DHUODA, UMA PROPOSTA EDUCACIONAL DO SÉCULO IX SALVADOR, Elaine Cristina Mello (UEM) OLIVEIRA, Terezinha (UEM/CNPq) INTRODUÇÃO O presente estudo oferece contribuições para a compreensão das reflexões acerca da crise Carolíngia do século IX e, por conseguinte, a decadência do apogeu dos francos, da máxima expansão territorial, e a tentativa de se fazer ressurgir a autoridade de um império universal. Assim como um primeiro enfoque nos relatos de Dhuoda em sua obra La educacion cristiana de mi hijo, em meados do século IX e que, de um modo geral, expressa alguns dos elementos da medievalidade feudal que permeava as relações entre os homens, em especial, a educação, a ética e a fidelidade, onde a autora dá especial destaque. Podemos observar que este escrito foi um marco importante para a educação daquela sociedade. Segundo Dib, (2005) “A obra de Dhuoda tem as características pedagógicas de um Espelho de Príncipe Medieval, ou seja, é um Manual de conduta ética e social. Por ser de autoria feminina, nobre, e ter como destinatário o próprio filho da autora, Manual de Dhuoda é singular”. Enfatizando a educação a partir da formação moral, dando especial atenção à ética, caridade e fidelidade como aspecto preponderante a formação do indivíduo. No sentido da existência, meio, finalidade, processo e meta. Tendo como objetivos e métodos suas concepções e suas propostas. 1 E ainda, entregar ao ser-educando a responsabilidade de auto-educar-se, despertando-lhe o ímpeto para isso. Assim, educar é antes de tudo, conquistar a adesão do educando para sua própria educação. Para Dhuoda único bem necessário e possível ao ser humano é estar em sintonia com a lei da evolução moral, estar impulsionado para seguir adiante, rumo à conquista de si na eternidade e no infinito. O maior mal a evitar é a estagnação, a apatia, o adormecimento da vontade. Sendo necessário um enfoque abrangente, com relação à educação, partido dos pressupostos teóricos da legislação, a Lei de Diretrizes e Bases da educação Nacional (1996), onde ratifica como legislação complementar, em seu art. 1º, o qual se refere à educação como uma prática. Considerando que a educação existe como suporte das relações afetivas que preparam o ser humano para a convivência social, este estudo pretende demonstrar o quanto à educação é importante para o processo de formação moral. A educação familiar fornece o “solo” a partir do qual toda a criança ou o adolescente necessita para o processo de formação. O conceito adotado de educação é amplo e suas ações envolvem desde a educação escolar, como a educação moral. O estudo nos permite entender que Dhuoda apesar de viver no século IX, sendo uma jovem de saúde frágil e delicada, mas nada a impediu de receber e repassar suas instruções. Para seu marido Bernardo, ela foi uma verdadeira jóia. Ambos viveram envoltos em turbulentos conflitos políticos no período de Carlos Magno. Tiveram dois filhos Bernanrdo e Guilhermo. Dhuoda procurava ensinar a seus filhos, os valores morais e os comportamentos que, a seu ver, poderiam livrar aquela sociedade da ruína que se tornava evidente. Toda a base dos ensinamentos de Dhuoda está pautada nas Escrituras Sagradas e na leitura. Dos estudos realizados percebe-se a evidência da crise do século VIII e XV do feudalismo na Europa ocidental. Apesar destas turbulências Dhuoda desenvolveu um importante papel, como mãe, mulher educadora, divulgadora de normas, crenças, costumes e valores morais. 2 Durante toda a Idade Média, houve tendências de interpretações nesse sentido e, mais ainda, a partir da Reforma aparecia tal idéia conectada ao chamado “milenarismo” ou ao “tempo messiânico” — a esperança do advento de novos tempos, na qual a verdade cristã seria restabelecida. Segundo Dib (2005), o modelo de sociedade descrita refere-se ao feudalismo, “bem como ao processo ocorrido para a formação deste sistema, nos fundamentamos, principalmente, no pensamento de Ganshof e guizot”. Ganshof (1968), propõe duas concepções fundamentais sobre o feudalismo, as quais são aceitas atualmente pelos historiadores. Para este autor, com relação à estrutura da sociedade ou do estado, o feudalismo pode ser definido como [...] um tipo de sociedade cujos caracteres determinantes são: um desenvolvimento, levado até muito longe, dos