ab Sexta-Feira, 1° De Janeiro De 2016 Não é segredo que os resultados econômicos de 2015 foram muito ruins. o orçamento primário, por exemplo, completou dois anos de deficit, algo inédito desde a reforma monetária de 1994. Como a matriz dos problemas da economia está no desequilíbrio das contas públicas, o repetido revés nessa área impôs um tombo extraordinário no investimento, no emprego e na renda, abalando a confiança de empresários e consumidores. A queda do PIB, que provavelmente passou de 3,5% em 2015, somente encontra paralelo na história recente em 1981 e 1990. A retração econômica começou em meados de 2014 e já estava em curso na campanha eleitoral, sem, no entanto, ter suscitado debate eficaz sobre a política econômica, seja pela avaliação fantasiosa da realidade propagada pela situação, seja pela falta de contundência das oposições em seus diagnósticos. Ficou nas mãos dos artífices do retrocesso no qual nos encontramos HHH Realidade ampliada Pedro Luiz Passos a tarefa de repor a retomada da agenda de reformas (previdenciária, trabalhista, fiscal etc.), a adoção de medidas reparadoras das contas fiscais, com o corte de programas não essenciais, e o desmonte da indexação generalizada e da vinculação dos gastos públicos. Nada se fez para diminuir o tamanho do Estado ou para melhorar a eficiência do setor público. Ficou apenas na promessa a consolidação fiscal indispensável para reduzir o endividamento público. Sem tais ações, a economia repetirá em 2016 o fracasso de 2015. E não só a economia. Do escândalo da Lava Jato ao estouro da barragemdeminériosnoRioDoce,passando pela emergência de novas doençasdomosquitoAedesAegypti,oano A crise de 2015 escancarou os problemas nacionais, mas gerou consensos necessários para superá-los quepassouexpôsarealidadeampliada dos problemas nacionais. Só sairemos do impasse com medidas realistas, como tem sido o ajuste tarifário e cambial. Ambos estão desfazendo quase uma década de subsídios que estouraram com o caixa da Petrobras e das empresas elétricas, além de levar as indústrias, as exportações e as contas externas à anemia devido à prolongada valorização do real. Tais medidas engrossam a inflação num primeiro momento. Mas estão criando as condições para o re- torno dos investimentos em atividades importantes da economia e já implicam a redução do deficit externo e o fomento à exportação. o colapso das contas públicas também desperta no meio empresarial, na sociedade e entre os políticos a consciência de que só a solução dos problemas estruturais fará o país voltar a crescer. Vão se formando consensos importantes. Um deles é o de que a integração com a economia global favorece a inovação e a produtividade, dois componentes essenciais para a riqueza das nações. é crescente também a percepção no setor privado de que os subsídios de juros, as desonerações tributárias e o protecionismo configuram ganhos ilusórios, se estendidos no mercado a11 tempo, mais servindo para encobrir ineficiências que induzir os avanços empresariais. Tenho esperança de que as contas públicas serão tratadas com maior zelo, inclusive pelo Congresso Nacional, que é a instância fiscalizadora dos atos do governo. E que “criatividade”, “maquilagem” e “pedaladas”, esses tristes neologismos das contas nacionais, sejam julgadas como realmente são: irresponsabilidades que não dignificam o Brasil e os brasileiros. Esse será o curso natural da crescente aceitação no debate econômico da imperiosa necessidade de que os resultados das políticas públicas sejam sistematicamente auditados, avaliados e divulgados. Quando e se todas essas transformações se tornarem realidade, poderemos festejar o ano que se vai e desejar feliz ano novo não como um chavão da época, mas como compromisso. PEDRO LUIZ PASSOS, 64, empresário, é conselheiro da Natura. Escreve às sextas-feiras, a cada 14 dias, nesta coluna. CoLuNisTas da seMaNa segunda: Marcia dessen; terça: Benjamin steinbruch; quarta: alexandre schwartsman; quinta: Laura Carvalho; sexta: Pedro Passos; sábado: ronaldo Caiado domingo: samuel Pessôa SEM FORÇA Eletronuclear está em dificuldades para terminar obras de Angra 3 Qual o estágio das obras? Usina nuclear Angra 3 procura verba e saídas Obras pararam em setembro e prazo de conclusão sofrerá revisão Quando deve ficar pronta? Cronograma atual prevê a entrega para maio de 2019 Quanto dinheiro falta? R$ 1 bi da Eletronuclear para destravar R$ 4 bi do BNDES 55% O que ainda falta fazer? Terminar as obras de construção civil – estruturas e barreiras de contenção Há outros problemas? A Eletronuclear quer renegociar contratos com as empresas responsáveis pela execução das obras, como a Andrade Gutierrez Importar turbinas e reator – fornecedores mantêm equipamentos fora do país RJ A estatal tenta barrar pagamentos de aditivos às construtoras e busca novos fornecedores Angra 3 MG RJ Falta de dinheiro, empreiteiras envolvidas na Lava Jato e questões jurídicas são principais obstáculos Depois de pronta, como vai funcionar? 