Revista Eletrônica do Curso de Pedagogia da PUC Minas

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ISSN
Pedagogia em Ação
Revista Eletrônica do Curso de Pedagogia da PUC Minas
Educação Infantil, Ensino Religioso e Necessidades Educacionais Especiais
Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais
Grão Chanceler
Dom Walmor Oliveira de Azevedo
Reitor
Prof. Dom Joaquim Giovani Mol Guimarães
Vice-Reitora
Profª Patrícia Bernardes
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Comunicação: Prof. Mozahir Salomão Bruck
Cultura e Assuntos Comunitários: Profa. Maria Beatriz Rocha Cardoso
Geral: Prof. Flávio Augusto Barros
Planejamento e Desenvolvimento Institucional: Prof. Carlos Barreto Ribas
Relações Internacionais: Prof. Djalma Francisco Carvalho
Assuntos Estudantis: Prof. Renato Durval Martins
ISSN
Pedagogia em Ação
Revista Eletrônica do Curso de Pedagogia da PUC Minas
Educação Infantil, Ensino Religioso e Necessidades Educacionais Especiais
Pedagogia em Ação
Belo Horizonte
v. 1
n. 1
p. 1-141
jun. 2009
Instituto de Ciências Humanas
Pe. Márcio Antônio Paiva (Diretor)
Departamento de Educação
Maria Salete Chaves (Coordenadora do Curso de Pedagogia)
Editor-Gerente
Vera Lúcia Lins Sant’Anna
Editor
Sérgio de Freitas Oliveira
Conselho Editorial
Prof. Dr. Amauri Carlos Ferreira
Profa. Dra. Ana Teresa Brandão de Oliveira e Britto
Profa. Ms. Elizabete Beling Caetano Silva
Profa. Ms. Lenise Maria Ribeiro Ortega
Profa. Dra. Magali de Castro
Profa. Ms. Nilza Bernardes Santiago
Prof. Ms. Raul de Barros Neto
Prof. Dr. Roberlei Panasiewicz
Prof. Sérgio de Freitas Oliveira
Profa. Dra. Vera Lúcia Lins Sant’Anna
Prof. Dr. Vicente Geraldo Amâncio Diniz Oliveira
Endereço eletrônico:
E-mail: [email protected]
Edição online: http://periodicos.pucminas.br/index.php/pedagogiaemacao
Endereço para correspondência:
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Projeto Gráfico, composição e leiaute
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Telefone: (31) 3452-4653
Sítio: http://www.portfoliorealmeida.hpg.com.br/
E-mail: [email protected]
Formato do Papel: Carta (21,59 x 27,94 cm)
Número de Páginas: 141p.
Capa: Paulo Pinheiro Cruz • Secretaria de Comunicação PUC Minas
Ficha Catalográfica Provisória
Pedagogia em Ação; Revista Eletrônica do Curso de Pedagogia Pontifícia Universidade
Católica de Minas Gerais – v. 1, n. 1, 1º sem. 2009 -. - MG/Belo Horizonte: PUC Minas,
2009.
Semestral.
ISSN
1. Educação - Periódicos. I. Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. Instituto
de Ciências Humanas. Departamento de Educação. Curso de Pedagogia.
