a avaliação é negativa!

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EDIÇÃO Nº 14
EDITOR: DANILO DA SILVA
MAPUTO, MAIO 2016 , ANO V
WWW.LAMBAMOZ.ORG
SITUAÇÃO DOS DIREITOS
HUMANOS EM MOÇAMBIQUE
“A AVALIAÇÃO É
NEGATIVA!”
IVETE MAFUNDZA
PÁG. 5
É PARTE DA NOSSA NAÇÃO
SERMOS PROGRESSISTAS, SERMOS
TOLERANTES E ACEITAR PESSOAS
QUE AMAM OUTRAS PESSOAS 8
OS VALORES DE ALGUMAS
PESSOAS SOBREPÕEM-SE ÀS SUAS
OBRIGAÇÕES LABORAIS 11
REALIZADO EM JOANESBURGO
AUTORIDADES MOÇAMBICANAS
GAZETAM SEMINÁRIO REGIONAL
SOBRE VIOLÊNCIA E DISCRIMINAÇÃO
BASEADA NO GÉNERO 16
JORNAL BRITÂNICO THE
GUARDIAN DESTACA TRABALHO DA
LAMBDA 20
uma publicação
2
AS CORES DO AMOR
...
MAIO 2016
GLOSSÁRIO
ESTA PUBLICAÇÃO É POSSÍVEL COM O APOIO DE:
Drag queen: Homem que se veste com
roupas femininas de forma satírica e extravagante. Uma drag queen não deixa de
ser um tipo de transformista , pois o uso
das roupas está ligado a questões artísticas – a diferença é que a produção necessariamente focaliza o humor, o exagero.
Embora a maior parte das drag queens
sejam homossexuais, não há uma relação
necessária entre esta actividade, que pode
ser vista como profissional, e a orientação
sexual do indivíduo.
No armário: Termo de origem inglesa (in
the closet) que denota um indivíduo que
não divulga sua orientação sexual e frequentemente se esforça para que outras
pessoas não venham a atestá-la. Quem
está “no armário” é quem não assumiu
para si mesmo ou para a sociedade uma
identidade relativa à sua orientação sexual.
Orientação sexual: Termo mais adequado
para referir-se à atracção física, emocional
e espiritual a pessoas do mesmo sexo ou
do sexo oposto, incluindo, portanto, a
homossexualidade, a heterosexualidade
e a bissexualidade . A orientação sexual
determina a direção do desejo sexual de
todas as pessoas.
Homofobia: Embora a etimologia da palavra aponte para o significado que denota
medo mórbido em relação aos homossexuais (LGBTI), o termo passou a ser empregue para descrever a rejeição e/ou aversão
de certos indivíduos à homossexualidade,
aos homossexuais e a todas as manifestações do desejo sexual voltado a pessoas
do mesmo sexo.
Esta errado!: O Uso de adjectivos pejorativos para designar os indivíduos de
orientação sexual diferente da sua, tais
como; paneleiro, panilas, larilas, rabietas,
maricas, fufa, etc, isso é o mesmo que o
chamarem de preto, cafre, seboso, monhé, etc.
FICHA: TÉCNICA
EDITOR: Danilo da Silva // REDACÇÃO: Francelino Zeute, Carina Capitine // LAYOUT: Stélio da Fonseca, REVISOR
LINGUÍSTICO: Rui Manjate, PUBLICAÇÃO: As cores do Amor // REGISTO:035/gabinfo-dec/2008 // TIRAGEM: 2.000 // PREÇO:
Distribuição gratuita, MORADA: Av. Vlandimir lenine 1323, Maputo - Moçambique // TELEFAX: 21304816
DESTAQUE
Outubro 2015
JORNAL DA COMUNIDADE LGBT DE MOÇAMBICANA
3
4
AS CORES DO AMOR
NOTA DE ABERTURA
MAIO 2016
A
ssinalou-se no dia 17
de Maio, em todo o
mundo o Dia Internacional contra a Homofobia. A esta data, em 1990,
a Organização Mundial da Saúde
(OMS) retirou a homossexualidade
da sua lista de doenças.
Este acto constituiu um marco
histórico no reconhecimento da
dignidade e direitos dos homossexuais, já que pela primeira vez
uma organização internacional e
multilateral posicionou-se contra o
tratamento abusivo dos homossexuais e pelo reconhecimento pleno dos seus direitos.
A Homofobia é a aversão, medo,
ódio, ou o desprezo por pessoas
homossexuais que pode ter raízes,
sociais, culturais, religiosas ou políticas. É a expressão mais atroz do
preconceito e da marginalização
de que são vítimas as pessoas homossexuais.
No nosso país, apesar do avanço dado com a recente revisão e
entrada em vigor do Código Penal, de onde constavam artigos
que podiam ser utilizados para
criminalizar a homossexualidade,
as manifestações de homofobia
e até protagonizadas por agentes
do estado continuam rotineiras, a
título de exemplo, num passado
recente e em tom intimidatório, o
DECLARAÇÃO
ALUSIVA AO DIA
INTERNACIONAL
DE LUTA CONTRA
A HOMOFOBIA
então ministro da Justiça, Assuntos Constitucionais e Religiosos
– Abdurremane Lino de Almeida,
pontapeou a Constituição da República ao afirmar que “o registo
da LAMBDA não constitui prioridade” - como também que - “existe
uma linha vermelha que os cidadãos homossexuais não podem
transpôr, sob pena de serem entregues à justiça”. É um pronunciamento eivado de preconceito,
que viola de forma mais vil o direito e princípio da igualdade consagrados na Constituição da Republica de Moçambique.
Num estado democrático de Direito, laico, a homofobia deve ser
combatida e eliminada por todas
as instituições e cidadãos. É papel
do Estado defender o cidadão de
qualquer forma de tratamento injusto ou desumano ou quaisquer
outros ataques contra a sua integridade motivados pelo preconceito. É responsabilidade do Estado adoptar políticas que garantam
o respeito pelas diferenças e que
possibilitem a integração das minorias sexuais na sociedade.
Por isso, neste dia
mundial contra a homofobia
queremos recordar ao
Estado moçambicano que
continuamos a espera
que se nos reconheça o
direito à existência legal.
Direito que nos é negado
há mais de 8 anos. Neste
17 de Maio, reafirmamos o
compromisso de continuar
levando em nossos ombros
o estandarte da liberdade.
Reafirmamos a nossa crença no
Estado de Direito democrático
e suas instituições, continuamos
unidos contra a homofobia e
contra todas as demais formas
de discriminação que retiram
aos homens, mulheres e crianças
aquilo que lhes é intrínseco, a
Dignidade Humana.
Queremos agradecer
a todos os homens e
mulheres, de forma
individual e/ou colectiva
que dia após dia, de forma
abnegada emprestam o seu
saber e arte para a defesa
dos direitos das pessoas
LGBT em Moçambique, em
Africa e no mundo. Pelo
respeito a igualdade de
todos perante a lei,
A LUTA CONTINUA!
AS CORES DO AMOR
DESTAQUE
5
MAIO 2016
Ivete Mafundza (jurista e activista)
IMAGEM: LAMBDA
“POR INCUMPRIMENTO DO ESTADO DAS RECOMENDAÇÕES
FEITAS NO ÂMBITO DO PROCESSO DE REVISÃO DE PARES DAS
NAÇÕES UNIDAS, EM 2011, SOBRE O REGISTO DA LAMBDA”
CONSIDERA IVETE MAFUNDZA
J
urista, docente universitária,
activista
dos
Direitos
Humanos e cantora – avalia
negativamente
o
Estado
moçambicano pelo incumprimento
das recomendações feitas ao nosso
Estado pelos seus pares, durante o
1° ciclo, em 2011, do Mecanismo de
Revisão Periódica Universal (MRPU),
um processo levado a cabo pelo
Conselho dos Direitos Humanos das
Nações Unidas (CDH). Dentre as
recomendações feitas ao Estado
moçambicano,
em
Genebra,
estão as atinentes aos direitos das
minorias sexuais, com particular
destaque para o registo
cont. pág 6
JORNAL DA COMUNIDADE LGBT DE MOÇAMBICANA
AS CORES DO AMOR
6
DESTAQUE
MAIO 2016
da Associação LAMBDA, que tem
o pedido de registo encalhado há
mais de 7 anos, no Ministério da
Justiça.
A jurista fez este pronunciamento
durante uma entrevista exclusiva
concedida ao boletim informativo
da LAMBDA, Cores do Amor,
onde explicou também sobre o
processo de Revisão Periódica
Universal das Nações Unidas, seus
objectivos, grau de implementação
das recomendações pelo Estado
e
o
papel
desempenhado
pelas organizações da sociedade
civil, neste processo.
