Apontamentos Sobre a Lógica Financeira Como

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Apontamentos Sobre a Lógica Financeira Como Transferência da Subalternidade
Francieli Martins Batista1
Resumo
O presente texto apresenta apontamentos acerca da formação capitalista brasileira a
partir do século XX com a constituição do padrão industrial no país. A formação do
Brasil está intimamente ligada à conjuntura internacional e à diretrizes do capital
mundial. Por isso, busca-se elucidar algumas das relações estabelecidas com o capital
externo, principalmente no campo econômico, na formação industrial e no processo de
financeirização. Assim como, a consequente condição de dependência e subalternidade
brasileira estabelecida com os países centrais do sistema capitalista.
Palavras - chave: Brasil; capitalismo financeiro; imperialismo; neoliberalismo.
Introdução
O desenvolvimento do padrão industrial brasileiro assim como a instalação do
regime capitalista na produção interna não se deu de forma espontânea ou enquanto
continuidade do desenvolvimento econômico nacional, uma vez que estava fortemente
determinado pela conjuntura externa colocada pelo capitalismo em seu âmbito mundial.
A formação econômica do Brasil carrega o caráter particular de entificação do modo de
produção capitalista brasileiro, na medida em que não aconteceu pela “via clássica”2
mas, tardiamente, em descompasso com os países centrais que já se encontravam em
outro estágio econômico, inclusive em condições de subordinar o Brasil à seus
interesses pela estrutura hegemônica consolidada.
É necessário retomar este contexto mais amplo para compreender, em suas
particularidades, os elementos que acompanham e determinam o desenvolvimento
econômico do Brasil enquanto parte constituinte do da expansão e reprodução do
1
Licenciada (2012) e Bacharel (2013) em Ciências Sociais pela Universidade Estadual de Maringá/
email: [email protected].
2
Compreende-se por via clássica o processo de desenvolvimento capitalista marcado pela Revolução
Democrático – Burguesa na qual a burguesia emergente junto aos operários e trabalhadores do campo
constituem, por insurreições e lutas revolucionárias, uma nova estrutura política, social e econômica
calcada nos princípios iluministas. Uns dos principais processos históricos ocorridos decorrentes da via
clássica são a Revolução Industrial, Revolução Francesa e Revolução Russa.
sistema capitalista. Assim como, os desdobramentos políticos, sociais e econômicos
posteriores que se colocam a nível nacional. A consolidação tardia do capitalismo
brasileiro coloca-o em uma posição desfavorecida em relação aos países europeus, EUA
e Japão que em fins do século XIX já possuíam um padrão industrial avançado,
decorrido, sobretudo da II Revolução Industrial que proporcionou um alto progresso
tecnológico na esfera produtiva. A nível mundial este processo representou um avanço
dos países centrais sobre os países periféricos elevando substancialmente seus
investimentos
nestas
regiões,
especialmente
via
exportação
de
capitais.
Consequentemente aprofundou-se a subordinação da periferia ao poder financeiro
hegemônico, subjugando a autonomia nacional aos interesses externos.
Ao longo do século XX, o Brasil passou por momentos de avanços industriais,
mas conservou uma economia e sistema monetário frágeis que aos sinais de
instabilidade na economia mundial era atingida a estrutura financeira brasileira. As
políticas assumidas durante grande parte do século XX promovem avanços no setor
produtivo e na economia com certo controle dos investimentos externos que adentram
ao país, contudo se manteve a condição de subalternidade brasileira, uma vez que,
dependia, em grande medida, da entrada de capitais externos para promover estes
progressos econômicos.
Com a reestruturação a geopolítica e geoeconomia mundial, no início da década
de 1990, e a concretização da expansão mundial do capitalismo sob a direção do
neoliberalismo identificamos, no Brasil, o ponto de inflexão de total inserção e
submissão ao mercado mundial. Após o período de cinco anos de transição quando
sucedeu o processo de abertura democrática e o fim da ditadura militar, o governo
Collor, recém-eleito, implementou a política de reformas neoliberais encabeçadas pelos
centros hegemônicos na busca de garantir livre movimentação de seus investimentos e
garantia de altas taxas lucros ao capital internacional em detrimento das demandas
sociais e projetos econômicos de cada Estado-Nação.
