Oncogeriatria - Revista Onco

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www.revistaonco.com.br
Outubro/Novembro 2011
Ano 2 • no 8
Oncologia para todas as especialidades
Nutrição
Alterações metabólicas e
terapia nutricional em câncer
Oncogenética
O futuro já chegou? Medicina
baseada em genética
e seus desdobramentos
Do bem
Além do paciente:
quando quem cuida
também precisa ser cuidado
Oncogeriatria
É hora de aproximar as áreas
e encontrar uma nova forma
de tratar o idoso com câncer
entrevista | onco-hematologia | emergências oncológicas
sumário
Câncer, pesquisa, educação, Deus: nada escapa da análise minuciosa
de Ricardo Brentani, diretor-presidente da Fapesp
entrevista
8
capa
12
A vez da oncogeriatria
Na integração da oncologia e da geriatria,
uma nova abordagem do paciente idoso de câncer
ginecologia
16
Atualizações em screening e epidemiologia do câncer ginecológico
José Carlos Sadalla
ginecologia
18
Atualizações em câncer de ovário
Jorge Saad Souen
mama
20
Mastectomia redutora de risco
Maurício Magalhães Costa
oncogenética
28
Para onde caminha a oncogenética? – Oportunidades e desafios
José Cláudio Casali da Rocha
nutrição
34
Desnutrição em câncer
Dan Linetzky Waitzberg, Letícia De Nardi e Lilian Mika Horie
onco-hematologia
38
Desafios no diagnóstico de linfoma indolente
Alexandre Palladino, Ana Carolina Nobre e Diogo Rodrigues
emergências oncológicas
44
Urgências metabólicas no paciente oncológico
Simone Maradei, Leonardo Javier Arcuri e Daniel Tabak
do bem
52
Cuidando do cuidador: quando quem zela pelo
paciente de câncer também inspira cuidados
quiz
56
A cada edição, um caso novo e pouco comum. E o diagnóstico é...
Ricardo Caponero
curtas
59
Notícias da indústria, iniciativas, prêmios:
um giro pelo mundo da oncologia
calendário
62
Programe-se: eventos e congressos para anotar na agenda
Conselho
editorial
Editor clínico:
Sergio D. Simon
I – Cancerologia clínica
Oncologia clínica:
André Moraes (SP)
Anelisa Coutinho (BA)
Auro Del Giglio (SP)
Carlos Sampaio (BA)
Claudio Petrilli (SP)
Clarissa Mathias (BA)
Daniel Herchenhorn (RJ)
Fernando Medina (SP)
Gothardo Lima (CE)
Igor Morbeck (DF)
João Nunes (SP)
José Bines (RJ)
Karla Emerenciano (RN)
Marcelo Aisen (SP)
Marcelo Collaço Paulo (SC)
Maria de Fátima Dias Gaui (RJ)
Nise Yamaguchi (SP)
Oren Smaletz (SP)
Paulo Marcelo Gehm Hoff (SP)
Roberto Gil (RJ)
Sebastião Cabral Filho (MG)
Sérgio Azevedo (RS)
Sergio Lago (RS)
Onco-hematologia:
Carlos Chiattone (SP)
Carmino de Souza (SP)
Daniel Tabak (RJ)
Jane Dobbin (RJ)
Nelson Spector (RJ)
Vânia Hungria (SP)
Transplante de medula:
Jairo Sobrinho (SP)
Luis Fernando Bouzas (RJ)
Nelson Hamerschlak (SP)
Yana Novis (SP)
II – Biologia molecular
Ada Alves (RJ)
André Vettore (SP)
Carlos Gil (RJ)
Helenice Gobbi (MG)
José Cláudio Casali (RJ)
Luísa Lina Villa (SP)
Maria Isabel Achatz (SP)
III – Cancerologia
cirúrgica
Neurologia:
Manoel Jacobsen Teixeira (SP)
Marcos Stavale (SP)
Cabeça e pescoço:
Luis Paulo Kowalski (SP)
Vergilius Araújo (SP)
Tórax:
Angelo Fernandez (SP)
Riad Naim Younes (SP)
Abdômen:
Ademar Lopes (SP)
José Jukemura (SP)
Laercio Gomes Lourenço (SP)
Marcos Moraes (RJ)
Paulo Herman (SP)
Mama:
Alfredo Barros (SP)
Antonio Frasson (SP)
Carlos Alberto Ruiz (SP)
Maira Caleffi (RS)
Urologia:
Antônio Carlos L. Pompeu (SP)
Miguel Srougi (SP)
Ginecologia:
Jorge Saad Souen (SP)
Sérgio Mancini Nicolau (SP)
Sophie Derchain (SP)
Tecido osteoconjuntivo:
Olavo Pires de Camargo (SP)
Reynaldo J. Garcia Filho (SP)
IV – Radioterapia
Ludmila Siqueira (MG)
Paulo Novaes (SP)
Robson Ferrigno (SP)
Rodrigo Hanriot (SP)
Wladimir Nadalin (SP)
V – Cuidados paliativos
e dor
Ana Claudia Arantes (SP)
Claudia Naylor Lisboa (RJ)
Fabíola Minson (SP)
João Marcos Rizzo (RS)
Ricardo Caponero (SP)
Ano 2 • número 8
Outubro/Novembro 2011
Editorial Lilian Liang
[email protected]
Sergio Azman
[email protected]
Comercial Simone Simon
[email protected]
Direção de arte Luciana Cury
[email protected]
Pré-impressão Ione Gomes Franco
Revisão Patrícia Villas Bôas Cueva
6
outubro/novembro 2011 Onco&
Impressão: Ipsis Gráfica e Editora
Tiragem: 10 mil exemplares
ISSN: 2179-0930
Jornalista responsável: Lilian Liang (MTb 26.817)
Colaboraram nesta edição: Alexandre Palladino,
Ana Carolina Nobre, Dan Waitzberg, Daniel Tabak,
Diogo Rodrigues, Jorge Saad Souen,
José Carlos Sadalla, José Cláudio Casali da Rocha,
Leonardo Javier Arcuri, Letícia De Nardi,
Lilian Mika Horie, Maurício Magalhães Costa,
Ricardo Caponero, Sérgio Vieira e Simone Maradei
A revista Onco& – Oncologia para todas as especialidades, uma
publicação da Iaso Editora, especializada em comunicação médica,
traz informações sobre oncologia a profissionais de todas as
especialidades médicas. De circulação bimestral, tem distribuição
nacional e gratuita por todo o território nacional. A reprodução
do conteúdo da revista é permitida desde que citada a fonte.
Avenida Vereador José Diniz, 3720 – cj. 406
Campo Belo – 04604-007 – São Paulo – SP
(11) 2478-6985 (redação) – (21) 3798-1437 (comercial)
Aproveitar as oportunidades
D
epois de meses de preparação e expectativa
de governos e sociedade civil, a tão esperada
Assembleia das Nações Unidas, a segunda
na história da ONU a se dedicar exclusivamente à
saúde, realizada em Nova York em meados de setembro, terminou numa espécie de anticlímax: boas intenções, mas poucas medidas concretas.
O documento de 14 páginas e 57 pontos resultante da reunião descreve as doenças crônicas –
entre elas câncer, diabetes, doenças cardiovasculares e doenças respiratórias – como um “desafio
de proporções epidêmicas”, mas define linhas de
ação pouco específicas para essas condições, que,
juntas, são responsáveis por mais de 60% das
mortes no mundo, segundo a Organização
Mundial da Saúde (OMS).
Trata-se de um desfecho desanimador, porque
os problemas já foram mapeados. Não é segredo
para ninguém que, para que as doenças crônicas
sejam abordadas de forma eficiente, é necessário investir maciça e consistentemente em prevenção;
promover a aproximação de governo e sociedade
civil na implementação de medidas de controle; fortalecer sistemas e políticas nacionais de saúde; investir em pesquisa e desenvolvimento; e desenvolver
alianças nacionais e internacionais para medidas
conjuntas. Desperdiçou-se, infelizmente, a valiosa
oportunidade de fazer aos líderes de cada país a pergunta mais importante: “Como fazer tudo isso?”.
Esse desperdício tem importantes reflexos na
economia. Um estudo do World Economic Forum
e da Escola de Saúde Pública da Universidade de
Harvard mostra que o impacto econômico das principais doenças crônicas pode chegar a US$ 47 tri lhões nos próximos 20 anos. Dados da OMS
mostram que 25% de todas as mortes por doenças
não transmissíveis ocorrem na fase mais produtiva
da vida, a maioria em países em desenvolvimento.
Em seu discurso, o secretário-geral da ONU, Ban
Ki-Moon, deixou claro: “As doenças crônicas são
uma ameaça ao desenvolvimento”.
O Brasil não escapa dessa sentença. Com o envelhecimento da população, a incidência de câncer no
país só tende a aumentar. Como país em desenvolvimento, o Brasil não pode se dar ao luxo de encarar as
perdas trágicas previstas pelos economistas. Muito já
foi feito, sem dúvida. Mas é preciso ir mais longe.
Há alguns exemplos a seguir. Algumas iniciativas têm não apenas aproveitado as chances que
aparecem para discutir o “Como?”, mas também
criado tais oportunidades. Destaco aqui as ações do
Instituto Oncoguia, que, sob a liderança de Luciana
Holtz, não poupa esforços para trazer à mesa os
envolvidos na discussão do câncer como saúde
pública. Em agosto, a organização promoveu
dois encontros fundamentais para esse debate: o
II Fórum de Discussão de Políticas Públicas em Oncologia e o II Simpósio para Jornalistas – A Força
da Mídia em Articulação com a Voz do Paciente.
Os resultados desses encontros extrapolam a
simples elaboração de relatórios, como é tão
comum. Seja num e-mail de resposta ao paciente,
seja numa conversa com o ministro da Saúde em
Brasília, eles se concretizam em ações, porque
quando se sabe “o que” e “como”, o “fazer” se torna
quase inevitável.
Boa leitura!
Lilian Liang
* Jornalista especializada na
cobertura de saúde, é editora da
Onco& – Oncologia para todas
as especialidades
Contato: [email protected]
Onco& outubro/novembro 2011
7
entrevista
Mais que luxo, necessidade
Oncologia, pesquisa, casamento e até Deus: nada escapa da análise
minuciosa de Ricardo Brentani, diretor-presidente da Fapesp
e vencedor da 2a edição do prêmio Octavio Frias de Oliveira
Eduardo Cesar/FAPESP
Por Lilian Liang
“
Ricardo Renzo Brentani
* Diretor-presidente da
Fundação de Amparo
à Pesquisa do Estado
de São Paulo (Fapesp)
8
outubro/novembro 2011 Onco&
V
ocê pode me perguntar o que quiser, até se
eu acredito em Deus.” Foi com esse convite
que o oncologista Ricardo Renzo Brentani,
diretor-presidente da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), deu início
à nossa conversa numa tarde de segunda-feira.
Aos 74 anos, Brentani não se esquiva das perguntas difíceis. De riso fácil e sem a aura solene que
parece sempre cercar os grandes pesquisadores, esse
italiano de Trieste expressa suas opiniões para quem
quiser ouvir. Não tem papas na língua nem medo de
pisar no calo alheio. Mesmo com jornalistas, não faz
cerimônia. Desenvolveu um método: “Quando você
não quer que o você falou seja publicado, é só colocar um palavrão no meio”, confessa, dando risada.
Formado em 1962 pela Faculdade de Medicina
da Universidade de São Paulo, Brentani tem um
currículo que lhe permite essas pequenas extravagâncias. Emplacou seu primeiro artigo na Nature,
uma das mais conceituadas revistas científicas do
mundo, quando ele ainda estava no quarto ano da
faculdade, em 1960. Repetiu o feito mais três vezes:
em 1964 e 1966, em parceria com sua mulher, e em
1990, com sua filha. Sua lista de artigos publicados
é longa. O cientista contabiliza hoje quase 200 artigos em periódicos científicos internacionais, que
foram citados cerca de 4,5 mil vezes por outros
pesquisadores. Não é pouco.
Entre suas conquistas mais notáveis, duas
saltam aos olhos: o desenvolvimento do projeto
Genoma Humano do Câncer, financiado pela
Fapesp e pelo Instituto Ludwig, que sequenciou 20
tipos de tumores e alçou o Brasil a uma posição de
destaque na ciência internacional; e a transformação
do Hospital do A.C. Camargo em uma das maiores
referências em câncer no país.
A mola que impulsiona tudo isso, segundo
Brentani, são o investimento e o incentivo à
pesquisa. “A pesquisa deve ser entendida como uma
ferramenta de promoção social. Não é um luxo, é
uma necessidade do país”, enfatiza. Mesmo no
Brasil, onde existem tantas outras prioridades? “A
inteligência não tem bandeira. Não há nenhuma
razão para não investir em pesquisa de ponta. Sim,
os recursos no Brasil são limitados, mas você não
vai me dizer que os do Obama não são”, alfineta.
Brentani acrescentou em agosto mais uma invejável linha ao seu extenso currículo: foi vencedor na
categoria Personalidade em Destaque da segunda
edição do prêmio Octavio Frias de Oliveira, concedido pelo Instituto do Câncer do Estado de São Paulo
(Icesp) em parceria com o Grupo Folha. “É sempre
gratificante ver que as outras pessoas valorizam o que
você faz, mas não acho que merecia o prêmio”, conta.
“Só fiz o que achava que era minha obrigação fazer.”
De trás da mesa impecavelmente arrumada,
Brentani dispara respostas às perguntas polêmicas
como um profissional de tiro ao alvo: com destreza,
precisão e firmeza. Mas, para desarmá-lo, basta falar
da mulher, a química Maria Mitzi (“uma cientista
bem melhor que eu, na minha opinião”), com quem
está casado há meio século. O segredo para o casamento longevo? “Faço tudo que ela manda. Lá em
casa, manda quem pode e obedece quem tem juízo.
Eu tenho muito juízo”, brinca.
Confira a seguir alguns trechos da entrevista.
Onco& – O senhor já vem há algum tempo acompanhando o desenvolvimento da oncologia no
Brasil. Como estamos nos saindo?
Ricardo Brentani – Um dos grandes problemas
da oncologia é que ela não é ensinada na maioria
das escolas médicas do Brasil. Temos mais de 180
faculdades de medicina no país e duvido que 10
tenham um curso de oncologia na graduação. Portanto, o médico se
forma sem ter noções básicas de oncologia, sem saber fazer diagnóstico
e muito menos a tratar. Não é culpa dele, é culpa da escola que não
ensinou. O que acontece nas escolas é que cada cirurgião ensina como
“arranca o pedaço” dele. O resto ninguém ensina: se faz quimioterapia
antes, depois ou durante; quais as indicações de quimioterapia e radioterapia. Isso ninguém sabe.
Não bastasse isso, metade dessas escolas não tem hospital próprio,
portanto o estudante se forma médico sem ter visto o doente. Eu brinco
sempre que esses médicos têm um diploma número “00 qualquer coisa”
– como o James Bond, com licença para matar. Some-se à falta de hospitais o fato de dois terços das escolas não terem residência médica. Então
o aprendizado que o aluno não teve na faculdade e poderia ter na residência não vai acontecer, porque não tem residência disponível para ele.
Onco& – Qual a saída?
Brentani – O MEC considera um segredo de estado, eu não entendo
por que, quais as escolas de medicina que nunca conseguiram que um
aluno seu fosse aprovado em algum exame de residência no território
nacional. Isso, na minha opinião, deveria ser matéria de primeira
página. No ano passado eu dei uma entrevista para a Folha de S. Paulo
e o título da matéria era “Pode fechar metade que ninguém percebe”.
Existem hoje 320 mil médicos no Brasil. Segundo a OMS [Organização Mundial da Saúde], o Brasil precisa apenas de 180 mil. Agora, o
sindicato dos médicos, do qual eu fui inimigo público número 1, está
chegando à conclusão de que é preciso fechar escolas médicas, que há
vagas demais, que deveria haver um filtro. Acresça a isso o fato de o
crime do erro médico ainda ser muito pouco julgado no Brasil – a gente
lê nos jornais, precisa matar seis moças por lipoaspiração antes de alguém tomar alguma providência. Essa é a base do problema.
Se você fala em residência de oncologia especificamente, deve haver
cinco ou seis, no máximo, em todo o território nacional. Então não tem
onde aprender oncologia. O que eu acho curioso, pois a mortalidade
por doenças cardiovasculares está caindo. Os fatores de risco para essas
doenças foram perfeitamente identificados há pelo menos 30 anos e
houve um empenho muito grande da própria população, que foi alertada pela mídia para evitar fatores de risco: precisa fazer exercício, não
pode ter colesterol alto, não pode ter pressão alta, não pode fumar. O
Brasil é o país onde a taxa de fumantes caiu mais depressa, e isso, nosso
líder máximo vai me perdoar, mas é mérito do José Serra, não do governo do PT. Se eu me lembro bem, antes de o Serra ser ministro da
Saúde havia 42% de fumantes na população. Hoje deve ter 16%. Essas
prevenções tiveram papel importante na redução do risco de doença
cardíaca e, consequentemente, da mortalidade. Aliado a isso houve
um desenvolvimento muito grande dos métodos diagnósticos de
doença cardíaca, como o cateterismo, e dos métodos de tratamento também. Ninguém ganhou o prêmio Nobel por inventar o stent, mas certamente a implantação quase ambulatorial do stent reduziu a
mortalidade significativamente. Em câncer, isso infelizmente ainda não
aconteceu. Todo mundo sabe que fumar é ruim e os outros fatores de
risco – agora já existe vacina contra hepatite, HPV, provavelmente daqui
a 20 anos o câncer de colo do útero e outros sexualmente transmitidos
vão diminuir muito –, mas no mais a gente sabe muito pouco. Então
você tem aí um quadro muito interessante: educação dos médicos defasada e conscientização da população precária.
Onco& – O quadro não me parece muito animador.
Brentani – Existe também um fato que eu acho alarmante: câncer é
doença de velho. Se observarmos a evolução da raça humana na próxima
década, o número de habitantes na face da Terra não vai crescer mais do
que 20%, mas a pirâmide de distribuição etária vai mudar muito, porque
a expectativa média de vida está aumentando e os métodos diagnósticos
e a eficiência do tratamento estão melhorando. Portanto, estima-se que
nas próximas duas décadas, embora a população não vá crescer mais do
que 20%, o número de casos novos de câncer no mundo dobre e o
número de pessoas vivas com câncer triplique. E por uma razão mais
do que óbvia, 80% dessa casuística vai acontecer no mundo em desenvolvimento, porque embora a economia do mundo desenvolvido esteja
muito ruim, todos já chegaram na expectativa média de vida mais alta.
É muito mais difícil aumentar a expectativa média de vida de 75 para
76 do que de 40 para 60. Então vamos, no nosso país, enfrentar uma
epidemia de câncer na próxima década. Portanto a mortalidade por
câncer no Brasil, em função da formação deficiente e da falta de informação da população, vai aumentar muito mais do que deveria. Já existem estudos da IARC [International Agency for Research on Cancer],
que é o braço oncológico da OMS, mostrando que hoje no Brasil morre
muito mais gente do que deveria. A relação entre a morbidade e a mortalidade por câncer é mais alta do que deveria ser.
Onco& – Dinheiro resolve o problema?
Brentani – O problema não é dinheiro. Vamos começar pelo começo:
para câncer de colo do útero, por exemplo, já existe uma vacina que
funciona. Primeiro: por que, ao invés de desperdiçar dinheiro com
besteira, o governo não compra vacina para distribuir para a população
carente? Qual é a população em risco para câncer de colo do útero?
São as meninas de 10 a 15 anos de idade com uma condição de vida
precária. São essas pessoas que deveriam ser vacinadas. “A vacina custa
caro” é o argumento. Bom, então vamos negociar.
Em segundo lugar, a vacina só vai baratear. Quando a vacina contra
hepatite foi lançada, era muito cara. Hoje ela está disponível até na
África. Então precisa querer. Quanto está sendo gasto com campanhas
inúteis... Quando a gente fala de campanha contra câncer de colo do
útero, o que o governo imagina é fazer Papanicolau em todo mundo.
Mas não é ético fazer o diagnóstico em alguém que não vai poder ser
tratado depois. Se sabe que não vai conseguir tratar, não procure fazer
o diagnóstico. Todo o enfoque da campanha de prevenção de câncer
de colo do útero está errado. Nos grandes centros as mulheres de 60
anos fazem um Papanicolau a cada seis meses – isso é tolice, é jogar
dinheiro fora. É preciso identificar quem é a população sob risco, e
Onco& outubro/novembro 2011
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“Nenhum pesquisador brasileiro tem mais a desculpa de que não produz
porque não tem dinheiro. Isso não é verdade.”
essa população tem que ser atendida e fazer o Papanicolau. Existem
estudos que mostram claramente que o risco de câncer de colo do
útero cai pela metade nas mulheres que fizeram um Papanicolau na
vida. Acho que não preciso dizer mais nada, certo?
Onco& – O senhor falou da questão dos sobreviventes de câncer.
Já chegamos a essa discussão ou ainda temos de resolver problemas básicos, como formar os médicos?
Brentani – Sim, a primeira questão é a formação profissional. O
câncer é hoje a segunda causa de morte por doença. Nas escolas que
têm oncologia na graduação, o curso não dura mais do que duas, quatro semanas, num curso de seis anos. Isso é ridículo. Sempre teremos
que passar por essa etapa primeiro.
Mas lógico que é preciso pensar no problema, porque resolver depois que ele apareceu é muito ruim. Existe algo que se chama prevenção, que vale também para a saúde pública. Sempre digo que
prevenir não é só melhor do que remediar, mas é mais barato também.
Então, se você antecipa o diagnóstico, o tratamento de um estadiamento inicial é sempre mais barato e mais eficiente do que o tratamento de um estadiamento avançado. Mas, de novo, você tem que ter
certeza de que é capaz de fazer o diagnóstico e tratar adequadamente.
Um hospital como o A.C. Camargo está virando superespecialista,
porque uma fração crescente dos pacientes só nos procura porque não
deu certo em outro lugar. É uma pena, porque câncer não é igual a
unha encravada, que tira e acabou. Não é sempre que dá para resolver.
Hoje conhecemos a causa de 75% dos tumores humanos – cigarro,
35%; álcool, 15%; vírus, 10%; outros fatores ambientais, como dieta,
sol, 5%; sobram 10% de hereditário. Então é preciso ter pesquisa para
descobrir a causa dos outros 25%, e tem que ter muito mais prevenção
do que se tem hoje. As operadoras de saúde têm uma relutância muito
grande em custear prevenção, o que é uma estupidez. O Brasil ainda
não se livrou da mentalidade inflacionária. Ninguém pensa que, se eu
prevenir hoje toda a minha carteira, daqui a dez anos vou ter uma
sinistralidade mais baixa. Quero lucrar o máximo hoje, amanhã é outro
dia. É como os políticos: ninguém pensa em cinco anos, porque o
mandato deles é de quatro. Então não tem esgoto, água encanada, luz,
porque não vai dar para inaugurar durante o mandato.
Onco& – Diante de um quadro tão difícil, a pesquisa em câncer
deve ser prioridade para países em desenvolvimento como o
Brasil?
Brentani – A inteligência não tem bandeira. Não há nenhuma razão
10
outubro/novembro 2011 Onco&
para não investir em pesquisa de ponta. Sim, os recursos no Brasil são
limitados, mas você não vai me dizer que os do Obama não são. Esse
argumento já peca pela raiz.
Além de tudo, é muito importante que se diga que desde o primeiro
dia, do primeiro mandato do FHC, o investimento em ciência no Brasil
nunca mais deixou de existir. O investimento das agências federais era
espasmódico – um dia tinha dinheiro, outro não. Essa inconstância,
associada a uma inflação galopante, tinha uma consequência muito
ruim na qualidade e no volume da ciência brasileira. Isso não existe
mais. O país gasta hoje seguramente 1,5% do PIB em pesquisa. No estado de São Paulo esse volume é ainda maior. Não é muito dinheiro,
outros países investem mais que isso. No entanto, esses países têm uma
comunidade científica grande; a nossa ainda é relativamente pequena.