laços de dependência de homem para homem, com uma classe de guerreiros especializados a ocuparem os escalões superiores dessa hierarquia (GANSHOF, 1968, p. 9). Considerando este contexto social, pode-se afirmar que a obra de Dhuoda apresenta elementos importantes acerca da educação dos homens naquele período. Sem pretensão e contrariando o conceito de temporalidade do medievo Dhuoda dividem seus relatos em 7 capítulos onde trata acerca do conceito de Deus e dos demais termos que se liga a este: como o amor, grandeza, sublimidade. Diz que por causa de Deus que o homem existe, vive, se move e é. Para Dhuoda Deus concede a faculdade de compreensão ao homem, para que ele possa entender (ainda que não em profundidade) sobre as coisas divinas. Sendo necessário Conduzir a educação de modo a torná-la um padrão de conduta do indivíduo a sociedade medieval. Com intencionalidade da relação educador/educando se fundir no ser mãe/filho. Esse ser humano tem uma essência divina que a ligava aos que amava, tornando a educação uma proposta universal e fundada em princípios gerais, revelando uma singularidade, que só pode ser tocada pelo sentimento. 3 Buscando um equilíbrio entre amor e caridade, exaltando o amor como fator de progresso moral do homem, a ponto de notar que a própria consciência (a luz interior, que ela toma por guia de conduta) se manifeste em forma de sentimento. Neste sentido, Ruy Nunes faz uma análise sobre a influencia da religião na vida dos homens dando ênfase para a compreensão de sua ação educadora. [...] A religião era, com efeito, a mola propulsora de toda atividade pedagógica; o estudo e a investigação não tinham finalidade em si mesmos, mas endereçavam à busca da perfeição cristã, enfim, o elemento religioso ocupava a posição central na vida interior da idade média (NUNES, 1979, p. 169). A importância do elemento religioso constituía-se como base para o desenvolvimento moral e intelectual do homem no medievo. Para Dhuoda o amor a Deus e a Educação de forma direta ou indireta eram modelos de educação. Mas ninguém como Pestalozzi enfatizou tanto o amor como fundamento, meio e finalidade da educação. Não o faz em detrimento de uma racionalidade, que também adota, buscando a prática de um amor “vidente” ou “esclarecido”, que não se perca nos impulsos de uma sentimentalidade desgovernada. (Que nada se faça, “mediante os frios cálculos da razão, nem tampouco levado apenas pelos impulsos do coração: procura ao invés que todas essas forças se conjuguem…” (PESTALOZZI, 1945, p. 57). A educação, neste contexto, é vista como instrumento de opressão do ser natural do homem, criando-lhe conflito e infelicidade, com o que ele irá procurar ilusões de poder, luxo, dinheiro e posição, para preencher a insatisfação íntima de que se vê possuído. A educação, dessa forma, só deseja enquadrá-lo socialmente, oferecendo-lhe migalhas de ilusão em troca. No entanto o amor é justamente o que não apenas enxerga, mas sente o ser humano como detentor de potencialidades, como herdeiro da divindade e como dono de si mesmo, no processo de auto-educação, que o Cristianismo veio deflagrar na humanidade e que o educador deve deflagrar no educando. 4 Acreditava Dhuoda que ao escrever o “Manual para meu filho” em que envolve tudo o que, ao seu entender, há de conhecer um nobre jovem, os valores morais e comportamentos. A seu ver, poderia além de educá-los, propagar este manual de conduta ética para toda uma sociedade que já estava em ruína evidente. Sua obra considerada por muitos autores uma espécie de Espelho de Príncipe, onde oferece contribuições sobre conselhos, regras e exortações que valem para toda a sociedade daquela época. Para Dib, 2005 “Ao redigir o Manual, Dhuoda pretende que Guilhermo o entenda como um espelho, por meio do qual deve contemplar sem hesitação a saúde de sua alma. Para ela, seu filho deve agradar não só as pessoas do mundo, mas também aquele que o criou. Para tanto, recomenda a Guilhermo que consulte freqüentemente o Manual, pois nele, [...] encontrarás em el todo lo que deseas aprender; tambien hallaras un espejo en el que podras contemplar sin duda la salud de tu alma, de forma que puedas agradar em todo, no solo al mundo, sino tambien al que te há formado del polvo de la tierra (DHUODA, 1995, p. 