“O Mecanismo de
Revisão Periódica
Universal (MRPU) do
Conselho dos Direitos
Humanos das Nações
Unidas (CDH) é um
processo de avaliação
sobre o grau de
implementação dos
Direitos Humanos feito
pelos outros Estados
membros das Nações
Unidas, com vista à
melhoria da situação
dos Direitos Humanos
nos países membros
desta organização
internacional”,
explicou.
Ivete Mafundza considera que
é bonito quando se ouve dizer
que Moçambique é um país que
assinou o Pacto Internacional
dos Direitos Civis e Políticos, a
Convenção Contra Todas as Formas
de Discriminação Contra a Mulher,
outrossim que Moçambique é
subscritor da Convenção dos
Direitos da Criança. Mas: “Esta é
apenas a parte política, onde os
Estados assinam estes protocolos,
daí que é mais importante ainda
a fase da implementação destes
compromissos assumidos pelos
Estados”, esclarece a activista.
PRIMEIRA
AVALIAÇÃO
AO
ESTADO – 2011
Ivete Mafundza, que participou do
primeiro ciclo deste processo, em
2011, realizado em Genebra como
parte da delegação da sociedade
civil, entende que: “Há uma crítica
que é feita a este processo, visto
que a avaliação é feita entre os
próprios Estados”. Para Mafundza,
“Muitas vezes aquilo é uma palmada
nas costas”, na medida em que aos
Estados não se fazem “Perguntas
muito difíceis, controversas, nem
recomendações
extremamente
complicadas”,
porque
quando
chega a vez do outro Estado, o
mesmo pode acontecer.
Ao mesmo tempo a activista
reconhece que: “Pouco a pouco os
Estados estão a ganhar a consciência
de que não se pode deixar que as
violações dos Direitos Humanos
avancem pelo mundo inteiro e as
organizações da sociedade civil têm
feito um trabalho muito importante
de lobby, junto dos Estados
avaliadores de forma que suas
preocupações sejam incluídas nas
recomendações dos Estados e, por
fim, sejam resolvidas”. De referir que
as organizações da sociedade civil
apresentaram um relatório paralelo
denominado: “Relatório Sombra”,
onde constam as questões mais
candentes de violação de Direitos
Humanos e que se pretende ver
sanadas.
Segundo a activista, a avaliação
que se fez ao Estado moçambicano
pelos pares em Genebra, em 2011,
foi mediana porque: “Moçambique
tem feito algum esforço de não
só legislar, mas também de
implementar algumas políticas,
normas”. Contudo, para a jurista
ainda não é suficiente porque: “O
nó de estrangulamento está na
polícia, está nas cadeias, está na
fiscalização da legislação, está na
existência de normas, mas de um
fraco cumprimento dessas mesmas
normas”.
NÃO PODEMOS SER UM
PARAÍSO LEGISLATIVO NO PAPEL
E UM INFERNO OU QUASE ISSO
NA PRÁTICA
“A análise é negativa!”. Mafundza
esclarece que: “Já naquela altura,
2011, as organizações da sociedade
civil denunciaram que o Estado
moçambicano não estava a cumprir
com as questões constantes das
convenções relativas aos direitos
das minorias sexuais (o registo da
LAMBDA), violando, desse modo,
os artigos 51 e 52 da Constituição
da República de Moçambique, que
garante a liberdade de associação
e manifestação. Questionado pelos
outros Estados membros sobre o
assunto, Moçambique respondeu
evasivamente, prometendo que iria
cumprir até onde pudesse, dentro
daquela que é a sua soberania. Iria
analisar e ver no que iria cumprir.
Recordo-me muito bem disso. E
desde então até hoje a situação
mantém-se”.
A activista argumenta que a
avaliação é negativa porque: “Não
podemos ser um paraíso legislativo
no papel e um inferno ou quase isso
na prática”. Para esta activista, por
não registar a LAMBDA, “o Estado
moçambicano está a dizer que
DESTAQUE
MAIO 2016
reconhece determinadas pessoas,
determinados tipos de pessoas, com
determinadas orientações, e está a
dizer que não reconhece as outras.
Isso é uma grande discriminação”.
Num outro desenvolvimento, a
docente universitária disse que: “É
uma pena que a LAMBDA não esteja
até agora a levar o caso ao Tribunal,
pois tem tudo para avançar”.
“É uma vergonha para o Estado
moçambicano. Este é um erro que
o Estado está a cometer porque é
o próprio Estado que não vê que
está a perder pontos na dimensão
nacional e internacional”, disse,
reforçando o seu ponto de vista.
Prosseguindo, Ivete
defende que: “O Estado
não pode ser moralista,
porque este Estado
reconheceu legalmente
uma associação
de mulheres
trabalhadoras
do sexo que têm
os seus direitos
salvaguardados
na Constituição da
República, mas não se
entende a recusa do
pedido da LAMBDA!”.
Para a nossa entrevistada, “Não
se trata de proteger as minorias
sexuais. A questão é tentar perceber
o que se passa. Se o Estado
fizesse um trabalho, contactando
experts que viessem explicar o
que é a homossexualidade, o que
é a heterossexualidade, o que
é a assexualidade, quais são os
diferentes tipos de sexualidade,
género no mundo. Se se chamassem
apenas um médico para explicar
o que é que se passa do feminino
ao masculino, o que é que há no
meio. O Estado mudaria totalmente
de ideia”. Para a activista, em
algum momento é uma questão de
desconhecimento e é complicado
para um Estado que se diz estar
a evoluir no âmbito dos Direitos
Humanos.
CONSEQUÊNCIAS DA RECUSA
DO REGISTO
“Eu acho que o impacto é aquele
que todos nós já conhecemos,
negação de personalidade jurídica
a uma instituição que defende os
seus direitos, isso põe em causa o
princípio de liberdade de associação,
e pôr em causa o princípio de
liberdade de associação é falar do
reconhecimento de determinadas
pessoas em detrimento de outras,
o Estado não está a permitir que
determinadas pessoas exerçam os
seus direitos”, disse, acrescentando
que: “As consequências são de
vária ordem. Desde psicológicas,
económicas
até
sociais.
Ou
seja, as pessoas não estão a ser
devidamente protegidas porque
não estão organizadas, estão
vulneráveis à discriminação até do
Estado, de que estão a ser vítimas”.
Para a activista, “Felizmente o
povo moçambicano, tal como é
chamado, é boa gente. Porque
o que nós temos visto, se o
cidadão moçambicano não gosta
dos homossexuais, pelo menos
tolera”. Ainda de acordo com
esta activista, “Temos a Labiba e
Lasanta que são muito acarinhadas.
Fazem espectáculos, actuam em
casamentos, quer dizer, elas têm o
seu espaço e é preciso que tenham o
seu espaço garantido e protegido”.
“Não conheço muitas pessoas
que já demonstraram abertamente a
sua vida a dois, mas conheço alguns
casais que saem juntos e ficam à
vontade e o povo moçambicano
olha, podem falar assim em surdina,
mas simplesmente olham. Agora,
se estas pessoas toleram porque a
vida não é minha. A vida é deles, a
intimidade é deles, quando o
Estado vem e maldiz, menospreza,
discrimina, está a transmitir uma
mensagem para o povo que é uma
mensagem de intolerância. E isto pode e está a afectar
negativamente. E no meu ponto de
vista, não é o Estado quem deve
fazer isso. Pelo que é uma atitude
errada e deve-se a todo o custo
corrigir nem que seja por meios
judiciais”, vincou
Vale recordar que em
Janeiro último, 4 anos
depois, Moçambique
voltou a ser avaliado
pelos seus pares em
Genebra e novamente
a tónica incidiu sobre
o registo da LAMBDA,
incluindo a criação
de condições de um
ambiente favorável
para a livre expressão
da orientação sexual e
identidade de género,
o que se aguarda a
posição do Estado
moçambicano, se
acolhe ou não as
recomendações ■
JORNAL DA COMUNIDADE LGBT DE MOÇAMBICANA
7
8
AS CORES DO AMOR
ENTREVISTA
lambda
É PARTE DA NOSSA NAÇÃO SERMOS
PROGRESSISTAS, SERMOS
TOLERANTES E ACEITAR PESSOAS QUE
AMAM OUTRAS PESSOAS
D
e
acordo
com
a
embaixadora do Reino
dos Países Baixos, em
Moçambique, Pascalle
Grotenhuis, o tabu à volta da
homossexualidade foi ultrapassado
há muitos anos no seu país. Segundo
a embaixadora, “É parte da nossa
nação sermos progressistas, sermos
tolerantes e aceitar pessoas que
amam,
independentemente
do
sexo. É óbvio que nós também
progredimos. Em 2000, fomos o
primeiro país do mundo a aceitar
relações entre pessoas do mesmo
sexo. Isso me orgulha!”