1. A Constituição do Estágio Imperialista
O modo de produção capitalista consolida suas estruturas a partir do século
XVIII com a I Revolução Industrial e a inauguração do capitalismo concorrencial,
sobretudo na Europa. Substitui-se a produção doméstica e a manufatura pela grande
indústria mecanizada propiciando sua expansão a nível mundial. Neste período já se
apontava a necessidade inerente do capital em acumular-se expansivamente para
garantir sua produção e reprodução e por isso, a tendência à concentração e
centralização. Contudo, é apenas com a II Revolução Industrial em fins do século XIX
que estes aspectos ganharam corpo e expressão na economia. O modo de produção
capitalista muda substancialmente suas bases com a implementação de novas
tecnologias como a metal-mecânica, a química, o plástico que garantiu elevar os níveis
de produtividade. Para Lênin estas mudanças representava uma nova fase do sistema
capitalista, denominada, "Imperialismo".
Fenômeno emergente nos países de modo de produção capitalista consolidado nos centros hegemônicos do capital -, caracteriza-se essencialmente pelo deslocamento
na forma de produção até então estabelecido, a competitiva. O padrão de acumulação se
assenta pela formação de monopólios. Estes, no geral mega-empresas com alta taxa de
concentração de capital, em âmbito mundial, dominam a produção de um ou diversos
produtos, bem como todo o processo de produção. No decorrer deste estágio, os bancos
têm destaque especial, pois não mais exercem, apenas, a função de meros interlocutores
de pagamentos, visto que, concentram em suas agências a riqueza dos grandes
monopólios. Convertem-se nos principais financiadores dos setores industriais pelo
fornecimento de crédito e, portanto, subjugam as empresas ao seu domínio financeiro.
Este novo padrão de acumulação reitera a necessidade de internacionalização do
capital devido aos altos níveis de produção e de concentração de massas monetárias
para ser aplicado novamente e continuar se valorizando expansivamente. Há, então, uma
exportação massiva de capitais para o exterior como forma de expansão e de produção a
ser revertida em lucro. Esta exportação se fez, especialmente, em países sob domínio
colonial como em países que já tenham independência política, ou no caso do Brasil,
que continuam subordinados ao capital externo, agora sob a forma de dominação
imperialista.
É importante ponderar que, mesmo superada a forma tradicional do capitalismo
competitivo, esta condição não deixa de existir. Apresenta-se, no entanto, em outros
patamares nos quais os grandes monopólios disputam o domínio de determinadas
esferas da produção e de novos mercados, e assim a exportação de capital ocorre, não
apenas como forma expansão, mas como garantia de domínio da produção - em
detrimento a um concorrente - e de controle das atividades econômicas a nível mundial.
Na medida em que o imperialismo avança, a corrida por domínio territorial
estrangeiro, com riquezas disponíveis ou em potencial desenvolvimento, se intensifica e
integra estes países, sejam colônias ou “semi - independentes”, mantendo, em condição
de dependência e subordinação aos centros hegemônicos, os seus respectivos interesses
mercantis. Constitui-se uma espécie de “parasitismo” em que tais monopólios adquirem
seus lucros pelos valores produzidos nestes países dependentes colocando o seu
desenvolvimento aquém das necessidades internas e em disposição às vicissitudes do
imperialismo que suga grande parcela dos rendimentos.
O processo de auto-expansão do capital (e das relações sociais especificamente
capitalistas) se dá no âmbito da produção e se estende ao conteúdo financeiro.
Caracterizado nas primeiras décadas do século XX como a fusão entre capital bancário
e produtivo, ratifica à tendência de concentração e centralização do capital, não apenas
quanto a diferentes ramos econômicos, mas também por diferentes atividades que
permitem maior eficiência no financiamento da produção e maiores rendimentos. Nesse
sentido, os países do centro do sistema concentram em seus territórios o
desenvolvimento na esfera de tecnologia visto que, é o setor que garante a dinâmica,
aumento de produtividade e reprodução ampliada do capital, garantem, assim, sua
dominância e vantagem sob outras economias, especialmente economias periféricas,
que não possuem produção neste setor, ou tem uma produção pouco desenvolvida, e
dependem da exportação dessas mercadorias para gerir suas economias.
