A dança dos conterrâneos de Berlim «Berlin! Berlin! Ich liebe die Stimmung, L'atmosphere c'est tres bizarre, Right over here», Nina Hagen canta em «Berlin (is dufte!)». A derradeira pirralha boémia gritou-­‐o nas línguas dos ocupantes que determinaram as políticas de Berlim Ocidental até 1989, quando a capital da República Democrática Alemã abriu as suas portas. Desde então, um novo conjunto de línguas foi ouvido na antiga ilha no meio da República Democrática Alemã. Na realidade, Berlim é um íman para a cultura independente e o cenário internacional de dança. Isto sempre sobrecarregou a nova capital. A sua atração própria vai além da atração das suas políticas. Aqui tentamos oferecer um panorama mais ou menos atual e definitivamente incompleto que inclui certas observações históricas. Os bailarinos e coreógrafos encontram-­‐se numa estrutura desenvolvida a partir da última Guerra Mundial, mas desde a queda do Muro de Berlim têm procurado formas de criar as suas próprias condições de trabalho. Tudo o que aparenta ser selvagem e, acima de tudo, o que é complexo nesta cidade e nos seus mais de 100 espaços de espetáculo, segue certas tendências e diretrizes políticas; nem sempre estão no melhor interesse da arte. Arnd Wesemann Antes Durante uns bons 30 anos, Berlim era uma cidade estritamente dividida. O sinal dos tempos enquanto competição entre o sistema russo na parte oriental, que preferia ignorar as suas próprias tendências subculturais na dança contemporânea e, acima de tudo, a influência americana na parte ocidental da cidade. Foi dada especial atenção aos alunos de Mary Wigman, que vivia em Berlim Ocidental desde 1 www.numeridanse.tv www.evdhproject.eu 1949 -­‐ também por esta bailarina Ausdruckstanz alemã ser o oposto perfeito a Gret Palucca da República Democrata Alemã. Enquanto o amor de Palucca pela liberdade parecia refletir a vida contemporânea no Leste com a sua arte de improviso, Wigman representava os «valores ocidentais». Baseava-­‐se muitas vezes nos EUA. Em 1931, a Wigman School de Nova Iorque de Hanya Holm já se tinha tornado um ponto de passagem muito visitado. Os alunos de Wigman, como Brigitta Herrmann e Manfred Fischbeck, emigraram com a companhia Group Motion de Berlim para Filadélfia em 1968. A dança contemporânea apenas existia oficialmente na Escola de Artes de Berlim Ocidental. No festival «Pantomime-­‐ Musik-­‐Tanz-­‐Theater», fundando por Dirk Scheper e Nele Hertling em 1966, vários coreógrafos americanos, como Merce Cunningham, foram convidados a atuar, assim como a dar seminários. Como resultado destas influências, o cenário expressou-­‐se pela primeira vez institucionalmente ao fundar a Tanzfabrik em Kreuzberg, em 1978. A América estava em casa e apresentou aos berlinenses a dança pós-­‐moderna e o improviso de contacto. Ontem Enquanto na Alemanha Ocidental a dança-­‐teatro de Pina Bausch, Susanne Linke ou Reinhild Hoffmann viajou pelo mundo, o panorama isolado de Berlim Ocidental virou as suas atenções para Paris (Mime Corporel), Londres (Estudo do Movimento de Laban) e Nova Iorque. Estas influências são especialmente visíveis no caso de Jutta Hell, Dieter Baumann e na sua companhia, Rubato. Por exemplo, em «Act»,que representa a ligação ao segundo grande mestre da dança de Berlim a seguir a Wigman, o construtivista da dança, Gerhard Bohner (falecido em 1992). Riki von Falken, Christina Ciupke e Anna Huber («zwischen jetzt») também trabalham no contexto da sua tradição. Contudo, a cultura de dança de Berlim floresceu primeiro durante e após a queda do Muro de Berlim. Na parte Leste da cidade, Jo Fabian, entre outros, trabalhava 2 www.numeridanse.tv www.evdhproject.eu com o seu «surrealismo espectral». Imediatamente após a queda do Muro, foi