1 Reator Aquece a água, que é transformada em vapor (sistema GV) 3 Turbina Depois de acionar as turbinas, o vapor é condensado pelo sistema de resfriamento, que usa água do mar no processo machado da costa dE brasília Enquanto briga com a falta de dinheiro em caixa e com as empreiteiras responsáveis pela obra, a Eletronuclear busca alternativas para destravar o andamento da construção de Angra 3 —suspensa desde setembro. Faltam R$ 5 bilhões para terminar a usina nuclear, e uma nova empresa capaz de tocar o empreendimento. A Andrade Gutierrez e a Engevix, que estavam construindo a usina, devem perder os contratos caso se confirmem as suspeitas de desvio de dinheiro apontadas na Operação Lava Jato. O ex-diretor-presidente da Eletronuclear Othon Luiz Pinheiro da Silva está preso desde julho, acusado de participar do esquema. De todo o dinheiro que ainda falta, cerca de R$ 1 bilhão precisa ser desembolsado pela própria estatal. Os outros R$ 4 bilhões virão de uma linha de crédito do BNDES. A empresa tem pleiteado 2 2 Vapor O vapor é levado para as turbinas, fora da barreira de contenção, que geram a eletricidade 1 3 4 4 Ciclo A água, líquida, volta a passar pelo reator para mais um ciclo Fontes: Eletronuclear, FEM/Unicamp, MME junto à Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica) a elevação de 28% das tarifas cobradas pela energia produzida por Angra 1 e 2, a fim de custear a nova usina. A revisão concedida, contudo, ficou próxima da metade disso. Hoje, as duas usinas em operação geram 1,5% da energia no país. Com a terceira unidade, seriam 2,5%. Sem uma ajuda da Eletrobras, principal acionista da Eletronuclear, o prazo para a finalização das obras —estendido para maio de 2019, enquanto o original era 2016— não deve ser cumprido. Em novembro, a Eletronuclear pediu uma suspensão do contrato por 120 dias para levantar R$ 140 milhões — que seriam usados como contrapartida para liberar uma parcela de R$ 560 milhões do BNDES. A empresa tenta renegociar o financiamento para flexibilizar essa regra. dúvidAs “Com a revisão da tarifa concedida pela Aneel, conseguimos uma parte da contrapartida, mas é insuficiente para destravar toda a obra”, diz Leonam Guimarães, diretor da Eletronuclear. No entanto, de acordo com o Ministério de Minas e Energia, as questões jurídicas envolvendo as empreiteiras e a estatal são os principais obstáculos à retomada das obras. “Ainda pairam muitas dúvidas sobre os contratos que precisam ser dirimidas antes que as obras sejam retomadas”, afirma o ministro Eduardo Braga. Por outro lado, a acusação feita pela Lava Jato pode ajudar a estatal a levantar mais recursos. A Eletronuclear espera um posicionamento do TCU (Tribunal de Contas da União) sobre como bloquear o paga- mento de despesas faturadas pelas construtoras e, assim, liberar mais dinheiro, segundo o ministério. Caso as obras não sejam retomadas até o final de fevereiro de 2016, a Eletronuclear está sujeita a multas e processos na Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica) que podem levar até à perda do contrato de construção e operação da usina. sucAtA Fernando Jordão (PMDBRJ), ex-prefeito de Angra dos Reis e agora deputado federal, afirma que há risco de An- gra 3 virar “sucata”. “Pleiteamos junto ao governo uma liberação de recursos do Tesouro. Sem dinheiro, é possível que se perca o que já está feito. Assim, Angra 3 vai virar sucata”, diz. Nem Braga, nem Guimarães confirmaram a tentativa de buscar recursos junto ao Tesouro. Guimarães também afirma que está sendo feito um trabalho de manutenção para não perder os trabalhos realizados e que os equipamentos mais caros, como as turbinas, são importados e estão estocados fora do país. O deputado diz ter conversado com o presidente da Eletrobras, José da Costa Carvalho Neto, que prometeu buscar uma solução para a questão financeira. Mas, a principal empresa do setor elétrico carece de recursos em caixa desde 2013 e deixou para a Eletronuclear o fardo da conclusão da usina. “O governo tem uma dívida com o município. Além de uma obra não acabada, agora temos 2.400 trabalhadores desempregados.” De acordo com a Eletronuclear, um acordo com os sindicatos locais estabelece que, assim que a construção for retomada, os trabalhadores demitidos terão prioridade na recontratação.