55). Para Incontri (1996), “O homem é a mais alta, a mais absoluta e a mais excelente das criaturas. É evidente que todo o homem nasce apto para adquirir conhecimento das coisas: primeiro porque é imagem de Deus. Com efeito, a imagem, se é perfeita, apresenta necessariamente os traços do seu arquétipo, ou então não será uma imagem”. No entanto, Dhuoda compreende o homem como ser em evolução permanente, como manifestação dessa lei do progresso, adotando-se o princípio da liberdade e as metas da maturação moral e intelectual da criança e da humanidade como conceitos centrais de uma nova ideologia, poderia orientá-lo com a segurança desejável, sem o dogmatismo inoportuno. Segundo Nunes (1995), Dhuoda reivindicou o desejo de educar seus filhos, usando o seguinte argumento: “quem melhor que uma mãe, que tem levado o seu 5 filho nove meses em seu ventre, parido com dor e amamentado, pode compreender e encaminhar um filho”. O único bem necessário e possível ao ser humano é estar em sintonia com a lei da caridade, é estar impulsionado para seguir adiante, rumo à eternidade e infinito. Se o homem mobilizou a vontade e sente em si mesmo o elã de progredir, tudo o mais está feito. O maior mal a evitar é a estagnação, a apatia, o adormecimento da vontade. Como mãe pensava em ser justamente a agente de mobilização da educação pautada no amor e na caridade do desenvolvimento de seu filho. Era o que observava atentamente, amando com intensidade, o ser-filho, e descobre como atingir o seu âmago, para tocar sua essência divina e deflagrar um processo de auto-educação. Todo verdadeiro ato de amor é um gesto que abre os caminhos do ser humano para conhecer-se e transformar-se, para participar da evolução do universo. Tinha alegria de sentir-se mãe: mãe por haveres dado a vida do corpo e mãe por haveres envolvido na maravilhosa tarefa de abrir suas mentes e seu coração. A base de seus ensinamentos estão pautados nas escrituras sagradas. No entanto percebe-se que Dhuoda assim mesmo quer mostrar que além da fidelidade, o amor e a caridade, os valores são mais fortes para a efetiva transformação social. Neste sentido, Dhuoda demonstra tentar passar um pensamento que difere do período no qual se encontra mesmo depois de ocorrido às transformações entende-se que não trespassa as mudanças necessárias para tal. O caráter laico da sociedade nos referindo ao feudalismo, bem como ao processo ocorrido para a formação deste sistema nos fundamenta. Principalmente no pensamento de Pirenne (1937), propõe concepções fundamentais sobre o feudalismo, as quais são aceitas atualmente pelos historiadores. Para este autor, com relação ao caráter laico da sociedade medieval pode ser definido como um modelo de sociedade nesse período Há que insistir ainda sobre um facto último que não chamou a atenção até hoje e que completa, todavia, a demonstração de que a 6 sociedade, após as invasões, continua exactamente como antes: é o seus carácter laico. Por grande que seja o respeito que se professa pela Igreja, e por enorme que seja a sua influência, ela não se integra no Estado. O poder político dos reis, como dos imperadores, é puramente secular (PIRENNE, 1937, p. 102). Desta forma, a desordem em meados do século IX, foi marcada pelo princípio da, “Desintegração do Império Carolíngio, causado pela interrupção de dois acontecimentos estreitamente ligados, de um lado, crises internas e a decadência da monarquia carolíngia, chave mestra da estrutura ocidental; e de outro, o ataque simultâneo de novos invasores provenientes do sul, do norte e do oriente” (Perroy, 1974, p. 145). Encontramos afirmações de que obras voltadas a regras de comportamento já existiam desde o início da Idade Média. De acordo com Hadot, Santo Agostinho, escreve por meio de estilos dos Espelhos, objetivando o comportamento de leigos, príncipes e cristãos. Para Hadot, [...] Santo Agostinho no século IV, ao escrever um de seus escritos bíblicos, destinados tanto a clérigos como para laicos, e outro escrito aos príncipes cristão, deu o nome à sua obra de speculum, ou seja, espelho, pois sua intenção era formar uma cultura religiosa entre os homens fornecendo aos mesmos algumas normas a serem seguidas (HADOT, 1972, p. 618). Neste contexto histórico, pode-se afirmar que a obra de Dhuoda apresenta