alessandra hermógenes go

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE OURO PRETO
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS FARMACÊUTICAS
(CIPHARMA)
ALESSANDRA HERMÓGENES GOMES TOBIAS
DESEMPENHO DO PRÉ-ESCRUTÍNIO RÁPIDO E DA REVISÃO RÁPIDA DE 100%
COMO MÉTODOS DE MONITORAMENTO INTERNO DA QUALIDADE DOS
EXAMES CITOPATOLÓGICOS DO COLO DO ÚTERO
OURO PRETO - MG
2016
ALESSANDRA HERMÓGENES GOMES TOBIAS
DESEMPENHO DO PRÉ-ESCRUTÍNIO RÁPIDO E DA REVISÃO RÁPIDA DE 100%
COMO MÉTODOS DE MONITORAMENTO INTERNO DA QUALIDADE DOS
EXAMES CITOPATOLÓGICOS DO COLO DO ÚTERO
Tese de doutorado apresentada ao Programa de PósGraduação
em
Ciências
Farmacêuticas
da
Universidade Federal de Ouro Preto, como parte
integrante dos requisitos para obtenção do título de
Doutor em Ciências Farmacêuticas.
Orientadora: Profª Cláudia Martins Carneiro
Co-orientadora: Profª Rita Goreti Amaral
OURO PRETO - MG
2016
T629d
Tobias, Alessandra Hermógenes Gomes.
Desempenho do pré-escrutínio rápido e da revisão rápida de 100% como
métodos de monitoramento interno da qualidade dos exames citopatológicos do
colo do útero [manuscrito] / Alessandra Hermógenes Gomes Tobias. - 2016.
99f.: il.: color; tabs.
Orientadora: Profa. Dra. Cláudia Martins Carneiro.
Coorientadora: Profa. Dra. Rita Goreti Amaral.
Tese (Doutorado) - Universidade Federal de Ouro Preto. Escola de
Farmácia. Programa de Pós-Graduação em Ciências Farmacêuticas.
Área de Concentração: Fármacos, Medicamentos e Vacinas.
1. Colo do útero. 2. Ginecologia - Diagnóstico . 3. Controle de qualidade. I.
Carneiro, Cláudia Martins. II. Amaral, Rita Goreti. III. Universidade Federal
de Ouro Preto. IV. Titulo.
CDU: 618.14:006.015.5
Catalogação: www.sisbin.ufop.br
Dedico este trabalho...
Ao meu esposo Wellington, por todo amor e cumplicidade;
Aos meus pais, Creuza e Félix, por me apoiarem sempre;
A minha irmã Fernanda, e aos meus sobrinhos Víctor e Eduardo pelo carinho;
À dona baixinha, muito especial e amada;
A minha vovó Lina, sempre amorosa e amiga.
AGRADECIMENTOS
Todo louvor seja dado a Deus, sempre constante, amigo, fiel e verdadeiro, pela força e
direção em toda minha vida!
Com um carinho mais que especial, agradeço a você Cláudia! Sempre me perguntam por que
escolhi ficar em Ouro Preto, e então conto com emoção, de como você me acolheu de
maneira muito carinhosa, e me abriu portas das quais serei eternamente grata. Muito
obrigada por cada lição transmitida, pelos ótimos anos de convivência, por todo apoio e
incentivo que você sempre me deu. Você é uma pessoa maravilhosa, ótima profissional! Você
é simplesmente especial!
Minha querida Rita, nem sei como te agradecer por tudo! Você é única! Obrigada pelo
acolhimento, por ser pra mim um exemplo de garra e determinação! E também por me
proporcionar momentos especiais na companhia desse menino lindo, Paulinho!
Ao Wendel, meu muito obrigada por sempre estar à disposição para colaborar com este
trabalho.
À vocês meninas, Aline, Renata, Mariana e Jennefer! Guardo vocês em um lugar especial no
meu coração. Vocês foram essenciais para realização deste trabalho e arrasaram!
À toda equipe do LAPAC, em especial à Karla, seu alto astral é contagiante! A todos da
Escola de Farmácia, pelos bons anos de convivência.
À Théa Nobre, jamais me esquecerei, que o desejo de ser citologista começou através de
você. Obrigada por ter sido uma professora e amiga excepcional!
Ao meu esposo, Wellington, que a cada dia me viu lutar por este sonho, e sempre esteve ao
meu lado! Obrigada por sonhar e lutar comigo!
Aos meus pais, Creuza e Félix. Vocês me ensinaram a não me acomodar. Além de serem meu
espelho de superação, em tudo vocês me apoiaram. Amo vocês!
À minha irmã, Fernanda, e aos meus sobrinhos, Víctor e Eduardo. Mesmo distantes, vocês
alegram meus dias!
À Conceição, carinhosamente dona baixinha! Seus conselhos são sempre preciosos! À Islie,
Sarah e Késya, por me acolherem nesta família maravilhosa!
À Secretaria de Saúde de Ouro Preto pela parceria para realização deste trabalho. Também
à toda equipe de atenção primária das Unidades Básicas de Saúde de Ouro Preto. Muito
obrigada por toda colaboração para execução deste projeto.
À Secretaria Estadual de Saúde de Minas Gerais, pela parceria.
Aos meus queridos amigos da Igreja Cristã Maranata, a oração de vocês é uma benção em
minha vida!
Enfim, agradeço a todos, amigos e familiares que torceram por esta conquista! Muito
obrigada!
“Porque a tua benignidade é melhor do que a vida; os meus lábios te louvarão. Assim eu te
bendirei, enquanto eu viver; em teu nome levantarei as minhas mãos. A minha alma se
fartará, como de tutano e de gordura; e a minha boca te louvará com alegres lábios, quando
me lembrar de ti na minha cama e meditar em ti nas vigílias da noite. Porque tu tens sido o
meu auxílio; jubiloso cantarei refugiado à sombra das tuas asas.”
Salmos 63:3-7
RESUMO
Introdução: O câncer do colo do útero é o quarto tipo de câncer mais frequente entre as
mulheres, e a realização periódica do exame citopatológico do colo do útero ou Papanicolaou
é a principal estratégia adotada para o rastreamento desta neoplasia. O exame citopatológico é
estratégico para detecção de lesões pré-neoplásicas, porém, sua eficiência ainda é
questionada, porque mesmo sendo realizado periodicamente, muitas mulheres ainda são
diagnosticadas com esse câncer, o que em parte ocorre devido a elevadas taxas de resultados
falso-negativos (RFN). A implantação de métodos de monitoramento interno de qualidade
(MIQ) na rotina laboratorial visa reduzir os RFN, melhorando o desempenho do exame
citopatológico na detecção de lesões precursoras. Objetivo: Avaliar o desempenho do préescrutínio rápido (PER) e da revisão rápida de 100% (RR100%) como métodos de MIQ.
Metodologia: Entre outubro de 2012 e outubro de 2014 o Laboratório Piloto de Análises
Clínicas da Escola de Farmácia da Universidade Federal de Ouro Preto recebeu para análise
9.675 esfregaços do colo do útero colhidos nas Unidades Básicas de Saúde (UBS) do
município de Ouro Preto, Minas Gerais. Após avaliação pré-analítica 357 esfregaços foram
rejeitados e aqueles em condições de análise foram enviados para leitura. Todos os esfregaços
foram avaliados rapidamente pelo PER antes do escrutínio de rotina (ER). Em seguida, os
esfregaços classificados como negativos pelo ER foram encaminhados para serem analisados
pela RR100%. Todos os esfregaços classificados como positivos e insatisfatórios pelo ER,
assim como os esfregaços discordantes entre o PER, o ER e a RR100% foram submetidos a
uma revisão detalhada para definição do diagnóstico final. Foi realizado levantamento do
exame citopatológico de seguimento e do exame histopatológico referentes às mulheres com
exames citopatológicos alterados detectados neste estudo. Resultados: Dentre os 9.318
esfregaços analisados, 1.267 foram considerados positivos pelo diagnóstico final, destes 1.054
(11,3%) foram identificados pelo ER e 213 (2,3%) foram RFN detectados pelos métodos de
MIQ. O PER suspeitou de 1.437 (15,4%) esfregaços e 647 (45%) foram classificados como
positivos pelo diagnóstico final e destes, 140 (1,5%) foram RFN. A RR100% suspeitou de
507 (6,2%) esfregaços e 123 (1,3%) foram RFN classificados como positivos pelo diagnóstico
final. As alterações mais frequentes entre os RFN detectados pelo PER foram ASC-US
(0,7%) seguida de LSIL (0,6%) e ASC-H (0,1%). Em relação aos RFN detectados pela
RR100% a LSIL (0,6%) foi a alteração mais frequente, seguida de ASC-US (0,5%) e ASC-H
(0,1%). O ER detectou 11,3% dos esfregaços alterados e esse valor subiu para 12,8% com
associação do PER e para 12,6% com a RR100%. Quando comparado ao diagnóstico final, a
sensibilidade do ER foi de 83,2%. A sensibilidade do PER e da RR100% levando em
consideração somente os esfregaços considerados como negativos pelo ER foi de 65,7% e
57,8%, respectivamente. Entre as mulheres com diagnóstico citopatológico positivo, apenas
668 (62,5%) realizaram novo exame citopatológico e 49 (25%) realizaram biópsia. A
sensibilidade do PER, da RR100% e do ER, quando comparado ao resultado do novo exame
citopatológico foi de 70,3%, 54,0% e 85,7%, respectivamente. Não foi possível calcular a
sensibilidade do ER e dos métodos de MIQ comparado ao resultado do exame histopatológico
devido ao baixo número de seguimentos (25%). Dentre os métodos de MIQ, o que dispensou
maior volume de trabalho foi o PER, aproximadamente 13,6% a mais que a RR100%. Os
citologistas mostraram melhor desempenho na realização do PER. Os indicadores de
qualidade dos exames citopatológicos realizados no laboratório se encontraram dentro do
recomendado pelo Ministério da Saúde tanto antes quanto após a realização dos métodos de
MIQ. Conclusões: De acordo com os resultados deste trabalho, o PER e a RR100% foram
capazes de melhorar o desempenho do exame citopatológico, mostrando resultados
semelhantes na detecção de resultados falso-negativos da rotina laboratorial.
ABSTRACT
Introduction: Cervical cancer is the fourth most common cancer among women, and regular
practice of cervical cytopathology exam or Pap test is the main strategy adopted for screening
of this cancer. The Pap test is strategic for the detection of precancerous lesions, although its
efficiency is still questioned, because even been done periodically, many women still develop
this cancer, which in part is due to high rates of false- negatives results (FNR). The
implementation of internal quality control methods (IQC) in routine laboratory aims to reduce
the FNR, improving the performance of the Pap test in detecting premalignant lesions.
Objective: To evaluate the performance of rapid prescreening (RP) and 100% rapid review
(RR100%) as IQC methods. Methods: Between October 2012 and October 2014 the Pilot
Laboratory of Clinical Analysis, School of Pharmacy of the Federal University of Ouro Preto
received for analysis 9.675 cervical smears collected from the Basic Health Units in the city
of Ouro Preto, Minas Gerais. After pre-analytical evaluation 357 smears were rejected, and
those in conditions to analysis were sent to reading. All smears were rapid evaluated by RPS
before routine screening (RS). Then, all smears classified as negative by RS were sent to be
analyzed by RR100%. All smears classified as positive or unsatisfactory by RS and
discordant smears between RPS, RS and the RR100% were underwent to detailed review to
define the final diagnosis. Results: Among 9.318 smears, 1.267 (13,6%) were classified as
positive by the final diagnosis, of these 1.054 (11,3%) were identified by the RS and 213
(2,3%) were FNR detected by IQC methods. Of the 1.437 (15,4%) smears ranked as
suspected by RPS 647 (45%) were classified as positive by final diagnosis and of these, 140
(1,5%) were FNR. The RR100% ranked 507 (6,2%) smears as suspect and 123 (1,3%) were
FNR classified as positive by the final diagnosis. The most frequently alterations between
FNR detected by the RPS were ASC-US (0,7%) followed by LSIL (0,6%) and ASC-H
(0,1%). In relation to the FNR detected by RR100% LSIL (0,6%) was the most frequent
alteration, followed by ASC-US (0,5%) and ASC-H (0,1%). When compared to the final
diagnosis, the sensitivity of RS was 83,2%. The sensitivity of RPS and RR100% taking into
account only the smears considered negative for RS was 65,7% and 57,8% respectively.
Among woman with positive Pap test, only 668 (62,5%) were submitted to a new Pap test and
49 (25%) to biopsy. The sensitivity of the RPS, the RR100% and RS when compared to the
result of the new Pap test was 70,3%, 54,0% and 85,7% respectively. The sensitivity of the
RS and IQC methods compared to the result of the histopathology exam could not calculate
due to low number of surveyed segments (23%). Among the methods of IQC, RPS dismissed
more work in laboratory routine, about 13,6% more than the RR100%. The cytologists
showed better performance on the RPS. The quality indicators of cytological tests performed
in the laboratory were within the recommended by the Health Ministry both before and after
the completion of IQC methods. Conclusions: According to the results of this study, RPS and
RR100% improved the performance of the Pap test, showing similar results in detection of
false-negative results of laboratory routine.
LISTA DE FIGURAS
Figura 1. Mudanças na estrutura do tecido associadas à progressão da neoplasia intraepitelial
cervical no epitélio escamoso e à infecção persistente por HPV. Piersma, 2011. (adaptado) . 22
Figura 2. Procedimento técnico operacional para leitura dos exames citopatológicos. .......... 41
Figura 3. Classificação dos resultados dos exames citopatológicos do colo do útero conforme
Sistema de Bethesda 2001. Solomon, Nayar, 2004 (adaptado). ............................................... 42
Figura 4. Resultado geral da avaliação do pré-escrutínio rápido, do escrutínio de rotina e da
revisão rápida de 100%, de acordo com o diagnóstico final. ................................................... 46
LISTA DE TABELAS
Tabela 1. Resultado detalhado da avaliação do pré-escrutínio rápido, do escrutínio de rotina e
da revisão rápida de 100%, confirmados pelo diagnóstico final. ............................................. 47
Tabela 2. Frequência de resultados citopatológicos alterados antes e após realização dos
métodos de monitoramento interno da qualidade, confirmados pelo diagnóstico final. .......... 48
Tabela 3. Frequência de resultados citopatológicos falso-negativos identificados pelos
métodos de pré-escrutínio rápido e de revisão rápida de 100%, confirmados pelo diagnóstico
final. .......................................................................................................................................... 49
Tabela 4. Desempenho do pré-escrutínio rápido, da revisão rápida de 100% e do escrutínio de
rotina, quando comparado ao resultado do diagnóstico final. .................................................. 49
Tabela 5. Desempenho do escrutínio de rotina, do pré-escrutínio rápido e da revisão rápida de
100% na detecção de ASC-US/LSIL, quando comparado ao resultado do novo exame
citopatológico. .......................................................................................................................... 50
Tabela 6. Volume de trabalho e tempo gasto de revisão entre o pré-escrutínio rápido e a
revisão rápida de 100%............................................................................................................. 51
Tabela 7. Desempenho individual dos citologistas na realização do pré-escrutínio rápido, da
revisão rápida de 100% e do escrutínio de rotina, quando comparado ao resultado do
diagnóstico final. ...................................................................................................................... 52
Tabela 8. Indicadores de qualidade antes e após realização dos métodos de monitoramento
interno de qualidade.................................................................................................................. 52
LISTA DE ABREVIATURAS
AGC: Células glandulares atípicas de significado indeterminado
ASC-US: Células escamosas atípicas de significado indeterminado, possivelmente não
neoplásicas
ASC-H: Células escamosas atípicas de significado indeterminado, não se pode excluir lesão
de alto grau
CAF: Cirurgia de alta freqüência
CCU: Câncer do colo do útero
DST: Doença sexualmente transmissível
ER: Escrutínio de rotina
HPV: Papiloma vírus humano
HSIL: Lesão intra-epitelial escamosa de alto grau
INCA: Instituto Nacional do Câncer
IP: Índice de Positividade
JEC: Junção escamo-colunar
LAPAC: Laboratório Piloto de Análises Clínicas
LSIL: Lesão intraepitelial escamosa de baixo grau
MIQ: Monitoramento interno da qualidade
NIC 1: Neoplasia intraepitelial cervical grau 1
NIC 2: Neoplasia intraepitelial cervical grau 2
NIC 3: Neoplasia intraepitelial cervical grau 3
PAISM: Programa de Atenção Integral à Saúde da Mulher
PRO-ONCO: Programa de Oncologia
PER: Pré-escrutínio rápido
RCCR: Revisão Baseada em Critérios Clínicos de Risco
RFN: Resultado falso-negativo
RR100%: Revisão rápida de 100% dos esfregaços negativos
R-10%: Revisão aleatória de 10% dos esfregaços negativos
SUS: Sistema Único de Saúde
UFOP: Universidade Federal de Ouro Preto
VPP: Valor preditivo positivo
VPN: Valor preditivo negativo
UBS: Unidade Básica de Saúde
SUMÁRIO
1. Introdução ......................................................................................................................... 133
2. Revisão da Literatura....................................................................................................... 177
2.1 Fatores de risco e epidemiologia do câncer do colo do útero (CCU) ........................... 188
2.2 Exame citopatológico: histórico, conceito, coleta e nomenclaturas para laudos .......... 199
2.3 Histórico de ações para o rastreamento do câncer do colo do útero no Brasil ............. 244
2.4 Controle de qualidade em citopatologia ....................................................................... 288
3. Objetivos .............................................................................................................................. 34
3.1 Objetivo geral ............................................................................................................... 355
3.2 Objetivos específicos .................................................................................................... 355
4. Material e Métodos ............................................................................................................. 36
4.1 Coleta dos esfregaços citopatológicos do colo do útero ............................................... 377
4.2 Avaliação pré-analítica dos esfregaços ......................................................................... 388
4.3 Monitoramento Interno de Qualidade ........................................................................... 399
4.4 Seguimentos dos resultados citopatológicos alterados ................................................. 422
4.5 Análise dos dados ......................................................................................................... 433
5. Resultados ........................................................................................................................... 45
6. Discussão ............................................................................................................................. 53
7. Conclusões ........................................................................................................................... 67
8. Considerações Finais .......................................................................................................... 69
9. Referências .......................................................................................................................... 71
Apêndices................................................................................................................................. 85
Anexos...................................................................................................................................... 94
13
1. INTRODUÇÃO
14
O câncer do colo do útero é o quarto tipo de câncer mais frequente entre as mulheres,
com aproximadamente 527 mil novos casos por ano em todo o mundo (WHO, 2012). No
Brasil, esse é o terceiro tipo de câncer mais incidente, onde as estimativas para os anos de
2016/2017 apontam para ocorrência de 16.340 novos casos (BRASIL, 2015a). É considerado
um grave problema de saúde pública não só no Brasil, mas em diversas regiões do mundo,
principalmente em países em desenvolvimento onde são observadas as maiores taxas de
mortalidade. A alta incidência dessa neoplasia é justificada pela exposição das mulheres a
fatores de risco e pela falta de efetividade dos programas de rastreamento (THULER, 2008).
