135 A REDE DE RELAÇÕES DE CAMPININHAS

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Número 20/21 – Janeiro / Julho, Julho / Dezembro – 2008 - ISSN 2179 5215
A REDE DE RELAÇÕES DE CAMPININHAS DAS FLORES
Miraci Kuramoto Nucada 1
Celene Cunha Monteiro Antunes Barreira 2.
Resumo
O tema do artigo é a rede de relações e a infraestrutura de comunicação adjacente ao processo de
urbanização na Região do Entorno de Goiânia, com especial enfoque em três influências em períodos
distintos entre 1900 a 1960: os padres da Matriz de Campinas, a construção de Goiânia e de Brasília. O
trabalho é fruto de pesquisa em arquivos históricos, fontes bibliográficas e dados estatísticos com o objetivo
de fundamentar investigação sobre a atual rede de relações na Região do Entorno de Goiânia, pesquisa
vinculada ao Programa de Pós-Graduação em Geografia da Universidade Federal de Goiás.
Palavras-chave: Urbanização. Rede de relações. Região.
Introdução
Neste artigo será apresentado o resultado inicial da pesquisa sobre a rede de
relações na Região do Entorno de Goiânia, objeto de estudo de uma pesquisa maior
desenvolvida junto ao Programa de Pesquisa e Pós-Graduação da Geografia da
Universidade Federal de Goiás. O recorte temporal é de 1900 a 1960 em dois momentos
distintos: o período imediatamente anterior à construção de Goiânia, ou seja: sobre as
relações estabelecidas na região do entorno de Campinas e as redes de comunicação
efetivadas com a construção das Capitais Goiânia e Brasília.
Em relação à região do entorno de Campinas será apresentado uma breve
contextualização regional com foco nas relações estabelecidas pelos padres da Matriz de
Campinas e a discussão inicial sobre a participação da religião Católica na urbanização e
modernização nas relações de produção e sociais, como efeito colateral à acumulação
fundiária.
1
Miraci Kuramoto Nucada, Arquiteta e Urbanista, Mestre em Geografia e Doutoranda em Geografia pela Universidade
Federal de Goiás e Professora do Curso de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Paulista, Campus Flamboyant.
Endereço eletrônico: [email protected]
2
Celene Cunha M. Antunes Barreira, Geógrafa, Mestre pela Universidade Federal de Goiás e Doutora pela
Universidade São Paulo e Profa. Dra. do PPG em Geografia, da UFG/IESA, Superintendente do Ensino à Distância da
Secretaria Estadual de Educação. Endereço eletrônico: [email protected]
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O artigo está estruturado em três tópicos, o primeiro trata da abordagem
metodológica
e
dos
procedimentos
operacionais,
o
segundo
apresenta
uma
contextualização histórica, sobre a formação das cidades do território goiano e da
estruturação dos fluxos e da rede de relações no Estado e finaliza com uma pesquisa
sobre o surgimento de Campinas, cidade que cedeu lugar a Goiânia. A conclusão trata da
construção da primeira rede de relações na região do entorno de Goiânia.
O procedimento metodológico adotado para a pesquisa compreende a coleta
dados nas instituições vinculadas à igreja, em órgãos públicos do Estado e da União
sobre a urbanização, construção de infraestrutura e sobre a regionalização utilizada por
seus órgãos no atendimento da população. Procurou-se espacializar a jurisdição prevista
em leis e documentos disponibilizados pela Secretaria de Planejamento do Estado de
Goiás (SEPLAN). Os dados históricos foram levantados na Fundação Instituto Brasileiro
de Geografia e Estatística (IBGE) e nos Boletins da igreja Católica.
Contextualização
Apesar de a ocupação do Estado ter-se iniciado quando da breve fase da
mineração no século XVIII, com o esgotamento das minas sobreveio a estagnação
econômica e muitos aglomerados urbanos entraram em decadência. Lentamente a
economia passou de autoconsumo (BARREIRA, 2002) para subsistência e daí a próspero
produtor de alimentos e gado. Barreira, ao tratar da ocupação na região nordeste de
Estado de Goiás chama a atenção para o fato de que durante a fase da mineração a
produção de alimentos para autoconsumo ocorreu nas proximidades das minas,
diferentemente das grandes e ricas jazidas de Minas Gerais com maior número de
trabalhadores que foram abastecidas principalmente pelos criadores de gado da Bahia e
até de regiões mais distantes.
