Programa de Pós-Graduação em Metrologia CIRCUITO DE HOMOGENEIZAÇÃO DAS CARACTERÍSTICAS DE FASE DE AMOSTRAS GMI: SIMULAÇÃO E ANÁLISE EXPERIMENTAL Aluno: Leonardo Gouvêa e Silva Fortaleza Orientadores: Elisabeth Costa Monteiro e Eduardo Costa da Silva Introdução O efeito da Magnetoimpedância Gigante (GMI) começou a ser estudado intensamente na década de 1990, e caracteriza-se pela variação da impedância de uma amostra de material amorfo de acordo com o campo magnético que o atravessa. A grande vantagem dos magnetômetros GMI em comparação às demais alternativas é o seu baixo custo para produção em escala, aliado à boa sensibilidade e à grande faixa de frequências de operação. O Laboratório de Biometrologia (LaBioMet), pertencente ao Programa de Pós Graduação em Metrologia da PUC-Rio, vem realizando pesquisas relacionadas ao estudo e desenvolvimento de métodos para o diagnóstico clínico não invasivo, em especial, o desenvolvimento de transdutores biomagnéticos baseados no efeito GMI. Campos biomagnéticos são gerados por organismos vivos ou por marcadores magnéticos inseridos nesses organismos. As densidades de fluxo magnético de fontes biomagnéticas são extremamente baixas (1 fT a 1 nT), com magnitude muito inferior à densidade do fluxo magnético terrestre (~20 µT) e ao ruído magnético ambiental. Para superar esse tipo de empecilho pode-se utilizar câmaras magnéticas blindadas, capazes de expressiva atenuação das interferências ambientais. Porém, os custos associados são proibitivos para o uso hospitalar. Outra abordagem possível é a implementação de uma configuração gradiométrica, com a qual se realiza uma leitura diferencial entre dois sensores de comportamento idêntico, um próximo à fonte de interesse, e outro a uma distância suficiente para que este não seja significativamente sensibilizado pelo sinal. O sinal resultante é o de interesse, livre do ruído, suposto comum a ambos os sensores. Desta forma, o gradiômetro permite o aumento da razão sinal/ruído, sem as desvantagens de custo apresentadas pelas câmaras blindadas. No entanto, seu desempenho está fortemente atrelado à homogeneidade dos elementos sensores. Estudos realizados no LaBioMet, indicaram que as fitas GMI, mesmo apresentando a mesma composição química e mesmas dimensões físicas (comprimento, largura e espessura), não apresentam as mesmas variações de impedância, para uma mesma variação do campo magnético [1]. Ou seja, foi constatado um comportamento heterogêneo das amostras, o que impossibilitaria o desenvolvimento de um gradiômetro, baseado nesses sensores, com desempenho satisfatório [2]. Objetivos Estudos simulados e experimentais para implementação de um circuito eletrônico de homogeneização das características de fase da impedância de amostras GMI, tendo em vista o desenvolvimento de configurações gradiométricas de transdutores magnéticos, destinados a medições biomagnéticas [3]. Metodologia As fitas GMI podem ser modeladas como uma resistência em série com uma indutância, cujos valores variam em função do campo magnético externo [4]. Programa de Pós-Graduação em Metrologia Foi implementado um sistema automático de caracterização de efeito GMI, visando à agilidade e à confiabilidade das medições, cuja representação esquemática é apresentada na Figura 1 [5]. O software de controle foi desenvolvido na plataforma LabView. Figura 1- Diagrama Esquemático do Sistema Automático de Caracterização do Efeito GMI Para a excitação da amostra, é usado um LRC meter, cujos parâmetros são controlados por software. O mesmo equipamento realiza leituras de módulo e fase da amostra dados os parâmetros de excitação, utilizando o método de “quatro pontos”, onde dois terminais do equipamento são encarregados do sinal de excitação e outros dois terminais encarregados da medição de tensão. O equipamento utilizado é apresentado na Figura 