2. Sistema Monetário Internacional e Dominância financeira
No início da fase imperialista, entre o fim do século XIX e início do século XX,
o sistema monetário era controlado pelo padrão ouro-libra sob hegemonia inglesa.
Ancorado nos princípios liberais de livre mercado, a Inglaterra consegue garantir
sustentação do sistema até início do século XX, mas com o avanço econômico e
industrial outros países começam a ganhar dinamismo e força neste período. EUA,
Alemanha e Japão e passam a concorrer com o domínio inglês. O país começa a perder
forças, assim como a política liberal em que se sustenta, sobretudo após a I Guerra
Mundial. A Inglaterra encontra muitas dificuldades em manter estabilidade monetária e
econômica do país e sofre com os grandes déficits sociais, já que o sistema monetário
orientava-se apenas pela busca de estabilidade economia sem intervenções do Estado
nas esferas econômicas e da sociedade. Sua fragilidade fica mais explicita durante a
crise de 1929 com sérias dificuldades para superar os altos índices de inflação e
consequentemente aumenta-se a desconfiança do mercado sobre a libra.
Os EUA, por sua vez, com uma indústria bem consolidada desde o fim do século
XIX, colocava-se, há décadas, à disposição para assumir tal posição, mas a pouca
credibilidade do dólar no mercado mundial não possibilitou que o país alcançasse tal
patamr. Apenas com a conjuntura do pós - II Guerra se consolidará a hegemonia do
dólar. As catástrofes sociais acumuladas por dois conflitos mundiais somados aos altos
déficits econômicos endossam as críticas ao modelo liberal e o livre mercado. O sistema
monetário, que já dava sinais de esgotamento, é enterrado definitivamente com acordo
de Bretton Woods.
Os países que saíram vencedores da guerra, liderados pelos EUA, se reuniram
em Bretton Woods para reorganizar o sistema financeiro retomar a estabilidade
econômica e o desenvolvimento. Para tanto, se criou o Fundo Monetário Internacional
(FMI), com a função de manter a constância financeira mundial e o Banco Mundial
(Bird) tendo a função de alocar recursos para os países em reconstrução. Acordou-se a
fixação do taxa de câmbio e o dólar foi adotado como padrão monetário devendo manter
a paridade com o ouro. Deste modo, se definiu políticas de controle social assumido
pelo Estado para assegurar o equilíbrio econômico e garantissem a proteção social, haja
visto as catástrofes que os países enfrentavam ao menos desde a I Guerra Mundial. Nos
trinta anos procedente, teremos em vigor a política de Estado de Bem-Estar-Social
fundamentado nas teses de Keynes que definia como necessidade essencial da
economia: garantir o crescimento e o pleno emprego.
Neste período, os altos de investimentos estadunidenses para a reconstrução das
regiões que passaram pelas duas Grandes Guerras garantiu o desenvolvimento acelerado
destes países. Fundamental ponderar que este período é marcado por uma geopolítica e
geoeconomia bipolar, uma disputa clara entre o capitalismo - liderado pelos EUA - e o
socialismo - liderado pela URSS. Portanto, haviam interesses claros dos países
capitalistas expandirem sua lógica a partir de investimentos e também de sustentar seu
sistema econômico, demonstrando eficiência social e também de rendimentos frente aos
países do leste europeu.
As políticas implementas em Bretton Woods já começam a dar sinais de
esgotamento durante a década de 1970, assim como o Welfare State. Os acontecimentos
dos anos subseqüentes intensificará esta crise e resultará na hegemonia do capital
financeiro como eixo central do sistema econômico. Dentre estes acontecimentos
podemos elencar: internacionalização bancária, rompimento com Bretton Woods e
implantação de taxas flexíveis a partir de 1970; desenvolvimento do mercado de
eurodólares, privatização da liquidez internacional e endividamento dos países
periféricos; estabelecimento do dólar como moeda padrão, liberalização dos sistemas
financeiros, mercados de ações, câmbio e bônus, mercados de derivativos a partir do
governo Tatcher e Reagan (Costa, 2008).
