O céu de Junho (Expresso: 30-05-1998) Veja as horas pela Ursa Maior e descubra o Boieiro e Hércules. Observe Júpiter à luz do dia. E, logo à noite, ao pôr-do-sol, confirme que a Ursa Maior e a Cassiopeia estão alinhadas na vertical com a Estrela Polar. A PRENDEMO-LO na escola: prolongando cinco vezes a distância entre as guardas da Ursa Maior encontramos a Estrela Polar, que é a ponta da cauda da Ursa Menor. No entanto, se a noite de Verão for avançada e a maior das ursas estiver já perto do horizonte, talvez seja mais fácil localizar a Cassiopeia, que também aponta para a Polar. Estas duas constelações são óptimos instrumentos de orientação. Mas são também um bom relógio. É preciso é saber-se a data, pois as constelações adiantam-se quase meia hora por semana. Esta noite, logo ao pôr-do-sol, a Ursa Maior e a Cassiopeia estarão alinhadas verticalmente com a Polar. À medida que a noite avança, esse eixo roda no sentido contrário ao dos ponteiros do relógio, perfazendo uma rotação completa em cerca de 24 horas. Pela meia-noite (hora legal), já as constelações rodaram cerca de 45 graus. Pelas três da manhã, o eixo atinge a horizontal. Mas o movimento das constelações, seguindo o movimento aparente da esfera celeste, não completa 360 graus em 24 horas. Se o fizesse, as constelações não ocupariam diferentes posições em diferentes meses, nem muitas delas apareceriam e desapareceriam conforme as estações do ano. Tal como o herói de Jules Verne na Volta ao Mundo em 80 Dias recupera um dia ao circular o Globo, assim a esfera celeste demora menos de 24 horas a operar uma rotação de 360 graus. O tempo que uma estrela demora a perfazer uma volta completa é o chamado dia sideral, que dura 23h56. Os quatro minutos que sobram perfazem um dia completo ao longo do ano; de forma que, para o ano que vem, as mesmas estrelas estarão no mesmo local no mesmo dia e na mesma hora. A tudo isto é preciso acrescentar uns segundos e retirar outros, pois o movimento da Terra não é uniforme, há anos que são bissextos, e surgem outros problemas complexos. Por isso a Humanidade demorou tanto tempo a fixar o calendário moderno. Quatro minutos por dia, que é a diferença entre o dia sideral e o dia das 24 horas, não parece muito. Mas, ao fim de uma semana, esses minutos, somados, perfazem quase meia hora, e ao fim de um mês totalizam duas horas. É a esse ritmo que, fixando uma hora e observando nessa hora o céu, noite após noite, se vê as constelações mudar de posição relativa, rodando lentamente em torno da Polar. Para finais do mês de Junho, o eixo da Cassiopeia à Ursa Maior aparece noutra posição ao princípio da noite. Medir as horas pelas estrelas obriga a ajustar os ponteiros do relógio. É preciso saber onde se encontra o eixo das duas constelações a determinada hora. A partir daí, basta contar uma hora por cada 15 graus de rotação desse eixo. Com um pouco de prática consegue-se uma precisão superior a 15 minutos. Melhor que alguns relógios de edifícios públicos… A Ursa Maior é um bom ponto de partida para a identificação de outras constelações. Prolongando em arco a cauda da ursa encontra-se uma estrela difícil de passar despercebida. É a Arcturo, a alfa da constelação Boieiro. Pela meia-noite, no princípio do mês, esta constelação está mesmo por cima das nossas cabeças, no zénite. A Arcturo é a quarta estrela mais brilhante do céu e é tão luminosa que é fácil reparar na sua coloração alaranjada. Diz uma lenda grega que a constelação representa o filho da deusa Deméter, versão helénica da Ísis egípcia, a que os romanos haveriam de chamar Ceres. Ceres era a divindade dos produtos da terra, essencialmente do trigo. O nome é aparentado com «cereal», pois era graças a essa deusa que a terra se tornava fértil. Ora, um dos filhos de Ceres seria o Boieiro, que teria transmitido à Humanidade o conhecimento do arado e das técnicas da agricultura. Segundo a lenda, o Boieiro guia as ursas em torno do Pólo Norte. A estrela Arcturo, que em tempos deu o nome a toda a constelação, está miticamente ligada ao do Pólo Norte - daí deriva o termo «árctico», que designa essa região. A leste do Boieiro aparece Hércules. Ainda mais a leste aparecem três estrelas muito brilhantes - Vega, Deneb e Altair, nas constelações da Lira, Cisne e Águia, respectivamente. Essas três estrelas constituem um asterismo conhecido como triângulo de Verão. Serão os nossos melhores guias celestes nos meses que se aproximam. A dança dos planetas continua a desenrolar-se pela madrugada. Júpiter levantase agora cada dia mais cedo e, nos meses seguintes, começará a ser possível observá-lo a meio da noite. Seguem-se Saturno e Vénus, mas este já confundido com a luz da aurora. Dia 17 deste mês, Júpiter e a Lua aproximam-se espectacularmente. A exibição inicia-se pelas duas da manhã, hora a que os dois astros nascem acima do horizonte leste. À medida que o dia entra, a Lua aproxima-se mais e mais do planeta, até que, pelo meio-dia, os dois astros se encontram apenas a grau e meio de distância angular, o equivalente ao diâmetro de três luas cheias. Já sabemos que Vénus e Júpiter são visíveis à luz do dia, desde que se saiba exactamente para onde olhar. Júpiter é mais difícil de observar do que Vénus, são necessários binóculos. Mas a Lua estará tão perto do planeta gigante que será fácil localizá-lo. Observar Júpiter à luz do dia é experiência que dificilmente se esquece. Texto de UO CRATO