CDU XXXXX (XXX)
Sumário
Apresentação.....................................................................................................................................................................................9
Prof. Sérgio de Freitas Oliveira
Profa. Vera Lucia Lins Sant’Anna
Editorial...........................................................................................................................................................................................11
Profa. Maria Salete Chaves
Artigos de Professores
Dimensões do processo ensino-aprendizagem: desafios à prática docente...................................................................................15
Vera Lúcia Lins Sant’Anna
Educação: a reflexão como elemento norteador na pesquisa e na produção de conhecimento...................................................25
Vicente Geraldo Amâncio Diniz Oliveira
Artigos de Alunos
Drogas: a necessidade da parceria família e escola.......................................................................................................................33
Anally Valentim Assis de Oliveira
Orient.: Sérgio de Freitas Oliveira
A práxis pedagógica no ambiente hospitalar: perspectivas e desafios...........................................................................................37
Áurea Vitória Batista
Íris Gomes de Araújo Pêgo
Kênia Cristina Ferreira
Lúcia Souza e Silva
Marina Lindaura Maranha Contarine
Vivian de Fátima Albergaria Pereira
Orient.: Vera Lúcia Lins Sant’Anna
Da lousa à tela do computador: as apropriações e usos das mídias e suas implicações nos processos de aprendizagem...........45
Bruna Guzman de Jesus Rapini
Lara Pires Ramos
Orient.: Nilza Bernardes Santiago
Um caso de inclusão na rede pública de ensino: estamos mesmo incluindo? ..............................................................................51
Cynthia Loureiro Amorim
Orient.: Sérgio de Freitas Oliveira
Um olhar pedagógico sobre o projeto cultural da FALE/BHtrans – “leitura para todos” – no interior dos ônibus:
repercussões e alternativas na prática da leitura...........................................................................................................................55
Cristiane Rute Machado da Silva
Mayara Marinho Silva Oliveira
Renata Cristina da Silva Sousa
Tamara Seabra de Souza
Orient.: Vera Lúcia Lins Sant’Anna
Importância da contação de histórias como prática educativa no cotidiano escolar...................................................................61
Divina Lúcia de Souza Medeiros Neder
Érica Cristina Silva Almeida
Liziane Aparecida Leite Cunha
Lucilene Cristiane da Silva Fernandes
Tatiana Lage de Castro
Thaissa Cristina de Almeida
Orient.: Vera Lúcia Lins Sant’Anna
Pedagogia em Ação
Belo Horizonte
v. 1
n. 1
p. 1-141
jun. 2009
O desenho como prática educativa na educação infantil: um salto qualitativo na aprendizagem.............................................65
Douglas de Castro Seabra
Heloísa Helena Galúcio da Costa Aguiar
Márcia de Souza dos Santos
Simone Cristina Fernandes
Wanda Maria Soares Gomes Ribeiro
Orient.: Vera Lúcia Lins Sant’Anna
A realidade sobre a inclusão de alunos com necessidades educacionais especiais na escola comum .........................................71
Ecleide Assis de Souza
Orient.: Sérgio de Freitas Oliveira
A prática pedagógica diante da violência escolar: perspectivas e desafios....................................................................................75
Elizabeth Rodrigues Ramos
Kele da Conceição Coelho
Maria de Fátima Guimarães Francisco
Orient.: Vera Lúcia Lins Sant’Anna
Práticas pedagógicas em ambientes hospitalares: potencializando a saúde através da educação...............................................81
Érica Cristina Silva Almeida
Orient.: Maria Eugênia Castelo Branco Albinati
A contribuição dos softwares educativos para a construção do conhecimento ...........................................................................87
Fernando Soares Silva
Orient.: Sheilla Alessandra Brasileiro de Menezes
Hiperlexia: sua complexidade e características..............................................................................................................................93
Irene de Fátima Alves Ribeiro
Raquel Christina Moreira Lemos
Orient.: Vera Lúcia Lins Sant’Anna
Indisciplina: possível indício de dificuldade de aprendizagem . ...................................................................................................97
Kely Aparecida de Oliveira
Orient.: Sérgio de Freitas Oliveira
A Educação Religiosa no ensino fundamental: desafios e perspectivas à prática docente...........................................................99
Luzinete Rodrigues dos Santos
Michelle Lopes Faria
Nilmair Machado de Oliveira
Pollyana Patrícia Dada
Sheilla Letícia de Castro Ferreira
Vanessa Pereira de Carvalho
Vívian Souza Ribeiro
Orient.: Vera Lúcia Lins Sant’Anna
Transtorno de conduta . ...............................................................................................................................................................107
Michelle MarquesTeixeira Ornelas