A entrevista teve lugar na sede da
Embaixada do Reino dos Países
Baixos, em Outubro de 2015, onde
a nossa equipa foi recebida com
Pascalle Grotenhuis, Embaixadora do Reino dos
Países Baixos, em Moçambique.
IMAGEM: LAMBDA
gentileza pela embaixadora e sua
equipa, um sinal inequívoco das
excelentes relações entre as duas
instituições que já juntas trabalham
desde a constituição da LAMBDA.
Um apoio que se revelou e continua
a ser imprescindível para o desafio
e esforços empreendidos por esta
organização de defesa e promoção
dos direitos das minorias sexuais.
ENTREVISTA
lambda
Durante a entrevista, a embaixadora falou também sobre os avanços
e a situação dos Direitos Humanos
[das minorias sexuais] no país, bem
como sobre a relação com a LAMBDA.
De acordo com a embaixadora, os
Direitos Humanos ocupam um lugar de relevo nas relações bilaterais com Moçambique, uma relação
que já existe antes da independência em Moçambique, sendo com
base em respeito pelas liberdades
e Direitos Humanos. Actualmente,
o Reino dos Países Baixos apoia vários projectos em que se destacam
as áreas de igualdade de género,
saúde sexual e reprodutiva, democracia e economia inclusiva. Instada
a embaixadora a comentar sobre o
estágio dos Direitos Humanos das
minorias sexuais, referiu que: “Estou em Moçambique há apenas 3
meses, então ainda estou a aprender. Tenho conversado com muitas
pessoas de modo a perceber bem
o cenário. Mas, ainda assim, vejo alguns exemplos positivos. Vejo que
Moçambique já assinou vários tratados sobre os Direitos Humanos, por
exemplo a Lei do Trabalho diz que
os homossexuais não podem ser
discriminados”.
Para a embaixadora, em Moçambique o que existe são boas intenções
manifestadas através de leis, mas as
práticas precisam ainda muito de
ser melhoradas. “Vejo que existe
uma distância entre a teoria e a prática. Existe ainda alguma discriminação contra alguns grupos minoritários”. Grotenhuis disse ainda que
tem acompanhado com muita preocupação as notícias sobre violência
contra os albinos, como também
sobre os casamentos prematuros;
e que, por isso, há muito trabalho
a ser feito e a Embaixada está disponível para ajudar nesse processo.
Relativamente a acções que possam concorrer para a mudança
de comportamentos, práticas e
atitudes em relação à discriminação
contra os homossexuais, e não só,
em qualquer contexto, a embaixadora defende que o primeiro passo
é a criação de espaços onde os
jovens possam falar de forma transparente sobre assuntos candentes.
“Eu acho que o que é
realmente importante,
e que é o começo, é a
criação de um espaço
aberto onde os jovens
possam ser educados
sobre a sexualidade,
sobre relacionamentos entre pessoas do
mesmo sexo, sobre
os casamentos precoces, sobre os males da
discriminação. E esse
espaço é a escola, é a
comunidade”.
Para a embaixadora, só o diálogo
pode criar um ambiente tolerante
às diferenças, “O diálogo transparente é a base para resolver
qualquer problema”.
Ainda no que toca à tolerância, Pascalle Grotenhuis comparou a reacção do seu avô quando soube da
orientação sexual do seu tio gay a
reacção dos seus filhos a informações similares, dizendo: “Eu tenho
um tio gay, e eu ainda me lembro
que o meu avô, já falecido, ficou
muito chocado quando descobriu.
Foi um grande choque para ele,
nós somos de uma pequena vila.
Hoje quando olho para os meus filhos, três gerações depois, vejo que
para eles é completamente normal.
Eles têm amigos com pais homossexuais. É possível ver que, por um
lado, é uma questão de gerações e,
por outro lado, um contraste entre a
vida no campo e na cidade”.
No que tange ao estágio dos Países Baixos relativamente aos direitos das minorias sexuais, à aceitação dos relacionamentos entre
pessoas do mesmo sexo, Pascalle
Grotenhuis referiu-se nos seguintes termos: “Eu acho que é incrível!
Deixa-me orgulhosa. Desde o ano
2000, os casamentos entre pessoas
do mesmo sexo são legais, fomos o
primeiro país do mundo a legalizá-los e temos visto muitos outros países a seguirem o nosso exemplo. É
um legado dos Países Baixos e eu
acho que é parte do nosso DNA [risos]. A Holanda é um país de referência para a comunidade LGBT a
nível mundial, em cada cidade há
bares gays, organizações LGBT”.
Ainda no que concerne ao compromisso daquele país europeu com a
questão dos direitos fundamentais
das minorias sexuais, Pascalle Grotenhuis disse que o Governo do seu
país tem um embaixador de Direitos Humanos que lida com todas
as matérias relacionadas, “Para nós
tornou-se tão normal, muitos dos
meus colegas nos serviços diplomáticos são gays e são casados. Eu não
sei se nós temos muitas mulheres
lésbicas no serviço diplomático no
estrangeiro, mas temos um grupo
focal especial dentro dos serviços
diplomáticos que é muito forte.”
cont. pág 10
JORNAL DA COMUNIDADE LGBT DE MOÇAMBICANA
9
10
AS CORES DO AMOR
ENTREVISTA
lambda
É PRECISO CONTAR HISTÓRIAS
POSITIVAS DE HOMOSSEXUAIS
Para a embaixadora, a LAMBDA deve
trabalhar de forma a dar visibilidade
a histórias da vida de pessoas homossexuais.
“É preciso contar histórias positivas
de homossexuais que vivem em Moçambique, precisa-se de informação
positiva sobre homossexuais e a
homossexualidade. “Eu acho que
só assim se pode contribuir para a
abertura da sociedade”. Para Grotenhuis, é também preciso garantir
informação correcta para os jovens
gays “porque é difícil quando os jovens descobrem-se gays e não têm
informação”. Pascalle Grotenhuis, Embaixadora do Reino dos
Países Baixos, em Moçambique.
IMAGEM: LAMBDA
Ao mesmo tempo a
embaixadora refere
que: “É importante
respeitar o contexto
cultural de cada país,
entretanto é também
preciso pensar no
assunto. Estamos
num país que tem o
seu contexto, mas é
preciso encontrar a
melhor maneira de
disseminar a vossa
mensagem, é preciso
muita educação,
talvez o melhor não
seja dar conferências
públicas, mas falar
com os ministros,
organizações e outras
pessoas sobre o
assunto. Na Holanda,
faz-se assim” ■
ENTREVISTA
lambda
Roberto Paulo, Oficial de Mobilização
Comunitária, Saúde e HIV, da LAMBDA
IMAGEM: LAMBDA
OS VALORES DE ALGUMAS PESSOAS SOBREPÕEM-SE ÀS
SUAS OBRIGAÇÕES LABORAIS
Assim reagiu Roberto Paulo, oficial
de Mobilização Comunitária, Saúde
e HIV, da LAMBDA, durante a entrevista realizada em Fevereiro último,
em Maputo, quando questionado
sobre que tipo de constrangimentos a organização tem enfrentado
no âmbito da implementação do
programa de formação de Agentes
Comunitários que têm em vista dar
resposta ao HIV, no seio da população de homens que fazem sexo com
homens (HSH), um programa que a
LAMBDA tem estado a implementar
em oito (8) províncias do país, des-
de 01 de Julho de 2015. De acordo
com o nosso entrevistado, “Há segmentos que tendem a tomar decisões baseadas nos seus valores morais, ignorando todas as evidências
e informação resultante de pesquisas que é feita e divulgada”
“Não temos apenas
constrangimentos
ligados a recursos
financeiros, mas é
preciso dizer que, às
vezes, temos situações
em que os valores
morais de algumas
pessoas sobrepõemse às suas obrigações
laborais”.
Como isso se manifesta? “Temos
situações em que, por exemplo,
alguém que responde por um sector
numa província recebe um ofício,
um convite para uma actividade,
mas porque essa pessoa coloca
os seus valores religiosos, culturais
ou morais em frente, acaba não
respondendo profissionalmente”,
JORNAL DA COMUNIDADE LGBT DE MOÇAMBICANA
11
12
AS CORES DO AMOR
ENTREVISTA
lambda
esclarece. “Quer dizer, se eu sou
uma pessoa homofóbica, contra a
homossexualidade, e recebo um
convite para participar ou indicar
um colega para participar de
uma formação sobre direitos das
minorias sexuais, logo vou julgar
com base nas crenças e valores que
eu defendo e simplesmente não vou
como também não indico ninguém
para participar da formação”,
continuou o nosso interlocutor,
acrescentando que: “Os meus
valores
como
indivíduo
vão
sobrepor-se às minhas obrigações
e acabam criando prejuízo num
programa que à luz das minhas
obrigações profissionais não devia
ter agido assim”.
