Número 20/21 – Janeiro / Julho, Julho / Dezembro – 2008 - ISSN 2179 5215 A REDE DE RELAÇÕES DE CAMPININHAS DAS FLORES Miraci Kuramoto Nucada 1 Celene Cunha Monteiro Antunes Barreira 2. Resumo O tema do artigo é a rede de relações e a infraestrutura de comunicação adjacente ao processo de urbanização na Região do Entorno de Goiânia, com especial enfoque em três influências em períodos distintos entre 1900 a 1960: os padres da Matriz de Campinas, a construção de Goiânia e de Brasília. O trabalho é fruto de pesquisa em arquivos históricos, fontes bibliográficas e dados estatísticos com o objetivo de fundamentar investigação sobre a atual rede de relações na Região do Entorno de Goiânia, pesquisa vinculada ao Programa de Pós-Graduação em Geografia da Universidade Federal de Goiás. Palavras-chave: Urbanização. Rede de relações. Região. Introdução Neste artigo será apresentado o resultado inicial da pesquisa sobre a rede de relações na Região do Entorno de Goiânia, objeto de estudo de uma pesquisa maior desenvolvida junto ao Programa de Pesquisa e Pós-Graduação da Geografia da Universidade Federal de Goiás. O recorte temporal é de 1900 a 1960 em dois momentos distintos: o período imediatamente anterior à construção de Goiânia, ou seja: sobre as relações estabelecidas na região do entorno de Campinas e as redes de comunicação efetivadas com a construção das Capitais Goiânia e Brasília. Em relação à região do entorno de Campinas será apresentado uma breve contextualização regional com foco nas relações estabelecidas pelos padres da Matriz de Campinas e a discussão inicial sobre a participação da religião Católica na urbanização e modernização nas relações de produção e sociais, como efeito colateral à acumulação fundiária. 1 Miraci Kuramoto Nucada, Arquiteta e Urbanista, Mestre em Geografia e Doutoranda em Geografia pela Universidade Federal de Goiás e Professora do Curso de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Paulista, Campus Flamboyant. Endereço eletrônico: [email protected] 2 Celene Cunha M. Antunes Barreira, Geógrafa, Mestre pela Universidade Federal de Goiás e Doutora pela Universidade São Paulo e Profa. Dra. do PPG em Geografia, da UFG/IESA, Superintendente do Ensino à Distância da Secretaria Estadual de Educação. Endereço eletrônico: [email protected] 135 Número 20/21 – Janeiro / Julho, Julho / Dezembro – 2008 - ISSN 2179 5215 O artigo está estruturado em três tópicos, o primeiro trata da abordagem metodológica e dos procedimentos operacionais, o segundo apresenta uma contextualização histórica, sobre a formação das cidades do território goiano e da estruturação dos fluxos e da rede de relações no Estado e finaliza com uma pesquisa sobre o surgimento de Campinas, cidade que cedeu lugar a Goiânia. A conclusão trata da construção da primeira rede de relações na região do entorno de Goiânia. O procedimento metodológico adotado para a pesquisa compreende a coleta dados nas instituições vinculadas à igreja, em órgãos públicos do Estado e da União sobre a urbanização, construção de infraestrutura e sobre a regionalização utilizada por seus órgãos no atendimento da população. Procurou-se espacializar a jurisdição prevista em leis e documentos disponibilizados pela Secretaria de Planejamento do Estado de Goiás (SEPLAN). Os dados históricos foram levantados na Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e nos Boletins da igreja Católica. Contextualização Apesar de a ocupação do Estado ter-se iniciado quando da breve fase da mineração no século XVIII, com o esgotamento das minas sobreveio a estagnação econômica e muitos aglomerados urbanos entraram em decadência. Lentamente a economia passou de autoconsumo (BARREIRA, 2002) para subsistência e daí a próspero