinamente, em um delicado processo que depende do ambiente, levou-o a
incluir significados ao conhecido conceito
de objeto que nunca haviam sido cogitados.
Assim, além de empregar o termo segundo
o jargão próprio da psicanálise, ao longo
de sua obra, vemos Winnicott usar essa
expressão, principalmente, com os sentidos específicos de objeto subjetivo, objeto
transicional, uso do objeto e objeto objetivamente percebido. Tais expressões foram
formuladas para nomear etapas, através
das quais se dá o início do contato com a
Ricardo Muratori
Psicólogo, psicoterapeuta, com
especializações em clínica da infância,
pelo Grupo de Estudos de Psiquiatria,
Psicologia e Psicoterapia da Infância – GEPPPI; em desenvolvimento
emocional infantil e na metodologia
da observação da relação mãe-bebê,
(modelo Esther Bick), pelo Centro de
Estudos da Relação Mãe-Bebê-Família; Membro Regular e orientador
de alunos do Centro Winnicott de
São Paulo; Mestre em Filosofia pela
Unicamp com o trabalho “A elaboração do conceito de objeto subjetivo
na obra de Donald W. Winnicott”, sob
orientação do Prof. Dr. Zeljko Loparic.
58
realidade e das relações objetais, segundo a teoria do amadurecimento. O objetivo
desta comunicação é o de apresentar e diferenciar esses sentidos para o termo
objeto utilizados por Winnicott para se referir a essas etapas.
A medicalização como uma das vozes do
Supereu
O presente trabalho é parte do processo
de construção de uma tese de doutorado
que trabalhará o tema da medicalização
de crianças em uma comunidade escolar
na cidade de Campinas, à luz da psicanálise. Neste resumo, trazemos uma questão
de cunho teórico no intuito de oxigenar a
unidade de teoria e prática em psicanálise.
O ponto de partida é demonstrar que a expressão medicalização não se reduz à administração de medicamentos (medicação)
e pode se configurar como uma das vozes
do Supereu. Foucault (1980/2015) lembra
que na gestão da existência humana, a
medicina se enrosca na cultura ocidental da
vida comum e assume uma postura normativa que não a autoriza apenas a distribuir
conselhos da vida equilibrada, mas a reger
as relações físicas e morais do indivíduo;
carrega consigo, não apenas um corpus de
técnicas da cura e do saber que elas requerem, envolve também um conhecimento do
homem saudável, isto é, ao mesmo tempo
uma experiência do homem não doente e
uma definição do homem modelo.
No horizonte da “postura normativa” e do
“homem modelo” enquanto ideal a ser
perseguido, o Supereu se apresenta como
construto teórico que não cabe em uma
definição conceitual, como dirá Lacan
(1953/1980), “O pensamento de Freud é
o mais perpetuamente a aberto à revisão.
Sérgio Sócrates Baçal de
Oliveira
Possui graduação em Psicologia
(2005) e Mestrado em Educação
pelo Programa de Pós Graduação em
Educação da Universidade Federal do
Amazonas (2008). É Professor Assistente II da Faculdade de Psicologia da
Universidade Federal do Amazonas.
Exerceu a função de Coordenador
Acadêmico (2012 - 2015). Desenvolve estudos e pesquisas na área da
Psicologia e Psicanálise abordando
os seguintes temas: sexualidade
na escola; violências em contextos
educativos; psicologia do desenvolvimento humano; psicologia da aprendizagem. Atualmente é doutorando em
Educação na UNICAMP.
Ana Archagelo
Possui graduação em Psicologia e
Formação de Psicólogo pela Pontifícia
Universidade Católica de São Paulo
(1988), Mestrado em Educação pela
Universidade Estadual de Campinas
(1995), Doutorado em Educação pela
Universidade Estadual de Campinas
(1999). Realizou estágios pós-doutorais nos Centre for Psycho-Social
Studies da University of the West of
England (2001 e 2009), Centre for
Psychoanalytic Studies da University
of Colchester (2003 e 2006) e na
Università degli Studi di Torino (2011).