Orient.: Sérgio de Freitas Oliveira
Inclusão e escolarização de alunos autistas.................................................................................................................................111
Regiane de Carvalho
Orient.: Sérgio de Freitas Oliveira
Comunicações
A voz no trabalho docente ...........................................................................................................................................................117
Gustavo Bruno Bicalho Gonçalves
O processo ensino-aprendizagem do aluno com síndrome de Down na rede regular de ensino ..............................................121
Jaqueline Soares Fonseca
Orient.: Sérgio de Freitas Oliveira
Pedagogia em Ação
Belo Horizonte
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p. 1-141
jun. 2009
Escrita de sinais: uma nova trajetória para pessoas surdas .......................................................................................................123
Neusa Donata de Souza Nascimento
Orient.: Sérgio de Freitas Oliveira
A força da pedagogia tradicional: uma explicação......................................................................................................................125
Sérgio de Freitas Oliveira
Escola e tecnologia: uma aliança necessária................................................................................................................................127
Sérgio de Freitas Oliveira
A Educação Especial e a Inclusão Social .....................................................................................................................................129
Soraya Fátima dos Santos
Orient.: Sérgio de Freitas Oliveira
Resumos de Monografias / TCC
A influência do pedagogo na elaboração qualitativa de softwares educativos: um estudo comparativo da
participação desse profissional na elaboração de programas......................................................................................................133
CUNHA, Adriana Santos; GUEDES, Ana Karina Vieira; FERNANDES, Cíntia Maria Roque; SOUSA, Elaine Fernandes de;
PINHEIRO, Elizângela Chagas
A contribuição ludo-pedagógica no processo de aprendizagem no universo da educação infantil...........................................134
SILVA, Adriane Vieira da; ANTÔNIO, Andréia Aparecida; JESUS, Marilu Ferreira de; BARBOSA, Patricía Maria; REZENDE,
Sandra Maria Fontes
Escolas-Referência: proposta mineira de educação na pauta das políticas públicas educacionais vigentes..............................135
LOPES, Ana Lúcia de Souza; GOMES CÓ, Ivone; COSTA, Luciana Tereza Silva
Educar para preservar. A educação ambiental no cotidiano escolar como possibilidade propulsora de uma
geração ecológica..........................................................................................................................................................................136
ALCÂNTARA, Bárbara Regina Rodrigues de; SANTOS, Cátia Regina Ferreira dos; SOARES, Íris Nazaré Nogueira; ROCHA,
Letícia Aparecida; SILVA, Renata Soares Reis da; AGUIAR, Selma Ferreira
O fracasso escolar como desencadeador da exclusão no ato educativo: perspectivas e desafios................................................137
SOUZA, Deise Keli de; ALEME, Elisabeth Efigênia Duarte Severino; CURTY, Lucimar; GUARDA, Márcia Rivane; SILVA, Sarah
Paulina da Silveira; LEITE, Vilma da Conceição Braga
A educação de jovens e adultos como fator de transformação social..........................................................................................138
ROCHA, Gabriela Alvarenga da; HENRIQUE, Mariana Carla Nassif; REGGIANI, Marina Costa Pinto
Pedagogia Afetiva: uma proposta alternativa que visa melhorar a qualidade da relação professor/aluno no processo
ensino aprendizagem....................................................................................................................................................................139
BATISTA, Irani; OLIVEIRA, Janaice Cândida de
Pedagogia Empresarial: as atribuições do pedagogo no setor de recursos humanos..................................................................140
SILVA, Ludmila Antunes da; ARAÚJO, Rafaela Luiza Barbosa; GARCIA, Renata Lacerda; REIS, Sheila Viana dos
O TDAH no cotidiano escolar: a importância de um trabalho multidisciplinar visando ao sucesso da aprendizagem..........141
COSTA, Luiza Fátima da Silva; DINIZ; Maria dos Anjos da Silva Carvalho; LACERDA; Marta Alves Marçal de; MENDES; Raquel
de Araújo Pereira
Pedagogia em Ação
Belo Horizonte
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n. 1
p. 1-141
jun. 2009
Apresentação
A Revista “Pedagogia em Ação” se dá em função da necessidade de reconhecer o papel que o profissional da área de educação tem sobre si. O Curso
de Pedagogia da PUC Minas tem procurado oferecer ao aluno uma sólida formação com ênfase em
conhecimento teórico e prático sobre as diferentes
ações educativas e ampliar a atuação do pedagogo
com senso crítico inovador e comprometido com a
construção de uma nova ordem social, com domínio
de conhecimentos referentes à Educação em seus
aspectos legais, sociais, filosóficos, metodológicos e
administrativos.