A redução da incidência e mortalidade pelo câncer do colo do útero é possível com a
detecção precoce das lesões pré-neoplásicas em mulheres assintomáticas, por meio da
realização periódica do exame citopatológico do colo do útero (exame de Papanicolaou),
fundamental em um programa de rastreamento eficiente e organizado. Para tanto, é
indispensável a execução de um conjunto de ações programadas, com população-alvo, faixa
etária e periodicidade entre os exames bem definidas (VALE et al., 2010).
Apesar de o exame citopatológico ser a estratégia mais utilizada para detecção de
lesões precursoras do câncer do colo do útero, sua eficiência ainda é questionada, pois embora
seja realizado repetidas vezes, muitas mulheres ainda são diagnosticadas com o câncer, em
parte devido às altas taxas de resultados falso-negativos (RFN) (KIRSCHNER et al., 2011).
Desde a publicação de uma série de artigos no Wall Street Journal em 1987, onde a
qualidade do exame citopatológico foi questionada, inúmeras estratégias foram elaboradas
para reduzir o impacto negativo sobre o exame, sendo a implantação do controle de qualidade
em laboratório de citopatologia uma das propostas lançadas para reduzir as altas taxas de RFN
(JONES, DAVEY, 2000). Para tanto, medidas de controle da qualidade devem ser
implantadas em todas as fases que envolvem a realização do exame na prática laboratorial, a
fim de garantir que o diagnóstico citológico seja o mais acurado possível (ÁZARA et al.,
2013).
Ainda que existam normas estabelecidas de monitoramento da qualidade dos exames
citopatológicos, a maioria dos laboratórios brasileiros apresenta indicadores de qualidade
abaixo do esperado (BORTOLON et al., 2012). Um estudo recente mostrou que os
laboratórios do estado de Minas Gerais que prestam serviço para o Sistema Único de Saúde
(SUS) na realização de exames citopatológicos não detectam, ou detectam baixos índices de
lesões precursoras do câncer do colo do útero (TOBIAS et al., 2016). Entre esses indicadores,
estão o índice de positividade (IP) e o índice de detecção de lesão de alto grau
Tobias, AHG
Introdução
15
(HSIL/satisfatórios), que quando estão abaixo do recomendado, são indicativos de RFN,
demonstrando a necessidade de medidas de controle interno e a participação dos laboratórios
em programas de controle externo da qualidade (ÁZARA et al., 2014b).
Além de avaliar os indicadores, o monitoramento interno da qualidade (MIQ) permite
que os laboratórios identifiquem as não-conformidades, desde a chegada do material até a
emissão do resultado (BRASIL, 2016). Como parte das ações realizadas pelo MIQ, o
Ministério da Saúde por meio da Portaria 3.388 de 30 de dezembro de 2013, tornou
obrigatório a todos os laboratórios de citopatologia que prestam serviço para o Sistema Único
de Saúde (SUS), a revisão de todos os esfregaços positivos e insatisfatórios associados a
realização de pelo menos um dos seguintes métodos de revisão: revisão aleatória de 10% dos
esfregaços negativos (R-10%); revisão rápida de 100% dos esfregaços negativos (RR100%);
pré-escrutínio rápido de todos os esfregaços (PER) e revisão dos esfregaços selecionados com
base em critérios clínicos de risco (RCCR) (Brasil, 2013b).
A RCCR consiste em revisar esfregaços considerados negativos pelo escrutínio de
rotina (ER), que possuem indicações clínicas relevantes na requisição do exame
citopatológico (HUTCHINSON, 1996; TAVARES et al., 2009). A revisão aleatória de 10%
(R-10%) dos esfregaços classificados como negativo pelo ER é bastante utilizada, apesar de
ter restrições por revisar somente 10% dos exames. Assim como a RCCR, é um método que
tem sido criticado por não ser eficiente em detectar lesões não identificadas pelo ER, por não
mostrar redução das taxas de RFN e por não avaliar o desempenho dos profissionais do ER
(ARBYN et al., 2003; AMARAL et al., 2005; TAVARES et al., 2008b).
A revisão rápida de 100% (RR100%) dos esfregaços consiste em revisar todos os
esfregaços classificados como negativos pelo ER, sendo apontado como um método eficiente
na detecção de RFN (MANRIQUE et al., 2006). Contudo, é um método em que o revisor tem
conhecimento do resultado do ER, uma vez que somente os resultados previamente
classificados como negativos são encaminhados para esta revisão, o que pode tornar o método
tendencioso, reduzindo a concentração do revisor e as chances de detectar erros do ER
(TAVARES et al., 2011).
O pré-escrutínio rápido (PER) é um método que consiste em escrutinar o esfregaço
rapidamente antes do ER e tem sido mencionado como uma ferramenta importante na
melhora da qualidade em citopatologia (DUDDING, RENSHAW, ELLIS, 2011). É um
método que tende a prender mais a atenção do pré-escrutinador, uma vez que é realizado antes
do ER, além de permitir que a sensibilidade de ambos, PER e ER, seja estimada (SMITH et
Tobias, AHG
Introdução
16
al., 2003; RENSHAW, DESCHENES, AUGER, 2009). Por outro lado, o PER pode afetar o
fluxo de trabalho no laboratório, uma vez que avalia todos os esfregaços antes do ER
(REPSE-FOKTER, CAKS-GOLEC, 2009).
Vários estudos que avaliaram o desempenho da R-10%, da RCCR, do PER e da
RR100% como métodos de MIQ mostraram que a R-10% e a RCCR são os métodos menos
sensíveis na detecção de RFN, quando comparados com o PER e com a RR100% (ARBYN et
al., 2003; AMARAL et al., 2005; DJEMLI, KHETANI, AUGER, 2006; TAVARES et al.,
2008b; LEE, LAM, WALKER, 2009; TAVARES et al., 2009). Por outro lado, poucos
estudos compararam o desempenho do PER e da RR100% na mesma população, durante o
escrutínio de rotina em um laboratório de citopatologia do colo do útero (TAVARES et al.,
2011).
Sendo assim, este trabalho avaliou o desempenho do PER e da RR100% como
métodos de monitoramento interno da qualidade dos exames citopatológicos do colo do útero
em um laboratório de citopatologia.
Tobias, AHG
Introdução
17
2. REVISÃO DA LITERATURA
18
2.1 Fatores de risco e epidemiologia do câncer do colo do útero (CCU)
O câncer do colo do útero (CCU) é caracterizado pela replicação desordenada do
epitélio de revestimento da cérvice uterina com comprometimento do estroma e eventual
invasão de estruturas e órgãos adjacentes ou à distância (LIMBERGER et al., 2012). É uma
doença cuja evolução é lenta, apresentando fases pré-invasivas, e, portanto, benignas, que são
detectáveis e curáveis mesmo em mulheres assintomáticas. O período de evolução de uma
lesão cervical inicial para a forma invasiva e, por conseguinte, maligna, pode durar anos e até
décadas (HABLE, 1993). Desta forma, este pode ser considerado o tipo de câncer que
apresenta um dos mais altos potenciais de prevenção e cura quando diagnosticado
precocemente (BRASIL, 2015a).
O CCU é o sétimo tipo de câncer mais incidente no mundo, sendo o diagnóstico mais
comum em mulheres de 45 países (WHO, 2012; BRAY et al., 2012). É de consenso geral que
o rastreamento realizado por meio do exame citopatológico é eficaz na redução da incidência
e da mortalidade por esta neoplasia em países desenvolvidos. Por outro lado, o CCU ainda é a
principal causa de morte por câncer nos países em desenvolvimento, que enfrentam
dificuldades para implementar de maneira eficiente o rastreamento desta neoplasia (FORBES,
JEPSON, MARTIN-HIRSCH, 2002; THULER, 2008; BRAY et al., 2013; ABUDUKADEER
et al., 2015). Contudo observou-se um declínio substancial da mortalidade por CCU nas
últimas quatro décadas em países onde o teste de Papanicolaou foi implantado como forma de
rastreio (DIJKSTRA et al., 2014).
Uma característica importante do CCU é a sua associação, em diversas regiões do
mundo, com o baixo nível socioeconômico, ou seja, com os grupos que têm maior
vulnerabilidade social (THULER, 2008). Nesses grupos se concentram as maiores barreiras
de acesso à rede de serviços para detecção e tratamento precoce da doença e de suas lesões
precursoras, advindas de dificuldades econômicas e geográficas, insuficiência de serviços e
questões culturais (MENDONÇA et al., 2008).
O principal agente associado ao desenvolvimento do CCU é o Papilomavírus Humano
(HPV), um vírus comumente encontrado no trato reprodutivo de mulheres sexualmente ativas,
e cuja infecção persistente pode levar ao surgimento de lesões pré-neoplásicas e até mesmo ao
câncer (RAMA et al., 2008; NAKAGAWA, SCHIRMER, BARBIERI, 2010).
Tobias, AHG
Revisão de Literatura
19
Os papilomavírus foram encontrados em uma grande variedade de vertebrados, mais
de 300 tipos virais já foram identificados e sequenciados, incluindo mais de 200
papilomavírus humanos. Contudo, aproximadamente 15 tipos de HPV são responsáveis por
praticamente todos os cânceres cervicais e suas lesões precursoras em todo o mundo, em
especial os HPVs 16 e 18, ou seja, a progressão das lesões pré-neoplásicas para o carcinoma
invasivo parece estar relacionada, em parte, ao tipo do HPV envolvido na infecção.
Praticamente 100% dos casos de CCU apresentam positividade para HPV de alto risco
(BOUVARD et al., 2009; STANLEY, 2010; PIRAS et al., 2011; EGAWA et al., 2015).
O CCU é evitável quando as lesões pré-neoplásicas são detectadas precocemente.
Neste sentido, a análise citológica é fundamental para detectar e classificar as alterações
celulares encontradas no esfregaço cervical que são fortemente associadas com a persistência
de HPV oncogênico (KONNO et al., 2011).
2.2 Exame citopatológico: histórico, conceito, coleta e nomenclaturas para laudos
O exame citopatológico do colo do útero (ou Papanicolaou) foi apresentado pelo Dr.
George N. Papanicolaou por volta de 1920, quando foi capaz de distinguir células cervicais
normais das alteradas através da observação ao microscópio de esfregaços de secreção
vaginal. Os resultados desta descoberta foram publicados em 1928, contudo, passaram
desapercebidos pela comunidade científica da época. Coincidentemente, Aureli Babes,
patologista romeno, publicou, também em 1928, seu trabalho sobre o diagnóstico de câncer
com a citologia exfoliativa, contudo a técnica de preparação, coloração e análise dos
esfregaços proposta por Babes era muito diferente da proposta de Papanicolaou e, sem
modificações, certamente não poderia ser usada no rastreamento em massa (NAYLOR, 2000;
TAN, TATSUMURA, 2015).
George N. Papanicolaou elaborou novo projeto em parceria com Herbert Traut,
iniciando a Citologia Oncótica Vaginal com a publicação “The diagnostic value of vaginal
smears in carcinoma of the uterus” no American Journal of Obstetrics and Gynecology, em
1941. Essa publicação e a monografia “Diagnosis of uterine câncer by vaginal smear” em
1943 permitiram a expansão e o desenvolvimento da citopatologia, culminando com o
rastreamento citológico para prevenção do CCU, que revelou não somente o grande número
Tobias, AHG
Revisão de Literatura
20
de casos de CCU não detectados na América, mas também que a detecção desta neoplasia
pelo exame citopatológico era prática e possível (NAYLOR, 2000).
Diversas modificações ocorreram desde então de acordo com o conhecimento
adquirido a respeito da evolução natural dessas lesões. Vale ressaltar, porém, que o objetivo
deste exame continua o mesmo, identificar alterações sugestivas de anormalidade e, da
mesma maneira, indicar ações que permitam o diagnóstico preciso e tratamento adequado das
pacientes (CARVALHO, QUEIROZ, 2010).
O exame citopatológico é um procedimento simples, rápido e indolor, sendo a coleta
convencional e em meio líquido os métodos mais utilizados para a confecção dos esfregaços
(ARBYN et al., 2008; BUKHARI et al., 2010).
No Brasil, o Ministério da Saúde recomenda a coleta convencional, que consiste na
coleta de células do colo do útero utilizando a espátula de Ayre, para coleta de células da
ectocérvice e a escova endocervical, para coleta de células da endocérvice, sendo o esfregaço
confeccionado em uma lâmina de vidro com extremidade fosca, onde consta identificação da
paciente. É recomendado iniciar a coleta com a espátula e posteriormente com a escova, pois
isso minimiza contaminação por sangue que eventualmente pode acompanhar o uso da escova
endocervical (BRASIL, 2013a).
Em mulheres na pós-menopausa ou em tratamento cervical excisional prévio, a junção
escamocolunar (JEC) geralmente está localizada no interior do canal endocervical e o orifício
cervical pode ser estreito, sendo recomendado nestes casos o uso da espátula. Amostras
coletadas com o uso em conjunto da espátula de Ayre e da escova endocervical mostraram
qualidade melhor do que as que foram coletadas somente com espátula de Ayre (DAVEY et
al., 2008).
Para realização deste exame é necessário a coleta de células esfoliadas do colo do
útero e exame microscópico destas células após coloração. Este procedimento permite
detectar células anormais e assim avaliar se existe risco de lesão precursora não detectável
clinicamente, para que então, caso necessário, essa mulher possa ser encaminhada para uma
investigação complementar. É por isso que este exame ainda é o escolhido para o screening
ou triagem e prevenção do CCU (ARBYN et al., 2004; DERCHAIN, LONGATTO FILHO,
SYRJÄNEN, 2005; DAVEY et al., 2008).
A primeira nomenclatura em citologia foi criada e introduzida por George N.
Papanicolaou no início dos anos 40 e expressava se as células eram normais ou não, lhes
atribuindo classes de I a V (PAPANICOLAOU, TRAUT, 1997). Reagan introduziu em 1953
Tobias, AHG
Revisão de Literatura
21
a classificação de displasia leve, moderada, severa e carcinoma in situ como lesões
precursoras do carcinoma invasor, em amostras citológicas e histológicas, baseando-se na
espessura do epitélio comprometido pela presença de células alteradas (REAGAN, HICKS,
1953). Posteriormente, Richard propôs o uso da terminologia neoplasia intraepitelial cervical
(NIC), dividida histologicamente em três graus: 1, 2 e 3 (RICHARD, 1990).
Em 1988, na cidade de Bethesda, foi realizado um workshop focado em abordar
questões relacionadas com a grande variabilidade na comunicação de resultados de
citopatologia do colo do útero. O objetivo deste encontro foi estabelecer uma terminologia
que daria limites claros para a gestão dos laudos citopatológicos e reduziria a variabilidade
interobservador, tendo como princípios fundamentais: uma terminologia que comunicasse
uma informação clinicamente relevante do laboratório para o prestador de serviço;
terminologia uniforme e razoavelmente reprodutível entre diferentes patologistas e
laboratórios, porém flexível o suficiente para ser adaptado conforme variações de localizações
geográficas; e uso de uma terminologia que refletisse o entendimento mais atual da neoplasia
cervical. Com base nesses princípios, em 1988, foi aprovada a nomenclatura proposta pelo
Sistema de Bethesda (NATIONAL CANCER INSTITUTE WORKSHOP, 1989; NAYAR,
WILBUR, 2015).
Essa nomenclatura categoriza as amostras em dentro dos limites da normalidade,
alterações celulares benignas e atipias celulares, separando dessa forma, alterações celulares
secundárias associadas a processos inflamatórios e de reparo, daquelas relacionadas às lesões
precursoras de câncer (SOLOMON, NAYAR, 2004).
Ainda em 1988, foram introduzidos os termos lesão intraepitelial escamosa de baixo
grau (LSIL), que compreende alterações celulares associadas ao HPV e a NIC 1 e lesão
intraepitelial escamosa de alto grau (HSIL) que inclui NIC 2 e 3, as verdadeiras precursoras
do câncer do colo do útero, uma vez que acometem células jovens da porção inferior do
epitélio, células essas indiferenciadas, que podem tomar toda espessura do epitélio cervical e
que se não for tratada pode evoluir para o câncer, conforme pode ser visto na Figura 1. Essa
terminologia refletia a compreensão sobre o HPV até a data de sua elaboração. Também foi
incorporado o termo adequabilidade da amostra como um componente obrigatório no laudo, e
por extensão, um importante elemento de garantia de qualidade (AGUIAR et al., 2011;
NAYAR, WILBUR, 2015).
Tobias, AHG
Revisão de Literatura
22
Figura 1. Mudanças na estrutura do tecido associadas à progressão da neoplasia
intraepitelial cervical no epitélio escamoso e à infecção persistente por HPV. Piersma,
2011. (adaptado)
Ao longo dos anos, após experiência com o uso dessa terminologia na prática clínica, e
diante de novos avanços no conhecimento científico, foram realizados novos encontros do
Sistema de Bethesda em 1991 e 2001. Uma das principais recomendações do workshop de
1991 foi o desenvolvimento de critérios para as categorias interpretativas e termos de
diagnóstico e para a determinação da adequação da amostra (NAYAR, WILBUR, 2015).
