de dissertação em pdf - Pós

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Universidade Federal da Bahia
Escola de Medicina Veterinária
Mestrado em Ciência Animal nos Trópicos
GEOTECNOLOGIAS NA ANÁLISE DOS DADOS DO PROGRAMA DE
PROFILAXIA DA RAIVA NO MUNICÍPIO DE LAURO DE FREITAS-BA, NO
PERÍODO 1999-2004
MARIA TEREZA VARGAS LEAL MASCARENHAS
Salvador – Bahia
2008
MARIA TEREZA VARGAS LEAL MASCARENHAS
GEOTECNOLOGIAS NA ANÁLISE DOS DADOS DO PROGRAMA DE PROFILAXIA
DA RAIVA NO MUNICÍPIO DE LAURO DE FREITAS-BA, NO PERÍODO 1999-2004
Dissertação apresentada à Escola de
Medicina Veterinária da Universidade
Federal da Bahia, como requisito para a
obtenção do título de Mestre em Ciência
Animal nos Trópicos, na área de Saúde
Animal.
Orientadora: Profa. Dra. Maria Emília Bavia
Salvador – Bahia
2008
GEOTECNOLOGIAS NA ANÁLISE DOS DADOS DO PROGRAMA DE PROFILAXIA
DA RAIVA NO MUNICÍPIO DE LAURO DE FREITAS-BA, NO PERÍODO 1999-2004
MARIA TEREZA VARGAS LEAL MASCARENHAS
Dissertação defendida e aprovada para obtenção do grau de Mestre em Ciência Animal nos
Trópicos
Salvador, 28 de março de 2008.
Comissão Examinadora:
____________________________________________________
Profa. Dra. Maria Emília Bavia – Universidade Federal da Bahia
Orientadora
_________________________________________________________
Profª. Dra. Claudia Di Lorenzo de Oliveira - Universidade Federal de Minas Gerais
__________________________________________________________
Prof. Dr. Carlos Roberto Franke - Universidade Federal da Bahia
À minha família, que me deu o lastro
necessário para a construção de uma vida
de luta e realizações.
AGRADECIMENTOS
À minha orientadora, Profa. Dra. Maria Emília Bavia, pelo exemplo de determinação e
pioneirismo.
A minha querida filha Mariana, amiga e companheira de todas as horas, sua ajuda me deu a
força necessária para chegar ao fim desta jornada.
A Camila, Beatriz e Roberto Muniz que me inspiraram e estimularam para conclusão deste
trabalho.
Aos meus pais, Duarte e Tereza, sem eles a minha construção como pessoa e como
profissional não chegaria tão longe.
Ao Professor Robson Bahia Cerqueira por suas idéias e contribuições, sempre tão pertinentes.
Ao colega Luiz Fernando Vieira, pela ajuda indispensável.
Aos colegas do Laboratório de Monitoramento de Doenças pelo SIG (LAMDOSIG), pela
disposição em ajudar, sempre que necessário, em especial a Profa. Luciana Lobato Cardim.
A Professora Tereza Calmon, pela sua ajuda, contribuindo com o seu conhecimento nas
análises estatísticas.
A Renato Reis pelos ensinamentos com o geoprocessamento dos dados.
A bibliotecária Tereza Mascarenhas e a professora Taíse Peneluc pelas correções das
Referências.
Ao colega Jorge Ribas pelo apoio, em especial nas revisões de bibliografia.
A Diretoria da ADAB (Agência de Defesa Agropecuária da Bahia) que permitiu a realização
do mestrado, nas pessoas de Dr. Lourival Oliveira e Dr. Willadesmon Silva.
Aos colegas e amigos da ADAB que me estimularam e apoiaram para a realização deste
trabalho.
Ao Prof. Eliel Judson Duarte de Pinheiro por acreditar na minha capacidade.
Aos colegas e professores da UNIME pelas conversas descontraídas e cheias de conhecimento
científico.
Aos amigos da Prefeitura de Lauro de Freitas, especialmente do Centro de Controle de
Zoonoses e do Departamento de Vigilância à Saúde, em especial a Dra. Francisca de Cássia
Oliveira de Almeida, pela ajuda na construção de um trabalho digno e responsável com a
saúde da população deste município.
“A grandeza de uma nação e seu progresso
moral podem ser julgados pelo modo como
seus animais são tratados.”
(Gandhi)
ÍNDICE
página
LISTA DAS TABELAS ......................................................................................................
x
LISTA DAS FIGURAS............................................................................................
xii
LISTA DE ABREVIATURAS.................................................................................
xiv
RESUMO..................................................................................................................
xv
SUMMARY................................................................................................................
xvi
1 INTRODUÇÃO GERAL ...................................................................................
1
2 REVISÃO DA LITERATURA.............................................................................
2
2.1
Etiologia .......................................................................................................
2
2.2
Ciclo epidemiológico e reservatórios da raiva .............................................
3
2.3
Modo de transmissão e período de transmissibilidade ................................
6
2.4
Distribuição da raiva ....................................................................................
7
2.5
Condições socioeconômicas e ocorrência da raiva ......................................
11
2.6
Geotecnologias para o estudo da saúde .......................................................
13
2.7
Dimensionamento da população canina .......................................................
14
2.8
Medidas de controle da doença ....................................................................
15
2.8.1 Profilaxia à raiva humana ............................................................................
16
2.8.1.1 Pré-exposição ...............................................................................................
17
2.8.1.2 Pós-exposição .............................................................................................
18
2.8.2 Vacinação animal .........................................................................................
19
2.8.2.1 De rotina ......................................................................................................
20
2.8.2.2 De campanha ..............................................................................................
20
2.8.2.3 Área de foco ................................................................................................
21
2.8.3 Vigilância Epidemiológica ..........................................................................
21
2.8.4 Controle de população animal .....................................................................
22
2.8.5 Posse Responsável Animal ..........................................................................
23
2.8.6 Educação em saúde ......................................................................................
24
3 ARTIGOS CIENTÍFICOS.....................................................................................
25
3.1 ARTIGO CIENTÍFICO 1: Geotecnologias na análise da população canina
considerando os fatores socioeconômicos e demográficos, em Lauro de FreitasBA, no período de 1999-2004, para o controle da raiva ..........................................
25
página
3.2 ARTIGO CIENTÍFICO 2: Análise espacial dos dados do Programa de
profilaxia à raiva no município de Lauro de Freitas-BA, no período de 19992004 ...................................................................................................................
4 CONSIDERAÇÕES GERAIS ............................................................................
42
66
5 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS................................................................
68
APÊNDICE.............................................................................................................
75
ANEXO ..................................................................................................................
76
LISTA DE TABELAS
página
ARTIGO CIENTÍFICO 1
TABELA 1 - Número de animais vacinados por ano no Município de Lauro de
Freitas-BA, no período de 1999 a 2004..................................................
31
TABELA 2 - População canina estimada pelo Ministério da Saúde e vacinada no
ano de 2000, e as suas diferenças, por Distrito Sanitário........................
31
TABELA 3 - Comparação da população canina e humana, por distrito sanitário, em
Lauro de Freitas-BA, no ano de 2000.....................................................
32
ARTIGO CIENTÍFICO 2
TABELA 1 - Número de agressões por animais em humanos, considerando
condição de domicílio do agressor, no período de 1999 a jun/2004, em
Lauro de Freitas-BA................................................................................
50
TABELA 2 - Agressões por mês de atendimento, no período de 1999 a jun/2004,
em Lauro de Freitas-BA..........................................................................
52
TABELA 3 - Raça de cães agressores, no período de 1999 a jun/2004, em Lauro de
Freitas-BA...............................................................................................
52
TABELA 4 - Número de agressões por animais em humanos, por distrito sanitário,
no período de 1999 a jun/2004, em Lauro de Freitas-BA.......................
TABELA 5 - População humana, Agressões e Incidência (por 1.000 hab) dos casos
ocorridos no ano de 2000, por Distritos Sanitários, em Lauro de
Freitas-BA...............................................................................................
TABELA 6 - Distribuição das Agressões por animais em humanos, por Cluster no
Município de Lauro de Freitas, Bahia, Brasil (1999 a jun/2004), pela
Análise Puramente Espacial....................................................................
54
56
57
LISTA DE FIGURAS
página
REVISÃO BIBLIOGRÁFICA
FIGURA 1 -
Esquema do vírus da Raiva secção longitudinal ....................................
2
FIGURA 2 -
Corte transversal do vírus .......................................................................
2
FIGURA 3 -
Ciclo de transmissão da raiva .................................................................
4
FIGURA 4 -
Presença ou ausência da raiva no mundo em 2003 ................................
8
FIGURA 5 -
Número total de casos de raiva animal em 2003 ....................................
9
FIGURA 6 -
Número total de casos de raiva humana em 2003 ..................................
9
FIGURA 7 -
Ocorrência da Raiva na América do Sul em 2000 .................................
10
FIGURA 8 -
Mapa de Londres com óbitos por cólera identificados por pontos e
FIGURA 9 -
poços de água apresentados por cruzes ..................................................
13
Campanha publicitária da OPAS para eliminação da raiva ...................
16
FIGURA 10 - Série histórica de cobertura vacinal em campanha anti-rábica canina
Bahia, 1996-2005 ...................................................................................
20
PRIMEIRO ARTIGO CIENTÍFICO
FIGURA 1 -
Área de Estudo – Distritos Sanitários do Município de Lauro de
Freitas na Bahia ......................................................................................
FIGURA 2 -
Densidade populacional humana e distribuição espacial da população
canina no Município de Lauro de Freitas-BA, no ano de 2000 .............
FIGURA 3 -
29
33
Distribuição espacial da população canina e Renda do chefe do
domicílio inferior a 2 salários mínimos, no Município de Lauro de
Freitas-BA, no ano de 2000.....................................................................
FIGURA 4 -
33
Distribuição espacial da população canina e tipo de Esgotamento
Sanitário inadequado, no Município de Lauro de Freitas-BA, no ano
de 2000....................................................................................................
34
ARTIGO CIENTÍFICO
FIGURA 1 -
Área de Estudo – Distritos Sanitários do Município de Lauro de
Freitas na Bahia.......................................................................................
46
página
FIGURA 2 -
Número de atendimento das agressões por animais em humanos, no
período de 1999 a jun/2004, em Lauro de Freitas-BA............................
FIGURA 3 -
Número de agressões por animais em humanos, por espécie agressora,
no período de 1999 a jun/2004, em Lauro de Freitas-BA.......................
FIGURA 4 -
51
Agressões por animais em humanos, considerando ter ou não raça
definida, no período de 1999 a jun/2004, em Lauro de Freitas-BA........
FIGURA 6 -
50
Número total de agressões e de animais domiciliados, por dia da
semana, no período de 1999 a jun/2004, em Lauro de Freitas-BA.........
FIGURA 5 -
49
53
Distribuição espacial das agressões por animais em humanos, com
caracterização dos agressores considerando ter ou não Raça definida,
no Município de Lauro de Freitas-BA, no ano de 2000..........................
FIGURA 7
54
Distribuição espacial das agressões, Densidade Populacional humana
e população canina, no Município de Lauro de Freitas-BA, no ano de
2000.........................................................................................................
FIGURA 8
Relação população canina e Agressões por cães, por Distrito, em
Lauro de Freitas-BA, no ano de 2000.....................................................
FIGURA 9
55
55
Detecção de Clusters das Agressões por animais em humanos, através
da Análise de Varredura Puramente Espacial, no Município de Lauro
de Freitas, Bahia, Brasil (1999 – Jun/2004)............................................
57
LISTA DE ABREVIATURAS
CCZ – LF -
Centro de Controle de Zoonoses de Lauro de Freitas
CONDER -
Companhia de Desenvolvimento Urbano do Estado da Bahia
IBGE -
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
LAMDOSIG -
Laboratório de Monitoramento de Doenças pelo S.I.G.
MS -
Ministério da Saúde
OMS -
Organização Mundial da Saúde
OPAS -
Organização Panamericana de Saúde
PAHO -
Organização Pan-Americana de Saúde
RMS -
Região Metropolitana de Salvador
SIG -
Sistemas de Informações Gográficas
SPSS -
Statical Package for the Social Sciences
WHO -
World Health Organization
MASCARENHAS, M.T.V.L. Geotecnologias na análise dos dados do Programa de
Profilaxia da Raiva, no município de Lauro de Freitas-BA, no período 1999-2004.
Salvador, Bahia, 2008. (77) p. Dissertação (Mestrado em Ciência Animal nos Trópicos) Escola de Medicina Veterinária, Universidade Federal da Bahia, 2008.
RESUMO
Por sua evolução letal e pelo elevado número de casos humanos e de pessoas submetidas,
anualmente, a tratamento anti-rábico com vacinas, a raiva continua representando um
importante problema de saúde pública em todo o mundo. A falta de sistemas adequados de
informação e vigilância epidemiológica não permite conhecer a real magnitude do problema.
As geotecnologias aplicadas a questões de saúde pública permitem uma melhor caracterização
e quantificação da exposição a doenças e seus possíveis determinantes, tendo a análise
espacial, como instrumento importante nesta avaliação. Este estudo teve o objetivo analisar a
população canina, tendo como base as condições socioeconômicas do município e de traçar o
perfil epidemiológico dos casos de agressões por animais, ocorridos em de Lauro de Freitas Bahia, no período de Jan/1999 a jun/2004, com identificação de áreas de risco, buscando
subsidiar ações educativas efetivas e específicas para a prevenção da raiva neste município.
Verificou-se que a população canina, no período estava subestimada em 25,6%, em relação à
estimativa oficial, com grande variação entre os Distritos sanitários, com uma maior
concentração no distrito de Areia Branca, área rural do município, onde as condições
socioeconômicas são inferiores. Com o estudo foi possível observar também um aumento no
número de registro de agressões no período, provavelmente pelo estímulo a notificação e que
as agressões ocorrem principalmente por cães, sem raça definida, que tem proprietário, nos
finais de semana, em especial no período de férias de verão. Ficou demonstrado que a
informação fornecida pelo paciente para preenchimento da ficha de profilaxia à raiva no
momento do atendimento pode levar a erros na prescrição da profilaxia humana. Pela análise
espacial foram identificados dois grupos de aglomerados de risco, o primeiro classificado
como o mais verossímil (ou primário) que inclui o Distrito Sanitário Centro e o aglomerado
secundário composto por dois Distritos, que foram Areia Branca e Itinga, localidades que
devem ser identificadas como áreas prioritárias para o controle da raiva no município de
Lauro de Freitas-BA.
Palavras Chave: Raiva Urbana, Raiva Canina, Saúde Pública, Análise espacial,
Geotecnologia, Geoprocessamento.
MASCARENHAS, M.T.V.L. Geotechonologies in analysis of the data of prophylaxis
program of rabies in town of Lauro de Freitas-Bahia, period 1999-2004. Salvador, Bahia,
2008. (77) p. Dissertação (Mestrado em Ciência Animal nos Trópicos) - Escola de Medicina
Veterinária, Universidade Federal da Bahia, 2008.
SUMMARY
Because of its high evolution and the high number of human cases and patients receiving
post-exposure treatment, rabies continues to represent an important public health problem
worldwide. The lack of adequate information systems and epidemiologic watch does not
recognize the real magnitude of the problem. Geotechnologies applied to issues of public
health allow a better characterization and quantification of disease exposures and their
possible determinants, having spatial analysis as an important instrument in this evaluation.