O resultado desta Revista são práticas investigativas vivenciadas associadas à educação escolar e
não escolar e às práticas de pesquisas cotidianas de
professores(as) e alunos(as); investindo, assim, numa
forte orientação para a pesquisa seja como prática
acadêmica seja como atitude. Ressaltem-se, aí, os
vínculos entre o ensino, a pesquisa e a extensão.
A proposta da Revista fundamenta-se em quatro princípios básicos: flexibilidade, autonomia, integração e atualização. Tais competências e habilidades
se constroem nos diversos espaços de aprendizagem
que configuram a trajetória da vida cotidiana na
Academia.
A diversidade das temáticas abordadas na Revista decorre da amplitude do campo de ação da Pedagogia. Por essa razão, a escolha do nome da revista Pedagogia em Ação, retratando não simplesmente a
dimensão teórica, mas enfatizando a prática pedagógica num constante processo de ação-reflexão-ação.
Prof. Sérgio de Freitas Oliveira
[email protected]
Profa. Vera Lucia Lins Sant’Anna
[email protected]
Pedagogia em Ação, v. 1, n. 1, p. 1-141, jan./jun. 2009 - Semestral
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Editorial
Uma Revista nasce da necessidade de troca de
experiências pela via da aquisição de informações,
do resultado do esforço coletivo no envolvimento de
pessoas que sistematizam suas reflexões, materializando-as em forma de textos, como instrumento de
divulgação das produções tanto de alunos (as) quanto de professores (as), mas, sobretudo, da vontade de
realizar recursos ou meios que possibilitam intercâmbio de experiências.
A Primeira Revista Eletrônica do Curso de
Pedagogia “Pedagogia em Ação” é fruto do esforço de
uns, mas com a finalidade de servir a todos que dela
usufruírem.
Esta publicação contempla o leitor com artigos diversificados, atendendo à necessidade multidisciplinar que orienta as análises dos fenômenos
educativos da atualidade.
Nosso desejo é de que a “Pedagogia em Ação”
traga aos seus leitores satisfação e crescimento intelectual, considerando que Ensino não se faz apenas nas salas de aula, mas divulgando ideias e
conhecimentos.
Àqueles que contribuíram para o lançamento
do 1º número, nossos cumprimentos, e aos demais,
nosso convite a contribuições futuras, a fim de que
possamos parafrasear o Professor Eurico Vieira de
Resende, bradando “Esta revista veio para ficar”, e
compartilhar ideias e ideais.
Bom proveito nesta leitura.