As comitivas que vinham a Goiás para exploração do ouro possuíam
integrantes cujo propósito era o de organizar as bases de apoio com roçados e pouso.
Alguns ficaram pelos caminhos, outros abriram as plantações e a pequena criação junto
às minas para o consumo dos trabalhadores junto aos veios de ouro descobertos. Com o
esgotamento da extração permaneceram nos lugares os trabalhadores interessados na
atividade pecuária a única autotransportável e “devido à facilidade de acumulação inicial
que podia ser efetuada com trabalho de ‘meeiro, no pastoreio de rebanho alheio’”
(BARREIRA, 2002, p. 92).
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Estevam (1998, p. 44/5) acredita que dois fatores concorreram para a
exploração agropecuária juntamente com a exploração aurífera: “a aptidão e a qualidade
da terra podem ter sido fortes condicionantes na dinâmica da produção agrícola” e o
segundo fator, “o grande distanciamento das minas e as decorrentes dificuldades de
abastecimento”, daí concluindo que o “minerador esteve fortemente voltado também para
o cultivo agropecuário”, o que seria para Estevam, “importante especificidade na
economia mineratória”.
De acordo com esse autor a atividade comercial “acompanhou de perto os
empreendimentos mineratórios. O nível da vitalidade mercantil media-se na razão direta
da produção do ouro e do ajuntamento demográfico proporcionado pela atividade”
(Estevam, 1998). Já para Gomes e Teixeira Neto (1993, p. 67) “a mineração foi um fator
de urbanização por excelência”, e a agropecuária teve dois momentos elementares: no
primeiro de mobilização populacional e no segundo de urbanização, e que “as fazendas
surgiram para abastecer as minas de víveres essenciais; daí nasceram múltiplas
atividades, principalmente as comerciais e de troca de produtos”.
Após o breve período aurífero3, as atividades agropecuárias lentamente
prosperaram e se consolidaram enquanto inúmeros pequenos povoados em torno de
minas foram abandonados. A população dividiu-se entre os migraram à procura de outros
lugares e aqueles que optaram por sobreviver dos afazeres no meio rural. As atividades
mercantis que sobreviveram e se desenvolveram localizavam-se em núcleos urbanos
maiores, mais estruturados e situados em pontos estratégicos dos poucos caminhos.
O verdadeiro surto de estradas e cidades no século XX encontrou o Estado
com imensas áreas ainda cobertas de mata virgem. De acordo com Barreira, em muitas
das estradas construídas na década de 1960 se aproveitou os caminhos das tropas e
boiadas e estradas, a GO – 070, por exemplo, aproveitou grande parte da Estrada Real
que ligava Vila Boa ao Rio de Janeiro. Havia ainda a Estrada do Boi e a estrada que
ligava Pirenópolis a Cavalcante e Traíras e esta ao oeste da Bahia e ao nordeste do País,
e ao sul a estrada que liga Jataí e Rio Verde ao estado de Minas Gerais e São Paulo.
3
Estendeu-se de 1722 a 1778. Em 1779 a produção se reduziu à metade e continuou em queda nos anos seguintes.
Sobre esse tema ver mais em Estevam, 1998.
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A área em estudo se localiza na região mais central da parte sul do Estado.
Desde a construção de Goiânia a parte centro – sul é a mais densa do Estado de Goiás.
Até então, os municípios do entorno de Goiânia estabeleciam uma rede de relações que
foi modificada com a transferência da Capital para suas proximidades e, da mesma forma,
a estrutura urbana existente se modificou influenciada pela melhoria dos canais de
comunicação, a proximidade com o poder político e administrativo. Juntava a essas
influências, o espírito da nova república instalada na nova Capital e, sobretudo, a intenção
de se distanciar das velhas oligarquias, dominante em Vila Boa de Goiás e no sul do
Estado.