A estrutura acadêmica é complicada, há uma remuneração baixa e
pouco incentivo para comercialização da sua invenção. O Brasil patenteia 100 vezes menos do que a Coreia do Sul, por exemplo.
Seja como for, o investimento das agências de governo e, principalmente, da Fapesp no estado de São Paulo, é significativo. Nenhum
pesquisador brasileiro tem mais a desculpa de que não produz porque
não tem dinheiro. Isso não é verdade.
A pesquisa deve ser entendida como uma ferramenta de promoção social. Não é um luxo, é uma necessidade do país. Se a Embrapa [Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária] não fizesse
pesquisa, a gente não teria o domínio mundial de soja que temos
hoje. Temos vários exemplos. Então está muito claro hoje que a ciência é uma prioridade de governo e merece ser apoiada – talvez não
tão claro neste governo federal.
Onco& – Onde o Brasil se encaixa no cenário mundial de pesquisa
em oncologia?
Brentani – A oncologia brasileira hoje deve representar entre 0,5% e
1% da ciência oncológica do mundo. Dá para melhorar muito. Segundo a Capes, o A.C. Camargo é responsável por 60% da ciência oncológica do Brasil. Não deveria ser assim, as outras instituições devem
investir mais. É preciso haver mais pesquisa em oncologia no país – e
a desculpa de que não tem dinheiro não cola mais.
Onco& – Muito se critica o ambiente burocrático que dificulta a
pesquisa no Brasil.
Brentani – É o ambiente burocrático das instituições acadêmicas. É
muito fácil culpar a Anvisa, a Conep [Comissão Nacional de Ética em
Pesquisa], a alfândega, mas muita coisa se perde dentro da própria ins-
tituição: é o seu serviço de compras que não colocou o pedido na Anvisa, não providenciou a documentação na alfândega. Por isso a
Fapesp, há muitos anos, resolveu ser responsável pelas importações
inerentes a todos os auxílios custeados por ela para a comunidade científica do estado de São Paulo.
Não estou dizendo que não existem problemas, todo mundo tem
problemas. Só para dar um exemplo: tem um amigo meu, que agora
está em Miami, que é o pioneiro em pesquisa da doença da vaca
louca. Ele é suíço e trabalhava na Suíça. Mas na Suíça aos 65 anos
de idade você é obrigado a se aposentar, e aposentado não pode
mais ter emprego nenhum na Suíça. Portanto ele foi impedido de
dirigir o laboratório. Como ele ainda estava com a corda toda, resolveu se mudar para a Inglaterra.
Lá ele ficou um ano e meio no Imperial College, esperando que a
comissão nacional da rainha o autorizasse a usar os camundongos
transgênicos que ele mesmo havia desenvolvido. Cansado de esperar,
ele foi trabalhar em Miami.
Então toda comunidade científica tem problemas: a brasileira, a
suíça, a inglesa, todo mundo tem problema. Mas você nunca vai encontrar alguém que diga: meu problema é que eu sou burro, que eu
sou vagabundo. O problema foi sempre um outro que criou.
Onco& – Existe incentivo à pesquisa por aqui?
Brentani – Eu digo sempre uma coisa: no Brasil a gente não precisa
ser bom. A gente vira estável quando defende o doutorado. Você faz
concurso público para entrar na universidade, passa no concurso, vira
estável. Qual é o requisito para passar no concurso? Tem que ter grau
de doutor. Então vai trabalhar para quê? O problema é que não se tem
a pressão que se tem nos EUA para ser bom. Nos EUA você ganha um
salário pequeno, o tenure, e complementa isso com seu auxílio à
pesquisa. Então se você não consegue ganhar o auxílio à pesquisa você
está fulminado, para não usar outra palavra. Então tem que ser bom –
senão vai ser outra coisa, não dá para ser cientista, porque você tem
que garantir o feijão das crianças.
Aí olhamos para a universidade pública brasileira. Todo mundo
diz que a USP é a melhor universidade pública do Brasil. Mas quando
se analisa a fração dos docentes da USP que produzem cientificamente
não dá 25%. Os outros 75% fazem o quê? Isso quem me disse foi um
ex-reitor da USP, não fui eu que inventei. Então trabalhar para quê?
E tem o reverso da medalha: se eu publico na Nature, eu ganho alguma bonificação, muda meu salário, ganho uma secretária? Não.
Então para que publicar?
Na universidade privada, a razão para não fazer é a mesma: é
porque também não precisa fazer. Pegue uma universidade que não
tem nenhum curso que tirou C no ENEM, só D. Acontece alguma coisa
para aquela universidade? Não. Então para que fazer força? Não falta
trouxa. Naquela entrevista da Folha, o repórter me perguntou por que
essas escolas de medicina prosperam. E foi exatamente isso que eu
disse: porque não falta trouxa. Essas coisas é que atrasam a ciência.
Apesar disso, o Brasil hoje é o 13o produtor de ciência no mundo.
Se você pensar em termos de impacto médio das publicações, as publicações brasileiras pareiam com as da Argentina, do Chile. Se pegar
o estado de São Paulo em particular, a produção por cientista pareia
com Espanha, Portugal, Canadá.
Onco& – Que lições podemos tirar do sucesso do A.C. Camargo?
Brentani – A primeira lição, óbvia, é que o A.C. Camargo é um instituto de ensino e pesquisa. Ele de fato faz pesquisa. É o único hospital
privado que é um dos institutos de ciência e tecnologia do CNPq [Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico]. É o
único hospital privado que é um dos CEPIDs [Centro de Pesquisa,
Inovação e Difusão] da Fapesp, que tem pós-graduação para mestrado
e doutorado credenciada no MEC. O que isso trouxe para o hospital?
Um corpo clínico de peso, com boa parte engajada por vocação no ensino e na pesquisa. Isso tem, necessariamente, uma repercussão na
qualidade da medicina e traz uma imagem favorável do hospital. É um
modelo que funciona, por isso que o Sírio [Hospital Sírio-Libanês] e
o Einstein [Hospital Israelita Albert Einstein] criaram seus institutos
de ensino e pesquisa. A lição é esta: ensino e pesquisa são importantes
porque melhoram a qualidade da medicina que se pratica. E melhorar
a qualidade da medicina que se pratica é importante porque dá dinheiro. [A atriz] Marlene Dietrich dizia que há muitas outras coisas na
vida além do dinheiro, mas todas custam caro. (risos)
Acho que o que foi muito importante foi a implantação dessa filosofia
de uma instituição de ensino e pesquisa, e isso me permitiu atrair bons
garotos, como eu os chamo, e criar um corpo clínico com essa vocação.
Onco& – O que significa ter recebido o prêmio Octavio Frias de
Oliveira, na categoria Personalidade em Destaque?
Brentani – É sempre gratificante ver que as outras pessoas valorizam
o que você faz. Mas, na hora em que recebi o prêmio, disse que achava
que não merecia, porque eu só havia feito o que achava que era minha
obrigação fazer. “Ah, mas você fez bem-feito”, alguns dizem. Sim, mas
a obrigação é fazer bem-feito. Eu sou um privilegiado, porque o que
faço me diverte. Meu pai me dizia que eu era vagabundo, porque trabalho é só o que enche o saco. Eu adoro o que faço e isso não me desobriga de fazer bem-feito. Outro dia estava conversando com um
amigo, dizendo que eu estava ficando velho. Ele perguntou: “Mas você
ainda fica bravo quando a revista recusa um artigo seu ou só seus
alunos ficam?”. Respondi que sim. “Ah, então você não está velho!”
Onco& – Já que o senhor deu a deixa: acredita em Deus?
Brentani – (risos) Não muito. Eu acho que era muito mais fácil acreditar em Deus quando se dizia que tinha trovoada porque Deus estava
bravo. Quando apareceu uma explicação científica para a trovoada
ficou mais complicado. Eu acredito numa força superior que criou o
universo, mas não acho que ele está demais preocupado com uns seres
vivos, num planeta de quinta categoria, girando em volta de uma estrela mixa como o Sol. Deve ter mais coisa aí.
Onco& outubro/novembro 2011
11
capa
A vez da oncogeriatria
O envelhecimento da população e o aumento da incidência de
câncer em pacientes idosos criam a necessidade de um novo
profissional, que alie conhecimentos de oncologia e geriatria.
Saiba mais sobre essa tendência
Por Sérgio Vieira
O
“Até muito
recentemente,
cada oncologista
tratava seus
pacientes idosos
com base em sua
experiência. E o
geriatra não se envolvia em absoluto
no tratamento do
câncer. Isso
começa a mudar.”
12
outubro/novembro 2011 Onco&
BRASIL ESTÁ ENVELHECENDO. E BEM RÁPIDO.
DADOS DO INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA (IBGE) MOSTRAM QUE,
em uma década, a expectativa de vida da população
cresceu quase três anos. Hoje, o tempo médio de
vida dos cidadãos é de 73 anos, e o mais recente
censo do órgão, realizado no ano passado, mostra
que a população idosa no país está em franco
crescimento: dos 190 milhões de habitantes, 14 milhões têm 65 anos ou mais, o que representa 7,4%
do total. Em duas décadas, estima-se que os idosos
representem mais de 30 milhões de brasileiros. O
Brasil se encontra diante de uma população mais
madura, experiente e ainda produtiva.
Mas a longevidade tem seu preço. Viver mais
significa ter mais tempo não só para fazer aquela
viagem de volta ao mundo ou abrir a tão sonhada
pousada, mas também para desenvolver doenças.
No Brasil, essa análise vem se mostrando cada vez
mais verdadeira. Segundo dados do Instituto Nacional de Câncer (INCA), é exatamente a parcela
mais velha da população a mais atingida pelo
câncer. Estima-se que 60% dos pacientes oncológicos no país tenham 65 anos ou mais e que 70% das
mortes decorrentes da doença ocorram nessa fase
da vida. Seria de se esperar que essa população
fosse estudada mais de perto e recebesse um atendimento adequado às limitações da idade. Infelizmente, essa ainda não é a realidade no Brasil.
Tecnologia, abordagens, equipes médicas e conceitos de tratamento ignoram esse público.
Já há sinais, no entanto, que apontam para mu-
danças na forma como o assunto é abordado. Há
não mais do que cinco anos foi cunhado o termo
oncogeriatria, uma espécie de junção informal da
oncologia com a geriatria. O objetivo? Criar um
profissional preparado para transitar bem nas duas
áreas e, portanto, mais equipado para compreender
e tratar o câncer do paciente idoso, com todas as
exigências e limitações que lhe são inerentes.
O que move a criação dessa “quase” especialidade médica é a possibilidade cada vez mais real de
o paciente de câncer idoso viver por mais tempo,
de forma digna. “Quase” porque, formalmente, o
oncogeriatra não existe: existe o oncologista com
especialização em geriatria e vice-versa. Não se sabe
ao certo o número de profissionais médicos que
trafegam nessas duas vias – sabe-se, no entanto, que
se trata de um número bem inferior ao que seria
necessário para atender a demanda.
O Brasil não foi o único a descobrir apenas
recentemente a importância e o impacto dessa atuação conjunta. O surgimento do conceito da multidisciplinaridade voltada aos pacientes 65+ não tem
mais de uma década. A diferença é a velocidade com
que essa subespecialidade vem se desenvolvendo
fora daqui. Países como Estados Unidos, Bélgica e
França caminham a todo vapor para o crescimento
constante da oncogeriatria e já são considerados
referências mundiais na área. Na 47a edição do congresso da American Society of Clinical Oncology
(ASCO), realizado em junho, em Chicago, o tema
dominou inúmeros debates, envolvendo profissionais do mundo todo. A conclusão? Falta atenção es-
pecífica para os idosos com câncer, e a classe médica, principalmente
em oncologia, precisa olhar com mais atenção para essa população.
Oncogeriatria no Brasil
No Brasil, a oncogeriatria aos poucos ganha força e adeptos. Para
Rafael Kaliks, oncologista clínico do Hospital Israelita Albert Einstein,
o próprio envelhecimento da população e o consequente aumento na
incidência de câncer no país são razões para isso.
“Paralelamente, a medicina está avançando e, com isso, mais casos
da doença são diagnosticados. Ocorre que o geriatra não tem em seu
currículo de treinamento nenhuma ênfase em oncologia, e oncologistas
não têm conhecimento sobre a fisiologia do envelhecimento, ou sobre
particularidades do câncer no idoso. Então, até muito recentemente,
cada oncologista tratava seus pacientes idosos com base em sua experiência. E o geriatra não se envolvia em absoluto no tratamento do
câncer. Isso começa a mudar. Não só há cada vez mais estudos de oncologia especificamente abordando pacientes idosos com câncer, como
há uma tentativa de incorporar no processo decisório ferramentas já
conhecidas pelos geriatras e que podem ajudar a determinar o curso
ideal do tratamento”, analisa o médico.
Há quem argumente que esse tipo de conscientização deve
começar bem antes, enquanto o médico está em formação. O tema,
no entanto, ainda está distante das salas de aula, que é exatamente
onde os futuros médicos recebem a primeira orientação sobre os caminhos das especialidades – não há disciplina que trate especificamente
da oncogeriatria e as residências não promovem o encontro entre as
matérias. O que ocorre, portanto, é um hiato entre o que pensam os
profissionais e o que de fato ocorre no início do aprendizado.
“Seria fundamental que o residente em oncologia passasse pela área
de geriatria e vice-versa. Além disso, a oncologia precisa seguir o
mesmo ritmo de crescimento da geriatria. Um precisa conhecer o trabalho do outro para que o resultado no tratamento do paciente seja
satisfatório”, diz Theodora Karnakis, representante nacional da Sociedade Internacional de Oncogeriatria (SIOG), responsável pelo programa de geriatria do Hospital Israelita Albert Einstein e colaboradora
do serviço de geriatria e programa de oncogeriatria da Faculdade de
Medicina da Universidade de São Paulo. “Os cursos universitários nas
áreas de saúde e direito necessitam implementar como grade curricular
temas específicos para a assistência ao idoso. A sociedade não está
preparada para receber essa população.”
O resultado dessa deficiência se faz sentir no atendimento de idosos
com câncer em todo o país. “Infelizmente, o atendimento ao idoso
ainda está aquém do que se pode oferecer. A avaliação adequada dessa
população requer a formação de equipes múlti e interdisciplinares,
compostas por oncologistas, geriatras, enfermeiros, fisioterapeutas, assistentes sociais, psicólogos, fonoaudiólogos, entre outros, que consigam abordar o idoso globalmente avaliando sua funcionalidade,
capacidade cognitiva, comorbidades, risco nutricional e suporte social.
Esse tipo de avaliação é fundamental para definir o tratamento oncológico a ser proposto”, avalia Theodora.
A geriatra reconhece que a carência de especialistas nessa área se
deve basicamente à dificuldade de se montar equipes integradas, em
que todos conversem entre si. “Para mudarmos essa realidade é fundamental que os grandes centros de oncologia estruturem suas equipes
na abordagem do idoso”, explica.
Para Auro Del Giglio, professor titular de oncologia e hematologia
da Faculdade de Medicina da Fundação ABC,
a oncogeriatria permite que se desenvolva,
entre outras habilidades, o bom senso no
cuidado com o idoso. “Ele depende de uma
boa interação entre o oncologista e o geriatra.
É importante que se faça uma avaliação ampla
do paciente antes do diagnóstico, por isso a
necessidade de uma equipe multidisciplinar”,
diz. E, nesse sentido, Del Giglio já dá uma boa
notícia: até o fim do ano, a faculdade em que
leciona inaugurará o setor de oncogeriatria,
um dos primeiros do país.
Pouco estudados
É inegável, portanto, que existem interesse e
disposição para se chegar a um denominador
comum no tratamento ideal de idosos com
câncer, sob a óptica de junção de disciplinas.
Um dos empecilhos, no entanto, para que a
Onco& outubro/novembro 2011
13
oncogeriatria seja de fato abraçada é um conhecimento mais profundo
da população que pretende atender.
Essa falta de familiaridade com o público idoso com câncer vem,
em parte, de um problema já identificado, mas ainda não resolvido na
subespecialidade: a baixa participação de idosos em estudos clínicos
de câncer. Ora, se há a preocupação em buscar a melhora no atendimento e os idosos estão cada vez mais conscientes de que uma vida
mais longa também deve vir acompanhada de mais saúde, por que não
há estudos clínicos específicos para essa população, dificultando não
apenas o melhor conhecimento desse público mas também o desenvolvimento de novas drogas?
Theodora sintetiza: “A população idosa é bastante heterogênea. Entre
os indivíduos acima de 70 anos temos tanto os funcionalmente independentes, que não fazem uso de nenhuma medicação, quanto os que usam
mais de dez remédios por dia. Logo, a inclusão desses pacientes em estudos clínicos requer monitoramento e abordagem específicos, aos quais
os trials desenhados para a população jovem não conseguem se adequar”.
Kaliks vai na mesma linha: “Quando se desenvolve uma droga
nova e se quer testá-la, é preciso realizar o estudo em uma população
relativamente homogênea, de preferência com baixo risco de ter complicações e com pouca probabilidade de interferência com outras medicações. Assim, os estudos acabam selecionando pacientes com
câncer, mas que idealmente são saudáveis apesar da doença. Isso automaticamente exclui os idosos. No mundo real, porém, idosos são a
maioria dos pacientes com câncer. Uma vez que a medicação nova se
torna efetiva em uma população sem outras variáveis, aí sim iniciamse estudos para avaliar sua eficácia e segurança em populações mais
velhas, com outras doenças. Portanto, a oncogeriatria fica atrasada em
vários anos em relação aos avanços dos pacientes jovens”.
Quando parar?
Ao desconhecimento da população se somam
outros desafios aos oncogeriatras, como as
taxas de sucesso extremamente baixas se
comparadas às de pacientes mais jovens.
“Para uma paciente com câncer de
mama, por exemplo, a mulher jovem normalmente passa por uma cirurgia sem
grande preocupação com os riscos de uma
anestesia geral. Na mulher acima de 70 anos,
não é raro que o risco cirúrgico seja excessivo. Há casos em que a cirurgia tem de ser
realizada com anestesia local, o que certamente limita a operação. Do ponto de vista
de tolerância à quimioterapia, raras são as
mulheres de 40 anos que não podem receber potencialmente qualquer químio agressiva. O mesmo não é verdade em mulheres
14
outubro/novembro 2011 Onco&
acima de 70, para as quais temos de pesar com extremo cuidado se o
potencial benéfico não implica riscos consideráveis. Mas vale dizer que
há idosas extremamente saudáveis e que podem receber o mesmo tratamento das mais jovens; há outras que não. O segredo na oncogeriatria
é como avaliar de maneira fidedigna qual sim e qual não”, argumenta
Kaliks, do Einstein.
Mas esse talvez não seja o ponto crucial no atendimento da população idosa. Há uma questão, inevitável, que envolve o custo-benefício
e o duro exercício de decidir até que momento o paciente idoso deve
continuar sendo rastreado e tratado para câncer. Difícil, mas importante momento, porque não se discute aqui apenas a questão ética
profissional, mas o sentimento individual de tomar a decisão de parar
com as ações para prolongar a vida do paciente idoso.
“O rastreamento deve cessar quando a probabilidade de ocorrer um
câncer já diminuiu muito ou quando a expectativa de vida é relativamente limitada, que é menor de dez anos para câncer de próstata em
homens e menor que cinco para câncer de mama em mulheres. Não é
a idade cronológica que deve determinar a interrupção do rastreamento,
e sim a expectativa de vida do paciente, aliado ao risco real de incidência
da neoplasia”, diz Kaliks. “Do ponto de vista de políticas públicas de
rastreamento e tratamento, a discussão é mais difícil, e deveria envolver
uma ampla reflexão sobre qual parâmetro usar para interromper o uso
de recursos públicos na prevenção e no tratamento, pois o fato de conseguirmos manter vivo alguém com idade avançada, com doença incurável e que causa sofrimento não significa necessariamente que
devemos fazê-lo. Mas estabelecer o limite não é fácil.”
Theodora acrescenta a questão da decisão solitária – por mais que
se faça parte de uma equipe multidisciplinar – na hora de mandar
parar o rastreamento e o tratamento. “O rastreamento de neoplasias segue princípios de custo-efetividade. É natural que, em se tratando de
população idosa, a própria expectativa de vida deva
ser levada em conta ao se adaptar diretrizes da população mais jovem. Entre os questionamentos
estão quando devemos deixar de fazer determinado
rastreamento e se devemos, de fato, instituir diretrizes para toda a faixa etária mais avançada, de
forma homogênea”, pondera. “É amplamente aceito
o conceito de se individualizar a decisão do rastreamento oncológico na população idosa, considerando o conjunto da saúde do indivíduo como um
todo, sua expectativa de vida e seus valores.”
Del Giglio complementa, analisando justamente
a questão do tempo de vida. “É preciso levar em conta
que um cidadão bem idoso já está próximo de completar seu ciclo de vida – bem diferente de alguém
com câncer na faixa dos 30 anos, por exemplo. Não
há como fugir do fato de que o tempo dedicado ao
rastreamento tem de estar condicionado à expectativa
de vida da pessoa”, diz o professor da Fundação ABC.
Embora seja vista como uma desvantagem, pelo
menos em uma ocasião a idade pode ser considerada
algo favorável: na hora de dar a notícia sobre o câncer.
“Costuma ser mais fácil do que com um paciente
jovem, a não ser quando a família quer blindá-lo do
diagnóstico”, conta Kaliks. “Esse preparo que o idoso
tem facilita a conversa. Em casos em que familiares
não querem que ele saiba o diagnóstico, o próprio
1o Simpósio Internacional
de Oncogeriatria
Para tentar avançar nessa discussão, será realizado em novembro, no Hospital Israelita Albert Einstein, o 1o Simpósio Internacional de
Oncogeriatria, que reunirá os principais nomes
do Brasil e do exterior.
“Esse simpósio é um marco na oncogeriatria
do país, por ser o primeiro a abordar o tema e
também por trazer os melhores especialistas
que atuam tanto na área de geriatria e gerontologia como na de oncologia. Eles discutirão
temas sobre os quais ainda não há consenso na
literatura”, diz Theodora Karnakis, responsável
idoso finge não saber para poupar seus parentes.
Cabe ao médico tentar fazer uma ponte para que
ocorra uma conversa aberta entre todos.”
Perspectivas
Mesmo com tantos desafios, Kaliks é otimista quanto
ao futuro da oncogeriatria brasileira. “A perspectiva
é boa. Existe a consciência da necessidade de o oncologista ter um maior conhecimento do idoso e de
suas particularidades. Estamos trazendo para mais
perto o geriatra e entendendo que tratamento oncológico não significa piora da qualidade de vida ou
desrespeito com a dignidade”, explica.
Para o oncologista, a oncogeriatria não deve se
limitar a ferramentas de mera avaliação e estratificação de idosos para permitir que eles entrem, homogeneamente, em estudos clínicos. É preciso mais
do que isso: que ela seja uma área de conhecimento
sobre fisiologia do envelhecimento e do câncer.
“Devemos promover uma aproximação maior
entre o trabalho do oncologista que cuida do
câncer do paciente idoso e do geriatra que cuida
do paciente que também tem um câncer. A ação
deles deve ser conjunta”, diz. “Vale lembrar que
todos nós, sem exceção, temos ou teremos um avô,
pai ou irmão mais velho que terá câncer em algum
momento da vida. Devemos nos perguntar se o
melhor para esse parente não seria uma ação integrada entre o geriatra e o oncologista. A resposta
certamente será sim.”
“Devemos promover
uma aproximação
maior entre o
trabalho do
oncologista que
cuida do câncer do
paciente idoso e do
geriatra que cuida
do paciente que
também tem um
câncer. A ação
deles deve ser
conjunta.”
pelo programa de geriatria do Hospital Israelita
Albert Einstein. Uma das idealizadoras do
evento, a geriatra lançará no congresso o livro
Oncogeriatria, Uma Abordagem Multidisciplinar,
cuja organização coordenou.
