Herbert Spencer e a gênese da Sociologia brasileira

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HERBERT SPENCER E A GÊNESE DA SOCIOLOGIA
Prof. Dr. Samuel de Jesus
[email protected]
Docente da Universidade Federal de Mato Grosso Sul
Campus de Coxim
Considerações iniciais
Herbert Spencer foi um dos fundadores das Ciências Sociais. Em seu
livro tenta estabelecer um método para esta nova ciência. Para uma
compreensão mais ampla de seu método é necessário entender sua época e
as idéias que circulavam. É necessário reconhecer sua contribuição às
ciências sociais através da elaboração de um método de investigação
científico, sobretudo é preciso entendê-lo em seu devido contexto histórico
onde já circulavam as teorias racistas do século XIX, período da Era
Vitoriana, assim como do Neo-colonialismo e a corrida tecnológica. No Brasil,
as teorias do conde de Gobineau e a Democracia Racial de Gilberto Freyre.
Basicamente escrevemos sobre a importância de Spencer em estabelecer
um método em Sociologia inserindo sua teoria em seu contexto histórico,
mencionamos o surgimento da Sociologia no Brasil e a Sociologia na
atualidade e seus novos paradigmas e abordagens.
A Era Vitoriana
A era vitoriana do Reino Unido foi o período de reinado da Rainha
Vitória de junho 1837 até sua morte em 22 de janeiro de 1901. O reinado
marcado pela Hegemonia Econômica Britânica, pois a Inglaterra se
consolidava como um país central que expandia seus tentáculos sobre as
áreas periféricas como África e Ásia, é o que pode ser chamado de a
consolidação do Império Britânico, aquele em que “o sol jamais se punha” A
segunda metade da Era Vitoriana praticamente coincidiu com a primeira parte
da época Belle Époque da Europa continental e a Era Dourada dos Estados
Unidos.
Perto do final do século, as políticas do novo imperialismo levaram a
crescentes conflitos coloniais e, eventualmente, tais como a Guerra dos
Boêres. Em seu reinado a população da Inglaterra quase duplicou, passando
de 16,8 milhões em 1851 para 30,5 milhões em 1901. (ARRUDA &
PILLET, 1996)
IMPERIALISMO
Imperialismo é um fenômeno político, sobretudo o domínio que um
país exerce sobre outro devido ao seu poder militar e econômico revestido de
uma carga ideológica que trabalha múltiplos espectros simbólicos. A
sobreposição de uma nação sobre um povo ou um conjunto de nações que
objetiva a expansão política e econômica do Império. Dessa forma a criação
de protetorados e a criação de monopólios comerciais são algumas das
características do imperialismo. O imperialismo pressupõe a concepção de
desigualdade econômica, política e social e afirmação da idéia de
superioridade. Lenin, líder da Revolução Bolchevique, estabeleceu algumas
hipóteses sobre a origem do imperialismo como resultado da produção
capitalista e a conseqüente criação de monopólios que cria uma oligarquia
financeira, resultado da fusão entre capital bancário e industrial. A exportação
desse capital, assim como a formação de associações internacionais
monopolistas de capitais resultou na partilha da periferia para a obtenção de
matéria prima e ampliação de seu mercado consumidor. (ARRUDA &PILLET,
1996)
TEORIAS RACISTAS DO SÉCULO XIX
A Ciência do século XIX, da época de Herbert Spencer (1873), é
marcada pelo Darwinismo Social que se baseava na tese de que a teoria
darwinista poderia ser perfeitamente aplicada à sociedade. A luta pela
sobrevivência entre animais corresponderia à lógica capitalista, ou seja, o
mais apto sobreviveria. Dessa forma as sociedades mais capazes se
sobressairiam às demais e ocupariam um papel de liderança. Esta seria uma
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das fundamentações para a criação do Império Colonial Britânico, assim a
missão da “civilização” era levá-la aos povos considerados bárbaros o “fardo
da civilização branca“. Essa foi a argumentação básica para a colonização da
África e da Ásia.