produtor de alimentos e gado. Barreira, ao tratar da ocupação na região nordeste de Estado de Goiás chama a atenção para o fato de que durante a fase da mineração a produção de alimentos para autoconsumo ocorreu nas proximidades das minas, diferentemente das grandes e ricas jazidas de Minas Gerais com maior número de trabalhadores que foram abastecidas principalmente pelos criadores de gado da Bahia e até de regiões mais distantes. As comitivas que vinham a Goiás para exploração do ouro possuíam integrantes cujo propósito era o de organizar as bases de apoio com roçados e pouso. Alguns ficaram pelos caminhos, outros abriram as plantações e a pequena criação junto às minas para o consumo dos trabalhadores junto aos veios de ouro descobertos. Com o esgotamento da extração permaneceram nos lugares os trabalhadores interessados na atividade pecuária a única autotransportável e “devido à facilidade de acumulação inicial que podia ser efetuada com trabalho de ‘meeiro, no pastoreio de rebanho alheio’” (BARREIRA, 2002, p. 92). 136 Número 20/21 – Janeiro / Julho, Julho / Dezembro – 2008 - ISSN 2179 5215 Estevam (1998, p. 44/5) acredita que dois fatores concorreram para a exploração agropecuária juntamente com a exploração aurífera: “a aptidão e a qualidade da terra podem ter sido fortes condicionantes na dinâmica da produção agrícola” e o segundo fator, “o grande distanciamento das minas e as decorrentes dificuldades de abastecimento”, daí concluindo que o “minerador esteve fortemente voltado também para o cultivo agropecuário”, o que seria para Estevam, “importante especificidade na economia mineratória”. De acordo com esse autor a atividade comercial “acompanhou de perto os empreendimentos mineratórios. O nível da vitalidade mercantil media-se na razão direta da produção do ouro e do ajuntamento demográfico proporcionado pela atividade” (Estevam, 1998). Já para Gomes e Teixeira Neto (1993, p. 67) “a mineração foi um fator de urbanização por excelência”, e a agropecuária teve dois momentos elementares: no primeiro de mobilização populacional e no segundo de urbanização, e que “as fazendas surgiram para abastecer as minas de víveres essenciais; daí nasceram múltiplas atividades, principalmente as comerciais e de troca de produtos”. Após o breve período aurífero3, as atividades agropecuárias lentamente prosperaram e se consolidaram enquanto inúmeros pequenos povoados em torno de minas foram abandonados. A população dividiu-se entre os migraram à procura de outros lugares e aqueles que optaram por sobreviver dos afazeres no meio rural. As atividades mercantis que sobreviveram e se desenvolveram localizavam-se em núcleos urbanos maiores, mais estruturados e situados em pontos estratégicos dos poucos caminhos. O verdadeiro surto de estradas e cidades no século XX encontrou o Estado com imensas áreas ainda cobertas de mata virgem. De acordo com Barreira, em muitas das estradas construídas na década de 1960 se aproveitou os caminhos das tropas e boiadas e estradas, a GO – 070, por exemplo, aproveitou grande parte da Estrada Real que ligava Vila Boa ao Rio de Janeiro. Havia ainda a Estrada do Boi e a estrada que ligava Pirenópolis a Cavalcante e Traíras e esta ao oeste da Bahia e ao nordeste do País, e ao sul a estrada que liga Jataí e Rio Verde ao estado de Minas Gerais e São Paulo. 3 Estendeu-se de 1722 a 1778. Em 1779 a produção se reduziu à metade e continuou em queda nos anos seguintes. Sobre esse tema ver mais em Estevam, 1998. 