This study had the goal to analyze the canine population, based on the socioeconomic
conditions of the municipality and to track an epidemiologic profile of the cases caused by
animal aggression that happened in Lauro de Freitas, Bahia, Brazil, during 1999 through
2004, with identification of risk areas, looking to subsidize effective and specific educational
actions for rabies prevention in this municipality. The canine population in this period was
observed to be underestimated by 25.6% in relationship with the official estimate,
representing 15.7% of the human population, variation between the districts, with a greater
concentration in rural area of the municipality, Areia Branca (39,2%), where the
socioeconomic conditions were lower. With this study it was possible to also observe an
increase in the number of animal aggressions during these years, probably due to better
notification. These aggressions were mainly by dogs, without defined breed, with owner,
during the weekends, particularly in summer vacation. It was demonstrated that the
information given by the patient to fill out the prophylaxis form at the moment of treatment
could lead to errors in the administration of human prophylaxis. Thanks to spatial analysis,
two risk clusters were identified, the first one considered more reliable (or primary) which
includes the Centro District and the secondary cluster composed of two districts: Areia Branca
and Itinga, localities that must be identified as priority areas for rabies control in the
municipality of Lauro de Freitas-Bahia.
Key Words: Urban rabies, Canine rabies, Public Health, Geotechonologies in analysis,
Geoprocessing.
1
INTRODUÇÃO GERAL
A raiva é uma encefalite viral grave, de natureza fatal, que atinge o Sistema Nervoso Central
dos mamíferos, transmitida pelo vírus rábico presente na saliva de animais infectados, através
de mordedura, arranhadura ou lambedura de mucosa (BRASIL, 2002a; ACHA; SZYFRES,
1986).
Por sua evolução letal e pelo elevado número de casos humanos e de pessoas submetidas,
anualmente, a tratamento anti-rábico com vacinas, a raiva continua representando um
importante problema de saúde pública em todo o mundo. A falta de sistemas adequados de
informação e vigilância epidemiológica não permite conhecer a real magnitude do problema
(BELOTTO, 2000). Metade da população humana no mundo vive em áreas endêmicas de
raiva canina, estando, portanto sob risco de contrair a doença (WHO, 2005).
A grande importância epidemiológica da raiva é devido a sua letalidade de 100%, aliado ao
fato de ser uma doença passível de eliminação no seu ciclo urbano, devido a disposição de
medidas eficientes de prevenção, tanto em relação ao ser humano, quanto a fonte de infecção
(BRASIL, 2002a). A campanha de vacinação animal é um dos importantes instrumentos de
prevenção da doença, porém o seu êxito está diretamente associado a uma estimativa
populacional canina adequada (OPAS/OMS, 1998; BRASIL, 2006a).
Com base nestas premissas, o presente trabalho visa traçar, através do emprego das
geotecnologias, o perfil dos casos de agressões por animais, ocorridos no Município de Lauro
de Freitas - Bahia, no período de janeiro de 1999 a junho de 2004, buscando subsidiar ações
educativas efetivas e específicas para a prevenção da raiva neste município, contribuindo para
a promoção da diminuição das agressões por animais e conseqüentemente a redução do risco
para a raiva humana.
Assim como Ramos (1998), entendemos que os investimentos na área de Saúde Pública,
priorizando as ações preventivas, representam um importante progresso social e uma
significante melhoria na qualidade de vida de uma comunidade, o que justifica as atividades
propostas nesse trabalho.
2
REVISÃO DE LITERATURA
Apesar do avanço acelerado em vários campos da ciência – biologia molecular, engenharia
genética, estudos de código genético - a raiva continua a representar um desafio para o gênio
humano. A falta de adaptação do vírus rábico aos seus hospedeiros transforma a raiva em uma
das doenças mais temidas que afeta a espécie humana por sua inexorável evolução letal
(BELOTTO, 2000). De acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS) metade da
população humana no mundo vive em áreas endêmicas de raiva canina, estando sob risco de
contrair a doença (WHO, 2005). A estimativa anual do custo da raiva é de U$ 583,5 milhões,
principalmente com a administração da profilaxia pós-exposição (WHO, 2005-2007).
2.1 Etiologia
O vírus rábico tem forma de projéctil e seu genoma é constituído de RNA. Pertence ao gênero
Lyssavirus, da família Rhabdoviridae. Apresenta dois antígenos principais: um de superfície,
constituído de uma glicoproteína, responsável pela formação de anticorpos neutralizantes, e
adsorção vírus – célula, e outro interno, constituído por uma nucleoproteína, que é grupo
específico (BRASIL, 2002a; ACHA; SZYFRES, 1986), conforme Figuras 1 e 2.
Figura 1. Esquema do vírus da Raiva secção
Figura 2. Corte transversal do vírus
longitudinal (http://www.cdc.gov)
(http://www.cdc.gov)
Desde princípios da década de 1980 os anticorpos monoclonais têm sido largamente
utilizados na identificação de cepas de vírus da raiva e no diagnóstico da raiva humana e
animal. Com base nestes estudos de anticorpos monoclonais e policlonais do vírus rábico
isolados em diversas espécies animais em todo o mundo, foi estabelecido uma classificação
de grupo rábico Rhabdoviridae, gênero Lyssavirus (OMS, 1999).
Acha e Szyfres (2003) descrevem o gênero Lyssavirus que se subdivide nos seguintes
sorotipos: Sorotipo 1, que incluem a maioria dos vírus que causam a raiva no homem e nos
animais, como também os vírus fixos de laboratório, cepa CVS (Challenge vírus standart);
Sorotipo 2, Virus murciélago Lagos (LBV – Lagos bat vírus), isolado em três espécies de
quirópteros frutívoros na Nigéria, na República Centroafricana, Sul da África e em bovinos de
Zimbábue; Sorotipo 3, Vírus Mokola (MOK), isolado em Crocida spp., na África, no homem
e em cães e gatos; e Sorotipo 4, Vírus Duvennhage (DUV), isolado no homem no Sul da
África e morcegos no Sul da África e Zimbábue.
O uso de tecnologias de biologia molecular permitiu o isolamento de sete genótipos: Rabies
Vírus (RV), Lagos Mokola, Duvenhage, EBL1, EBL2 (European Bat Lyssavirus), ABL
(Australian Bat Lyssavirus) (BUCZEK, 1999).
Em estudo realizado para a caracterização de variantes antigênicas no Brasil e Países
vizinhos, foi identificando além das seis variantes previamente descritas no painel utilizado,
outros cinco perfis diferentes, não compatíveis com os pré-estabelecidos. No Brasil foi
encontrada a variante-3 característica do Desmodus rotundos, em diversas espécies, inclusive
cães e humanos, sugerindo que o morcego hematófago desempenha importante papel tanto na
raiva silvestre, como também, em ambientes urbanos. Circulando em algumas locais ao
mesmo tempo a variante-2, característica de raiva mantida por cães e a variante-3 de
morcegos hematófagos (FAVORETTO et al., 2000).
2.2 Ciclos epidemiológicos e reservatórios da raiva
Apenas os mamíferos são suscetíveis ao vírus da raiva e os únicos capazes de transmiti-lo.
Costa et al. (2000) relatam a presença do vírus em mamíferos, devendo ser pesquisada sempre
que possível, pois possibilita o mapeamento do risco da doença na região de procedência do
animal. Acha e Szyfres (1986) mencionam que os hospedeiros que mantêm o vírus rábico na
natureza são os carnívoros e os morcegos. Os herbívoros e outros animais não agressores,
como os roedores, os lagomofos, não desempenham um papel importante na epidemiologia da
raiva. A raiva em animais domésticos, excluído o cão, não tem grande importância
epidemiológica para a doença no Brasil, de acordo com Schneider et al. (1996). Estudo
realizado por este autor, no período de 1980 a 1990, demonstrou que o ciclo mais importante
é o ciclo urbano, sendo o cão responsável por 83,2% do total de casos humanos, contudo,
apesar de a raiva urbana estar controlada no Rio Grande do Sul, a raiva em bovinos,
transmitida essencialmente por morcegos hematófagos, continua endêmica (TEIXEIRA et al.,
2005).
O cão e o gato são as principais fontes de infecção no ciclo urbano. No Brasil, o morcego é o
principal responsável pela manutenção da cadeia silvestre. Outros reservatórios silvestres são:
macaco, raposa, coiote, chacal, gato do mato, jaritataca, guaxinim e mangusto (BRASIL,
2002a). Na zona rural, a doença afeta animais de produção, como bovinos, eqüinos e outros
(BRASIL, 2006a). As raposas são hospedeiros de raiva na Europa e na América do Norte,
continuando a constituir um sério obstáculo no controle da doença nestes locais
(THRUSFIELD, 2004). Na Polônia no ano de 2000, foram notificados um total de 2.221
casos de raiva animal, sendo na sua maioria animais selvagens (84,4%) (LYCZAK et al.,
2001) (Figura 3).
Figura 3. Ciclos de Transmissão da Raiva (BRASIL, 2002a)
Na análise epidemiológica da ocorrência da raiva humana uma das principais variáveis
estudada é a espécie animal transmissora, a exemplo do trabalho realizado por Belotto (2000),
que além de apontar o cão como principal espécie transmissora da raiva ao homem, o
descreve como responsável pelas mordeduras que resultam em tratamento pós-exposição,
tanto nos países em desenvolvimento como nos países mais desenvolvidos. A Organização
Mundial de Saúde (1999), porém revela que a raiva humana transmitida pelo cão limita-se,
quase que exclusivamente, aos países em desenvolvimento e grande parte do problema devese a incompreensão do papel do cão na sociedade e a falta de aplicação de sistemas de
controle eficazes.
No Brasil, no período de 1995 a 1999, nos casos de raiva humana, o cão foi responsável pela
transmissão em 73,1% dos casos, seguido pelo morcego (10,3%) e pelo gato (4,6%)
(ARAÚJO, 2000). Outros autores mostraram também que o cão é o maior responsável pelos
casos de raiva humana em nosso meio (RAMOS, 1998; COSTA et al., 2000; DAINOVSKAS;
CAMARA, 1998). Estudo recente com o uso do geoprocessamento, mostrou entre outras
conclusões, que na capital do Estado da Bahia, o cão vem sendo responsável direto pelos
casos de raiva humana registrados no Sistema de Vigilância Epidemiológica de Salvador
(RIBAS, 2005).
Estatística realizada em 1996 pela Organização Pan-americana da Saúde (OPAS, 1998)
demonstra que o cão é responsável pela transmissão de 83,6% dos casos de raiva humana
registrados nas Américas, sendo este o reservatório principal dos países em desenvolvimento
(BENENSON, 1997). Segundo informação da Coordenadoria do Programa Estadual de
Controle da Raiva do Instituto Pasteur de São Paulo, nos últimos 14 anos, registrou-se a
mesma percentagem para o Estado de São Paulo (CHAGAS, 1999).
Outros reservatórios importantes são os morcegos hematófagos que provocam mordeduras
para se alimentar, além de outras espécies de morcegos não hematófagas que podem agredir,
numa atitude defensiva ao se sentirem ameaçados, como por exemplo, ao serem manuseados
ou pisoteados, podendo assim transmitir a raiva. Em 2003, no Estado de São Paulo foram
registrados mais de 100 casos de raiva em morcegos, sendo a grande maioria de espécies não
hematófagas (95%) (INSTITUTO PASTEUR, 2004).
Segundo relato de confirmação de diagnóstico da raiva em morcego, a identificação de
morcegos não hematófagos em áreas urbanas, pode estar associado a plantios de vegetais
atrativos nestas áreas, favorecendo a sua sinantropia e possíveis riscos à saúde humana e
animal (CUNHA et al., 2005). Estudo realizado na região oeste do Estado de São Paulo, no
período de 1996 a 2003, constatou que 78,4% das amostras positivas para raiva foram de
morcegos não hematófagos (ALBAS et al., 2005).
A constatação da presença do vírus em morcegos não hematófagos e da possibilidade de que
os mesmos estejam endemicamente infectados com o vírus da raiva introduz uma
preocupação especial, em vista da possibilidade do contato humano com os mesmos. Por
exemplo, o morcego insetívoro Tadarida brasiliensis é bastante comum no meio urbano no
Brasil e tem sido encontrado ocasionalmente contaminado com raiva, mesmo em grandes
cidades em que não são encontrados morcegos hematófagos e a raiva canina é inexistente.
Dessa forma, os cuidados a serem tomados para evitar a contaminação de humanos devem ser
revistos, buscando incluir uma maior conscientização sobre o potencial papel de morcegos
não hematófagos na transmissão da doença (TEIXEIRA et al., 2005).
São considerados animais de baixo risco para a transmissão da raiva, os seguintes roedores e
lagomorfos, urbanos ou de criação: ratazana de esgoto (Rattus norvegicus); rato de telhado
(Rattus rattus); camundongo (Mus musculus); cobaia ou porquinho-da-índia
(Cavea
porcellus); hamster (Mesocricettus auratus); e coelho (Oryetolagus cuniculus), pessoas
agredidas por estas espécies ficam dispensadas do uso de vacina ou soro anti-rábico
(BRASIL, 2002a).
2.3 Modo de transmissão e período de transmissibilidade
A raiva é transmitida de forma direta, pela penetração do vírus contido na saliva do animal
infectado, principalmente pela mordedura e, mais raramente, pela arranhadura e lambedura de
mucosa. O vírus penetra no organismo, multiplica-se no ponto de inoculação, atinge o sistema
nervoso periférico e, posteriormente, o sistema nervoso central e, a partir daí, se dissemina
para vários órgãos e glândulas salivares, nos quais também se replica e é eliminado na saliva
das pessoas ou animais enfermos (BRASIL, 2002a).
A transmissão inter-humana foi descrita através de transplante de órgãos, como córnea. É
descrito também a possibilidade de transmissão por aerossóis em pessoas dentro de cavernas
com muitos morcegos e ambiente laboratorial (BENENSON, 1997). Em estudo realizado em
Minas Gerais foi demonstrado que 63,64% dos casos de raiva humana do período foram
transmitidos por cão, seguido do morcego com 27,27% (MIRANDA; SILVA; MOREIRA,
2003).
A observação de cães e gatos por um período de dez dias, está justificada no fato de que, para
estas espécies, a eliminação de vírus pela saliva se dá de 2 a 5 dias antes do aparecimento dos
sinais clínicos, persistindo durante toda a evolução da doença. A morte do animal ocorre, em
média entre 5 a 7 dias após a apresentação dos sintomas. Em relação aos animais silvestres, há
poucos estudos sobre o período de transmissão, sabendo-se que varia de espécie para espécie.
Por exemplo, especificamente os quirópteros podem albergar o vírus por longo período, sem
sintomatologia aparente (BRASIL, 2002a). Apesar de grandes controvérsias na literatura
científica ficou demonstrado que o morcego como outros mamíferos, reage ao vírus da raiva
com período de incubação variável, com excreção do vírus pela saliva, sem apresentar o
estado de “portador são” e não se recupera após apresentarem sintomatologia de raiva ou
eliminarem vírus pela saliva (KOTAIT, 1996).
O período de incubação é extremamente variável, desde dias até um ano, com média de 45
dias, no homem, e de 10 dias a 2 meses, no cão. Em crianças, existe tendência para um
período de incubação menor que o do indivíduo adulto. O período de incubação está
intrinsecamente ligado a localização e gravidade da mordedura, arranhadura ou lambedura de
animais infectados, proximidade de troncos nervosos e quantidade de partículas virais
inoculadas (BRASIL, 2006a).