O fato que decisivamente consolidou a hegemonia do capital financeiro na
dinâmica capitalista foi a destituição do sistema Bretton Woods.O crescente déficit na
balança estadunidense, pela grande demanda de dólar e emissão de moeda, começou a
gerar desconfianças quanto a paridade da moeda com o ouro. As pressões de outros
países se intensificam e levou o presidente dos EUA, Nixon, em 1971, romper com o
padrão ouro, deixando o dólar à deriva conforme o sistema financeiro, sem lastro. A
partir desta conjuntura, o sistema monetário irá se modificar substancialmente com a
flutuação das taxas de câmbio legalizada pelo FMI em 1976. Ocorre também, a
chamada reciclagem dos petrodólares a partir do aumento unilateral da comodite pela
OPEP (Organização dos Países Exportadores de Petróleo) que resultará na privatização
da liquidez internacional, ampliação do credito internacional e do endividamento dos
países periféricos. A crise do petróleo intensifica a crise do Estado de bem-estar social
pela exaustão do desempenho global e o próprio ritmo de crescimento. Esta crise
inaugurou uma nova fase do aparelho financeiro.
Da crise, que se segue nos anos de 1974 e 1975, emerge dois fenômenos: 1)
desemprego crônico e estagflação devido aos altos índices de desemprego nos países
centrais; 2) altos índices inflacionários conservados em ambos os momentos, de
recessão e crescimento, sendo esta a razão para sepultamento do sistema Bretton Woods
e do Estado de Bem-Estar-Social. Deste modo, se constitui um novo ciclo na economia
capitalista. Este novo ciclo encerra a vigência da política keynesiana e se instala a
política monetarista e neoliberal sob a predominância do setor financeiro. No que
concerne ao regime de trabalho, rompe com a organização fordista estabelece contratos
de trabalho flexíveis a partir da regulação do Estado mínimo e de privatizações em larga
escala. Este novo ciclo foi liderado e iniciado pelos EUA e Inglaterra entre as décadas
de 1950 e 1960 que nos anos seguintes se tornaram as forças hegemônicas na economia
mundial de modo que, a acumulação financeira torna-se reinante sob o setor produtivo e
Estado.
A estratégia estadunidense para manter sua hegemonia, econômica e monetária que neste período estava em declínio -, se dará a partir do governo Carter ao nomear
Paul Volcker, em 1979, para a presidência do FED (Federal Reserve System). Edificará
como meta a estabilização da economia estadunidense pelo aumento da taxa de juros
para fortalecer o dólar, pois o país encontrava-se em crise por altos índices
inflacionários e déficits. A política do FED inverteu o fluxo mundial de moedas em
direção ao tesouro norte-americano retomando novamente o dólar a moeda hegemônica
e admitindo a política econômica estadunidense e o consequente abandono das políticas
keynesianas pela estabilidade monetária com o objetivo final de controle da inflação.
Com Reagan e Tatcher, o neoliberalismo e o monetarismo se expandem para
grande parte do mundo.
Com estas duas gestões se consolida o processo de
desregulamentação e liberalização financeira sem restrição à mobilidade de capitais,
criando novos tipos de aplicação e dando grande poder ao capital financeiro na
elaboração das políticas macroeconômicas. A elevação da taxa de juros passou a ser o
elemento estabilizador da economia e em contraposição ao crescimento econômico e de
emprego. A política neoliberal/monetarista fortaleceu o setor financeiro do grande
capital impondo ao restante da economia novas regras de mercado determinada pela
lógica das finanças. A busca pela hegemonia do pólo financeiro leva a captura de todos
os setores da economia.