“Às vezes, temos percebido que
alguns dirigentes da área da Saúde
posicionam seus valores morais em
frente e não as evidências de estudos que todos temos acesso”, realçou Roberto Paulo, apresentando
como exemplo a directriz de apoio
às populações-chave, que foi engavetada no Ministério da Saúde.
“Já há estudos
nacionais e
internacionais feitos
por universidades de
grande renome e as
evidências mostram
que para fazer recuar
o HIV e SIDA é preciso
que haja intervenções
nessas populações. E
esses estudos estão
disponíveis, mas há
segmentos que tendem
a tomar decisões
baseadas em seus
valores culturais e/
ou morais, ignorando
todas as evidências e
informação resultante
de pesquisas que é
feita e divulgada”,
atestou.
De acordo com o nosso entrevistado, ao treinar Agentes Comunitários
em matérias de HIV e SIDA, incluindo a questão dos Direitos Humanos, a LAMBDA contribui na resposta
às necessidades da comunidade de
homens que fazem sexo com homens em matérias ligadas à saúde.
Uma vez tratar-se de um grupo estigmatizado e vulnerável a infecções
de transmissão sexual, espera-se
ainda que os agentes saibam sensibilizar os seus pares para adopção
de práticas sexuais seguras, falar
correctamente sobre ITS, HIV, e garantir que a comunidade HSH tenha
acesso a insumos de prevenção tais
como o preservativo e gel lubrificante à base de água, fornecidos
pela LAMBDA.
“Este programa iniciou em Julho
de 2015 e é financiado pelo Fundo
Global. Através deste programa, a
LAMBDA pretende, até 2017 – ano
previsto para o término do projecto – alcançar cerca de 6000 HSH
– homens que fazem sexo com homens, nas oitos (8) províncias onde
o mesmo é implementado”, referiu
Roberto Paulo, elucidando sobre
quando é que se considera que um
determinado beneficiário foi alcançado: “É aquele que, pelo menos
duas vezes, tenha contactado um
agente comunitário”. Entretanto,
Roberto Paulo esclarece que: “Afigura-se importante que o beneficiário tenha um contacto contínuo com
o agente de forma a beneficiar-se
de insumos de prevenção a longo
prazo e aconselhamento em maté-
rias de HIV e SIDA”.
É UMA PENA QUE AS FORMAÇÕES SEJAM MUITO CARAS
Falando sobre o custo das formações, sem, no entanto, informar sobre os números envolvidos, o nosso
entrevistado referiu que as mesmas
consomem parte considerável do
valor alocado, o que, por uma questão de estratégia, a “LAMBDA tem
estado a incluir, nas formações, os
provedores de Saúde, que são os
médicos, os enfermeiros e o pessoal de aceitação, sendo o pessoal
de aceitação os responsáveis pela
abertura da ficha do doente, o servente”. Continuando, Roberto Paulo justifica que: “Decidiu-se incluir o pessoal
de aceitação porque muitas vezes
para ter acesso ao médico depende-se muito do que o paciente vai
encontrar em termos de aceitação
com o servente e se for um servente homofóbico ou que não tenham
informação sobre identidade de género e o paciente seja uma mulher
ou homem transgénero, por exemplo, o servente vai pegar no Bilhete de Identidade (BI) do paciente e
questionar sobre o nome do BI e o
traje do paciente e, em algum momento, o paciente sentir-se-á mal
acolhido porque falta informação
daquele profissional, o que pode
não retornar à unidade sanitária”.
Roberto Paulo diz ainda que: “Os
membros da comunidade têm informado sobre este tipo de questões,
daí que a LAMBDA decidiu, estrategicamente, incluir estes profissionais e os próprios provedores nas
formações e os mesmos têm-nos
aconselhado a aumentar o número
de pessoas treinadas”.
ENTREVISTA
lambda
Para Roberto Paulo,
“Quando no fim
da formação um
enfermeiro diz muito
obrigado pela formação
e que seria bom se
mais colegas meus
passassem por uma
formação igual, é sinal
de reconhecimento
de que, se calhar,
algumas atitudes
discriminatórias
que os membros da
comunidade reportam
das unidades sanitárias
acontecem por falta de
informação”.
Na sequência da mesma questão,
o nosso interlocutor entende que
muitos profissionais de Saúde não
têm informação sobre questões
como identidade de género e orientação sexual, referindo que: “Se eu
passei por um curso de enfermagem e ninguém me disse que nem
todas as pessoas que nascem com
genitálias masculinas é porque têm
identidade de homem ou o contrário, significa que estas pessoas têm
de aprender isso em algum sítio e é
natural que reajam com alguma estranheza quando recebem nos seus
consultórios, algum paciente trajado de forma contrária àquilo que
são as expectativas sociais”.
“É preciso perceber que as pessoas
precisam destas informações. É
uma pena que estas formações sejam muito caras, o que torna difícil
para a LAMBDA aumentar o número
de pessoas treinadas, porque não
temos recursos para isso. É por isso
que temos estado empenhados em
acções de advocacia para que estas
necessidades sejam incorporadas
nos planos do Ministério da Saúde”,
rematou o nosso entrevistado.
DIÁLOGO COM O MINISTÉRIO
DA SAÚDE
No que respeita ao diálogo já iniciado com o Governo, concretamente
com o Ministério da Saúde, o nosso
interlocutor diz já ter sido elaborada uma directriz que vai garantir a
provisão de serviços de saúde amigáveis às populações-chave, sendo
que se aguarda neste momento a
sua aprovação.
“Apesar de se reconhecer a importância da sua aprovação, a mesma
anda encalhada no ministério de tutela, lamenta Roberto Paulo, garantindo que já foi elaborada a directriz
para atendimento amigável às populações-chave, pelo que aguardamos a sua aprovação pela ministra,
mas como sabe, instrumentos como
esses – que mexem com sensibilidades de alguns segmentos do nosso
Governo – acabam ficando encravados nas gavetas do ministério. Esperamos que seja aprovado porque
à luz da tal directriz ficou estabelecido que vai ser responsabilidade do
Ministério da Saúde garantir que as
pessoas vão para os cursos de medicina, enfermagem e aprendam
sobre questões ligadas à identidade de género e orientação sexual e
que não sejamos nós, LAMBDA, uma
pequena organização da sociedade
civil, a ter que mobilizar recursos
para treinar enfermeiros que, em
princípio, já deviam aprender sobre
esses conteúdos nos seus cursos de
formação”.
Quisemos saber das expectativas
em relação ao projecto que, segundo o nosso entrevistado, têm
metas ambiciosas. Roberto Paulo
prosseguiu: “Espero honestamente
podermos estar a contribuir para
elevar o nível de consciência pública sobre os direitos e liberdades, ou
seja, que até 2017, tenhamos conseguido mudar significativamente
o ambiente que se vive no país, no
que respeita à questão do acesso à
saúde para a população de homens
que faz sexo com homens”.
Para o nosso
entrevistado, “Apesar
de em Moçambique não
se reportaram casos
de violência física,
temos ainda muitos
problemas ligados
à discriminação
decorrente da
identidade de género
e orientação sexual e,
por isso, espero que,
com este programa,
possamos conseguir
alcançar os resultados
programados e que
mais pessoas tenham
acesso a insumos de
prevenção. Que as
pessoas, no geral,
saibam o perigo
que representam as
diferentes práticas e
como prevenir-se” ■
JORNAL DA COMUNIDADE LGBT DE MOÇAMBICANA
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NOTÍCIAS
lambda
IMAGEM: GOOGLE
“É POSSÍVEL QUE
ÁFRICA SE TORNE
MENOS HOMOFÓBICA
AO LONGO DO TEMPO”,
REFERE RELATÓRIO DO
AFROBARÓMETRO
O
s jovens africanos e mais instruídos tendem a ser mais tolerantes para com os homossexuais do que os cidadãos africanos
mais velhos e menos instruídos”, indica o
relatório do Afrobarómetro sobre Tolerância em África,
proveniente da 6ª Ronda (2014/2015), lançado a 01 de
Março, em Maputo.
Realizado em 33 países africanos com uma amostra
de 5400 pessoas e um nível de confiança de 95%, o
documento refere que:
“Existe uma ligação entre
tolerância para com os
homossexuais e a idade e níveis de
instrução dos inquiridos”.