2.4 Distribuição da raiva
A raiva ocorre em todos os continentes, com exceção da maior parte da Oceania, Figura 4.
Vários países estão livres da doença, porém a raiva não apresenta uma distribuição uniforme,
nos países infectados, podendo apresentar condições como: áreas livres, de endemicidade
baixa ou alta ou também áreas com surtos endêmicos, no mesmo país (ACHA; SZYFRES,
2003). A raiva transmitida por cão foi eliminada na América do Norte, Oeste da Europa,
Japão e algumas áreas da América do Sul (WHO, 2005).
São consideradas áreas sem raiva na população animal, a Austrália, Nova Zelândia, Nova
Guiné, Japão, Havaí, Taiwan, Oceania, Finlândia, Reino Unido, Islândia (BENENSON,
1997). Porem a raiva ultrapassa continentes, a exemplo do caso de um homem residente da
Austrália, onde o risco da raiva é considerado muito baixo, que foi a óbito pela doença, tendo
sido exposto em Marrocos em viagem de turismo, evidenciando que as infecções podem
cruzar com facilidade as fronteiras geográficas (KRAUSE et al., 2005).
Na última década foi registrada uma importante expansão da agricultura e rebanhos de larga
escala, sobre áreas marginais, diminuindo a renda dos pequenos agricultores. Produzindo
assim êxodos maciços do campo para as periferias das grandes cidades sem infra-estrutura
sanitária adequada, levando a um comprometimento ambiental e vulnerabilidade a certas
zoonoses como a raiva transmitida por morcegos (BELOTTO et al., 2006).
Figura 4. Presença ou ausência da raiva no mundo em 2003 (http://www.cdc.gov/rabies)
A raiva é endêmica em grande parte da África e Ásia, considerando as 55.000 mortes
estimadas no mundo, 56% ocorrem na Ásia e 44% na África, particularmente na área rural
dos dois continentes. O número de casos humanos de raiva no mundo, no ano de 2003,
apresenta-se também de forma heterogênea, não necessariamente de forma similar ao padrão
de distribuição observado nos casos de raiva animal (Figuras 5 e 6) (WHO, 2005-2007).
Figura 5. Número total de casos de raiva ani mal em 2003 (http://www.cdc.gov/rabies)
Figura 6. Número total de casos de raiva humana em 2003 (http://www.cdc.gov/rabies)
Na América Latina o número de casos de raiva humana está limitado a menos de 100 por ano
e a média anual de tratamento anti-rábico é de 500.000 pessoas. Na América do Norte e
Europa o número de casos humanos é menor que 50 e aproximadamente 100.000 pessoas
anualmente, recebem tratamento anti-rábico pós-exposição. Estimativas conservadoras
indicam que a cada 10 a 15 minutos uma pessoa morre de raiva e a cada hora 1.000 pessoas
recebem tratamento pós-exposição no mundo (BELOTTO, 2000).
De acordo com a Figura 7, o padrão de distribuição da raiva na América do Sul, no ano de
2000, demonstra que a doença está presente em quase toda a área. Houve redução no número
de casos na América Latina, porém o Brasil continua tendo casos, inclusive na Bahia, que está
dentro de uma área classificada como de circulação ativa do vírus rábico na espécie canina
(OPAS; OMS, 2005)
Figura 7. Ocorrência da Raiva na América do Sul em 2000 (http://www.cdc.gov/rabies)
A raiva no Brasil tem sido notificada em 22 Estados, com diferenças importantes no controle
da doença, de acordo com as peculiaridades de cada Unidade Federada. No período de 1995 a
1999, o número de casos de Raiva Humana se manteve numa média de 26 casos / ano, destes
44% dos casos ocorreram na Região Nordeste, 32% na região Norte, 12% na região CentroOeste e 12% na Região Sudeste. A Região Sul não registrou casos de Raiva Humana desde
1987 (ARAÚJO, 2000). Em 2004 foram registrados 22 casos de raiva humana e em 2005
ocorreram 42 óbitos até novembro (BRASIL, 2005). A doença apresentou uma redução no
número de casos registrados por ano nas duas últimas décadas, caindo de 173 casos anuais,
em 1980, para 21 casos em 2001. Esses casos atualmente estão concentrados principalmente
nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste. A raiva transmitida por animais domésticos já foi
totalmente eliminada da região Sul e de alguns Estados da região Sudeste. (BRASIL, 2002b)
No período de 1999 a 2004, foram registrados 11 casos de raiva humana no Estado da Bahia,
sendo que nos dois últimos anos os casos ocorreram na área urbana de Salvador, Dias D’Ávila
e Itororó. O Estado é considerado área de risco para a raiva (BRASIL, 2005). No período de
2002 a 2005, foram notificados 264 casos de raiva canina e felina, 18 em raposas e cinco
casos de raiva humana, sendo três transmitidos por cão e dois por morcegos (BRASIL,
2006a).
Em estudo realizado na capital da Bahia no período de 1992 a 2004, a raiva foi considerada
endêmica na cidade, tendo a principal espécie envolvida na transmissão para o homem, a
canina, constatado também que 84% da população humana de Salvador, neste período, esteve
exposta ao risco do vírus rábico (RIBAS, 2005).
2.5 Condições socioeconômicas e ocorrência da raiva
As zoonoses são doenças que apresentam reconhecido caráter social, econômico e sanitário,
tendo condições associadas à pobreza e migrações humanas, como fatores de fortalecimento
de sua transmissão (BELOTTO et al., 2006). Farmer (1996) destaca que a pobreza e
desigualdade social geram cada vez mais uma morbidade diferenciada e o desenvolvimento
nas condições de moradia, entre outros diminui os riscos a doenças, sendo os grupos de risco
de algumas enfermidades como a malária, definidas mais por sua condição socioeconômica
do que pela latitude das terras que habitam.
O Brasil é um dos países do mundo com desigualdades socioeconômicas mais destacadas
(OPAS; OMS, 1998). Em estudo realizado no Brasil no período de 1980 a 1990, sugere que a
raiva se encontra em municípios com problemas socioeconômicos maiores ou na periferia de
algumas grandes cidades, onde vivem pessoas com baixa inserção no processo produtivo
(SCHNEIDER et al.,1996). A ocorrência da raiva humana está relacionada a localidades
carentes sócio e economicamente, como é o caso da Bahia, no Nordeste brasileiro. (OPAS;
OMS, 2005).
Outras variáveis, para análise epidemiológica da raiva humana, deveriam ser melhor
observadas, entre elas as condições de domicílio dos animais, já mostrada em trabalho
realizado em Salvador-BA, em que foi constatado que a maioria dos animais positivos para
raiva eram domiciliados ou semi-domiciliados (RIBAS, 2005). Os fatores sociais poderão
atuar como facilitadores ou empecilhos para a dispersão do vírus em áreas específicas. Quanto
menor a situação de desenvolvimento local, maior é a promiscuidade observada na relação
homem/animal e menores também os cuidados sanitários tomados (MIRANDA; SILVA;
MOREIRA, 2003). As características de exposição, do tratamento humano e variáveis
relacionadas ao animal agressor, poderão em conjunto contribuir para o melhor entendimento
da manutenção dessa complexa doença (PINTO; ALLEONI ,1986).
A raiva humana transmitida por morcegos hematófagos alcançou em 2004 e 2005, na
Amazônia, uma incidência incomum, provavelmente, por um aumento de certas atividades
econômicas com alto impacto no ambiente (BELOTTO et al., 2006). Pode ser observado que
a grande maioria dos dados epidemiológicos existentes são em geral descritos e analisados de
forma isolada e apesar da grande disponibilidade de informações na área, esta grave doença
ainda persiste em nosso meio, levando pessoas e animais a óbito, conforme o Relatório da
Situação da Bahia, em 2005, do Ministério da Saúde (OMS, 1999; BRASIL, 2005).
Carvalho; Cruz; Nobre (1997) identificaram no seu estudo, que teve como base dados
socioeconômicos do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), que áreas de nível
de desenvolvimento distintas podem estar muito próximas, espacialmente, apontando grandes
desigualdades na distribuição dos recursos, seja mapeando grandes regiões de pobreza, seja
identificando microáreas de exclusão em meio a relativa riqueza.
Dentro da análise da saúde, entende-se que a saúde de um indivíduo é melhor assegurada
quando se mantem a melhoria da saúde da população é importante definir qual a população
mais exposta ao risco. Evidencia-se a falta de mais estudos que examinem as doenças de
forma interativa, com identificação de seus fatores de risco, delimitando áreas e populações
que necessitam intervenção imediata (FARMER, 1996).
2.6 Geotecnologias para o estudo da saúde
A incorporação do espaço na análise, caracterizado como análise espacial, busca mensurar
propriedades e relacionamentos, levando em conta a localização espacial do fenômeno em
estudo de forma explicita. Um exemplo pioneiro, quando intuitivamente se incorporou a
categoria espaço às análises realizadas foi realizado no século XIX por John Snow, numa
situação em que a relação espacial entre dados contribuiu significativamente para avanço na
compreensão da cólera, sendo um dos primeiros exemplos de análise espacial (DRUCK et al.,
2004) (Figura 8).
Figura 8. Mapa de Londres com óbitos por cólera identificados por pontos e poços de água
apresentados por cruzes (DRUCK et al., 2004).
Com o advento das novas tecnologias na área de informática e computacional, vem sendo
possível o desenvolvimento de programas para representação da distribuição espacial das
enfermidades e eventos ligados à saúde através das geotecnologias, que podem ser definidas
como um conjunto de “ferramentas” para coleta de dados, tratamento, manipulação e
apresentação de informações espaciais georeferenciadas que tem como característica principal
gerar as facilidades para a identificação de fatores de risco e, através das similaridades, a
delimitação das áreas de risco (BAVIA, 2000). Essas tecnologias tem tornado possível a
realização de análises espaciais em saúde, que vão além do simples mapeamento dos eventos,
para a reprodução de áreas que permitam a análise e reflexão, sob a participação de elementos
históricos, geográficos, socioeconômicos e ambientais, de ordem extrínseca e intrínseca
envolvidos no aparecimento da doença ou agravos, em espaços geográficos definidos
(BAVIA, 1996; MEDRONHO et al., 2003).
O Geoprocessamento aplicado a questões de saúde pública permite o mapeamento de doenças
e avaliação de riscos, no qual o Sistema de Informação Geográfica (SIG) tem sido apontado
como instrumento de integração de dados sócio-demográficos e ambientais com os agravos a
saúde, proporcionando uma melhor caracterização e quantificação da exposição e seus
possíveis determinantes. (BARCELLOS; RAMALHO, 2002). Santos et al. (2001) realizaram
um estudo com análise de variáveis do IBGE, como densidade demográfica, utilizando o
Geoprocessamento, demonstrando ser este um importante instrumento de vigilância e
identificação de situações adversas à saúde.
O estudo do ambiente urbano, tem se mostrado uma das tarefas mais difíceis enfrentadas por
planejadores e pesquisadores nesta área, devido à dificuldade de acesso, disponibilidade e
confiabilidade dos dados intra-urbanos convencionais, pelas principais fontes de dados para
estudos, como dados censitários, estatísticos, mapas, cartas, relatórios, etc. (NOVAESJÚNIOR; COSTA, 2007). As tecnologias de Sensoriamento Remoto e os Sistemas de
Informações geográficas apresentam grande possibilidade de aplicações na apreensão do
espaço urbano (PEREIRA, 1997). Se a doença é uma manifestação do individuo, a situação de
saúde é uma manifestação do lugar (BARCELLOS et al., 2002).
2.7 Dimensionamento da população canina
O desenvolvimento das medidas de controle de doenças e de manejo da população canina
depende da ecologia e da biologia destes animais e das condições socioeconômicas e culturais
da comunidade. È importante desenvolver métodos para melhor estimar a densidade
populacional canina de cada uma das cidades, conforme critérios preestabelecidos, gerando
informações que possibilitem planejar os recursos necessários para implantar as diferentes
medidas de controle populacional e de controle de zoonoses (REICHMANN et al., 2000b).
Em estudo realizado em Minas Gerais, foi observado coberturas vacinais abaixo do
recomendado pela OMS, quando é realizado um novo dimensionamento da população canina,
diferente da estimativa populacional oficial do Estado, para o período, que era de 10%. É
importante ressaltar que dentro da estimativa oficial a cobertura vacinal atendia ao
preconizado (MIRANDA; SILVA; MOREIRA, 2003).
De acordo com censo canino, realizado em uma província na Tailândia, a população canina
cresceu 10% em cinco anos, apresentando uma relação homem:cão de 10:1 (KAMOLTHAM,
et al., 2003). A relação observada nos países em que estes estudos têm sido feito, varia entre
1:4 e 1:7 (OPAS, 1992). Silva et al. (1982), em Belo Horizonte - MG e Reichmann et al.
(2000b), no Estado de São Paulo, após estudos populacionais, encontraram índice médio de
um cão para cada oito habitantes.
MIRANDA; SILVA; MOREIRA (2003) levanta a necessidade de considerar as diferenças
entre porte do município e a densidade demográfica em áreas urbanas, suburbanas, periféricas
e rurais, para o dimensionamento da população canina, diante das divergências encontradas
no seu estudo.
2.8 Medidas de controle da doença
A raiva ainda é considerada um problema imbatível em muitos lugares do mundo e um
constante desafio para os pesquisadores, porém, um fato permanece claro, o de que a
erradicação da raiva humana depende, fundamentalmente, do controle da raiva animal
(GERMANO, 1994). Estudo demonstra que a distribuição de casos humanos de raiva está
relacionada com área de maior concentração de raiva canina (MIRANDA; SILVA;
MOREIRA, 2003).
Existe um compromisso internacional de controle da raiva humana transmitida por cães, na
América Latina (OPAS; OMS, 2005). O programa de eliminação da raiva transmitida por cão
é coordenado pela OPAS, e tem tido resultados no México, América do sul e Caribe (Figura
9) (WHO, 2005).
Figura
9.
Campanha
publicitária
da
OPAS
para
eliminação
da
raiva
(http://www.cdc.gov/rabies)
Os países da região com apoio da OPAS e da OMS conseguiram avanços significativos na
eliminação da raiva transmitida por cão, com uma redução de 90% no número de casos nos
últimos 20 anos (BELOTTO et al., 2006).
Miranda; Silva; Moreira (2003) sugerem que o conhecimento das áreas de risco para raiva,
permite a utilização de condutas adequadas a cada situação, estabelecendo prioridades locais e
possibilitando uma racionalização de recursos financeiros que poderiam ser voltados para a
implementação da vigilância epidemiológica.
Schneider et al. (1996) evidenciam a existência de uma associação direta entre o
desenvolvimento de ações de controle da doença e o resultado na diminuição do número de
casos de raiva, principalmente em locais em que a condição de vida é mais digna, mesmo que
a execução do programa não seja de facilmente exeqüível, é possível de ser realizada.
2.8.1 Profilaxia à raiva humana
Apesar relato de um tratamento realizado com sucesso em um paciente nos Estados Unidos
(WHO, 2005-2007), não existe tratamento específico para a raiva. Após a instalação do
quadro clínico, as únicas condutas possíveis se limitam a diminuir o sofrimento do paciente.
São raros os casos de pacientes com quadro confirmado de raiva que não evoluíram para
óbito, mesmo com o auxílio de todo arsenal terapêutico moderno. A literatura médica registra
apenas três pacientes que sobreviveram à doença, mas em apenas um paciente há evidências
conclusivas de que se tratava realmente de um caso de raiva humana. Assim, o temor a
doença é grande e a profilaxia no paciente, potencialmente infectado, pelo vírus da raiva, deve
ser rigorosamente executada (COSTA et al., 2000).