É em eventos desse porte que é possível
mensurar a capacidade do profissional brasileiro em se adequar ao novo momento da
oncologia. Para Rafael Kaliks, o cenário da
oncogeriatria tem tudo para crescer. O primeiro
passo? “A conscientização de que a parceria
entre as duas especialidades é um caminho sem
volta. Não há mais como desassociar as áreas
quando o assunto é tratar de um paciente idoso
com câncer”, diz.
Onco& outubro/novembro 2011
15
ginecologia
Atualização em screening
e epidemiologia do
câncer ginecológico
N
ESTE TÓPICO SERÃO ABORDADOS OS ARTIGOS
MAIS RELEVANTES NO SCREENING E EPIDEMIOLOGIA DO CÂNCER GINECOLÓGICO EM GERAL
publicados em 2010 e 2011. Os artigos selecionados englobam os cânceres de vulva, colo, endométrio e ovário.
Divulgação
Tumores ginecológicos em geral
José Carlos Sadalla
* Doutor em Ciências pela Faculdade
de Medicina da USP; assistente do
Instituto do Câncer do Estado de
São Paulo – ICESP/FMUSP;
membro do Núcleo de Mastologia do
Hospital Sírio-Libanês
Contato: [email protected]
16
Para começar, temos o trabalho de Hjartåker e colegas1 avaliando a relação de álcool e tumores. Tratase de análise de estudos de coorte e caso-controle
publicados até 31/03/09. A premissa é de que o consumo de álcool aumenta o risco de câncer de colo,
vagina e vulva. Entretanto, o resultado desse estudo
não mostrou associação de consumo de álcool com
aumento no risco de câncer ginecológico.
Yu e colegas2 investigaram o consumo de café e a
associação desse hábito com câncer em geral. Foi uma
metanálise de 40 estudos, englobando estudos de
coorte prospectivos que avaliaram risco relativo (RR)
com intervalo de confiança de 95% (IC=95%). O objetivo do estudo foi avaliar o risco de câncer com consumo de uma xícara de café por dia. Como resultado,
o consumo de uma xícara de café por dia promoveu
redução global de 3% na incidência de câncer
(RR, 0.97; 95% CI, 0.96-0.98). Na análise de subgrupo, os cânceres que apresentaram diminuição
foram de bexiga, orofaringe, colorretal, esôfago, fígado, pâncreas, próstata, leucemia. Na esfera
ginecológica, a redução se deu nos cânceres de mama
e endométrio. Ou seja, como mensagem do trabalho:
tome uma xícara de café por dia.
Finalmente, temos o trabalho de Cibula e colegas3 avaliando a contracepção hormonal e o risco
de câncer. Os autores colocam que um dos motivos
da não aceitação e da descontinuidade do uso dos
métodos contraceptivos hormonais é o medo de
câncer (“cancerofobia”). Sendo assim, realizaram revisão de estudos coorte e caso-controle publicados
na base de dados PUBMED e EMBASE até 12/2008.
outubro/novembro 2011 Onco&
Os resultados foram:
• Câncer de mama: discreto aumento na incidência,
desaparecendo de 5 a 10 anos após a interrupção
do uso da medicação.
• Câncer de ovário: diminuição da incidência. Essa
proteção aumenta com os anos de uso (o risco relativo diminui 20% a cada 5 anos de uso). Diminui
inclusive em pacientes com mutação nos genes
BRCA 1 e 2.
• Câncer de endométrio: diminui 50% a incidência
nas usuárias. Essa proteção também aumenta com
a duração de uso dos contraceptivos.
• Câncer de colo uterino: discreto aumento em
usuárias de longa data (mais de 5 anos).
Também houve aumento nos tumores benignos
do fígado (aumento moderado) e no câncer de fígado (aumento discreto).
Os autores salientam que nenhum estudo
mostrou maior incidência global de câncer ou de
mortalidade nas usuárias de contracepção hormonal. Ou seja, é desnecessária a cancerofobia nas
usuárias de métodos contraceptivos hormonais.
Mais ainda, esses métodos devem ser recomendados a portadoras de mutação nos genes BRCA 1 e
2 como quimioprevenção.
Câncer de colo uterino
Há vários trabalhos relatando screening com captura
híbrida, em vez da citologia. Seleciono o de Zhao e
colegas4 pela grande casuística. O objetivo principal
do trabalho foi avaliar a acurácia dos métodos de
DNA HPV, citologia base líquida (CBL) e IVA (inspeção visual com ácido acético) para detecção de neoplasia intraepitelial grau 3 (NIC 3) e câncer invasivo.
Num total de 30.371 mulheres rastreadas, 1.523
foram excluídas. Os critérios de exclusão foram pacientes gestantes, com história prévia de NIC ou
câncer e radioterapia pélvica. As respectivas sensibi lidades e especificidades foram: 97,5% e 85,1%
(DNA HPV); 87,9% e 94,7% (CBL); e 54,6% e 89,9%
(IVA). Como mensagem do trabalho, temos que DNA HPV pode ser
benéfico para futuros programas de rastreamento.
Outro trabalho interessante, para não dizer inusitado, é o de Chu e
colegas5. É relatado que ducha vaginal pós-coito é comum mundialmente.
Entretanto, seu efeito na LSIL (lesão intraepitelial escamosa de baixo grau)
é incerto. Para avaliar isso, foi criada uma coorte prospectiva, com 1.332
pacientes. Destas, 295 foram diagnosticadas com LSIL, sendo seguidas
trimestralmente com colposcopia. Os parâmetros estudados foram infecção por HPV, higiene pessoal e comportamento sexual. Das pacientes
com LSIL, 15% também apresentavam HSIL (lesão intraepitelial escamosa
de alto grau) quando submetidas a colposcopia/biópsia; e 8% desenvolveram HSIL em um ano. No seguimento de 36 meses, 83% regrediram,
11% evoluíram e 6% permaneceram. O fator de risco e odds ratio obtidos
foram de 4,4 para persistência de HPV e de 3,14 para ducha vaginal. Mais
ainda, esses dois fatores conferiram menor regressão da LSIL (8,0 x 4,1
meses – HPV; e 8,0 x 5,6 – ducha). Como mensagem, temos que a prática
de ducha vaginal pós-coito está associada com não regressão de LSIL.
Câncer de endométrio
Em relação ao screening para câncer de endométrio, temos o trabalho
de Timmermans e colegas6 questionando a espessura do eco endometrial para pacientes com sangramento vaginal pós-menopausa. Foi realizada uma metanálise, com revisão de 90 artigos no MEDLINE,
englobando 2.896 pacientes e 259 casos de câncer de endométrio.
Através de análise de curvas ROC e de regressão logística, os autores
chegaram à conclusão de que o cut-off deveria ser de 3 mm apenas.
Já Jacobs e colegas7 analisaram o screening em pacientes assintomáticas, que não faz parte das orientações atuais. Há um aumento
na incidência de câncer de endométrio, sendo o ultrassom transvaginal
(USG TV) bom método para rastreamento. Não há estudos em grande
escala com USG TV. O objetivo foi detecção de hiperplasia atípica ou
câncer. Foram rastreadas 48.230 mulheres, num follow-up médio de
5,11 anos. O cut-off ideal sugerido é de 5,15 mm, com sensibilidade
de 80,5% e especificidade de 86,2%. Houve 96 casos de hiperplasia
atípica ou câncer em pacientes assintomáticas. Nesses casos, o cut-off
de 5 mm teve sensibilidade de 77,1% e especificidade de 85,8%. Usando regressão logística para grupo de alto risco, temos que o cut-off ideal
Referências bibliográficas
1. Hjartåker A, et al. Alcohol and gynecological cancers: an overview. Eur J
Cancer Prev. 2010 Jan;19(1):1-10. Review.
2. Yu X, et al. Coffee consumption and risk of cancers: a meta-analysis of cohort
studies. BMC Cancer. 2011 Mar 15;11:96.
3. Cibula D, et al. Hormonal contraception and risk of cancer. Hum Reprod
Update. 2010 Nov-Dec;16(6):631-50.
4. Zhao FH, et al. Performance of high-risk human papillomavirus DNA testing
as a primary screen for cervical cancer: a pooled analysis of individual patient
data from 17 population-based studies from China. Lancet Oncol. 2010
Dec:11(12):1160-71.
5. Chu TY, et al. Post-coital vaginal douching is risky for non-regression of
seria de 6,75 mm com sensibilidade de 84,3% e especificidade de
89,9%. Como mensagem, temos que USG TV tem boa sensibilidade
como screening. Custo e falso-positivo são menores no grupo de alto
risco, principalmente obesas e com histórico familiar.
Câncer de ovário
Talvez o trabalho mais importante deste ano em relação ao screening
tenha sido o de Buys e colegas8 investigando o papel do rastreamento no
câncer de ovário. Screening com CA-125 e USG possui efeito incerto na
mortalidade. Sendo assim, foi realizado estudo randomizado controlado,
com 78.216 mulheres de 55 a 74 anos. Criaram-se dois grupos: o de
screening anual (39.105 pacientes) e rotina (sem screening, com 39.111
pacientes). O estudo envolveu dez centros nos EUA entre 11/1993 e
07/2001. No grupo screening foi dosado CA-125 anual por seis anos,
junto com realização de USG anual por quatro anos. O seguimento foi
de até 13 anos, objetivando câncer ou morte (término 28/02/2010), analisando mortalidade de câncer de ovário (incluindo peritônio e tubas),
incidência de câncer de ovário e complicações do screening (procedimentos diagnósticos/terapêuticos). Houve 212 casos de câncer de ovário
no grupo de screening contra 176 no grupo controle (rotina), sendo essa
diferença não significante. Ocorreram 118 mortes por câncer de ovário
no grupo de screening contra 100 no grupo controle (rotina), sendo essa
diferença também não significante. Observaram-se 2.924 mortes por outras causas no grupo de screening contra 2.914 no grupo controle
(rotina), sendo essa diferença também não significante.
Entretanto, houve 3.285 falso-positivos no grupo de screening,
sendo 1.080 pacientes operadas. Destas, 163 tiveram uma complicação
séria (15%), como infecção, perda sanguínea, lesão intestinal, ou eventos
cardiovasculares. Sendo assim, como mensagem, temos que screening
com CA-125 e USG TV não reduz mortalidade de câncer de ovário. Mais
ainda, screening com falso-positivo está associado a complicações.
Finalizando os artigos, trago um sobre a vitamina D, tão em voga
atualmente. Esse trabalho é de Cook e colegas9 e avalia se a suplementação de vitamina D diminui o risco de câncer de ovário. Foi realizada
metanálise de artigos no MEDLINE. Como mensagem, temos que não
há evidências consistentes suportando suplementação de vitamina D
para diminuir incidência de câncer de ovário.
low-grade squamous intraepithelial lesion of the cervix. Gynecol Oncol. 2011
Mar;120(3):449-53.
6. Timmermans A, et al. Endometrial thickness measurement for detecting endometrial cancer in women with postmenopausal bleeding: a systematic review
and meta-analysis. Obstet Gynecol. 2010 Jul;116(1):160-7.
7. Jacobs I, et al. Sensitivity of transvaginal ultrasound screening for endometrial cancer in postmenopausal women: a case-control study within the UKCTOCS cohort. Lancet Oncol. 2011 Jan;12(1):38-48.
8. Buys SS, et al. Effect of screening on ovarian cancer mortality: the Prostate,
Lung, Colorectal and Ovarian (PLCO) Cancer Screening Randomized Controlled Trial. JAMA. 2011 Jun 8;305(22):2295-303.
9. Cook LS, et al. A systematic literature review of vitamin D and ovarian cancer. Am J Obstet Gynecol. 2010 Jul;203(1):70.e1-8.
Onco& outubro/novembro 2011
17
ginecologia
Atualizações em
câncer de ovário
O
CÂNCER DE OVÁRIO NÃO É TÃO FREQUENTE
Divulgação
QUANTO O CÂNCER DE MAMA, O DE COLO DO
Jorge Saad Souen
* Professor associado da Faculdade de
Medicina da Universidade de São Paulo
Contato: [email protected]
18
ÚTERO E O DE ENDOMÉTRIO; PORÉM, OS EPITEliomas, sua forma mais frequente, são os de pior
prognóstico entre essas entidades.
Na Faculdade de Medicina da Universidade de
São Paulo (FMUSP), por exemplo, situava-se em
quarto lugar na prevalência entre os tumores malignos da Clínica Ginecológica (CG); no entanto,
era o mais fatal – entre as portadoras do mal, só
19% sobreviveram mais que cinco anos.
A razão de tão mau prognóstico se deve ao fato
de seu reconhecimento acontecer apenas em fases
tardias da doença. Nos casos citados da FMUSP –
CG, quase 80% dos tumores estavam inseridos em
estádios III e IV, quando as chances de sobrevida
caem drasticamente. Quando a neoplasia é descoberta em estádios iniciais, ou seja, “borderline” e
estádio I, o prognóstico é bem melhor, o que propicia sobrevida, após correto tratamento, de 90%
ou mais. Nessas condições, tumores ditos “borderline” ou de baixo potencial maligno, assim como
no estádio I, é possível realizar cirurgias não radicais em mulheres jovens, proporcionando-lhes a
possibilidade de engravidar mais tarde.
Nas formas mais avançadas, no entanto, o
tratamento é altamente complexo. Isso se deve ao
fato de a progressão da doença ocorrer por disseminação em peritônio livre, causando inúmeros
implantes neoplásicos na superfície peritoneal.
Tais implantes atingem todos os órgãos e tecidos
intra-abominais, inclusive aqueles do abdômen
superior, como fígado, omento, baço, pâncreas,
estômago, alças intestinais, paredes abdominais,
além de linfonodos pélvicos e para-aórticos em
toda a sua extensão. O tratamento é cirúrgico e
quimioterápico, e eventualmente radioterápico e
com hormonioterapia.
Quanto à cirurgia, há nítida correlação entre o
outubro/novembro 2011 Onco&
volume do tumor ressecado, incluindo evidentemente a fonte de origem da neoplasia, ou seja,
ovários e trompas, e a evolução tumoral. Quando a
retirada dos genitais, linfonodos e omento, além de
todos os implantes, for completa, o prognóstico é
razoavelmente bom. Porém, se sobrarem, por impossibilidade técnica de ressecção, massas neoplásicas maiores que 1 cm, o prognóstico piora de
maneira significativa.
O fato de os implantes atingirem órgãos e tecidos importantes dificulta grandemente amplas
ressecções e determina tentativas muitas vezes
frustradas de se atingir o objetivo de diminuir o volume neoplásico. Frequentemente, quando das
cirurgias radicais, há necessidade de ressecções de
órgãos comprometidos, como alças intestinais, o
que obriga a atuação de equipe multidisciplinar e
de cirurgiões altamente especializados. Devido às
considerações, há morbidade importante e evolução muitas vezes tempestuosa.
Os carcinomas de ovário, que são os referidos
tumores malignos de origem epitelial, quase sempre
exigem quimioterapia baseada em platina. Quando
não é possível ressecar otimamente o tumor durante a primeira tentativa, recomenda-se atualmente quimioterapia dita neoadjuvante, ou seja,
tratamento inicial com quimioterápicos. O objetivo
é, após certo número de sessões das drogas,
diminuir o tamanho da massa neoplásica e, numa
segunda tentativa, conseguir o intento de ressecar
otimamente a massa tumoral. Todavia, atingir essa
meta nem sempre é possível. Realmente é mais
provável conseguir a citorredução completa na
primeira tentativa do que na segunda.
Algumas novas tendências procuram melhorar
o prognóstico do carcinoma de ovário, entre elas a
quimioterapia intraperitoneal com ou sem hipertemia associada. No entanto, os resultados desses
recursos ainda não são totalmente conhecidos, além
do fato de a hipertemia associada às drogas quimioterápicas poder
causar uma importante morbidade.
Enfim, a esperança de que o prognóstico dos carcinomas de ovário
melhore repousa na possível descoberta de novas terapêuticas relacionadas à biologia molecular e de terapias-alvo.
Indubitavelmente, o ideal, como em qualquer tumor maligno, seria
a detecção precoce. Porém, contamos com recursos pouco confiáveis
nesse aspecto. A ultrassonografia pélvica e os marcadores tumorais CA
125 e CEA, feitos rotineiramente, não diminuíram a mortalidade da
doença. Os exames periódicos ginecológicos com eventual solicitação
da ultrassonografia podem ser a estratégia que nos resta na tentativa
de detectar precocemente essa insidiosa moléstia.
Referências bibliográficas
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Khonry Cold F., Chias A. S. Recent Surgical Management of Ovarian Cancer. J
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and Survival of Patients Treated for an Advanced Ovarian Cancer: The CARACO
trial. J Gynecol Obstet Biol Reprod (Paris) 2011, May; 40(3): 2010-7.
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Feminina. Eds: Jorge Souen, Jesus P. Carvalho e José Aristodemo Pinotti. Ed
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2. Ang L., Chan KK, Bryant A. et als. Ultra Radical (extensive) Surgery Versus
Standard Surgery for the Primary Cytoreduction of Advanced Epithelial Ovar-
mama
Mastectomia redutora de risco
Divulgação
O
CÂNCER DE MAMA É A NEOPLASIA MAIS PREVA-
BRASIL. SEGUNDO DADOS DO INSTITUTO NACIONAL DE
Câncer (INCA), estima-se que em 2011 serão registrados quase 50 mil novos casos da doença. Há
inúmeras variáveis que contribuem para o risco de
câncer de mama, como idade, questões hereditárias, história pregressa de câncer de mama, lesões
precursoras, fatores endócrinos endógenos e exógenos e fatores ambientais.
A disponibilidade de meios para identificar mulheres de maior risco para desenvolver câncer de
mama, tais como teste genético para rastrear as mutações dos oncogenes BRCA1 e BRCA2 e índices epidemiológicos estatísticos como o modelo de Gail, intensifica a necessidade de definir os riscos e os benefícios de medidas protetoras para essas mulheres.
Os recursos disponíveis atualmente para protegê-las são: screening mamográfico intenso, mudança de estilo de vida (dieta, atividade física),
quimioprevenção (SERMS, IAS) e mastectomia redutora de risco.
LENTE ENTRE MULHERES NO
Mastectomia redutora de risco
Maurício Magalhães Costa
* Mestre e doutor em ginecologia
pela Universidade Federal do
Rio de Janeiro (UFRJ); especialização
em oncologia ginecológica pelo
Instituto Karolinska (Suécia);
responsável pelo setor de
oncologia ginecológica do
Hospital Universitário Clementino
Fraga Filho, da UFRJ; membro
do Conselho Diretor da American
Society of Breast Diseases
Contato: [email protected]
20
outubro/novembro 2011 Onco&
A mastectomia redutora de risco ou profilática é a
remoção cirúrgica de parte do tecido mamário, com
a finalidade de diminuir o risco de desenvolvimento
de câncer de mama. Vale ressaltar que nenhuma técnica de mastectomia pode garantir a remoção total
da glândula mamária, devido à impossibilidade de
se estabelecer os seus reais limites, já que ela apresenta muita intimidade com a pele e prolonga-se
para a axila. Porém, estima-se que a cirurgia proporcione uma redução de 90% do risco – portanto,
quanto mais radical a cirurgia, maior a proteção.
O benefício da cirurgia profilática varia segundo
o risco de desenvolvimento da doença: em mulheres com um risco de 40% durante a vida, a cirurgia profilática adiciona três anos de vida; naquelas
em que o risco é de 85%, esse número sobe para
mais de cinco anos.
A mastectomia profilática pode ser aplicada em
duas situações: mastectomia contralateral sincrônica
ao tratamento do tumor primário e procedimento
bilateral em mulheres de alto risco. Ela é indicada
para mulheres com maior risco de desenvolver
câncer de mama, que pode aumentar na presença
de alguns fatores (Quadros 1,2 3 e 4):
1. História familiar: mulheres com parentes de
primeiro grau que tiveram câncer de mama antes
dos 50 anos, bilateral ou múltiplos parentes com
câncer de mama ou ovário.
2. História pessoal de câncer: mulher que teve um
câncer de mama tem maior risco de desenvolver na
mama contralateral.
3. Presença de mutação genética em genes BRCA1
ou BRCA2.
4. Múltiplas biópsias mamárias com diagnóstico de
lesões precursoras com atipias e principalmente o
carcinoma lobular in situ.
5. Alterações difusas em mamas densas, principalmente microcalcificações, dificultam o seguimento, mas isoladamente não caracterizam indicação cirúrgica.
6. História de irradiação em tórax antes dos 30
anos, principalmente para tratamento de linfoma de
Hodgkin.
É fundamental a seleção individualizada da paciente, com propedêutica por imagem incluindo
mamografia, ultrassonografia mamária e ressonância magnética. Deve ser feita uma avaliação por
equipe multidisciplinar – mastologista, oncologista,
cirurgião plástico, psicólogo e geneticista – para
definir se há indicação para a cirurgia, saber se a paciente está preparada para um eventual resultado
estético insatisfatório, definir a melhor técnica cirúrgica e a melhor opção de reconstrução.
A opção pela cirurgia deve ser feita conjuntamente, e sem pressa, entre paciente, família e equipe
médica. A avaliação psicológica é fundamental e a
cancerofobia é um fator que deve ser avaliado cuidadosamente para não haver precipitação ou abuso de
indicação. Recomenda-se a assinatura de um termo
de consentimento livre e esclarecido.
Quadro 3: Fatores de risco da história familiar
para ser portador de mutação BRCA1 e 2
Mutação BRCA1 e 2 conhecida
Câncer de mama e ovário
Quadro 1: Fatores de risco para câncer de mama
Dois ou mais casos de câncer de mama
com < 50 anos na família
Fator de risco
Risco relativo
Câncer de mama no homem
Idade (>50 anos)
6,5
História familiar
1o grau
2o grau
1,4 - 13,6
1,5 - 1,8
Um ou mais casos de câncer na família
em descendentes de Ashkenazi
Câncer de ovário em descendente de Ashkenazi
Idade menarca (<12 anos)
1,2 - 1,5
Idade menopausa (>55 anos)
1,5 - 2,0
Idade no primeiro parto
(<20 >30)
1,3 - 2,2
Quadro 4: Critérios para ser incluída
em categoria de maior risco
Hiperplasia atípica
4,0 - 4,4
Dois ou mais parentes de primeiro grau com
câncer de mama.
TRH
1,0 - 1,5
“A opção pela
cirurgia deve ser
feita conjuntamente,
e sem pressa, entre
paciente, família
e equipe médica.
A avaliação
psicológica é
fundamental e
a cancerofobia é
um fator que deve
ser avaliado
cuidadosamente."
Um parente de primeiro grau e dois ou mais de
segundo ou terceiro grau com câncer de mama.
Um parente de primeiro grau com câncer de
mama antes dos 45 anos e outro parente
com câncer de mama.
Quadro 2: Mutações genéticas
Estima-se que 5% dos casos de câncer estejam
associados a alterações conhecidas.
A presença dos genes BRCA1 e BRCA2 aumenta
entre 56% e 85% o risco de desenvolver câncer
de mama, ovário, cólon e próstata.
As mutações genéticas estão associadas a
tumores em mulheres mais jovens.
O risco de mutações genéticas na população geral
é de 1/800. Em judeus Ashkenazi, é de 2,3%.
Um parente de primeiro grau com câncer de
mama e um ou mais com câncer de ovário.
Dois parentes de segundo ou terceiro grau
com câncer de mama e um ou mais com
câncer de ovário.
Um parente de segundo ou terceiro grau
com câncer de mama e dois ou mais com
câncer de ovário.
Três ou mais parentes de segundo e terceiro grau
com câncer de mama.
Um parente de primeiro grau com câncer
de mama bilateral.
Onco& outubro/novembro 2011
21
Técnicas de cirurgia
As técnicas de cirurgia consistem em retirada do parênquima glandular
bilateralmente. As cirurgias se classificam em:
1. Mastectomia simples ou total (retira toda a glândula e o CAP);
2. Adenomastectomia preservadora de pele e CAP (retirada da glândula
com preservação do CAP). Essa técnica é a que deixa maior proporção
de tecido mamário residual;
3. Adenomastectomia com preservação da pele (técnica que retira o
máximo de tecido, preserva a pele).