acusado de imitar a estética de Robert Wilson, mesmo com a estética manifesta de raiva em «Whisky & Flags» (1993), por exemplo. Isto demonstrava a forma de pensar do Ocidente: reações treinadas levaram alguém a ver o autismo artístico de Wilson antes de poderem reconhecer o autismo forçado de um socialismo acabado de perecer. Mas depois Berlim Leste foi conquistado pelo panorama da dança de Berlim Ocidental. Os porta-­‐vozes foram Jochen Sandig e Sasha Waltz, influenciada pela aluna de Wigman, Waltraud Kornhaas. A coreógrafa mais proeminente de Berlim e o seu marido, que tinham uma afinidade pelo Leste naquela altura, declararam primeiro o Tacheles e depois o Sophiensæle como locais de espetáculo centrais para grupos independentes. O «Tanztage» no Pfefferberg, iniciado por Barbara Friedrich e Dock 11, fundado por Wibke Janssen e Kirsten Seeligmüller, pertenciam a estes locais. Contudo, o Hebbel-­‐Theater, reanimado por Nele Hertling e o multidisciplinar Theater am Halleschen Ufer em Kreuzberg, eram locais mais centrais para a arte da dança independente, mesmo depois do seu rejuvenescimento enquanto HAU-­kombinat, sob a direção de Matthias Lilienthal e Annemie Vanackere. Meg Stuart de New Orleans, com o seu lendário «Disfigure Study» (1991), assim como Jeremy Wade e Jared Gradinger («Les petites morts – i hope you die soon») de Nova Iorque, tornaram-­‐se representantes importantes da personalidade internacional de Berlim, assim como o festival HAU «Tanz im August». Atualmente Aproximadamente 3000 artistas de dança e performers de todo o mundo vivem na cidade reunificada. Para eles, a antiga dicotomia Leste-­‐Ocidente é apenas um mito, que algumas pessoas relacionam com a procura por uma herança de dança -­‐ por exemplo, Jochen Roller no seu «Trachtenbummler» -­‐ que vai de Wigman ao período em que Constanza Macras, vinda de Cunningham em 1995, trouxe uma 3 www.numeridanse.tv www.evdhproject.eu filosofia de «anything goes» (vale tudo) para a cidade e especialmente o Schaubühne: com humor, ferocidade e desobediência anárquica. O seu objetivo? Sobrecarregar o teatro com tanto significado que este acaba por ceder. O princípio oposto foi também a raiva, que se tornou popular com «Self-­‐Unfinished» (1998) de Xavier Le Roy e, posteriormente, com intervenções em exposições pelo artista sediado em Berlim, Tino Sehgal: foi, acima de tudo, a prática das artes visuais no Podewil de Berlim Leste que obteve o máximo efeito com um mínimo de linguagem gestual corporal. Ivana Müller também está nesta tradição com «In Common», assim como a colaboração de Isabel Schad com o filósofo Laurent Goldberg em «Der Bau»; um exemplo mais recente é «Parade» de Adam Linder. O Centro de Dança Interuniversidades com os Uferstudios no Distrito de Wedding de Berlim tem sido um foco para autores orientados para a forma como a dança se torna arte. Inter alia, é Britta Wirthmüller, quem tem de ser mencionada aqui com a sua produção «Physical encounters», que lida com o bailarino Jean Weidt e o seu oeuvre de dança. A nova série «Nah dran», também baseada nos Uferstudios, um laboratório sazonal para resultados intermédios apresentáveis (por exemplo: «Air» de Kollektivtransit), também reflete este desenvolvimento na dança. Culmina no «Tanznacht Berlin» nos Uferstudios no final do verão e no «Tanztage» no Sophiensæle no início de janeiro. Um contraste é, entre outros, a dança-­‐teatro de Toula Limnaios, com o seu próprio local de espetáculos, o halle (onde podemos ver «the thing i am»), Nir de Volff com a sua companhia Total Brutal em «Diary of a Lost Decade», ou o alcance da dança em espaços públicos como nas atuações em lojas de «Alice im Wunderland» por Martin Stiefermann, ou os jogos de dança interativos