A terminologia do Sistema de Bethesda introduziu o termo atipia escamosa de
significado indeterminado (ASCUS), e atipia glandular de significado indeterminado (AGUS)
para os casos que não se enquadram nos critérios morfológicos de processo reativo e não se
poder afirmar alteração celular neoplásica. Em 2001, as atipias escamosas e glandulares foram
divididas em subcategorias: células escamosas atípicas de significado indeterminado,
possivelmente não neoplásicas (ASC-US), células escamosas atípicas de significado
indeterminado, nas quais não se pode excluir lesão de alto grau (ASC-H), células glandulares
atípicas de significado indeterminado, sem outras especificações (AGC-SOE) e células
glandulares atípicas de significado indeterminado, possivelmente neoplásicas (AGC-NEO).
Foi introduzida avaliação da adequabilidade da amostra considerada componente de garantia
de qualidade de grande importância do Sistema Bethesda (AGUIAR et al., 2011).
Tobias, AHG
Revisão de Literatura
23
No ano de 2003 o INCA, juntamente com o Ministério da Saúde, publicou a primeira
Nomenclatura Brasileira para Laudos Citopatológicos Cervicais, baseada no Sistema de
Bethesda. Esta nomenclatura foi incorporada pelos laboratórios que prestam serviço ao
Programa Nacional de Controle do Câncer do Colo de Útero e Mama - Viva Mulher, a fim de
padronizar o laudo citopatológico com as respectivas condutas clínicas e manter o controle de
qualidade deste exame principalmente nos laboratórios que prestam serviço para o Sistema
Único de Saúde (SUS) (BRASIL, 2012b).
No ano de 2014 houve uma nova atualização do Sistema de Bethesda, contudo foram
feitas alterações mínimas relacionadas à terminologia. A principal motivação desta
atualização segundo os autores foi fornecer um atlas atualizado, imagens e conteúdo
adicional, que refletisse a experiência continuada e mudanças na prática clínica ao longo dos
últimos anos. Uma das mudanças foi a descrição do achado de células endometriais no
esfregaço, que anteriormente era relatado no laudo em pacientes acima de 40 anos, porém esta
nova versão recomenda esse relato em pacientes acima de 45 anos (NAYAR, WILBUR,
2015).
O uso dessas classificações além de fornecer uma terminologia padronizada e
orientações para gestão clínica reflete as diferenças biológicas entre os diferentes graus de
lesões, diferenças essas que norteiam as condutas clínicas de mulheres acometidas por
alterações citopatológicas (INCE, AYDIN, PEKER, 2011).
Segundo o Ministério da Saúde o exame citopatológico deve ser realizado com
intervalo de três anos, após dois exames negativos com intervalo anual. O início da coleta
deve ser aos 25 anos de idade para mulheres que já iniciaram atividade sexual e deve
prosseguir até os 64 anos, e só deve ser interrompido quando após essa idade as mulheres
apresentarem dois exames negativos consecutivos nos últimos cinco anos (BRASIL, 2011a).
O Ministério da Saúde ainda faz recomendações quanto ao seguimento de pacientes
que tiveram diagnóstico alterado pelo exame citopatológico. Mulheres com diagnóstico de
ASC-US abaixo de 30 anos de idade devem repetir o exame após 12 meses, enquanto as
mulheres acima de 30 anos devem repetir a citologia após 6 meses. Mulheres com diagnóstico
de ASC-H devem ser encaminhadas às unidades secundárias para colposcopia, e somente
aquelas que apresentam alterações colposcópicas são submetidas à biópsia, sendo que as
demais devem repetir a citologia após 6 meses. Na presença do diagnóstico de células
glandulares atípicas (AGC) ou células atípicas de origem indefinida a paciente deve ser
imediatamente encaminhada para colposcopia, onde faz-se a biópsia quando são observadas
Tobias, AHG
Revisão de Literatura
24
alterações, caso não sejam visualizadas alterações, faz-se nova citologia. Em mulheres com
diagnóstico de LSIL, sugere-se repetir o exame citopatológico após 6 meses, com indicação
de colposcopia caso a atipia se mantenha. Mulheres com diagnóstico de HSIL devem ser
encaminhadas para realização de colposcopia em até três meses após o resultado, e caso haja
presença de alterações faz-se a biópsia, caso contrário recomenda-se nova citologia após três
meses a contar da data da coleta da citologia anterior (BRASIL, 2011a).
De posse destas recomendações percebe-se a importância do seguimento adequado, a
fim de efetivamente prevenir que mulheres com lesões pré-neoplásicas venham a desenvolver
o carcinoma invasor do colo do útero.
2.3 Histórico de ações para o rastreamento do câncer do colo do útero no Brasil
Até meados do século XX somente mulheres com acesso a exames ginecológicos
frequentes conseguiam o diagnóstico precoce do câncer do colo do útero, pois até então não
havia um método de prevenção. A partir da década de 1940, com o desenvolvimento da
citologia esfoliativa (Papanicolaou) como forma de detecção precoce da doença, esse cenário
se modificou (LOWY, 2010).
No Brasil, no final dos anos 1960 e início da década de 1970 o modelo centrado em
consultórios relacionado apenas à detecção precoce do CCU e no uso combinado da
colposcopia e da citologia, começa a conviver com campanhas ou programas de prevenção
baseados no rastreamento de casos em uma população alvo, a partir do uso em grande escala
do exame citopatológico (TEIXEIRA, PORTO, SOUZA, 2012).
A partir disso diversos programas foram lançados pelo Ministério da Saúde (MS) e
pelo Instituto Nacional de Câncer (INCA) a fim de melhorar o atendimento das mulheres, a
qualidade dos exames realizados e promover informações necessárias sobre o CCU. O
Programa de Atenção Integral à Saúde da Mulher (PAISM) foi criado em 1984 e previa a
ampliação de campanhas educativas pelo serviço básico e atividades de prevenção do CCU. A
principal contribuição desse programa foi a introdução e estimulação da coleta de material
para o exame citopatológico como procedimento de rotina da consulta ginecológica
(CORRÊA, VILLELA, 2008).
Em 1987 foi criado o Programa de Oncologia (PRO-ONCO), que estabeleceu a
expansão da prevenção e controle dos quatro tipos de câncer de maior incidência no país na
Tobias, AHG
Revisão de Literatura
25
época: colo uterino, mama feminina, boca e próstata (LOPES et al., 1994). Contudo as
estimativas mostravam que a porcentagem das mulheres brasileiras que faziam regularmente o
teste de Papanicolaou permanecia muito baixa nos anos 1980, sendo que muitas continuavam
a ser diagnosticadas com CCU em estágio já avançado, incurável (TEIXEIRA, PORTO,
SOUZA, 2012).
Nessa época, a consciência do papel de HPV na gênese das neoplasias cervicais e a
nova definição desta neoplasia como uma doença infecciosa, sexualmente transmitida,
favoreceu o reconhecimento do CCU como um problema de Saúde Pública (TEIXEIRA,
LOWY, 2011).
A partir de um estudo piloto que, posteriormente, subsidiou o Programa Nacional de
Controle do Câncer do Colo do Útero, criou-se o Programa Viva Mulher, implantado pelo
INCA entre Janeiro de 1997 e Junho de 1998 (ROBERTO NETO et al., 2001). O programa
foi criado com o objetivo de reduzir a mortalidade e as repercussões físicas, psíquicas e
sociais do câncer do colo do útero e de mama, ofertando serviços para prevenção e detecção
em estágios iniciais, tratamento e reabilitação. Houve ampliação do acesso das mulheres
brasileiras ao exame citopatológico, priorizando as mulheres sob maior risco e garantindo o
acolhimento e o tratamento adequado da doença e das lesões precursoras em 100% dos casos
(CORRÊA, VILLELA, 2008; KATZ et al., 2010; TEIXEIRA, PORTO, SOUZA, 2012).
No ano de 1998, por meio da Portaria n. 79/88, o Brasil tomou medidas para garantia
da qualidade dos exames citopatológicos, ao incluir o procedimento de controle de qualidade
do exame citopatológico cérvico-vaginal na tabela de remuneração do SUS, além de
recomendar a prática de revisão de pelo menos 10% dos esfregaços por outro observador. Esta
Portaria também estabeleceu que os laboratórios que prestavam serviço para o SUS deveriam
obrigatoriamente participar do Monitoramento Externo da Qualidade (MEQ), que consistia
em realizar uma nova leitura do esfregaço por laboratório diferente daquele que realizou a
primeira leitura, sendo que os gestores estaduais e municipais deveriam gerenciar o programa
acompanhando os laboratórios participantes (FREITAS, THULER, 2012). Neste mesmo ano
MS instituiu o Programa Nacional de Combate ao Câncer do Colo do Útero. A coordenação
do Programa foi transferida para o INCA por meio da Portaria GM/MS nº 788/99, de 23 de
junho de 1999. Foi também nesse ano que se instituiu o Sistema de Informação do Câncer do
Colo do Útero (SISCOLO) como componente estratégico no monitoramento e gerenciamento
das ações (BRASIL, 2011a).
Tobias, AHG
Revisão de Literatura
26
O Departamento de Informática do SUS (DATASUS) em parceria com o Instituto
Nacional de Câncer (INCA) desenvolveram o Sistema de Informação do Câncer do Colo do
Útero (SISCOLO). Esse sistema foi implantado em janeiro de 2000, com objetivo de
armazenar dados sobre identificação da mulher, informações demográficas, epidemiológicas e
dos exames citopatológicos e histopatológicos realizados pelo SUS. O sistema também
subsidia o pagamento destes exames e propicia avaliação dos serviços e programas de
controle e assistência do CCU, além de possibilitar a coleta de informação para pesquisas
(GIRIANELLI, THULER, SILVA, 2009).
No ano de 2005, o MS lançou através da Portaria GM2439/2005, a Política Nacional
de Atenção Oncológica, em que o controle dos cânceres de colo do útero e mama passou a ser
previstos nos planos estaduais e municipais de saúde e foi sugerida a avaliação a curto, médio
e longo prazo das ações de vigilância em saúde. Neste mesmo ano, em consequência da
criação desta Portaria, foi criado o Plano de Ação para o Controle dos Cânceres de Colo e de
Mama/2005-2007, que propôs seis diretrizes estratégicas: aumento de cobertura da populaçãoalvo, garantia da qualidade, fortalecimento do sistema de informação, desenvolvimento de
capacitações, estratégia de mobilização social e desenvolvimento de pesquisas (BRASIL,
2005).
No ano de 2006, o compromisso com o combate e controle do CCU foi reafirmado
com o Pacto pela Vida, através da criação de indicadores e metas a serem atingidas pelos
estados e municípios, de acordo com as taxas de incidência em cada região, a fim de se
alcançar 80% de cobertura do exame citopatológico (BRASIL, 2006).
Em 2010, foi publicado o Plano de Ação para Redução da Incidência e Mortalidade
por Câncer do Colo do Útero. Esta publicação continha as conclusões do grupo de trabalho
estabelecido pela Portaria 310/2010, as propostas de ações formuladas e o cronograma das
atividades a serem desenvolvidas no ano de 2010 que visavam colocar em prática as ações
propostas. O principal ponto discutido foi a necessidade de melhorar as informações
concernentes ao seguimento das mulheres com alterações citológicas diagnosticadas. Uma vez
que o SISCOLO fazia apenas gestão do exame e não da mulher usuária do SUS, não era
possível identificar as mulheres que nunca foram rastreadas ou repetições realizadas com
periodicidade não recomendada, ou verificar a realização do acompanhamento das mulheres
com resultado positivo no exame citopatológico. Com relação a qualidade do exame
citopatológico oferecido pelos laboratórios que prestam atendimento no âmbito do SUS, após
a Portaria SPS/SAS nº 92 de 16/10/2001, verificou-se adesão dos laboratórios ao
Tobias, AHG
Revisão de Literatura
27
Monitoramento Interno da Qualidade (MIQ). Porém o MEQ, de responsabilidade das
coordenações estaduais, não havia sido implantado em todo país (BRASIL, 2010).
Após a avaliação do Programa Nacional de Controle do Câncer do Colo do Útero, foi
lançado em março de 2011 o Plano Nacional de Fortalecimento da Rede de Prevenção,
Diagnóstico e Tratamento do Câncer. Este Plano visava o fortalecimento do Programa
Nacional de Controle do Câncer do Colo do Útero buscando corrigir os problemas
encontrados através da concretização das propostas de ações elaboradas. As propostas
formuladas a partir da identificação dos problemas foram divididas em 5 eixos, onde podemos
destacar o Eixo 1, que objetivava o fortalecimento das ações de prevenção, diagnóstico e
tratamento do câncer de colo de útero. O componente 3 deste eixo tratava da gestão da
qualidade em citopatologia, e propunha cinco ações, entre elas promover a implantação do
Programa de MIQ e MEQ como garantia de qualidade do exame citopatológico (BRASIL,
2011b).
O eixo 5 deste plano prevê a melhoria dos sistemas de informação e vigilância do câncer,
possibilitando assim o desenvolvimento do Sistema de Informação do Câncer (SISCAN),
sistema de informações que integra e substitui os sistemas oficiais de informação dos
Programas Nacionais de Controle do Câncer do Colo do Útero e de Mama (SISCOLO e
SISMAMA). Esse sistema avança na capacidade de fornecer subsídios para a avaliação dos
serviços que executam os procedimentos referentes ao rastreamento do câncer do colo do
útero e de mama, no planejamento das ações de controle, na organização da rede de
assistência para diagnóstico e tratamento, na avaliação de necessidade de capacitações e no
acompanhamento dos usuários com exames alterados (BRASIL, 2013c).
Tendo em vista a garantia da qualidade dos processos desde a coleta até a emissão do
laudo e o segmento dado a paciente com alterações citológicas, foram elaboradas diversas
publicações destinadas a uniformizar a prestação de serviço oferecida pelo SUS. O “Caderno
de atenção básica – Controle dos cânceres de colo do útero e mama” foi elaborado com a
finalidade de orientar a atenção às mulheres, subsidiando tecnicamente os profissionais da
Atenção Básica em saúde através da disponibilização de conhecimentos atualizados, que
possibilitasse a esses profissionais a tomada de condutas adequadas em relação ao controle do
câncer do colo do útero (BRASIL, 2013a).
Em 2011 foram lançadas as “Diretrizes para rastreamento do câncer do colo do útero”,
que buscaram contribuir de forma significativa para as boas práticas clínicas em todo o país
quanto ao seguimento de exames citopatológicos alterados através de recomendações mais
Tobias, AHG
Revisão de Literatura
28
custo-efetivas (BRASIL, 2011a). Em 2012, foi publicado “Manual de Gestão da Qualidade
para Laboratório de Citopatologia” voltado especificamente para melhoraria da qualidade e
confiabilidade dos exames citopatológicos, com recomendações para implantação e/ou
implementação dos monitoramentos interno e externo de qualidade à rotina laboratorial. Em
2016 foi publicada uma nova edição deste manual, a fim de atualizá-lo e adequá-lo à Portaria
n.3.388 de 30 de dezembro de 2013 (BRASIL, 2016).
2.4 Controle de qualidade em citopatologia
A garantia da qualidade em um laboratório pode ser definida como monitoramento
contínuo de todas as atividades que envolvem os aspectos da função laboratorial, que incluem
a administração de pessoal, os procedimentos operacionais e o controle de qualidade. Sendo
assim, é necessário o desenvolvimento de métodos de checagem que assegurem ao laboratório
níveis aceitáveis de acurácia e confiabilidade dos laudos liberados, melhorando a
sensibilidade do exame na detecção de alterações escamosas e glandulares, diminuindo assim
os RFN (FERRAZ et al., 2005; MICHELOW, MCKEE, HLONGWANE, 2006; PAJTLER et
al., 2006; RENSHAW, 2009; SIEGL et al., 2014; EFLSTROM et al., 2015). Detectar, corrigir
e reduzir deficiências do processo de produção dentro do laboratório proporcionam o
aperfeiçoamento de procedimentos laboratoriais e minimizam a ocorrência de erros
diagnósticos (COLLAÇO et al., 2005; GOLDIE et al., 2005; BRITO-SILVA et al., 2014).
Apesar do exame citopatológico ser o método mais utilizado para o rastreamento do
CCU, desde o início da década de oitenta há uma série de críticas relacionadas a alta
proporção de resultados falso-negativos, que variam de 2% a 62%. As principais causas são
atribuídas a erros na coleta de material, no escrutínio do esfregaço ou na interpretação dos
diagnósticos (ATTWOOD et al., 1985; KOSS, 1989; BOSCH, RIETVELD-SCHEFFERS,
BOON, 1992; MITCHEL, MEDLEY, DRAKE, 1995; FRANCO et al., 2006; AMARAL et
al., 2008; GULLO et al., 2012; BRANCA, LONGATTO-FILHO, 2015).
Coleta do material, processamento técnico, análise dos esfregaços citopatológicos,
seguimentos das mulheres com exame citopatológico alterado e controle de qualidade são
consideradas ações básicas para o bom funcionamento de um programa de prevenção do CCU
(THULER, ZARDO, ZEFERINO, 2007; COLLAÇO, ZARDO, 2008).
As medidas de MIQ dos exames citopatológicos do colo do útero na fase pré-analítica
contemplam o registro do material recebido, a preparação, a coloração e a montagem das
Tobias, AHG
Revisão de Literatura
29
lâminas, a manutenção dos equipamentos e microscópios, bem como os registros de
informações de pessoal, sua qualificação e seu treinamento (BRASIL, 2016).
Na fase analítica o monitoramento tem como objetivo reduzir os resultados falsonegativos e falso-positivos, causados por erros de escrutínio ou de interpretação do resultado,
e prover meios para o laboratório assegurar o melhor serviço possível (TAVARES et al.,
2008a).
Na fase pós-analítica, é importante que o laboratório monitore continuamente seus
resultados, avaliando tanto o desempenho global, quanto o individual de seus profissionais.
Cada um deve ter uma análise estatística individual dos resultados dos exames citopatológicos
anormais realizados e comparados com o desempenho do laboratório em geral. Se houver
uma porcentagem alta inexplicável de um resultado específico, a avaliação do desempenho é
obrigatória (ÁZARA et al., 2014a; BRASIL, 2016). Neste sentido, o monitoramento interno
da qualidade (MIQ) em citopatologia visa a realização de exames com alto nível de
confiabilidade, mantendo sempre as boas condições do material.