NOTÍCIAS
lambda
Para a equipa do Afrobarómetro,
“Embora as actuais atitudes dos
africanos sejam em grande parte
negativas, é possível que África
se torne progressivamente menos
homofóbica ao longo do tempo”.
O inquérito foi realizado considerando cinco indicadores onde se
destacam educação e proximidade
aos meios de comunicação social
como os principais catalisadores do
aumento da tolerância no continente africano.
Segundo o documento em alusão,
“A grande maioria dos países africanos são intolerantes em relação
aos cidadãos homossexuais. Entre
os 33 países, uma média de 78%
dos inquiridos dizem que: “Não
gostariam nada” ou “Não gostariam tanto” de terem um vizinho
homossexual. Ao mesmo tempo, o
documento refere que:
“Nem toda a África é
homofóbica. A maioria,
em quatro países
(Cabo Verde, África
do Sul, Moçambique
e Namíbia) e mais
de quatro em cada
10 cidadãos em
três outros países,
gostariam ou não, se
importariam de ter
vizinhos
homossexuais”.
em África é que a maior parte dos
cidadãos são intolerantes às pessoas diferentes – quer essa diferença seja baseada na etnia, religião,
nacionalidade, filiação política ou
orientação sexual. Contudo, as respostas às diferentes perguntas do
Afrobarómetro sobre tolerância sugerem que esta generalização seja
incorrecta.
REGISTO DA LAMBDA PENDENTE
Apesar de o inquérito do Afrobarómetro referir que em Moçambique a
maioria dos cidadãos expressa aceitação e ou não se importa em ter
vizinhos que sejam homossexuais,
aliado ao facto de, em 2014, o país
ter despenalizado a homossexualidade com a entrada em vigor do
novo Código Penal, a LAMBDA, única
organização LGBT do país, continua
há mais de 7 anos com o pedido de
registo da organização pendente no
Ministério da Justiça.
Na senda dos resultados do
inquérito do Afrobarómetro,
importa referir que o
estudo “Atitudes perante a
Homossexualidade nas cidades de
Maputo, Beira e Nampula”, levado
a cabo pela LAMBDA, em 2013,
refere que:
“Há uma tendência
entre a população
em tolerar ou aceitar
as práticas entre
os homossexuais
quando se trata de um
indivíduo não próximo
das suas relações
sociais”.
De acordo ainda com o mesmo estudo, os inqueridos mostraram-se
indiferentes, aceitam e/ou toleram
quando são figuras como médicos,
professores etc., mas quando se
trata do(a) filho(a) que assuma essa
identidade, a tendência é fazer com
que o(a) mesmo(a) mude de ideias.
Em termos percentuais, os dados
indicam que esta afirmação é verdadeira para cerca de 32.2% das pessoas em Nampula e 29.4% na cidade
da Beira. A cidade de Maputo foi a
única em que a maior parte (37.9%)
dos entrevistados respondeu que
aceitaria ter um filho que admitisse
publicamente ser homossexual em
detrimento dos que fariam mudar
de ideia (23%) ■
De acordo com o mesmo documento, entre os 33 países, a grande maioria dos cidadãos africanos
mostram uma elevada tolerância a
pessoas de grupos étnicos diferentes (91%); às pessoas de religiões diferentes (87%), aos imigrantes (81%)
e às pessoas portadoras de HIV/
SIDA (68%). Uma narrativa comum
JORNAL DA COMUNIDADE LGBT DE MOÇAMBICANA
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AS CORES DO AMOR
NOTÍCIAS
lambda
REALIZADO EM JOANESBURGO
AUTORIDADES MOÇAMBICANAS GAZETAM SEMINÁRIO REGIONAL
SOBRE VIOLÊNCIA E DISCRIMINAÇÃO BASEADA NO GÉNERO
Particinpantes do Seminário
IMAGEM: LAMBDA
A
s autoridades moçambicanas, nomeadamente
o Ministério da Justiça,
Assuntos Constitucionais
e Religiosos e a Comissão Nacional
dos Direitos Humanos – CNDH, gazetaram o primeiro seminário regional (zona austral) sobre Violência e
Discriminação baseada no Género
Contra cidadãos LGBT - Lésbicas,
Gays, Bissexuais e Transexuais, realizado na primeira semana de Março
(03 a 05), na cidade sul-africana de
Joanesburgo.
Organizado pela Comissão Nacional
dos Direitos Humanos da África do
Sul e com o apoio do Governo local,
o mesmo teve como mote encontrar
soluções práticas para enfrentar a
violência e discriminação baseada
no género contra pessoas homossexuais, o seminário surge como
seguimento à Resolução 275, aprovada pela Comissão Africana dos Direitos Humanos e dos Povos na sua
55ª sessão, realizada nos meses de
Abril e Maio de 2014.
Entretanto, para o activista Danilo
da Silva, que participou do evento
na qualidade de único representante
moçambicano, em representação à
LAMBDA, disse que:
“Apesar dos enormes
entraves que ainda
limitam o exercício de
direitos e liberdades
por parte dos cidadãos
LGBT, nos países da
região e não só, o
NOTÍCIAS
lambda
seminário constituiu
um marco histórico e
é também uma vitória
para o movimento
LGBT regional,
considerando que
o mesmo teve
suporte do governo
o sul-africano, o que
elucida o nível de
preocupação em
relação ao impacto
e malefícios da
violência contra
cidadãos LGBT.
Por outro lado,
Danilo da Silva
lamentou pelo facto
de as autoridades
moçambicanas não se
terem feito presente
no evento, o que é
também revelador do
nível de preocupação
sobre a matéria.
Na sua intervenção de abertura,
Michael Masutha, Ministro da
Justiça e Serviços Correccionais
da África do Sul, referiu que o
governo sul-africano está atento
e a trabalhar na estratégia
produzida em 2014, para dar
resposta à violência baseada no
género contra os LGBT,
“Condenamos a
violência e outras
violações dos Direitos
Humanos, incluindo
assassinatos,
estupros, assaltos
Particinpantes do Seminário
IMAGEM: LAMBDA
e outras formas
de perseguição de
pessoas com base
na sua orientação ou
identidade de género”. De acordo com o ministro,
“O governo sul-africano tem
demonstrado compromisso através
da estratégia de intervenção lançada
em 2014, com a qual já foi possível
condenar em 30 anos de prisão
o assassino [violador correctivo]
da jovem Duduzile Zozo. Para o
ministro, a condenação do assassino
de Duduzile: “É uma evidência clara
da postura agressiva adoptada pelo
sistema judicial sul-africano”.
Durante o seminário as discussões
estiveram centradas em temas relativos à defesa para a reforma legislativa e política, incluindo o combate
à violência por meio da educação
e da política, usando os tribunais e
processos judiciais para resolver crimes de ódio [homofobia] perpetrados contra os LGBT nos países da
região austral, também foi produzida uma declaração que deve ser
partilhada com as autoridades dos
países da região.
Incluindo a África do Sul, também
participaram do seminário os representantes das repúblicas do Lesoto,
Tanzânia e Botswana ■
JORNAL DA COMUNIDADE LGBT DE MOÇAMBICANA
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AS CORES DO AMOR
NOTÍCIAS
lambda
DURANTE O EVENTO ALUSIVO
AO DIA INTERNACIONAL DAS
MULHERES COMUNIDADE
LGBT JUNTOU-SE ÀS
FESTIVIDADES E REITEROU
APOIO À LUTA DAS MULHERES
Visitantes do stand da LAMBDA durante a feira.
IMAGEM: LAMBDA
A
LAMBDA – Associação
Moçambicana para Defesa das Minorias Sexuais - em formação,
participou no dia 05 de Março do
corrente ano, no espaço da FEIRA
Municipal de Flores, Gastronomia e
Artesanato (FEIMA), em Maputo, subordinado ao tema: “No Caminho
da Igualdade”, evento enquadrado
NOTÍCIAS
lambda
nas comemorações do Dia Internacional da Mulher que se celebra a
cada dia 8 de Março de cada ano.
Organizada pelo Ministério do Género, Criança e Acção Social (MGCAS), em parceria com a Delegação
da União Europeia em Maputo, o
evento foi corporizado por palestras,
concertos musicais, declamação de
poesia, onde o momento mais alto
foi marcado pela apresentação de
performances de canto e dança protagonizados por Drags, Bruna Tatiana, Kyria e Susher, em representação
à LAMBDA, um momento bastante
aplaudido pelo público presente
como também registado em vídeos
e fotografias. Ainda no palco, Susher
aproveitou a oportunidade para dizer parabéns às mulheres pela efeméride, reiterando que a LAMBDA
apoia e identifica-se com a luta pela
igualdade.