2. Figura 2- LRC Meter Agilent 4285A Para a geração do campo magnético (DC) externo utiliza-se uma bobina de Helmholtz, que é uma configuração de duas bobinas de diâmetro idêntico, afastadas a uma distância igual ao raio das bobinas, conforme mostrado na Figura 3. Essa configuração garante um campo magnético uniforme no volume interno às bobinas. Esse aparato foi produzido especialmente para o LabBioMet, e permite excitar a amostra com o campo magnético desejado a partir de uma corrente contínua. Essa corrente é fornecida por uma fonte de tensão controlada por software. Uma caixa inversora de polaridade foi desenvolvida para permitir medidas com campos magnéticos em ambos os sentidos. A caixa consiste em um relé duplo acionado simultaneamente por um transistor. Programa de Pós-Graduação em Metrologia Figura 3- Bobina de Helmholtz utilizada para geração do campo magnético (DC), aplicado à amostra GMI. Para estes estudos de homogeneização, foram usados os seguintes parâmetros: duas amostras de fitas metálicas amorfas (comprimento de 5 cm, espessura de 60 µm e largura de 1,5 mm) com mesma composição química (Co70Fe5Si15B10), nível DC de corrente de 80 mA, 15 mA de amplitude de corrente alternada com freqüência de 100 kHz. O estudo da impedância foi feito no intervalo de (-2,0 a 2,0) Oe (1 Oe = 103/4 A/m). O parâmetro corrente DC (80 mA), foi alvo de estudos anteriores e resulta na inserção de um fator de assimetria com relação ao eixo da fase na caracterização das amostras. Esses valores utilizados para os parâmetros foram selecionados por critérios qualitativos baseados em observações empíricas. É prevista a realização de projetos visando à otimização desses parâmetros através do uso de recursos computacionais como algoritmos genéticos e redes neurais, juntamente com um banco de dados experimentais que está sendo desenvolvido. A partir das curvas experimentais de comportamento da fase da impedância de amostras GMI em função do campo magnético aplicado, foi montado um circuito para homogeneização das características de fase dessas amostras [1]. Esse circuito consiste em uma reatância de ajuste Xaj em série com uma resistência negativa Raj, implementada utilizando-se uma topologia FDNR (Frequency Dependent Negative Resistance) – Figura 4(b), a qual é obtida ao se configurar adequadamente as impedâncias internas de um GIC (Generalized Immittance Converters) – Figura 4(a) [6]. Figura 4 – (a) Generalized Immittance Converters (GIC) e (b) FrequencyDependent Negative-Resistance (FDNR) Programa de Pós-Graduação em Metrologia A impedância equivalente ZGIC é definida por (3) e, fazendo-se R3 = R4, ZFDNR é dada por (4). (1) (2) O método de homogeneização proposto em estudo realizado no LaBioMet consiste na resolução de um sistema de duas equações e duas variáveis (Raj e Xaj) [1], capaz de homogeneizar o comportamento das curvas de fase da impedância de duas amostras GMI heterogêneas, numa região compreendida entre dois valores de campo H1 e H2, escolhidos de forma que o intervalo entre eles apresente o comportamento mais linear possível nas características de ambas as fitas sensoras GMI. As equações são as seguintes, supondo as amostras fita A (referência) e fita B, a ser homogeneizada [7]: ( ⇒ ⇒ ) ( (3) ) ( ) { (4) ⇒ ⇒ ( ) ( ) Resultados O método de homogeneização proposto foi aplicado objetivando a homogeneização das características de fase de duas amostras GMI, amostra A e amostra B, previamente caracterizadas. Selecionou-se a região compreendida entre os valores de campo magnético H1 =-0,90 Oe e H2 = -0,10 Oe. Como o interesse maior desta pesquisa é a criação de transdutores de alta sensibilidade, o circuito homogeneizador iguala as características de fase de B (amostra de menor sensibilidade) às características de A (amostra de maior sensibilidade). O intervalo de homogeneização definido