Discute-se a inclusão da identificação e exame do linfonodo sentinela, mas a tendência é de só indicá-la se houver diagnóstico de
câncer de mama, seja infiltrante ou intraductal (Tabela 1).
Tabela 1: Técnicas de incisão
Tipo de incisão
Periareolar
Sulco inframamário
T invertido
Volume
mamário ideal
Pequeno
Pequeno, médio
Médio e grande
Grau de
dificuldade
Grande
Grande polo superior
Menor
Maior risco
Perfurar retalho
Perfurar cauda axilar
Necrose do T
A
B
D
E
Exemplo de mastectomia redutora de risco com: A) incisão em "T" invertido, infra-aureolar; B) retirada de toda
a glândula mamária; C) peça cirúrgica; D) marcação da posição do CAP; E) resultado final após cicatrização
22
outubro/novembro 2011 Onco&
C
Técnicas de reconstrução
A reconstrução pode ser com implantes de silicone, expansores temporários ou definitivos, retalhos dermomusculares de abdômen ou de
grande dorsal. Em alguns casos podem ser utilizados os dois recursos.
O complexo areolopapilar pode ser reconstruído com pele mamária,
tecido da região vulvar ou tatuagem (Tabela 2).
Pré e pós-operatório
No pré-operatório, é importante descrever a cirurgia e mostrar imagens
tanto de bons resultados quanto de outros menos satisfatórios. Além
disso, vale informar a paciente sobre os riscos de complicações e enfa-
tizar as possíveis sequelas como alteração da temperatura, sensibilidade
e forma. Para mulheres tabagistas, reforçar a importância de parar de
fumar para prevenir complicações (Tabela 3).
Embora o índice de mastectomia tenha caído nos últimos anos, cada
vez mais mulheres com câncer de mama unilateral estão optando por ter
as duas mamas removidas. Pesquisadores têm questionado se a mastectomia profilática contralateral tem sido utilizada mais que o necessário.
Em recente estudo conduzido no Memorial Sloan-Kettering Hospital, observou-se um aumento na indicação de mastectomia profilática
contralateral de 6,7% para 24,2% em oito anos. Em estudo genético
Tabela 2: Métodos de reconstrução
Tipo
Vantagens
Desvantagens
Prótese submuscular
Técnica simples.
Procedimento único
Ausência de projeção e ptose;
contratura capsular
Expansor temporário
Melhor projeção.
Ptose.
Sulco bem definido
Enchimento; segundo tempo cirúrgico
Expansor permanente
Procedimento único
Menor projeção. Enchimento
Músculo grande dorsal
Boa definição do
prolongamento axilar
e infraclavicular
Necessita inserção de prótese,
cicatriz no dorso
Músculo reto abdominal
Ótima forma. Não necessita de prótese
Procedimento de longa duração.
Complicações abdominais
Retalhos livres
com microanastomoses
Forma depende do
retalho escolhido
Alta taxa de insucesso. Longa duração.
Equipe multidisciplinar
A
B
Reconstrução mamária com colocação de prótese sob o músculo peitoral. A) preparação do músculo;
B) inserção da prótese; C) resultado estético da cirurgia
24
outubro/novembro 2011 Onco&
C
Tabela 3: Complicações de cirurgia reconstrutora
Precoces (< 6 semanas)
Tardias (> 6 semanas)
Hematoma 11,3%
Necrose 6,2%
Infecção 4,5%
Contratura de cápsula 17,5%
Estética 17,5%
Dog ear 9,1%
Fonte: Heemskerk- Gerritsen et al, Ann Surg Oncol 2007; 14(12) 3335-3344
de 407 mulheres, apenas 13% eram realmente de maior risco para um
segundo câncer de mama. A conclusão da pesquisadora Monica Morrow e de sua equipe é de que a incorporação de ressonância magnética
no diagnóstico tem uma forte associação com o crescimento das taxas
de mastectomias profiláticas contralaterais.
Estudo recente do Journal of National Cancer Institute em março de
2010 demonstrou uma melhora na sobrevida específica de câncer em
cinco anos em mulheres que realizaram a mastectomia profilática contralateral e mulheres jovens com câncer de mama inicial e receptores
hormonais negativos (83,7% vs. 88,5%). Em contraste, mulheres mais
velhas com doenças mais avançadas e receptores hormonais positivos
não demonstraram benefício com o procedimento.
Na reunião da ASCO deste ano, Monica Morrow apresentou um
estudo que demonstrou que o estado mental das pacientes teve
grande influência na decisão cirúrgica. Mulheres com maior ansiedade em relação à recidiva local optaram três vezes mais por cirurgias radicais. Ela questiona se é ético tratar ansiedade com cirurgia e
conclui que são necessários mais estudos prospectivos para responder se a mastectomia contralateral tem real benefício e para que subgrupo de pacientes.
A seguir, outros pontos que devem ser considerados na possibilidade de uma mastectomia redutora de risco:
• Necessidade de cirurgia reconstrutora;
• Efeito da cirurgia na imagem do corpo e sexualidade;
• Irreversibilidade da decisão;
• Esclarecimento que nem todas as mulheres que foram operadas
teriam câncer de mama;
• Cirurgia redutora de risco é uma boa opção para prevenção do câncer
de mama em mulheres de alto risco, mas a eficácia do método e a melhor técnica não estão estabelecidas;
• Mulheres candidatas devem ouvir especialistas e se informar claramente sobre os benefícios e limites da técnica;
• Estudos clínicos demonstraram redução de 90% na incidência e de
81% a 94% no risco de morte por câncer de mama;
• Estudos de satisfação de longo prazo evidenciaram 4% de arrependimento; 44% revelaram que gostariam de ter feito a cirurgia dez anos antes;
• Na Universidade Johns Hopkins apenas 10% das pacientes a quem
a cirurgia foi oferecida aceitaram realizá-la.
Referências bibliográficas:
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3. Morrow, M Contralateral Prophylatic mastectomy Journal of Clinical Oncology in April 2011 (doi: 10.1200/JCO.2010.29.4041) doi: 10.1093/jnci/djq018).
4. Singletary , SE. Techniques in surgery. Therapeutic and prophylactic mastectomy. In: Harris JR, Lippman, ME, Morrow, M, Osborn, CK Editors. Diseases
Considerações finais
• Raras indicações: apenas casos BRCA1+ comprovados
• Técnica: adenectomia. Nos casos de mutação genética, considerar
ooforectomia bilateral
• Idade ideal: cerca de 35 anos
• Mastectomia contralateral apenas em casos de bom prognóstico
• Avaliação pré-operatória com RNM
• Não pesquisar linfonodo sentinela
• Seguimento com USG e exame físico. RM poderá ser empregada
Onco& outubro/novembro 2011
25
oncogenética
Para onde caminha a oncogenética?
– Oportunidades e desafios
O futuro chegou?
T
ALVEZ AINDA NÃO TRATEMOS CADA PESSOA IN-
DIVIDUALMENTE, MAS CERTAMENTE ENORMES
Divulgação
AVANÇOS RECENTES VÊM TORNANDO A MEDICINA
José Cláudio Casali da Rocha
* Doutorado em oncologia, Fundação
Antonio Prudente, São Paulo;
pós-doutor em farmacogenética,
St Jude Children’s Hospital, EUA;
diretor do CGEN – Centro de
Genética, São Paulo; oncogeneticista
da Clínica COI e da Clínica Salus,
Rio de Janeiro; pesquisador do
Hospital Erasto Gaertner, Curitiba.
Autor do livro Oncologia Molecular
Contato: [email protected]
28
baseada na genética uma realidade. Será que nós,
oncologistas clínicos, teremos que nos tornar também oncogeneticistas? A aquisição de conhecimentos nessa área será, sem dúvida, necessária até
mesmo para entendermos o desenho dos novos estudos clínicos. Acredito que vamos direcionar
nosso aprendizado segundo nossas áreas de atuação
clínica e de interesse.
Antecipando a necessidade de formação nas
áreas de oncogenética e biologia molecular, essas
matérias foram incluídas como parte do currículo
mínimo recomendado pela ACCO (ASCO Core
Curriculum Outline), que define pontualmente as
competências mínimas para oncologistas clínicos
em treinamento, sendo a primeira delas: “I. Princípios científicos básicos; incluindo biologia do
câncer e genética, etiologia do câncer, imunologia
tumoral, e epidemiologia”.
A ASCO (American Society of Clinical Oncology), juntamente com a ESMO (European Society for
Medical Oncology), recentemente definiu no documento Global Core Curiculum as habilidades
que devem ser desenvolvidas por oncologistas clínicos, alcançadas em três níveis de conhecimento:
essencial (básico); competência para atuar clinicamente, do diagnóstico clínico/molecular até as condutas de rastreamento e prevenção (médio); e bases
epidemiológicas e biológicas (avançado). Além dos
princípios científicos básicos acima, o currículo
prevê habilidades na área de patologia/medicina
laboratorial/biologia molecular.
O fato é que precisamos nos preparar nas várias
vertentes do conhecimento em oncogenética, já que
(1) o uso de biomarcadores de predisposição ao
outubro/novembro 2011 Onco&
câncer; (2) o diagnóstico e classificação molecular
dos tumores, com implicação prognóstica; (3) a
suscetibilidade do indivíduo aos efeitos do tratamento; e (4) a predição de benefício com o uso de
agentes farmacológicos farão cada vez mais parte de
nossas rotinas.
A herança do câncer esporádico
O reconhecimento de que as variações genéticas
herdadas de nossos ancestrais nos caracterizam
como únicos – não apenas na aparência externa,
mas também na forma como reagimos a estímulos
endógenos, ambientais e genéticos e a suas interações – é o campo explorado pela epidemiologia
molecular. Mesmo nos tumores esporádicos, o
componente genético pode influenciar a carcinogênese no desenvolvimento de subtipos específicos
de tumores, na idade de desenvolvimento e também no seu comportamento biológico. À luz dos
conhecimentos atuais, a etiologia dos tumores, o
risco e as medidas para o controle do câncer devem
ser compreendidos considerando-se o indivíduo e
sua família em seus aspectos regionais.
Câncer hereditário: individualizando
a prevenção e o tratamento
No campo dos tumores hereditários, o nosso nível
de compreensão vem melhorando com o reconhecimento das variações clínicas de síndromes hereditárias conhecidas e a partir da possibilidade de
testagem de mutações genéticas germinativas nos
genes de predisposição ao câncer nos probandos
afetados e nos seus familiares assintomáticos (teste
preditivo). É interessante que, a cada semana, novos
genes sejam associados a síndromes hereditárias e
novas síndromes de predisposição ao câncer sejam
descritas. Pouco ainda se conhece sobre as principais síndromes de câncer hereditário no Brasil, com
séries de casos pequenas ou restritas a uma região. Embora a maioria
das famílias brasileiras com síndromes de câncer hereditário relatadas
até agora desenvolva um padrão sindrômico semelhante ao de outras
populações, algumas variações fenotípicas, mutações genéticas e riscos
de tumores peculiares da população brasileira também têm sido descritos. Estudos futuros devem explorar as características étnicas, clínicas
e genéticas de populações de alto risco, melhorando o cuidado especializado e intradisciplinar e garantindo o direito ao aconselhamento
genético e o acesso aos testes moleculares.
Um dos obstáculos que precisamos superar ainda hoje é o reconhecimento de indivíduos com diagnóstico ou suspeita de câncer
hereditário. A coleta adequada da história familiar de tumores, más-formações congênitas e patologias recorrentes, a representação da estrutura
familiar com a confecção do heredograma (ou árvore genealógica) e sua
interpretação são considerados conhecimentos essenciais. É fundamental
fornecer orientação ao paciente com câncer sobre (1) seus riscos e de
seus familiares, prevenindo sinistros futuros; e (2) os riscos de transmissão à prole e de recorrência. O diagnóstico clínico e molecular, assim
como medidas individualizadas de rastreamento e prevenção, inclusive
cirurgias redutoras de risco, deve ser definido.
Devido à raridade de estudos clínicos e ao baixo poder estatístico
pelo número de participantes nos estudos, os consensos de especialistas guiam muitas dessas condutas. Antes de tudo, é importante que
as recomendações estejam adequadas aos riscos relativos e aos percebidos pelo indivíduo. A experiência prática na área de oncogenética
facilita o reconhecimento das principais síndromes hereditárias no
dia a dia e a referência ao oncogeneticista para o aconselhamento
genético (Figuras 1 e 2).
Câncer de mama
Câncer de ovário
Figura 1 Heredograma de uma família com a síndrome do
câncer de mama e ovário hereditários (HBOC, na sigla em
inglês) associada principalmente com mutações nos genes
BRCA1 e BRCA2 (~20%), mas também com envolvimento
de outros genes ainda pouco explorados, como PTEN,
CHK2, ATM, BRIP1, PALB2, RAD51C, RAD51D, FANC e
CDKN2A, com contribuições <1% cada um
Assinaturas genéticas
O escore de recorrência baseado na assinatura de genes expressos por
tumores vem sendo cada vez mais aplicável na prática clínica. Um
exemplo disso é o painel de 21 genes OncotypeDx, disponível comercialmente para identificar um grupo de mulheres com carcinoma de
mama localizado, receptores hormonais de estrogênio ou progesterona
positivos, com extensão para um a três linfonodos axilares, que não terão
nenhum benefício com quimioterapia, e que derruba o paradigma contemporâneo de que toda paciente com comprometimento axilar deve
receber quimioterapia adjuvante. O uso cada vez maior de painéis de
genes classificadores para predição de resposta ao tratamento e/ou de
resistência tumoral identificará os pacientes que terão grande benefício
de tratamento adjuvante e aqueles com baixo escore, que, consequentemente, poderiam ser poupados dos efeitos adversos do tratamento.
O rápido desenvolvimento de novas tecnologias para análises
genéticas com alta performance e de aplicativos de bioinformática
trouxe para o presente a possibilidade de avaliar genomas de tumores
(Figuras 3 e 4). Uma lacuna de oportunidades existe para explorar o
Figura 2 Via BRCA. As vias de interação das proteínas BRCA1
e BRCA2 com outras proteínas celulares facilitam o conceito
de que mutações de diferentes componentes da mesma via
genética podem causar fenótipos semelhantes
Onco& outubro/novembro 2011
29
imenso abismo que separa o avanço tecnológico e a aplicação prática
dos novos conhecimentos adquiridos.
Biomarcadores moleculares preditores de sensibilidade
O avanço na clínica do uso de biomarcadores vem sendo demonstrado,
entre outras aplicações, para a classificação molecular dos tumores e a
definição do benefício de um tratamento específico. Além da classificação dos tumores por suas características histopatológicas, a expressão
de proteínas (por imuno-histoquímica) e os métodos moleculares (pCR,
sequenciamento, FISH, microarray) trouxeram para o presente a possibilidade do uso rotineiro de detecção de mutações genéticas, amplificações e fusões gênicas dos tumores com relevância clínica.
Um crescente número de agentes terapêuticos direcionados a alvos
específicos nas células tumorais vem sendo desenvolvido, revolucionando a forma como se tratam diferentes tipos de câncer, tendo como
alvo mutações e/ou vias genéticas. Vários estudos demonstraram que
a seleção de pacientes com base em características genéticas presentes
no tumor identifica aqueles indivíduos que mais se beneficiarão do
uso desses agentes. Com a crescente complexidade da rede de interações de vias genéticas e dos mecanismos de escape biológicos dos
tumores, será necessário desenvolver uma forma abrangente de se
compreender o espectro de alterações genéticas distintas do câncer.
Só assim será possível traçar estratégias personalizadas voltadas para
subgrupos de pacientes com maior chance de obter benefício com um
tratamento específico ou combinado (Tabela 1).
Farmacogenética
Figura 3 Mapa genômico de uma linhagem tumoral de câncer
de mama (HCC1954). O gráfico circular representa os resultados
do sequenciamento do exoma da linhagem, onde os segmentos
definidos no contorno representam os cromossomos, e as linhas
que interligam cromossomos representam as fusões intra ou
intercromossômicas
Figura 4 Evolução dos avanços
genômicos ao longo dos últimos
anos. A tecnologia permitiu
a mudança de resolução da análise
genética cromossômica para o
nível de nucleotídeos. Além disso,
o avanço tecnológico também
permitiu aumentarmos o
processamento para as
análises genômicas globais
e o sequenciamento genômico
30
outubro/novembro 2011 Onco&
A variabilidade de resposta dos indivíduos aos medicamentos é a base
dos princípios que suportam a farmacogenética. Enquanto os estudos
clínicos procuram definir a janela terapêutica, e a dose do medicamento
é normalmente baseada na dose máxima tolerada, a farmacogenética
procura adaptar o tratamento com a dose mínima eficaz segundo as características do indivíduo. A variação de resposta tumoral desejada e a
toxicidade tolerada pelos tecidos normais podem ser explicadas por varia-
ções genéticas comuns (polimorfismos) presentes nos genes responsáveis
por absorção, transporte, distribuição, metabolismo (bioativação e inativação) e eliminação dos fármacos, bem como nos genes que regulam as
funções celulares, como o ciclo celular e a capacidade de reparo aos danos
do DNA. As variações genéticas potencialmente modulam a disponibilidade do agente terapêutico nas células normais e tumorais do indivíduo
e têm sido incorporadas à prática clínica, como a genotipagem dos genes
TPMT (metabolismo das tiopurinas); UGT1A1 (irinotecano); DPD, TS,
MTHFR, RFC, entre outros do ciclo do ácido fólico (fluoropirimidinas);
e CYP2D6 (tamoxifeno). O desafio de ajustar as doses e a escolha de
medicamentos com base em análises farmacogenéticas também é uma
perspectiva da medicina personalizada.
Conclusão
Ainda temos muitos desafios pela frente até alcançarmos na prática a
chamada medicina personalizada. Com a perspectiva real de regermos os
cuidados ao paciente com câncer e seus familiares, presenciaremos cada
vez mais mudanças no desenho de estudos clínicos. Devemos aproveitar
para discutir as implicações da medicina personalizada no sistema de
saúde público e privado, bem como os seus aspectos éticos e legais.
Tabela 1: Marcadores genéticos de relevância terapêutica em oncologia
Alteração genética
Gene envolvido
Fenótipo (câncer)
Agente alvo direcionado
Translocação/fusão
BRC-ABL
PML-RARa
EML4-ALK
FIP1L1-PDGFR
LMC
Leucemia promielocítica aguda
Mama, colorretal, pulmão
Leucemia eosinofílica crônica
Imatinibe, dasatinibe, nilotinibe
Ácido retinoico All-trans (ATRA)
Crizotinibe (fase III), foretinibe (fase II)
Imatinibe
Amplificação
EGFR
Pulmão, colorretal, glioblastoma, pâncreas
ErbB2
KIT
SRC
PIK3CA
Mama, ovário
GIST, glioma, hepatocarcinoma, rim, LMC
Sarcoma, LMC, LLA
Mama, ovário, colorretal, endométrio
Cetuximabe, gefitinibe, erlotinibe,
panitumumabe, lapatinibe
Trastuzumabe, lapatinibe
Imatinibe, nilotinibe, sunitinibe, sorafenibe
Dasatinibe
Inibidores PI3-kinase; experimental: LY294002
EGFR
Pulmão, glioblastoma
KIT
PDGFR
BRAF
MET
KRAS
RAS/RAF
PTEN (mTOR)
PI3K/Akt
(mTOR)
PTCH1, SMO
(Hedgehog)
GIST, glioma, hepatocarcinoma, rim, LMC
GIST, glioma, hepatocarcinoma, rim, LMC
Melanoma, astrocitoma pediátrico
Pulmão
Colorretal, pâncreas, estômago, pulmão
Linfoma de células T cutâneo
Câncer de endométrio, próstata, pulmão NSCLC, rim
Câncer de endométrio, próstata, pulmão NSCLC, rim
Cetuximabe, gefitinibe, erlotinibe,
panitumumabe, lapatinibe
Imatinibe, nilotinibe, sunitinibe, sorafenibe
Imatinibe, nilotinibe, sunitinibe, sorafenibe
PLX4032 (fase III)
Cresatinibe (fase III), foretinibe (fase II)
Resistência a erlotinibe, cetuximabe (colorretal)
Selumetinib (fase II)
Ridaforolimo, temsirolimo, everolimo
Ridaforolimo, temsirolimo, everolimo
Carcinoma basocelular
GDC-0449 (vismodegib) (fase II)
VEGF-2578
VEGF-1154
Mama
Mama
Bevacizumabe
Bevacizumabe
Mutação pontual
Genótipo
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Onco& outubro/novembro 2011
31
nutrição
Desnutrição em câncer
Introdução
O
Divulgação
MENTO DO CÂNCER.
Dan Linetzky Waitzberg
* Professor associado do
Departamento de Gastroenterologia
da FMUSP; coordenador do Laboratório de Metabologia e Nutrição
em Cirurgia (Metanutri – LIM 35);
diretor do Grupo de Nutrição
Humana (GANEP)
Letícia De Nardi
* Nutricionista; mestre pelo
Programa de Pós-Graduação em
Gastroenterologia da Faculdade de
Medicina da Universidade de
São Paulo (FMUSP); pesquisadora
do Laboratório de Metabologia e
Nutrição em Cirurgia (Metanutri –
LIM 35 – FMUSP); especialista
em Nutrição Clínica pelo Grupo
de Nutrição Humana (GANEP)
Lilian Mika Horie
* Nutricionista; mestranda pelo
Programa de Pós-Graduação em
Gastroenterologia da FMUSP;
pesquisadora do Laboratório de
Metabologia e Nutrição em Cirurgia
(Metanutri – LIM 35 – FMUSP);
especialista em Nutrição Hospitalar
em Hospital Geral do Instituto
Central do Hospital das Clínicas
da FMUSP
Contato: [email protected]
34
ESTADO NUTRICIONAL INFLUENCIA O TRATA-
outubro/novembro 2011 Onco&
DISTÚRBIOS
DO ESTADO
NUTRICIONAL CONTRIBUEM PARA MAIOR INcidência e gravidade dos efeitos colaterais do tratamento da moléstia cancerosa, aumento do risco de
infecções e redução da sobrevida1. Adiciona-se que
a desnutrição é causa de óbito em 20% a 40% dos
portadores de câncer2.
Alterações do estado nutricional podem estar
presentes já no momento do diagnóstico de moléstias cancerosas. A anorexia está presente em 15% a
25% de todos os doentes com câncer por ocasião
do seu diagnóstico e em quase todos os que apresentam metástase3. O conjunto de anorexia, anemia, perda de peso, massa muscular e gordurosa
leva o paciente a um estado de desnutrição grave,
conhecida por caquexia.
A desnutrição é muito comum no câncer e sua
intensidade varia conforme o tipo e a localização
da neoplasia maligna. Em câncer de cabeça e
pescoço, por exemplo, cerca de 40% dos pacientes se encontram desnutridos antes do diagnóstico e do tratamento4.
No Brasil, a incidência de desnutrição em pacientes com câncer e as suas consequências foram
abordadas em estudo multicêntrico nacional
(IBRANUTRI). Waitzberg e colaboradores (2001)5
analisaram 4 mil pacientes internados pela rede SUS
em hospitais de grandes cidades brasileiras e encontraram desnutrição em 47,6% dos enfermos. Os autores identificaram 794 doentes (19,9%) com câncer
nessa casuística. Ao comparar a incidência de desnutrição entre os pacientes com câncer e os internados
por outras doenças, foi possível averiguar que a
desnutrição é mais frequente na vigência de neoplasia maligna (desnutridos com câncer (66,9%) versus
desnutridos sem câncer (40,7%), p< 0,01).
As consequências da desnutrição são graves e de
alto custo institucional. A presença de desnutrição
se associou a maior mortalidade (31,1% de desnutridos versus 20,6% de nutridos) e morbidade
(14,4% de desnutridos versus 5,9% de nutridos) e
também a maior número de dias de internação hospitalar, que foi de 10±12 dias para os doentes nutridos contra 17±24 dias para os desnutridos5.
A alta frequência de alterações nutricionais e
suas graves consequências para o doente com
câncer justificam esforços para compreender suas
causas e mecanismos, com o intuito de orientar medidas terapêuticas e de suporte.