Outro fator, que influiu na modificação da estrutura urbana e na rede de
relações dessas cidades, foi a construção da nova Capital Federal, Brasília. As novas
Capitais atraíram uma enorme quantidade de migrantes. O fenômeno ainda existe,
embora em menor proporção. A política de desenvolvimento do Governo JK beneficiou o
Estado de Goiás ao implementar ações como as que contemplavam abertura de novas
estradas e construção do ramal da ferrovia até Brasília. Mesmo que tais medidas
objetivassem consolidar o DF e viabilizar a comunicação deste com outros Estados, Goiás
terminou contemplado com a estrutura viária e, por fim, deixou o isolamento. O governo
necessitava dispor de melhores condições estratégicas de segurança e de relações com
os entes federativos, nesse sentido a localização centralizada cumpriu o papel. A
dinamização econômica resultante desses dois eventos, definitivamente marcou a região.
Trazendo vigor deu novo impulso à urbanização e metropolização de Goiânia.
Diante desse quadro, verifica-se que o Estado de Goiás passou por dois
períodos de intensa abertura de estradas: 1930 a 1943, quando a malha rodoviária “mais
que quadruplicou” de acordo com Estevam (1998, p. 115), e de 1956 a 1970, quando
foram abertas as rodovias federais que ligam Brasília às demais regiões do País. Ambos
os períodos, como visto acima estão ligados ao surgimento de sedes políticoadministrativas, a primeira estadual e a outra federal.
Durante o processo de adaptação, homens e máquinas trabalharam
intensamente: represaram rios, aplainou montanhas, derrubou vasta vegetação e
afugentaram inúmeros animais num ritmo nunca visto na história goiana. Grande parte
das fechadas matas do Mato Grosso Goiano foram derrubadas por arrastão 4, como meio
para abrir rapidamente estradas e áreas de plantio e pasto, segundo relato de moradores
mais antigos de Goianápolis.
4
Técnica de desmatamento que consiste na movimentação de dois tratores atrelados a grossas correntes. A vegetação à
frente das correntes é literalmente arrancada do solo com o deslocamento das máquinas..
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Waibel (1979, p. 299) aponta essa fase como estágio pré-pioneiro, para ele o
pós-pioneiro começa quando a mata quase desapareceu e a terra já foi ocupada, que é o
fato presente. Aquele período posterior à construção das capitais para as respectivas
regiões de influência seria o estágio da zona pioneira, quando o povoamento promove, o
que chamou de um verdadeiro boom, com movimentação semelhante ao relatado acima.
A cada atividade ou evento como os acima mencionados injetaram vigor no
desenvolvimento econômico do Estado de Goiás, tal como uma onda modificou as
estruturas existentes e imprimiram outro dinamismo à configuração espacial, cidades
nasceram sobre o declínio das representações urbanas do período que se foi. A
urbanização, tal como a mineração no Estado possui elementos que conferem o caráter
de especificidade pela sua formação, pela rede de relações disseminadas em cada
período da sua história de ocupação.
A rede de Campinas
Em síntese, a rede de relações no Estado de Goiás vivenciou três momentos:
no primeiro as relações eram mais restritas, a produção se baseava na economia de
subsistência, o excedente era transferido para troca na cidade próxima. Nesse sistema,
os grupos familiares rurais, em contraste com os urbanos, eram autossuficientes no
suprimento alimentar, vestuário, calçados, mobiliário e alguns poucos equipamentos de
trabalho.
As cidades do Estado ainda eram pequenas, não passavam de povoados,
arraiais ou vilas que pouco contribuía na formalização da precária rede de relações. As
relações campo-cidade se sustentavam na oferta de pequenos serviços, ferramentas e
querosene, raras vezes as relações se estendiam aos municípios circunvizinhos, até
porque a comunicação era dificultada pela falta de vias e agravado pelo longo tempo de
espera para a satisfação das necessidades. Da mesma maneira o contato dos moradores
em área rural com as cidades maiores e centro político-administrativo aconteciam de
forma escasseada. A estrutura social nesse primeiro momento era escravocrata.
No segundo momento, havia boa malha viária, veículos motorizados para
otimizar o deslocamento de cargas e pessoas, mas a industrialização e a distribuição da
produção ainda eram insuficientes e pouco desenvolvidas. O terceiro momento se realiza
no presente na atual estrutura e estágio econômico, onde as relações são intensas
motivadas pela melhoria dos canais de comunicação, mudanças na estratégia capitalista
de produção e distribuição, e nos padrões de consumo da população.