137 Número 20/21 – Janeiro / Julho, Julho / Dezembro – 2008 - ISSN 2179 5215 A área em estudo se localiza na região mais central da parte sul do Estado. Desde a construção de Goiânia a parte centro – sul é a mais densa do Estado de Goiás. Até então, os municípios do entorno de Goiânia estabeleciam uma rede de relações que foi modificada com a transferência da Capital para suas proximidades e, da mesma forma, a estrutura urbana existente se modificou influenciada pela melhoria dos canais de comunicação, a proximidade com o poder político e administrativo. Juntava a essas influências, o espírito da nova república instalada na nova Capital e, sobretudo, a intenção de se distanciar das velhas oligarquias, dominante em Vila Boa de Goiás e no sul do Estado. Outro fator, que influiu na modificação da estrutura urbana e na rede de relações dessas cidades, foi a construção da nova Capital Federal, Brasília. As novas Capitais atraíram uma enorme quantidade de migrantes. O fenômeno ainda existe, embora em menor proporção. A política de desenvolvimento do Governo JK beneficiou o Estado de Goiás ao implementar ações como as que contemplavam abertura de novas estradas e construção do ramal da ferrovia até Brasília. Mesmo que tais medidas objetivassem consolidar o DF e viabilizar a comunicação deste com outros Estados, Goiás terminou contemplado com a estrutura viária e, por fim, deixou o isolamento. O governo necessitava dispor de melhores condições estratégicas de segurança e de relações com os entes federativos, nesse sentido a localização centralizada cumpriu o papel. A dinamização econômica resultante desses dois eventos, definitivamente marcou a região. Trazendo vigor deu novo impulso à urbanização e metropolização de Goiânia. Diante desse quadro, verifica-se que o Estado de Goiás passou por dois períodos de intensa abertura de estradas: 1930 a 1943, quando a malha rodoviária “mais que quadruplicou” de acordo com Estevam (1998, p. 115), e de 1956 a 1970, quando foram abertas as rodovias federais que ligam Brasília às demais regiões do País. Ambos os períodos, como visto acima estão ligados ao surgimento de sedes políticoadministrativas, a primeira estadual e a outra federal. Durante o processo de adaptação, homens e máquinas trabalharam intensamente: represaram rios, aplainou montanhas, derrubou vasta vegetação e afugentaram inúmeros animais num ritmo nunca visto na história goiana. Grande parte das fechadas matas do Mato Grosso Goiano foram derrubadas por arrastão 4, como meio para abrir rapidamente estradas e áreas de plantio e pasto, segundo relato de moradores mais antigos de Goianápolis. 4 Técnica de desmatamento que consiste na movimentação de dois tratores atrelados a grossas correntes. A vegetação à frente das correntes é literalmente arrancada do solo com o deslocamento das máquinas.. 138 Número 20/21 – Janeiro / Julho, Julho / Dezembro – 2008 - ISSN 2179 5215 Waibel (1979, p. 299) aponta essa fase como estágio pré-pioneiro, para ele o pós-pioneiro começa quando a mata quase desapareceu e a terra já foi ocupada, que é o fato presente. Aquele período posterior à construção das capitais para as respectivas regiões de influência seria o estágio da zona pioneira, quando o povoamento promove, o que chamou de um verdadeiro boom, com movimentação semelhante ao relatado acima. A cada atividade ou evento como os acima mencionados injetaram vigor no desenvolvimento econômico do Estado de Goiás, tal como uma onda modificou as estruturas existentes e imprimiram outro dinamismo à configuração espacial, cidades nasceram sobre o declínio das representações urbanas do período que se foi. A urbanização, tal como a mineração no Estado possui elementos que conferem o caráter de especificidade pela sua formação, pela rede de relações disseminadas em cada período da sua história de ocupação. A rede de Campinas Em síntese, a rede de relações no Estado de Goiás vivenciou três momentos: no primeiro as relações eram mais restritas, a produção se