Vários métodos de MIQ foram desenvolvidos a fim de minimizar os erros do
escrutínio e de interpretação do diagnóstico citopatológico, dentre eles a revisão aleatória de
10% dos esfregaços negativos pelo escrutínio de rotina (R-10%), a revisão baseada em
critérios clínicos de risco (RCCR), a revisão rápida de 100% dos esfregaços negativos
(RR100%) e o pré-escrutínio rápido (PER) (BRASIL, 2016).
A R-10% consiste em revisar aleatoriamente 10% dos esfregaços classificados como
negativos pelo escrutínio de rotina. É um método bastante utilizado, no entanto, parece não
ser o mais eficiente na detecção de lesões não identificadas pelo escrutínio de rotina. Uma
restrição da R-10% é exatamente revisar somente 10% dos esfregaços negativos, o que torna o
método alvo de muitas críticas (AMARAL et al., 2005; FERRAZ et al., 2005; MANRIQUE et
al., 2007; TAVARES et al., 2008b, 2011). A RCCR consiste em revisar os esfregaços
classificados como negativos pelo ER que tenham indicações clínicas relevantes relatadas
pelo profissional responsável pela coleta, que podem estar associadas com maior risco para
neoplasias intraepiteliais ou carcinoma invasivo do colo do útero (BRASIL, 2016). Contudo
tanto a RCCR quanto a R-10% têm se mostrado ineficazes para avaliar o desempenho do
escrutínio de rotina, além de não se mostrarem eficientes na detecção de RFN (AMARAL et
al., 2005; TAVARES et al., 2008b).
A revisão rápida de 100% (RR100%) consiste em escrutinar rapidamente todos os
esfregaços considerados negativos pelo ER, durante 30 a 120 segundos. Após essa rápida
Tobias, AHG
Revisão de Literatura
30
revisão todos os esfregaços considerados suspeitos são submetidos a uma revisão detalhada
para então se definir um diagnóstico final (FARAKER, 2001; MANRIQUE et al., 2011). Este
método de revisão foi descrito pela primeira vez em 1957 com o objetivo inicial de substituir
o método padrão de escrutínio, porém só em 1990 este método ficou conhecido ao ser
utilizado como uma ferramenta no controle interno de qualidade no Reino Unido (TAVARES
et al., 2007). Outros países da Europa e Austrália e América do Norte também utilizam a
RR100% na garantia da qualidade em citopatologia (CLARKE et al., 2008). Os resultados de
uma meta-análise realizada por Arbyn e Schenck (2000) mostraram que a RR100% é um
método eficiente que apresenta boa relação custo benefício como garantia interna da
qualidade quando comparado à R-10%. Outros trabalhos comparando métodos de revisão
concluíram que a RR100% detecta significativamente mais RFN do que a R-10% ou a RCCR
(AMARAL et al., 2005; FERRAZ et al., 2005; MANRIQUE et al., 2006).
O pré-escrutínio rápido (PER) é uma técnica que proporciona melhoria da qualidade e
que simultaneamente pode medir com precisão a sensibilidade e especificidade tanto do
citologista quanto do desempenho global do laboratório de citologia, uma vez que detecta
erros antes do diagnóstico final, melhorando assim a sensibilidade global do laboratório na
detecção de lesões precursoras (DUDDING, 2001; TAVARES et al., 2008a; KANBER,
CHARBONNEAU, AUGER, 2015).
Este método consiste em pré-escrutinar todos os
esfregaços rapidamente antes do ER, utilizando o tempo de 1 a 2 minutos. O fato de o
esfregaço ser pré-escrutinado antes do ER torna o trabalho mais interessante para o
citologista, dado que o número de alterações presentes é maior, uma vez que todos os
esfregaços são avaliados pelo método (TAVARES et al., 2007). Além disso, apesar desta
metodologia apresentar sensibilidade menor do que o ER, o ato de realizar uma pré-triagem
dos esfregaços pode possibilitar maior detecção de RFN do que a revisão rápida de 10%
(RENSHAW, 2009).
Uma parte significativa do controle de qualidade em citopatologia do colo do útero
relaciona-se a atribuição de limites de carga de trabalho por citologista dentro do laboratório,
levando-se em consideração que o citologista possui outras tarefas diárias no laboratório além
da leitura de rotina, e em alguns países esse limite diário é regulamentado, contudo a maneira
como esses limites são definidos é pouco clara (DESCHENES, RENSHAW, AUGER, 2008).
No Brasil, não existe uma determinação legal quanto ao número de lâminas diárias a serem
avaliadas. Em 1988, o INCA juntamente com a Sociedade Brasileira de Citopatologia e a
Sociedade Brasileira de Patologia definiram um limite diário de 100 lâminas por citotécnico.
Tobias, AHG
Revisão de Literatura
31
O Manual de Gestão da Qualidade para Laboratório de Citopatologia sugere que este número
não ultrapasse o limite máximo de 70 lâminas por profissional em uma jornada de trabalho de
8 horas, independente se esse número se refere somente a leitura de rotina, ou a leitura de
rotina mais a realização dos métodos de monitoramento interno da qualidade (BRASIL,
2016).
De acordo com o Manual de Gestão da Qualidade para Laboratório de Citopatologia e
com a Portaria Qualicito, é indispensável em um sistema de monitoramento da qualidade o
uso dos indicadores de qualidade que permitam comparar a situação atual com metas préestabelecidas, sendo capaz de avaliar o laboratório como um todo e o desempenho de
determinadas etapas do processo de trabalho. Dessa forma, é possível acompanhar o
comportamento do indicador após a realização de alguma intervenção para a melhoria do
processo, para monitorar a atividade (BRASIL, 2016; BRASIL, 2013b).
O índice de positividade expressa a prevalência de alterações celulares nos exames e a
sensibilidade do processo do rastreamento em detectar lesões na população examinada. Outro
indicador é o percentual de exames compatíveis com ASC entre os exames satisfatórios. As
ASC compõem um caso de dúvida diagnóstica, no qual os achados citológicos são
insuficientes para o diagnóstico definitivo. Valores elevados desse indicador sugerem
problemas na amostra, na análise laboratorial ou em ambas as fases e representa um ônus para
a mulher e para a rede assistencial, pois acarreta a necessidade da oferta de um maior número
de exames destinados à repetição para melhor investigação diagnóstica (BRASIL, 2016).
O percentual de exames compatíveis com ASC entre os exames alterados é um
indicador que deve ser analisado em conjunto com o índice de positividade, pois mesmo
quando este apresenta valores aparentemente dentro do recomendado, pode conter um elevado
percentual de exames compatíveis com ASC, que representa casos de dúvida diagnóstica
(BORTOLON et al., 2012).
A razão ASC/SIL, permite identificar o baixo desempenho profissional no
rastreamento e frente a valores muito altos é necessário que seja determinada a causa desse
resultado e ainda, pode ser necessário rever os critérios citológicos (BRASIL, 2016).
O indicador de percentual de exames compatíveis com lesão intraepitelial escamosa de
alto grau (HSIL) mede a capacidade de detecção de lesões precursoras do CCU (BRASIL,
2016).
Garantindo-se a confiabilidade do resultado citopatológico, faz-se necessário também
que a mulher receba seu laudo e faça o seguimento adequado de acordo com a alteração
Tobias, AHG
Revisão de Literatura
32
detectada. Porém, um dos maiores problemas enfrentado pelo programa de rastreamento e
controle do CCU é a falta de seguimento dado às mulheres depois que realizam o exame
citopatológico e também a orientação errônea por parte dos profissionais de saúde quanto aos
procedimentos que devem ser realizados frente a um resultado citológico alterado
(ALBUQUERQUE, 2012). Assim, é de fundamental importância garantir a qualidade do
programa de rastreamento e seguimento das pacientes, pois é através de um tratamento
adequado que o curso desse câncer poderá ser interrompido, garantindo que a mulher não
desenvolva esta neoplasia (SANTOS, 2013).
O estímulo ao processo de trabalho integrado entre a rede básica e o centro de
referência, com a constituição de equipes responsáveis pelo cuidado das pacientes, pode
contribuir para que a gestão das mesmas seja realizada com melhor desempenho do programa
de prevenção. A inclusão do acesso ao centro de referência no conjunto da atenção à saúde da
mulher na rede local de saúde também pode contribuir para a maior adesão das pacientes ao
seguimento, sanando um dos grandes obstáculos enfrentados na prevenção do CCU que é o
abandono das pacientes ao tratamento e/ou seguimento (SANTIAGO, ANDRADE, 2003).
O aumento da realização do exame citopatológico pela população feminina não é
suficiente para garantir a redução da mortalidade. Para o sucesso do programa de
rastreamento é necessário que as mulheres examinadas recebam tratamento adequado. Há
evidências de que uma quantidade significativa de mulheres que são encaminhadas para
avaliação colposcópica, não chega a realizá-la e que o sistema de saúde também não é
eficiente para controlar adequadamente esse serviço. Além disso, o eficiente controle do CCU
está diretamente relacionado com a qualidade do sistema de saúde, que além de identificar as
mulheres que precisam fazer controle, deve garantir diagnóstico correto e tratamento preciso,
além de acesso fácil e ágil aos serviços, flexibilidade para marcar e remarcar consultas e
rapidez no atendimento (RIBEIRO, 2004; ZEFERINO, 2008; AMARAL et al., 2014).
Além de garantir um tratamento adequado, o seguimento da paciente permite que seja
realizada a correlação entre citologia e histologia, que tem sido apontada como um dos
indicadores para medir e garantir a qualidade dos diagnósticos citológicos dos laboratórios de
citopatologia envolvidos com programas de prevenção do CCU (SHIRATA et al., 2009).
Neste sentido, a correlação cito-histológica também pode ser utilizada para avaliar o
desempenho dos métodos de MIQ. Alguns estudos avaliaram o desempenho da RR100%
comparando o resultado do exame citopatológico ao resultado do exame histopatológico
mostrando que 81% das alterações de alto grau identificadas pela RR100% na rotina de
Tobias, AHG
Revisão de Literatura
33
exames citopatológicos são confirmadas pelo resultado histopatológico de seguimento como
lesões de alto grau (CLARKE et al., 2008). Em outro estudo, 83% das lesões de alto grau
identificadas pela RR100% tiveram seguimento com biópsia, sendo que destes 80% foram
confirmados como carcinoma de células escamosas pelo resultado histopatológico (SOOD,
SINGH, 2009).
Considerando o PER, Dudding, Renshaw e Ellis (2011) avaliaram o desempenho deste
método utilizando o resultado do exame histopatológico. Este estudo mostrou que o PER
identificou 156 casos alterados na citologia, sendo que destes o seguimento histopatológico
confirmou positividade em 50 (32%) casos. Outro estudo avaliou o desempenho do PER e da
RR100% onde o PER mostrou melhor desempenho do que a RR100% quando comparado
com os resultados dos exames histopatológicos e do novo exame citopatológico de mulheres
com resultado citopatológico alterado (TAVARES et al., 2014).
A detecção precoce das lesões pré-neoplásicas é primordial em programas de
prevenção do CCU que utilizam o exame citopatológico como ferramenta de rastreio
populacional, contudo as altas taxas de RFN são um importante problema enfrentado pelos
laboratórios de citopatologia na detecção destas lesões e a prática do MIQ nestes laboratórios
se torna assim medida indispensável para contornar tal situação. Várias evidências têm
apontado o bom desempenho do PER e da RR100% na detecção de RFN em laboratórios de
citopatologia e a avaliação de ambos os métodos simultaneamente no mesmo grupo amostral
pode fornecer informações relevantes para avaliação do desempenho de cada um dos
métodos.
Tobias, AHG
Revisão de Literatura
34
3. OBJETIVOS
35
3.1 Objetivo geral
Avaliar o desempenho do pré-escrutínio rápido e da revisão rápida de 100% como
métodos de monitoramento interno da qualidade em laboratório de citopatologia do colo do
útero.
3.2 Objetivos específicos
- Comparar o resultado do pré-escrutínio rápido, do escrutínio de rotina e da revisão rápida de
100% com o resultado do diagnóstico final;
- Determinar a frequência dos resultados citopatológicos alterados antes e após a realização do
pré-escrutínio rápido e da revisão rápida de 100%;
- Determinar a frequência de resultados falso-negativos do escrutínio de rotina identificados
pelo pré-escrutínio rápido e pela revisão rápida de 100%, confirmados pelo diagnóstico final;
- Avaliar o desempenho do pré-escrutínio rápido, do escrutínio de rotina e da revisão rápida
de 100% quando comparado ao resultado do diagnóstico final;
- Avaliar o desempenho do pré-escrutínio rápido, do escrutínio de rotina e da revisão rápida
de 100% quando comparado aos resultados do exame citopatológico de seguimento e do
exame histopatológico;
- Verificar o volume de trabalho e o tempo gasto na realização do pré-escrutínio rápido e da
revisão rápida de 100%;
- Avaliar o desempenho dos citologistas no escrutínio de rotina, na realização do préescrutínio rápido e da revisão rápida de 100% quando comparados ao resultado do diagnóstico
final;
- Avaliar os indicadores de qualidade antes e após a realização dos métodos de
monitoramento interno da qualidade.
Tobias, AHG
Objetivos
36
4. MATERIAL E MÉTODOS
37
Este trabalho foi desenvolvido no setor de citologia do Laboratório Piloto de Análises
Clínicas (LAPAC) da Escola de Farmácia da Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP) e
aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da UFOP, nº 527.582 (Anexo 1). Para a
realização desta pesquisa, contou-se com o apoio de 4 citologistas, 2 bolsistas, 1 técnica e 1
assistente administrativa e com a infraestrutura do laboratório, que dispunha de um
microscópio Olympus BX41 de 5 observadores, para discussão de casos.
O LAPAC atende uma rotina de exames citopatológicos encaminhados pelas Unidades
Básicas de Saúde (UBS) do município de Ouro Preto, MG. Este foi um estudo transversal
cuja casuística se baseou em 9.675 esfregaços citopatológicos do colo do útero recebidos pelo
laboratório no período de outubro de 2012 a outubro de 2014.
4.1 Coleta dos esfregaços citopatológicos do colo do útero
A coleta do material para confecção dos esfregaços do colo do útero para realização do
exame citopatológico foi realizada nas UBS de Ouro Preto por profissionais treinados e
qualificados. O material para coleta do esfregaço como espátula de Ayre, escova
endocervical, espéculo, luvas e lâmina eram fornecidas pela Secretaria Municipal de Saúde do
município. Para fixação e transporte dos esfregaços das UBS até o laboratório o setor de
citologia forneceu frascos porta lâminas contendo álcool, todos numerados. Foi oferecido de
forma regular treinamentos para aperfeiçoamento da coleta e preenchimento correto dos
formulários de requisição de exame citopatológico. Tais treinamentos foram ministrados pelos
citologistas da seção de citologia do LAPAC. O município apresenta considerável
rotatividade de enfermeiros, porém, sempre que um novo profissional era recebido pela UBS
novo treinamento para coleta convencional dos esfregaços era oferecido.
Foi preconizado que o material colhido fosse dispensado sobre uma lâmina de
extremidade fosca, previamente identificada com as iniciais e data de nascimento da paciente,
conforme recomendações do MS (BRASIL, 2013a). A fixação era realizada imediatamente
após a confecção do esfregaço, o qual era acondicionado em frasco porta lâmina devidamente
identificado juntamente com a ficha de requisição (Anexo 2). Os frascos eram colocados em
sacos plásticos lacrados e as fichas de requisições em pastas plásticas, ambos identificados
com o nome da UBS, que posteriormente enviavam o material para o setor de citologia do
LAPAC, por meiodo transporte fornecido pela secretaria de saúde do município.
Tobias, AHG
Material e Métodos
38
4.2 Avaliação pré-analítica dos esfregaços
Para a avaliação pré-analítica, foi verificado se os esfregaços enviados para o setor de
citologia estavam devidamente identificados e dentro dos padrões e critérios de aceitação para
análise. Para tal avaliação foram levados em conta os seguintes critérios, conforme
recomendado pelo Ministério da Saúde (BRASIL, 2012a):
- Identificação correta da lâmina (iniciais do nome da paciente e data de nascimento);
- Identificação da lâmina e do frasco coincidente com a requisição;
- Lâmina não danificada e acondicionada adequadamente;
- Requisição com todos os dados preenchidos.
Foi verificado se a requisição de exame citopatológico continha todos os dados de
identificação das mulheres, data da coleta da amostra e nome do profissional de saúde
responsável pela coleta. Foi também verificado o preenchimento dos dados da anamnese e os
dados do exame clínico. Ademais, sintomas e alterações do colo visualizadas durante a coleta
poderiam ser registrados na requisição, conforme orientado durante os treinamentos.
Do total de 9.675 esfregaços recebidos, 357 juntamente com as requisições que não
estavam conformes com os critérios recomendados pelo Ministério da Saúde foram rejeitados
e devolvidas para as UBS de origem com uma solicitação de correção e ajuste das nãoconformidades detectadas. Foi encaminhado junto com o material rejeitado um parecer
esclarecendo o motivo da rejeição, de acordo com as recomendações do MS (BRASIL,
2012a).
Um total de 9.318 esfregaços estavam em condições adequadas para a análise e foram
incluídos neste estudo. Todos os esfregaços receberam um número de registro do laboratório,
bem como suas respectivas requisições, e em seguida as requisições foram encaminhadas para
um pré-cadastro no banco de dados do laboratório, a fim de manter um controle de
recebimento de todo o material. Após o registro das informações e a identificação dos
esfregaços, os mesmos foram encaminhados ao setor de coloração e montagem, onde foram
corados pelo método de Papanicolaou e em seguida montados com Entellan e lamínula
(BRASIL, 2012a).
Por fim, os esfregaços foram encaminhados para análise microscópica juntamente com
suas respectivas requisições.
Tobias, AHG
Material e Métodos
39
4.3 Monitoramento Interno de Qualidade
Além do ER foram realizados os métodos de monitoramento internos da qualidade, o
PER e a RR100%, conforme observado na Figura 2. Para estas etapas contou-se com a
participação de três citologistas, os quais eram especialistas em citologia clínica, com
experiência de dois a três anos na análise do exame citopatológico do colo do útero. Estes três
citologistas não tinham experiência prévia na realização dos métodos de MIQ, porém, antes
do início da pesquisa receberam treinamento para correta aplicação dos métodos. Cada etapa,
ER, PER e RR100% foi analisada às cegas, intercaladas entre os três os citologistas, de tal
forma que cada esfregaço era analisado por pelo menos três vezes.