Lecionou de 1992 a 2004 no Depar-
59
É um erro reduzi-lo a palavras gastas.
Nele, cada noção possui vida própria.”.
Nestes termos, Imbertín (2000) aponta
que a noção de Supereu não é individual, nem social; não é interior, nem
exterior; não é própria, nem alheia; não
é somente mera identificação ao pai,
nem uma simples herdeira do complexo
de Édipo; nem materno, nem paterno,
nem feminino, nem masculino, nem
precoce nem maduro, mas antes, uma
dimensão circular que participa da geografia do sujeito entre a cultura em que
está inserido e o campo de linguagem
que a compõe; assim, a medicalização
como uma das vozes do Supereu vai
se produzindo como um olhar-discurso
participante das formações subjetivas
de cada humano no intuito de alicerçar
um estado ideal de pessoa saudável,
uma espécie de imperativo massivo
incansavelmente difundido na mídia
especializada (área da saúde e grandes
laboratórios), nas relações do cotidiano (escolas, universidades, famílias,
grupo de amigos etc.) e na mídia de
um modo geral (televisão, rádio, jornais,
revistas, internet etc.). Com efeito, tudo
que excede ou que se encontra aquém
do modelo normativo estabelecido, ou
seja, aquilo que escapa aos ideais da
medicalização, traz notícias do sintoma
social como imperativo ao gozo (satisfação e engodo) operando como uma
das vozes do Supereu. Neste contexto,
a criança é mais susceptível para se
imprimir uma forma de gozar que,
aparentando ser o melhor caminho de
tamento de Educação da UNESP, campus de
Presidente Prudente. Desde então, é Professora
Doutora do Departamento de Psicologia Educacional da Faculdade de Educação da UNICAMP,
onde leciona na graduação e na pós-graduação,
e orienta pesquisas de IC, mestrado e doutorado.
60
conduta para sua vida, pode ampliar seu sofrimento.
Linguagem e verdade entre Édipo e a
Esfinge – a crítica de Agamben a Lacan a
respeito do simbólico
O objetivo deste trabalho é comparar a
análise da questão do símbolo no mito de
Édipo em Agamben com aquilo que Lacan
diz sobre o mesmo assunto em “A instância da letra no inconsciente ou a razão
desde Freud” e em “À memória de Ernest
Jones: sobre sua teoria do simbolismo”. Tal
recorte se justifica, pois, ao refletir sobre
as interpretações modernas do mito de
Édipo, Agamben tenciona a concepção de
Lacan do simbólico, num debate entorno da
ontologia heideggeriana. Agamben tentará
mostrar que, na psicanálise, a interpretação
do mito subentende um certo funcionamento da linguagem que se sustenta sobre
aquilo que Heidegger considerou a “metafísica ocidental”: o esquecimento de uma
experiência mais originária da “verdade”
entendida enquanto verdade. Propondo uma
oposição entre o discurso propriamente
“simbólico” ou “apotropaico” da Esfinge e o
discurso da “clareza” de Édipo, para quem
a verdade só poderia aparecer plenamente após um “deciframento” do “enigma”,
Agamben opõe Heidegger à psicanálise,
propondo uma concepção da verdade em
que o “simbólico” aparece como fundamento da significação. Nesse sentido, o que
Agamben tenta mostrar é que, enquanto
a Esfinge representa um entendimento da
linguagem mais próximo daquele que Saussure havia intuído ao falar paradoxalmente
Suzana Soares Lopes
Mestranda no Programa de Pósgraduação em Psicologia Clínica na
Universidade de São Paulo. Especialista em Filosofia Moderna e Contemporânea - aspectos Éticos e Políticos,
pela Universidade Estadual de
Londrina - graduação em Psicologia
pela mesma instituição. Atua como
psicóloga clínica.