baseava na economia de subsistência, o excedente era transferido para troca na cidade próxima. Nesse sistema, os grupos familiares rurais, em contraste com os urbanos, eram autossuficientes no suprimento alimentar, vestuário, calçados, mobiliário e alguns poucos equipamentos de trabalho. As cidades do Estado ainda eram pequenas, não passavam de povoados, arraiais ou vilas que pouco contribuía na formalização da precária rede de relações. As relações campo-cidade se sustentavam na oferta de pequenos serviços, ferramentas e querosene, raras vezes as relações se estendiam aos municípios circunvizinhos, até porque a comunicação era dificultada pela falta de vias e agravado pelo longo tempo de espera para a satisfação das necessidades. Da mesma maneira o contato dos moradores em área rural com as cidades maiores e centro político-administrativo aconteciam de forma escasseada. A estrutura social nesse primeiro momento era escravocrata. No segundo momento, havia boa malha viária, veículos motorizados para otimizar o deslocamento de cargas e pessoas, mas a industrialização e a distribuição da produção ainda eram insuficientes e pouco desenvolvidas. O terceiro momento se realiza no presente na atual estrutura e estágio econômico, onde as relações são intensas motivadas pela melhoria dos canais de comunicação, mudanças na estratégia capitalista de produção e distribuição, e nos padrões de consumo da população. 139 Número 20/21 – Janeiro / Julho, Julho / Dezembro – 2008 - ISSN 2179 5215 O texto a seguir pretende caracterizar a rede de relações construída nesses três momentos boom de movimentação como se fosse a constante recriação de zonas pioneiras no espaço goiano. No primeiro momento a região do entorno de Goiânia tinha como centro a vila de Campininha das Flores5. Segundo o Recenseamento de 1872, Campinas era circundado pelas seguintes Freguesias6, em sentido horário a partir do norte: Pirenópolis, Corumbá, Silvânia, Santa Cruz, Piracanjuba, Palmeiras, Anicuns, Itaberaí e Jaraguá. Esse conjunto abrigava 26,4% da população do Estado. A distância de Campinas às cidades acima situava-se entre 80 a 120 km, as mais distantes são as cidades localizadas ao norte de Campinas: Corumbá, Pirenópolis e Jaraguá, e ao sul, Santa Cruz todas situadas a mais de 100 km de distância, conforme Figura 1. Os municípios com maior população eram os que tinham cidades mais estruturadas, com mais moradores e melhor capacidade de abastecimento de produtos, bens e serviços. Conforme relatos Pirenópolis, Corumbá e Silvânia dispunham inclusive de vida cultural e artística, atributos que exerciam uma atração extra ao consumo básico. Tabela 1. População em Campinas e entorno – 1872 Freguesias Jaraguá Pirenópolis Corumbá Silvânia Santa Cruz Piracanjuba Palmeiras Anicuns Itaberaí Campinas Totais Livres Escravos 4.407 231 7.023 433 6.171 576 6.772 604 5.637 515 1.422 88 1.206 104 1.099 51 3.065 158 2.580 130 39.382 2890 Total % Estado 4.638 2,9 7.456 4,6 6.747 4,2 7.376 4,6 6.152 3,8 1.510 0,9 1.310 0,8 1.150 0,7 3.223 2,0 2.710 1,7 42.272 26,4 % escravo 5,0 5,8 8,5 8,2 8,4 5,8 7,9 4,4 4,9 4,8 6,8 Fonte: IBGE, Recenseamento 1872 Org. NUCADA, Miraci Kuramoto Como se pode verificar na Tabela 1, esses municípios eram os que reuniam maior percentual de escravos em relação à população total do município, na região, pois, Caiapônia em 1872 tinha 28,4% da população composta por escravos. 5 Refere-se a Campinas, cidade-sede de município que desapareceu para criação do município de Goiânia onde se instalou a nova capital do Estado de Goiás. Citação do Boletim Pe. Pelágio. História de Campinas/Goiânia. 