A raiva é a única virose na qual o tratamento específico por vacina ou soro pode ser aplicado
com êxito depois da contaminação (MORENO et al., 1990). É estimado que 10 milhões de
pessoas no mundo recebam tratamento de profilaxia após a exposição a animais susceptíveis
(WHO, 2005-2007).
Dentro do Programa de controle a primeira ação a ser adotada é a atenção adequada às
pessoas expostas, que inclui tratamentos pré e pós-exposição. (OPAS; OMS, 2005). O
tratamento preventivo da raiva humana tem o objetivo de diminuir a mortalidade no homem,
sem, porém atuar no processo de transmissão da doença (SCHNEIDER et al.,1996).
Os melhores resultados com relação ao tipo de vacina utilizado atualmente foram alcançados
com as vacinas preparadas em culturas celulares, e dentre a de melhor qualidade é, até o
momento, a preparada com células diplóides humanas, embora não completamente isenta de
risco pós-vacinais, esta vacina, porém é de produção muito dispendiosa (GERMANO, 1994).
A vacina humana e animal são gratuitas para o paciente (BRASIL, 2006a).
2.8.1.1 Pré-exposição
É indicada para pessoas que, por força de suas atividades profissionais ou de lazer, estejam
expostas permanentemente ao risco de infecção pelo vírus da raiva, tais como profissionais e
estudantes das áreas de Medicina Veterinária e de Biologia e profissionais e auxiliares de
laboratórios de Virologia e/ou Anatomopatologia para raiva. É indicado, também, para
aqueles que atuam no campo na captura, vacinação, identificação e classificação de
mamíferos passíveis de portarem o vírus, bem como funcionários de zoológicos (BRASIL,
2002a).
A imunização deve ser feita com vacinas de cultivo celular, com aplicação de três doses
intramusculares completas de vacina anti-rábica com uma potência mínima de 2,5 UI por
dose, administradas nos dias 0, 7 e 28. É importante verificar a presença de anticorpos
neutralizantes de vírus em pessoas vacinadas, através do soro coletado 1-3 semanas depois da
última dose. Recomenda-se a aplicação periódica de injeção de reforço às pessoas expostas de
forma contínua ao risco da raiva a cada seis meses, quando o título de anticorpos estiver
abaixo de 0,5 UI/ml (OMS, 1999).
2.8.1.2 Pós-exposição
A profilaxia pós-exposição é indicada para as pessoas que acidentalmente se expuseram ao
vírus; combina a limpeza criteriosa da lesão e a administração da vacina contra raiva,
isoladamente ou em associação com o soro ou a imunoglobulina humana anti-rábica. É o
único meio disponível para evitar a morte do paciente infectado, desde que adequada e
oportunamente aplicada. Entretanto, as indicações desnecessárias da profilaxia expõem o
paciente a risco de eventos adversos, além de ser um desperdício de recursos públicos, o que
compromete a qualidade do sistema de saúde (COSTA et al., 2000).
Considerando-se o alto índice de mortalidade por raiva, é extremamente importante prevenir a
infecção rábica no homem depois da exposição (OMS 1999). Na América Latina é atendido
cerca de 1 milhão de pessoas expostas ao risco da raiva. (OPAS; OMS, 2005). Lyczak et al.
(2001), descrevem um caso de óbito de paciente que recusou-se a realizar tratamento pósexposição, tendo sido agredida por um gato com raiva.
Estudo na Polônia demonstra que a maioria das pessoas vacinadas, são agredidas por animais
domésticos (cães e gatos) e que os casos de raiva animal são na maioria de animais silvestres
(84,4%) e que a raiva em cães representa 2,7%, em gatos 5,1% e 7,5% no gado (LYCZAK et
al., 2001).
Em análise do programa de prevenção à raiva em uma província na Tailandia, ocorrido entre
1996 a 2001, 10.350 pacientes receberam tratamento pós-exposição, sendo que nos últimos
três anos do programa não ocorreram óbitos humanos (KAMOLTHAM et al., 2003).
Estudo realizado em Minas Gerais demonstrou que em 33 casos de raiva humana, houve
procura dos pacientes ao atendimento médico em sistema de saúde privado, porém não houve
indicação de tratamento, mesmo se tratando de área endêmica para raiva. Ficou constatado
que a indicação de vacina, não observa a situação epidemiológica local, levando a erro na
prescrição (MIRANDA; SILVA; MOREIRA, 2003).
Conforme estudo realizado no Brasil no período de 1980 a 1990 demonstrou que cerca de
350.000 pessoas foram atendidas anualmente na rede pública de saúde devido a ataques por
animais, representando 0,14% do total de pessoas atendidas em questões de saúde em todo o
país (SCHNEIDER et al.,1996).
2.8.2 Vacinação animal
No Brasil, a vacina contra raiva canina, utilizada por órgãos públicos, é a vacina modificada
do tipo Funenzalida & Palácios, que é constituída de vírus inativado, 2% de tecido nervoso,
conservantes (à base de fenol e timerosol) e apresentada, em geral, na forma líquida, em
frascos de 50 ml ou 25 doses (REICHMANN et al., 1999).
A vacinação parenteral em massa de animais é a ação de controle mais efetiva contra raiva
(WHO, 2005). Êxitos observados no controle da raiva obedecem fundamentalmente a
estratégias de ações baseadas em campanhas maciças de vacinação canina e tratamento
profilático oportuno às pessoas expostas (BELOTTO, 2004)
A incidência de raiva humana e canina decresceu acentuadamente no Brasil, desde a
instituição do Programa Nacional de Controle, na década de 70, que priorizou a realização de
campanhas anuais de vacinação de cães em áreas urbanas (OPAS; OMS, 1998).
A cobertura vacinal no Estado da Bahia é satisfatória. Entretanto, diferenciada para os
municípios. Ainda não foi realizada a revisão da estimativa populacional canina, Figura 10
(BRASIL, 2006a).
Figura 10. Série histórica de cobertura vacinal em campanha anti-rábica canina. Bahia, 19962005 (BRASIL, 2006)
Em estudo realizado, ficou demonstrado que o maior impacto para o controle da raiva
transmitida por cão é a vacinação animal em massa (MIRANDA; SILVA; MOREIRA, 2003),
que tem como objetivo diminuir a intensidade da transmissão da doença, interrompendo a
transmissão para as pessoas e animais (SCHNEIDER et al.,1996).
2.8.2.1 De rotina
A vacinação contra raiva em áreas endêmicas ou epidêmicas deve desenvolver-se no sistema
de rotina, com o objetivo de atingir os extratos das populações caninas e felinas ingressos
após a campanha anual, eliminando ou diminuindo o contingente de suscetíveis da população,
devendo ser considerado a implantação de postos fixos de vacinação como estratégia aliado a
outras ações de incentivo as atitudes de posse responsável (REICHMANN et al., 1999).
2.8.2.2 De campanha
O objetivo das campanhas de vacinação é o de estabelecer, em curto espaço de tempo, uma
barreira imunológica capaz de interromper a transmissão da raiva na população canina de uma
comunidade e o comprometimento da população humana (REICHMANN et al., 1999).
Na América Latina campanhas de vacinação com coberturas em torno de 80% em um curto
período, ocorrendo anualmente tem tido resultado na diminuição no número de casos de raiva
canina, vacinando cerca de 45 milhões de cães no ano (WHO, 2005).
Cobertura mínima de 70% gera impacto na redução de casos. No Brasil a meta estabelecida
pelo Ministério da Saúde é de 80%, animais vacinados principalmente em campanhas de
vacinação, o aumento no número de cães vacinados, diminuiu a taxa de mortalidade por raiva
humana no País. Estudo demonstra que a vacinação em massa para cães, de forma regular é
um importante instrumento para a prevenção da raiva humana (WHO, 2005; SCHNEIDER et
al.,1996; KAYALI et al., 2003).
2.8.2.3 Área de foco
A finalidade é vacinar ou revacinar os animais de estimação domiciliados na área, para
promover um novo estímulo imunológico nos vacinados e promover a primovacinação
daqueles não vacinados anteriormentes (REICHMANN et al., 1999).
A vacinação deve obedecer ao tipo “casa-a casa”, com o objetivo de imunizar 100% da
população canina estimada, devendo ser realizada nas primeiras 72 horas após a detecção do
foco, devendo proceder a revacinação, em um prazo não inferior a 90 dias. A área de extensão
do foco no caso de raiva urbana deve ser de um raio de 5 Km (BRASIL, 2002a).
2.8.3 Vigilância epidemiológica
Áreas de baixo ou médio risco apresentam Sistemas de Vigilância Epidemiológica operando
adequadamente. O diagnóstico laboratorial em cão deve ser no mínimo de 0,15 da população
canina existente, para demonstrar uma Vigilância Epidemiológica confiável, no caso do Brasil
(OPAS; OMS, 2005). A atividade de Vigilância Epidemiológica é fundamental, nela está
incluído o diagnóstico laboratorial da raiva. O envio anual de amostra equivalente a 0,1% da
população canina estimada para a área permite uma informação confiável sobre a situação da
doença na localidade (SCHNEIDER et al., 1996).
Na Bahia há presença de vírus circulante com municípios silenciosos, devido ao
monitoramento insuficiente. Deverão ser intensificadas as ações de vigilância epidemiológica,
principalmente na atenção as pessoas expostas ao risco de agressão por animais silvestres
(BRASIL, 2006a).
Na vigilância epidemiológica para raiva humana, é importante considerar a hipótese de
ocorrência da doença nos quadros neurológicos de encefalite, com sinais e sintomas clássicos
da raiva e, também, naquelas que apresentam prurido (geralmente no local da agressão) e/ou
sensação de parestesia (“dormência” ou “formigamento”), paresias e paralisias. A presença de
outros sinais e sintomas, como tremores ou convulsões, dor de garganta ou dificuldade de
deglutição, sinais de desidratação com acúmulo de saliva na boca, rouquidão, soluços,
pigarro, náuseas, vômitos, diarréia e febre baixa, devem servir também de alerta como
sugestivos de raiva (INSTITUTO PASTEUR, 2004).
Em estudo realizado em bovinos, observou-se que a forma clínica predominante foi a
paralítica, com presença de incoordenação dos membros pélvicos, seguida de paresia e
paralisia flácida. Observado também outros sinais nervosos como paralisia de cauda e do
esfíncter anal, hipoestesia na região pélvica, sialorréia, cegueira, bruxismo, tremores
musculares na região de cabeça e opstótono. Sinais clínicos compatíveis com a raiva furiosa,
também foram observados em alguns animais, como agressividade e mugidos freqüentes.
Alguns bovinos apresentaram prurido intenso (LANGOHR et al.,. 2003).
A Vigilância Epidemiológica dispõem hoje de um importante instrumento que é o estudo
antigênico das variantes do vírus rábico, através do qual é possível correlacionar amostras do
vírus com possíveis hospedeiros de origem. Atualmente, tal correlação não só é possível
como pode ser utilizada para a orientação de condutas visando o controle e eliminação de
focos (TEIXEIRA et al., 2005).
A instituição de um tratamento adequado, a rapidez na observação do animal e no repasse de
informações dão qualidade à vigilância epidemiológica em caso de agressão animal (RIGO;
HONER, 2005).
2.8.4 Controle da população animal
Para que a raiva se mantenha numa população animal, é necessário que exista um contato
intra-específico entre hospedeiros infectados, o que, por sua vez, requer uma elevada
densidade populacional, daí a importância de ter a população animal reduzida como medida
de controle da raiva (OMS, 1999).
Somente a eutanásia não é suficiente para o controle da raiva (WHO, 2005). A captura e a
eliminação de cães não são mais consideradas medidas de controle eficazes, se bem que
possam obter benefícios indiretos através da eliminação seletiva de cães não vacinados, que
não estejam em conformidade com as normas de controle e costumam se amontoar ao redor
de mercados, matadouros e fábrica de alimentos. A eliminação destes animais deve ser
considerada somente no caso de puder impedir que outros cães ocupem seu lugar ecológico
(OMS, 1999).
No Brasil, a captura de animais durante o controle de focos passou a ser considerada
fundamental, mas a captura de rotina em áreas urbanas não demonstrou ser sempre necessária
para que se consiga o controle da enfermidade. Curitiba, que foi a primeira cidade a conseguir
controlar a raiva no Brasil, não realizava captura sistemática. Esta estratégia provavelmente
depende da realidade local (SCHNEIDER et al.,1996).
No município de Lauro de Freitas a captura de animais está regulamentada pela Lei Municipal
nº. 945/2000 e Lei Municipal nº. 1020/2003 (LAURO DE FREITAS, 2000, 2003). A
eutanásia de animais, seus métodos e procedimentos, estão previstos na Resolução nº. 714/
2002, do Conselho Federal de Medicina Veterinária (CFMV, 2002).
2.8.5. Posse Responsável Animal
A Posse Responsável de animais de estimação traduz o exercício consciente e edificante da
cidadania, a educação e os hábitos culturais diferenciados de uma sociedade (REICHMANN
et al., 2000a). A realização de monitoramento da população canina, com estímulo a
esterilização e vacinação, foram ações realizadas para o controle da raiva humana
(KAMOLTHAM, et al., 2003).
Posturas de posse responsável redundam em melhores condições de vida porque permitem
evoluir na prevenção de doenças e de agravos, assim como contribuem para a preservação do
meio ambiente. Para isto deve existir envolvimento da sociedade na busca de soluções e
adequações para cada local (REICHMANN et al., 2000a).
A posse responsável pressupõe a manutenção constante de animais de estimação nos
domicílios de seus proprietários, em boas condições de higiene e saúde e, quando a passeio,
que sejam controlados através do uso de coleiras e de guias por pessoas com capacidade física
para conduzi-los (REICHMANN et al., 2000b).
Alguns aspectos importante, referente à posse responsável animal, como a vacinação,
manutenção do animal em condições higiênicas de alojamento, alimentação e saúde, bem
como remoção de seus dejetos depositados em logradouro público ou em locais
inapropriados, estão previsto em Legislação municipal (LAURO DE FREITAS, 2000, 2003).
2.8.6. Educação em saúde
Em estudo de um programa bem sucedido de controle da raiva, na Tailândia, ficou atribuído
como fator importante, a educação das equipes de saúde, para prescrição adequada da
profilaxia a raiva humana e a educação da comunidade, sobre os riscos da doença, em especial
para pais, devido ao grande risco da ocorrência em crianças, em local em que a raiva canina
ainda era endêmica (KAMOLTHAM et al., 2003). Exemplo de administração de esquemas de
soro-vacinação erradas, em que um caso grave no qual o cão morreu dentro do período de
observação, porém o paciente não foi a óbito pela identificação a tempo do erro e realização
de ajuste na prescrição, demonstra a importância da educação em saúde, como instrumento de
controle da raiva humana (ZANETTI et al., 1993).
3 ARTIGO CIENTÍFICO
3.1 ARTIGO 1
Geotecnologias na análise da população canina considerando os fatores socioeconômicos
e demográficos, em Lauro de Freitas-BA, no período de 1999-2004, para o controle da
raiva.
Geospatial analysis of canine population in relation to socio economics and demographics
factors in Lauro de Freitas, Bahia, during 1999-2004.