Gabriel Pinezi
Doutor e mestre em Estudos Literários
pela Universidade Estadual de Londrina. Realizou estágio de pós-doutorado
no Programa de Pós-graduação em
Filosofia da mesma instituição, desenvolvendo pesquisa sobre pensamento
estético de Giorgio Agamben, com
ênfase na questão da originalidade da
obra de arte.
61
da “unidade dupla” do signo linguístico, estando assim alinhado àquilo que Heidegger considera uma experiência “mais originária” do significar, Édipo representaria
um herói do iluminismo e da metafísica moderna, por expressar uma concepção
da linguagem em que a verdade e o simbólico aparecem como cindidos. Para
Agamben, “a culpa de Édipo não é tanto o incesto, quanto uma verdade diante da
potência do simbólico em geral (a Esfinge é, assim, segundo a indicação de Hegel,
de fato ‘o símbolo do simbólico’), que ele menosprezou interpretando a sua intenção
apotropaica como relação entre um significante oblíquo e um significado escondido.
Com o seu gesto, ele abre uma fenda na linguagem, que terá vasta descendência
metafísica: por um lado, o discurso simbólico e por termos impróprios da Esfinge,
cuja essência é um cifrar e um esconder, e, por outro, aquele claro, e por termos
próprios de Édipo, que é um expressar ou um decifrar. Édipo aparece, portanto,
na nossa cultura como o ‘herói civilizador’ que, com sua resposta, proporciona o
modelo duradouro da interpretação do simbólico”. Assim, Agamben parece sugerir
que a contraposição entre Édipo e a Esfinge seria equivalente a um entendimento
metafísico do signo da psicanálise e um entendimento propriamente ontológico da
linguagem, tal como Heidegger a trata a partir de sua interpretação da verdade nos
gregos. A hipótese que guia nossa leitura é a de que, apesar de Lacan desconfiar
de certos pressupostos de Heidegger em sua defesa da hermenêutica psicanalítica, ele não necessariamente apresenta um entendimento do simbólico que seja
“metafísico”, no sentido que Agamben atribui ao termo, justamente por sua aguda
interpretação da linguística de Saussure. Visa-se, assim, comparar as interpretações
de Lacan e de Agamben sobre o estatuto dual do signo linguístico a partir de suas
leituras do mito de Édipo e da ontologia heideggeriana.
62
Sobre o estatuto ontológico do sujeito do
desejo inconsciente e suas consequências
para a investigação filosófica
A construção freudiana do conceito de
inconsciente possibilitou a posterior
instauração de uma nova concepção de
sujeito, a qual subverte o tradicional modelo
metafísico de subjetividade procedente da
filosofia cartesiana. Considerando como
ponto fundamental para a psicanálise a característica clivagem do psiquismo em dois
sistemas que se apresentam com modos
de funcionamento diferentes – consciente/
pré-consciente e inconsciente –, podemos
assinalar ainda uma distinção ontológica
entre os modelos de subjetividade freudiano
e cartesiano. Em Descartes, o penso, logo
sou aponta para uma identidade entre o
pensamento (consciência) e o ser (existir),
de modo a identificarmos de imediato uma
substancialização do pensamento: a res cogitan (ou coisa pensante). Temos, portanto,
uma subjetividade cartesiana que, além de
inteiramente identificada a um sujeito da
razão consciente, também se mostra como
um sujeito que é substancialmente pleno.
Por sua vez, em Freud a clivagem psíquica
operada pelo recalcamento nos conduz a
postular – para além da existência de um
sujeito da razão consciente – a validade
de um sujeito do inconsciente, o qual se
revela como um conceito heurístico capaz
de tornar inteligíveis fenômenos como
os sintomas neuróticos, os sonhos e os
atos falhos. Se para Descartes, contudo,
a subjetividade se apresenta como uma
consciência racional substancializada, para
a psicanálise o sujeito do inconsciente coin-
Yonetane de Freitas Tsukuda
Professor Auxiliar da Universidade Estadual de Feira de Santana.