elementos importantes acerca da educação dos homens naquele período. Por intermédio dela, pode-se compreender quais eram as grandes motivações ou acontecimentos que levavam os homens daquela sociedade a se educarem uns aos outros de uma maneira grotesca e determinada. É o século IX marcado pelos conflitos religiosos de um período essencialmente hierárquico, mas também pelo florescimento das discussões, das visões extremamente impregnadas pela magia do autoritarismo e do poder. É todo este universo que marca a trajetória de Dhuoda, que vai ser exposto em quase toda uma vida em que relembra todas as transformações que passou, em uma narrativa que nos lega um panorama da época, mas, muito mais do que isso, nos possibilita 7 o acesso às discussões sobre o processo de construção de um sujeito feminino, marcado pela ambigüidade e pela luta por expandir seus horizontes, longe das amarras dos papéis de gênero. Entende-se que o surgimento do feudalismo está ligado ao fim do Império Romano do Ocidente, passando por crise e ruralização nos séculos IV e V, pela organização do Império Carolíngio nos séculos VIII e IX, para enfim se afirmar em fins do século IX e princípios do século X. Nesta passagem, ocorreu o aproveitamento dos homens “pobres” que migraram para o campo em busca de subsistência, com processo de ruralização. Segundo Dias (2001). Para Dhuoda, por exemplo, a verdadeira pobreza era a pobreza de espírito. Mas, qual o conceito de pobreza de espírito em seu entendimento? O homem pobre de espírito, agradável a Deus, seria aquele que mesmo sendo possuidor de muita riqueza, fosse capaz de reconhecer-se pequeno e despojado diante de Deus. Assim, esse homem seria aquele capaz de dizer, seguidamente, em seu íntimo: “je suis un ver, et nom un homme (...) ‘LeSeigneur est mon appui, mon aide, mon protecteur”. Para Dhuoda, o homem que confiasse no Senhor, como Abraão, não seria jamais confundido e humilhado. Ao contrário, Deus o cumularia de muitos bens. Contudo, era preciso que, possuindo muito ou pouco, esse homem fosse capaz de ajudar aqueles que precisassem. A propósito, diz a Guillaume: “... quant à toutes les richesses mises à ta disposition par Dieu, aie la main large pour lês distribuer. Que l’avarice, ‘qui rend esclave des idoles’, ne soit même pás nommée chez toi. Et si Dieu te donne beaucoup ou même peu, distribue suivant tes ressources à qui demande. Donne afin de recevoir” (Dhuoda apud Dias, 2001, p. 35-6). A sensação que Dhuoda nos passa, não nos deixa esquecer semelhanças com o processo de entrada das mulheres no mercado de trabalho, no século XX, quando se vêem compelidas a adotar um código estranho ao mundo doméstico e a valores ensinados por tanto tempo pela sociedade patriarcal. No entanto, o que a história confirma é que estes passos no universo externo, até então marcadamente masculino, significaram para muitas mulheres a mutilação de uma experiência e de um saber/sentir feminino: “As mulheres não 8 tinham parâmetros femininos de vida autônoma e sem coerções, o que lhes deixava como opção de liberdade a imitação de um estilo masculino de vida” (OLIVEIRA, 1991, p. 117). O seu trabalho será o de mediar com seu filho Guilhermo, através do florescer do amor, da caridade, da sabedoria, e da sua busca na elevação moral. Fundamentados na historiografia, podemos apontar a crise no período do século V ao século IX caracterizado pela formação do Sistema Feudal. Neste período observam-se vários processos históricos e descritos como um dificílimo momento, vivenciados por Dhuoda. O caráter laico da sociedade após as invasões, permaneciam ainda sobre um facto último sem demonstração de mudanças, “...exatamente como antes: é o seu carácter laico.” (PIRENNE, p. 116) Uma característica de Dhuoda é a preocupação com a organização de seus pensamentos em seu Manual. A autora dedica um capítulo inteiro para falar sobre as virtudes e os vícios, relacionando seus ensinamentos sobre a moral cristã com a formação aristocrática do seu filho. Dhuoda inicia o Manual tratando acerca do conceito de Deus e dos demais termos que se liga a este, recorre a passagens bíblicas, como procura de Deus por Moisés e as palavras de Paulo, para ilustrar o mistério de Deus. Sugere o amor, grandeza e a sublimidade ao ser. Diz que por causa