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O texto a seguir pretende caracterizar a rede de relações construída nesses
três momentos boom de movimentação como se fosse a constante recriação de zonas
pioneiras no espaço goiano.
No primeiro momento a região do entorno de Goiânia tinha como centro a vila
de Campininha das Flores5. Segundo o Recenseamento de 1872, Campinas era
circundado pelas seguintes Freguesias6, em sentido horário a partir do norte: Pirenópolis,
Corumbá, Silvânia, Santa Cruz, Piracanjuba, Palmeiras, Anicuns, Itaberaí e Jaraguá. Esse
conjunto abrigava 26,4% da população do Estado.
A distância de Campinas às cidades acima situava-se entre 80 a 120 km, as
mais distantes são as cidades localizadas ao norte de Campinas: Corumbá, Pirenópolis e
Jaraguá, e ao sul, Santa Cruz todas situadas a mais de 100 km de distância, conforme
Figura 1. Os municípios com maior população eram os que tinham cidades mais
estruturadas, com mais moradores e melhor capacidade de abastecimento de produtos,
bens e serviços. Conforme relatos Pirenópolis, Corumbá e Silvânia dispunham inclusive
de vida cultural e artística, atributos que exerciam uma atração extra ao consumo básico.
Tabela 1. População em Campinas e entorno – 1872
Freguesias
Jaraguá
Pirenópolis
Corumbá
Silvânia
Santa Cruz
Piracanjuba
Palmeiras
Anicuns
Itaberaí
Campinas
Totais
Livres Escravos
4.407
231
7.023
433
6.171
576
6.772
604
5.637
515
1.422
88
1.206
104
1.099
51
3.065
158
2.580
130
39.382
2890
Total
% Estado
4.638
2,9
7.456
4,6
6.747
4,2
7.376
4,6
6.152
3,8
1.510
0,9
1.310
0,8
1.150
0,7
3.223
2,0
2.710
1,7
42.272
26,4
% escravo
5,0
5,8
8,5
8,2
8,4
5,8
7,9
4,4
4,9
4,8
6,8
Fonte: IBGE, Recenseamento 1872
Org. NUCADA, Miraci Kuramoto
Como se pode verificar na Tabela 1, esses municípios eram os que reuniam
maior percentual de escravos em relação à população total do município, na região, pois,
Caiapônia em 1872 tinha 28,4% da população composta por escravos.
5
Refere-se a Campinas, cidade-sede de município que desapareceu para criação do município de Goiânia onde se
instalou a nova capital do Estado de Goiás. Citação do Boletim Pe. Pelágio. História de Campinas/Goiânia.
6
Freguesia é a menor unidade administrativa no sistema herdado de Portugal, a igreja Católica designava um pároco ou
sacerdote para liderar os serviços religiosos das unidades administrativas, Freguesias, aos quais dava o nome de
Paróquia. O Recenseamento de 1872 foi realizado pelas igrejas e as localidades, no documento, receberam o nome de
Paróquia, por exemplo, Campinas: Paróquia de N. Sra. da Conceição.
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Esse dado abjeto de nossa história indica a acumulação, o poder de renda do lugar se
considerar o alto custo de aquisição do bem semovente 7, como o escravo era registrado
no guarda-livros.
7
Na contabilidade, bens de propriedade ou o domínio sobre algo que se move por conta própria. Os animais de propriedade também
eram contabilizados como bem semovente.
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Em 1843 Campinas foi elevada à categoria de Freguesia. Esse ano marca para
a igreja Católica, o início da paróquia do lugarejo, que até então, fazia parte do curato de
Silvânia. Oficialmente, só em 1845 a paróquia de Campinas foi criada, e desmembrada de
Silvânia, a antiga capela foi substituída pela igreja de Nossa Senhora da Conceição, a
mesma padroeira da capela. Acredita-se que o desmembramento mencionado
anteriormente se refere à jurisdição da paróquia, porém, no Recenseamento de 1872, o
município de Bom-Fim (Silvânia) possuía duas Freguesias, Bom-Fim e Campinas, isso é
contraditório com o que diz a SEPLAN e outras referências bibliográficas, que Goiânia foi
criada com parte dos municípios de Anápolis e Bela Vista.