Os esfregaços classificados como positivos e insatisfatórios pelo ER e os suspeitos
identificados pelo PER e pela RR100%, foram revisados detalhadamente por um quarto
citologista, com mais de 15 anos de experiência na realização do exame citopatológico, para a
definição do diagnóstico final.
Inicialmente todos os esfregaços citopatológicos da rotina foram submetidos ao PER,
os quais foram escrutinados rapidamente, utilizando a objetiva de 10x do microscópio óptico,
durante um tempo médio de 60 a 90 segundos para percorrer todo o esfregaço. Foi utilizada a
técnica de escrutínio rápido Whole ou Turrent (MONTEMOR et al., 2006). Os resultados do
PER foram classificados como suspeito, negativo ou insatisfatório e registrados na planilha de
PER (Apêndice A).
Em seguida os esfregaços foram submetidos ao ER, que consistiu na análise de todos
os campos do esfregaço em tempo médio de 5 a 10 minutos, utilizando as objetivas de 10x e
40x do microscópio óptico. Para esta avaliação o citologista tinha em mãos a requisição de
exame citopatológico (Anexo 2) e classificou os resultados de acordo com a nomenclatura
brasileira para laudos citopatológicos, baseada no Sistema de Bethesda 2001, conforme Figura
3 (SOLOMON, NAYAR, 2004; BRASIL, 2012b).
Logo após o ER, todos os esfregaços classificados como negativos foram submetidos a
RR100% e analisados utilizando a objetiva de 10x do microscópio óptico, durante um tempo
médio de 60 a 90 segundos para percorrer todo o esfregaço. Assim como no PER, também foi
utilizada a técnica de escrutínio rápido Whole ou Turrent (MONTEMOR et al., 2006). Os
resultados da RR100% foram classificados como suspeitos, negativos ou insatisfatórios e
registrados na planilha de RR100% (Apêndice B).
Tobias, AHG
Material e Métodos
40
Todos os esfregaços considerados positivos e insatisfatórios pelo ER foram registrados
na planilha de revisão de resultados positivos e insatisfatórios (Apêndice C) e encaminhados
para a revisão detalhada para confirmação ou não da alteração e definição do diagnóstico
final. Quando a revisão detalhada concordava com o resultado do ER, este era considerado o
diagnóstico final. Nos casos em que a revisão detalhada não concordava com o resultado do
ER havia um consenso entre todos os citologistas para a definição do diagnóstico final.
Os esfregaços considerados suspeitos e insatisfatórios pelo PER ou pela RR100% e
que o ER classificou como negativo, foram separados, registrados na planilha de resultados
discordantes (Apêndice D), e encaminhados para revisão detalhada. Quando o resultado da
revisão detalhada era classificado como negativo, concordando com o resultado do ER, este
era considerado como diagnóstico final. Os esfregaços classificados como positivos na
revisão detalhada, eram discutidos em uma reunião de consenso entre os citologistas para
definir o diagnóstico final.
Todos os esfregaços suspeitos pelo PER ou pela RR100%, confirmados como
positivos pelo diagnóstico final e que foram classificados como negativos pelo ER, foram
considerados como RFN.
O desempenho do PER, da RR100% e do ER foram calculados em comparação com o
resultado do diagnóstico final.
Para evitar a fadiga dos citologistas foi recomendado um limite diário de leitura de 70
lâminas (BRASIL, 2012), incluindo os esfregaços do ER, do PER ou da RR100%.
Para avaliação do desempenho individual de cada citologista na realização dos
métodos de MIQ e do ER foram confeccionadas três planilhas para controle de leitura dos
esfregaços: uma planilha de controle de leitura do PER (Apêndice E), uma da RR100%
(Apêndice F) e uma do escrutínio de rotina (Apêndice G), em que cada citologista registrava o
número das amostras por ele avaliada.
Uma vez que na realização do PER e da RR100% são consumidos, em média, 90
segundos para avaliação de cada esfregaço, em uma hora era realizado o escrutínio rápido de
aproximadamente 40 esfregaços. Para cálculo do volume de trabalho e do tempo gasto para
realização de cada método foi considerado o total de esfregaços rapidamente escrutinados e o
total de esfregaços que foram revistos devido a suspeita pelo PER ou pela RR100%.
Tobias, AHG
Material e Métodos
41
Exames citopatológicos
recebidos para análise
Amostras
Rejeitadas
Negativo
Suspeito
Insatisfatório
Escrutínio de
Rotina(ER)
Positivas e
Insatisfatórias
Revisão
detalhada
Discordante
Concordante
Pré-escrutínio
Rápido (PER)
Reunião de
Consenso
Diagnóstico Final
Negativo
Suspeito
Insatisfatório
Negativas
Revisão Rápida de
100% (RR100%)
Esfregaços suspeitos
ou insatisfatórios no
PER e na RR100%
Revisão
detalhada
Concordante
Esfregaços
negativos no PER
e na RR100%
Discordante
Reunião de
Consenso
Diagnóstico Final
Figura 2. Procedimento técnico operacional para leitura dos exames citopatológicos.
Tobias, AHG
Material e Métodos
42
Sistema de Bethesda 2001
Interpretação dos resultados
Insatisfatório para análise
Negativo para lesão intra-epitelial ou malignidade
Anormalidades de células epiteliais
Células escamosas
 Células escamosas atípicas
• de significado indeterminado (ASC - US)
• não é possível excluir lesão de alto grau (ASC - H)
 Lesão intra-epitelial escamosa de baixo grau (LSIL)/(abrangendo HPV/displasia leve/NIC 1)
 Lesão intra-epitelial escamosa de alto grau (HSIL)/(abrangendo: displasia moderada e grave, CIS; NIC 2 e NIC 3)
 Lesão intra-epitelial escamosa de alto grau (HSIL)/(com características suspeitas de invasão)
 Carcinoma de células escamosas
Células glandulares
 Atípicas (AGC - SOE)
• células endocervicais (sem outras especificações)
• délulas endometriais (sem outras especificações)
• células glandulares (sem outras especificações)
 Atípicas (AGC - NEO)
• células endocervicais, possivelmente neoplásicas
• células glandulares, possivelmente neoplásicas
 Adenocarcinoma endocervical in situ
 Adenocarcinoma
• endocervical
• do endométrio
• extra-uterino
• sem outras especificações (SOE)
Outros tumores malignos
Figura 3. Classificação dos resultados dos exames citopatológicos do colo do útero conforme
Sistema de Bethesda 2001. Solomon, Nayar, 2004 (adaptado).
4.4 Seguimentos dos resultados citopatológicos alterados
Foi realizado levantamento do seguimento de todas as pacientes com resultado
citopatológico classificado com alguma alteração atípica ou pré-maligna identificada pelo
escrutínio de rotina ou como RFN detectados pelo PER e/ou pela RR100%, confirmados pelo
diagnóstico final, conforme preconizado pelo MS. Para os exames cujos resultados foram
classificados como ASC-US ou LSIL, foi realizada a busca do resultado do novo exame
citopatológico, uma vez que a conduta preconizada é a repetição do exame citopatológico no
período de seis meses a um ano. Para os exames cujos resultados foram classificados como
ASC-H ou pior diagnóstico, foi realizado o levantamento do resultado do exame
histopatológico conforme Figura 4, uma vez que a conduta preconizada é o encaminhamento
para colposcopia e biópsia (BRASIL, 2011a).
Tobias, AHG
Material e Métodos
43
Para realização deste levantamento, foram agendadas visitas aos profissionais
responsáveis pela coleta do exame citopatológico, nas UBS, e que fazem o acompanhamento
dessas pacientes. Durante a visita foi utilizada uma lista contendo o nome das pacientes
daquela unidade que haviam sido diagnosticadas com alguma alteração citológica e o
profissional responsável pela coleta do preventivo, verificou junto aos prontuários das
pacientes, o seguimento que foi adotado em cada caso. Contudo, durante essas visitas foi
constatado que as UBS possuíam poucos registros do seguimento dessas pacientes, e por isso,
foram adotadas outras estratégias para levantamento desses dados.
Portanto, foi agendada visita ao Centro Viva Vida em Itabirito, que é o centro de
referência para atenção secundária do município de Ouro Preto, a fim de levantar os dados
referentes ao seguimento das pacientes encaminhadas para acompanhamento de ASC-H e
lesões intraepiteliais escamosas de alto grau. Também foi realizada busca de seguimento das
mulheres de Ouro Preto na Secretaria Estadual de Saúde de Minas Gerais. Outro recurso
utilizado foi o levantamento destes seguimentos em um Laboratório de Citopatologia e
Anatomia Patológica, que atende pacientes encaminhadas pelo Centro Viva Vida.
Para levantamento do novo exame citopatológico, também foi realizada pesquisa nos
registros do próprio LAPAC, uma vez que desde 2013 este é o único laboratório do município
que presta serviço para o SUS na realização dos exames citopatológicos do colo do útero.
4.5 Análise dos dados
Após elaboração do banco de dados com as variáveis a serem estudadas, a análise foi
realizada através do programa OpenEpi, versão 3, que é uma calculadora online de código
aberto, disponível no endereço: http://www.openepi.com/DiagnosticTest/DiagnosticTest.htm.
Foram calculados a sensibilidade, especificidade, com seus respectivos intervalos de
confiança de 95%, assim como o valor preditivo positivo (VPP) e valor preditivo negativo
(VPN) dos métodos de MIQ (PER e RR100%), do ER e do desempenho individual de cada
citologista (Apêndice H). Foi realizado o cálculo da área sob a curva ROC de ambos os
métodos de MIQ e este resultado foi submetido ao teste qui quadrado para verificar se havia
diferença estatisticamente significativa entre o desempenho do PER e da RR100%. Estes
cálculos foram realizados utilizando o programa Stata10.0.
Tobias, AHG
Material e Métodos
44
A comparação entre os diagnósticos citológicos alterados confirmados pelo
diagnóstico final e também dos indicadores de qualidade antes e após realização do PER e da
RR100% foi computada por meio da variação percentual relativa (VPR=[valor final - valor
inicial]*100 / valor inicial). Para avaliar o desempenho dos métodos de MIQ e do ER foi
considerado o diagnóstico final, o resultado do novo exame citopatológico e do exame
histopatológico. Em especial para cálculo do desempenho do PER e da RR100% na detecção
de RFN foram utilizados somente os esfregaços considerados negativos pelo escrutínio de
rotina e que após a revisão detalhada, por terem sido suspeitos pelo PER ou pela RR100%,
foram classificados como positivos pelo diagnóstico final.
Os indicadores de qualidade foram calculados de acordo com as fórmulas presentes no
Manual de Gestão da Qualidade para Laboratório de Citopatologia (BRASIL, 2012a):
Índice de Positividade: (valor de referência: entre 3 e 10%)
Nº de exames alterados em determinado local e ano x 100
Total de exames satisfatórios
Percentual de exames compatíveis com ASC entre os exames satisfatórios: (valor de
referência: entre 4 a 5 %)
Nº de exames com ASC-US e ASC-H x 100
Total de exames satisfatórios
Percentual de exames compatíveis com ASC entre os exames alterados: (valor de referência:
menor que 60%)
Nº de exames com ASC-US e ASC-H x 100
Total de exames alterados
Razão ASC/SIL: (valor de referência: não superior a 3)
Nº de ex. compatíveis com ASC-US e ASC-H
No de exames com LSIL e HSIL
Percentual de exames compatíveis com lesão intraepitelial escamosa de alto grau (HSIL):
(valor de referência: maior que 0,4%)
N° de exames HSIL x 100
Total de exames satisfatórios
Tobias, AHG
Material e Métodos
45
5. RESULTADOS
46
O PER foi realizado em 9.318 esfregaços e suspeitou de 1.437, considerou 19
insatisfatórios e 7.862 negativos. Em seguida o ER foi realizado nestes 9.318 esfregaços e
classificou 1.135 como positivos, 15 como insatisfatórios e 8.168 como negativos. A
RR100% foi realizada nos 8.168 esfregaços classificados como negativos pelo ER e suspeitou
de 507 esfregaços, considerou 14 insatisfatórios e 7.647 negativos, conforme pode ser
observado na Figura 4.
Positivo (2/10,5%)
Insatisf atório (6/31,6%)
Negativo (11/57,9%)
Positivo (618/7,9%)
Insatisf atório (15/0,2%)
Negativo (7.229/91,9%)
Suspeito
(1.437/15,4%)
Diagnóstico f inal
Positivo (647/45,0%)
Insatisf atório (2/0,1%)
Negativo (788/54,9%)
Insatisf atório
(19/0,2%)
Pré-escrutínio
Rápido (PER)
(9.318/100%)
Negativo
(7.862/84,4%)
Positivos (1.135) e
Insatisf atórios (15)
(1.150/12,3%)
Escrutínio de
Rotina (ER)
(9.318/100%)
Diagnóstico f inal
Negativos
(8.168/87,7%)
Positivo
(1.054/91,6%)
Insatisf atório
(13/1,1%)
Negativo
(83/7,2%)
Revisão Rápida de
100% (RR100%)
(8.168/87,7%)
Suspeito
(507/6,2%)
Insatisf atório
(14/0,2%)
Negativo
(7.647/93,6%)
Diagnóstico f inal
Positivo (123/24,3%)
Insatisf atório (1/0,2%)
Negativo (383/75,5%)
Positivo (0)
Insatisf atório (5/35,7%)
Negativo (9/64,3%)
Positivo (90/1,2%)
Insatisf atório (4/0,1%)
Negativo (7.553/98,7%)
Figura 4. Resultado geral da avaliação do pré-escrutínio rápido, do escrutínio de rotina e da
revisão rápida de 100%, de acordo com o diagnóstico final.
Tobias, AHG
Resultados
47
Dentre os 1.437 esfregaços em que o PER suspeitou de alguma alteração, o
diagnóstico final classificou apenas 647 como positivos e destes 122 foram classificados
como ASC-US, 417 como LSIL, 32 como ASC-H, 71 como HSIL e cinco como AGC. Dos
507 esfregaços em que a RR100% suspeitou de alguma alteração, o diagnóstico final
classificou 51 como ASC-US, 56 como LSIL, 11 como ASC-H, três como HSIL e 2 como
AGC. O ER classificou 1.135 esfregaços como positivos, contudo após revisão detalhada o
diagnóstico final classificou 1.054 como positivos e 81 como negativos. Após revisão
detalhada de todos os esfregaços classificados como positivos pelo ER e suspeitos pelo PER e
pela RR100%, o diagnóstico final classificou 1.267 (13,6%) esfregaços como positivos, sendo
301 ASC-US, 769 LSIL, 95 ASC-H, 85 HSIL e 17 AGC, conforme pode ser observado na
Tabela 1.
Tabela 1. Resultado detalhado da avaliação do pré-escrutínio rápido, do escrutínio de rotina e
da revisão rápida de 100%, confirmados pelo diagnóstico final.
Diagnóstico Final
Pré-escrutínio rápido
Insatisfatório
Negativo
ASC-US
LSIL
ASC-H
HSIL
AGC
n
n
n
n
n
n
n
Total
Insatisfatório
6
11
0
1
1
0
0
19
Suspeito
2
788
122
417
32
71
5
1.437
Negativo
15
7.229
179
351
62
14
12
7.862
Total
23
8.028
301
769
95
85
17
9.318
Insatisfatório
Negativo
ASC-US
LSIL
ASC-H
HSIL
AGC
n
n
n
n
n
n
n
Insatisfatório
5
9
0
0
0
0
0
14
Suspeito
1
383
51
56
11
3
2
507
Negativo
4
7.553
49
32
7
1
1
7.647
Total
10
7.945
100
88
18
4
3
8.168
Insatisfatório
Negativo
ASC-US
LSIL
ASC-H
HSIL
AGC
n
n
n
n
n
n
n
Insatisfatório
13
2
0
0
0
0
0
15
Negativo
10
7.945
100
88
18
4
3
8.168
ASC-US
0
55
192
189
14
1
1
452
LSIL
0
9
8
483
0
5
1
506
ASC-H
0
9
1
6
59
6
0
81
HSIL
0
2
0
3
2
66
0
73
AGC
0
6
0
0
2
3
12
23
Total
23
8.028
301
769
95
85
17
9.318
Revisão Rápida de 100%
Escrutínio de Rotina
Total
Total
ASC-US: Células escamosas atípicas, possivelmente não neoplásicas; ASC-H: Células escamosas atípicas, não
podendo excluir lesão de alto grau; LSIL: Lesão intraepitelial de baixo grau; HSIL: Lesão intraepitelial de alto
grau; AGC: Células glandulares atípicas de significado indeterminado.
Tobias, AHG
Resultados
48
A idade das mulheres com diagnóstico citológico alterado confirmado pelo
diagnóstico final variou de 15 a 89 anos. Dentre as mulheres com diagnóstico citológico de
ASC-US/LSIL, 20,3% estavam na faixa etária abaixo de 25 anos e 79,7% acima de 25 anos.
A Tabela 2 mostra a frequência de resultados citopatológicos alterados antes e após a
realização dos métodos de monitoramento interno da qualidade. O ER detectou 1.054 (11,3%)
resultados alterados confirmados pelo diagnóstico final. A frequência de resultados alterados
aumentou para 12,8% e 12,6% quando o resultado do ER foi associado aos métodos de PER e
da RR100%, respectivamente. O ER mostrou ganho de 13,3% na detecção de alterações
citológicas com a associação do PER e de 11,5% com a associação da RR100%. A VPR
mostrou que o ER teve ganho de 38,1% no diagnóstico de ASC-US com associação do PER.
Tabela 2. Frequência de resultados citopatológicos alterados antes e após realização dos
métodos de monitoramento interno da qualidade, confirmados pelo diagnóstico final.