Na presente publicação pretende-se abordar as
principais alterações metabólicas decorrentes do
câncer para traçar, a seguir, as linhas mestras de terapia nutricional em câncer.
O primeiro passo para instituir a terapia nutricional e buscar atenuar o quadro de desnutrição do
paciente com câncer é a avaliação nutricional. Uma
vez identificado o estado nutricional, iniciam-se o
planejamento e a terapia nutricional, cujos principais objetivos encontram-se na tabela abaixo:
Objetivos da terapia nutricional em câncer
• Prevenir ou corrigir desnutrição
• Favorecer a tolerância ao tratamento
• Reduzir efeitos colaterais e complicações
relacionadas com a nutrição
• Preservar a força e a energia
• Manter a capacidade de reagir à infecção
• Auxiliar na recuperação e na cicatrização
• Manter ou melhorar a qualidade de vida
Repercussões do tumor
maligno no hospedeiro
A partir de um determinado estágio de desenvolvimento e dependendo do tipo de câncer, ocorrem
modificações no organismo hospedeiro em função
da reação contra a presença do câncer ou decorrentes da ação de substâncias produzidas pelo
próprio tumor. De maneira geral, predomina uma
reação do tipo inflamatória, medida por elevação de
hormônios contrarreguladores e citocinas pró-in-
flamatórias, como fator de necrose tumoral (TNF) e interleucinas (IL1, IL-2 e IL-6)6.
Essa reação inflamatória pode ser acompanhada pela maior produção hepática de proteínas de fase aguda, salientando-se como marcador a proteína C reativa, em detrimento da produção hepática de
outras proteínas como a albumina6.
As alterações neuro-hormonais e de citocinas pró-inflamatórias
promovem modificações no metabolismo intermediário, que se
assemelham a resposta metabólica ao trauma e à infecção7. Assim, em
câncer não se encontra resposta metabólica adaptativa ao jejum. Portanto, o organismo vai necessitar de glicose obtida principalmente pela
degradação de proteínas, ao invés de se adaptar através de energia às
custas do tecido adiposo e dos corpos cetônicos8.
Alterações metabólicas no paciente com câncer
A etiologia da desnutrição em câncer é multifatorial e pode ser devida
à anorexia ou à diminuição da ingestão dietética, por fatores mecânicos, perda de ciclos metabólicos fúteis, aumento do gasto energético
mediante alterações metabólicas causadas pelo tumor, efeito adverso
de terapia antineoplásica radical, dor, náusea, vômitos, diarreia, má
absorção e depressão9-11.
A caquexia caracteriza-se por grave depleção do tecido adiposo e
musculoesquelético refletida na progressiva perda de peso corpóreo em
câncer avançado. A perda do tecido adiposo pode atingir 85% da massa
gordurosa total, enquanto a perda de proteínas do musculoesquelético
chega a 75% do total, o que leva o paciente à perda de 30% do peso
corpóreo total. No entanto, a perda de peso a partir do musculoesquelético é provavelmente o fator mais limitante para a sobrevida
dos pacientes oncológicos, devido à diminuição de tecido muscular, que
leva ao comprometimento de funções fisiológicas como diminuição da
função respiratória e aumento da suscetibilidade a infecções6,12,13.
Cerca de 50% de todos os pacientes com câncer apresentam perda
de peso corpóreo, porém a síndrome da caquexia não está presente
em todos os tipos de tumores malignos. Os pacientes com câncer pancreático e gástrico têm perda de peso com grande frequência (83% a
87%), enquanto os pacientes diagnosticados com quadro desfavorável
de linfoma não-Hodgkin, câncer de cólon, próstata e pulmão apresentam perda de peso intermediária (48% a 61%). A perda de peso encontra-se em menor frequência principalmente nos pacientes com
subtipos favoráveis de linfoma não-Hodgkin, câncer de mama,
leucemia aguda não linfocítica e alguns sarcomas (31% a 40%). Isso
se explica porque os tumores capazes de induzir caquexia têm expressão gênica alterada, com produção de fatores modificadores do
metabolismo intermediário, com o intuito de disponibilizar substratos
para rápida proliferação das células neoplásicas6,14.
As principais alterações metabólicas observadas no paciente com
câncer envolvem estímulo da gliconeogênese a partir do lactato, aumento da captação de glicose pelas células tumorais e mobilização das
reservas orgânicas2. Fatores relacionados ao hospedeiro, como liberação de citocinas, aumento do gasto energético e redução da ingestão
alimentar, associados a fatores tumorais que incluem liberação de substâncias catabólicas, priorização dos substratos energéticos e proteicos
para a proliferação celular, podem ainda levar ao desenvolvimento da
caquexia com aumento da mortalidade7.
A sobrevivência das células tumorais depende, em parte, da capacidade de síntese de microcirculação na região tumoral, por meio
de fatores angiogênicos. A progressão tumoral envolve alterações
genéticas: ocorre perda de função dos genes supressores de tumor e
ativação de oncogenes que favorecem a tumorigênese, resultando no
desequilíbrio da proliferação celular.
Células cancerosas são ávidas por glicose e capazes de captar a glicose cerca de 10 a 50 vezes mais em relação às células normais pro ximais ao tumor10. Pacientes com câncer desenvolvem alterações
importantes no metabolismo da glicose, secundárias ao intenso
turnover da glicose corpórea, devido ao uso preferencial desse nutriente como fonte de energia pelas células tumorais14. O ciclo de Cori
consiste na conversão hepática do lactato à glicose com gasto de energia15-17, sendo considerado “ciclo fútil” por ser energeticamente ineficiente para o paciente e por contribuir parcialmente para o aumento
do gasto energético17. Observa-se redução do uso da glicose pelo tecido
muscular, maior utilização tumoral da glicose por via anaeróbica com
aumento da liberação de lactato na circulação sanguínea e consequente
estímulo para o ciclo de Cori, de forma a compensar a acidose
metabólica comum nos pacientes com câncer. No ciclo de Cori, o lactato proveniente da glicólise anaeróbica liberado pelos tecidos extrahepáticos (principalmente músculos) é reciclado no fígado, com alto
custo energético (seis ATPs por ciclo)15,18.
Pacientes oncológicos com acentuada perda de peso apresentam
aumento no turnover de glicerol e ácidos graxos quando comparados
com indivíduos normais ou pacientes oncológicos sem perda de peso.
As concentrações plasmáticas de glicerol apresentam-se elevadas, devido ao aumento da lipólise17.
Os ácidos graxos livres concorrem para aumento em 20% na taxa
de oxidação de gorduras. Em pacientes com câncer não existem evidências da diminuição dos níveis da enzima lipase lipoproteica (LPL)
no tecido adiposo, porém existe aumento de duas vezes dos níveis de
mRNA para lipase hormônio sensível (HSL), o que sugere aumento na
regulação na hidrólise do triacilglicerol17.
A atividade lipolítica também pode ocorrer em pacientes portadores de tumor e ser mediada através do fator de mobilização de lipídios (FML). Essa substância é produzida por alguns tipos de células
tumorais e encontra-se ausente em pessoas saudáveis19. Os ácidos
graxos provenientes de lipólise podem ser utilizados por diferentes
vias, incluindo síntese de energia em ciclos metabólicos fúteis e por
meio de reação de betaoxidação na mitocôndria, síntese de fosfolípides
utilizados na composição de membranas celulares e síntese de
Onco& outubro/novembro 2011
35
eicosanoides que são mediadores inflamatórios, além da produção de
calor no tecido adiposo marrom e musculoesquelético20.
Em diferentes situações de trauma e doença, as perdas de tecido
adiposo na caquexia podem ser mediadas por citocinas pró-inflamatórias, principalmente o fator de necrose tumoral alfa (TNF-α), por
meio da mobilização de ácidos graxos pela inibição da atividade de
lipoproteína lipase. Em tais condições, essa inibição leva ao aumento
da lipólise no tecido adiposo e de ácidos graxos livres no sangue21,22.
Em câncer ocorre predomínio da degradação muscular em relação à
síntese proteica, que está diminuída. Ocorre aumento da proteólise,
em particular das proteínas miofibrilares com maior liberação de
aminoácidos, como alanina e glutamina. As alterações metabólicas observadas no câncer conduzem ao aumento da excreção de nitrogênio
urinário e à presença de balanço nitrogenado negativo23.
Diferentes vias proteolíticas são responsáveis pelo catabolismo do
musculoesquelético. Entre elas, a via ubiquitina dependente de energia
é a principal responsável pela acelerada proteólise em condições de estresse, como jejum, sepse, acidose metabólica, diabetes e durante a
caquexia do câncer. Esse processo ocorre através da ativação de proteínas
intracelulares, que são sinalizadas para a degradação por uma pequena
proteína denominada ubiquitina (processo denominado ubiquitinação).
Ocorre a conjugação da proteína alvo com a ubiquitina, que atua como
sinalizador do substrato para a ação da enzima proteolítica proteasoma
26S. Geralmente, as proteínas ubiquitinadas são degradadas pelo complexo enzimático proteasoma 26S, encontrado no núcleo e no citoplasma celular. Essa via envolve três diferentes etapas dependentes de
energia (ATP), que resultam em maior gasto energético, encontrado em
alguns pacientes que apresentam caquexia do câncer23,24.
O catabolismo do musculoesquelético em pacientes com caquexia
ainda pode estar relacionado à produção de uma glicoproteína sulfa-
tada denominada fator de indução de proteólise (PIF). O PIF foi isolado na urina de pacientes com caquexia do câncer, mas não na urina
de indivíduos normais, pacientes com perda do peso devido a trauma
ou nos pacientes oncológicos com manutenção do peso25,26.
Os pacientes com câncer de pulmão e gastrintestinal com perda de
massa muscular apresentam níveis aumentados de proteína C reativa
(PCR)27. Além disso, associa-se a elevação dos níveis de fibrinogênio aos
pacientes com câncer pancreático com reduzido tempo de sobrevida28.
As citocinas podem ser produzidas pelo hospedeiro em resposta
ao quadro inflamatório ou pelo próprio tumor. As citocinas IL-6, IL-8
e TNF-α induzem a produção de proteínas de fase aguda, que pode
sugerir seu papel na caquexia do câncer6. No entanto, estudos experimentais e clínicos demonstram que a alteração dos níveis de citocinas
pode não se correlacionar com a perda de peso. Espat e colaboradores
(1996) administraram IL-6 durante sete dias em ratos adultos
saudáveis e verificaram aumento nos níveis hepáticos de proteínas de
fase aguda, porém sem alteração de peso29. Entretanto, em outro estudo demonstrou-se que níveis séricos de TNF-α, IL-1, IL-6 e IFN-γ
não se correlacionam com a perda de peso apresentada por pacientes
com câncer avançado ou terminal30.
As alterações do metabolismo intermediário descritas repercutem
em prejuízo do estado nutricional associado a maiores índices de morbidade e mortalidade, com maior risco de infecção, maior tempo de
hospitalização, piora da qualidade de vida, menor resposta a
quimioterapia e radioterapia e maior custo hospitalar9,31-34.
O conhecimento das principais alterações metabólicas observadas
nas células transformadas e suas repercussões clínicas no paciente oncológico têm grande importância para a melhor compreensão do impacto da terapia nutricional sobre a evolução e o prognóstico dos
pacientes com câncer.
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onco-hematologia
Desafios no diagnóstico
de linfoma indolente
Introdução
O
TERMO LINFOMA NÃO-HODGKIN É UTILIZADO
Divulgação
PARA DESIGNAR UM GRUPO DE NEOPLASIAS DO
Alexandre Palladino
Oncologista do INCA; membro do
Grupo de Linfomas do INCA;
onco-hematologista do Centro de
Oncologia da Rede D’or e da clínica
Oncologistas Associados
Contato: [email protected]
Ana Carolina Nobre
* Oncologista da Pesquisa Clínica do
INCA; oncologista do Hospital Geral
da Lagoa; oncologista do Centro de
Oncologia da Rede D’or e da clínica
Oncologistas Associados
Contato: [email protected]
Diogo Rodrigues
* Oncologista do HFAG; oncologista
do Centro de Oncologia da Rede D’or e
da clínica Oncologistas Associados
Contato: [email protected]
38
SISTEMA LINFÁTICO, CONSTITUÍDO POR ENTIdades clínicas específicas que apresentam diferenças
em sua fisiopatologia, histologia, biologia molecular
e curso clínico. Sua origem são células B ou T em
diferentes estágios de maturação.
A Organização Mundial da Saúde (OMS) classifica os linfomas baseados na fisiopatologia e na
origem celular, o que não inclui o termo “linfoma
indolente” e “linfoma agressivo”. Porém, essa designação é amplamente utilizada na prática clínica.
Os linfomas agressivos normalmente se apresentam de forma aguda ou subaguda, com aumento
rápido e importante do volume da doença, presença
de sintomas B (febre, calafrios e perda de peso de >
10% em 6 meses) e elevação de LDH. Exemplos de
linfomas agressivos são os linfomas difusos de
grandes células, linfoma de Burkitt, linfoma/leucemia
de células T do adulto e linfoma linfoblástico.
Os linfomas indolentes representam um grupo
de linfomas de crescimento lento, frequentemente
associados a menos sintomas. É comum se apresentar como doença avançada já na apresentação, com
linfonodomegalias em diferentes cadeias ganglionares, hepatomegalia, esplenomegalia e infiltração
da medula óssea.
Epidemiologia
Os linfomas são a quinta maior causa de morte por
câncer nos Estados Unidos, sendo as neoplasias
hematológicas mais comuns. Representam de 4% a
5% do total de novos casos de câncer, com um
aparente aumento dessa incidência nas últimas décadas. Esse aumento foi observado principalmente
nos casos de linfomas mais agressivos, como os associados à infecção pelo HIV. Os linfomas indolentes respondem por cerca de 40% de todos os
linfomas não-Hodgkin. Enquanto os linfomas de
características mais agressivas costumam acometer
populações mais jovens, os linfomas indolentes ten-
outubro/novembro 2011 Onco&
dem a acometer populações mais idosas.
O subtipo histológico mais comum de linfoma indolente é o linfoma folicular. Outro subtipo com alta
prevalência é a leucemia linfocítica crônica/ linfoma
linfocítico de pequenas células (representam a mesma
patologia, porém com diferença na apresentação
clínica: leucêmica vs. linfomatosa, respectivamente).
Apresentação clínica
A apresentação clínica dos linfomas não-Hodgkin
pode variar conforme o subtipo. A grande maioria
dos pacientes se apresenta com linfadenopatia pe riférica não dolorosa. Aproximadamente 50% dos
pacientes podem desenvolver doença extranodal e
10% a 35% vão se manifestar com doença primária
extranodal desde o diagnóstico.
Na anamnese devemos ter atenção especial ao
curso da doença e seu tempo de evolução, o que
permite avaliar a sua agressividade e ter uma ideia
inicial do possível subtipo de linfoma. Esperamos
uma evolução de meses ou até mesmo anos para
um linfoma indolente.
Alguns pacientes não valorizam um gânglio aumentado pelo curso extremamente arrastado da
doença. Colocações como “este caroço é antigo, já
tenho há alguns anos” não são incomuns. Já pacientes com linfoma agressivo estão claramente
“doentes”, com queixas agudas, sintomas sistêmicos
e queda do estado geral. Entretanto, história de sintomas B pode estar presente em 30% dos pacientes
com LNH indolente durante o curso de sua doença.
Os sintomas B consistem em febre, perda de peso
(> 10% em 6 meses) e sudorese noturna e estão associados a um pior prognóstico. Outros sintomas
sistêmicos relatados são fadiga, mal-estar e prurido
(menos de 10% dos casos). Esses sintomas não possuem correlação prognóstica.
Também deve ser observada a história patológica pregressa do paciente, principalmente no que
diz respeito à presença de patologias e condições
relacionadas ao diagnóstico de linfoma. Nesse grupo
incluímos algumas infecções virais e condições rela-
cionadas a imunodeficiência, como o uso de algumas drogas, infecção de leucemização é vista em 10% dos pacientes com linfoma, principalmente naqueles com doença indolente.
pelo HIV, HTLV1, hepatites B e C e doenças autoimunes.
Fenômenos autoimunes, como anemia hemolítica e PTI, são obA relação entre infecções virais e linfoma é bem conhecida, a
exemplo da correlação entre o vírus Epstein-Barr e alguns subtipos de servados em alguns pacientes, sendo mais frequentes nos linfomas inlinfoma, como Burkitt e doença de Hodgkin. Pacientes imunossupri- dolentes que nos agressivos.
O envolvimento do sistema nervoso central, em meninge ou parênmidos em programas de transplante de órgãos também estão sob risco.
O tratamento prévio de neoplasias deve ser documentado. Alguns quima cerebral, e doença óssea também podem ocorrer, mas costumam ser mais comuns nos linfomas agressivos.
tratamentos antineoplásicos estão associados ao diagnóstico de uma
segunda neoplasia. Além disso, existem algumas associações de outros
tumores e o diagnóstico de linfoma, como a relação de câncer de cólon
Diagnóstico
e do linfoma linfocítico de pequenas células/leucemia linfocítica O diagnóstico de linfoma, dentro de um contexto clínico apropriado,
crônica. Alguns quadros virais se apresentam com febre e linfono- é confirmado pela avaliação histopatológica de um gânglio ou estrutura
domegalias, podendo confundir com o diagnóstico de linfoma, porcomprometida. Também utilizamos a imuno-histoquímica e estudos
tanto é importante arguir quanto à saúde dos contactantes. genéticos que auxiliam tanto no diagnóstico quanto na classificação
Particularmente interessante é a associação da droga hidantoína com do linfoma. O ideal é que o material seja obtido através de uma biópsia
uma rara condição conhecida como pseudolinfoma, o que mostra a
excisional para melhor avaliação de todo o linfonodo. Punções aspiimportância de uma história clínica bem conduzida.
rativas por agulha fina não fornecem material apropriado para o diagHistória familiar de neoplasia é um fator importante, já que o risco
nóstico, e comumente não são recomendadas.
de desenvolver a doença pode ser maior em quem tem casos de linNa avaliação histopatológica observam-se a morfologia das células
foma e outras neoplasias na família.
e o padrão de infiltração linfonodal, que pode ser folicular ou difuso.
Linfonodomegalias periféricas palpáveis ao exame físico estão preA expressão de antígenos celulares permite a classificação do linsentes em boa parte dos pacientes ao diagnóstico – alguns pacientes foma e pode ser feita pela imunofenotipagem ou pela imuno-historelatam que os gânglios aumentam e diminuem espontaneamente, sem
química. A imunofenotipagem é realizada por citometria de fluxo em
qualquer tratamento.
tecido a fresco, como sangue ou medula óssea. A imuno-histoquímica
No exame físico devem ser examinadas todas as cadeias linfáticas, é realizada em tecido fixado ou congelado.
que incluem os anéis de Waldeyer, linfonodos axilares, supraclavicuA imunofenotipagem tem um papel crucial para o diagnóstico e a
lares, cervicais, inguinais e femorais, cadeias occipitais, pré-auriculares, subclassificação da maioria dos LNH. O padrão de expressão dos antíepitrocleares e poplíteas.
genos de diferenciação linfoide na superfície celular é usado para distinO envolvimento de estruturas orbitais é raro, mas pode estar pre- guir entre células B e T e seus vários estágios de maturação (Tabela 1).
sente nos linfomas de células do manto, zona marginal
e sistema nervoso central.
Tabela 1: Marcadores usados na avaliação dos linfócitos por citometria de fluxo
Aproximadamente 20% dos pacientes com LNH
apresentam adenopatia mediastinal. O envolvimento
Marcador
Tipo celular
Comentário
mediastinal pode ocorrer como manifestação isolada,
principalmente no linfoma difuso de grandes células B,
Expressas em todas as células T
CD3
Células T
e em outros tipos celulares
que é um subtipo de linfoma agressivo. Pode ocorrer
síndrome de compressão da veia cava superior.
Predominantes nas células
CD4
Algumas células T
helper/inducer T cells
Pode-se notar o comprometimento de serosa, particularmente a pleura, podendo ser observados achados
Predominantes nas células T citotóxicas,
CD8
Algumas células T
compatíveis com um derrame pleural ao exame físico.
e em um terço da natural killer
O acometimento dos linfonodos abdominais geralCD19 ou CD20
Células B
mente é assintomático, mas eventualmente chama a
Algumas células NK podem não expressar
CD16
Células natural killer
atenção por uma massa palpável ou pelo desconforto
abdominal. A hepatoesplenomegalia difusa é encontrada
Expressas na maioria das células NK
CD56
Células natural killer
com maior frequência nos linfomas indolentes, porém
Expressas na maioria das células NK
CD57
Células natural killer
massas hepáticas são mais comuns em linfomas agressivos.
CD45RA
Células T naives
Os exames laboratoriais podem revelar citopenias,
especialmente quando há comprometimento da meCD45RO
Células de memória T
dula óssea, comum em linfomas indolentes. A presença
Onco& outubro/novembro 2011
39
A análise genética é importante para pesquisa de alterações cromossômicas como translocações, adições e deleções, bem como o
rearranjo de genes específicos. A pesquisa de alterações genéticas pode
ser realizada por técnica de PCR ou FISH. Pode também ser feita pela
pesquisa, através de imuno-histoquímica, da expressão de proteína que
seja produto de determinado gene. Um exemplo é a translocação (14;
18), que leva à hiperexpressão do gene bcl-2 e da proteína BCL-2 em
pacientes com linfoma folicular. A Tabela 2 apresenta uma relação das
translocações mais bem documentadas e das alterações genéticas mais
frequentes nos linfomas indolentes.
sólidos, doenças infecciosas diversas, doenças autoimunes, linfonodomegalias secundárias a infecções localizadas (Tabela 3). Linfomas
que se apresentam fora do sistema linfático podem ser semelhantes a
massas mediastinais, pulmonares ou do sistema nervoso central ou
lesões do trato gastrointestinal, como úlceras.
Tabela 3: Diagnóstico diferencial dos linfomas
Doenças
Tabela 2: Translocações citogenéticas e oncogenes associados
frequentemente nos cânceres linfoides
Doenças
Anormalidades citogenéticas
Características
Doenças hematológicas Doença de Hodgkin, leucemias crônicas
e agudas, mieloma múltiplo, doença
de Castleman
Doenças infecciosas
Virais (HIV, EBV, HBV, HCV), fúngicas
(histoplasmose, paracoccidioidomicose),
tuberculose, DSTs
Oncogene
LLC/Linfoma de
células pequenas
t(14;15) (q32;q13)
ATM
Neoplasias sólidas
Mama, próstata, pulmão, cólon, tireoide,
cabeça e pescoço
Linfoma MALT
t(11:18) (q21;q21)
API12/MLT
Inflamatórias
Linfoma de células
do Manto
t(11:14) (q13;q32)
BCL-1, IgH
Sarcoidose, lúpus eritematoso sistêmico,
doença de Still, síndrome de Sjögren
Pseudolinfoma
Secundário a drogas. Ex.: Hidantal
Linfoma folicular
t(14:18) (q32;q21)
BCL-2, IgH
Linfoma de Burkitt
t(8; -) (q24;q -)
C-MYC
Linfoma difuso de
grandes células
t(3;-) (q27;-)
t(17;-) (p13;-)
BCL-6
P53
Linfoma anaplásico
de células grandes
CD 30+
t(2;5) (p23;q35)
ALK
Linfoma
linfoplasmocitoide
t(9;14) (q13;q32)
PAX-5
A biópsia de medula óssea deve ser realizada em todos os pacientes
como procedimento de estadiamento, já que pode estar infiltrada em
um número apreciável de pacientes. Pode ajudar no diagnóstico, mas
não substitui a biópsia ganglionar, já que o padrão de comprometimento do gânglio auxilia na classificação. O acometimento da medula
óssea está presente em 30% a 50% dos pacientes com LNH, sendo em
18% a 36% dos pacientes com linfomas agressivos e em 40% a 90%
dos pacientes com linfoma indolente.