e o comportamento das características de fase das amostras utilizadas é apresentado na Figura 5. Figura 5 – Fase da impedância em função do campo magnéticos das amostras GMI A e B e definição do Intervalo de Homogeneização Programa de Pós-Graduação em Metrologia Aplicando-se a equação (4), para as amostras analisadas e na região de homogeneização definida, obteve-se uma capacitância Caj = 9,1µF e uma resistência negativa Raj = -0,54Ω. Assim, as impedâncias internas do FDNR foram selecionadas: C1 = C2 = 10nF, R1 = R3 = 1,2kΩ e R2 = 470Ω. Nesta situação, aplicando-se (2) verifica-se que a impedância equivalente ZFDNR = -53,89Ω, pois valores maiores garantem sua maior estabilidade. Assim, a fim de se obter o valor desejado de Raj introduziu-se um potenciômetro Zpot de ajuste em série com o FDNR, sendo que o valor teórico ideal para Zpot é 53,35Ω. O circuito eletrônico de homogeneização implementado, ao qual a amostra B é conectada, é apresentado na Figura 6, onde as amostras GMI foram eletricamente modeladas como uma resistência Rb em série com uma indutância Lb. Conforme pode ser observado na Figura 6, além dos elementos teóricos previstos, também foram adicionados ao circuito Rescape1 cuja função é retirar do circuito a componente DC da corrente de excitação e Rescape2 cuja função é permitir a polarização da entrada nãoinversora do Amplificador X1. Destaca-se que Rescape1 e Rescape2 foram escolhidos de forma a se minimizar suas influências sobre a impedância equivalente total Zeq. Figura 6 – Representação esquemática da versão 1 do Circuito Homogeneizador A Figura 7 ilustra a proximidade entre o comportamento da amostra A e da amostra B homogeneizada utilizando-se a configuração do Circuito Homogeneizador apresentado na Figura 6. O resultado obtido indica a eficácia do método de homogeneização proposto. Programa de Pós-Graduação em Metrologia Figura 7- Características de fase da magnetoimpedância antes (Amostra B pura) e depois (Amostra B homogeneizada) da inserção do circuito de Homogeneização por dois pontos Foram feitas simulações do circuito eletrônico, no programa TopSpice, que também indicaram a viabilidade do método de homogeneização proposto. A Figura 8 mostra os pontos de encontro (com relação à frequência da corrente gerada) das fases das amostras A e B homogeneizada, em função da frequência da corrente gerada, para nove valores de campo magnético induzido (entre -0,9Oe e -0,1Oe). Conforme esperado, esses pontos de encontro são observados em frequências próximas a 100 kHz, para a qual o método de homogeneização foi aplicado. Figura 8- Pontos de Encontro entre as fases da amostra A e da amostra B homogeneizada, em relação à frequência da corrente aplicada. Programa de Pós-Graduação em Metrologia Apesar dos bons resultados advindos da teoria e das simulações, ao realizar-se a montagem experimental do circuito, observou-se que a reatância de ajuste Xaj não correspondia à esperada. Cogitou-se a possibilidade de que as capacitâncias reais utilizadas nessa topologia poderiam afetar a impedância equivalente do FDNR, visto que o modelo real de uma capacitância inclui resistências em série que acabam por introduzir uma capacitância espúria em ZFDNR, conforme indicado em (5). O valor desta capacitância, que fica em série com o capacitor de ajuste, é inferior ao Caj necessário, impedindo que se atinja o valor teórico desejado. Introduzindo-se as capacitâncias reais, identificadas experimentalmente, ao modelo simulado no TopSpice, foram obtidos resultados que confirmaram a impossibilidade de homogeneização das caracteristicas de fase, como pode ser observado na Figura 9. Figura 9 – Fase da impedância em função da frequência de excitação, incorporando-se ao modelo as resistências espúrias de 0,5 Ω em série com os capacitores do FDNR A equação (5) apresenta a expressão matemática para