No limiar da década de 1990, com o fim da Guerra Fria, a plataforma neoliberal
se expande pelo restante do globo, principalmente nas economias periféricas, como no
Brasil. O estabelecimento das concepções liberais em âmbito mundial promove a
internacionalização
definitiva
do
capitalismo
sob
o
viés
da
liberalização,
desregulamentação e financeirização das economias visando garantir a lucratividade do
capital. Há um rompimento com a barreira do espaço e tempo, dispondo da internet para
valorizar o capital a qualquer horário e em qualquer lugar. A consequência mais direta
deste fenômeno tem sido o deslocamento de investimentos de áreas produtivas para a
financeira, por gerar mais lucro em menor tempo, provocando disputa por alocação de
recursos em uma esfera que não produz valor, mas se apropria dele. A nível social gerou
desemprego, concentração de renda e empobrecimento, ao passo que mantém as
mesmas posições hierárquicas favorecendo os países centrais e subordinando os países
periféricos
3. O capitalismo no Brasil
O Brasil emerge como colônia, marcado pelo trabalho escravo e com larga
exploração comercial voltada para exportação, o que lhe confere um alto grau de
conservadorismo mesmo com o fim da escravidão. Mantém, também, sua condição de
dependência e subalternidade ao capital internacional ademais do ganho "político" da
independência e do alvorecer da industrialização. Sob as condições postas pelo
imperialismo, o Brasil, apesar de independente politicamente, continua vinculado à uma
produção colonial, pois está voltado às demandas externas fundamentalmente, fato que
certamente não atinge apenas o âmbito econômico, mas político, social e cultural. E não
se restringe ao século passado, mas adentra o século XXI.
Os períodos de maior crescimento industrial do Brasil estiveram atrelados,
substancialmente, às condições da conjuntura mundial em que se estabelecia o
imperialismo e à presença do capital financeiro que estimulava, direta e indiretamente,
os setores produtivos. Certamente tal situação colocou a economia brasileira sob bases
muito frágeis e instáveis, criando o que Caio Prado Jr. chama de “indústria fictícia”.
O primeiro grande surto de industrialização brasileira ocorre em meados da I
Guerra Mundial, no qual o Brasil passa a atender as demandas externas que, em grande
parte, eram de solvência dos produtos primários e incorporação da produção dos países
que se encontravam em guerra. Isto posto, tem-se um desenvolvimento considerável da
produção manufatureira que atende, de forma restrita, o mercado interno. Contudo, este
surto não promove um desenvolvimento industrial com bases internas, pois não houve
acumulação de capital necessário para investimentos contínuos na produção interna. O
Brasil só volta a ter um crescimento significativo com a II Guerra Mundial, sob as
mesmas condições em que ocorreram no primeiro momento, todavia o país já possui
bases econômicas mais sólidas e consegue chegar a avanços mais significativos. Neste
período entre guerras, verifica-se o crescimento das subsidiárias dos monopólios
estrangeiros que se instalam no país e ocupam função primordial na vida econômica do
país.
Passado a conjuntura favorável da II Guerra Mundial, o Brasil volta a ter
dificuldades na produção industrial com os desequilíbrios das contas externas e aumento
de dívida, inflação e instabilidade financeira. Os problemas postos expressam a forma
de produção instalada no Brasil - colonial -, mantida sob interesse imperialista, na qual
a produção não se desenvolve de forma ordenada e em consonância com as demandas
internas mas, faz-se a partir de conjunturas temporalmente favoráveis em que alguns
setores se devolvem e outros ficam estagnados conforme a margem de lucratividade
possível ao capital externo. Em alguma medida, o Brasil avança em sua produção
industrial, contudo não consegue abarcar o desenvolvimento que o país carece e
consolidar um mercado interno ficando atrelado a dependência imposta pelas
hegemonias imperialistas.
As associações capitalistas monopolistas centralizam para si tanto os lucros
como as forças produtivas que possibilitam a manutenção e o contínuo desenvolvimento
industrial. Exemplo disto são as tecnologias, que são elementos essenciais a necessidade
do desenvolvimento expansivo do capitalismo e dão suporte e inovação a sua produção.
Tais recursos são produzidos e controlados pelos centros do capital, restando, para os
países periféricos, a transferência dos mesmos como opção. Ou seja, a possibilidade de
desenvolvimento industrial autônomo está assegurado nas mãos dos grandes
capitalistas, aos quais, o interesse é justamente manter a maior parcela de países sob seu
domínio, de modo que a produção nestes países não vá em direção à economia nacional,
mas que, ao contrário, os mantenham dependentes do mercado externo.