Consta na história de Trindade que este fazia parte do município de Campinas
como distrito juntamente com o distrito de Ribeirão (Guapó) e que anteriormente as terras
pertenciam a Santa Cruz, cujo território de leste a oeste era limitado pelos rios Parnaíba e
dos Bois. O limite oeste do município de Campestre de Goiás, Aragoiânia e Varjão é o Rio
dos Bois. O primeiro e parte do segundo município pertenceram a Trindade, o que pode
ser indício da correção da história de Trindade contada em sua página da Internet. Para o
Goiás em dados da SEPLAN, o município de Trindade é originário de Goiânia.
Campininha das Flores é o retrato da descrição acima sobre os núcleos
urbanos, conforme relato, “o pequeno arraial cresceu, mas não passou de 30 casas. Só
em 1907 tornou-se vila. Ficou parada no tempo até a chegada dos Redentoristas em
1894”. Segundo o Prof. Stanley8 “A calmaria que reinava na Campininha só foi rompida no
final do séc. XIX, quando os padres redentorista alemães chegaram aqui”. É nesse
cenário que se desenvolve e se fortalece aos poucos a primeira rede de relações a partir
da região do entorno de Campinas ela foi capitaneada pelos padres da paróquia de
Campinas na realização do serviço religioso da igreja católica.
As capelas fundadas ou construídas pelos padres da paróquia de Campinas
são: Inhumas, Goianira, Trindade, Bela Vista de Goiás, Aparecida de Goiânia e Guapó.
As quatro últimas seriam semelhantes, segundo o Boletim Pe. Pelágio. As outras capelas
da região devem ser investigadas quanto à construção e participação dos padres
Redentoristas de Campinas. Em 1891 o Bispo de Goiás ao visitar Trindade se convenceu
da necessidade de fundar ali uma congregação para acompanhar de perto os
preparativos e desenrolar da romaria de Trindade que àquela altura havia se desviado
para a jogatina, as festas profanas e o uso indevido das esmolas. Foi a Roma à procura
de padres que pudessem vir para Goiás.
8
A citação consta no Boletim Pe. Pelágio.
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Segundo o Boletim Pe. Pelágio, os quatorze missionários Redentoristas
alemães vieram a convite do Bispo da Cidade de Goiás Dom Eduardo da Silva. Sete
deles ficaram em Aparecida – SP e sete vieram para Campinas de trem até Uberaba –
MG e de lá seguiram viagem, a cavalo, que durou um mês até chegar a Campinas em 12
de dezembro de 1894. Haviam embarcado no porto de Bordeux na França em 5 de
outubro de 1894.
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A partir do lugar onde nasceria Goiânia e se construiria complexa rede urbana no
futuro, os padres Redentoristas montaram a primeira rede de relações baseada na
assistência religiosa, educacional e social. Construíram albergue para receber viajantes
em trânsito, igrejas, escolas e oficinas para executar serviços como marcenaria e outros
para atender às necessidades da paróquia e da comunidade.
Segundo o Boletim os padres estabeleceram contatos em todas as direções
“de Campinas para Bela Vista, Pirancanjuba, Morrinhos, Quirinópolis, Guapó, Varjão,
Edéia, São Luis de Montes Belos, Anicuns, Americano do Brasil, Iporá, até às margens do
Araguaia”, lugares que conseguiram “grande influência na formação religiosa e social de
todo o povo da região”. Na Figura 2 se verifica a extensão dessa rede fica fora apenas a
região sudoeste do Estado.
De acordo com a Enciclopédia dos Municípios Brasileiros (1958, p. 344) foi o
padre Marinho de Campinas que, interessado em estabelecer relações comerciais com
Minas Gerais e São Paulo, abriu o caminho que passaria por Pouso Alto (Pirancanjuba)
onde havia um local ideal para o pernoite, e via Morrinhos seguiria até ao porto de Santa
Rita do Paranaíba (Itumbiara).
Os padres introduziram técnicas primorosas de carpintaria e entalhe. Os altares
eram elaborados de modo a prescindir do uso de pregos e colas. Trouxeram técnicas que
melhoraram a produção agropastoril, tais como as pastagens artificiais e a produção de
vinhos a partir de frutas locais, rapaduras, farinhas de trigo e de milho que eram vendidos
após as missas. Para essa produção construíram moendas. Os Redentoristas
contribuíram efetivamente na modernização da região.