a impedância equivalente do FDNR expandida considerando-se as resistências espúrias em série com as capacitâncias ideais e considerando os dois capacitores como sendo iguais (C1 = C2): ( ( ) ) (5) Logo obtém-se uma parte resistiva RFDNR e uma capacitiva CFDNR, da seguinte forma: ( { ( ) ) (6) Objetivando-se solucionar o problema identificado, foi incorporada uma indutância de ajuste Laj em série com o capacitor de ajuste Caj, de modo que Laj anulasse a capacitância espúria do FDNR, tornando Z’ puramente uma resistência negativa. Outra possível solução é a escolha de Laj, de forma a tornar indutiva a componente Programa de Pós-Graduação em Metrologia reativa de Z’. Em ambos os casos é possível selecionar um Caj capaz de homogeneizar as características de fase. O novo circuito eletrônico (versão 2 do Circuito Homogeneizador) , apresentado na Figura 10, foi simulado no TopSpice. Figura 10- Representação esquemática da versão 2 do Circuito Homogeneizador Os resultados das simulações, apresentados na Figura 11, confirmaram a eficácia da solução proposta. A homogeneização ocorre na vizinhança da frequência de 101,7kHz, próxima da frequência desejada de 100kHz. O erro obtido deve-se a aspectos não-ideais dos elementos ativos, por simplicidade, não considerados na modelagem teórica. Programa de Pós-Graduação em Metrologia Figura 11 - Pontos de Coincidência entre as fases da amostra A e da amostra B homogeneizada utilizando-se a versão 2 do Circuito Homogeneizador. Conclusões No presente trabalho foram realizados estudos experimentais e simulados objetivando a implementação de um circuito eletrônico capaz de homogeneizar as características de fase da impedância de fitas GMI, tendo em vista sua aplicação na configuração gradiométrica de transdutores magnéticos GMI. A configuração do circuito de homogeneização mostrou-se suscetível a aspectos não ideais introduzidos em sua montagem experimental, alguns dos quais não são modelados pelos softwares de simulação. Dessa forma, a configuração original do circuito homogeneizador foi adaptada para superação de aspectos não ideais observados experimentalmente. O trabalho contribui para o aprimoramento do circuito de homogeneização das características de fase da impedância de sensores GMI, aspecto essencial para o desenvolvimento de transdutores magnéticos com configuração gradiométrica, de alta resolução, capazes de medir campos biomagnéticos. Programa de Pós-Graduação em Metrologia Referências 1 – Costa Silva, E. Gusmão, L. A. P., Hall Barbosa, C. R., Costa Monteiro, E. An electronic approach to homogenize the impedance phase characteristics of heterogeneous GMI sensors. ACTA IMEKO, v. 1, n. 1, p. 70-76, 2012. 2 - Costa Silva, E. Desenvolvimento de Transdutor Baseado na Fase da Magnetoimpedância Gigante para Medição de Campos Biomagnéticos. Dissertação de Mestrado, PUC-Rio, abril de 2010. 3 - Silva, E.C., Gusmão, L.A.P., Barbosa, C. R.H., Monteiro, E.C., (2011) “Homogenization of The Impedance Phase Characteristics of Giant Magnetoimpedance Sensors”, In: Proceedings of the IX SEMETRO, Natal, Brasil, p. 1-6. 4 - Phan, M.H., Peng, H.X. (2008) “Giant magneto impedance materials: Fundamentals and applications” Progress in Materials Science, v. 53, p. 323-420. 5 - Carneiro, J.H.C.C., Costa Silva, E., Gusmão, L.A.P., Barbosa, C.R.H., Costa Monteiro, E. (2012), “System for automatic characterization of giant magnetoimpedance samples”, In: Proceedings of the XX IMEKO World Congress [Metrology for Green Growth], Busan, Republic of Korea, p. 1-5. 6 - Bruton L.T., (1980) RC-Active Circuits: Theory and Design, London: Prentice-Hall International. 1980. 7 - Leipner Y., (2011) Circuito de Homogeneização das Características de Modulo e Fase em Amostras GMI, Projeto de Fim de Curso, Departamento de Engenharia de Controle e Automação, PUC-Rio, Rio de Janeiro, 38p.