Esta situação demonstra como a internacionalização, abertura comercial e
financeira e exportação de capitais não garantem as mesmas condições de
competitividade e investimento entre os países centrais e periféricos. Mas, ao contrário,
permite que os centros hegemônicos mantenham sua vantagem sobre as formações
sociais com economias mais fracas que se tornam ainda mais fragilizadas sob os efeitos
da mundialização do capital.
“A questão central nessa discussão refere-se a notar que os países
desenvolvidos não somente exploram suas vantagens comparativas em relação
aos países em desenvolvimento, mas também controlam os mecanismos
competitivos, visto que, são detentores da tecnologia avançada, alta
produtividade e capacidade de desterritorialização da rede produtiva, que reduz
custos e facilita a comercialização e distribuição de mercadorias e ou produtos.”
(MATHIAS, 2011, p. 72.).
Cabe ressaltar que a relação de dependência e subalternidade entre o centro e
periferia foi preconizada pelas teses do “Imperialismo” já no início do século XX, na
América Latina, um dos teóricos que buscou compreender este processo a partir das
especificidades da região foi Ruy Mauro Marini, através da Teoria Marxista da
Dependência a partir dos anos 1960. Dentre suas elaborações, destaca-se a compreensão
que do autor sobre a realização do ciclo do capital na periferia no qual capital externo
que não apenas realiza o financiamento da economia interna, mas requer retorno de seus
investimentos seja por empréstimos ou por instalação de empresas filiais nestes países.
Este processo resulta na apropriação de parte do valor produzido nacionalmente que seja
acumulado externamente e esta transferência para o exterior torna-se parte constituinte
da dinâmica de acumulação destes capitais internacionais. Visto isso, a produção em
economias dependentes não se consolida a partir de um mercado interno e das
demandas sociais de seu país, mas a partir dos investimentos que adentram ao país e
apenas buscam alta rentabilidade que ocorre não apenas por transferências de valores
produtivos, mas em pagamentos de juros, royalties, dividendos... Ou seja, atua também
na esfera financeira.
Para além dos momentâneos progressos da produção industrial e capitalista, as
consequências foram drásticas para grande parte da população brasileira. Este progresso
foi acompanhado de uma intensa desigualdade econômica e social, no qual grande
parcela da sociedade não teve acesso à massa de riqueza produzida por eles mesmos. Os
momentos de instabilidade em que ocorreram tais avanços provocaram altas
vertiginosas dos produtos, contudo não provocaram a valorização da mão-de-obra e dos
salários, ficando estes estagnados e levando a uma precariedade da condição de vida da
sociedade em geral. A grande acumulação realizada no país ocorreu sob a intensa
exploração da classe trabalhadora levando-os a níveis de subsistência e apenas uma
pequena parcela da sociedade brasileira teve acesso aos progressos sucedidos nos país.
4. Desregulamentação e Abertura a Lógica Financeira
A década de 1990 foi marcada no Brasil pela adoção de um novo padrão de
acumulação, voltado à abertura do mercado, a liberalização econômica e
desregulamentação, ou seja, o país se submete a política neoliberal, já instalada nos
países centrais em décadas anteriores.
Com a crise dos anos 1980, no qual o padrão de desenvolvimento-nacional não
consegue mais se sustentar devido a vertiginosa dívida externa e os altos índices
inflacionários, o projeto que ganha força e se consagra no país é o neoliberal,
estabelecendo um novo patamar de dependência e subalternidade. A diretriz econômica
se forja a partir do gerenciamento da política monetária sendo este o aspecto
fundamental para garantir a estabilidade econômica e torna-se orientadora das políticas
estatais.
Ainda na década de 1980 foi organizado um encontro nos EUA com a finalidade
de determinar reformas necessárias à América Latina para enquadrar definitivamente a
região à doutrina neoliberal. O resultado do encontro foi o Consenso de Wanshigton
que determinou algumas diretrizes e reformas para estes países: redução de gastos
públicos, reforma tributária, investimento estrangeiro, privatizações e entre outros. O
Brasil, condicionado pelas agências multilaterais, Fundo Monetário Internacional e
Banco Mundial, assume acordos no início da década de 1990, sob a gestão do governo
Collor, que impõe a abertura de mercado, a desregulamentação de capitais e do mercado
interno, a liberalização cambial e a privatização econômica submetendo-o ao mercado
externo e ao capital e inserindo o país no bojo da política neoliberal.