pela dupla David Brandstätter/Malgven Gerbes em «Festina Lente». Igualmente afastada de uma pesquisa puramente artística está a geração de artistas de dança com pensamento político, como Christoph Winkler no seu confronto com o desenvolvimento radical da atualidade («RechtsRadikal»), Helena Waldmann que entra em conflitos distantes com bailarinas iranianas ou do Bangladesh («Made in Bangladesh», 2014), ou Kadir Amigo Memiş, que centra os 4 www.numeridanse.tv www.evdhproject.eu seus espetáculos na história da migração de Berlim e da Alemanha («Scha’irlie. This is not a Chaplin»), entre outras. Sasha Waltz é particularmente difícil de colocar neste conjunto de profissionais de dança independentes. Tornou-­‐se famosa com o seu «Dialoge», grandes peças que abriram o Jüdische e Neue Museum em Berlim. Depois de obras como «impromptus», trabalha agora com as óperas da cidade enquanto coreógrafa independente com a sua própria casa, Radialsystem em Spreeufer. Não só a conquista de locais de Berlim começou com ela, após a queda do Muro de Berlim, como Waltz tem uma relação diferente, mais aberta, com os políticos, isto levou-­‐a a criar uma nova fórmula do que o panorama independente pode ser: uma cooperação confiante com um conjunto de instituições por toda a Europa. Um exército crescente de artistas de dança independentes encontra-­‐se no lado oposto a ela em Berlim. Este grupo é extremamente diverso e, ou produz nesta capital comparativamente barata com dinheiro dos seus países maternos, ou sobrevive em nichos entre o ensino e os seus projetos de arte independentes. As iniciativas que tentam ir contra esta situação de trabalho precário tornaram-­‐se mais urgentes sob a forma do Tanzbüro Berlin, a Iniciativa Zeitgenössischer Tanz Berlin, uma colaboração entre o panorama independente e o Dachverband Tanz Deutschland, com sede em Berlim. Até agora, só se encontra ajuda nos Hauptstadtkulturfonds e apoio adicional do governo federal. 5 www.numeridanse.tv www.evdhproject.eu Bibliografia Revistas no Geral -­‐ tanz , em: www.tanz-­‐zeitschrift.de -­‐ TanzRaumBerlin, em: www.tanzraumberlin.de Literatura Em alemão: -­‐ “Tanzfabrik: Ein Berliner Modell im zeitgenössischen Tanz 1978-­‐1998“, editado por Claudia Feest, editora: Hentrich Verlag, Berlim, 1998. -­‐ “Gerhard Bohner – Tänzer und Choreograph“, editado por Akademie der Künste, editora: Hentrich Verlag, Berlim, 1991. -­‐ “Mary Wigman. Leben und Werk der großen Tänzerin“ por Hedwig Müller, editora: Ullstein, Berlim, 1997. -­‐ “Gret Palucca. Schriften. Interviews. Tanzmanuskripte”, editado por Huguette Duvoisin e René Radrizzani, editora: Schwabe, Basileia, 2008. -­‐ “Anita Berber: Studie“ por Joe Jencík, editado por Martin Stiefermann, editora: K. Kieser Verlag, Munique, 2014. -­‐ “100 Jahre Hebbel-­‐Theater. Angewandtes Theaterlexikon nach Gustav Freytag“, editora: primeline.print, Berlim, 2008. -­‐ “Import Export. Arbeitsbuch zum HAU Berlin”, editado por Kirsten Hehmeyer, Matthias Pees, editora: Theater der Zeit, Berlim, 2012. -­‐ “50 Jahre Schaubühne. 1962-­‐2012”, editado por: Jürgen Schitthelm, editora: Theater der Zeit, Berlim, 2012. -­‐ “Cluster. Sasha Waltz” editado por Sasha Waltz&Guests, editora: Henschel, Berlim, 2007. Em inglês: -­‐ “New German Dance Studies”, editado por Susan Manning e Sophia Ruprecht, University of Illinois Press, Illinois, 2012. 6 www.numeridanse.tv www.evdhproject.eu -­‐ A revista online Tanzraumberlin, todas as edições disponíveis no site: http://tanzraumberlin.de/tanzraumberlin-­‐archive-­‐-­‐16-­‐1.html Internet -­‐ www.danceinfo.de -­‐ www.tanzraumberlin.de -­‐ www.dachverband-­‐tanz.de -­‐ www.hzt-­‐berlin.de -­‐ www.ztberlin.de -­‐ www.tanzforumberlin.de 7 www.numeridanse.tv www.evdhproject.eu