Entretanto, antes do espectáculo
musical a agenda foi preenchida por
debates todos em torno de temas
ligados à mulher, subordinados aos
seguintes temas: Mulher e o meio
ambiente; A prevenção do casamento prematuro; O atendimento às vítimas de violência baseada no género
e O empoderamento da Mulher. E
foi no terceiro painel que o jornalista e também activista dos Direitos
Humanos, Samuel Matusse, interveio questionando sobre a violência
contra mulheres lésbicas, que, para
o jornalista, não acontece apenas no
seio familiar, mas também na escola
e no trabalho. Segundo Samuel Matusse, “É preciso que ao reflectir-se
sobre a violência baseada no género
a questão das mulheres lésbicas não
seja marginalizada”. De acordo com o comunicado da
União Europeia, “A igualdade de
género é fundamental para uma
sociedade justa e próspera. Não
é apenas uma questão de Direitos
Humanos, democracia e boa governação. É também essencial para o
crescimento económico e o desenvolvimento sustentável de um país.
É positivo para todos”.
A par de outras
organizações da
sociedade civil que
participaram do
evento, os activistas
da LAMBDA estiveram
empenhados na
distribuição de
materiais informativos,
insumos de prevenção,
materiais da campanha
“Diferentes, mas
iguais” e explicação
sobre o trabalho da
LAMBDA, objectivos,
visão e missão da
organização.
As actividades referentes às comemorações do dia Internacional da
Mulher decorreram de 5 de Março
e prolongaram-se até ao dia 12 do
mesmo mês
“No Caminho da
Igualdade”, evento
enquadrado nas
comemorações do
Dia Internacional da
Mulher que se
celebra a cada dia 8
de Março de cada
ano.
Visitantes do stand da LAMBDA durante a feira.
IMAGEM: LAMBDA
JORNAL DA COMUNIDADE LGBT DE MOÇAMBICANA
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AS CORES DO AMOR
NOTÍCIAS
lambda
após o êxito da sua campanha para
obter a descriminalização da homossexualidade em Junho passado.
O código penal revisto
retirou uma cláusula
da era colonial que
bania “vícios contra a
natureza”.
Na publicação em referência, lê-se
ainda que Moçambique é conhecido por ter uma atitude mais relaxada à homossexualidade do que em
alguns outros países africanos, todavia a falta do registo da LAMBDA
[pendente há mais de 7 anos no Ministério da Justiça], única organização dos direitos dos LGBT no país,
impede que a organização se beneficie de outros direitos previstos na
Lei, o que seria mais um passo para
a aceitação da comunidade gay, no
país.
Activista na campanha da LAMBDA
IMAGEM: LAMBDA
DEPOIS DO THE NEW YORK
TIMES
JORNAL BRITÂNICO
THE GUARDIAN
DESTACA TRABALHO
DA LAMBDA
O
jornal britânico The
Guardian
destacou,
na sua edição digital
de 10 de Fevereiro de
2016, o trabalho da LAMBDA ao incluir Moçambique numa lista de 5
outros países que a nível mundial
têm avançado em matéria dos direitos LGBT. Segundo aquele jornal, a comunidade gay de Moçambique teve
muito que comemorar em 2015,
De recordar que ainda
em Janeiro do presente
ano, o jornal norteamericano The New York
Times também destacou
o trabalho da LAMBDA,
citando-a como uma
organização que tem
contribuído no combate
ao estigma sobre a
homossexualidade em
todo o país.
Além de Moçambique, o The Guardian listou a Colômbia, o Nepal, a
Jamaica, o Taiwan e o Vietname,
como países que têm vivido mudanças legais e sociais favoráveis à livre
expressão das diversas orientações
sexuais e identidades de género ■
...
lambda
JORNAL DA COMUNIDADE LGBT DE MOÇAMBICANA
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AS CORES DO AMOR
NOTÍCIAS
lambda
NAIR BASTOS
VESTIU “DIFERENTES, MAS IGUAIS”,
CAMPANHA DA LAMBDA
A
apresentadora de televisão, TVM, Nair Bastos,
vestiu em Dezembro último a camiseta da campanha de advocacia da LAMBDA, denominada “Diferentes, mas iguais”.
O facto deu-se no dia 10 de Dezembro, dia Internacional dos Direitos
Humanos.
Nair Bastos apresentou o programa
“Alta Tensão” da data em referência,
trajando a camiseta desta campanha
incentivada pelo jovem estilista Ka-
mana Félix. De acordo com Kamana,
o dia 10 de Dezembro foi uma data
oportuna para costumizar uma camiseta da LAMBDA e vestir a apresentadora como forma de promover o seu
trabalho, mas também enviar uma
mensagem contra a discriminação
contra as minorias sexuais, no país
Nair Bastos, Apresentadora de televisão,
TVM, vestiu em Dezembro último a
camiseta da campanha de advocacia da
LAMBDA
IMAGEM: LAMBDA
“Diferentes, mas
iguais” surge em
resposta ao estigma
e preconceito a
que as pessoas
LGBT – Lésbicas,
Gays, Bissexuais e
Transexuais, estão
sujeitas na sociedade
moçambicana ■
NOTÍCIAS
lambda
NA CIDADE DA BEIRA
COMUNIDADE LGBT JUNTOU-SE À
MARCHA CONTRA TRÁFICO DE ALBINOS
M
embros e activistas
da comunidade LGBT
(Lésbicas, Gays, Bissexuais e Transexuais)
residentes na cidade da Beira participaram, em Janeiro último, de uma
marcha contra o tráfico de albinos,
uma iniciativa levada a cabo pela organização PNDH - Pressão Nacional
dos Direitos Humanos realizada em
parceria com a Associação de Albinos, delegação de Sofala.
Realizada sob o mote “Abaixo o tráfico de pessoas com problemas de
pigmentação da pele”, e com objectivo de sensibilizar a sociedade
sobre a necessidade de se pôr fim
à onda de sequestros e assassinatos
perpetrados contra cidadãos albinos. A mesma esteve enquadrada
no âmbito das actividades de promoção dos Direitos Humanos.
Do evento, participaram pouco mais
de quatro centenas de pessoas com
destaque para representantes do
governo provincial, do gabinete do
edil da cidade, representantes de organizações da sociedade civil e cidadãos no geral, onde, na sua maioria,
empunhavam dísticos com mensagens de apelo ao fim do tráfico de
pessoas albinas. “De forma geral, a nossa participação foi positiva”, disse Micky Beula,
assistente Provincial da LAMBDA, na
cidade da Beira. Para Micky Beula,
Comunidade LGBT marchando na Cidade da Beira
IMAGEM: LAMBDA
os albinos merecem ser tratados de
forma igual a todos outros cidadãos,
uma vez que não escolheram a sua
condição. Lembrando que é tarefa
de toda a sociedade velar pela sua
segurança. Nesta, a LAMBDA fez-se
representar com 13 activistas.
Ao participarem desta marcha, a comunidade LGBT, em representação
à LAMBDA, reafirmam o seu compromisso de combate não apenas
contra a discriminação e violação de
Direitos Humanos das minorias sexuais, mas, sim, o comprometimento
com os direitos de todos os moçambicanos no geral ■
JORNAL DA COMUNIDADE LGBT DE MOÇAMBICANA
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AS CORES DO AMOR
NOTÍCIAS
lambda
MÃE, PAI, SOU GAY!
S
e algum dia ouvir estas palavras do seu filho ou filha,
fique grato, pois elas representam um elevado nível de
confiança!
Muitas vezes falamos sobre o processo de descoberta e auto-aceitação
das pessoas LGBT, mas é importante que se fale também do processo
pelo qual pais e mães passam ao
descobrir esta verdade sobre os seus
filhos. O processo de auto-aceitação
varia bastante de pessoas para pessoa, e tem influência de vários factores, sendo um dos principais o ambiente social e familiar em que está
inserido. Após ultrapassar as barreiras de aceitação internas, os jovens
Ilustração de uma famila
IMAGEM: LAMBDA
LGBT devem depois partilhar este
segredo com a família e amigos, o
que nem sempre é fácil. O estudo:
“Atitudes perante a homossexualidade nas cidades de Maputo, Beira
e Nampula”, realizado no ano de
2013, cita que:
“Há uma tendência entre
a população em tolerar ou
aceitar as práticas entre
os homossexuais quando
se trata de um indivíduo
não próximo das suas relações sociais”.
O sentido generalizado de homofobia presente na nossa sociedade actual faz com que não só as pessoas
LGBT sejam discriminadas e repreendidas, mas também as suas famílias
e amigos; dificultando, assim, que
estes tomem uma posição de apoio,
por sentirem que “incentivam” algo
que traz vergonha para a família e
contribui para a desvalorização dos
valores. Antes de tudo, é importante
que perceba que a homossexualidade não é uma doença e de forma alguma deve ser motivo de vergonha.