Resultados
Escrutínio de Rotina
citológicos
n
201
77
681
81
14
%
2,1
0,8
7,3
0,9
0,2
Escrutínio de Rotina
+ Pré-escrutínio
rápido
n
%
270
2,9
86
0,9
738
7,9
84
0,9
16
0,2
VPR
%
Escrutínio de Rotina
+ Revisão rápida
de100%
n
%
252
2,7
88
0,9
737
7,9
84
0,9
16
0,2
VPR
%
28,6
12,5
8,2
0
0
ASC-US
38,1
ASC-H
12,5
LSIL
8,2
HSIL
0
AGC
0
Todos de
1.054
11,3
1.194
12,8
13,3
1.177
12,6
11,5
alterados
Nota: VPR: Variação Percentual Relativa; ASC-US: Células escamosas atípicas, possivelmente não neoplásicas;
ASC-H: Células escamosas atípicas, não podendo excluir lesão de alto grau; LSIL: Lesão intraepitelial de baixo
grau; HSIL: Lesão intraepitelial de alto grau; AGC: Células glandulares atípicas de significado indeterminado.
A Tabela 3 mostra a frequência de RFN identificados pelos métodos de MIQ. O PER
foi responsável pela detecção do maior número deles. O diagnóstico de ASC-US representa a
maior parte dos RFN detectados pelo PER, enquanto que a RR100% detectou maior
frequência de LSIL.
Tobias, AHG
Resultados
49
Tabela 3. Frequência de resultados citopatológicos falso-negativos identificados pelos
métodos de pré-escrutínio rápido e de revisão rápida de 100%, confirmados pelo diagnóstico
final.
Resultados citológicos/
ASC-US
Métodos de MIQ
n
%
PER
69
RR100%
51
Somente pelo PER
ASC-H
LSIL
HSIL
AGC
Positivo
n
%
n
%
n
%
n
%
n
%
0,7
9
0,1
57
0,6
3
0,03
2
0,02
140
1,5
0,5
11
0,1
56
0,6
3
0,03
2
0,02
123
1,3
49
0,5
7
0,1
32
0,3
1
0,01
1
0,01
90
1,0
Somente pela RR100%
31
0,3
9
0,1
31
0,3
1
0,01
1
0,01
73
0,8
Pelos dois métodos
20
0,2
2
0,02
25
0,3
2
0,02
1
0,01
50
0,5
Diagnóstico final
100
1,1
18
0,2
88
0,9
4
0,04
3
0,03
213
2,3
ASC-US: Células escamosas atípicas, possivelmente não neoplásicas; ASC-H: Células escamosas atípicas, não
podendo excluir lesão de alto grau; LSIL: Lesão intraepitelial de baixo grau; HSIL: Lesão intraepitelial de alto
grau; AGC: Células glandulares atípicas de significado indeterminado.
A sensibilidade do PER e do ER quando comparada ao diagnóstico final foi de 48,2%
(IC: 45,6 - 50,9) e 83,2% (IC: 81,0 - 85,2), respectivamente. O PER apresentou sensibilidade
de 65,7% e a RR100% apresentou sensibilidade de 57,8% na detecção de RFN, conforme
observado na Tabela 4. O PER mostrou área sob a curva ROC de 0.6906 e a RR100% de
0.6884, sendo que o teste de qui quadrado para estes resultados mostrou valor-p de 0.9201. A
RR100% apresentou VPP de 23,6%, enquanto o PER apresentou VPP de 15,3%.
Tabela 4. Desempenho do pré-escrutínio rápido, da revisão rápida de 100% e do escrutínio de
rotina, quando comparado ao resultado do diagnóstico final.
Resultados
Revisão Rápida de
100%
57,8 (51,0 - 64,2)
Escrutínio de Rotina
Sensibilidade
Pré-escrutínio
Rápido
65,7 (59,1 - 71,8)
Especificidade
90,2 (89,6 - 90,9)
95,0 (94,5 - 95,4)
99,0 (98,8 - 99,2)
Valor Preditivo Positivo
15,3 (13,1 - 17,8)
23,6 (20,2 - 27,4)
92,9 (89,9 - 94,2)
Valor Preditivo Negativo
99,0 (98,7 - 99,2)
98,8 (98,6 - 99,0)
97,4 (97,0 - 97,7)
83,2 (81,0 - 85,2)
Nota: Os valores de sensibilidade e especificidade foram expressos em porcentagem. Intervalo de confiança de
95% entre parênteses.
Das 1.070 mulheres com resultados citológicos de ASC-US e LSIL confirmados pelo
diagnóstico final, 882 foram detectados pelo ER e 188 foram RFN detectados pelos métodos
de MIQ, sendo que 668 (62,5%) mulheres realizaram novo exame citopatológico. Destas,
553(62,3%) se referiam ao seguimento de alterações detectadas pelo ER e 115 (61,2%) se
referiam ao seguimento de RFN detectados pelo PER e/ou pela RR100%.
Das 553 mulheres com resultado citopatológico prévio de ASC-US/LSIL identificados
pelo ER, 222 apresentaram resultado do novo exame citopatológico alterado: em 200
Tobias, AHG
Resultados
50
mulheres a alteração de ASC-US/LSIL persistiu e em 22 mulheres o resultado do novo exame
citopatológico foi de ASC-H ou lesões mais graves (ASC-H/+). A sensibilidade do ER na
detecção de ASC-US/LSIL quando comparado ao novo exame citopatológico foi de 85,7%.
Das 115 mulheres com resultado citopatológico prévio de ASC-US/LSIL identificados
apenas pelos métodos de MIQ, 37 apresentaram resultado do novo exame citopatológico
alterado: 26 foram identificados como alterados pelo PER no exame citopatológico prévio e
20 pela RR100%. A sensibilidade do PER e da RR100% quando comparado ao novo exame
citopatológico foi de 70,3% e 54,0%, respectivamente (Tabela 5).
Tabela 5. Desempenho do escrutínio de rotina, do pré-escrutínio rápido e da revisão rápida de
100% na detecção de ASC-US/LSIL, quando comparado ao resultado do novo exame
citopatológico.
Resultados dos
métodos de
monitoramento interno
da qualidade (MIQ)
Escrutínio de Rotina
Resultado do novo exame citopatológico
Negativo
ASC-US/LSIL
ASC-H/+
Total
ASC-US/LSIL
331 (59,8%)
200 (36,2%)
22 (4,0%)
553 (100,0%)
Negativo
78 (67,8%)
32 (27,8%)
5 (4,4%)
115 (100,0%)
Total
409 (61,2%)
232 (34,8%)
27 (4,0%)
668 (100%)
Sensibilidade
85,7 (80,9 - 89,5)
Especificidade
19,1 (15,6 - 23,2)
Pré-escrutínio Rápido
Suspeito
50 (65,8%)
22 (28,9%)
4 (5,3%)
76 (100,0%)
Negativo
28 (71,8%)
10 (25,6%)
1 (2,6%)
39 (100,0%)
Total
78 (67,8%)
32 (27,8%)
5 (4,4%)
115 (100%)
Sensibilidade
Revisão Rápida de
100%
Suspeito
70,3 (54,2 - 82,5)
48 (70,6%)
18 (26,5%)
2 (2,9%)
68 (100,0%)
Negativo
30 (63,8%)
14 (29,8%)
3 (6,4%)
47 (100,0%)
Total
78 (67,8%)
32 (27,8%)
5 (4,4%)
115 (100%)
Especificidade
36,0 (26,2 - 47,0)
Sensibilidade
54,0 (38,4 - 69,0)
Especificidade
38,5 (28,5 - 49,6)
Nota: Os valores de sensibilidade e especificidade foram expressos em porcentagem. Intervalo de confiança de
95% entre parênteses. ASC-US: Células escamosas atípicas, possivelmente não neoplásicas; ASC-H: Células
escamosas atípicas, não podendo excluir lesão de alto grau; LSIL: Lesão intraepitelial de baixo grau; HSIL:
Lesão intraepitelial de alto grau; AGC: Células glandulares atípicas de significado indeterminado.
Dentre as 197 mulheres com diagnóstico de ASC-H/+ confirmados pelo diagnóstico
final, 172 foram identificadas pelo ER e 25 foram RFN detectados pelos métodos de MIQ.
Apenas 63 (32%) realizaram biópsia, sendo que 53 apresentaram resultado do exame
histopatológico alterado, em que 50 (29%) foram identificados como alterado pelo ER e 3
Tobias, AHG
Resultados
51
(12%) pelos métodos de MIQ. Devido ao número reduzido de seguimentos, não foi possível
calcular o desempenho do ER e dos métodos de MIQ comparado ao exame histopatológico.
A Tabela 6 mostra o número de horas que foram necessárias para a execução de cada
método de MIQ. Foram necessárias 364.05 horas para escrutinar rapidamente todos os 9.318
esfregaços e revisar aqueles considerados suspeitos pelo PER. A RR100% necessitou de
276.6 horas para escrutinar rapidamente os 8.168 esfregaços e revisar aqueles que considerou
suspeito.
Tabela 6. Volume de trabalho e tempo gasto de revisão entre o pré-escrutínio rápido e a
revisão rápida de 100%.
Número de esfregaços rapidamente
escrutinados
Número de esfregaços suspeitos
Número de esfregaços confirmados pelo
diagnóstico final
Tempo médio gasto para escrutínio
rápido por esfregaço (segundos)
Total de horas gastas para escrutínio
rápido
Total de horas gastas para revisão
detalhada
Total de horas gastas pelos métodos de
monitoramento interno de qualidade
Diferença no tempo gasto por cada um
dos métodos (%)
Pré-escrutínio
Rápido (PER)
Revisão Rápida de 100%
(RR100%)
9.318
8.168
1.437
507
646
123
90
90
232.95
204.2
131.1
72.4
364.05
276.6
56,8
43,2
A Tabela 7 mostra o desempenho individual na realização do PER da RR100% e do
ER. O citologista 1 realizou o PER, o ER e a RR100% em 3.098, 3.117 e 2.753 esfregaços; o
citologista 2 em 3.117, 3.103 e 2.648; e o citologista 3 em 3.103, 3.098 e 2.767 esfregaços,
respectivamente. O citologista 1 apresentou melhor desempenho na realização do PER e da
RR100%, com sensibilidade de 63,7% e 73,0%, respectivamente. O citologista 2 apresentou
baixo desempenho na realização da RR100%, com sensibilidade de 23,7%. O citologista 3
apresentou melhor desempenho na realização do ER, com sensibilidade de 87,6%.
Tobias, AHG
Resultados
52
Tabela 7. Desempenho individual dos citologistas na realização do pré-escrutínio rápido, da
revisão rápida de 100% e do escrutínio de rotina, quando comparado ao resultado do
diagnóstico final.
Método/Citologistas
Sensibilidade
Especificidade
Citologista 1
63,7 (59,2 – 67,9)
84,6 (83,2 – 85,9)
Citologista 2
48,4 (43,6 – 53,2)
91,0 (89,9 – 92,0)
Citologista 3
38,8 (34,1 – 43,8)
94,1 (93,2 – 94,9)
Citologista 1
73,0 (61,9 – 81,8)
92,7 (91,6 – 93,6)
Citologista 2
23,7 (14,7 – 36,0)
97,8 (97,2 – 98,3)
Citologista 3
68,8 (57,9 – 77,9)
94,6 (93,7 – 95,4)
Citologista 1
80,3 (76,2 – 83,9)
99,3 (99,0 – 99,5)
Citologista 2
80,7 (76,5 – 84,4)
98,6 (98,1 – 99,0)
Pré-escrutínio rápido
Revisão rápida de 100%
Escrutínio de rotina
Citologista 3
87,6 (84,3 – 90,3)
99,0 (98,5 – 99,3)
Nota: Os valores de sensibilidade e especificidade foram expressos em porcentagem. Intervalo de confiança de
95% entre parênteses.
O índice de positividade do ER foi de 11,3% e esse valor oscilou entre 12,6 com a
RR100% (VPR=11,5%) e 12,8% com o PER (VPR=13,2%). O percentual de HSIL entre os
exames satisfatórios foi de 0,9% tanto antes quanto após realização dos métodos de MIQ,
conforme observado na Tabela 8.
Tabela 8. Indicadores de qualidade antes e após realização dos métodos de monitoramento
interno de qualidade.
Indicadores de qualidade
Índice de Positividade
11,3
Escrutínio
de Rotina +
PER
12,8
13,2
Escrutínio
de Rotina +
R100%
12,6
ASC/Satisfatório
3,0
3,8
26,6
3,6
20,0
ASC/Alterado
Razão ASC/SIL
26,4
29,8
12,9
28,8
9,1
0,4
0,4
0
0,4
0
HSIL/Satisfatório
0,9
0,9
0
0,9
0
Escrutínio de
Rotina
VPR (%)
VPR (%)
11,5
Nota: PER: Pré-escrutínio Rápido; RR100%: Revisão Rápida de 100%; VPR: Valor Percentual Relativo;
ASC/Satisfatório (%): Percentual de exames compatíveis com ASC entre os exames satisfatórios (%);
ASC/Alterado (%): Percentual de exames compatíveis com ASC entre os exames alterados; HSIL (%):
Percentual de exames compatíveis com lesão intraepitelial escamosa de alto grau (HSIL).
Tobias, AHG
Resultados
53
6. DISCUSSÃO
54
Os resultados deste trabalho mostraram que o PER detectou maior número de RFN
dentre os esfregaços classificados como negativos pelo escrutínio de rotina, contudo, não
houve diferença significativa no desempenho do PER e da RR100%, quando comparados ao
diagnóstico final.
Ao avaliar o desempenho do PER e da RR100% alguns estudos mostraram que o PER
foi responsável pela detecção do maior número de RFN (DJEMLI, KHETANI, AUGER,
2006; TAVARES et al., 2011; TAVARES et al., 2014). Contudo, também existem relatos que
corroboram com o achado deste trabalho, em que a sensibilidade entre o PER e a RR100% na
detecção de alterações citológicas não identificadas pelo ER foram semelhantes (ARBYN et
al., 2003).
Dentre os esfregaços considerados suspeitos pelo PER e pela RR100%, 55% e 75%,
respectivamente, foram classificados como negativos pelo diagnóstico final. O PER é um
método que pré-escrutina todos os esfregaços antes do escrutínio de rotina e ainda que
suspeite de muitos casos que após a revisão detalhada sejam classificados como negativos, é
capaz de detectar atipias e lesões pré-neoplásicas não detectadas pelo escrutínio de rotina
(TAVARES et al., 2009). Embora um número maior de esfregaços classificados como
suspeito pela RR100% tenham sido considerados negativos pelo diagnóstico final, este
método de revisão rápida também foi capaz de detectar alterações não identificadas pelo
escrutínio de rotina, contribuindo assim, na melhora do desempenho do exame citopatológico.
Em 7,9% e 1,2% dos casos em que o PER e a RR100%, respectivamente,
classificaram os esfregaços como negativos, o diagnóstico final os classificou como positivos.
Mais de 80% das alterações não detectadas pelo PER e pela RR100% corresponderam a ASCUS e LSIL. Essas alterações são menos evidentes durante o escrutínio de rotina, sendo
responsáveis pela maior parte dos casos de variabilidade interobservadores (YUNES-DIAS et
al., 2015). Os critérios morfológicos celulares são a base para o diagnóstico citológico,
entretanto nem sempre as anormalidades morfológicas são suficientemente distintas a ponto
de rápida identificação, podendo estar presente em raras células do esfregaço e ser passível de
confusão com alterações benignas celulares (KEATING, INCE, CRUM, 2001). Neste sentido,
a educação continuada pode ser ferramenta importante para uniformização de critérios
citomorfológicos, principalmente no que diz respeito aos diagnósticos limítrofes (TAVARES
et al., 2009; BRANCA, LONGATTO-FILHO, 2015).
As taxas de RFN identificadas pelo PER e pela RR100% foram de 1,5% e 1,3%,
respectivamente. Tavares et al. (2007) avaliaram o desempenho do PER e observaram que
Tobias, AHG
Discussão
55
2.15% dos esfregaços alterados confirmados pelo diagnóstico final foram detectados somente
pelo PER. Manrique et al. (2009) avaliaram 3.149 esfregaços e verificaram que 1,3% dos
resultados positivos confirmados pelo diagnóstico final foram detectados pela RR100%. Em
um total de 2.954 esfregaços, 2.568 foram classificados como negativos pelo ER e foram
submetidas a RR100%, que detectou 34 esfregaços alterados, demonstrando uma taxa de
1,15% de RFN identificados pelo método (MATTOSINHO et al., 2005). O desempenho do
PER e da RR100% foram avaliados em 11.245 esfregaços do colo do útero, em que o PER
detectou 1.8% e a RR100% 1.15% dos resultados falso-negativos, resultados próximos
daqueles encontrados nesse trabalho (TAVARES et al., 2011). Estes resultados demonstram
que a realização do PER e da RR100% auxilia na detecção de RFN (JENSEN, DYBDAHL,
SVANHOLM 2000; BROOK, DUDDING, SUTTON, 2002; WILSON, MOLYNEUX, 2004;
GUPTA et al., 2004, PAJTLER et al., 2006; MICHELOW, MCKEE, HLONGWANE, 2006).
As lesões de menor gravidade, ASC-US e LSIL, foram as mais freqüentes entre os
RFN identificados pelos métodos de MIQ. Rao, Nayal e Patil (2015) relataram que a RR100%
identificou com sucesso 1.77% das alterações citopatológicas, em que 1,15% correspondiam a
ASC-US, 0,37% a LSIL e 0,03% a HSIL, mostrando melhor desempenho na detecção de
lesões menores. Repse-Fokter e Caks-Golec (2009) avaliaram o desempenho do PER em
2.521 esfregaços e verificaram que 25 (1,0%) foram RFN detectados somente pelo PER, dos
quais 15 eram ASC-US, 8 LSIL e 2 HSIL, mostrando também melhor desempenho na
detecção de lesões e atipias de baixo grau.
Neste estudo 20,3% das mulheres com diagnóstico de ASC-US/LSIL tinham abaixo de
25 anos e 79,7% tinham mais de 25 anos. Com base no fato e na correlação com doença de
baixa gravidade para a maioria das mulheres com diagnóstico de ASC-US e LSIL, uma
conduta conservadora, pouco invasiva, é recomendável (SCHIFFMAN et al, 2007). Mesmo
para aquelas mulheres acima dos 40 anos com diagnóstico de lesões de menor gravidade, o
encaminhamento para a colposcopia deve ser determinado somente nos casos em que esse
resultado seja mantido. Alguns países recomendam a utilização do teste de identificação para
HPV oncogênico que, caso positivo, é critério para encaminhamento para colposcopia.