Profa. Maria Salete Chaves
Chefe do Departamento de Educação
Coordenadora do Curso de Pedagogia
[email protected]
Pedagogia em Ação, v. 1, n. 1, p. 1-141, jan./jun. 2009 - Semestral
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Artigos de Professores
Dimensões do processo ensino-aprendizagem:
desafios à prática docente
Vera Lúcia Lins Sant’Anna *
Resumo
Este trabalho propõe-se a colocar em discussão os postulados e princípios que têm orientado as
dimensões do processo ensino-aprendizagem no atual contexto educacional. É necessário entender
os paradigmas de conhecimento que estão surgindo, o que permitirá ao profissional da educação vislumbrar possibilidades concretas de investigação de suas práticas educativas. Refletir sobre a sala de
aula com todas as suas contradições é o nosso objetivo, levantando questões que estejam organizadas
em torno da resolução de problemas práticos de sala de aula que sejam significativos para os sujeitos
envolvidos e que estejam, portanto, diretamente relacionados às concepções sobre ensino-aprendizagem veiculadas por eles nos diversos momentos do processo. O novo princípio educativo exige do
professor um novo perfil, que tenha domínio do fazer pedagógico, novas atitudes e comportamentos
perante a sociedade e sua prática docente.
Palavras-chave: Educação; Ensino-aprendizagem; Concepções; Desafios.
1 - Introdução
D
iante de tantas transformações advindas
do processo de globalização, em que o
quadro educacional brasileiro aparece
como um “caleidoscópio”, as dificuldades e dilemas educacionais e as contradições pedagógicas tornaram-se conflitantes, gerando ansiedade,
repetições e pseudossoluções.
Na perspectiva educacional, a intensa luta entre
tradição e inovação ocorre por meio do dualismo teoria e prática, que se apresenta no processo educacional de forma difusa. É nessa passagem que surgem
as problematizações em busca de soluções no ato de
educar.
Tendências inovadoras têm despontado, propondo novas práticas, levando o educador ao desafio de transpor as rígidas fronteiras no campo de sua
atuação pedagógica. Essas novas tendências que perpassam no contexto educacional refletindo não apenas o político-econômico, mas também a prática da
realidade tem gerado constantes discussões sobre
metodologias no processo ensino-aprendizagem que
sejam coerentes com a realidade complexa e heterogênea da sociedade brasileira.
Diante deste quadro, é preciso pensar em Propostas de Educação que não sejam antagônicas às
propostas formais e à realidade efetiva, mas que ao
formulá-las tenha-se como prioridade uma prática
pedagógica coerente com o “olhar e pensar” do nosso tempo, sem desprezar as propostas mais distantes que poderão propiciar “pistas” para propor novas
alternativas pedagógicas dos dilemas educacionais
pertinentes às exigências do terceiro milênio. Nesse
sentido, ressaltam-se as palavras do educador Paulo
Freire:
[...] viver a abertura respeitosa aos outros e, de quando em
vez, de acordo com o momento, tomar a prática de abertura ao outro como objeto da reflexão crítica deveria fazer parte da aventura docente. A experiência da abertura
como experiência fundante do ser inacabado que terminou por ser inacabado. Seria impossível. Saber-se inacabado e não se abrir ao mundo e aos outros à procura de
explicação, de respostas a múltiplas perguntas. O fechamento ao mundo e aos outros se torna transgressão ao impulso natural da incompletude. (FREIRE, 2000 p. 153).
O grande desafio hoje é articular o saber e o fazer no cotidiano educacional, como forma de produzir propostas que assumam um caráter investigador
*
Professora pesquisadora da PUC Minas (Departamento de Educação), Doutora em Ciências da Religião (Ciências Sociais e
Religião - UMESP), Mestre em Educação (Univ. Mackenzie - SP). E-mail: [email protected]
Pedagogia em Ação, v. 1, n. 1, p. 1-141, jan./jun. 2009 - Semestral
15
Vera Lúcia Lins Sant’Anna
na procura de uma nova síntese para pensar a educação, trazendo sempre embutida ideias que orientem
e mobilizem as esperanças, uma vez que a pedagogia sempre alimentou utopias, considerando, porém,
que essas utopias não seriam “utopias quiméricas”,
mas trata-se, sem duvida, de descobrir novos conhecimentos, inventar novas técnicas e explorar ou criar
“novas realidades”. Assim, a educação deverá superar e enfrentar uma série de impedimentos de ordem
econômica, política e burocrática, no que diz respeito não só à determinação dos valores, mas também
aos padrões dos sistemas educacionais, uma vez que
a realidade do espaço pedagógico reside na diversidade das funções que exerce, bem como na intensidade deste exercício.