Informe-se, leia e reflicta. Procure
entender o seu filho e esforce-se de
modo a fortificar a confiança e amor
NOTÍCIAS
lambda
que ele depositou em si ao contar-lhe que é homossexual. Entenda
que a orientação sexual do seu filho
é apenas uma fracção de quem ele
é. Mantenha sempre em mente as
outras qualidades que aprecia nele.
Por não compreenderem bem a
questão da homossexualidade, há
pais que submetem os seus filhos
a tratamentos (psicológicos, tradicionais e/ou religiosos). Esta é uma
atitude de negação que tem efeitos
bastante nocivos para o bem-estar
dos seus filhos, podendo causar danos irreparáveis.
Tentar perceber “Porquê o meu filho é homossexual?” poderá criar
um sentimento de culpa virada para
o pai ou mãe (“o que fiz de errado?”) ou para os outros, influências
mais próximas (outros membros da
família) ou mais distantes (mídia,
amigos, etc.).
Em Moçambique, há organizações
que oferecem serviços de várias
áreas, com profissionais preparados
para ajudar-lhe com o que for necessário.
Procure por este apoio, pois o ajudará a melhor desempenhar o seu
papel e superar as suas dificuldades
junto da sua comunidade.
A LAMBDA é uma dessas
organizações que fornece
insumos, informação
e apoio psicossocial
e jurídico. Acesse ao
website lambdamoz.org
para mais informação ■
Não faz diferença saber
porquê o seu filho é gay,
esteja apenas presente,
preste apoio e dê amor.
Após solidificar o seu
entendimento sobre a
questão, prepare-se para
ajudar o seu filho ou filha
a enfrentar os demais.
Como pai ou mãe deverá
estar apto para expor
o seu ponto de vista de
forma positiva, apoiando
sempre o seu filho ou
filha. Use a sua posição
para modificar atitudes,
pois cada um pode ser
um ponto de viragem
nesta luta, por isso,
em vez de afastar-se
promova um diálogo
informador.
JORNAL DA COMUNIDADE LGBT DE MOÇAMBICANA
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AS CORES DO AMOR
NA PRIMEIRA PESSOA
lambda
“SER HOMEM
GAY EM
MOÇAMBIQUE
NÃO É FÁCIL!”
DANIEL MATE
Daniel Mte
IMAGEM: LAMBDA
D
evido à homofobia, as
experiências de vida narradas na primeira pessoa
por cidadãos homossexuais continuam ainda escassas em
contextos adversos à livre expressão
das identidades de género e orientação sexual. Ao mesmo tempo, há
os que de peito aberto enfrentam as
adversidades e rompem com a invisibilidade forçada de uma comunidade estigmatizada, vivendo de forma aberta a sua orientação sexual,
como também dando a conhecer as
suas experiências de vida, ajudando, assim, a diluir a concepção “generalizada” e estereotipada gerada
à volta da homossexualidade e dos
próprios homossexuais. Foi na esteira da auto-aceitação e desafio de
ser homossexual em Moçambique
que o activista LGBT, Daniel Mate,
um homem que vive a sua orientação sexual de forma aberta, partilhou a sua história.
A conversa teve lugar no mês que
o mundo celebrou o 67° aniversário da Declaração Universal dos
Direitos Humanos – (10 de Dezembro – 1948), Daniel Mate – membro
da comunidade LGBT – [Lésbicas,
Gays, Bissexuais e Transexuais], que
por reconhecer a crucialidade desta
secção [Na primeira pessoa], para
a comunidade de que é membro e
não só, partilha com os nossos leitores a sua história de auto-aceitação
e desafio de ser um homem gay
num país em que o preconceito e
a discriminação contra os homossexuais são ainda uma realidade no
quotidiano destes cidadãos moçambicanos.
Daniel Mate ou simplesmente
Dany é estudante do curso de Psicologia Educacional, na Universidade
Pedagógica, delegação de Maputo, é natural de Maputo, residente
no bairro do Ferroviário, e à semelhança de muitos moçambicanos é
oriundo de uma família humilde de
tradição (religiosa) e é único homem
de quatro irmãos.
De acordo com Daniel
Mate, “Ser homem gay
em Moçambique não é fácil. Existem ainda muitas
barreiras, o preconceito e a discriminação no
seio familiar, no grupo de
amigos, na sociedade no
geral são ainda o maior
desafio.
NA PRIMEIRA PESSOA
lambda
Para Daniel, embora a homossexualidade não seja crime em
Moçambique, nunca se está à
vontade porque há sempre receio
de qualquer coisa. São barreiras
que muitos homossexuais vivem e
sentem no dia-a-dia, é muito difícil
abrir-se e dizer eu sou homossexual. Eu enfrentei essa luta!”
O primeiro contacto de Daniel
Mate com a LAMBDA foi numa festa da comunidade “Manas Party”
que até hoje a LAMBDA organiza,
onde a comunidade LGBT, e não
só, encontra-se para confraternizar
e reforçar os laços de amizade entre seus membros, de modo a fortalecer o sentimento de pertença
da comunidade arco-íris. “Conheci
a LAMBDA em 2009 na companhia
de um amigo, desde então nunca mais me afastei da organização
onde hoje sou membro. Graças ao
apoio da LAMBDA, consegui assumir
a minha orientação sexual para a minha família. Mas confesso que não
foi fácil.
as minhas experiências,
particularmente com a
minha mãe [ela tem sido
uma super mãe]”.
Referiu o nosso entrevistado quando questionado sobre a relação que
mantém com a família, antes e depois de assumir a sua orientação
sexual. Relativamente às experiências de discriminação,
Daniel Mate diz que já foi
vítima de discriminação e
recorda-se com muita tristeza da noite em que um
grupo de amigos foi impedido de entrar para um
bar, algures na cidade de
Maputo,
“Foi há uns 5 anos,
recordo-me, foi de noite
num dos bares da cidade
de Maputo, impediram
uns amigos de entrar
para o bar porque são
homossexuais e que, por
isso, não tinham
o direito de
frequentar
aquele
espaço.
“Actualmente tenho uma
relação estável com a
minha família porque já
todos sabem que sou
homossexual, isso já há
dois anos. Mas, antes
não era fácil, porque
como único filho homem,
para mim era tudo muito difícil, não tinha com
quem partilhar as minhas
preocupações, para além
das pessoas da comunidade. Mas, a partir do
momento em que assumi
para a família, passei a
sentir-me mais à vontade
em falar da homossexualidade e tenho partilhado
JORNAL DA COMUNIDADE LGBT DE MOÇAMBICANA
cont. pág 28
Daniel Mate
IMAGEM: LAMBDA
27
28
AS CORES DO AMOR
NA PRIMEIRA PESSOA
lambda
Então houve confusão
e eu acabei intervindo,
envolvendo-me numa
discussão. Foi triste!
Porque não imaginei
que fossem impedir
alguém de frequentar um
determinado local por ser
homossexual”.
Daniel Mate partilhou ainda as
dificuldades de ser homossexual
na carteira da sala de aulas, na
Universidade, “Nos dois primeiros
anos foi muito triste porque nunca
esperei que num espaço académico
se cultivasse a discriminação,
não esperava que estudantes
tivessem uma mentalidade de
exclusão. Em muitos momentos
em que fôssemos falar sobre o
tema da homossexualidade havia
sempre piadas e estas não vinham
apenas dos estudantes, alguns
docentes também gozavam,
faziam piadas. Daí que tive que
ser muito forte porque não era
fácil assumir-me naquele espaço
enquanto faziam pouco dos
homossexuais. Entretanto, Daniel
disse ainda que:
“Chegou uma altura
em que já não dava
importância às
piadas e falava com
maior abertura e
segurança sobre a
homossexualidade e a
partir desse momento,
alguns colegas que
gozavam, que falavam
mal dos homossexuais
passaram a ter interesse
sobre o assunto e outros
ainda se aproximaram à
LAMBDA para saberem
melhor sobre a temática.
Acrescentou ainda que a
LAMBDA contribuiu muito
para essa abertura,
através de palestras que
foi ministrando naquela
instituição de ensino
superior e que muitos
membros da comunidade
também deram
testemunhos sobre suas
experiências de vida.