Há um “declínio do Estado-Nação” no qual se perde sumariamente a função
social do Estado e os setores sociais (saúde, educação, previdência, etc.) são colocados a
serviço da iniciativa privada em prol da lucratividade. A chamada reforma do Estado
direciona-se à implantação do Estado Mínimo no qual um projeto de desenvolvimento
nacional não tem espaço. Não nos surpreende que a forma de produção esteja alheia a
realidade social de grande parcela da população resultando em altos índices de
desigualdade. Afirma Ianni:
“Também por isso a globalização não significa nunca homogeinização, mas
diferenciações em outros níveis, diversidades com outras potencialidades,
desigualdades com outras forças. Nesse horizonte, a sociedade global pode ser
vista como uma totalidade desde o início problemática, no sentido complexo e
contraditório; atravessado pelo desenvolvimento desigual, combinado e
contraditório, que se especifica no âmbito de indivíduos, grupos, classes, tribos,
nações, sociedades, culturas, religiões, línguas e outras dimensões singulares ou
particulares.” (IANNI, 1994; p.159)
A necessária adoção da abertura e liberalização financeira e comercial
propugnada pelos países centrais não encontra relação direta com as políticas adotadas
nestes países. As reformas da plataforma neoliberal se restringiram a não ameaçar o
padrão de acumulação interno garantido pela proteção de seus mercados. Afirma
Carcanholo:
“ Em que pese as reformas neoliberais para o mercado doméstico (e
regional no caso da União Européia e NAFTA), as estratégias e práticas de
abertura externa e a presença do Estado na economia destes países estão muito
distantes do discurso propalado. A abertura financeira só foi feita nas ocasiões
em que o excesso de capitais no mercado interno requeria ampliação das
fronteiras, enquanto as reformas do mercado de trabalho, da previdência, dos
processos de privatização, dentre outras, foram implementadas no sentido de
retomar a capacidade de acumulação interna nos anos 70.
É mais no campo comercial do que no financeiro que o paradoxo entre
discurso neoliberal e a prática política se apresenta. Apesar do discurso
propagado pró-abertura comercial tanto no âmbito regional como supranacional,
o protecionismo comercial americano e europeu é bastante conhecido.”
(CARCANHOLO, 2005, p. 81)
Portanto, verifica-se a direção e as ambições que se toma o projeto neoliberal ao
constituir uma economia mundial sendo determinada pelas necessidades e interesses dos
capitais centrais, no qual aprofunda a condição vulnerabilidade dos países periféricos
que são subordinados a tais reformas e colocam seus mercados a serviço das intemperes
do mercado. Enquanto os países centrais garantem sua hegemonia, inclusive pela
proteção de seu mercado nacional e das instabilidades e demandas externas.
No âmbito das economias periféricas, como o Brasil, o cumprimento da pauta
neoliberal adequou a necessidade do capital internacional movimentar-se livremente e
buscar rendimentos de alta e rápida valorização sem grandes riscos ou mecanismos de
controle. A partir da esfera financeira que passa a dominar a lógica de acumulação, no
qual os investidores não são responsáveis pela realização do valor, ou seja, não tem
relação direta com a esfera da produção. Contudo, se apropriarem de parcela, e de
parcelas cada vez maiores, deste valor do qual não investiram para sua criação. Nessa
conjuntura, as regiões periféricas ocupam os espaços ideais para a busca desta
valorização – espaços construídos pelo ideário neoliberal. Deste modo, o Brasil seria
uma “plataforma de valorização do capital financeira” como define Paulani:
“É nos anos 1990 que se consuma a vitória avassaladora da
doutrina neoliberal e, com ela, a política econômica e as providências
ainda em curso para a transformação do Brasil num locus de valorização
financeira, particularmente num instrumento que, por meios mais
variados, permite substantivos ganhos reais em moeda forte, em
detrimento de nossa capacidade de aumentar o estoque de riqueza, de
crescer e de conter o aumento da miséria e da barbárie social.”