6 Freguesia é a menor unidade administrativa no sistema herdado de Portugal, a igreja Católica designava um pároco ou sacerdote para liderar os serviços religiosos das unidades administrativas, Freguesias, aos quais dava o nome de Paróquia. O Recenseamento de 1872 foi realizado pelas igrejas e as localidades, no documento, receberam o nome de Paróquia, por exemplo, Campinas: Paróquia de N. Sra. da Conceição. 140 Número 20/21 – Janeiro / Julho, Julho / Dezembro – 2008 - ISSN 2179 5215 Esse dado abjeto de nossa história indica a acumulação, o poder de renda do lugar se considerar o alto custo de aquisição do bem semovente 7, como o escravo era registrado no guarda-livros. 7 Na contabilidade, bens de propriedade ou o domínio sobre algo que se move por conta própria. Os animais de propriedade também eram contabilizados como bem semovente. 141 Número 20/21 – Janeiro / Julho, Julho / Dezembro – 2008 - ISSN 2179 5215 Em 1843 Campinas foi elevada à categoria de Freguesia. Esse ano marca para a igreja Católica, o início da paróquia do lugarejo, que até então, fazia parte do curato de Silvânia. Oficialmente, só em 1845 a paróquia de Campinas foi criada, e desmembrada de Silvânia, a antiga capela foi substituída pela igreja de Nossa Senhora da Conceição, a mesma padroeira da capela. Acredita-se que o desmembramento mencionado anteriormente se refere à jurisdição da paróquia, porém, no Recenseamento de 1872, o município de Bom-Fim (Silvânia) possuía duas Freguesias, Bom-Fim e Campinas, isso é contraditório com o que diz a SEPLAN e outras referências bibliográficas, que Goiânia foi criada com parte dos municípios de Anápolis e Bela Vista. Consta na história de Trindade que este fazia parte do município de Campinas como distrito juntamente com o distrito de Ribeirão (Guapó) e que anteriormente as terras pertenciam a Santa Cruz, cujo território de leste a oeste era limitado pelos rios Parnaíba e dos Bois. O limite oeste do município de Campestre de Goiás, Aragoiânia e Varjão é o Rio dos Bois. O primeiro e parte do segundo município pertenceram a Trindade, o que pode ser indício da correção da história de Trindade contada em sua página da Internet. Para o Goiás em dados da SEPLAN, o município de Trindade é originário de Goiânia. Campininha das Flores é o retrato da descrição acima sobre os núcleos urbanos, conforme relato, “o pequeno arraial cresceu, mas não passou de 30 casas. Só em 1907 tornou-se vila. Ficou parada no tempo até a chegada dos Redentoristas em 1894”. Segundo o Prof. Stanley8 “A calmaria que reinava na Campininha só foi rompida no final do séc. XIX, quando os padres redentorista alemães chegaram aqui”. É nesse cenário que se desenvolve e se fortalece aos poucos a primeira rede de relações a partir da região do entorno de Campinas ela foi capitaneada pelos padres da paróquia de Campinas na realização do serviço religioso da igreja católica. As capelas fundadas ou construídas pelos padres da paróquia de Campinas são: Inhumas, Goianira, Trindade, Bela Vista de Goiás, Aparecida de Goiânia e Guapó. As quatro últimas seriam semelhantes, segundo o Boletim Pe. Pelágio. As outras capelas da região devem ser investigadas quanto à construção e participação dos padres Redentoristas de Campinas. Em 1891 o Bispo de Goiás ao visitar Trindade se convenceu da necessidade de fundar ali uma congregação para acompanhar de perto os preparativos e desenrolar da romaria de Trindade que àquela altura havia se desviado para a jogatina, as festas profanas e o uso indevido das esmolas. Foi a Roma à procura de padres que pudessem vir para Goiás. 8 A citação consta no Boletim Pe. Pelágio. 