A concepção de que o processo de ensino-aprendizagem é uma unidade dialética entre a instrução e
a educação está associada à idéia de que igual característica existe entre ensinar e aprender. Esta relação nos remete a uma concepção de que o processo de ensino-aprendizagem tem uma estrutura e um
funcionamento sistêmico, isto é, está composto por
elementos estreitamente inter-relacionados. Deve-se
estar atento à necessidade de envolver o aluno com
as diferentes práticas educativas propostas para a sua
formação, de modo que todos percebam o porquê
de se estar realizando cada atividade proposta. Com
isso, rompe-se a visão de alienação do aluno com relação aos objetivos e ao processo educativo.
Conforme afirma Perrenoud:
2 - Uma visão paradigmática do fazer pedagó-
O sistema educativo construiu-se de cima para baixo.
É por isso que as mesmas constatações valem, até certo
ponto, para o ensino médio e, em menor medida, para
o ensino fundamental. Quando os alunos são crianças
ou adolescentes, eles são menos numerosos e o ensino
é mais interativo; há mais possibilidades de exercícios e
experiências feitas por eles (e não diante deles). Entretanto, enquanto praticarem uma pedagogia magistral e
pouco diferenciada, os professores não dominarão verdadeiramente as situações de aprendizagem nas quais
colocam cada um de seus alunos. No máximo, podem
velar, usando meios disciplinares clássicos, para que todos os alunos escutem com atenção e envolvam-se ativamente, pelo menos em aparência, nas tarefas atribuídas. A reflexão sobre as situações didáticas começa com
a questão de Saint-Onge (1996): “Eu, ensino, mas eles
aprendem?”. (PERRENOUD, 2001 , p. 24).
gico
Refletir sobre a educação requer aberturas para
repensar e compreendê-la como um fenômeno processual que é permeado pela existência das múltiplas relações que se estabelecem com os outros no
cotidiano.
No campo da educação, destacam-se: a complexidade das estruturas e das relações sociais, a difusão
das novas tecnologias que vêm invadindo o cotidiano
de todo cidadão, principalmente através do meio urbano. Nessa perspectiva, os diferentes grupos sociais
elaboram seus sonhos e projetos, pensando em como
interagir com essa sociedade para que possam usufruir dela de forma positiva. É também nesse contexto que se vêm disputando diferentes concepções
pedagógicas sobre as práticas educativas no processo
ensino-aprendizagem.
A eficácia do processo de ensino-aprendizagem
está na resposta em que este dá à apropriação do conhecimento, ao desenvolvimento intelectual e físico
do estudante, à formação de sentimentos, qualidades
e valores, que alcancem os objetivos gerais e específicos propostos em cada nível de ensino de diferentes
instituições, conduzindo a uma posição transformadora, que promova as ações coletivas, a solidariedade
e o viver em comunidade. Por isso é preciso tornar os
saberes significativos e interessantes. É necessário ao
aluno compreender com total clareza a importância
deles e como eles se articulam com outros saberes da
vida no processo de construção de seu conhecimento.
16
Nas últimas décadas, o movimento da escola
ativa e o enfoque construtivista de educação passaram por importantes mudanças nas suas propostas
tanto pedagógicas quanto sociais da ação educativa
que abrangem todo o sistema. Por um lado, temos o
desenvolvimento das potencialidades do pensamento em termos de valor, comunicação e criação. Por
outro, temos, em relação aos conteúdos de aprendizagem, a inclusão explícita de conteúdos de valores
e de procedimentos em termos do “saber fazer”, um
complexo orientado à resolução de problemas.