(PAULANI, 2008, p.103)
Apesar do discurso em garantia da autonomia econômica, o projeto neoliberal
representou a aprofundamento da subalternidade das economias dependentes aos
centros hegemônicos do sistema. Mais de um século passado desde a constituição
efetiva do capitalismo no Brasil, os desafios e contradições parecem manter-se e se
aprofundando. Abandonou-se o projeto de desenvolvimento nacional e da constituição
de produção voltado as demandas e necessidades internas em prol dos ganhos de
mercado e da iniciativa privada. Assim como, as consequências sociais, politicas
subalternas se intensificam, o aumento da desigualdade e das contradições sociais, com
uma política restrita ao grande capital, agora sob a forma do rentismo financeiro.
“Na época neoliberal, não há espaço para o aprofundamento dos direitos sociais,
ainda que limitados, mas estamos diante da tentativa aberta – infelizmente em grande
parte bem sucedida – de eliminar tais direitos, de desconstruir e negar as reformas já
conquistadas pelas classes subalternas.” (COUTINHO, 2012; p.123).
Considerações
O desenvolvimento histórico do modo de produção capitalista no último século
demonstrou a capacidade extraordinária deste sistema modificar frequentemente sua
forma de acumulação ante as diferentes conjunturas políticas, sociais e econômicas para
garantir a valorização do capital e expropriação do trabalho social a nível mundial com
taxa de lucros cada vez maiores. A consolidação do imperialismo enquanto uma nova
fase do capitalismo conduziu todo o século XX e adentrou o século o XXI. Nesse
sentido, embora o capitalismo preserve suas estruturas e mantenha as condições de
produção vinculadas à propriedade privada, o imperialismo emergente com a II
Revolução Industrial, forja-se em condições diferentes das quais nos deparamos
atualmente,
visto
que
identificamos
modificações
significativas
fruto
das
transformações geopolíticas e geoeconômicas ocorridas ao longo deste período. Por
isso, a análise da dinâmica social demanda esforços contínuos e revigorantes no intuito
de compreendermos os fenômenos contemporâneos do capitalismo e suas manifestações
na esfera social, econômica e política.
No fim do século XX, o capitalismo atinge sua expansão mundial com a
implementação da ordem neoliberal em praticamente todos os países a partir da
determinação de agencias multilateral - como FMI e Banco Mundial - e da hegemonia
estadunidense. A difusão capitalista avança internacionalmente amparada pelas políticas
de livre mercado, iniciativa privada e desregulamentação econômica e financeira. Neste
processo, a riqueza passa a ser financeirizada e a economia passa a ser dominada pelo
capital financeiro enquanto o setor produtivo fica submetido às ações especulativas do
mercado mundial, estima-se que a esfera financeira movimenta recursos dez vezes
maiores que os alocados na área produtiva. (COSTA, 2004)
Os esforços para enquadrar definitivamente os países latino-americanos,
inclusive o Brasil, na ordem neoliberal, ocorrem em 1989 com o Consenso de
Washington reunindo membros do governo norte-americano, FMI, Banco Mundial no
intuito de definir estratégias de reformas para a região. O Brasil, sob a gestão de
governo de Fernando Collor de Melo, prontamente adere os pressupostos neoliberais e
passa a se adequar as condições impostas neste acordo, bem como inicia o processo de
implementação de reformas voltadas para o mercado. Assim, a partir da década 1990,
temos uma nova conjuntura política e econômica já colocada a nível mundial que desde
então, se instala em bases nacionais.
Nesta nova conjuntura, que propugna a abertura comercial e financeira como
condutores de uma economia competitiva e estruturada resulta na conservação das
relações hegemônicas construída no sistema econômico mundial desde o século XX, no
qual as regiões periféricas colocam sua produção a serviço da acumulação externa e não
sob bases de um projeto nacional. As políticas que se adotam elevam a vulnerabilidade
de países como Brasil e estabelece um novo caráter de dependência, agora sob a égide
do capital financeiro.
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