142 Número 20/21 – Janeiro / Julho, Julho / Dezembro – 2008 - ISSN 2179 5215 Segundo o Boletim Pe. Pelágio, os quatorze missionários Redentoristas alemães vieram a convite do Bispo da Cidade de Goiás Dom Eduardo da Silva. Sete deles ficaram em Aparecida – SP e sete vieram para Campinas de trem até Uberaba – MG e de lá seguiram viagem, a cavalo, que durou um mês até chegar a Campinas em 12 de dezembro de 1894. Haviam embarcado no porto de Bordeux na França em 5 de outubro de 1894. 143 Número 20/21 – Janeiro / Julho, Julho / Dezembro – 2008 - ISSN 2179 5215 A partir do lugar onde nasceria Goiânia e se construiria complexa rede urbana no futuro, os padres Redentoristas montaram a primeira rede de relações baseada na assistência religiosa, educacional e social. Construíram albergue para receber viajantes em trânsito, igrejas, escolas e oficinas para executar serviços como marcenaria e outros para atender às necessidades da paróquia e da comunidade. Segundo o Boletim os padres estabeleceram contatos em todas as direções “de Campinas para Bela Vista, Pirancanjuba, Morrinhos, Quirinópolis, Guapó, Varjão, Edéia, São Luis de Montes Belos, Anicuns, Americano do Brasil, Iporá, até às margens do Araguaia”, lugares que conseguiram “grande influência na formação religiosa e social de todo o povo da região”. Na Figura 2 se verifica a extensão dessa rede fica fora apenas a região sudoeste do Estado. De acordo com a Enciclopédia dos Municípios Brasileiros (1958, p. 344) foi o padre Marinho de Campinas que, interessado em estabelecer relações comerciais com Minas Gerais e São Paulo, abriu o caminho que passaria por Pouso Alto (Pirancanjuba) onde havia um local ideal para o pernoite, e via Morrinhos seguiria até ao porto de Santa Rita do Paranaíba (Itumbiara). Os padres introduziram técnicas primorosas de carpintaria e entalhe. Os altares eram elaborados de modo a prescindir do uso de pregos e colas. Trouxeram técnicas que melhoraram a produção agropastoril, tais como as pastagens artificiais e a produção de vinhos a partir de frutas locais, rapaduras, farinhas de trigo e de milho que eram vendidos após as missas. Para essa produção construíram moendas. Os Redentoristas contribuíram efetivamente na modernização da região. Segundo o Boletim, a região deve aos padres a inauguração da primeira usina hidrelétrica, em 1921 foi inaugurada em Trindade a eletricidade e em Campinas um ano mais tarde, 1922. Conseguiram alterar o traçado da ferrovia para a Cidade de Goiás ampliando um ramal até Trindade a partir de Campinas e fizeram pressão junto às forças políticas e aos grupos em conflito contra a estrada de ferro, para apressar a construção da ferrovia. Como a linha ficou paralisada em Roncador, próximo a Pires do Rio, providenciaram a construção de estrada para fluxo de automóvel de Campinas a Roncador em 1920. 144 Número 20/21 – Janeiro / Julho, Julho / Dezembro – 2008 - ISSN 2179 5215 A ferrovia chegou a Campinas em 1955, o trecho a partir de Campinas à Trindade, não foi construído, mas atualmente as terras do percurso foram adquiridas e são áreas públicas nas quais se encontra em construção a Av. Leste-Oeste, trecho concluído entre o edifício da Câmara Municipal vizinha da Praça do Trabalhador até à Rua Benjamin Constant na Vila Abajá, uma quadra após o prédio da antiga Estação Ferroviária de Campinas. Os padres foram, também, responsáveis pela instalação da linha telefônica entre Trindade e Campinas e dos primeiros telefones e fundaram a primeira: serraria, jornal. Trouxeram as irmãs e construíram o Colégio Santa Clara, a primeira motocicleta e a segunda bicicleta, a primeira já havia em Campinas. Tais ações ilustram a influência dos padres alemães e da igreja em inserir na região as modernidades que a prepararam para os novos tempos e que na Alemanha já existiam há quase cem anos. 145 Número 20/21 – Janeiro / Julho, Julho / Dezembro – 2008 - ISSN 2179 5215 Conclusão Na medida em que se desenvolvia o serviço religioso, a