Diagnóstico diferencial
Dentre os diagnósticos diferenciais, devem-se considerar outros linfomas ou neoplasias hematológicas, metástases linfonodais de tumores
40
outubro/novembro 2011 Onco&
Avaliação inicial e estadiamento
O estadiamento é feito através de avaliação clínica, tomografias e biópsia de medula óssea.
A avaliação clínica deve dar importância à presença de sintomas B
e atenção especial no exame físico das cadeias linfonodais, do fígado
e do baço. Essas informações são importantes no estadiamento.
Além disso, condições que podem interferir na escolha do regime
de tratamento, como cardiopatias, doença renal e hepática, hepatites
crônicas e infecção pelo HIV, devem ser investigadas.
Devem ser solicitados exames laboratoriais, entre eles hemograma
completo, testes da função renal e hepática, incluindo LDH (lactato
desidrogenase), beta 2 microglobulina, testes para HIV, HBV e HCV,
eletrólitos e ácido úrico. Esses exames são importantes na avaliação de
condições clínicas associadas e do prognóstico do paciente.
São solicitadas tomografias computadorizadas com contraste do
pescoço, tórax, abdômen e pelve. O objetivo é analisar cadeias ganglionares não palpáveis em mediastino, retroperitônio e pelve. Os exames de imagem permitem também ter um parâmetro de avaliação
inicial das cadeias palpáveis no exame físico para comparação futura
com exames pós-tratamento e aferir resposta.
O uso de PET-CT é crescente em oncologia, mas sua utilização em
linfomas indolentes traz pouco benefício.
O ecocardiograma pode ser importante se optarmos por protocolo
de quimioterapia que inclua droga cardiotóxica.
A biópsia da medula óssea é essencial para o estadiamento, principalmente pelo fato de observarmos uma alta prevalência de infiltração
medular em pacientes com linfoma indolente.
A partir dos resultados dos exames podemos definir o estádio da
doença, utilizando a classificação de Ann Arbor modificada (Tabela 4).
Tabela 4: Estadiamento dos linfomas de Hodgkin
Estádio I
Acomete uma única cadeia linfonodal
Estádio II
Acomete duas ou mais cadeias
linfonodais localizadas do mesmo
lado (acima ou abaixo) do diafragma
Estádio III
Acomete linfonodos em ambos
os lados do diafragma
Estádio IV
Presença de doença em medula óssea,
fígado, ou doença extranodal difusa
portanto definido como IIBS.
A presença de uma grande massa linfonodal é definida pela letra
X. Um exemplo é um indivíduo com estádio III, sintomas B e grande
massa mediastinal, que será definido como estádio IIIBX.
Tratamento
Os linfomas indolentes geralmente cursam com um comportamento
clínico pouco agressivo. Esse fato, associado a maior prevalência em
populações mais idosas, permite a observação sem tratamento de uma
parcela dos pacientes. Essa opção deve contemplar um acompanhamento regular, avaliando a evolução clínica com cuidado.
Nos pacientes que cursam com um quadro clínico desfavorável e
que são capazes de tolerar o tratamento, deve-se optar pela quimioterapia. Existem algumas drogas com atividade na doença. As mais utilizadas nos diferentes regimes de tratamento são ciclofosfamida,
doxorrubicina, vincristina, fludarabina e clorambucil. Muitos protocolos recebem associação de corticoide, geralmente prednisona. Novas
opções de drogas incluem bortezomibe e everolimo. Pacientes com linfoma de células B devem receber rituximabe, um anticorpo monoclonal
anti-CD20. A monoterapia é uma opção, mas a maioria dos pacientes
tratados recebe poliquimioterapia.
Prognóstico
Outras informações complementam a designação numérica de
I a IV. Os pacientes que apresentam sintomas sistêmicos de febre,
sudorese noturna e perda de peso recebem a letra B, e aqueles que
não apresentam esses sintomas recebem a letra A ao seu estadiamento. Por exemplo, aqueles com estádio II e febre são designados
IIB; e os assintomáticos, IIA.
Pacientes com comprometimento de estrutura extranodal (osso,
pulmão, pele...) recebem a letra E. Exemplo: estádio IIBE.
A presença de doença no baço acrescenta a letra S (de spleen, em
inglês). Um paciente estádio II com sintomas B e doença no baço é
O prognóstico é dependente do tipo histológico e do comportamento da doença.
Entretanto, dentro de cada subtipo de linfoma indolente, alguns
fatores influenciam no prognóstico, como performance status do paciente, idade, número de sítios linfonodais acometidos, valor da hemoglobina, LDH, acometimento extranodal e estádio clínico.
Esses elementos são incorporados em alguns índices de prognóstico que classificam o paciente de acordo com seu risco, como o IPI
(International Prognostic Index) e o FLIPI (Folicular Lymphoma International Prognostic Index).
Referências bibliográficas
4. DeVita, Hellman, and Rosenberg's Cancer: Principles and Practice of Oncology - Eighth Edition p2099-2163.
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http://www.nccn.org/professionals/physician_gls/pdf/nhl.pdf.
6. Non-Hodgkin's lymphoma: a study of the evolution of the disease based
upon 92 autopsied cases. AURisdall R, Hoppe RT, Warnke R. Cancer.
979;44(2):529.
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lymphomas: clinical features of the major histologic subtypes. Non-Hodgkin’s
Lymphoma Classification Project. J Clin Oncol. 1998;16:2780-2795.
1. Clinical presentation and diagnosis of non-Hodgkin lymphoma – Uptodate
2011– Arnold S Freedman, Jonathan W Friedberg, Jon C Aster – www.uptodate.com.
2. Evaluation, staging, and prognosis of non-Hodgkin lymphoma – Uptodate
2011- Arnold S Freedman, Jonathan W Friedberg, Jon C Aster – www.uptodate.com.
3. Classification of the hematopoietic neoplasms – Uptodate 2011 – Arnold S
Freedman, Jonathan W Friedberg, Jon C Aster – www.uptodate.com.
Onco& outubro/novembro 2011
41
emergências oncológicas
Urgências metabólicas
no paciente oncológico
Divulgação
Introdução
O
S PACIENTES COM NEOPLASIAS ESTÃO SUJEITOS
A DESENVOLVER VÁRIAS COMPLICAÇÕES METABÓLICAS QUE REQUEREM IMEDIATA AVALIAÇÃO
Simone Maradei
* Hematologista do Centro
de Tratamento Oncológico
(CENTRON) e do Centro de
Transplante de Medula Óssea
(CEMO) – INCA
Contato: [email protected]
Divulgação
Hipercalcemia
Leonardo Javier Arcuri
* Hematologista do Centro
de Tratamento Oncológico
(CENTRON) e do Centro de
Transplante de Medula Óssea
(CEMO) – INCA
Contato: [email protected]
Daniel Tabak
* Hematologista-oncologista;
diretor médico do Centro de
Tratamento Oncológico (CENTRON);
membro titular da Academia
Nacional de Medicina
Contato: [email protected]
44
e tratamento. Entre as principais situações metabólicas que exigem rápida atenção, encontramos a
hipercalcemia, a hiponatremia e a síndrome de lise
tumoral. Com o aumento da incidência de câncer
na população em geral e com a melhora da terapia
antineoplásica, os pacientes passaram a ter maior
sobrevida e essas emergências ocorrem com mais
frequência. Por isso, os médicos devem ser capazes
de reconhecer prontamente essas condições clínicas
para que o tratamento seja iniciado antes que os
sintomas se agravem.
A hipercalcemia é relativamente comum em pacientes com câncer, ocorrendo em aproximadamente 20% a 30% dos casos durante o curso da
doença. Ocorre em pacientes com tumores sólidos,
bem como nas neoplasias hematológicas.
Os cânceres mais comuns associados com
hipercalcemia são mama, pulmão e mieloma múltiplo. A ocorrência de hipercalcemia no curso de
neoplasias tem um impacto prognóstico desfavorável na grande maioria dos casos. A hipercalcemia nesses pacientes ocorre em virtude do
aumento da reabsorção óssea e da liberação de cálcio dos ossos. Há quatro principais mecanismos
pelos quais isso pode ocorrer: (1) metástases osteolíticas com liberação local de citocinas (incluindo
fatores de ativação dos osteoclastos); (2) tumor que
secreta proteínas relacionadas ao hormônio da
paratireoide (PTHrP); (3) tumor com produção de
1,25-dihidroxivitamina D (calcitriol); e (4) produção ectópica do PTH.
As metástases osteolíticas representam cerca de
20% dos casos de hipercalcemia secundária ao
câncer. A indução de osteólise local por células tu-
outubro/novembro 2011 Onco&
morais é comum em alguns tumores sólidos que
são metastáticos ao osso e no mieloma múltiplo,
sendo menos frequente nos linfomas e na leucemia. O tumor sólido que geralmente produz
hipercalcemia por esse mecanismo é o câncer de
mama. A destruição óssea observada nas metástases osteolíticas é mediada principalmente pelos
osteoclastos e não é um efeito direto das células tumorais. As citocinas como IL-1 e TNF têm uma
participação importante nesse processo, pois aceleram a transformação de precursores de osteoclastos em osteoclastos maduros.
O segundo tipo é a hipercalcemia humoral maligna (HHM), causada pela secreção do PTHrP na
circulação sistêmica pelas células tumorais. É a
causa mais comum de hipercalcemia em pacientes
com tumores sólidos não metastáticos e em alguns
pacientes com linfoma não-Hodgkin. Essa condição
é responsável por até 80% dos pacientes oncológicos com hipercalcemia. Os tumores que mais comumente causam HHM são carcinomas de células
escamosas (pulmão, cabeça e pescoço e colo
uterino), carcinoma renal, de bexiga e endométrio.
O PTHrP tem propriedades hipercalcemiantes
pois atua de forma semelhante ao PTH, aumentando
a reabsorção óssea (maior atividade osteoclástica)
nos rins, promovendo fosfatúria. O PTHrP produzido localmente aumenta a expressão do receptor
ativador do fator nuclear kappa B ligante (RANKL)
no osso. O RANKL contribui para o desenvolvimento de hipercalcemia pela ligação ao receptor ativador do fator nuclear kappa B (RANK) sobre a
superfície de precursores dos osteoclastos. Os resultados da interação RANKL/RANK promovem ativação, migração, diferenciação e fusão de células
hematopoiéticas da linhagem dos osteoclastos para
iniciar o processo de reabsorção. Além disso, citocinas como IL-6, IL-8, IL-1 e VEGF são secretadas por
células do câncer de mama e podem contribuir para
os efeitos do PTHrP na reabsorção óssea.
O terceiro tipo está relacionado ao aumento da produção de 1,25dihidroxivitamina D (calcitriol). Essa é a causa de quase todos os casos
de hipercalcemia em linfoma de Hodgkin e aproximadamente um
terço dos casos de linfoma não-Hodgkin. Também tem sido descrita
em pacientes com disgerminoma de ovário. Em indivíduos normais, a
conversão de 25-hidroxivitamina D (calcidiol) em 1,25-dihidroxivitamina D (calcitriol, o metabólito mais ativo da vitamina D) ocorre
através de uma 1-hidroxilase no rim que está sob o controle fisiológico
do hormônio da paratireoide (PTH). A alta concentração sérica de fosfato pode alterar esse controle. A hipercalcemia deve suprimir a liberação de PTH e, portanto, a produção de 1,25-dihidroxivitamina D
(1,25 D). O aumento da absorção de cálcio no intestino induzida pela
alta concentração sérica de 1,25 D é a anormalidade primária.
O quarto tipo está associado à produção ectópica de PTH (e não
PTH-rp). É uma condição rara, havendo poucos casos descritos na literatura. Alguns tumores como rabdomiossarcoma metastático, carcinoma papilífero de tireoide e carcinoma de pulmão podem ocasionar
hipercalcemia em virtude dessa produção ectópica.
Quadro clínico
Dependendo da severidade e da rapidez de instalação, os pacientes
com hipercalcemia podem apresentar graus variados de sinais e sintomas. Os sintomas da hipercalcemia incluem anorexia, náusea,
vômito, constipação e poliúria. Os sintomas relacionados ao sistema
nervoso central predominam, tais como progressivo declínio da capacidade cognitiva, estupor e coma. As alterações na função renal (incapacidade de concentrar a urina, acarretando poliúria) e no trato
gastrointestinal (anorexia, náuseas e vômitos) corroboram para a
desidratação e agravam a hipercalcemia.
Alterações no aparelho cardiovascular, como hipertensão, bradicardia, encurtamento do intervalo QT, bloqueio AV, assim como
fraqueza muscular, dores ósseas e artralgias, fazem parte do quadro.
Em geral, as complicações neurológicas e renais são proporcionais ao
grau da hipercalcemia.
Diagnóstico
O diagnóstico da hipercalcemia é geralmente feito através da
dosagem do cálcio sérico total. Porém, esse método pode sofrer interferências que levam ao diagnóstico de resultados falso-positivos e
negativos. Na presença de hipoalbuminemia, podemos ter níveis falsamente baixos, e o valor do cálcio deve ser corrigido. Por outro lado,
alguns raros mielomas múltiplos produzem imunoglobulinas ligadoras de cálcio, e teremos cálcio total superestimado. Assim, em alguns
casos seria melhor considerar o cálcio ionizado. Adota-se, atualmente, que a elevação de cálcio até 12 mg/dl corresponde a uma al-
teração leve, cuja avaliação deve ser feita em ambulatório. Níveis de
cálcio plasmático entre 12-14 mg/dl configuram uma elevação moderada de cálcio, e acima de 14 mg/dl correspondem a hipercalcemia
grave, que se associa a um quadro amplo de manifestações clínicas.
Essa situação configura, em geral, uma urgência médica, e o seu
pronto reconhecimento e tratamento implicam em redução acentuada de morbimortalidade.
A dosagem de PTH-rP circulante só é necessária quando a origem
da hipercalcemia não pode ser definida com base nos exames clínicos.
Da mesma forma, a dosagem de 1,25 dihidroxivitamina D terá valor
na presença de linfomas e outros raros tumores que produzem essa vitamina. A radiografia do esqueleto é muito útil nos casos de mieloma,
enquanto a cintigrafia óssea auxiliará na identificação das metástases
nos demais tumores.
Deve-se suspeitar de hipercalcemia humoral em qualquer paciente
com um tumor sólido na ausência de metástases ósseas. E também em
pacientes com hipercalcemia de outra forma inexplicável, que apresentam uma concentração baixa de PTH no soro. Níveis de PTH inapropriadamente normais/altos em um paciente que sabidamente tem
câncer nos remetem à pesquisa de hiperparatireoidismo primário ou
a mais um raro caso em que o PTH é produzido pela neoplasia.
O diagnóstico de hipercalcemia humoral maligna (HHM) pode ser
confirmado ao se demonstrar uma alta concentração sérica de PTHrP.
Essa alta concentração está presente na maioria dos pacientes com tumores sólidos hipercalcêmicos. As concentrações séricas de PTHrP são
baixas (indetectável na maioria dos ensaios) em pacientes com hiperparatiroidismo primário e em indivíduos normais.
Além de sua importância diagnóstica, os níveis séricos de PTHrP
em pacientes com hipercalcemia induzida por tumor podem fornecer
informações sobre o prognóstico. Pacientes com hipercalcemia induzida por PTHrP relacionados ao câncer normalmente têm doença
avançada e um mau prognóstico.
Tratamento
O tratamento definitivo da hipercalcemia em pacientes com neoplasia
requer o tratamento da doença de base e deve ser instituído logo que
possível. Além disso, é necessária a correção da desidratação e dos distúrbios metabólicos. O tratamento baseia-se em:
1. Medidas gerais: Remover o cálcio da alimentação parenteral,
interromper medicamentos que contribuem para a hipercalcemia (suplementação de cálcio e vitamina D, lítio, tiazídicos), além de reduzir
sedativos para melhorar o nível de consciência e favorecer a deambulação, sempre que possível.
2. Hidratação: Os pacientes habitualmente encontram-se
desidratados, pela menor ingestão de alimentos e fluidos causada por
Onco& outubro/novembro 2011
45
anorexia, náuseas e vômitos. A hipercalcemia, por si só, reduz a capacidade tubular renal de reabsorver água por mecanismo mediado
pelos receptores de cálcio, o que agrava ainda mais a hipercalcemia e
a desidratação. Por outro lado, a redução da filtração glomerular reduz
a capacidade renal de excretar cálcio. Assim, a hidratação generosa do
paciente com grandes quantidades de solução salina é uma etapa fundamental do tratamento. Somente após adequada expansão de volume
pode-se associar diurético de alça, como a furosemida, para aumentar
ainda mais a calciúria.
3. Reposição de fosfato: A hipofosfatemia é comum em decorrência do efeito fosfatúrico do PTHrP nas HHM, do uso de diuréticos
de alça, da própria hipercalcemia ou da menor ingestão alimentar. A
reposição de fosfato auxilia a reduzir a reabsorção óssea e, quando
necessária, deve ser feita por sonda nasogástrica A reposição intravenosa (IV) deve ser evitada pelos riscos de insuficiência renal,
hipotensão e hipocalcemia grave.
4. Glicocorticoides: Quando o excesso de 1,25 dihidroxivitamina
D está envolvido na gênese da hipercalcemia, o tratamento pode incluir glicocorticoides para reduzir a absorção intestinal, recomendando-se prednisona 60 mg/dia via oral (VO) por 10 dias ou
hidrocortisona 200 a 300 mg IV durante 3-5 dias.
5. Redução de reabsorção óssea: Combater a osteólise é fundamental, e os bisfosfonatos são os medicamentos mais eficientes para
esse fim, por seu reconhecido efeito apoptótico e antiproliferativo
sobre os osteoclastos. Eles devem ser iniciados tão logo detectada a
hipercalcemia, preferindo-se a via venosa devido à pobre absorção por
VO. Pelo seu potencial nefrotóxico, o zolendronato deve ser evitado
nos pacientes com alteração da função renal. O pamidronato parece
ter menor potencial nefrotóxico, sendo inclusive considerado para uso
em pacientes com disfunção renal (Tabela 1).
No momento, nenhum tratamento específico que inibe a liberação
de PTHrP está disponível. A administração de análogos da vitamina D
pode diminuir a liberação de PTHrP in vitro. Se esses agentes se revelarão eficazes em pacientes, ainda não se sabe. Em casos refratários
pode ser necessário o uso de diálise peritoneal ou hemodiálise.
Hiponatremia
A hiponatremia é a alteração eletrolítica mais frequente na prática
clínica hospitalar e reflete uma alteração do balanço de água, com
consequente diminuição da osmolaridade plasmática. A osmolaridade é o fator determinante da distribuição da água corporal. Em
condições normais, existe um equilíbrio entre a administração de
água (proveniente da ingestão, dos alimentos e do metabolismo) e
a sua excreção (na urina, nas fezes e em perdas insensíveis pela pele
e pelo aparelho respiratório), o que mantém a osmolaridade plasmática dentro de determinados limites. Essa regulação do balanço
de água é mediada por osmorreceptores localizados no hipotálamo,
que na presença de alterações da osmolaridade plasmática determinam modificações na ingestão e na excreção de água. Essas, por sua
vez, são mediadas pelo mecanismo da sede e por alterações na secreção de vasopressina ou hormônio antidiurético (ADH), promovendo a retenção de água livre.
Pacientes com câncer frequentemente sofrem de hiponatremia, e
a fisiopatologia nem sempre é bem compreendida.
A síndrome de secreção inapropriada do hormônio antidiurético
(SIADH) deve ser considerada quando um paciente oncológico se
apresenta com hiponatremia. A SIADH é uma condição clínica caracterizada pela diminuição gradual da natremia, com valores extremamente reduzidos, por vezes de 100 a 110 mmol. Com origem no
hipotálamo, ou ectopicamente em neoplasias, a secreção de ADH
ocorre de forma inapropriada para os estímulos osmóticos e não osmóticos, resultando em retenção de água, diluição de solutos e
aparecimento de hiponatremia e hipo-osmolaridade. Embora a
SIADH possa ser causada por muitas drogas como antidepressivos,
inibidores de enzima conversora de angiotensina e alguns
quimioterápicos, o tumor mais frequentemente associado com essa
síndrome é o carcinoma de pequenas células do pulmão e o adenocarcinoma do pâncreas. Outra causa frequente de hiponatremia em
pacientes com câncer é a presença de edema levando a uma síndrome de diluição. Tal situação clínica pode ser observada na presença de ascite e/ou derrame pleural.
Tabela 1: Bisfosfonatos usados para corrigir hipercalcemia, com dose recomendada
Nome
46
Dose
Diluição
Infusão
Pamidronato
60 – 90 mg
SF ou SG 200 mL
2h
Ácido zoledrônico
4 mg
SF ou SG 50 mL
15 min
Clodronato
300 mg
SF 0,9% 200 mL
1 – 2h
outubro/novembro 2011 Onco&
Quadro clínico
Os sintomas e sinais clínicos vão depender da rapidez com que a
hiponatremia ocorreu. A hiponatremia resulta, quase invariavelmente,
em hipotonicidade do líquido extracelular (LEC), com consequente
fluxo de água em direção ao líquido intracelular (LIC). Com isso, pode
ocorrer edema intracelular, com prejuízo do funcionamento de algumas
células, principalmente as do sistema nervoso central (SNC), onde a
restrição volumétrica exercida pelos ossos do crânio limita a expansão
do parênquima cerebral ocasionada pelo edema. Os achados neurológicos causados pela hiponatremia variam em função da sua gravidade e
também da velocidade de instalação. O tecido nervoso dispõe de
mecanismos capazes de contrabalancear as oscilações da osmolaridade
plasmática, de forma que uma instalação insidiosa da hiponatremia permite que esses mecanismos se instalem causando menos sintomas do
que quando da instalação abrupta. Entre os vários mecanismos destacase a perda de solutos do LIC para compensar a hipotonicidade do meio
externo, de forma a evitar o influxo excessivo da água e, portanto, o
edema cerebral. Os sintomas neurológicos da hiponatremia são inespecíficos, semelhantes a outras encefalopatias metabólicas. Nas formas
leves de hiponatremia (Na > 125 mEq/l), sintomas gerais ocorrem,
como mal-estar e náuseas. Valores de sódio plasmático < 120 mEq/l
cursam com cefaleia e obnubilação. As formas graves de hiponatremia
(Na < 115 mEq/l) costumam induzir coma e convulsões. Mais raramente, manifestações clínicas envolvendo outros sistemas podem ocorrer em função do influxo rápido de água para o LIC, como hemólise
intravascular e microangiopatia.
Tratamento
A escolha da terapia adequada em pacientes com hiponatremia devido a
SIADH varia de acordo com a gravidade da hiponatremia, com a presença
ou ausência de sintomas e, até certo ponto, da osmolaridade urinária.
Entre os pacientes com hiponatremia sintomática grave que se
apresentam com convulsões ou outras anormalidades neurológicas
graves, recomendamos intervenção urgente com solução salina
hipertônica, em vez de outras terapias. Um regime eficaz inicial é de
100 ml de solução salina 3% dado como um bolus IV, o que deve elevar a concentração de sódio no soro por cerca de 1,5 meq/l em homens
e 2,0 meq/l em mulheres, reduzindo assim o grau de edema cerebral.
Se os sintomas neurológicos persistirem ou piorarem, um bolus de
100 ml de solução salina 3% pode ser repetido uma ou duas vezes
mais, em intervalos de dez minutos.
Alguns pacientes apresentam manifestações neurológicas menos
graves, principalmente aqueles com concentração de sódio sérico
abaixo de 120 meq/l, por mais de 48 horas, ou hiponatremia crônica
moderada (sódio sérico 120-129 meq/l). A terapêutica inicial desses
pacientes depende, em parte, da gravidade dos sintomas.
Para pacientes com confusão e letargia, recomenda-se a adminis-
tração inicial da terapia salina hipertônica para elevar o sódio sérico, que
deve ser medido em duas a três horas. A taxa de perfusão subsequente
deve ser ajustada para atingir uma taxa de correção de menos de 10
meq/l em 24 horas e menos de 18 meq/l em 48 horas. Caso haja necessidade de correção rápida, os antagonistas do receptor da vasopressina
podem ser usados. Eles produzem uma diurese seletiva de água, sem
afetar o sódio e a excreção do potássio. O conivaptan (VAPRISOL®) e o
tolvaptano estão disponíveis e aprovados para o uso em pacientes com
hiponatremia secundária a SIADH, porém seu uso é limitado em virtude
da necessidade de internação hospitalar e do alto custo.