Em relação ao significado do dia
10 de Dezembro, dia Internacional
dos Direitos Humanos, o nosso entrevistado disse: “Para mim, o dia
10 de Dezembro representa um dia
muito importante, primeiro porque
tenho a consciência dos meus direitos. E, segundo, porque é um dia
de reflexão sobre os nossos direitos,
sobre o nosso papel como cidadãos
que lutam pelos seus direitos e também porque a Declaração dos Direitos Humanos surge para garantir a
nossa dignidade como pessoas” ■
AS ESCOLHAS
LARA LOPES
AS ESCOLHAS DE…
LARA LOPES
PROFISSÃO: Consultora de Crédito Bancários
UM PASSATEMPO: Ir ao cinema
UM FILME: Boys dont cry - Kimberly Peirce
UM LIVRO: “50 tons de cinza – Erika. Leonard
James
UMA MÚSICA: “Body 2 body (Ace Hood ft
Chris Brown)
UMA PEÇA DE TEATRO: A demissão do
senhor so ministro (Gungu)
UM PROGRAMA DE TELEVISÃO: Criminal
Minds
UMA VIAGEM: Natal (Fortaleza)
UM OBJECTIVO: Me tornar numa referência
para os direitos LGBT
FÉRIAS IDEAIS: Tailândia
UMA COR: Preto
UM DESPORTO: Natação
UMA EQUIPA: Sporting clube de Portugal
O QUE NÃO SUPORTA VER NO MUNDO:
Racismo
UMA FRASE: “Quero dias diferentes, pessoas
que me acrescentem, quero vida e muita
alegria ao meu redor, quero luzes coloridas
e brilhantes, quero paz, quero amor, quero
a liberdade de saber quem eu sou!” (Ana
Carolina)
MAIOR ORGULHO: Ver minha mãe feliz pelo
que eu sou e me tornei por esforço próprio
UM ÍDOLO: Graça Machel
JORNAL DA COMUNIDADE LGBT DE MOÇAMBICANA
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AS CORES DO AMOR
INTERNACIONAL
LAMBDA
NIKE RESCINDE CONTRATO MILIONÁRIO
COM MANNY PACQUIAO, APÓS OFENSAS HOMOFÓBICAS
Manny Pacquiao
IMAGEM: GOOGLE
M
anny Pacquiao desculpou-se da declaração
homofóbica sobre os
homossexuais,
manifestada em Fevereiro último. O
pugilista afirmou que gays seriam
“piores que animais” e depois usou
as redes sociais para se desculpar. O
novo posicionamento, porém, não
foi aceite pela Nike, patrocinadora
oficial do filipino. A empresa rescindiu com Manny Pacquiao e, em
comunicado oficial, garantiu que os
comentários do atleta são “detestáveis”. “Nós achamos os comentários
de Manny Pacquiao detestáveis”.
“A Nike opõe-se fortemente à discriminação de qualquer forma e tem
uma longa história de apoio à comu-
nidade LGBT. Nós não temos mais
nenhum relacionamento com Manny
Pacquiao” – lê-se no comunicado da
Nike. A Nike patrocinava Pacquiao
desde 2006. A polémica começou
quando um vídeo, postado por uma
televisão filipina, foi divulgado. A
declaração causou revolta no seu
país. Vice Ganda, um dos comediantes mais populares das Filipinas e assumidamente homossexual, usou as
redes sociais para criticar Pacquiao.
O pugilista que concorre a uma vaga
no Senado [Parlamento] das Filipinas, voltou a dizer que é contra a
união homossexual por conta de
seus princípios religiosos, mas pediu
desculpas à comunidade LGBT.
“Eu peço desculpas por
machucar pessoas ao
comparar homossexuais
a animais”.
Continuou o pugilista: “Por favor,
peço perdão àqueles que machuquei, eu vou continuar com a minha
crença de que sou contra casamentos entre pessoas do mesmo
sexo por conta do que a Bíblia diz,
mas eu não estou condenando os
LGBT”. Acrescenta ainda que: “Eu
amo todos vocês com o amor do
Senhor. Que Deus abençoe a todos
e estou rezando por vocês”, disse,
em vídeo publicado na sua página
do Facebook ■
INTERNACIONAL
LAMBDA
escola representam uma
perda para a sociedade.
Todo o adulto gay ou
lésbica que lhe é negado trabalho ou induzido
a emigrar constitui uma
oportunidade perdida”.
A campanha “Free & Equal” foi
lançada pela primeira vez pelo Escritório de Direitos Humanos das
Nações Unidas em 2013 e lançou
uma série de vídeos no passado,
incluindo uma música que apela à
igualdade de direitos ■
Imagem que simboliza pessoas livre e iguais
IMAGEM: GOOGLE
NAÇÕES UNIDAS
AFIRMAM QUE HOMOFOBIA CUSTA BILHIÕES
À ECONOMIA GLOBAL
A
campanha anti-discriminação LGBT das Nações
Unidas “Free & Equal”
– “Liberdade e Igualdade” lançou, na última quinzena de
Dezembro de 2015, algumas estatísticas surpreendentes que mostram
que a homofobia e transfobia ainda são um grande problema a nível
mundial. As estatísticas estão apresentadas em forma de um vídeo,
intitulado: “O Preço da Exclusão”,
este centra-se no custo da discriminação a nível do mundo, financeiramente e para as pessoas que sofrem
discriminação social e legal, devido
às suas identidades sexuais e de género.
“Para a sociedade, no geral, a homofobia representa um enorme desperdício do potencial humano, do
talento, da criatividade e da produtividade que pesa sobre a economia.
Além de tudo isso, refere-se também que os jovens lésbicas, gays
e bissexuais são quatro vezes mais
propensos a tentar o suicídio, com
o aumento de dez vezes mais para
​​
jovens transexuais.
“Não são apenas as pessoas LGBT que pagam o
preço; todos nós pagamos. Todas as pessoas
que são expulsas de casa
ou forçadas a desistir da
JORNAL DA COMUNIDADE LGBT DE MOÇAMBICANA
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AS CORES DO AMOR
INTERNACIONAL
LAMBDA
AFIRMAM BISPOS ANGLICANOS
“HOMOSSEXUAIS SÃO MEMBROS DE
PLENO DIREITO DA IGREJA”
O
s bispos anglicanos da
África Austral declararam que os homossexuais são bem-vindos
à Igreja como membros de pleno
direito. O tema foi abordado numa
carta pastoral de Thabo Makgoba,
bispo do Cabo e líder anglicano
para África Austral. A posição resulta do recente sínodo realizado em
Fevereiro, onde estiveram reunidos
clérigos da África do Sul, Angola,
Moçambique, Namíbia, Lesoto e
Santa Helena. A mesma foi histórica
pela posição mais vincada da Igreja Anglicana, o apelo à integração,
respeito e igualdade das pessoas,
independentemente da orientação
sexual”.
DIFERENÇAS
SOBRE
O
CASAMENTO ENTRE PESSOAS
DO MESMO SEXO
Por tratar-se de um tema fracturante,
na carta o arcebispo Makgoba
reconhece que os bispos da África
Austral estejam ainda divididos
sobre a matéria do casamento entre
pessoas do mesmo sexo na igreja.
Makgoba entende que as diferenças
entre os bispos incidiram sobre a
teologia do casamento e o resultado
de realidades no terreno em
diferentes dioceses. “Por exemplo,
a maioria das nossas dioceses na
região são predominantemente
rurais, o que requer ainda algum
preparo das comunidades”. Num
outro desenvolvimento, o arcebispo
Thabo Makgoba, que é também líder
Momento de culto
IMAGEM: GOOGLE
da igreja na África do Sul, expressou
sua determinação em tudo fazer para
que não haja divisões profundas na
igreja. “No passado tivemos muitas
diferenças e elas não podem hoje
não existir, mas não constituem
“perigo de divisão da igreja”.
Para Makgoba, as diferenças sobre
a ordenação de mulheres, por exemplo, no passado foram ultrapassadas
e o mesmo vai acontecer sobre a
questão da aceitação de gays e lésbicas. “ Nós superamos profundas
diferenças sobre a imposição de
sanções contra o apartheid e sobre
a ordenação de mulheres, e nós vamos ultrapassar sobre a sexualidade
humana”, concluiu ■
...
LAMBDA
JORNAL DA COMUNIDADE LGBT DE MOÇAMBICANA
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A Associação LAMBDA, é uma organização (em formação)
de cidadãos LGBT (lésbicas, gays, bissexuais e transexuais)
moçambicanos que advogam pelo reconhecimento dos seus
direitos.
A nossa visão é uma sociedade onde os direitos humanos dos
cidadãos LGBT são respeitados pelos cidadãos, garantidos por lei e
assegurados pelo Estado.
A nossa missão é liderar o movimento LGBT e mobilizar a sociedade
tornando-a favorável a promoção e garantia dos direitos económicos, políticos e sociais dos cidadãos LGBT.
Av. Vladimir Lenine 1323, telfax: 21 30 48 16, Cell: 84 38 92 967 , email: [email protected], Maputo, Moçambique
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