Perrenoud, ao fazer algumas alusões a esta questão, afirma:
Desde Bourdieu (1966), sabe-se que só aprendem verdadeiramente, por meio dessa pedagogia, os “herdeiros”,
aqueles que dispõem dos meios culturais para tirar proPedagogia em Ação, v. 1, n. 1, p. 1-141, jan./jun. 2009 - Semestral
Dimensões do processo ensino-aprendizagem: desafios à prática docente
veito de uma formação que se dirige formalmente a todos, na ilusão da equidade, identificada nesse caso pela
igualdade de tratamento. Isso parece evidente hoje em
dia. No entanto, foi necessário um século de escolaridade obrigatória para se começar a questionar esse modelo,
opondo-lhe um modelo mais centrado nos aprendizes,
suas representações, sua atividade, as situações concretas nas quais são mergulhados e seus efeitos didáticos.
Sem dúvida, essa evolução - inacabada e frágil - tem
vínculos com a abertura dos estudos longos a novos públicos, o que obriga a se preocupar com aqueles para
os quais assistir a uma aula magistral e fazer exercícios
não é suficiente para aprender. Há laços estreitos entre a
pedagogia diferenciada e a reflexão sobre as situações de
aprendizagem. (PERRENOUD, 2000, p. 24).
Outro aspecto fundamental das novas concepções pedagógicas é a Pedagogia das Competências,
que vem impondo novos desafios ao educador: romper os limites da formação fragmentada e reconstruir
as relações de áreas específicas de conhecimento com
outras áreas de saber correlatas. Trabalhar nessa perspectiva exige um redimensionar das práticas educativas. O educador deve ter não apenas a aquisição de
conhecimentos cognitivos, como a de outros saberes
e competências sociais, políticas e instrumentais, ou
seja: saber, saber ser e fazer.
De acordo com Libâneo, o professor, “ao dirigir e estimular o processo de ensino em função da
aprendizagem dos alunos, utiliza intencionalmente
um conjunto de ações, passos, condições externas e
procedimentos a que chamamos métodos de ensino”.
(LIBÂNEO, 1994, p. 150).
Sob tal concepção, o processo ensino-aprendizagem depende da competência técnica do professor.
Logo, os métodos devem ser eficazes, estimuladores
e criativos, no entanto, se o docente teve uma formação teórica cheia de “tecnicismos” sem uma proposta
de redefinição dos conteúdos e métodos utilizados,
dificilmente se verá mudança nos profissionais da
Educação. Sairão da Universidade com os conhecimentos que aprenderam e começarão a transmiti-los
numa cadeia infinita. O professor é sempre professor, não importa se universitário ou de Ensino Fundamental ou Médio. Ele deve ter as habilidades e
competências necessárias, conforme as exigências de
cada estágio, turma ou momento vivido.
Cabe ao professor-educador descobrir, efetivamente,
como ser sujeito em diálogo com a realidade, com o aluno; ao aluno, fazer-se sujeito em diálogo com o profesPedagogia em Ação, v. 1, n. 1, p. 1-141, jan./jun. 2009 - Semestral
sor, com os demais companheiros, com a realidade social
política, econômica e cultural, para que nessa busca de
interação seja construída a universidade, que jamais poderá existir sem professor e aluno voltados para a criação
e construção do saber engajado, por isso transformado.
(LUCKESI, 1991, p. 44).
O educando traz consigo uma história de vida,
modos de viver e experiências culturais que devem
ser valorizados no seu processo de desenvolvimento. Essa valorização se dá a partir do momento em
que ele tem a oportunidade de decidir, opinar, debater, construir sua autonomia e seu comprometimento
com o social, identificando-se como sujeito que usufrui e produz cultura.
Contudo, percebem-se alguns modelos educacionais e identificam-se algumas raízes desses modelos, que fundamentam a prática pedagógica, mostrando a educação à luz das diferentes propostas
didático-pedagógicas.