Para pacientes que têm apenas sintomas leves, como esquecimento
e distúrbios da marcha, sugerimos terapia inicial com restrição de líquidos e comprimidos orais de sal ao invés de solução salina hipertônica.
A terapia de manutenção em pacientes que inicialmente tinham
hiponatremia sintomática pode prevenir uma subsequente redução do
sódio sérico e recorrência dos sintomas possíveis. Sugerimos restrição
de líquidos a menos de 800 ml/dia. Se o sódio sérico é persistentemente inferior a 130 meq/l, adicionamos comprimidos orais de sal e,
se necessário, um diurético de alça (por exemplo, furosemida 20 mg
por VO, duas vezes por dia) em pacientes com osmolaridade urinária
alta (mais que o dobro do plasma). Entre os pacientes assintomáticos
com SIADH, iniciamos o tratamento com restrição de líquidos. Comprimidos orais de sal podem ser adicionados e depois, se necessário,
um diurético de alça em pacientes com osmolaridade urinária alta.
Síndrome de lise tumoral (SLT)
A síndrome de lise tumoral é caracterizada pela destruição maciça de
células malignas. Embora possa ocorrer de modo espontâneo, a SLT
aparece, em geral, logo após o início do tratamento com agentes
quimioterápicos citotóxicos. Ela acontece quando células neoplásicas
são destruídas e seu conteúdo intracelular – potássio, fósforo e ácidos
nucleicos – é liberado na circulação sanguínea, ultrapassando a capacidade do organismo de excretar essas substâncias. Clinicamente, é
caracterizada por hiperfosfatemia, hipercalemia, hiperuricemia, hipocalcemia e insuficiência renal aguda, frequentemente oligúrica.
O ácido úrico é produzido pelo metabolismo da purina. Ácidos
nucleicos são metabolizados em hipoxantina, xantina e, como produto final, ácido úrico, que é excretado pelos rins. Hiperuricemia,
portanto, ocorre mais frequentemente em doenças de alto índice
proliferativo, e é agravada pela quimioterapia citotóxica. Em excesso, o ácido úrico e a xantina cristalizam nos túbulos renais, sendo
esse um dos principais mecanismos de insuficiência renal na síndrome de lise tumoral. Quanto mais ácida a urina, maior a tendência
de cristalização do ácido úrico. A solubilidade da xantina não depende do pH urinário.
Hiperfosfatemia leva à precipitação de fosfato de cálcio ectópico e
à hipocalcemia, sendo outro importante mecanismo de lesão renal na
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47
síndrome de lise tumoral. Ao contrário do ácido
úrico, o fosfato de cálcio tende a precipitar em meio
alcalino. Além disso, pode ocorrer também precipitação de fosfato de cálcio no sistema de condução
elétrica cardíaco, levando a arritmias. A reposição de
cálcio aumenta o risco de precipitação. A hipocalcemia é, então, secundária à hiperfosfatemia e pode
levar a tetania, arritmias e convulsões.
Diagnóstico e classificação
O diagnóstico é clínico-laboratorial, classicamente
caracterizado por hiperuricemia, hipercalemia, hiperfosfatemia, hipocalemia e insuficiência renal.
A síndrome de lise tumoral é classificada em laboratorial ou clínica:
1. Laboratorial: quando há pelo menos dois dos
seguintes critérios: aumento de ácido úrico, fósforo,
potássio (maior que 25% do valor basal ou do limite
da normalidade) ou queda de cálcio iônico (maior
que 25% do valor basal do limite normalidade);
2. Clínica: quando há também queda do clearance de creatinina (para valores < 60 mL/min, que
pode ser estimado pela equação de Cockroft e Gault
ou, para crianças, pela fórmula de Schwartz), convulsão, hipocalcemia sintomática, arritmia cardíaca
ou morte. A dosagem sérica de creatinina não pode
ser utilizada para diagnóstico ou classificação.
Estratificação de risco e profilaxia
A probabilidade de ocorrer a síndrome de lise tumoral
depende diretamente de quatro fatores: a) agressividade da doença; b) volume tumoral; c) efetividade do
tratamento citotóxico; e d) medidas profiláticas
tomadas. Não se devem subestimar condições clínicas
que contribuam para o desenvolvimento dessa síndrome, como desidratação, insuficiência renal crônica
prévia, oligúria e hipotensão.
Graças a essa multifatoriedade, as incidências relatadas de SLT são extremamente variáveis, mesmo
quando se estratifica por doença ou risco.
Apesar de classicamente associado ao tratamento citotóxico, a lise tumoral pode ocorrer com
doses baixas de corticosteroides e até espontaneamente. Pacientes que já têm níveis altos de ácido
úrico antes do tratamento, ou com critérios laboratoriais de lise tumoral, têm risco aumentado.
No momento, não há dados que permitam
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outubro/novembro 2011 Onco&
Tabela 2: Critérios de Cairo e Bishop para diagnóstico de síndrome de lise tumoral
Lise tumoral laboratorial
Ácido úrico > 8 mg/dL (ou > 25% do valor basal)
Potássio > 6 mEq/L (ou > 25% do valor basal)
Fósforo > 4,5 mg/dL (ou > 25% do valor basal,
ou > 6,5 mg/dL em crianças)
Cálcio < 7,0 mg/dL (ou < 25% do valor basal)
Lise tumoral clínica
Insuficiência renal (ClCr estimado < 60 mL/min)
Arritmia cardíaca
Convulsão
Para diagnóstico de lise tumoral laboratorial, são necessários dois critérios. Quando associado
a qualquer um dos critérios de lise tumoral clínica, faz-se esse diagnóstico.
Fórmulas para estimar clearance de creatinina:
- Cockroft e Gault: [140 – idade (anos)] x peso (kg) x 0,85 (mulheres) x [1/Cr (mg%)] x [1/72]
- Schwartz: 0,55 x altura (cm) x [1/Cr (mg%)]
Tabela 3: Classificação de risco
Alto risco
Linfoma de Burkitt, exceto estágio I totalmente ressecado
Leucemia aguda com contagem leucocitária > 25.000/mm3
ou infiltração maciça de medula óssea ou LDH alto
Risco intermediário
Linfoma de Burkitt totalmente ressecado e sem LDH alto
Leucemia aguda com contagem de leucócitos <
25.000/mm3 e sem LDH alto
Linfoma linfoblástico estágio I – II, sem LDH alto
Linfomas agressivos com LDH alto e alta carga tumoral
Linfoma folicular grau 3B com LDH alto
Tumor germinativo metastático
Neuroblastoma
Câncer de pulmão de pequenas células
Tumor sólido com alta carga tumoral
Leucemia linfocítica crônica tratada com fludarabina
e rituximabe
Mieloma múltiplo com acometimento renal
Pacientes com hiperuricemia, desidratação,
hipotensão ou disfunção renal prévia
Baixo risco
Outros tumores sólidos
Linfoma de Hodgkin
Sem risco
Tumor sólido totalmente ressecado
LDH alto quando > 2 vezes o normal
classificar categoricamente o risco de síndrome de lise tumoral em
pacientes com tumores sólidos ou linfomas, e todas as classificações
de risco esbarram em um certo grau de subjetividade. A classificação
que será apresentada aqui é baseada em dados disponíveis e
opiniões, e deve ser interpretada criticamente.
Profilaxia
O objetivo das medidas profiláticas é aumentar o débito urinário
(>2 mL/kg.min), através de hiper-hidratação (2 – 3 L/m2 de superfície
corporal) e diurético de alça, e redução dos níveis de ácido úrico. Recomendamos que a hiper-hidratação seja feita com soro hipotônico e
que se evite ofertar uma quantidade muito grande de NaCl. A hiperhidratação é a única maneira de reduzir os níveis de fosfato. Vale lembrar que, uma vez instalada, a síndrome de lise tumoral é um quadro
grave com consequências potencialmente fatais.
Há no mercado brasileiro dois agentes para redução de ácido
úrico. O alopurinol, na dose de 300-900 mg/dia por via oral, inibe a
xantina oxidase e reduz o risco de cristalização de ácido úrico. Pode
haver acúmulo de xantina, que, em menor grau, também pode precipitar nos túbulos renais. O efeito máximo da medicação ocorre após
dois dias, que é o tempo que o ácido úrico já existente leva para ser
excretado do organismo. Já a rasburicase é uma enzima que converte
o ácido úrico em alantoína, muito mais solúvel. A redução dos níveis
de ácido úrico ocorre em quatro horas. A dose recomendada é
0,20 mg/kg.dia por cinco dias, por via venosa. Não deve ser utilizada
em pacientes com deficiência de G6PD.
A rasburicase é mais eficaz e reduz mais rapidamente os níveis de
ácido úrico. A única limitação é o custo – por isso é necessário um
uso mais racional, com indicação precisa. Um estudo fase III demonstrou que o uso por três dias, ao invés de cinco, associado a alopurinol
(tratamento sequencial), tem resultados igualmente satisfatórios em
pacientes de alto risco. Há também evidências de que doses menores,
que variam de 0,02 – 0,07 mg/kg, ou fixas entre 3,0 – 7,5 mg, são
igualmente eficazes.
Não há consenso sobre alcalinização da urina. Se, por um lado, ela
reduz a cristalização de ácido úrico, por outro aumenta a precipitação
de fosfato de cálcio. Portanto, não se deve alcalinizar a urina de pacientes com hiperfosfatemia ou que desenvolvem hiperfosfatemia. Os
pacientes de alto risco e grande volume de doença podem, adicionalmente, receber um pré-tratamento quimioterápico em dose baixa para
reduzir o risco de lise tumoral ou alterar o tratamento citotóxico de
modo a torná-lo menos intenso no início. Em alguns protocolos, esse
pré-tratamento já está incluso.
Alto risco
Os pacientes com doenças de alto índice proliferativo e alta sensibilidade a quimioterapia, como linfoma de Burkitt, leucemia linfoblástica aguda e leucemia mieloide aguda, são os de mais alto risco
para desenvolvimento de síndrome de lise tumoral. Nesses pacientes, a carga tumoral, que pode ser estimada pelos níveis de
desidrogenase lática (LDH), contagem leucocitária, tamanho do
tumor e infiltração maciça de medula óssea, é o principal preditor
de desenvolvimento da síndrome.
Pacientes com linfoma de Burkitt, exceto estágio I ressecado, e
com leucemias agudas com contagem de leucócitos > 25.000/mm3,
LDH > 2 vezes o normal ou infiltração maciça de medula óssea devem
ser considerados de alto risco.
Esses pacientes de alto risco devem receber profilaxia intensiva,
que inclui hiper-hidratação e rasburicase. Devem também ser monitorizados com exames laboratoriais (incluindo LDH, ácido úrico,
sódio, potássio, fósforo, cálcio, ureia e creatinina) pelo menos duas
vezes por dia, pelos primeiros três dias. O débito urinário deve ser
monitorizado a cada quatro a seis horas.
Tabela 4: Profilaxia recomendada
Alto risco
Hiper-hidratação
Rasburicase
Monitorização laboratorial, hídrica e clínica
Risco intermediário
Hidratação
Alopurinol
Avaliar internação para monitorização
Baixo risco
Alopurinol
Sem risco
Não é necessária profilaxia
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Risco intermediário
A lise tumoral em tumores sólidos não é um evento frequente. Os tumores com maior risco de desenvolver a SLT são os de alta sensibilidade à quimioterapia, como câncer de pulmão de pequenas células,
neuroblastoma e tumor germinativo metastático. Esses são considerados de risco intermediário. Além disso, grande volume tumoral, especialmente quando há metástases hepáticas, pode ser considerado um
fator de risco para o desenvolvimento da lise.
Surpreendentemente, a mortalidade relacionada à síndrome de lise
tumoral é alta em tumores sólidos, o que reflete o baixo índice de suspeição e o uso de medidas profiláticas menos efetivas.
As neoplasias hematológicas de risco intermediário são os linfomas
agressivos ou com grande carga tumoral e com LDH > 2 vezes o normal.
Exemplos: linfoma anaplásico, linfoma do manto, linfoma difuso de
grandes células B, linfoma folicular 3B, linfoma T periférico. Linfomas
de Burkitt estágio I, ressecado ou com LDH < 2 vezes o normal, e linfomas linfoblásticos estágio I ou II com LDH < 2 vezes o normal também
devem ser considerados de risco intermediário, assim como leucemias
agudas com LDH < 2 vezes o normal e leucócitos < 25.000/mm3.
Pacientes de baixo risco, porém com disfunção ou acometimento
renal (que é frequente em mieloma múltiplo), devem ser classificados
como risco intermediário, bem como as doenças de baixo índice proliferativo que apresentam excelente resposta ao tratamento (como, por
exemplo, leucemia linfocítica crônica tratada com esquemas contendo
fludarabina e rituximabe).
Esses pacientes devem receber profilaxia com alopurinol e
hidratação venosa. A necessidade de internação para monitorização
clínica e laboratorial deve ser avaliada caso a caso.
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Baixo risco
Pacientes com outros tumores sólidos, mieloma múltiplo sem acometimento renal, linfoma de Hodgkin, leucemia linfocítica crônica tratada
com agente alquilante, linfomas cutâneos e linfomas agressivos (excluindo-se linfoma linfoblástico e linfoma de Burkitt) com LDH < 2
vezes o normal são de baixo risco, e a profilaxia deve ser feita apenas
com alopurinol.
Tumores sólidos totalmente ressecados têm risco negligenciável de
lise tumoral e não é necessária profilaxia.
Tratamento
Uma vez desenvolvida, a síndrome de lise tumoral clínica é um quadro
grave e potencialmente fatal. Pacientes com ácido úrico elevado devem
ser tratados com rasburicase. Hiperfosfatemia e hipercalemia devem
ser tratados agressivamente, com diálise se necessário.
O tratamento é, basicamente, de suporte. A hipocalcemia assintomática ou sem repercussão eletrocardiográfica não deve ser tratada.
A reposição de cálcio pode causar precipitação de fosfato de cálcio nos
túbulos renais, piorando ou precipitando a síndrome.
Deve-se suspender a hiper-hidratação, uma vez que ocorre oligúria
não responsiva a diuréticos de alça, e o paciente deve ser avaliado
clínica e laboratorialmente. Não se deve postergar hemodiálise em indivíduos que desenvolvem hipervolemia secundária à síndrome.
do bem
Quem cuida do cuidador?
Seja familiar ou profissional, o cuidador também
precisa de cuidados para exercer bem sua atividade
Por Sergio Azman
Fotos André François
A
MORTE DE IVAN ILITCH É UM TEXTO DO AUTOR
LEON TOLSTÓI, PUBLICADO EM 1886.
NELE, O PERSONAGEM DO TÍTULO É UM JUIZ QUE
adoece e entra em processo de morte. Tolstói se utiliza do olhar do enfermo para nos revelar as angústias e os pensamentos de um paciente nessa situação.
Dependente de auxílio para realizar suas atividades,
integrante de uma família que vive de aparências e
para a qual já é considerado um estorvo, Ilitch se
apoia na figura de Guerássim, um camponês analfabeto que foi chamado para ajudá-lo. Apenas com seu
cuidador ele pode conversar sobre o que realmente
está acontecendo e dividir as transformações e os
pensamentos que a ocasião suscita.
Em determinado momento, Ilitch descobre que
deixar as pernas para o alto, sobre uma almofada,
diminui um pouco sua dor. Ao pedir que Guerássim
levante suas pernas, ele descobre que a dor praticamente desaparece. O que era uma atividade entre tantas torna-se, então, rotina. Guerássim passa a apoiar
as pernas do paciente nos ombros, ato que, além de
despertar uma intimidade quase impossível entre um
juiz e um camponês na Rússia czarista, ameniza a dor
do doente de uma forma que os recursos da medicina
da época não haviam conseguido.
“Acho curiosa essa história porque ela retrata
algo que vemos acontecer. Um bom cuidador contribui muito com a qualidade de vida do doente. Infelizmente o inverso também é verdadeiro. O mau
cuidador, ou a falta de um, atrapalha muito a vida
do doente”, afirma Luana Viscardi, psicóloga do
Programa de Cuidados Paliativos do Hospital
Samaritano, em São Paulo. “Acho que a qualidade
do cuidado que o paciente recebe faz toda a difeRUSSO
“Um bom cuidador
contribui muito com
a qualidade de vida
do doente.
Infelizmente o
inverso também
é verdadeiro”
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outubro/novembro 2011 Onco&
rença. É um dos fatores mais importantes.”
Luciana Holtz, psicóloga e presidente do Instituto
Oncoguia, concorda com Luana sobre a importância
do cuidador: “Ele é fundamental para a qualidade do
tratamento de um paciente. Diante de um câncer, o
paciente tende a se sentir mais sozinho, e o apoio social e familiar são essenciais nesse momento”.
Cuidador é quem cuida
Existem dois tipos de cuidador: o familiar, que é
aquele que passa a fazer esse papel por causa de uma
doença na família; e o profissional, que se prepara
para essa função e é remunerado por isso. Segundo
Luana, existe uma falsa ideia de que o cuidador contratado precisa, necessariamente, ser um profissional
da área da enfermagem. “Há casos e casos. Eventualmente, o paciente pode precisar apenas de cuidados
básicos – alguém que o ajude a se alimentar, a tomar
banho. Claro que existem procedimentos que são
exclusivos dos profissionais da área de enfermagem.
Mas, dependendo da situação, procedimentos mais
complexos também podem ser ensinados, desde que
respeitando as diretrizes e determinações dos respectivos conselhos de classe”, diz.
Idealizador da ImageMágica, organização que
desde 1995 desenvolve iniciativas em promoção de
saúde, cultura e educação por meio da fotografia, o
fotógrafo André François percebeu que havia espaço
para falar sobre uma medicina mais humana. Assim
nasceu a ideia do livro Cuidar – Um Documentário
sobre a Medicina Humanizada no Brasil, publicação
que empresta algumas de suas imagens para esta
matéria. François revela que achou que teria problemas para encontrar bons personagens para o seu pro-
jeto. Que nada. “No hospital, todos conhecem o bom
cuidador e indicam o mesmo profissional pelo trabalho diferente que faz”, conta.
Para ele, o bom cuidador deve ter um bom conhecimento técnico, pois é imprescindível se manter atualizado. Mas o fundamental é entender o que
o paciente tem, saber ouvi-lo, ser acessível. “Os
bons cuidadores são aqueles que conseguem combinar tempo, paciência e carinho para cuidar de
seus pacientes, mesmo em um ambiente hostil
como o hospital. E isso é um desafio para os médicos, pois não é fácil se manter atencioso no dia a
dia de atendimento a tanta gente”, diz.
Apesar da quantidade de gente que atende por
dia, Maria Goretti Maciel, diretora do Serviço de
Cuidados Paliativos do Hospital do Servidor do Estado de São Paulo (HSPE) e do Hospital Samaritano, é dessas pessoas que parecem ter tempo,
paciência e carinho de sobra. Ela diz que a enfermaria de cuidados paliativos do Hospital do Servidor disponibiliza uma cama para o doente e outra
para o cuidador. “O familiar recebe cuidados como
o paciente. Recebe atenção, conversa, ele é cuidado
também. E quando percebemos que o cuidador
pode ter um luto complicado, por exemplo, ficamos de olho, aumentamos a intensidade de
atendimentos de psicologia, e depois da morte também realizamos um acompanhamento.”
Cuidando de quem se ama
Acostumada a cuidar de pacientes, Goretti contou
que também teve uma experiência como cuidadora
em sua família. “Eu tive uma percepção muito diferente quando precisei cuidar do meu pai. Nunca
pensei que fosse tão prazeroso cuidar de quem a
gente ama. É muito difícil, por exemplo, quando
você tem uma relação ambígua, uma mágoa
daquela pessoa. E é preciso ficar antenado quando
existe um cuidador nessa situação. Você tem de
conhecer a história de vida do paciente para poder
entender o problema”, ressalta.
A artista plástica Sueli Bernabé Martini é um
exemplo de quem viveu a experiência do cuidar
com ambiguidade. Filha única, foi a responsável
pelo acompanhamento da mãe, Sueli Martini,
quando ela precisou de cuidados. “Minha mãe
sempre foi muito reservada, o meu relacionamento com ela sempre foi complicado. Ela não era
uma pessoa de abraçar, beijar. E no hospital foi
Imagens do livro Cuidar – Um Documentário sobre a Medicina Humanizada
no Brasil, de André François
Onco& outubro/novembro 2011
53
“Um dos primeiros
sinais da estafa
do cuidador é a
irritação. A pessoa
começa a não ter
muita paciência com
as atitudes, com
o tempo destinado
ao paciente”
um resgate, acho que ela se despiu de tudo isso.
Eu resgatei esse amor que eu sentia por ela, e
tenho a impressão de que ela também sentiu isso.
Porque ela tinha momentos de lucidez, quando a
gente conversava tranquilamente. Acho que para
ela foi bom. Para mim, foi ótimo”, conta, com a
consciência tranquila.
O processo, no entanto, não foi assim tão fácil.
Ela diz que, apesar de ter sido cuidadora em um
ambiente hospitalar, se sentiu muito sozinha em alguns momentos. “No hospital você fica muito sozinho. Os médicos chegam, olham o paciente, e
alguns nem olham na cara do acompanhante. Não
todos, mas a maioria não dá muita atenção. E às
vezes, naquele momento, quem mais está precisando de ajuda não é o paciente, mas justamente
quem está do lado”, diz.
Ela lembra que o apoio da equipe de cuidados
paliativos do Samaritano foi muito importante para
que pudesse superar mais facilmente essa fase difícil da sua vida. “Poder conversar com uma equipe
de profissionais me ajudou bastante. Todo mundo
precisa desse apoio nesse final. Só o fato de você
poder desabafar já alivia”, lembra.
Síndrome de burnout
A síndrome da estafa profissional, também conhecida como síndrome de burnout, foi descrita pela primeira vez em 1974 pelo
psicólogo H.J. Freudenberger para definir o estado de esgotamento
físico e emocional causado por condições de trabalho desgastantes.
A estafa profissional acontece em todas as profissões, principalmente quando envolvem altos níveis de estresse, como na área de
saúde. A oncologia é uma especialidade extenuante por diversas
razões, entre elas a constante exposição à morte e o conflito entre o
objetivo de cura e a necessidade de prestar cuidados paliativos.
Um estudo conduzido entre 2003 e 2004 para avaliar a frequência do burnout entre oncologistas brasileiros apontou que as
principais causas da estafa profissional entre eles são: tempo insuficiente para férias, sentimento de impotência e expectativas
irreais, raiva, frustração, dificuldade em lidar com perdas e assuntos relacionados a fontes pagadoras.
O estudo analisou o burnout nas dimensões exaustão emocional, despersonalização e baixa realização pessoal. Pelo menos
54
outubro/novembro 2011 Onco&
Amparo profissional
A experiência de Sueli é um exemplo do impacto
dos cuidados também com o cuidador. Mas será
que isso é comum? Na prática, quem zela pelo
cuidador? Para Luana, muitas vezes se pensa que o
psicólogo é a figura que vai amparar os cuidadores.
“Mas se esquece de que o psicólogo é parte dessa
equipe que cuida e precisa de cuidados como qualquer outro profissional”, diz.
Segundo ela, o dia a dia tem mostrado que
quem cuida do profissional de saúde que está lidando com doentes graves é a própria equipe.
“Muitas vezes, meu olhar como psicóloga ajuda alguém da equipe a ver aquela situação de outro
ponto de vista. E isso pode ter um efeito terapêutico, porque faz o profissional se distanciar da situação através do olhar do outro”, diz.
Ela também vivenciou situações nas quais a
conversa com um enfermeiro ou um médico foi
muito importante. “As conversas que me ajudaram
foram no café, na copa. Acho que os momentos
mais férteis são justamente aqueles que não são formalizados. A equipe tem a função de se suportar,
no bom sentido”, diz.