igreja angariava terras, construía capelas e igrejas e a seu modo dominava o território sob a jurisdição da paróquia, ao mesmo tempo, alimentando o processo de crescimento no atendimento aos fiéis aumentava a circunscrição da diocese, por gravidade, crescia o patrimônio da igreja. Considerando que nas terras doadas para se erguer uma capela ou igreja no entorno das mesmas se originou a cidade, parece correto afirmar que a igreja Católica foi o terceiro fator de urbanização no Estado. Na região em estudo foi o primeiro fator de urbanização, conforme Figura 3. Entre vinte e três cidades da região do entorno de Goiânia quinze nasceram em patrimônios da igreja Católica. Gomes e Teixeira Neto (1993, p. 74) afirmam: Os Patrimônios foram muito importantes na região Centro-Sul de Goiás, especialmente nas zonas pioneiras do Mato Grosso de Goiás. As reuniões dominicais numa pequena capela rural representavam para o homem do campo, e ainda representam, necessidades além da fé religiosa; nelas as pessoas buscavam, e ainda buscam, uma vida social mais intensa para quebrar o isolamento do meio rural tradicional. O sertanejo sonhava e sonha com a cidade, como o beduíno sonha com o oásis. Considerando o estágio rudimentar das técnicas e dos instrumentos de trabalho na região até à chegada dos padres Redentoristas alemães para colaborar nos serviços religiosos da igreja de Campinas e de Trindade e que estes religiosos se esforçaram junto ao governo para a implantação das políticas de desenvolvimento na Região e em outros casos introduziram inovações técnicas e máquinas enquanto permaneciam atentos no andamento dos projetos governamentais para a implantação de mais inovações, se reconhece aqui que os religiosos escreveram o capítulo decisivo para que a região ingressasse em novo período de sua história. The network of relations from Campininhas das Flores Abstract. The theme of the article is the network relations and the communication infrastructure adjacent to the process of urbanization in the surrounding region from Goiânia, with special focus on influences in three distinct periods between 1900 to 1960: the priests from Campinas church, the construction from Goiânia and Brasília. The work is the result of research in historical archives, bibliographic sources and statistical data with the objective to support research on the current network relations in the surrounding region from Goiânia, research linked to the Graduate Post Program in Geography, Federal University from Goiás. Key-words: urbanization, network relations, region. 146 Número 20/21 – Janeiro / Julho, Julho / Dezembro – 2008 - ISSN 2179 5215 REFERÊNCIAS ARQUIDIOCESE DE GOIÂNIA. Arquidiocese de Goiânia, s/d. História de Campinas/Goiânia. Boletim Pe. Pelágio. Goiânia: BARREIRA, Celene Cunha Monteiro Antunes. Vão do Paraná: a estruturação de uma região. Brasília: Ministério da Integração Nacional: UFG, 2002. BORGES, Barsanulfo Gomides. Goiás nos quadros da economia nacional: 1930 – 1960. Goiânia: UFG, 2000. ESTEVAM, Luis. O tempo da transformação: estrutura e dinâmica da formação econômica de Goiás. Goiânia: ed. do Autor, 1998. 276p. GOMES, Horieste e TEIXEIRA NETO, Antônio. Geografia: Goiás-Tocantins. Goiânia: Centro Editorial e Gráfico, Universidade Federal de Goiás, 1993. IBGE. Iº Centenário das ferrovias brasileiras. Rio de Janeiro: IBGE, 1954. _____. Enciclopédia dos municípios brasileiros. Goiás v. 36. Rio de Janeiro: IBGE, 1958. _____. Censo 2000: Brasil 2002. Rio de Janeiro: IBGE, 2002. SECRETARIA DE PLANEJAMENTO E ADMINISTRAÇÃO – SEPLAN: Gerência de estatísticas. Goiás em dados 2005. Goiânia: Governo do Estado de Goiás, 2006. WAIBEL, Leo. Capítulos de geografia tropical e do Brasil. Rio de Janeiro: IBGE, 1979. 147