de Deus que o homem existe, vive, se move e é. Deus concede a faculdade de compreensão ao homem, para que ele possa entender (ainda que não em profundidade) sobre as coisas divinas. Deus é superior, inferior, interior e exterior ao homem. O homem deve ser consciente de sua pequenez perante Deus. Dhuoda analisa o termo Deus e os símbolos que seu signo pode representar. Afirmando que Deus é o rei absoluto de tudo o que existe no mundo. O homem apenas o é, por um lapso de tempo. Deus é superior (guarda e governa os homens), inferior (sustenta o homem), interior (sacia-o com seus bens) e exterior (rodeia o homem com seu muro inabalável; protege, resguarda e defende o homem). 9 O homem deve buscar a Deus por meio da Igreja, na figura dos sacerdotes e de pessoas preparadas para ensiná-lo na vida cristã. O homem deve buscar iniciar os menores que si nas coisas do alto, mostrando o compromisso social educativo que Dhuoda enfoca em todos os seus ensinamentos. No Livro II inicia a discussão afirmando que a Trindade é Unidade, assim como a Unidade é Trindade. Exorta seu filho as diferentes orações que deve fazer ao longo do dia ou quando se deita. A oração deve ser curta e feita com o coração disposto – Sinceridade. O homem que busca a Deus tem suas vontades saciadas por Ele. Dentre as virtudes o amor é a principal. Dhuoda refere-se ao termo ágape para se referir ao amor em grego e dilectio em latim. O verbo aparece no Novo Testamento que descreve, entre outras coisas, o relacionamento entre Jesus e os seus discípulos. Na literatura Bíblica, seus significados são ilustrados como auto-sacrifício, dando o amor a todos - amigo e inimigo. No Livro III, ela trata acerca da reverência ao pai e ao seu senhor. Onde é preciso educar o homem a respeitar, obedecer e temer seu pai, para que não passe por seu pensamento nenhum mal contra seu pai, “Seja maldito quem não honrar a seu pai” (Dt 27:16) Dando importância do modelo educativo como referência: Deus é a primeira delas; os grandes pais, descritos na Bíblia são os segundos; os homens que ao longo de sua vida serviram a Deus, os terceiros. Dhuoda mostra algumas características que o homem deve ter com relação ao seu senhor: lealdade; vigilância; cuidado; dignidade; prudência; fidelidade. E afirmava que o homem deve respeitar amar, venerar e estimar o seu senhor, bem como sua família e descendência. Deus não faz acepção de pessoas, e o homem não deve fazê-lo. O homem deve ser doce com os velhos e os jovens, já que o amor deve permanecer sempre. O homem deve honrar também os sacerdotes, já que são os 10 anjos de Deus. Todo homem é pecador e precisa voltar-se para Deus, que grande em piedade, pode salvá-lo. E no Livro IV Dhuoda exorta sobre a importância de cultivo, na memória, dos bons exemplos. São estas lembranças que devem ser resgatadas quando algum pensamento mal sobrevier ao homem. O homem deve fugir da soberba e cultivar a humildade. A vigília é o modo de combater o mal e fazer cumprir a boa obra. O homem chega a sua perfeição pelo esforço e exercício constantes. O espírito é contrário à carne. Dhuoda refere-se à prática dos dons do Espírito Santo: Espírito de sabedoria; Espírito de inteligência; Espírito de conselho; Espírito de fortaleza; Espírito de ciência; Espírito de piedade e Espírito de temor a Deus. As oito bem-aventuranças são resgatadas por Dhuoda para que o homem lembre-se sempre delas e assim, vencer facilmente os vícios: 1ª) Bem-aventurados os pobres de espírito, porque deles é o reino dos céus. 2ª) Bem-aventurados os que choram, porque serão consolados. 3ª) Bem-aventurados aqueles que são brandos e pacíficos, porque herdarão a Terra. 4ª) Bem-aventurados os que têm fome e sede de justiça, porque serão saciados. 5ª)Bem-aventurados aqueles que são misericordiosos, porque alcançarão misericórdia. 