Departamento de Ciências Humanas
e Filosofia. Especialista em Psicologia Clínica pelo Conselho Federal de
Psicologia. Especialista em Filosofia
Contemporânea pela Universidade
Estadual de Feira de Santana Graduado em Psicologia pela Universidade
Federal da Bahia.
63
cide com o sujeito do desejo, sendo, portanto, uma subjetividade demarcada pelo
desejo inconsciente. É neste ponto, então, que introduzimos o nosso questionamento principal: qual é o estatuto ontológico do sujeito do desejo inconsciente? Certamente, podemos afirmar, não é o mesmo do sujeito apoiado na substância pensante
de Descartes; pelo contrário, devemos assumir se tratar o desejo de um vazio de
substância – em oposição ao ‘cheio’ do ser metafísico – e, assim sendo, compreender a subjetividade freudiana como dessubstancializada. Esta dessubstancialização
da subjetividade operada por Freud se torna ainda mais evidente quando nos remetemos à teoria da representação forjada em Sobre a concepção das afasias (1891).
Nele, podemos constatar que os fios que tecem a tessitura do psiquismo são
compostos pela articulação das representações-palavra (Wortvorstellung) e representações-objeto (Objektvorstellung) em contraponto à noção de coisa (das Ding),
localizando, desde o princípio, a investigação psicanalítica na dimensão da linguagem – e, portanto, na dimensão do vazio de substância. Por conseguinte, o sujeito
da psicanálise (tornado possível somente como função da linguagem) e seu desejo
(as representações expulsas do consciente pela operação do recalque) exigem uma
aproximação ontológica que se coadune com a sua especificidade, evitando recair
numa simples investigação ôntica. Assim, seria o caso de nos indagarmos sobre
qual é o tipo possível de ontologia requisitado pelo campo psicanalítico, ou mesmo
se a psicanálise não lançaria questões cruciais para a pesquisa ontológica, de modo
a subverter alguns de seus conceitos fundamentais como ser e verdade, desembocando numa ruptura com a ontologia tradicional (metafísica).
64
Promoção
Centro de Lógica, Epistemologia e História da Ciência-UNICAMP
GrupoFPP (Grupo de Filosofia e Práticas Psicoterápicas)
Instituto de Filosofia e Ciências Humanas (IFCH)
Internation Research Group on Winnicott’s Paradigm (IRG-WP)
International Winnicott Association (IWA)
Apoio
Instituto Winnicott (IBPW)
Universidade Federal do ABC (UFABC)
Universidade Estadual de Feira de Santana (UEFS)
Fundação de Amparo à Pesquisa de São Paulo (FAPESP)
Coordenação
Zeljko Loparic (IBPW, IWA, UNICAMP)
Comissão Científica
Alice Busnardo (IBPW)
Carlota Ibertis (UFBA)
Carlos Barros (UEFS)
Danit Pondé (IBPW)
Eder Soares Santos (UEL/IBPW)
Léa Silveira (UFLA)
Malcom Guimarães (UEFS)
Sérgio Fernandes (UFRB)
Suely Aires (UFRB)
Comissão Organizadora
Caroline Vasconcelos Ribeiro (UEFS, pós-doutoranda na UNICAMP)
Conceição Aparecida Serralha (UFTM e pós-doutoranda na UNICAMP)
Suzi de Oliveira Piza (UFABC, pós-doutoranda na UNICAMP)
Comissão de Trabalho
Carolina Aparecida Cajaíba (UFABC)
Fernanda de Jesus Almeida (UEFS)
Jilvania de Jesus Barbosa (UEFS)
Laura Elza Mack Rates (IBPW, IWA, Doutoranda UNICAMP)
65
ibpw.org.br
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