Maria Tereza Vargas Leal Mascarenhas1,2; Robson Bahia Cerqueira2; Luciana Lobato
Cardim3; Thereza Cristina Borio dos Santos Calmon Bittencourt3; Taíse Peneluc2; Valdirene
Silva de Brito3; Marta Mariana Nascimento Silva3; Maria Emília Bavia3.
RESUMO
A análise da população canina de um município representa um instrumento indispensável para
o controle da raiva e outras zoonoses, que tenham o cão como reservatório. Fatores
socioeconômicos e demográficos foram considerados devido à relação destes com a condição
da saúde de uma população, amplamente mencionada em diversos estudos. As geotecnologias
aplicadas a questões de saúde pública permitem uma melhor caracterização e quantificação da
exposição a doenças e seus possíveis determinantes. O presente estudo teve como base o
histórico vacinal do Município de Lauro de Freitas-BA (1999 a 2004) e os dados do último
Censo Demográfico no ano 2000, constatando que a população canina, no período estava
subestimada em 25,7%, em relação à estimativa oficial, representando 15,7% da população
humana, com grande variação entre os Distritos sanitários, com uma maior concentração em
Areia Branca (39,2%), área rural do município, em que as condições socioeconômicas eram
inferiores e a menor no distrito de Ipitanga (2,7%), local com características de veraneio. A
alta proporção de cães no município pode estar relacionada com tipo de moradia,
principalmente horizontal, com predominância de domicílio tipo casa.
Palavras-chave: População canina, Geotecnologias, Sistema de Informação Geográfica
(SIG), Raiva, Zoonoses, Saúde Pública.
1. Agencia Estadual de Defesa Agropecuária da Bahia (ADAB) 2. União Metropolitana
de Educação e Cultura (UNIME) 3. Laboratório de Monitoramento de doenças pelo
Sistema de Informação Geográfica (LAMDOSIG/HOSPMEV/UFBA).
Endereço para correspondência: Profa. Dra. Maria Emília Bavia. Escola de Medicina
Veterinária, Universidade Federal da Bahia. Av. Adhemar de Barros, 500, Ondina,
40170-110, Salvador, Bahia. Brasil.
Tel.: 55 71 32836745 E-mail: [email protected]
SUMMARY
The analysis of the canine population of a municipality is an indispensable for the control of
rabies and other zoonosis, which have the dog as a reservoir. Demographic and
socioeconomic factors were considered because the relation of those with the health condition
of population, mentioned widely in several studies. The geotechnologies applications to
matters of public health allow better characterization and quantification of exposure to
diseases and their possible risk factors. This study was based on the history of vaccination of
the city of Lauro de Freitas-Bahia, Brazil (1999 to 2004) and the date of the last Population
Census in 2000. It noted that the canine population during that period was underestimated by
25.7% in relation to official estimate, representing 15.7% of the human population, variation
between the districts, with a greater concentracion in rural area of the municipality, Areia
Branca (39,2%), where the socioeconomic conditions were lower. The district of Ipitanga is
less percentage of the authority (2,7%). The high proportion of dogs in the city could be
linked to the housing type, which is predominantly horizontal in structure.
Key Words: Population canina, Canine rabies, Public Health, Geotechonologies,
Geoprocessing
INTRODUÇÃO
O cão é o principal reservatório da raiva urbana (ACHA; SZYFRES, 1986; BRASIL, 2002a),
metade da população humana no mundo vive em áreas endêmicas de raiva canina, estando
sob risco de contrair a doença (WHO, 2005). Ficou demonstrado que o maior impacto para o
controle da raiva transmitida pelos cães é a vacinação animal em massa, interrompendo a
transmissão para as pessoas e animais (MIRANDA; SILVA; MOREIRA, 2003; SCHNEIDER
et al.,1996).
O desenvolvimento das medidas de controle de doenças e de manejo da população canina
depende da ecologia, biologia destes animais,s condições socioeconômicas e culturais da
comunidade. Torna-se importante desenvolver métodos para melhor estimar a densidade
populacional canina em áreas geográficas, conforme critérios preestabelecidos, gerando
informações que possibilitem planejar os recursos necessários para implantar as diferentes
medidas de controle populacional e conseqüentemente o controle de zoonoses
(REICHMANN et al., 2000a).
A atividade de Vigilância Epidemiológica é também fundamental para o controle da raiva, em
que está incluído o diagnóstico laboratorial. O envio anual de amostra equivalente a 0,1% da
população canina estimada para a área permite uma informação confiável sobre a situação da
doença na localidade (SCHNEIDER et al., 1996).
Os fatores sociais funcionam como facilitadores ou empecilhos para dispersão do vírus da
raiva em uma determinada área. Quanto menor a situação de desenvolvimento local, maior é a
promiscuidade observada na relação homem/animal e menores também os cuidados sanitários
tomados (BELOTTO et al., 2006; FARMER, 1996; MIRANDA; SILVA; MOREIRA, 2003).
A Bahia é considerada área de risco para a raiva, apesar da cobertura vacinal ser considerada
satisfatória, em torno de 80%, porém no Estado há presença de vírus circulante com
municípios silenciosos, devido ao monitoramento insuficiente (BRASIL, 2005, 2006). Em
estudo realizado em Salvador-BA, no período de 1992 a 2004, Ribas (2005) demonstrou a
endemicidade da raiva, tendo o cão como principal animal envolvido na transmissão para o
homem, constatando também que 84% da população humana residente na capital, esteve
exposta ao risco do vírus rábico.
Com o advento das novas tecnologias na área de informática e computacional, vem sendo
possível o desenvolvimento de programas para representação da distribuição espacial das
enfermidades e eventos ligados à saúde através das geotecnologias, que tem tornado possível
a realização de análises espaciais em saúde, que vão além do simples mapeamento dos
eventos, para a reprodução de áreas que permitam a análise e reflexão, sob a participação de
elementos históricos, geográficos, socioeconômicos e ambientais, de ordem extrínseca e
intrínseca envolvidos no aparecimento da doença ou agravos, em espaços geográficos
definidos (BARCELLOS; RAMALHO, 2002; BAVIA, 1996; BAVIA et al., 2000;
MEDRONHO et al., 2003).
Este trabalho se propõe, através das geotecnologias, a análise da população canina do
município de Lauro de Freitas-BA, no período de 1999 a 2004, levando em conta os dados
socioeconômicos e demográficos de cada distrito sanitário do município, com objetivo de
respaldar ações de controle da raiva, através do dimensionamento e caracterização adequada
da população canina para ações como vacinação animal, vigilância epidemiológica da doença
e atividades para a educação em saúde.
MATERIAL E MÉTODOS
Área do estudo
O Município de Lauro de Freitas, pertence à Região Metropolitana de Salvador (RMS), com
uma população de 113.543 habitantes, numa área de 59 Km2 (IBGE, 2000). Situado
geograficamente na latitude 12º52’S e longitude 38º02’W, limitando-se ao norte com Simões
Filho, ao sul o Oceano Atlântico, ao leste com Camaçari e ao oeste com Salvador, da qual
mantém uma distância de 22 km em relação ao centro, Figura 1.
A unidade espacial utilizada neste trabalho foi o Distrito Sanitário, de acordo com a divisão
administrativa adotada pelo órgão público oficial no período do estudo.
Figura 1. Área de Estudo – Distritos sanitários do município de Lauro de Freitas-Bahia
Dados Epidemiológicos
Dados socioeconômicos e demográficos foram obtidos através do último censo, realizado no
ano 2000 pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). A área estudada possui
111 setores censitários, os dados foram agrupado em sete distritos sanitários, como mostra o
Apêndice 1, sendo composto por: população, tipos de domicílios, fonte de abastecimento de
água, tipo de esgotamento sanitário, destino do lixo, escolaridade e renda.
Foram levantados os dados de vacinação animal no período de 1999 a 2004, por Distrito
Sanitário. No período, foi realizado um inquérito vacinal, a campanha de vacinação ocorreu
em um único ciclo, com orientação de revacinação de animais adultos após o período de um
ano. A Prefeitura de Lauro de Freitas realizou o controle através da carteira de vacinação
animal, confeccionada e distribuída para a população, garantindo um monitoramento
adequado. Os dados dos animais referentes à vacinação, espécie animal, período e local de
residência, foram agrupados por Distritos sanitários.
A população canina por distrito sanitário foi estimada, com base no Censo de 2000, seguindo
a orientação do Ministério da Saúde, como sendo 12,5% da população humana (BRASIL,
2002b) e comparada com a população canina vacinada neste ano. Realizada análise descritiva
dos dados, através do software Statical Package for the Social Sciences (SPSS 13.0), com
obtenção da distribuição e freqüência das informações, evidenciando seus atributos.
Para a composição da base cartográfica digitalizada de Lauro de Freitas-BA foi utilizado o
mapa dos setores censitários na escala original de 1:2.000 (2003), digitalizadas pela
Companhia de Desenvolvimento Urbano do Estado da Bahia (CONDER), agrupados nos
Distritos Sanitários, com o auxílio do software ArcView 9.1.
O Sistema de Informação Geográfica (SIG) foi montado sobre a base cartográfica digitalizada
e georeferenciada no qual foram plotados os endereços presentes nas planilhas de vacinação
analisadas, considerando o distrito dos animais vacinados, junto com dados censitários,
através do software ArcView 9.1, realizado no Laboratório de Monitoramento de Doenças
pelo Sistema de Informação Geográfica (LAMDOSIG/UFBA).
RESULTADOS
No período do estudo (1999 a 2004), foram observados um total de 134.077 animais
vacinados, sendo 116.713 cães e 17.364 gatos. No ano 2000, que foi o ano base para esta
análise, por ser o ano do último censo demográfico disponível do IBGE, foram vacinados
17.842 cães e 2.619 gatos, totalizando 20.461 animais (Tabela 1).
De acordo com a estimativa preconizada pelo Ministério da Saúde a população animal no
município seria de 14.193 cães e 2.839 gatos, totalizando 17.031 animais, para o ano de 2000,
neste mesmo período observou-se que o número de cães vacinados superou em 3.649 animais
(25,7%) com relação à estimativa oficial (Tabela 2).
Tabela 1. Número de animais vacinados por ano no Município de Lauro de Freitas-BA, no
período de 1999 a 2004.
Animais vacinados
Ano Vacinação
Cães
Gatos
Total
1999
19.544
3.190
22.734
2000
17.842
2.619
20.461
2001
18.997
2.326
21.323
2002
21.038
2.956
23.994
2003
18.444
2.936
21.380
2004
20.848
3.337
24.185
Total
116.713
17.364
134.077
Tabela 2. População canina estimada pelo Ministério da Saúde e vacinada no ano de 2000, e
as suas diferenças, por Distrito Sanitário.
Estimativa cães
Diferença entre % da diferença entre
Ministério da
Cães
cães vacinados e
cães vacinados e
DISTRITOS
Saúde
vacinados
estimados
estimados
Areia Branca
394
1235
841
213,5
Atlântico Norte
1585
2120
535
33,8
Caji-Picuaia
1831
993
-838
-45,8
Centro
2063
3708
1645
79,7
Ipitanga
1468
328
-1140
-77,7
Itinga
4868
7448
2580
53,0
Portão
1985
2010
25
1,3
TOTAL
14193
17842
3649
25,7
A população canina no ano de 2000 representou uma percentagem em relação à população
humana de 15,7%, excedendo, portanto a estimativa oficial de 12,5% (Tabela 3). Tendo como
base os dados do IBGE, verificou-se que o município apresenta um tipo de moradia
principalmente horizontal, com predominância de domicílios tipo casa, com uma percentagem
acima de 90%, com exceção do Distrito Centro que apresentou 83,9% tipo casa.
Constatou-se que a distribuição da população e sua densidade populacional têm apresentação
heterogênea, conforme demonstrado na Tabela 3 e Figura 2. É possível observar a grande
variação proporcional da população canina proposta neste trabalho, considerando os Distritos
Sanitários. A menor proporção de cães em relação à população humana é no Distrito de
Ipitanga (2,7%) local no qual a maior parte da população permanece nas residências apenas
nos finais de semana e período de férias (características de veraneio). A maior proporção
ocorre no Distrito de Areia Branca (39,2%), o único caracterizado como rural no município,
em que ocorre a menor densidade populacional, com presença de sítios e pequenas
propriedades.
Tabela 3. Comparação da população canina e humana, por distrito sanitário, em Lauro de
Freitas-BA, no ano de 2000.
Pessoas
Relação
DISTRITOS
Cães
% de cães
residentes
homem/cão
Areia Branca
1235
3151
39,2
3:1
Atlântico Norte
2120
12188
17,4
6:1
Caji-Picuaia
993
12033
8,3
12:1
Centro
3708
16500
22,5
4:1
Ipitanga
328
12237
2,7
37:1
Itinga
7448
41558
17,9
6:1
Portão
2010
15876
12,7
8:1
TOTAL
17842
113543
15,7
6:1
Uma característica demográfica que apresenta destaque é a Densidade Populacional, por
Distrito Sanitário no município. Areia Branca apresenta a mais baixa, com 190 hab/Km2 e o
Distrito de Itinga a maior com 8.461 hab/Km2 (Figura 2).
A maior população canina está relacionada com a maior população humana, porém é possível
verificar que o distrito de Areia Branca apesar de ter a menor população humana, não
apresenta a menor população canina (Figura 2).
Através da distribuição espacial com uso do Sistema de Informação Geográfica (SIG),
observou-se que o Distrito de Areia Branca, além, de apresentar características rurais, destacase com os menores índices socioeconômicos, em relação ao resto do município, como nos
dados de alfabetização, renda das pessoas responsáveis pelo domicílio e saneamento básico
(Figuras 3 e 4), porém dados como coleta de lixo e abastecimento de água, não apresentam
grande variação entre os distritos.
* A representação tridimensional do mapa, está de acordo com a população canina
Figura 2. Densidade populacional humana e distribuição espacial da população canina no
Município de Lauro de Freitas-BA, no ano de 2000.
* A representação tridimensional do mapa, está de acordo com a população canina
Figura 3. Distribuição espacial da população canina e Renda do chefe do domicílio inferior a
dois salários mínimos, no Município de Lauro de Freitas-BA, no ano de 2000.
* A representação tridimensional do mapa, está de acordo com a população canina
Figura 4. Distribuição espacial da população canina e tipo de Esgotamento Sanitário
inadequado, no Município de Lauro de Freitas-BA, no ano de 2000.
DISCUSSÃO
De acordo com Ramos (1998), os investimentos na área de Saúde Pública, priorizando as
ações preventivas, representam um importante progresso social e uma significante melhoria
na qualidade de vida da comunidade, porém ainda não foi realizada uma revisão da estimativa
populacional canina no Brasil (BRASIL, 2006; SCHNEIDER et al.,1996), o que seria um
instrumento fundamental para o controle da raiva, em ações prioritárias como a vacinação
animal e a vigilância epidemiológica da doença.
Conforme recomendado pela OMS (1999) foi realizado um levantamento dos dados sobre a
população canina, como estratégia de prevenção da raiva, considerando aspectos como
densidade populacional humana, relação entre população canina e humana, formas de
propriedade dos cães, padrões de assentamento humano, entre outros fatores foram avaliados.
Neste estudo a população canina estimada superou a população canina estabelecida pelo
Ministério da Saúde (BRASIL, 2002b), em 25,7%, com variações importantes entre os
Distritos Sanitários, fato este, que pode ter relação com as características socioeconômicas e
demográficas de cada um.