No Brasil Conde de Gobineau refletia as concepções européias do
período, Segundo ele, a mistura de raças era inevitável e levaria a raça
humana a graus sempre maiores de degenerescência física e intelectual. Élhe atribuída a frase "Não creio que viemos dos macacos, mas creio que
vamos nessa direção." A mistura racial daria origem a mestiços e pardos
degenerados e estéreis. Esta característica já teria selado a sorte do país: a
degeneração levaria ao desaparecimento da população. (Brasiliana, abaixo
citada, página 74). A única saída para os brasileiros seria o incentivo à
imigração de "raças" européias, consideradas superiores. (ARRUDA
&PILLET, 1996).
Estudo das Ciências Sociais
A lei dos agregados sociais de Spencer (1873) gravita em torno das
teses científicas características baseadas no evolucionismo e no Darwinismo
Social. No cápítulo III. Da natureza da Ciência Social nos oferece como
exemplo inicial. Spencer utiliza o exemplo de um pedreiro que não usa
material de qualidade. Esse material estando empenado, rachado e quebrado
não poderá construir uma parede com estabilidade. Para isso seria
necessário que os tijolos tenham uma geometria mínima, ao ponto que uma
vez perfilados e encaixados possam formar uma parede com a estabilidade
necessária. Da mesma maneira os agregados sociais precisam ter uma
conformação básica, as peças sem qualidade consideradas inferiores
poderão desestabilizar a parede social, assim o todo é determinado pela
propriedade das unidades. As características especiais das raças e dos
indivíduos impactam a formação social. A característica de cada agregado é
o objeto das Ciências Sociais. Dessa forma compreenderemos a sociedade.
Esse é talvez uma das primeiras formulações de um método das
Ciências Sociais, Concordemos ou não, certamente é inegável que a idéia de
agregados Sociais é um primeiro método para se entender a sociedade,
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mesmo que seja calcado nos princípios evolucionistas ou Darwinismo Social.
Devemos entender Spencer (1873) como homem do seu tempo.
Spencer (1873) continua suas formulações teóricas sobre as Ciências
Sociais afirmando que é limitada a previsão do fato social utilizar o exemplo
da mina que está para explodir, sabemos que se explodir irá fragmentar-se,
sabemos que cada fragmento irá tomar uma direção e depois cairá no solo
em lugares diferentes em uma área circunscrita e em momentos diferentes.
Isso é tudo que a ciência pode nos dizer, ou seja, um fato social não poderá
ser descrito com extrema precisão pelas Ciências Sociais.
Para Spencer (1873) no fundo de cada espécie animal ou vegetal
existe uma estrutura que a possibilita a vida, possui um tipo parental para a
agregação dada pelas condições da natureza das unidades, assim pelos
caracteres das unidades é preciso certos limites dentro dos quais se constitui.
Devemos considerar cada individuo que compõe a trama social, esses
deverão afetar as relações quando associados.
Define que a propriedade
das unidades determina as propriedades do agregado e conclui que deve
existir uma ciência social que expressa relações entre os dois que significa
tecer a gênese das relações sociais nas sociedades de todas as ordens e
tamanhos, assim como a distinção de alguns grupos sociais, sejam raciais e
as peculiaridades de cada sociedade. A sociedade deverá possuir
determinadas características que formarão o objeto de uma ciência.
A sociologia deve reconhecer as verdades do desenvolvimento social,
sua estrutura e sua função aspectos universais, gerais e especiais, assim
como a biologia que descobre traços fundamentais do desenvolvimento,
estrutura e função dos organismos vivos, pois os Seres Humanos
considerados tem propriedades em comum os agregados sociais que ele
compõe, possui traços em comum. Olhando para as nações e estudando os
povos que a compõe entendemos seus traços distintivos, peculiares, os
fenômenos da natureza individual e da natureza e os fenômenos da natureza
humana incorporada, assim os fenômenos da natureza humana integrada
compõem o objeto das Ciências Sociais.