Todavia essa proposta não se aplica à realidade brasileira, em função do alto custo do teste no
mercado e pelo fato de que a repetição do exame citopatológico cumpre o objetivo de
identificar as mulheres que realmente precisam de colposcopia (RUSSOMANO,
MONTEIRO, MOUSINHO, 2008).
Tobias, AHG
Discussão
56
Dentre os 18 casos de ASC-H detectados como RFN confirmados pelo diagnóstico
final, 6 estavam associados a esfregaços atróficos. Da mesma forma 2 dos 4 casos de HSIL
detectados pelos métodos de MIQ também estavam associados a atrofia com inflamação, que
por vezes são de difícil análise e interpretação (SAAD et al., 2006). Nestes casos, o ideal seria
acompanhar o seguimento destas pacientes, pois o resultado da colposcopia e biópsia podem
auxiliar no feedback ao citologista, que assim refinaria seus critérios citomorfológicos para
casos desta natureza.
Embora de maneira geral tenha detectado menos falso-negativos que o PER, a
RR100% é um método viável, recomendado como método de MIQ no Reino Unido e que
recebeu boa aceitação, especialmente na Europa e Austrália, apesar de ser difícil monitorar
sua sensibilidade, exatamente por revisar somente esfregaços negativos da rotina (DJEMLI et
al., 2006). Um trabalho realizado em um laboratório de citopatologia de grande porte mostrou
que a RR100% foi facilmente incorporada no fluxo de trabalho diário, demonstrando ser um
método eficiente no controle de qualidade, resultando no aumento da detecção de esfregaços
alterados (WRIGHT, HALFORD, DITCHMEN, 1999). Nossos resultados mostraram que a
RR100% detectou mais atipias e lesões de alto grau comparado ao PER. Isso mostra que a
RR100% é um método que pode melhorar a detecção de lesões precursoras e mostrar bons
resultados na melhoria da qualidade do exame citopatológico, como já foi verificado em
estudos anteriores (MATTOSINHO et al., 2005; AMARAL et al., 2005; UTAGAWA et al.,
2008).
O ganho na detecção de alterações citopatológicas proporcionado ao escrutínio de
rotina foi de 13,3% com a realização do PER e de e 11,5% com a realização da RR100%.
Outros trabalhos relataram a melhora no desempenho do exame citopatológico com a
utilização do PER ou da RR100% como métodos de monitoramento interno da qualidade
(WRIGHT, HALFORD, DITCHMEN, 1999; DJEMLI, KHETANI, AUGER, 2006; LEE,
LAM, WALKER, 2009; DUDDING, RENSHAW, ELLIS, 2011).
O PER possui algumas vantagens operacionais quando comparado a RR100%. Uma
delas é pelo fato do PER ser realizado antes do escrutínio de rotina, o que desperta maior
interesse e alerta no escrutinador, que irá pré-escrutinar esfregaços que ainda não foram
submetidos a leitura de rotina e que poderá encontrar casos alterados entre os esfregaços préescrutinados. A outra vantagem é que o fato de pré-escrutinar todos os esfregaços antes do
ER torna possível calcular sua sensibilidade comparada ao ER (RENSHAW et al., 1999;
RENSHAW, LEZON, WILBUR, 2001; DJEMLI, KHETANI, AUGER, 2006). Por outro
Tobias, AHG
Discussão
57
lado, a possibilidade da RR100% suspeitar de esfregaços alterados é consideravelmente
reduzida por ser um método realizado em esfregaços previamente classificados como
negativos pelo escrutínio de rotina e, consequentemente, não é possível calcular sua
sensibilidade comparada ao ER (RENSHAW et al., 1999, 2001; DJEMLI, KHETANI,
AUGER, 2006).
Outra vantagem do PER, é avaliar o desempenho de toda a equipe envolvida no ER.
Brimo et al. (2009) analisaram a variação do desempenho individual dos citologistas na
realização do PER e do ER ao longo do tempo e para isso contaram com a participação de 11
citologistas que realizaram 51.792 exames citopatológicos convencionais, cujos resultados
apontaram que,
como método de MIQ em um laboratório de citopatologia,
o PER
desempenha um papel importante na melhoria da sensibilidade global e individual ao longo
do tempo, beneficiando principalmente citologistas que apresentaram baixa sensibilidade na
detecção de casos alterados.
Embora o PER tenha apresentado sensibilidade maior que a RR100% conforme
resultados deste estudo, a RR100% mostrou VPP maior que o PER, ou seja, a RR100%
conseguiu detectar maior proporção de resultados verdadeiramente positivos entre aqueles
considerados alterados pelo diagnóstico final. A RR100% é realizada após o escrutínio de
rotina, ou seja, muitos casos alterados já foram identificados e removidos daqueles
encaminhados para a revisão, incluindo os casos mais facilmente detectados devido a
quantidade de células alteradas e com critérios de malignidade mais característicos (FRANCO
et al., 2006; CLARKE et al., 2008). À vista disto, uma forma de melhorar a sensibilidade
deste método seria colocar esfregaços alterados aleatoriamente entre os esfregaços negativos
encaminhados para essa revisão. Introduzir esfregaços com diferentes graus de alteração entre
os esfregaços encaminhados para RR100% pode aumentar o nível de alerta dos revisores
durante a realização do método e permite avaliar o desempenho individual do citologista,
identificando aqueles com dificuldades na identificação de atipias e lesões com menor
representatividade celular no esfregaço (CLARKE et al., 2008). Contudo esta é uma
alternativa que demanda um gasto de tempo adicional na seleção e distribuição destes
esfregaços positivos entre os negativos que seriam revisados, sendo necessária a dedicação de
uma pessoa que não participe da revisão das lâminas.
A fim de evitar a superestimação do PER em comparação a RR100%, a sensibilidade
do PER foi calculada de duas formas: incluindo os verdadeiros positivos e os falso-negativos
na análise, em que a sensibilidade do PER foi de 48,2% e incluindo somente os RFN, em que
Tobias, AHG
Discussão
58
a sensibilidade do PER foi de 65,7% e da RR100% foi de 57,8%. Há relatos na literatura de
variação da sensibilidade do PER entre 35,8 a 81,4% (ARBYN et al., 2003). Porém, se for
considerado que o PER pré-escrutina todos os esfregaços, essa sensibilidade se mostrou
abaixo do esperado, resultado semelhante a outros achados na literatura (DJEMLI,
KHETANI, AUGER, 2006; CURRENS et al., 2012).
Uma hipótese para a baixa sensibilidade do PER é a falta de treinamento/habilidade do
pré-escrutinador com o método. Porém, segundo resultados de Deschenes, Renshaw e Auger
(2008) não há correlação entre a sensibilidade do PER e o nível de experiência ou o volume
de trabalho exercido pelos citopatologistas.
Por outro lado, Arbyn et al. (2003) afirmam que a sensibilidade do PER diminui
quando o citologista analisa mais de 60 esfregaços por dia de trabalho. Contudo, é provável
que ocorra melhora da sensibilidade do PER a medida que o pré-escrutinador ganhe
experiência e tenha um retorno de seu desempenho na execução do método e para isso é
necessário constante monitoramento de toda equipe de trabalho. O PER pode reduzir a taxa de
RFN em pelo menos 30%. Portanto, um laboratório com uma sensibilidade de
aproximadamente 80% seria capaz de melhorar a sensibilidade em aproximadamente 87%
(RENSHAW, 2009).
O PER gastou aproximadamente 13,6% mais tempo para sua execução no laboratório
comparado ao tempo gasto na realização da RR100%.
Uma das críticas ao PER é de que apesar de ser capaz de reduzir o número de falsonegativos, é um método que afeta o fluxo de trabalho do laboratório exatamente por préescrutinar todos os esfregaços, e por isso, este provavelmente seja o método menos atraente
para se implantar na rotina laboratorial. Este método demanda mais tempo da rotina para
realizá-lo e a realidade da maioria dos laboratórios de citopatologia é de um grande volume de
esfregaços a serem avaliados, e um reduzido número de citologistas para fazê-lo. Em caso de
sua implementação, seria necessário estudar alternativas como contratação de novos
citopatologistas ou redução do número de lâminas na leitura de rotina por cada profissional
(REPSE-FOKTER, CAKS-GOLEC, 2009; RENSHAW, 2009). Neste sentido a RR100%
pode ser uma boa alternativa, já que reduz o número de esfregaços a serem revisados. O
essencial é que pelo menos um método de MIQ seja realizado, pois além de reduzir RFN,
manter um programa de garantia de qualidade no laboratório oferece maior credibilidade e
confiabilidade dos resultados às mulheres (ARAÚJO JR et al., 2015).
Tobias, AHG
Discussão
59
Vale ressaltar ainda, que caso haja atraso na realização do PER, todo o fluxo de leitura
de rotina pode ser prejudicado, considerando que o escrutínio de rotina só é realizado após a
realização do PER e por isso, a escolha da RR100% como método de MIQ pode estar muitas
vezes associada a praticidade no fluxo de trabalho que este método oferece (CLARKE et al.,
2008). Algo crucial em um laboratório de citopatologia é o prazo de liberação do exame
citopatológico e no caso do Brasil, por exemplo, aqueles que prestam serviço para o SUS, o
prazo deve ser de no máximo 30 dias após o recebimento dos esfregaços pelo laboratório
(BRASIL, 2013b). Neste sentido, o uso não só do PER, mas também da RR100%, requer
planejamento e gestão desses processos para que assim o resultado seja liberado em tempo
hábil.
Quanto ao desempenho individual dos citologistas, durante a realização dos métodos
de MIQ e do ER, observou-se neste estudo que o citologista 1 apresentou boa sensibilidade na
detecção de alterações citológicas comparado ao diagnóstico final, o citologista 2 apresentou
baixo desempenho na realização da RR100%. O citologista 3 mostrou melhor desempenho na
realização do ER. Todos os citologistas seguiram a recomendação do INCA/MS, fazendo a
leitura de aproximadamente 70 esfregaços por dia, revezando entre o PER, RR100% e ER
(BRASIL, 2016). Por isso, pode-se inferir que o volume de esfregaços não influenciou na
variação detectada no desempenho entre os citologistas, mas outros fatores como o pouco
tempo de experiência dos citologistas na realização dos métodos de MIQ, perfil de cada
citologista na execução de determinado método.
A diferença de desempenho entre os citologistas na realização do ER e dos métodos de
MIQ é aceitável, pois como em qualquer tarefa, alguns são melhores do que outros em
determinadas funções (DJEMLI, KHETANI, AUGER, 2006; DESCHENES, RENSHAW,
AUGER, 2008; BRIMO et al., 2009). Dudding, Renshaw e Ellis (2011) mostraram que a
sensibilidade dos citologistas na realização do PER não é estática ao longo do tempo, pois
mostra melhora conforme a prática.
Por outro lado, é importante ressaltar que apesar dos citologistas que realizaram este
trabalho não possuírem experiência na realização dos métodos de MIQ, eles foram capazes de
detectar alterações citológicas presentes nos esfregaços, e a prática contínua dos métodos
provavelmente os ajudaria a melhorar sua capacidade de detectar essas alterações na rotina
laboratorial.
Ao implantar um método de MIQ em laboratório de citopatologia, deve-se,
preferencialmente, fazer um planejamento com todo corpo técnico, envolvendo todos os
Tobias, AHG
Discussão
60
citologistas, selecionando aqueles que têm melhor desempenho na prática do método de MIQ
para realizá-lo. Para tanto, deve ser feito um período de teste em que o desempenho dos
citologistas seja avaliado a fim de verificar seu melhor rendimento. Importante também é que
os métodos de MIQ não sejam realizados pelo mesmo citologista que irá fazer a leitura de
rotina, para que assim as chances de detecção de alterações citológicas sejam maiores
(AUGER, 2011).
Em 2011, um inquérito foi enviado para 1604 laboratórios participantes do College of
American Pathologists (CAP) sobre os métodos de MIQ e destes, 625 (39%) responderam ao
questionário enviado. Segundo os resultados deste inquérito, o PER é utilizado somente por
3,5% dos laboratórios e a RR100% é utilizada por 11.2% (CROTHERS et al., 2016). Um dos
possíveis fatores que faz com que o PER seja raramente adotado nos Estados Unidos é o
aumento do volume de trabalho que este método demanda, uma vez que o The Clinical
Laboratory Improvement Amendments (CLIA 88) regulamenta um limite diário de lâminas
por citopatologista (DESCHENES, RENSHAW, AUGER, 2008). Contudo, os órgãos
regulamentadores limitam somente o volume de trabalho no que diz respeito ao ER, não
esclarecendo se esses limites incluem a realização dos métodos de MIQ.
Embora a maioria dos citologistas concorde que a regulação da carga de trabalho é
parte importante para garantia da qualidade em citopatologia do colo do útero, ainda são
poucas e limitadas as regulamentações sobre o assunto (DESCHENES, RENSHAW,
AUGER, 2008; BRANCA, LONGATTO-FILHO, 2015). Ao comparar a sensibilidade
estimada do PER em relação à carga de trabalho, foi observado que a sensibilidade do método
é fortemente associada com o volume de trabalho executado, sendo que a sensibilidade
máxima foi alcançada quando o PER foi realizado em no máximo 30 lâminas por dia (ELLIS,
RENSHAW, DUDDING, 2012). Deschenes, Renshaw e Auger (2008) concluíram que a
forma mais eficaz para melhorar o desempenho de um laboratório é a contratação de
citologistas experientes ao invés de limitar a quantidade de lâminas que eles poderiam ler,
pois os citologistas podem mostrar diferentes taxas de erros, e embora o volume de trabalho
possa ter influenciado nessa taxa de erro, esse fator se mostrou menos importante do que a
variabilidade interobservador entre os citologistas.
No Brasil a recomendação é de que o citologista não escrutine mais que 70 lâminas
por dia enquanto nos Estados Unidos o limite é de 100 lâminas e no Canadá de 70 a 80
lâminas em uma jornada de 8 horas de trabalho. Embora geralmente essa seja a jornada de
trabalho praticada na maioria dos laboratórios, deve-se considerar que pode estar incluído
Tobias, AHG
Discussão
61
neste período a realização de outras atividades além da avaliação de lâminas. Deve-se
considerar também que outros fatores influenciam no rendimento do ER do citologista, como
o grau de complexidade do esfregaço, adequabilidade do material, e até mesmo o tempo gasto
em outras tarefas no laboratório (BRASIL, 2016; DESCHENES, RENSHAW, AUGER,
2008). Enfim, é importante ressaltar que o controle da carga de trabalho e do tempo gasto na
triagem é essencial para manter a qualidade e a precisão diagnóstica na leitura de esfregaços
do colo do útero (BRANCA, LONGATTO-FILHO, 2015).
Outra ferramenta importante para avaliar o desempenho dos exames citopatológicos é
o monitoramento dos indicadores de qualidade, que permitem uma comparação da situação
ideal com a situação real do laboratório (ARAÚJO JR et al., 2015). O índice de positividade
detectado neste trabalho foi considerado elevado em comparação a países desenvolvidos
(NYGARD, SKARE, THORESEN, 2002; DAVEY et al., 2004; EVERSOLE et al., 2010).
Isto pode ser explicado pelo fato de que em países desenvolvidos, a triagem possui melhor
organização e é bem sucedida em reduzir a incidência de câncer do colo do útero e índices de
mortalidade (COSTA et al., 2015).
Mulheres do município de Ouro Preto, MG, demonstraram persistência de infecção
pelo HPV de 59,6%. Os tipos virais de alto risco foram os mais prevalentes, com uma
persistência de infecção por HPV de alto risco oncogênico de 61,8% (MIRANDA et al.,
2013). Essa alta prevalência de infecção por HPV nas mulheres residentes em Ouro Preto
pode refletir no alto número de diagnósticos citológicos alterados encontrado neste trabalho.
Bortolon et al. (2012) fizeram uma análise da distribuição dos indicadores de
qualidade em citopatologia no Brasil no ano de 2010. Foi observado que o país realizou, no
âmbito do SUS, aproximadamente dez milhões e trezentos mil exames citopatológicos do
colo do útero em 2010. Grande número de prestadores mostrou IP menor que 3,0% e
percentual de HSIL menor que 0,4%, o mínimo recomendado pelo Ministério da Saúde.
Outros trabalhos regionais têm mostrado que a maioria dos laboratórios que realizam o exame
citopatológico pelo SUS tem dificuldades na detecção de lesões precursoras do CCU
(PLEWKA et al., 2014; TOBIAS et al., 2016). Em países onde houve diminuição das taxas de
incidência e mortalidade por CCU, como nos Estados Unidos e no Reino Unido, o IP foi
acima de 6%, mostrando a importância na detecção das lesões precursoras na prevenção da
neoplasia cervical (DAVEY et al., 2004; NHS CANCER SCREENING PROGRAMMES,
2011). O resultado do percentual de HSIL observado neste trabalho mostra que o laboratório
está alcançando a meta de detectar lesões precursoras do CCU.
Tobias, AHG
Discussão
62
Antes e após a realização dos métodos de MIQ e das revisões detalhadas, a razão de
ASC entre os exames satisfatórios, se mostrou dentro do recomendado, que é de 4% a 5%.
Um alto percentual de ASC pode indicar problemas nas fases pré-analítica e analítica de um
laboratório de citopatologia. É necessário investigar a causa e implantar melhorias para
diminuir esse indicador, pois além de gerar um desconforto à mulher e para a rede assistencial
devido à necessidade da oferta de um maior número de exames para investigação diagnóstica,
também pode implicar na análise de outros indicadores de qualidade, principalmente na
interpretação do IP, que aparentemente pode estar ideal, porém com altas taxas de ASC, o que
não é recomendado (BRASIL, 2016; ÁZARA et al., 2014b).
