Brasília, 18 de janeiro de 2011. Nº 80 1 A Europa como fator de risco em 2011 Apesar dos muitos problemas pendentes, existe expectativa firme de que a economia mundial continuará sua rota da recuperação neste ano, com crescimento entre 4,0% e 4,5%. Nos Estados Unidos, os indicadores de atividade econômica têm sido animadores nos últimos meses, a despeito do hiato do produto ainda ser da ordem de 6,0% e das dificuldades para a economia gerar emprego. Na China, o forte aumento da taxa de inflação tem levado ao aperto da oferta de crédito para conter a demanda interna, mas, como é hábito naquele país, as medidas têm sido graduais, conservadoras e deixam claro que não é intenção do governo chinês reduzir expressivamente a taxa de crescimento econômico. Os demais emergentes (Brasil incluído) também compartilham do surto inflacionário gerado, pelo menos em parte, pela expansão monetária das economias desenvolvidas e, em maior ou menor escala, terão de adotar políticas fiscal e monetária mais austeras neste ano, porém sem comprometer muito a expansão da renda real. 2 Nessa visão global, o problema está na Europa, não apenas pelo baixo crescimento esperado para a região, com exceção da Alemanha, mas principalmente pela crise fiscal e de endividamento público dos países periféricos - os chamados PIGS (conjunto das economias de Portugal, Itália, Grécia e Espanha). É verdade que os programas de ajuste fiscal desses países, ainda em estágio inicial, têm obtido alguns resultados significativos. Por exemplo, a Grécia, que iniciou o ajuste antes dos demais, reduziu o déficit de 15,4% do Produto Interno Bruto (PIB), em 2009, para 9,4%, em 2010, e projeta nova queda para 7,4% neste ano. A Irlanda, cujo déficit atingiu 31,7% do PIB em 2010, em virtude do auxílio ao sistema bancário, espera contraí-lo para 9,1% neste ano. A Espanha tem como meta a queda do déficit de 9,3% do PIB, em 2010, para 6%, em 2011, ao passo que Portugal comprometeuse a reduzir o déficit de 7,3% para 4,6% no mesmo período. 3 Apesar dessa melhora, esses países ainda estão distantes da condição de sustentabilidade da dívida pública, expressa na estabilidade temporal da relação dívida- PIB. Ou seja, eles continuarão precisando de financiamento líquido neste e nos próximos anos. Como o mercado privado de capitais não parece disposto a aumentar sua exposição a esse tipo de dívida, o apoio da União Européia, do Fundo Monetário Internacional (FMI) e de fundos soberanos de vários países é fundamental para evitar o default (quebradeira). Entretanto, mesmo que o fluxo de financiamento oficial seja viável, existe um segundo complicador importante: esses países praticamente não crescem desde a crise de 2008 e certamente não crescerão neste e talvez no próximo ano. A ausência de expansão econômica (ou mesmo a contração da renda, em alguns casos) não só torna a condição de sustentabilidade fora de alcance, como gera pressões internas crescentes sobre a classe política e o governo no sentido de abandonar a política de austeridade. 4 A questão é que os PIGS não parecem ter alternativas melhores à política de ajustamento atual, por mais dolorosa que ela seja. Decretar moratória unilateral ou abandonar o euro (ou ambas) por parte de qualquer um desses países poderia representar custos ainda maiores no médio prazo e certamente precipitar uma crise financeira nos demais, talvez na região como um todo. Portanto, até onde decisões como essas são inspiradas em avaliação racional, dificilmente um dos PIGS recorrerá a elas. Por outro lado, os financiadores, que até aqui têm seguido a máxima do lend and pray (emprestar e rezar), podem se cansar ou serem coagidos por seus constituintes a rever essa posição e simplesmente abandonar o barco. Também este não parece ser um caminho possível sem implodir (ou explodir) o projeto geopolítico da União Européia. 5 Seja como for, o fato é que a zona do euro, neste ano, é a região do mundo onde os maiores riscos se concentram. E, obviamente, tais riscos contribuem para determinar o valor dos ativos em todo o mundo. Deve-se esperar que esses preços aumentem moderadamente com a recuperação da economia mundial neste ano e a perspectiva de permanência do quadro de juro zero nos EUA. Mas, ao mesmo tempo, a existência de uma zona de possível turbulência financeira da importância da Europa pode produzir também uma elevada volatilidade de preços, ao sabor dos altos e baixos do processo de ajustamento dos PIGS.