Spencer (1873) utiliza a biologia para defender a hierarquia presente
no tecido social, segundo ele uma condição primaria nos agregados sociais,
possui uma verdade biológica comparada a uma verdade sociológica que o
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primeiro passo para a constituição de um organismo vivo a diferenciação
entre uma parte central e a porção periférica. Em uma sociedade o chefe é
político e militar. Ele caça faz as armas gere os seus assuntos privados e na
guerra difere-se de outros guerreiros, mesmo sendo um deles e não
perdendo esta condição, embora esteja separado do resto da tribo em
funções militares e nas sociedades modernas em funções industriais, exerce
sua autoridade pessoal na manutenção da ordem social, regulador da
produção e do comércio e preside os atos do cambio sobre a qual não é
exercida pessoalmente. O chefe tem suas funções mais especializadas como
a evolução da sociedade em tamanho e complexidade. A organização é
indispensável para o crescimento, para além de certo ponto não pode existir
crescimento sem organização. O agregado a que chamamos de sociedade é
um plástico muito mais que um agregado, ou seja não é de um tipo tão rígido,
mas flexível que toma formas distintas, embora em sua natureza a tendência
é se tornar fixo.
Os pressupostos biológicos estão presentes na teoria spenceriana a
organização e crescimento são preocupações do século XIX e inicio do XX. A
função do chefe, líder admite a desigualdade e no plano das nações que
compõe o organismo planetário existiriam aquelas que exercerão a liderança.
A Sociologia no Brasil.
Segundo Antonio Candido (2006, P. 271-272) a Sociologia Brasileira
formou-se sob a égide do evolucionismo, possuía as mesmas preocupações
e orientações. As pesquisas se balizavam pelos fatores naturais e biológicos
tais como raça com a predominância do critério evolutivo adotando a História
Social. Os primeiros foram os “juristas filósofos” tais como Clovis Bevilacqua
no século XIX. O evolucionismo se adequou a nossas realidades locais tais
como o escravismo e as possibilidades de desenvolvimento do Brasil, o ideal
de branqueamento.
Euclides da Cunha a partir de Os Sertões elaborou-se uma forma
brasileira de Estudos Sociais dentre outros como Alberto Torres, Oliveira
Viana, Gilberto Freyre, Sérgio Buarque de Holanda e Caio Prado Junior. A
primeira obra que poderá ser considerada a primeira obra de Sociologia do
Brasil seja Introdução à História da Literatura Brasileira de Silvio Romero.
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Lança as diretrizes orientadoras dos Estudos Sociais no Brasil, pois interpreta
o sentido da evolução cultural e institucional segundo o meio e a raça.
Para Antonio Cândido (2006, pp. 272-273) o primeiro escrito teórico
de certo vulto sobre a matéria foi Tobias Barreto que obedecia ao critério
negativista, as Glosas Heterodoxas na qual contesta autonomia das Ciências
Sociais argumentando que as leis sociais não são naturais, mas normativas,
ou seja, não são regidas pelo princípio do determinismo, os fatos pertencem
a uma esfera “mecanicamente explicável”.
A Sociologia brasileira só fora reconhecida como atividade ampla,
reconhecida e produtiva, contando com um pessoal numeroso e devidamente
especializado somente depois de 1940. Primeiro: a organização do trabalho
sociológico; 20 no espírito que o preside, c) nas obras realizadas. Quanto à
organização, as atividades sociológicas devem ser consideradas sob alguns
aspectos dentre eles, a) ensino, b) pesquisa, c) divulgação. (CANDIDO,
2006, P. 272-273).
As ciências Sociais na atualidade.
Atualmente as ciências Sociais possuem outros paradigmas e outros
objetos. De acordo com suas concepções Spencer tentou e conseguir
formular um primeiro método e teoria social através dos quais poderia
entender sua época marcada pelas teorias científicas do século XIX no
contexto da teoria da origem das espécies, do neo-colonialismo afro-asiático,
da hegemonia européia caracterizada pela Era Vitoriana inglesa e pela Bellè
Époque francesa. Hoje, as preocupações e os métodos, abordagens das
ciências sociais são outras.