A maior diferença encontrada entre a população canina estimada oficialmente e a observada
neste estudo, ocorreu no distrito de Areia Branca (39,2%), localidade rural, em que a
população residente apresenta a menor renda no município, além das piores condições de
saneamento e educação. Estas características aliadas ao fato do distrito apresentar a menor
densidade populacional devem ser consideradas, devido as grandes distâncias percorridas para
o atendimento de toda população, com a finalidade de garantir a realizações de ações efetivas
no controle da raiva.
A OMS valida que a população canina deve ser estimada numa relação de um cão para sete
homens. Em diversos estudos considerando a relação da população canina e humana, fica
demonstrada a grande variação nesta proporção. OPAS (1992) descreve que a relação
observada nos países em que estes estudos têm sido feito, varia entre 1:4 e 1:7. Em uma
província na Tailândia a relação homem:cão foi 10:1. Em Recife (PE) foi encontrada uma
razão de 9,1 humanos para cada cão, em Taboão da Serra (SP) foi de 5,14, em Araçatuba (SP)
observou-se uma relação de 3,6. (WHO, 1992; LIMA JÚNIOR, 1999; NUNES et al., 1997;
KAMOLTHAM, et al., 2003; DIAS et al., 2004; ALVES et al., 2005).
Silva et al. (1982), em Belo Horizonte (MG) e Reichmann et al. (2000b), no Estado de São
Paulo, após estudos populacionais, encontraram índice médio de um cão para cada oito
habitantes, mesmo índice preconizado pelo Ministério da Saúde (BRASIL, 2002b). No
presente estudo a relação homem/cão encontrada foi de 6:1, em que a população canina
representa 15,7% da população humana. A alta proporção de cães no município pode estar
relacionada ao tipo de moradia, principalmente horizontal, com predominância de domicílio
tipo casa, no qual muitos residentes criam animais para fins de guarda ou companhia.
Após a realização de novo dimensionamento da população canina, em Minas Gerais, foi
observado coberturas vacinais abaixo do recomendado pela OMS, devido à diferença da
estimativa populacional oficial do Estado, para o período (10%), e a população real. É
importante ressaltar que dentro da estimativa oficial a cobertura vacinal atendia ao
preconizado (MIRANDA; SILVA; MOREIRA, 2003). Estes resultados corroboram como o
observado neste estudo, em que a população canina encontrava-se subestimada e as coberturas
vacinais no período de estudo apresentaram-se sempre acima de 100%.
De acordo com Dias et al. (2004), adoção de uma metodologia de estimativa populacional
canina domiciliada baseada em indicadores populacionais humanos, é a mais indicada e
facilmente exeqüível quando comparada ao censo canino. Quanto maior a identificação entre
a população e seu território, mais facilmente podem ser elaborados os diagnósticos e
planejamento das ações de saúde, pelo conhecimento da estrutura e dinâmica espacial da
população. Através desta caracterização é possível realizar o planejamento de ações de
controle e alocação de recursos de forma mais eficiente (BARCELLOS et al., 2002).
O presente estudo demonstra que o Município de Lauro de Freitas-BA, apresenta
características socioeconômicas e demográficas, bastante diversificada, com perfis
diferenciados para cada distrito sanitário, devendo esta característica ser consideradas no
planejamento de ações do controle da raiva. A exemplo das características observadas no
distrito de Ipitanga, em que a população canina apresenta uma percentagem em relação a
população humana de apenas 2,7%, tal característica pode estar associada ao fato de nesta
localidade a população manter suas casas para freqüência apenas nos finais de semana e
período de férias, apresentando portanto poucos animais domésticos. Comumente estas
residências permanecem fechadas durante a semana, ações como a vacinação animal, devem
ser desenvolvidas preferencialmente nos finais de semana.
Corroborando com nosso estudo de caracterização socioeconômica e demográfica do
município, Souza (1988) revelou que entre 1970 e 1987, a Itinga e o Centro apresentaram uma
taxa de crescimento do número de domicílios superior a 200%, uma das maiores da RMS,
justificando a alta densidade populacional encontrada neste estudo. Dias (2004) descreve que
Lauro de Freitas está situado no vetor de expansão da capital, voltados tanto para a classe
média e alta, quanto para aqueles de rendimentos mais baixos. No período de 1980 a 1991
algumas áreas deixaram de se caracterizar essencialmente como local de veraneio para se
transformarem em habitações permanentes, a exemplo de Vilas do Atlântico, localizado no
Distrito Atlântico Norte em que no ano de 2000, contava com a maior proporção de pessoas
com rendimento superior a 20 salários mínimos.
Observou-se neste estudo, uma freqüência absoluta da população canina, com distribuição
espacial similar a população humana, relacionada também a densidade populacional. Dias
(2004) demonstrou em análise da população humana de Lauro de Freitas-BA, a elevação da
densidade demográfica, entre 1970 e 2000, foi expressiva: passou de 166,8 hab/Km2 pra 1.924
hab/Km2, respectivamente, colocando a cidade como o segundo município em densidade da
RMS, superado apenas por Salvador. Apesar de representar apenas 2,57% do território
metropolitano, no ano de 2000, foi a terceira maior população da RMS, com 3,76% do total
de moradores dessa região – inferior a Salvador e a Camaçari, sendo a 11ª maior população da
Bahia. Comparado com as demais cidades da RMS, Lauro de Freitas apresentou o maior
ritmo de crescimento das últimas duas décadas.
Miranda; Silva; Moreira (2003) levantam a necessidade de considerar as diferenças entre
porte do município e a densidade demográfica em áreas urbanas, suburbanas, periféricas e
rurais, para o dimensionamento da população canina, diante das divergências encontradas. Na
análise dos dados do município observou-se que existem diferenças importantes na relação da
população humana e canina, considerando cada distrito sanitário.
Para a melhoria da condição de saúde da população é importante definir qual o público alvo,
considerando a doença e fatores de riscos nos espaço geográficos ocupados (FARMER,
1996). Faz-se necessário, para a implantação de um programa eficiente de controle da raiva,
com vacinação canina, vigilância epidemiológica, envio de amostra para laboratório, além de
ações de educação em saúde, uma análise correta da população canina e caracterização da
população humana de cada localidade. O dimensionamento da população canina em períodos
posteriores, com criação de índices adequados, considerando outros fatores como o
crescimento populacional e mortalidade, deve ser considerado.
CONCLUSÃO
A população canina do município de Lauro de Freitas-BA, no período estudado apresentou-se
de forma subestimada, superando em 25,7% a população estabelecida, por órgãos oficiais.
No período de estudo, a população canina representou 15,7% da população humana, com uma
variação de 2,7% a 39,2%, entre os distritos sanitários.
A maior relação homem/cão foi observada no Distrito de Areia Branca, caracterizado como
área rural, em que as condições socioeconômicas apresentaram os menores níveis do
município.
A menor proporção na relação homem/cão foi observada no Distrito de Ipitanga, local com
características de veraneio no município.
A alta proporção de cães no município pode estar relacionada com o tipo de moradia,
principalmente horizontal, com predominância de domicílio tipo casa.
O conhecimento da população canina do município é fator fundamental para a aplicação de
medidas de controle da raiva, como a vacinação canina, vigilância epidemiológica, com envio
de amostra para laboratório, além de ações de educação.
Mais estudos fazem-se necessários para o dimensionamento da população canina em períodos
posteriores, com criação de índices adequados, considerando outros fatores como o
crescimento populacional e mortalidade, por exemplo.
REFERÊNCIAS
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y a los animales. 2 ed. Washington: Orgonizacion Panamericana de la Salud, 1986.
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3.2 ARTIGO 2
Análise espacial dos dados do programa de profilaxia da raiva no município de Lauro de
Freitas-BA, no período de 1999-2004.
Geospatial analysis of the data of the rabies control program in Lauro de Freitas
municipality, Bahia during 1999-2004.
Maria Tereza Vargas Leal Mascarenhas1,2; Robson Bahia Cerqueira2; Luciana Lobato
Cardim3; Thereza Cristina Borio dos Santos Calmon Bittencourt3; Taíse Peneluc2; Valdirene
Silva de Brito3; Marta Mariana Nascimento Silva3; Maria Emília Bavia3.
RESUMO
A elevada letalidade e o número de pessoas vacinadas tornam a raiva um problema de saúde
pública mundial. Inadequados sistemas de informação e vigilância epidemiológica não
permitem conhecer a magnitude real do problema. Geotecnologias aplicadas na saúde pública
caracterizam e quantificam a exposição a doenças e seus possíveis determinantes, tendo a
análise espacial, como instrumento importante nesta avaliação. Este estudo objetivou traçar o
perfil epidemiológico das agressões por animais, em Lauro de Freitas-Bahia, entre 1999-2004,
identificando áreas de risco, subsidiando ações educativas efetivas e específicas para
prevenção da raiva neste município. Observou-se um aumento no registro de agressões no
período, provavelmente pelo estímulo a notificação, sendo principalmente por cães, sem raça
definida, com proprietário, nos finais de semana, especialmente nas férias de verão. Ficou
demonstrado que a informação fornecida pelo paciente, durante o atendimento, possibilita
erros na prescrição da profilaxia humana. O geoprocessamento e análise estatística
identificaram que os Distritos Centro e Itinga, tem a maior densidade populacional, assim
como maior número de ocorrência de agressões e incidências. Em análise espacial identificouse dois grupos de aglomerados de risco, o primeiro rotulado como o mais verossímil inclui o
Distrito Centro e o aglomerado secundário composto por dois Distritos, que foram Areia
Branca e Itinga, localidades que devem ser identificadas como áreas prioritárias para o
controle da raiva em Lauro de Freitas-BA.
Palavras-chave: Profilaxia à Raiva Humana, Agressões, Raiva, Análise Espacial,
Geoprocessamento, Saúde Pública.
1. Agencia Estadual de Defesa Agropecuária da Bahia (ADAB) 2. União Metropolitana de
Educação e Cultura (UNIME) 3. Laboratório de monitoramento de doenças pelo Sistema de
Informação Geográfica (LAMDOSIG/HOSPMEV/UFBA).
Endereço para correspondência: Profa. Dra. Maria Emília Bavia. Escola de Medicina
Veterinária, Universidade Federal da Bahia. Av. Adhemar de Barros, 500, Ondina, 40170-110,
Salvador, Bahia. Brasil.
Tel.: 55 71 32836745 E-mail: [email protected]
SUMMARY
The high fatality rate and the number of people vaccinated, make rabies a problem of public
health worldwide. Inadequate information systems and epidemiological surveillance, do not
demonstrate the real magnitude of the problem. Geotechnologies applied in public health
characterize and quantify exposure to diseases and their risk factors, having spatial analysis as
an important part in this evaluation. This study aimed to trace the epidemiological profile of
attacks by animals to huans, in Lauro de Freitas, Bahia, Brazil, between the years 1999-2004,
identifying areas of risk, thereby subsidizing effective educational and specific actions for
prevention of rabies in this municipality. There was an increase in the number of aggression
in the period, probably due to better notification. These aggressions were mainly by dogs,
without defined breed, domicilied and semi-domicilied, on weekends, especially in summer
vacation. Evidence shows that the information provided by the patient during the service,
facilitates errors in the prescribing of human prophylaxis. The geoprocessing and statistical
analysis identified that the Districts Centro and Itinga, has the highest population density, as
well as many of the occurrence of attacks and incidents. In spatial analysis identified are two
groups of clusters of risk, the first labeled as the most credible includes the District Centro
and a secondary cluster composed of two Districts: Areia Branca and Itinga, locations to be
identified as priority areas for control of rabies in Lauro de Freitas-Bahia.
Key Words: Urban rabies, Canine rabies, Public Health, Geotechonologies in analysis,
Geoprocessing.
INTRODUÇÃO
Por sua evolução letal e pelo elevado número de casos humanos e de pessoas submetidas,
anualmente, a tratamento anti-rábico com vacinas, a raiva continua representando um
importante problema de saúde pública em todo o mundo. A falta de sistemas adequados de
informação e vigilância epidemiológica, não permitem conhecer a magnitude real do
problema (BELOTTO, 2000). Metade da população humana no mundo vive em áreas
endêmicas de raiva canina, estando sob risco de contrair a doença (WHO, 2005). A estimativa
anual do custo da raiva é de U$ 583,5 milhões, principalmente com a administração da
profilaxia pós-exposição (WHO, 2005-2007).
Apenas os mamíferos são suscetíveis ao vírus da raiva e os únicos capazes de transmiti-lo.
Costa et al. (2000) relatam que a presença do vírus em mamíferos deve ser pesquisada sempre
que possível, pois possibilita o mapeamento do risco da doença na região de procedência do
animal. Estudo realizado por Schneider et al. (1996), no período de 1980 a 1990, demonstrou
que o ciclo mais importante é o urbano, sendo o cão responsável por 83,2% do total de casos
humanos. Belotto (2000) aponta o cão como principal espécie transmissora da raiva ao
homem e o descreve como responsável pelas mordeduras que resultam em tratamento pósexposição, tanto nos países em desenvolvimento como nos países mais desenvolvidos. A
Organização Mundial de Saúde (1999), porem revela que a raiva humana transmitida pelo cão
limita-se, quase que exclusivamente, aos países em desenvolvimento e grande parte do
problema deve-se a incompreensão do papel do cão na sociedade e a falta de aplicação de
sistemas de controle eficazes.
Outras variáveis, para análise epidemiológica da raiva humana, deveriam ser melhor
observadas, entre elas destacam-se as condições de domicílio dos animais, já mostrada em
trabalho realizado em Salvador-BA, em que foi constatado que a maioria dos animais
positivos para raiva eram domiciliados ou semi-domiciliados (RIBAS, 2005). Os fatores
sociais podem atuar como facilitadores ou empecilhos para a dispersão do vírus em áreas
específicas, quanto menor a situação de desenvolvimento local, maior é a promiscuidade
observada na relação homem/animal e menores também os cuidados sanitários tomados
(MIRANDA; SILVA; MOREIRA, 2003). Características de exposição, do tratamento
humano e variáveis relacionadas ao animal agressor, poderão em conjunto contribuir para o
melhor entendimento da manutenção dessa complexa doença (PINTO; ALLEONI,1986).
A raiva é a única virose na qual o tratamento específico por vacina ou soro pode ser aplicado
com êxito depois da contaminação (MORENO et al., 1990). É estimado que 10 milhões de
pessoas no mundo recebam tratamento de profilaxia após a exposição a animais susceptíveis à
raiva (WHO, 2007). Dentro do Programa de controle, a primeira ação a ser adotada é a
atenção adequada às pessoas expostas, que inclui tratamentos pré e pós-exposição. (OPAS;
OMS, 2005). Em estudo de um programa bem sucedido de controle da raiva, na Tailândia,
ficou atribuído como fator importante a educação das equipes de saúde, para prescrição
adequada da profilaxia a raiva humana e a educação da comunidade, sobre os riscos da
doença (KAMOLTHAM et al., 2003). O tratamento preventivo da raiva humana tem o
objetivo de diminuir a mortalidade no homem, sem porem atuar no processo de transmissão
da doença (SCHNEIDER et al.,1996).