28% dos entrevistados apresentaram pontuações referentes a uma
das dimensões gravemente alteradas e cerca de 15% deles apresentaram alterações importantes simultaneamente nas três dimensões avaliadas.
Segundo Auro Del Giglio, oncologista clínico e um dos líderes
do estudo, é preciso ficar atento ao perceber uma diminuição na
capacidade profissional e na motivação para trabalhar. “A hora de
buscar ajuda é quando o médico sente que não está agregando ou
não está tratando bem os pacientes.”
Ele afirma que não existe um tratamento específico, e que as
atitudes que devem ser tomadas têm a ver com o bom senso. “O
indivíduo precisa tirar férias, ter outros níveis de motivação além
do profissional, ter um suporte familiar adequado, talvez diminuir
a carga de trabalho para adquirir mais satisfação ao trabalhar. Um
dos motivos também pode ser a remuneração, que muitas vezes é
insuficiente e desmotiva o profissional”, diz.
E ressalta: “Quando já está num estágio avançado desse
processo, muitas vezes ele tem de procurar uma nova recolocação
profissional ou reformatar sua forma de praticar a medicina”.
Quando é hora de procurar ajuda?
Os cuidadores, sejam eles profissionais ou fami liares, devem estar sempre atentos se a atividade
está trazendo muito sofrimento, irritação ou impaciência. “Um dos primeiros sinais da estafa do
cuidador é a irritação. A pessoa começa a não ter
muita paciência com as atitudes, com o tempo destinado ao paciente. Quando se detecta isso, é interessante procurar um profissional, que vai
mostrar alternativas para uma válvula de escape,
ensinar como fazer isso sem sentimento de culpa”,
explica Jamiro Wanderley, coordenador de um
curso para cuidadores informais na Universidade
Estadual de Campinas (Unicamp).
E isso vale também para o cuidador familiar.
“Ele também tem medo de perder a pessoa que ele
ama e de quem está cuidando de forma tão presente. Na maioria dos casos, orientamos ao familiar
cuidador que procure apoio psicológico para que
possa dar conta de forma efetiva desse momento,
às vezes tão doloroso e que requer tanto dele”,
afirma Luciana, do Oncoguia.
Além disso, é muito comum que o cuidador familiar fique sobrecarregado, pois raramente o cuidado é compartilhado. “O que se vê geralmente é
uma pessoa que fica responsável pelo cuidado de
outra. Isso é delicado, porque a pessoa precisa ter
tempo para se cuidar”, diz Luana. Por exemplo, numa
situação de internação hospitalar, o cuidador tem de
sentir que as coisas vão funcionar na sua ausência. “É
importante dizer que o cuidador pode sair, descansar
um pouco, mas sem cobrar essa atitude, porque se
não vira uma tarefa a mais. E isso é muito ruim.”
Wanderley concorda que o que ocorre na maioria das vezes entre os cuidadores familiares é
o excesso de responsabilidades. “O cuidador profissional cumpre um horário, faz suas atividades e
vai embora. Já o cuidador familiar cuida o tempo
todo. Quem tem o perfil de cuidador acaba assumindo os cuidados e os outros familiares se acomodam. A pessoa pode cuidar sozinha durante um
tempo, mas vai acabar se exaurindo. Por isso, é importante que ela também se cuide, tenha o seu espaço, consiga ter com quem trocar de vez em
quando essa condição de cuidador”, diz.
Ele acrescenta que mesmo os profissionais de
enfermagem precisam de apoio emocional e psicológico, porque eles têm um apego ao paciente
que poderá vir a falecer. “Além disso, se o indivíduo
é um cuidador profissional e depende daquilo para
sobreviver, a morte desse paciente significa que essa
família não precisa mais dele. Ele fica desempregado de uma hora para outra.”
O ideal, seja entre familiares ou profissionais, é
demonstrar que o cuidador não está sozinho. É preciso ter uma rede de suporte, uma equipe de saúde
que o ampare, uma família, uma rede social que o
substitua em determinados momentos, para que ele
possa se ausentar também. “Acho que o ideal é oferecer essa retaguarda, a disponibilidade para contatos telefônicos, a orientação em relação aos
procedimentos que o paciente vai precisar, mesmo
que não seja ele quem vai fazer o procedimento.
Isso tem um impacto direto para o paciente, mas
também impacta o cuidador, que se percebe compartilhando aquela tarefa”, finaliza Luana.
“Às vezes, naquele
momento, quem
mais está precisando
de ajuda não é o
paciente, mas
justamente quem
está do lado”
Onco& outubro/novembro 2011
55
quiz
Quebra-cabeça
O quiz é uma seção interativa de Onco& que convida leitores a dar opiniões,
levantar dúvidas e emitir hipóteses do caso apresentado
Novo caso
Medicação em uso: Bezerol, Benicar.
lizada no terço inferior da parede torácica anterior, medindo 7,1 x
5,0 cm nos maiores eixos transversos. Essa lesão envolve o terço
inferior do corpo do esterno e o apêndice xifoide, estendendo-se
para os planos subcutêneos do quadrante inferomedial da mama
esquerda. Junto ao seu contorno inferior nota-se lesão com as mesmas características, que infiltra o músculo reto abdominal direito e
os planos subcutâneos adjacentes, medindo 3,6 x 3,4 cm.
Destacam-se linfonodomegalias nas cadeias mamárias internas medindo até 3,3 x 1,7 cm (com componente que se insinua
para o mediastino anterior), axilar esquerda (2,7 x 1,9 cm) e
retropeitonal (1,2 cm).
Pequeno nódulo sólido heterogêneo com 1,1 cm no quadrante inferomedial da mama esquerda.
Tomografia computadorizada de tórax (08/07/2011): lesão expansiva infiltrativa heterogênea e de contornos irregulares, loca-
Anatomopatológico em 14/07/2011: biópsia de massa de
parede torácica. Positivo para células neoplásicas malignas, pre-
CLKA, sexo feminino, branca, 58 anos
- Retirou um nódulo mamário há mais de dez anos
(sem neoplasia - sic).
- Colecistectomia laparoscópica há um ano.
- Há três meses notou abaulamento na parede abdominal,
interpretado como hérnia.
- No momento está com dor severa em parede abdominal
e torácica, de difícil controle com analgésicos simples.
Antecedentes pessoais: hipertensão arterial controlada.
Mande suas respostas para o e-mail: [email protected]. Os resultados
serão divulgados no site www.revistaonco.com.br e na próxima edição de Onco&.
56
outubro/novembro 2011 Onco&
Resposta do quiz anterior – edição 7
sença de células epitelioides atípicas, contendo vacúolos claros
intracitoplasmáticos.
Imuno-histoquímica em 30/07/2011:
RE neg. RPg. neg. Her2 neg. (Score 0)
p53 positivo focal e fraco
Ki-67 em cerca de 80% das células
Citoqueratina 5/6 focalmente positivo
Questões:
1) Qual o diagnóstico provável?
2) Qual a melhor proposta terapêutica?
Ricardo Caponero
Oncologista clínico da Clínica de Oncologia Médica de São Paulo
L.S.S., 76 anos, casado, aposentado, residente na cidade de Belém,
estado do Pará, procurou atendimento no dia 23/2/2011 para segunda opinião médica. Ao exame
físico apresentava lesões em placas
elevadas infiltradas, eritemato-acastanhadas, de bordas bem delimitadas, comprometendo principalmente a região torácica, bom estado
geral, sem linfonodomegalias nem
qualquer outra alteração.
O paciente relata tratamento
com dermatologistas por aproximadamente seis anos, já tendo utilizado diversos medicamentos tópicos e sistêmicos que não sabe precisar, atualmente em uso das seguintes medicações: Cetaphil,
Clovesol, Fexofenadina, Cetrilan e Hixizine. Diz ainda que
será submetido a uma cirurgia de glaucoma no mês seguinte.
Foram solicitados os seguintes exames laboratoriais: hemograma, U/C, ALT, AST e DHL. Dos exames de imagem
disponíveis foi solicitada uma CT de tórax. Os resultados laboratoriais foram normais, com DHL no limite superior da
normalidade, e CT de tórax sem qualquer anormalidade.
Qual a hipótese diagnóstica? Quais exames complementares solicitar? Quais os diagnósticos diferenciais e o
tratamento adequado?
Resposta
Tem algum caso interessante que
gostaria de divulgar? Mande para
[email protected]
Trata-se de um linfoma cutâneo difuso de células T, conhecido como micose fungoide do tipo clássica de AlibertBazin. É uma doença de curso indolente e progressiva, que
acomete pacientes geralmente acima dos 55 anos, com um
predomínio sobre o sexo masculino (2:1).
Esse linfoma apresenta-se com muita variação clinicopatológica, podendo exibir inicialmente aspectos inespecíficos ou com lesões mais bem delimitadas, sendo as lesões
eritematosas, por vezes hipocrômicas, ou ainda poiquilodérmicas, com superfície ligeiramente atrófica. Surgem geralmente na pele das seguintes regiões: cintura pélvica, nádegas,
tronco inferior, virilhas, axilas e mamas, em número variável,
disseminando-se gradativamente.
Onco& outubro/novembro 2011
57
Com o curso da doença, essas lesões tendem a se tornar placas infiltradas, eritematosas ou eritemato-acastanhadas, de bordos bem delimitados e contornos bizarros. O mais comum é que
os pacientes apresentem uma combinação de lesões não infiltradas, placas e tumores, havendo a possibilidade de placas e
tumores se tornarem ulcerados.
Na história natural da doença podemos encontrar linfonodos
regionais aumentados de tamanho, apresentando alterações histológicas relacionadas ao linfoma. Diversos órgãos, inclusive a
pele, podem ser acometidos no decorrer da doença devido à
falência dos linfócitos T, o que pode levar o paciente a um
quadro séptico, principalmente por Staphylococcus aureus. Felizmente esse acometimento sistêmico ocorre na minoria dos casos
– 2% evoluem para morte após 32 anos de evolução e 9% dos
quadros mostram progressão sistêmica.
Exames complementares
Biópsia e histopatologia
Os dados obtidos serão correlacionados ao estadiamento clínico
da doença. As características que ditam de maneira positiva para
a condição incluem: linfócitos com núcleos hipercromáticos e
convolutos, rodeados por halo claro, na camada basal da epiderme com aproximadamente o mesmo tamanho dos queratinócitos, isolados ou alinhados, formando configuração linear
ou intensa exocitose de linfócitos, e microabscessos de Pautrier.
Diagnósticos diferenciais
Dermatoses inflamatórias, tais como eczemas crônicos, tínea do
corpo, hanseníase indeterminada, pitiríase alba, parapsoríase em
placas, eritrodermia, síndrome de Sézary.
Tratamento
Durante a fase precoce com lesões confinadas à pele: corticosteroides tópicos, bexaroteno tópico, quimioterapia tópica com
mostarda nitrogenada (mecloretamina ou carmustine), fototerapia com UVB, UVB narrow band, PUVA ou irradiação localizada ou de toda a pele com elétrons.
Placas infiltradas e tumores: irradiação total da pele com
elétrons. Também podem ser utilizados os modificadores de resposta biológica, como interferon alfa, bexaroteno, interleucina
2 coligada a toxina difitérica, com ou sem associação com a terapia tópica.
Doença avançada, doença sistêmica e casos refratários com
taxa de remissão parcial, como o descrito: poliquimioterapia
semelhante às usadas para linfomas não-Hodgkin nodais com
protocolos: COP, CHOP, PROMACE-CYTABON.
Luís Eduardo Werneck de Carvalho
Clínica Oncológica Brasil
Belém – PA
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outubro/novembro 2011 Onco&
curtas
Quimioterapia pode
prejudicar a fala
Anvisa aprova novo medicamento
contra o câncer de estômago
Pacientes com câncer gástrico, o segundo tipo de câncer que mais mata e o quarto
mais comum no mundo, têm uma nova opção de tratamento: o medicamento Herceptin® (trastuzumabe), do laboratório Roche, foi aprovado pela Agência Nacional
de Vigilância Sanitária em julho.
O medicamento, que já é usado com sucesso no combate ao câncer de mama e
no tratamento do adenocarcinoma de estômago na Europa e nos Estados Unidos,
agora passa a ter a mesma indicação no Brasil. Estudos mostram que pacientes com
câncer gástrico em estado avançado do tipo HER2 positivo fazendo uso de
trastuzumabe têm sobrevida de 14 meses, contra os 11 proporcionados pelos
medicamentos quimioterápicos disponíveis.
Pacientes que receberam altas doses de
quimioterapia podem ter mais dificuldade
de se expressar verbalmente. Esse é o resultado de uma nova pesquisa realizada
pela Academia Sahlgrenska na Universidade de Gotemburgo, na Suécia, e publi cada na revista científica Acta Oncologica.
O estudo ouviu quase mil sobreviventes de câncer de testículo, que
foram convidados a responder a um
questionário sobre como se sentiam
11 anos após o diagnóstico.
Aqueles que se submeteram à quimioterapia apresentaram duas vezes
mais dificuldades de linguagem. Eles
reclamaram que “as palavras vinham na
ordem errada”, que “não diziam as
palavras que planejavam” e que tinham
“dificuldade em terminar sentenças”.
Além disso, sobreviventes de câncer
que receberam quimioterapia frequentemente relatam dificuldades com memória
e capacidade de concentração, mas os pes quisadores ainda não têm certeza se as
deficiências foram causadas pela quimio terapia, já que a maioria das pesquisas é
realizada em pacientes com câncer de
mama, que também recebem hormônios
que podem afetar a função cognitiva.
Rede social permite compartilhar
experiências com o câncer
Um espaço que permite que portadores de câncer compartilhem suas experiências.
Assim é o I Had Cancer, uma nova rede social na qual os usuários podem contar
sua história, formar um círculo de amizades, participar de discussões e até escrever
mensagens destinadas ao tumor, numa seção denominada “Querido câncer”.
Além disso, um sistema de busca possibilita que os usuários encontrem pessoas
que enfrentaram a mesma situação por gênero, idade, tipo de câncer e tratamento.
Os idealizadores dessa rede social também trabalham para desenvolver aplicativos que ajudem a promover a realização de eventos beneficentes e permitam às
ONGs novas formas de destinar seus recursos. Para conhecer a rede social, acesse
www.ihadcancer.com.
Novos aliados contra o melanoma
O FDA acaba de aprovar o uso do equipamento de diagnóstico Cobas 4800 BRAF
V600 Mutation Test, que identifica quais pacientes com melanoma podem ser beneficiados com o medicamento Zelboraf (vemurafenibe), da Roche, indicado para
melanoma maligno, a forma mais agressiva de câncer de pele.
A droga também foi recentemente aprovada nos Estados Unidos com indicação
para pessoas com melanoma metastático BRAF V600E mutação positivo, que corresponde a cerca de metade do total dos casos de melanoma. Tanto o equipamento
quanto o medicamento são parte da estratégia global do laboratório de foco em
medicina personalizada.
Onco& outubro/novembro 2011
59
De olho no público jovem
Com o intuito de chamar a atenção para o problema do tabagismo no
país, o INCA lançou em agosto o relatório “A situação do tabagismo no
Brasil”, com dados de pesquisas do Sistema Internacional de Vigilância
do Tabagismo da Organização Mundial da Saúde realizadas no Brasil entre
2002 e 2009.
Um dos dados mais alarmantes diz respeito à facilidade de acesso dos
adolescentes ao produto. Apesar da lei federal que proíbe a venda para
menores de idade, adolescentes entre 13 e 15 anos não encontram dificuldade na hora da compra.
A preocupação com os jovens é grande, já que eles são o principal
alvo da indústria do tabaco, interessada em atrair novos consumidores.
Além disso, o tabagismo entre os adolescentes não tem diminuído como
vem ocorrendo entre os adultos, e a iniciação precoce pode aumentar em
quase o dobro o risco de danos à saúde.
Tour de prevenção do
câncer da pele percorre o país
A Sociedade Brasileira de
Dermatologia (SBD), com o
apoio exclusivo de La RochePosay, deu início, com o Tour
de Prevenção, à 13a Campanha Nacional de Prevenção
ao Câncer da Pele. De 10
de setembro a 27 de novembro, um caminhão percorrerá
10 mil km do Sul ao Norte do país, oferecendo à população esclarecimentos e atendimento gratuito sobre cuidados e prevenção do câncer da
pele – o mais incidente entre os brasileiros, com expectativa de 110 mil
novos casos em 2011, segundo o INCA.
Serão diversas equipes médicas compostas por médicos da SBD rea lizando diagnósticos, sempre nos fins de semana, das 9 às 15 horas. Os
especialistas realizarão o exame de sinais, pintas e manchas, e os pacientes
com suspeita da doença serão encaminhados para tratamento totalmente
gratuito nos serviços credenciados de cada estado.
Mais informações sobre o roteiro do Tour de Prevenção podem ser
obtidas pelo telefone 0800 723-9710 ou pelo site www.previnaocancerdapele.com.br.
60
outubro/novembro 2011 Onco&
Nova ferramenta antecipa
risco de linfedema
Pesquisadores brasileiros criaram um
conjunto de modelos
estatísticos com precisão de mais de 70%
para prever o risco de
desenvolvimento de
linfedema no período
de cinco anos após a
cirurgia para remoção dos linfonodos em pacientes de
câncer de mama.
Liderados por José Bevilacqua, cirurgião oncológico no Hospital Sírio-Libanês, em São
Paulo, os pesquisadores estudaram 1.054 mulheres
com câncer de mama submetidas a dissecção axilar
entre 2001 e 2002. A incidência geral de linfedema
no grupo, no período de cinco anos, foi de 30,3%.
Apoiados em fatores clínicos como idade, índice
de massa corporal, infusões de quimioterapia no
braço ipsilateral, nível de dissecção axilar, localização do campo de radioterapia, entre outros, os
pesquisadores desenvolveram três modelos e seus
nomogramas correspondentes para prever o risco
de desenvolver linfedema em diferentes pontos no
período pós-cirúrgico.
”Para efeito de comparação, essas ferramentas
de modelagem são tão precisas para prever o risco
de uma mulher desenvolver linfedema como a
mamografia é para a detecção de câncer de mama”,
diz Bevilacqua.
Ele sugere que os modelos podem se tornar
uma ferramenta útil para ajudar médicos a selecionar em quais casos a dissecção axilar deve ou
não ser recomendada. O modelo para estimar o
risco de linfedema estará disponível em breve no
endereço www.lymphedemarisk.com.
Prêmio Pedro Kassab incentiva
pesquisa em nutrição e câncer
A terapia nutricional precoce e
agressiva tem impacto favorável
na redução da morbimortalidade
de pacientes oncológicos. O conhecimento dos princípios bioativos dos nutrientes confirma a
importância da nutrição no tratamento multimodal do câncer.
Para discutir recentes avanços e novas perspectivas, em junho de
2012 serão realizados o V Congresso Brasileiro de Nutrição e Câncer,
o Ganepão 2012 e o III International Conference of Nutritional Oncology, que reunirão especialistas nacionais e internacionais.
Um dos destaques do evento será a entrega da 2a edição do
Prêmio Pedro Kassab, cujo objetivo é incentivar a produção de
pesquisa científica no Brasil nas áreas de nutrição e câncer. Os dois
melhores trabalhos serão apresentados e premiados pelo prefeito da
cidade de São Paulo, Gilberto Kassab, que já confirmou presença.
Mais informações: www.ganepao.com.br.
Colonoscopias
em intervalos maiores
Pessoas que se submeteram a colonoscopia e não apresentaram sinais
de câncer podem atrasar ou mesmo não fazer a próxima. Os resultados
de uma pesquisa conduzida pelo Centro Alemão de Pesquisa do Câncer,
em Heidelberg, na Alemanha, desafiam as diretrizes atuais, que recomendam que a colonoscopia com resultado negativo deve ser
repetida após dez anos.
Para o estudo, os pesquisadores questionaram cerca de 2 mil pacientes de câncer de cólon e 2,4 mil pessoas saudáveis se tinham feito
o exame e quando ele havia sido feito. Em comparação com pessoas
que nunca tinham passado pelo procedimento, aqueles cujos testes
deram negativo – sem evidências de tumores de cólon – tinham cinco
vezes menos risco de desenvolver câncer no futuro.
Embora o estudo não seja definitivo, os pesquisadores defendem
que intervalos mais longos de rastreamento poderiam ter um impacto
significativo sobre o custo-benefício geral da colonoscopia, bem
como diminuir a taxa de complicações relacionadas com o exame.
Uso do DIU diminui pela
metade risco de câncer
de colo do útero
O dispositivo intrauterino (DIU) pode proteger as
mulheres contra o desenvolvimento do câncer cervical, embora não interrompa a infecção que normalmente leva à doença.
Pesquisadores do programa de pesquisa epidemiológica em câncer do Hospital Llobregat, na
Catalunha, Espanha, estudaram 20 mil mulheres e observaram que aquelas com um histórico de uso de DIU
não são menos suscetíveis do que as mulheres que não
contraíram o papiloma vírus humano (HPV), que causa
câncer de colo do útero, mas têm cerca de metade do
risco de desenvolver o câncer em si.
Segundo cientistas, entre as possíveis explicações
para o efeito protetor do DIU está o processo de inserção ou remoção do contraceptivo, que pode destruir células pré-neoplásicas ou causar algum tipo de
inflamação que provoca uma resposta imunológica
duradoura e evita o progresso do HPV.
Os resultados mostraram ainda que o uso do DIU
não afetou o risco de infecção pelo HPV, mas estava ligado a um risco significativamente menor de câncer de
colo do útero para ambos os tipos principais da doença
– redução da probabilidade de desenvolvimento de carcinoma de células escamosas em 44% e adenocarcinoma ou carcinoma adenoescamoso em 54%.
O período de tempo que as mulheres usaram o
DIU não alterou significativamente o risco, disseram
os pesquisadores: o risco foi reduzido quase pela
metade no primeiro ano de uso e o efeito protetor permaneceu significativo mesmo após dez anos.
Onco& outubro/novembro 2011
61
calendário 2011
Evento
Data
Local
Informações
X Congresso Brasileiro
de Cirurgia Oncológica
13 e 14 de outubro
Rio de Janeiro, RJ
www.sbco.com.br
Simpósio de Neuro-Oncologia
14 e 15 de outubro
São Paulo, SP
www.accamargo.org.br/
simposioneuroonco2011/
10o Simpósio Internacional
de Economia da Saúde
19 a 21 de outubro
Barretos, SP
www.oncoeventos.com.br/
economiadasaude/
XVII Congresso Brasileiro
de Oncologia Clínica
26 a 29 de outubro
Gramado, RS
www.sboc2011.com.br
XI Curso de Radioterapia
de Última Geração
27 e 28 de outubro
São Paulo, SP
http://cursos.hospitalsiriolibanes.com.br/
Vendas/cursos.asp
II Congresso Brasileiro de Cuidados
Paliativos – Casa do Cuidar
3 de novembro
São Paulo, SP
www.luminaeventos.com.br/agenda.htm
Simpósio Up to Date –
Câncer de Mama
4 e 5 de novembro
São Paulo, SP
www.eventosuptodate.com.br
Simpósio Internacional de Cirurgia
Laparoscópica e Procedimentos
Intervencionistas em Câncer
do Aparelho Digestivo
4 e 5 de novembro
São Paulo, SP
www.accamargo.org.br/pecogi2011/
Cursos à Distância Ganep – Câncer
9 de novembro a
20 de dezembro
À distância – online
www.ganepeducacao.com.br
I Simpósio Internacional
de Oncogeriatria
18 e 19 de novembro
São Paulo, SP
http://ensino.einstein.br/portal/
II Jornada Norte-Rio-Grandense
de Oncologia
18 a 20 de novembro
Natal, RN
http://jornadadeoncologia.blogspot.com/
1o Simpósio Anual do Núcleo
de Oncologia Torácica (NOT)
– COI
25 e 26 de novembro
Rio de janeiro, RJ
www.coinet.com.br/pagina/?CodSecao=122
Calendário de eventos de 2011 completo e atualizado:
62
outubro/novembro 2011 Onco&
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