Segundo Enrique Leff (2007) todo o saber, conhecimento sobre o
mundo que nos cerca tem sido reflexo de uma conjuntura geográfica
ecológica e cultural, o que redunda na produção e na reprodução de uma
formação social determinada. A produção depende do meio ambiente e da
diferenciação social de diversas culturas, a partir da qual o homem se utiliza
de técnicas para a transformação do meio onde vive e se apropria
socialmente da natureza, pois todo o conhecimento teórico que parte de um
saber herdado, mas, resultado de uma luta teórica contra o conhecimento
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ideológico e utilitarista que é instrumento para a manutenção das classes
dominantes e interesses em jogo.
Os paradigmas não são imutáveis, muito ao contrário, segundo
Altvater (1999) a mudança paradigmática é possível, pois os desafios
históricos se impõem frente ao poder explicativo dos conceitos teóricos,
assim a crise de um paradigma acontece quando uma nova realidade se
impõe frente ao poder explicativo dos conceitos teóricos, assim a crise de um
paradigma acontece quando uma nova realidade se impõe e o coloca em
xeque fazendo com que suas respostas sejam insatisfatórias, insuficientes ou
ridículas. Exemplo, atualmente a desnacionalização, o aquecimento global, a
escassez dos recursos naturais devido a degradação do meio ambiente,
fazem com que a limitação da produção ou que o estabelecendo de outros
padrões produtivos sejam necessários, assim contrariam os pressupostos
econômicos liberais de Adam Smith estabelecendo assim um novo campo da
teoria econômica, ou seja, um novo paradigma que considere a intervenção
do Estado na economia.
Considerações finais
Salvo as condicionantes históricas temos a tentativa de constituição de
um método sociológico. Certamente, como anteriormente afirmado o método
é impregnado pelo contexto histórico. No caso de Spencer não podemos vêlo apenas como um evolucionista e teórico do neo-colonialismo, mas
entender a tentativa de elaboração de um método é louvável muito embora
existissem divergências quanto a ele, mas certamente fora uma das primeiras
incursões
para
definir
parâmetros
da
pesquisa
sociológica,
seus
pressupostos, suas limitações. No trabalho procuramos não pensar Spencer
isoladamente, assim fizemos a opção por descrever muito brevemente os
primeiros passos da sociologia brasileira, formação de um padrão de análise
e por final discutir a mudança paradigmática no campo das Ciências Sociais
com a intenção de demonstrar as mudanças pela qual passa a teoria, pois a
teoria spenceriana é constituída em contexto e tempo histórico específico.
Hoje não podemos analisar a sociologia do ponto de vista da biologia
evolutiva, mas talvez da ecológica, pois afinal as questões sobre meio
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ambiente estão quebrando muitos paradigmas e tornando obsoletos os
métodos atuais, assim procuramos mostrar o dinamismo da constituição dos
métodos. Por outro lado, a leitura de Herbert Spencer é uma referência para
que pós-graduandos compreendam como se concebe um método e a partir
dele entender os parâmetros de uma pesquisa sociológica. Hoje existem
muitos trabalhos ensaísticos que distanciam o trabalho sociológico de uma
pesquisa strictu sensu com uma metodologia que permita a dissecação do
objeto sociológico e a confrontação de diversas fontes na qual serão obtidas
algumas informações preliminares.
Bibliografia
ALTVATER, Elmar. Os desafios da globalização e da crise ecológica para
o discurso da democracia e dos direitos humanos. In: HELLER, A. et alli
A crise dos paradigmas em Ciências Sociais e os desafios para o século XXI.
Rio de Janeiro: Contraponto/Corecon, 1999.
BIRMAN, Joel. Arquivos do mal-estar e da resistência. Rio de Janeiro:
CIVILIZAÇÃO BRASILEIRA, Rio de Janeiro, 2006.
CÂNDIDO, A. A sociologia no Brasil.- São Paulo. In: Revista Tempo Social,
revista de sociologia da USP, v. 18, n. 1.
ARRUDA, Jose Jobson. PILLET, N. Toda Historia - Historia Geral e Hist. do
Brasil, 4ª Ed. São Paulo: Atica, 1996
LEFF, Enrique. Sobre La articulação de lãs Ciências em la reacción
naturaleza-sociedade. In: Ecologia y Capital. México: Siglo XXI Editores, 7 a
ed., 2007.
SPENCER, Herbert. The Study of Sociology, London: Henry S. King, 1873.
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