Com o advento das novas tecnologias na área de informática e computacional, vem sendo
possível o desenvolvimento de programas para representação gráfica da distribuição espacial
das enfermidades e eventos ligados à saúde através das geotecnologias. Estas técnicas podem
ser definidas como um conjunto de “ferramentas” para coleta de dados, tratamento,
manipulação e apresentação de informações espaciais georeferenciadas que tem como
característica principal gerar as facilidades para a identificação de fatores de risco e, através
de suas similaridades, a delimitação das áreas de risco (BAVIA et al., 2000). A geotecnologia
tem tornado possível a realização de análises espaciais em saúde, que vão além do simples
mapeamento dos eventos, para a reprodução de áreas que permitam a análise e reflexão, sob a
participação de elementos históricos, geográficos, socioeconômicos e ambientais, de ordem
extrínseca e intrínseca envolvidos no aparecimento da doença ou agravos, em espaços
geográficos definidos (BAVIA, 1996; MEDRONHO et al., 2003).
Com base nestas premissas, o presente trabalho visa traçar, através do emprego das
geotecnologias, o perfil epidemiológico dos casos de agressões por animais, ocorridos no
Município de Lauro de Freitas - Bahia, no período de Janeiro de 1999 a junho de 2004,
propondo a identificação de áreas de risco, buscando subsidiar ações educativas efetivas e
específicas para a prevenção da raiva neste município, contribuindo para a diminuição do
número de agressões por animais e conseqüentemente a redução do risco para a raiva humana.
MATERIAL E MÉTODOS
Área do estudo
O Município de Lauro de Freitas, pertence à Região Metropolitana de Salvador (RMS), com
uma população de 113.543 habitantes, numa área de 59 Km2 (IBGE, 2000). Situado
geograficamente na latitude 12º52’S e longitude 38º02’W, limitando-se ao norte com Simões
Filho, ao sul o Oceano Atlântico, ao leste com Camaçari e ao oeste com Salvador, da qual
mantém uma distância de 22 km em relação ao centro, Figura 1.
A unidade espacial utilizada neste trabalho foi o Distrito Sanitário, de acordo com a divisão
administrativa adotada pelo órgão público oficial no período do estudo.
Figura 1. Área de Estudo – Distritos Sanitários do Município de Lauro de Freitas na Bahia
Dados Epidemiológicos
Dados demográficos (população humana) foram obtidos através do último censo, realizado no
ano 2000 pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). A área estudada possui
111 setores censitários, os dados foram agrupado em sete distritos sanitários, como mostra o
Apêndice 1. A população canina utilizada foi estimada com base no inquérito vacinal
realizado no ano de 2000 (MASCARENHAS et al., 2008)1.
O banco de dados epidemiológico foi construído tendo como base os dados obtidos das 5.725
notificações de agressões por animais ocorridos entre janeiro de 1999 a junho de 2004,
registradas em Fichas Individuais de Atendimento Anti-Rábico Humano (Anexo 1),
provenientes das Unidades de Saúde Municipais de referência para a Profilaxia Anti-rábica
Humana. Todos os casos do município foram acompanhados pelo Centro de Controle de
Zoonoses (CCZ) de Lauro de Freitas – Bahia, através das visitas técnicas de acompanhamento
dos casos, observação e exame dos animais quando indicados e a partir desta atividade
registrando as informações nestas Fichas.
As variáveis selecionadas nas Fichas Individuais de Atendimento Anti-Rábico Humano de
utilizadas para análise foram: espécie agressora, raça, condição de domicílio, informação do
paciente sobre o animal, condição do animal na investigação epidemiológica (observação),
realizada pelo CCZ, distrito sanitário e data da agressão.
A classificação quanto aos hábitos de vida dos cães e gatos (condição do domicílio) utilizada,
é descrita por Costa et al. (2000), em que considera domiciliados os animais totalmente
dependentes do proprietário, os semi-domiciliados aqueles animais dependentes do
proprietário, mais que permanecem fora do domicílio, desacompanhados, por períodos
indeterminados e não domiciliados ou errantes os animais independentes, vivem soltos nas
ruas, em sítios, chácaras ou fazendas.
___________________________________________
1
Dados não publicados
Utilizando a estatística descritiva, realizada no software SPSS® V 13.0 (Statical Package for
the Social Sciences), foi identificado a freqüência absoluta e relativa dos dados, com análise
univariada, além da análise multivariada, através da correlação linear de Pearson, para
descrever a associação entre duas variáveis, para os dados contínuos e a estatística do Quiquadrado, que constitui uma medida de discrepância entre as freqüências observadas e as
esperadas, para os dados nominais.
A Densidade populacional foi calculada pela divisão da população humana pela área
geográfica, com resultado em hab/Km2. A incidência das agressões foi calculada, pela divisão
do número de agressões por animais a pacientes humanos pela população humana, utilizando
o fator 103.
Para a composição da Base Cartográfica Digitalizada de Lauro de Freitas-BA foi utilizado o
Mapa dos Setores Censitários na escala original de 1:2.000 (2003), digitalizadas pela
Companhia de Desenvolvimento Urbano do Estado da Bahia (CONDER), no qual foram
agrupados os Distritos Sanitários, com o auxílio do software ArcView 9.1.
O Sistema de Informação Geográfica (SIG) foi montado sobre a base cartográfica digitalizada
e georeferenciada no qual foram plotados os endereços presentes nas fichas analisadas,
considerando o Distrito de residência do paciente atendido, através do software ArcView 9.1,
realizado no Laboratório de Monitoramento de Doenças da UFBA (LAMDOSIG).
Análise espacial
Para execução dos testes estatísticos de varredura espacial, para detecção de conglomerados
de risco, adotou-se software SaTScan™ versão 7.0, idealizado por Kulldorff e Nagarwalla
(1995), distribuído gratuitamente na internet (http:\\www.satscan.org), o qual baseia-se na
razão de verossimilhança entre as áreas, utilizando uma estatística de varredura
multidimensional composta por três propriedades básicas, que leva em consideração a
geometria da área que está sendo varrida, a distribuição de probabilidade que gera os casos
sob a hipótese de completa aleatoriedade espacial, e o tamanho e forma da janela de
varredura.
Utilizou-se as seguintes variáveis: a população por unidade territorial (Distritos Sanitários),
coordenadas dos centróides dos casos de agressões por animais, número de casos por distrito,
ano de ocorrência. Para cada distrito foi calculado o centro de massa, denominado de
centróide, através da extensão para o ArcView 9.1. Jenness Enterprises, disponível em:
(http://www.jennessent.com/arcview/centermass.htm).
Para análise dos dados o SaTScan™ foi configurado a partir dos seguintes parâmetros:
realizar análise puramente espacial; utilizar o intervalo de tempo estudado; obedecer modelo
de distribuição de probabilidade de Poisson (em que a distribuição é heterogênea e os eventos
são raros em relação a população), considerar cluster com 10%, 20%, 30%, 40% e 50% da
população sob risco e submeter cada um destes a replicação de 999 vezes.
RESULTADOS
Na análise de 5.725 fichas de Profilaxia à Raiva Humana, do período de 1999 a jun/2004, no
Município de Lauro de Freitas-BA, observou-se a diferença estatística entre o número de
casos nos anos do estudo (p<0,001), provavelmente devido ao estimulo na notificação,
decorrente da implementação do programa, com aumento no número de casos esperados nos
anos 2001, 2002 e 2003 (Figura 2). A espécie agressora mais freqüente foi a canina com
89,54% dos casos, seguido da felina, com 8,70%, conforme figura 3.
* até Junho/2004
Figura 2. Número de atendimento das agressões por animais em humanos, no período de
1999 a jun/2004, em Lauro de Freitas-BA
Figura 3. Número de agressões por animais em humanos, por espécie agressora, no período
de 1999 a jun/2004, em Lauro de Freitas-BA
Observou-se a diferença na informação fornecida pelo paciente e aquela constatada após
investigação epidemiológica do caso, pela equipe do CCZ-LF. Houve uma porcentagem de
concordância entre a informação do paciente, considerando o animal sadio, e aquela
constatada pela investigação, de 72% dos casos que são informados como sadios e tem esta
condição confirmada após observação técnica. Verificou-se divergências também em 0,8%
dos casos (46 ocorrências), quando o animal foi considerado suspeito pelo paciente e
apresentava-se sadio.
Na Tabela 1, observamos que 88,58% dos casos de agressões, foram de animais domiciliados,
e que esta freqüência somada com os semi-domiciliados, totaliza 95,15% de agressões por
animais que tem proprietário.
Tabela 1. Número de agressões por animais em humanos, considerando condição de
domicílio do agressor, no período de 1999 a jun/2004, em Lauro de Freitas-BA.
Domiciliado
Freqüência Absoluta
Freqüência relativa%
Não
226
3,95%
Semi-domiciliado
376
6,57%
Sim
5.071
88,58%
Sem informação
52
0,91%
Total
5.725
100,00%
Diferença estatística foi registrada quando analisado o número de agressões por dia da semana
em que ocorreram as agressões (p<0,001), sendo a maior freqüência nos dias de Domingo,
superando em 166 o número de ocorrências esperadas, assim como no dia de Sábado, com um
excesso no esperado de 117 casos. Nos dias úteis o número de casos registrados está abaixo
do esperado estatisticamente. Em análise das variáveis domicílio e dia da semana, é observado
que o animal domiciliado é o que apresenta maior relação com as agressões ocorridas,
independente do dia da semana (p = 0,190) (Figura 4).
Figura 4. Número total de agressões e de animais domiciliados, por dia da semana, no
período de 1999 a jun/2004, em Lauro de Freitas-BA.
A freqüência das ocorrências por mês, dentro do período, mostrou-se de forma heterogênea,
conforme Tabela 2, com maior ocorrência nos meses de Dezembro e Janeiro. Em análise fica
demonstrado existir diferença estatística entre os meses (p<0,001).
Nas agressões por cães ocorridas no período, a maior freqüência é de animais Sem Raça
Definida (S.R.D.), com 76,9% da ocorrência. Considerando os animais com raça definida, a
maior freqüência é da raça Pastor Alemão (5,2%), seguido de Poodle (5,0%), conforme
Tabela 3. Na análise das agressões, foi observado que houve diferença estatística entre ter ou
não raça definida (p<0,001) e na análise entre ter raça e ser domiciliado houve também
diferença estatística, com predominância de cães de raça domiciliados (p<0,001) (Figura 5).
Houve diferença estatística entre ser de raça e distrito sanitário (p<0,001), através do
georeferenciamento destes dados podemos observar a diferença no padrão de distribuição de
raças entre os Distritos Sanitários, com uma maior percentagem de agressões de raça, no
Atlântico Norte, distrito que apresenta condições socioeconômicas melhores (Figura 6).
Tabela 2. Agressões por mês de atendimento, no período de 1999 a jun/2004, em Lauro de
Freitas-BA
Mês da Exposição
Freqüência Absoluta
Freqüência relativa%
Janeiro
615
10,74%
Fevereiro
460
8,03%
Março
480
8,38%
Abril
482
8,42%
Maio
526
9,19%
Junho
464
8,10%
Julho
444
7,76%
Agosto
457
7,98%
Setembro
421
7,35%
Outubro
451
7,88%
Novembro
367
6,41%
Dezembro
558
9,75%
Total
5.725
100,00%
Houve diferença estatística entre os distritos e o número de agressões (p<0,001), com excesso
no número de casos nos Distritos de Itinga , seguido de Centro. É importante salientar que
estão localizados nestes Distritos as duas Unidades de Saúde de referência para a realização
do tratamento de Profilaxia a raiva humana, são também os dois Distritos mais populosos do
município, em número absoluto de população (Tabela 4).
Tabela 3. Raça de cães agressores, no período de 1999 a jun/2004, em Lauro de Freitas-BA
FREQÜÊNCIA
FREQÜÊNCIA
RAÇA
ABSOLUTA
RELATIVA%
S.R.D.
3.943
76,92%
Pastor Alemão
267
5,21%
Poodle
257
5,01%
Fila
236
4,60%
Rottweiler
129
2,52%
Sem informação
4
0,08%
Pit Bull
55
1,07%
Akita
38
0,74%
Pinsher
31
0,60%
Cocker Spaniel
30
0,59%
Doberman
30
0,59%
Siamês
1
0,02%
Dog Alemão
19
0,37%
Husk Siberiano
12
0,23%
Bassë House
10
0,20%
Peqinês
8
0,16%
Boxer
7
0,14%
Pastor Belga
7
0,14%
América
Dálmata
Fox Terrier
Labrador
Chow-Chow
Weimaraner
Cocker
Dachsund
Charpey
Pastor Albino
Buldog
Collie
Lhasa Apso
Shiba Japonês
TOTAL
5
5
5
5
4
4
3
3
2
2
1
1
1
1
5.126
0,10%
0,10%
0,10%
0,10%
0,08%
0,08%
0,06%
0,06%
0,04%
0,04%
0,02%
0,02%
0,02%
0,02%
100,00%
Figura 5: Agressões por animais em humanos, considerando ter ou não raça definida, no
período de 1999 a jun/2004, em Lauro de Freitas-BA
* A representação tridimensional do mapa, está de acordo com o número de agressões
Figura 6. Distribuição espacial das agressões por animais em humanos, com caracterização
dos agressores considerando ter ou não Raça definida, no Município de Lauro de Freitas-BA,
no ano de 2000.
Em análise, ficou constatado uma forte correlação positiva entre densidade populacional e
número de agressões (r = 0,85; p<0,001), conforme demonstrado Figura 7, tendo o maior
número de agressões nos Distritos de Itinga e Centro, que apresentam uma densidade
populacional de 8.461 e 3.022 hab/Km2, respectivamente.
Tabela 4. Número de agressões por animais em humanos, por distrito sanitário, no período de
1999 a jun/2004, em Lauro de Freitas-BA
Distrito
Freqüência Absoluta
Freqüência relativa%
Areia Branca
236
4,12%
Caji
362
6,32%
Centro
1.443
25,21%
Ipitanga
257
4,49%
Itinga
2.200
38,43%
Outro Município
483
8,44%
Portão
496
8,66%
Atlântico Norte
248
4,33%
Total geral
5.725
100,00%
Observou-se a relação entre a população canina estimada na cidade de Lauro de Freitas – BA
(MASCARENHAS at al., 2008)1 e o número de agressões por cães, considerando cada
Distrito Sanitário, em Lauro de Freitas-BA (Figura 8), no ano de 2000, verifica-se que as
percentagens não são diretamente proporcionais. Considerando o mapa georeferenciado
destas variáveis (Figura 7), observamos que o distrito Atlântico Norte, apesar de ter uma
grande população canina apresenta um registro de poucas notificações de agressões.
* A representação tridimensional do mapa, está de acordo com o número de agressões e o cilindro representa a
população canina
Figura 7. Distribuição espacial das agressões, Densidade Populacional humana e população
canina, no Município de Lauro de Freitas-BA, no ano de 2000.
Figura 8. Relação população canina e Agressões por cães, por Distrito, em Lauro de FreitasBA, no ano de 2000.
______________________________________________
1. Dados não publicados
A maior incidência das agressões, no ano de 2000, ocorreu no Centro, seguido da Itinga
(Tabela 5), sendo estes os Distritos Sanitários mais populosos, no qual estão localizados as
Unidades de Saúde de referência para a Profilaxia à Raiva Humana, observou-se também que
as menores incidências ocorrem no distrito de maior renda (Figura 7).
Tabela 5. População humana, Agressões e Incidência (por 1.000 hab) dos casos ocorridos no
ano de 2000, por Distritos Sanitários, em Lauro de Freitas-BA.