6ª) Bem-aventurados aqueles que têm puro o coração, porque verão a Deus. 7ª) Bem-aventurados os que sofrem perseguição pela justiça, porque o reino dos céus é para eles. 8ª) Bem-aventurados sois quando, por minha causa, vos injuriarem e vos perseguirem e, mentindo, disser todo mal contra vós. Regozijai-vos e exultai, porque é grande o vosso galardão nos céus; pois assim perseguiram aos profetas que viveram antes de vós. 11 No geral a nosso ver, estes escritos foram fundamentais para construção da sociedade nascente, uma vez que neste novo espaço, observamos uma profunda mudança, ocorrendo no conceito de temporalidade. O mundo medievo, herdados do apogeu dos Francos, ficou marcado por Dhuoda, estabelecendo uma nova medida do tempo, definida agora pela ética, caridade e fidelidade. A educação passada por Dhuoda não é mais um processo simples de acúmulo de conhecimentos, mas de transformações graduais. A mudança creditada por Dhuoda, trás referência ao tempo, onde há duas espécies de mudanças que se prestam mútuo apoio, todavia, não marcham lado a lado, o progresso intelectual e destoa do progresso moral. Para Dhuoda a educação é, portanto, o desenvolvimento progressivo e harmonioso de todos os poderes e faculdades do ser, inerente a mudanças. Neste sentido, sobre o tempo Oliveira relata; A análise de Le Goff (1979), sobre esta mudança, no artigo intitulado Tempo da Igreja, tempo do mercador, é muito rica porque demonstra como a vida das pessoas passa a ser gerida pelo relógio e não mais pela natureza. É o borbulhar de homens, de mercadorias, que passa a definir o tempo da vida, ou seja, a vida passa, no seio do medievo, a ser coordenada pelo trabalho e não mais somente pela idéia da salvação eterna. O mundo do trabalho, que principia a nascer, define também as atividades intelectuais. O profissional do saber não considera mais o seu conhecimento como uma graça divina, mas como uma atividade humana. Finalmente, Dhuoda solicita ao filho que recorra sempre ao Manual, que seja sempre um jovem nobre, forte e valente em Cristo. Ela termina seus escritos dando graças a Deus usando as palavras do evangelho. É possível estudar o Manual de Dhuoda do ponto de vista do amor de uma mãe por um filho no século IX , no entanto o amor é justamente o que não apenas enxerga, mas sente o ser humano como detentor de potencialidades, como herdeiro da divindade e como dono de si mesmo, no processo de auto-educação, que o Cristianismo veio deflagrar na humanidade. 12 CONSIDERAÇÕES FINAIS Nosso objetivo neste estudo foi analisar algumas reflexões em torno do modelo de educação proposto no século IX, tendo como base uma mãe, cujo empenho era educar seu filho de acordo com as normas aristocráticas e cristãs. Os relatos aqui apresentados mostram a distância entre os séculos, mas ao mesmo tempo atualíssimos. A convicção dos ensinamentos de outrora, são tão firmes em seus propósitos que diríamos ser próprios para o saber pedagógico e maternal da contemporaneidade. Exemplos de educação, fidelidade, ética e amor, foram transmitidos e vivificados, que se perderam com o passar do tempo. Dhuoda propôs um modelo de educação calcado principalmente no conceito de fidelidade para aquele período. Enfim, após muitas reflexões, entende-se, que a passagem do tempo deixa guardada no medievo exemplos de conduta ética e moral, próprios para a transformação social envolvendo assim todos os sujeitos sobre a perspectiva global da formação humana. REFERÊNCIAS DIAS, Ivone Aparecida. A educação feminina na Idade Média: damas e religiosas. Dissertação de Mestrado – Universidade Estadual de Maringá. Maringá 2001. DIB, Marlene Aparecida Barchi. A Educação Cristã de Meu Filho: Uma Reflexão sobre a crise Carolíngia do século IX, Dissertação de Mestrado – Universidade Estadual de Maringá. Maringá 2005. DHUODA, La Educación Cristiana de mi Hijo. Pamplona: Ediciones Eunate, 1995. FAVIER, Jean. Carlos Magno. Trad. Luciano Vieira Machado. São Paulo: Estação Liberdade, 2004. 13 INCONTRI, Dora. Pestalozzi, Educação e ética. . Dissertação de Mestrado. São Paulo, USP, 1991. NUNES, Ruy. O dever da fidelidade no Manual de Dhuoda. In: SOUZA, José A. (org). O Reino e o Sacerdócio: O pensamento político na alta idade média. Porto Alegre: EDIPUCRS, 1995. OLIVEIRA, Terezinha. Intelectuais e Educação no Século XIII:Tomás de Aquino e Boaventura. Universidade Estadual de Maringá. Maringá 2005. PESTALOZZI, Johann Heinrich. Sämtliche Werke und Briefe. Kritische Ausgabe. Ed. cit., vol. 26. Letters on early Education adressed to J. P. Greaves, p. 57. PIRENNE, Henri Maomé. Carlos Magno. Dom Quixote, v. 7. VITORETTI, Regiani. Considerações Acerca de Boécio e a Educação Medieval. Dissertação de Mestrado – Universidade Estadual de Maringá. Maringá 2004. 14