Pelo fato do exame citopatológico do colo do útero ser um teste de escrutínio visual e,
portanto, subjetivo, é necessário estabelecer uma padronização de critérios diagnósticos,
sendo o procedimento de controle da qualidade uma ferramenta fundamental para melhora da
acurácia diagnóstica. Neste sentido, não só o MIQ é necessário, mas também o
Monitoramento Externo da Qualidade é um exercício de aprimoramento diagnóstico muito
importante, pois é uma ferramenta a mais que auxilia na melhoria da concordância
diagnóstica das lesões intra-epiteliais e no desempenho do laboratório de maneira geral
(PEREIRA et al., 2006; FREITAS, THULER, 2012; ÁZARA et al., 2013, 2014a).
O percentual de ASC entre os exames alterados encontrado neste trabalho, antes ou
após realização dos métodos de MIQ, da revisão detalhada e do diagnóstico final estava
dentro dos limites estabelecidos, inferior a 60%. Da mesma forma a razão ASC/SIL se
manteve dentro do recomendado.
As atipias e lesões intraepiteliais escamosas de baixo grau corresponderam a 84,4%
dos resultados positivos confirmados pelo diagnóstico final neste trabalho e destes, apenas
62,5% repetiram o exame citopatológico.
O PER mostrou melhor desempenho que a RR100% na identificação de ASCUS/LSIL não detectados pelo ER quando comparado ao resultado do novo exame
citopatológico, mostrando também melhor desempenho na identificação de casos com
diagnóstico de ASC-H/+ no novo exame citopatológico.
Um estudo realizado em uma universidade de Joanesburgo, África do Sul, avaliou o
desempenho da RR100% comparando o resultado do exame citopatológico prévio com o
resultado do exame histopatológico e com o exame citológico de repetição mostrou que de
101 casos classificados como ASC-H/HSIL falso-negativos detectados pelo método, apenas
15 (14,9%) apresentaram seguimento com resultado do exame histopatológico e apenas
Tobias, AHG
Discussão
63
12,9% das mulheres com diagnóstico de ASC-US/LSIL foram submetidas a citologia de
acompanhamento (MICHELOW, MCKEE, HLONGWANE, 2006). Baixas taxas de
seguimento mostram a necessidade de promover medidas corretivas, pois a gestão correta e o
tratamento oportuno são tão importantes como o diagnóstico preciso para o sucesso dos
programas de rastreio.
Nossos resultados mostraram que 61,2% dos casos identificados tanto pelos métodos
de MIQ quanto pelo ER como ASC-US/LSIL foram considerados negativos pelo resultado do
novo exame citopatológico. Conforme recomendação do MS, o seguimento para tais
alterações citológicas deve ser realizado no período de seis meses a um ano da data de
recebimento do resultado alterado (BRASIL, 2011a). Contudo, sabe-se que os diagnósticos de
ASC-US e LSIL estão fortemente associados à infecção pelo HPV (MOSCICKI et al., 2004).
Uma vez que a maioria das infecções por HPV e anormalidades citológicas associadas a essa
infecção são transitórias é natural que elas regridam espontaneamente dentro de um a dois
anos (SYRJÄNEN et al., 2005).
O resultado do novo exame citopatológico não é o padrão ouro ideal para avaliar o
desempenho do exame citopatológico. Contudo, muitas vezes na prática clínica este é o único
exame alterado realizado pela mulher. No Brasil, por exemplo, na presença de um resultado
de atipia e lesão intraepitelial escamosa de baixo grau, a conduta inicial é a repetição do
exame citopatológico. Somente em casos em que a alteração persista no resultado do novo
exame citopatológico é recomendado colposcopia e biópsia (BRASIL, 2011a). Neste sentido,
o resultado do novo exame citopatológico de seguimento pode ser utilizado para comparar os
diagnósticos feitos entre os diferentes métodos de escrutínio e estas informações podem ser
utilizadas para educação continuada dentro do próprio laboratório, sendo assim uma
ferramenta importante no controle interno de qualidade.
O número de casos com seguimento adequado e exames complementares neste
trabalho foram baixos, porém um número maior de casos suspeitos pelo PER esteve
relacionado a um número maior de citologia alterada no novo exame citopatológico,
comparado com a RR100%.
Não foi possível obter o seguimento de todas as mulheres com atipias e lesões
intraepiteliais escamosas de alto grau identificadas pelo ER nem pelos métodos de MIQ. Esse
resultado mostra que há dificuldades em seguir as diretrizes recomendadas pelo MS no
município de Ouro Preto, que orienta que mulheres com resultado citopatológico de ASC-H/+
sejam encaminhadas para colposcopia e biópsia.
Tobias, AHG
Discussão
64
Durante o levantamento do seguimento das mulheres com resultados citopatológicos
classificados como ASC-H/+, observou-se que uma das condutas usualmente praticada pelo
serviço de atenção secundária era o pedido de repetição do exame citopatológico, isso sem
antes fazer a colposcopia, contudo, segundo recomendação do MS, pacientes com resultado
citológico de ASC-H/+ devem ser encaminhadas imediatamente para o exame colposcópico
(BRASIL, 2011a). Repetir o exame citopatológico ao invés de realizar o exame colposcópico
nessas mulheres pode resultar em atraso na confirmação do diagnóstico e, consequentemente,
do tratamento, de acordo com o preconizado pelo MS, além de gastos desnecessários com a
realização da citopatologia de seguimento.
A colposcopia subsequente ao resultado citopatológico alterado é a melhor forma de
identificar as atipias que correspondem à NIC de alto grau e a separar daquelas que não
apresentam alterações intraepiteliais (ARAÚJO et al., 2014). Por esse motivo, a observação
das normas e os encaminhamentos corretos são parâmetros importantes para o melhor
desempenho do programa de rastreamento e controle do CCU, excluindo assim
procedimentos e condutas inadequadas, que podem gerar custos adicionais. Além de ser uma
alternativa econômica, a conduta preconizada é viável e simples, podendo ser realizada em
consultório ginecológico e UBS (UCHIMURA et al., 2012).
Ao verificar se as mulheres com atipias ou lesões precursoras do CCU estavam sendo
encaminhadas para atenção secundária conforme condutas recomendadas pelo MS,
Albuquerque et al. (2012) verificaram que cerca de 80% e 46% das mulheres com diagnóstico
de ASC-US/LSIL foram submetidas à colposcopia e biópsia, respectivamente, enquanto que
cerca de 14% e 33% de mulheres com diagnóstico citológico de ASC-H/+ não foram
submetidas à colposcopia e biópsia, respectivamente. Estes resultados mostraram elevada
freqüência de encaminhamentos inadequados, o que demandou alto percentual de
procedimentos desnecessários para algumas mulheres e falta de atendimento adequado para
outras.
No Brasil, em 2013, o IP foi de 2,9% variando de 1,0% a 9,7% entre os estados. Isso
implica no acompanhamento de aproximadamente 240 mil mulheres/ano e a necessidade de
cerca de 200 mil colposcopias e 80 mil biópsias, aproximadamente. No atendimento a essa
necessidade, todos os estados do país dispõem de serviços que realizam colposcopia e biópsia.
Entretanto, esses procedimentos nem sempre são distribuídos adequadamente, de forma a
atender oportuna e resolutivamente à mulher com lesão suspeita. Verifica-se, de uma forma
geral, no país, uma fragmentação da rede que leva a uma descontinuidade de ações
Tobias, AHG
Discussão
65
assistenciais, obrigando as mulheres, a percorrerem vários serviços, às vezes, em diferentes
municípios, até obter o diagnóstico e/ou tratamento definitivo (BRASIL, 2015b).
Através deste trabalho observou-se que há grandes obstáculos e dificuldades para
realização do seguimento de mulheres com citologia alterada, principalmente no seguimento
de mulheres com atipias ou lesões intraepiteliais escamosas de alto grau que requerem
colposcopia e biópsia, o que também foi observado em outros trabalhos (ALBUQUERQUE et
al., 2012; ARAÚJO et al., 2014).
Dentre os obstáculos observados no município podemos citar: não adesão da mulher
ao rastreamento, uma vez que muitas não retornaram as UBS para buscar o resultado do
exame citopatológico; mudança de endereço; considerável rotatividade dos profissionais
responsáveis pela realização do exame citopatológico nas UBS; deslocamento das mulheres
do município sede até o município onde são atendidas pela atenção secundária. Contudo, o
que mais dificulta o acompanhamento dessas mulheres no município é a falta de contra
referência da unidade de atenção secundária para as UBS. Ou seja, das mulheres com
resultado citológico com atipias ou lesões de alto grau que são encaminhadas para atenção
secundária, muitas são atendidas, contudo as UBS não recebem contra referência. Com isso o
profissional da atenção primária, na UBS, fica sem informação dos procedimentos e
resultados daquela paciente, que por sua vez, na maioria das vezes, não sabem relatar a esse
profissional os procedimentos que ela realizou. Isso leva a um quadro de desinformação
dessas UBS, que acabam por solicitar novos exames citopatológicos a fim de tentar manter
essa paciente no rastreamento. Em trabalho realizado por Santos, Silva e Bezerra (2012), os
autores descrevem que uma das queixas dos profissionais responsáveis pela realização do
exame citopatológico é a dificuldade para a garantia da continuidade do tratamento para
pacientes que apresentam laudo positivo.
Nascimento et al. (2015) analisaram o rastreamento do CCU em Minas Gerais entre os
anos de 2000 a 2010 e constataram cobertura inferior à meta pactuada para o estado.
Verificaram que os fatores que levaram ao não alcance das metas em relação à cobertura do
exame citopatológico mostram que o problema é complexo e multifacetado. Dentre os fatores
citados que dificultam o alcance dessa meta está a rotatividade nas equipes de saúde da
família, que pode interferir na dinâmica do trabalho e no vínculo construído com as famílias.
Outro fator seria a barreira da própria mulher em relação ao exame citopatológico, levando
em consideração que muitas mulheres, devido ao baixo grau de escolaridade e por residirem
Tobias, AHG
Discussão
66
em regiões de extrema pobreza, não têm informações adequadas a respeito do CUU nem
sobre sua prevenção e detecção precoces (ANDRADE et al., 2013).
O controle do CCU está diretamente relacionado com a qualidade do sistema de saúde,
que além de identificar mulheres que precisam fazer controle, deve garantir diagnóstico
correto e tratamento preciso, acesso fácil e ágil aos serviços, flexibilidade para marcar e
remarcar consultas e rapidez no atendimento (RIBEIRO et al., 2004). Além disso, não basta
ter infra-estrutura disponível para o programa de rastreamento, é indispensável que esta
estrutura seja organizada de maneira eficiente conforme preconizado pelo MS, a fim de evitar
a perda de seguimento de pacientes com resultado citológico alterado (VALE et al., 2010;
YUNES-DÍAZ, RUIZ, LAZCANO-PONCE, 2015).
Enfim, diante dos resultados deste trabalho, verificou-se que a implantação do préescrutínio rápido e da revisão rápida de 100% na rotina do laboratório proporcionou melhora
no desempenho do exame citopatológico. Ambos os métodos foram capazes de detectar
resultados falso-negativos do escrutínio de rotina. Os resultados desta avaliação também
foram importantes para identificar e direcionar ações de educação continuada, a fim de que o
desempenho individual e global do laboratório fossem aprimorados. Ações junto a Secretaria
Municipal de Saúde também estão sendo implementadas no que diz respeito à gestão do
seguimento de mulheres com resultado do exame citopatológico alterado, visando que esta
importante etapa da prevenção do CCU seja realizada de forma efetiva no município.
Tobias, AHG
Discussão
67
7. CONCLUSÕES
68
O PER e a RR100% detectaram resultados falso-negativos do escrutínio de rotina,
melhorando assim o desempenho do exame citopatológico do colo do útero em laboratório de
citopatologia.
Comparado com o resultado do diagnóstico final o pré-escrutínio rápido mostrou
maior taxa de acerto nos casos em que suspeitou em relação a revisão rápida de 100%.
A associação do escrutínio de rotina com o pré-escrutínio rápido mostrou maior
frequência na detecção de alterações citopatológicas em comparação com a associação do
escrutínio de rotina com a revisão rápida de 100%.
O pré-escrutínio rápido detectou maior frequência de resultados falso-negativos do que
a revisão rápida de 100%.
O pré-escrutínio rápido detectou maior número de resultados falso-negativos do
escrutínio de rotina, contudo, não houve diferença significativa na detecção dos RFN do
escrutínio de rotina detectados pelos métodos PER e RR100%, quando comparado com o
diagnóstico final.
O pré-escrutínio rápido apresentou melhor desempenho na detecção de resultados
falso-negativos quando comparado com o resultado do novo exame citopatológico.
O pré-escrutínio rápido demandou maior volume de trabalho e consequentemente mais
tempo para ser realizado do que a RR100%.
O desempenho individual dos citologistas se mostrou melhor na realização do PER em
comparação à RR100%.
Os indicadores de qualidade do laboratório se mostraram dentro do recomendado tanto
antes quanto após a realização dos métodos de MIQ.
Tobias, AHG
Conclusões
69
8. CONSIDERAÇÕES FINAIS
70
O exame citopatológico está sujeito a diversos erros, que podem ocorrer desde a coleta
até a liberação do laudo. Neste sentido o monitoramento interno da qualidade possui papel
fundamental para estabelecer limites e padrões que confiram qualidade ao resultado final.
Os resultados desta pesquisa mostraram que o PER e a RR100% são métodos
eficientes na detecção de resultados falso-negativos do escrutínio de rotina. Contudo é
inviável a utilização simultânea de dois métodos de monitoramento em um laboratório de
citopatologia. Portanto, cada laboratório deve escolher um método que seja capaz de executar
e que vá de encontro com a demanda por ele realizada e com os recursos disponíveis. O
indispensável é que pelo menos um método de MIQ seja realizado na rotina do laboratório de
citopatologia, para que assim o objetivo primordial do exame citopatológico, que é a detecção
de lesões precursoras do CCU, seja alcançado.
Ao fazer levantamento do seguimento das mulheres com resultado citopatológico
alterado, observou-se que grande parte dessas mulheres, principalmente aquelas com
diagnóstico ASC-H ou lesões mais graves não fizeram os exames complementares conforme
preconizado pelo Ministério da Saúde. Durante o período de coleta dessas informações,
observou-se que nas UBS, em muitos casos, não havia informações do seguimento dessas
pacientes no prontuário da mulher. No centro de referência que atende mulheres
encaminhadas pelo município para realização dos exames complementares, foi observado que
muitas mulheres encaminhadas devido ao diagnóstico citológico de ASC-H ou lesões mais
graves repetiram o exame citopatológico, mesmo antes de realizar a colposcopia. Além disso,
a coleta de informações no prontuário das mulheres atendidas pelo centro de referência
requereu bastante atenção, pois não havia um padrão de anotação do atendimento dado às
pacientes em seus prontuários.
Um diagnóstico precoce sem seguimento adequado não garante à mulher tratamento
ideal e com isso lesões precursoras podem progredir para o câncer do colo do útero. Um dos
princípios do sistema de saúde brasileiro é a integralidade no atendimento aos seus usuários.
Nesse sentido faz-se necessário esclarecer e corrigir dificuldades no atendimento integral à
mulher, pois o seguimento adequado das alterações identificadas no exame citopatológico de
rotina é de suma importância para que o programa de rastreamento do CCU possa ter êxito.
Ademais, acompanhar o seguimento dessas mulheres fornece subsídios para planejamento de
ações preventivas adequadas para a realidade do município.
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Tobias, AHG
Referências Bibliográficas
85
APÊNDICES
86
Apêndice A. Planilha do pré-escrutínio rápido
PLANILHA DO PRÉ-ESCRUTÍNIO RÁPIDO (PER)
DATA DE CHEGADA:
DATA:
REVISOR:
Nº DA CITOLOGIA
N= NEGATIVO
Tobias, AHG
RESULTADO DO PER
I= INSATISFATÓRIO
S= SUSPEITO
Apêndices
87
Apêndice B. Planilha da revisão rápida de 100%
PLANILHA DA REVISÃO RÁPIDA DE 100% DOS NEGATIVOS (RR100%)
DATA DE CHEGADA:
DATA
Nº DA CITOLOGIA
REVISOR:
RESULTADO DA RR100%
N: Negativo
Tobias, AHG
I: Insatisfatório
FLORA
S: Suspeito
Apêndices
88
Apêndice C. Planilha dos resultados positivos e insatisfatórios
PLANILHA DE REVISÃO DOS RESULTADOS POSITIVOS E INSATISFATÓRIOS
NO DA
CITOLOGIA
DATA
N= NEGATIVO
Tobias, AHG
RESULTADO
PER
RESULTADO
ER
I= INSATISFATÓRIO
REVISOR
DIAGNÓSTICO
FINAL
S= SUSPEITO
Apêndices
89
Apêndice D. Planilha de revisão dos resultados discordantes
PLANILHA DE REVISÃO DOS RESULTADOS DISCORDANTES
DATA
NO DA
CITOLOGIA
N= NEGATIVO
Tobias, AHG
RESULTADO
PER
RESULTADO
ER
RESULTADO
RR100%
I= INSATISFATÓRIO
REVISOR
DIAGNÓSTICO
FINAL
S= SUSPEITO
Apêndices
90
Apêndice E. Planilha de controle de leitura do pré-escrutínio rápido
PLANILHA DE CONTROLE DE LEITURA DAS LÂMINAS (PRÉ-ESCRUTÍNIO RÁPIDO)
Data
Responsável
Lâminas vistas
91
Apêndice F. Planilha de controle de leitura da revisão rápida de 100%
PLANILHA DE CONTROLE DE LEITURA DAS LÂMINAS (REVISÃO RÁPIDA 100%)
Data
Responsável
Lâminas vistas
92
Apêndice G. Planilha de controle de leitura do escrutínio de rotina
PLANILHA DE CONTROLE DE LEITURA DAS LÂMINAS (ESCRUTÍNIO DE ROTINA)
Data
Responsável
Lâminas vistas
93
Apêndice H. Programa utilizado para cálculo de sensibilidade, especificidade, valor
preditivo positivo e valor preditivo negativo.
94
ANEXOS
95
Anexo 1. Parecer de aprovação do projeto pelo Comitê de Ética em Pesquisa
Tobias, AHG
Anexos
96
Tobias, AHG
Anexos
97
Tobias, AHG
Anexos
98
Anexo 2. Requisição de exame citopatológico do colo do útero
Tobias, AHG
Anexos
99
Tobias, AHG
Anexos
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