POPULAÇÃO
AGRESSÕES NO ANO INCIDÊNCIA POR
DISTRITOS
HUMANA
2000
1.000
Areia Branca
3151
23
7,3
Atlântico Norte
12188
22
1,8
Caji-Picuaia
12033
55
4,6
Centro
16500
225
13,6
Ipitanga
12237
31
2,5
Itinga
41558
360
8,7
Portão
15876
89
5,6
TOTAL
113543
849
7,5
Com base nos parâmetros configurados para análise através do SaTScanTM, o melhor
resultado foi obtido pelo modelo matemático que considerou: no máximo 40% da população
exposta ao risco de ser agredido e replicação de Monte Carlo de 999 vezes. Foram detectados
conglomerados de risco (clusters) primário e secundário com (p<0,001).
Pela análise de varredura Puramente Espacial para detecção de clusters de risco para
Agressões por animais em humanos, foram detectados dois grupos de aglomerados de risco,
abrigando 74% dos casos notificados (Figura 9). Nos distritos pertencentes à área geográfica
estudada, no período de 1999 a jun/2004, a população total estimada foi de 120.513 habitantes
e a estimativa de casos anuais de 724,8/100.000.
Figura 9. Detecção de Clusters das Agressões por animais em humanos, através da Análise
de Varredura Puramente Espacial, no Município de Lauro de Freitas, Bahia, Brasil (1999 –
Jun/2004).
O primeiro aglomerado rotulado como o mais verossímil (ou primário) inclui o Distrito
Sanitário Centro, envolvendo uma área com 17.513 habitantes, cuja taxa bruta foi de
1.372,9/100.000 habitantes e o risco relativo de 2,234. Dentro do aglomerado foram
registrados 1.443 casos de agressões em humanos, esperando-se, sob a hipótese nula, o
número aproximado de 761,77 casos, numa relação entre observados e esperados de 1,894. O
aglomerado secundário foi composto por dois Distritos, que foram Areia Branca e Itinga,
englobando 47.453 habitantes e uma taxa de risco de 1,652 e 1,253 respectivamente. O
número de casos esperados para Areia Branca foi de 145,47 e 1.918,63 para Itinga, porém
foram notificados um total de 2.436 casos nesta área (Tabela 6).
Tabela 6. Distribuição das Agressões por animais em humanos, por Cluster no Município de
Lauro de Freitas, Bahia, Brasil (1999 a jun/2004), pela Análise Puramente Espacial.
Cluster
Primário
Secundário
Casos
Casos
Risco
observados/
esperados
Relativo
esperados
p_valor
Casos
observados
Centro
0,001
1443
761,77
1,894
2,234
Areia Branca
0,001
236
145,47
1,622
1,652
Itinga
0,001
2200
1918,63
1,147
1,253
Distritos
DISCUSSÃO
Na América Latina o número de casos de raiva humana está limitado a menos de 100 por ano
e a média anual de tratamento anti-rábico é de 500.000 pessoas. Na América do Norte e
Europa o número de casos humanos é menor que 50 e aproximadamente 100.000 pessoas
anualmente, recebem tratamento anti-rábico pós-exposição. Estimativas conservadoras
indicam que a cada 10 a 15 minutos uma pessoa morre de raiva e a cada hora 1.000 pessoas
recebem tratamento pós-exposição no mundo (BELOTTO, 2000). No município de Lauro de
Freitas-BA, observou-se um o aumento no número de casos notificados de agressões por
animais no período estudado, provavelmente pelo estímulo a notificação, com a
implementação, no período, do Programa Municipal de Controle da Raiva.
A participação do cão como animal agressor foi predominante (89,54%), corroborando com
os resultados de Kamoltham et al (2003) (93%), Pinto e Alleoni (1986) (84,1%), Garcia et al.
(1999) (52,3%), Rigo e Honer (2005) (87,6%), Carvalho; Soares; Franceschi (2002) (86,8%),
Rolim; Lopes; Navarro (2006) (91,2%). Considerando ser o cão, o principal animal
transmissor da raiva ao homem (MIRANDA; SILVA; MOREIRA, 2003; BRASIL, 2002a;
RIBAS, 2005), apesar da redução no número de casos na América Latina, o Brasil continua
tendo casos, inclusive na Bahia, que está dentro de uma área classificada como de circulação
ativa do vírus rábico na espécie canina (OPAS; OMS, 2005), portanto é de extrema
importância o monitoramento adequado dos casos de agressões por animais.
Considerando a informação presente na Ficha de Atendimento de Profilaxia, fornecida pelo
paciente, referente à condição do animal agressor, houve discordância, quando realizada a
observação por equipe técnica, em 28% dos casos considerados sadios, fato este, que chama a
atenção para a importância do preenchimento correto das fichas e da observação posterior por
órgão competente, garantindo assim uma prescrição correta do esquema de profilaxia à raiva,
para a não ocorrência da doença em humanos. Outros autores confirmam a importância do
preenchimento correto das fichas de profilaxia a raiva e da observação do animal agressor
(cão e gato) por dez dias, quando relata que apenas 44,8% dos animais submetidos à
observação permanecem sadios (PINTO; ALLEONI, 1986; RIGO; HONER, 2005). Em
estudo realizado, em São Paulo, num período de dez anos, por Garcia et al.(1999), o animal só
teve a sua observação realizada pelos órgãos responsáveis em 0,6 % através de visita
domiciliar e 0,5% em canil de isolamento.
A maior parte dos animais agressores observados neste estudo (95,15%), foram de animais
que tinham proprietários, apresentado-se como domiciliados (88,58%) ou semi-domiciliados
(6,57%), em outro estudo considerando o local em que ocorreu a agressão, observou-se 65,7%
das agressões ocorreram em ambiente doméstico (PINTO; ALLEONI, 1986). Enquanto
Garcia et al.(1999) evidenciaram que a freqüência foi de 46,8%. Caramori-Junior et al.
(2003), mostraram um perfil de população animal em que 37,2% de cães saem as ruas (semidomiciliados). Evidência de maior ocorrência das agressões nos finais de semana, neste
estudo, caracteriza que o ambiente doméstico deve ser monitorado para a prevenção da
exposição ao vírus rábico através da diminuição das agressões.
Os meses de Dezembro e Janeiro, apresentaram maior ocorrência de agressões, contrariando
Schneider et al. (1996) que não observou variação sazonal, já em estudo realizado em São
Paulo, foi observado um maior número de atendimentos no mês de agosto,o autor considera
que tal fato poderia estar associado a estigmatização referente ao mês ser considerado do
“cachorro doido” e consequentemente, o número de pessoas que procuram as Unidades de
Saúde no referido mês seja maior (PINTO; ALLEONI, 1986). Rolim; Lopes; Navarro (2006)
relataram uma possível associação do aumento no número de casos no período de férias
escolares. O município de Lauro de Freitas-BA apresenta uma população flutuante,
especialmente em meses de férias de verão, além da maior permanência das pessoas em
ambiente doméstico neste período, podendo estes fatos estarem associados ao aumento da
ocorrência das agressões nestes meses.
A observação da raça do animal agressor evidenciou que os animais Sem Raça Definida
(S.R.D.), são responsáveis pela maioria das agressões (77,5%), esta variável não tem sido
objeto de estudo em outros trabalhos relacionados ao tema de profilaxia à raiva, porem tal
dado é importante para a caracterização do perfil das agressões, juntamente com outros dados,
podendo servir de respaldo a programas de educação em saúde, para o controle desta doença.
Esta variável deve ser melhor estuda, em trabalhos futuros, para análise de sua correlação com
a condição socioeconômica da população exposta ao vírus rábico.
Foi constatado diferença (p<0,001) de ocorrência de agressões entre os Distritos Sanitários,
com forte correlação (r = 0,85; p<0,001) da ocorrência em distritos e Densidade populacional
(Hab/Km2), corroborando com o estudo realizado em São Paulo, em um período de dez anos,
em que a observação da localização espacial dos casos atendidos revelou que em 24,6% do
total de bairros estudados, não houve registro de habitantes agredidos por animais, com
distribuição diferenciada entre os bairros de ocorrência, relacionados a densidade (GARCIA
et al.,1999). A densidade demográfica pode ter importante repercussão sobre a difusão de
doenças, principalmente das transmissíveis (BARCELLOS et al., 2002).
Em análise da incidência das agressões, no ano de 2000, observou-se valores diversos de
acordo com cada distrito, destacando-se a maior incidência no Centro e na Itinga, com 13,6 e
8,7/1.000 hab, respectivamente, nestes distritos estão localizados as Unidades de Saúde de
referência para a Profilaxia à Raiva Humana, podendo este indicador estar associado a uma
maior facilidade de acesso e divulgação, estimulando a procura do paciente para avaliação
médica, no caso de acidentes com animais. Verificou-se também que a menor incidência
(1,8/1.000 hab) ocorre no distrito de melhor renda, público que habitualmente tem menor
procura a Unidades de Saúde Pública, estabelecimentos em que o programa de profilaxia à
raiva ocorre de forma mais sistemática. A incidência do município (7,5/1.000 hab) foi
superior as encontradas em outros estudos, no Estado de São Paulo a média de atendimento de
profilaxia à raiva foi de três por 1.000 habitantes (TAKAOKA, 2001), semelhante à
incidência encontrada no Paraná que foi 3,2/1.000 habitantes (CARVALHO; SOARES;
FRANCESCHI, 2002), evidenciando o aumento da procura por parte do paciente agredido às
Unidades de Saúde, provavelmente estimulado pelas ações de educação em saúde promovidas
pelo Programa de Controle da Raiva do município.
A análise espacial de condições de saúde pode ser um instrumento importante na avaliação do
impacto de processos e estruturas sociais na determinação de eventos de saúde. A categoria
espaço, tem valor intrínseco na análise das relações entre saúde, sociedade e ambiente.
Conhecer a estrutura e a dinâmica espacial da população é o primeiro passo para a
caracterização de situações de saúde. Pessoas e áreas de pior nível socioeconômico
apresentam, quase que invariavelmente piores condições de saúde (BARCELLOS et al.,
2002). Dias et al. (2004), através da análise de risco para raiva, demonstra pelas diferenças
observadas, relacionadas a status socioeconômicos, a importância desta ferramenta para a
proposta de ações de controle desta doença, de maneira mais eficiente.
Pela análise de varredura Puramente Espacial, proposto por Kulldorff e Nagarwalla (1995),
para detecção de clusters de risco para Agressões por animais em humanos, no período do
estudo, foram detectados dois grupos de aglomerados de risco, o primeiro aglomerado
rotulado como o mais verossímil (ou primário) inclui o Distrito Sanitário Centro, com Risco
Relativo de 2,234 e o aglomerado secundário composto por dois Distritos, que foram Areia
Branca e Itinga, apresentando Risco Relativo de 1,652 e 1,253, respectivamente.
Considerando as agressões por animais como fatores de risco para a raiva humana, podemos
inferir que estas localidades devem ser identificadas como áreas prioritárias para o controle da
raiva no município de Lauro de Freitas-BA, associado ao fato que estes distritos apresentam
menores padrões socioeconômicos, em especial o Distrito de Areia Branca, área rural, que
apresenta a maior proporção população canina com relação a humana, estes resultados
corroboram com estudo realizado em Minas Gerais, em que foi observado que a área de maior
risco coincide com áreas de pobreza e analfabetismo do Estado (MIRANDA; SILVA;
MOREIRA, 2003). Santos et al. (2001), descreve em seu estudo de análise de situação de
risco a saúde, com uso de geotecnologias, em quais localidades os eventos estão
concentrados, evidenciando diferentes densidades de eventos na superfície do município. O
conhecimento dessas áreas, independente da distribuição da população, é fundamental para a
adequação de recursos e o direcionamento de ações de saúde.
CONCLUSÃO
Houve um aumento no número de registro de agressões no município de Lauro de Freitas-BA,
durante o período do estudo, provavelmente pelo estímulo a notificação.
As agressões ocorrem principalmente por cães, sem raça definida, que tem proprietário, nos
finais de semana, em especial no período de férias de verão.
A informação fornecida pelo paciente para preenchimento da ficha de profilaxia à raiva no
momento do atendimento pode levar a erros na prescrição da profilaxia humana.
Distritos com maior densidade populacional apresentam maior número de ocorrência de
agressões, assim como as maiores incidências, observadas nos Distritos Centro e Itinga.
Em análise espacial foi identificado dois grupos de aglomerados de risco, o primeiro rotulado
como o mais verossímil (ou primário) inclui o Distrito Sanitário Centro e o aglomerado
secundário composto por dois Distritos, que foram Areia Branca e Itinga, localidades que
devem ser identificadas como áreas prioritárias para o controle da raiva no município de
Lauro de Freitas-BA.
REFERÊNCIAS
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Acesso em 25/11/2007.
4 CONSIDERAÇÕES GERAIS
Os resultados deste estudo, nas condições em que foi realizado, permitem as seguintes
considerações:
•
A população canina do município de Lauro de Freitas-BA, no período estudado
apresentava-se de forma subestimada, superando em 25,6% a população estabelecida,
por órgãos oficiais.
•
No período de estudo, a população canina representou 15,7% da população humana,
com uma variação de 2,7% a 39,2%, entre os distritos sanitários.
•
A maior relação homem/cão foi observada na área rural do Município, no Distrito de
Areia Branca, em que as condições socioeconômicas apresentaram os menores níveis
do município.
•
A menor proporção na relação homem/cão foi observada no Distrito de Ipitanga, local
com características de veraneio no município.
•
A alta proporção de cães no município pode estar relacionada com o tipo de moradia,
principalmente horizontal, com predominância de domicílio tipo casa.
•
Houve um aumento no número de registro de agressões no município de Lauro de
Freitas-BA, durante o período do estudo, provavelmente pelo estímulo a notificação.
•
As agressões ocorrem principalmente por cães, sem raça definida, que tem
proprietário, nos finais de semana, em especial no período de férias de verão.
•
A informação fornecida pelo paciente para preenchimento da ficha de profilaxia à
raiva no momento do atendimento pode levar a erros na prescrição da profilaxia
humana.
•
Distritos com maior densidade populacional apresentam maior número de ocorrência
de agressões, assim como as maiores incidências, observadas nos Distritos Centro e
Itinga.
•
Em análise espacial foi identificado 02 grupos de aglomerados de risco, o primeiro
rotulado como o mais verossímil (ou primário) inclui o Distrito Sanitário Centro e o
aglomerado secundário composto por dois Distritos, que foram Areia Branca e Itinga,
localidades que devem ser identificadas como áreas prioritárias para o controle da
raiva no município de Lauro de Freitas-BA.
REFERÊNCIAS
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y a los animales. 2. ed. Washington: Orgonizacion Panamericana de la Salud, 1986.
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Ver qual aparece primeiro no testo (a, b)
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APÊNDICE I
Setor Censitário, por Distrito Sanitário, no município de Lauro de Freitas-BA, segundo Censo
2000 e divisão administrativa do município.
SETOR CENSITÁRIO
DISTRITO
Areia
Branca
111
110
109
105
Atlântico
Norte
56
57
58
75
83
76
78
82
84
81
80
86
77
85
79
CajiPiquaia
108
106
54
53
107
74
104
103
40
Centro
55
26
25
6
23
22
21
3
24
1
2
4
98
5
20
7
19
17
Ipitanga
8
11
12
9
13
14
10
15
16
18
Itinga
100
52
99
101
102
49
46
45
48
44
47
51
73
50
87
89
88
30
39
90
43
91
29
41
31
92
35
32
36
71
33
72
93
42
94
38
34
95
96
37
28
97
27
Portão
59
70
68
66
67
69
65
64
63
60
62
61
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