Segundo o Boletim, a região deve aos padres a inauguração da primeira usina
hidrelétrica, em 1921 foi inaugurada em Trindade a eletricidade e em Campinas um ano
mais tarde, 1922. Conseguiram alterar o traçado da ferrovia para a Cidade de Goiás
ampliando um ramal até Trindade a partir de Campinas e fizeram pressão junto às forças
políticas e aos grupos em conflito contra a estrada de ferro, para apressar a construção
da ferrovia.
Como a linha ficou paralisada em Roncador, próximo a Pires do Rio,
providenciaram a construção de estrada para fluxo de automóvel de Campinas a
Roncador em 1920.
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A ferrovia chegou a Campinas em 1955, o trecho a partir de Campinas à
Trindade, não foi construído, mas atualmente as terras do percurso foram adquiridas e
são áreas públicas nas quais se encontra em construção a Av. Leste-Oeste, trecho
concluído entre o edifício da Câmara Municipal vizinha da Praça do Trabalhador até à
Rua Benjamin Constant na Vila Abajá, uma quadra após o prédio da antiga Estação
Ferroviária de Campinas.
Os padres foram, também, responsáveis pela instalação da linha telefônica
entre Trindade e Campinas e dos primeiros telefones e fundaram a primeira: serraria,
jornal. Trouxeram as irmãs e construíram o Colégio Santa Clara, a primeira motocicleta e
a segunda bicicleta, a primeira já havia em Campinas. Tais ações ilustram a influência dos
padres alemães e da igreja em inserir na região as modernidades que a prepararam para
os novos tempos e que na Alemanha já existiam há quase cem anos.
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Conclusão
Na medida em que se desenvolvia o serviço religioso, a igreja angariava terras,
construía capelas e igrejas e a seu modo dominava o território sob a jurisdição da
paróquia, ao mesmo tempo, alimentando o processo de crescimento no atendimento aos
fiéis aumentava a circunscrição da diocese, por gravidade, crescia o patrimônio da igreja.
Considerando que nas terras doadas para se erguer uma capela ou igreja no entorno das
mesmas se originou a cidade, parece correto afirmar que a igreja Católica foi o terceiro
fator de urbanização no Estado. Na região em estudo foi o primeiro fator de urbanização,
conforme Figura 3.
Entre vinte e três cidades da região do entorno de Goiânia quinze nasceram
em patrimônios da igreja Católica. Gomes e Teixeira Neto (1993, p. 74) afirmam:
Os Patrimônios foram muito importantes na região Centro-Sul de Goiás,
especialmente nas zonas pioneiras do Mato Grosso de Goiás. As reuniões
dominicais numa pequena capela rural representavam para o homem do campo, e
ainda representam, necessidades além da fé religiosa; nelas as pessoas
buscavam, e ainda buscam, uma vida social mais intensa para quebrar o
isolamento do meio rural tradicional. O sertanejo sonhava e sonha com a cidade,
como o beduíno sonha com o oásis.
Considerando o estágio rudimentar das técnicas e dos instrumentos de trabalho
na região até à chegada dos padres Redentoristas alemães para colaborar nos serviços
religiosos da igreja de Campinas e de Trindade e que estes religiosos se esforçaram junto
ao governo para a implantação das políticas de desenvolvimento na Região e em outros
casos introduziram inovações técnicas e máquinas enquanto permaneciam atentos no
andamento dos projetos governamentais para a implantação de mais inovações, se
reconhece aqui que os religiosos escreveram o capítulo decisivo para que a região
ingressasse em novo período de sua história.
The network of relations from Campininhas das Flores
Abstract. The theme of the article is the network relations and the communication infrastructure adjacent to
the process of urbanization in the surrounding region from Goiânia, with special focus on influences in three
distinct periods between 1900 to 1960: the priests from Campinas church, the construction from Goiânia and
Brasília. The work is the result of research in historical archives, bibliographic sources and statistical data
with the objective to support research on the current network relations in the surrounding region from
Goiânia, research linked to the Graduate Post Program in Geography, Federal University from Goiás.
Key-words: urbanization, network relations, region.
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REFERÊNCIAS
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Arquidiocese de Goiânia, s/d.
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