Nesta perspectiva, Charlot afirma:
[...] O professor, ao mesmo tempo em que contribui
para a reprodução social, transmite saberes, instrui,
educa, forma. Não se pode socializar sem que disso, ao
mesmo tempo, resulte uma certa forma do humano e do
sujeito. O movimento de abertura da escola apresenta,
pois, simultaneamente, efeitos culturais e pedagógicos.
(CHARLOT, 2005, p. 82).
Neste contexto, as propostas de mudanças nos
paradigmas do conhecimento tornam-se relevantes diante deste mundo complexo e de profundas
transformações.
Por que buscar novos paradigmas? Estamos fazendo apenas reavaliação de rotina? Não estamos
mais satisfeitos com os paradigmas até aqui em vigor? Houve mudanças que nos indicam a necessidade de atualização? A discussão sobre os paradigmas,
seus limites e anomalias tem por finalidade desenvolver no professor investigador de sua prática a necessária humildade para reconhecer o desafio das
experiências inovadoras e dos grupos que as desenvolvem está em tirar delas as lições aprendidas, que
lhes permitam melhorar o processo ensino-aprendizagem, assim como alimentar as políticas educativas.
O objetivo das Instituições Escolares é sistematizar,
explicar o conhecimento construído e “pôr em serviço” o aprendido.
17
Vera Lúcia Lins Sant’Anna
Uma mudança qualitativa no processo de ensino-aprendizagem acontece quando conseguimos integrar dentro de uma visão inovadora todas as metodologias significativas e pertinentes ao aprendizado
do aluno. Este critério seria um ponto fundamental
para superar o acentuado grau de verificação da investigação educativa acompanhado, no entanto, de
um baixo grau de proposição. Este, aliás, é um problema já apontado com propriedade, inclusive na relação da cultura dos movimentos sociais com o ato
educativo, segundo a formulação de uma ação cultural para a liberdade na visão de Freire:
Considerando, porém, que o ato de desvelar a realidade, indiscutivelmente importante, não significa engajamento automático na ação transformadora da mesma,
o problema que nos apresenta é de encontrar, em cada
realidade histórica, os caminhos de ida e volta entre o
desvelamento da realidade e a prática dirigida no sentido de sua transformação. (FREIRE, 1982, p. 60).
Nesta perspectiva, é possível interpretar que os
caminhos de ida e volta, na verdade, são uma constante ação-reflexão na prática educativa num constante que-fazer. O que necessariamente implica em
redimensionar os sentidos metodológicos e epistemológicos da investigação educativa, ante a realidade
sociocultural desafiadora.
A forma de entender o ato educativo é, quase
sempre, responsável pelo enfoque dado na ação e organização do trabalho escolar. Por exemplo, existem
leituras de mundo revestidas de ideais de promover
práticas educativas solidárias que primam pela elevação da cultura humana e da justiça social. Estas, normalmente, têm claro o componente político de que
está imbricado o espaço pedagógico.
Assim, entendendo que o currículo escolar e as
práticas educativas devem levar em conta as experiências cotidianas das crianças, adolescentes e jovens
que frequentam a escola, dando especial atenção às
práticas culturais vivenciadas por elas na família e
na comunidade, a fim de estabelecer uma interação
constante entre os conhecimentos escolares e os saberes, valores e práticas da vida cotidiana.
Considerando-se que os indivíduos e os grupos
culturais aos quais pertencem possuem diferentes e
complexas características, compreender e aceitar a
diversidade cultural é condição primeira para quem
18
pretende realizar uma atividade educacional crítica e
voltada para a construção da cidadania.
Jean-Claude Forquin (1993) ressalta que a escola deve buscar a aproximação entre os conteúdos
escolares e as experiências da vida cotidiana dos alunos. Afirmação relevante principalmente se considerarmos que a família é o grupo social onde se iniciam
as primeiras relações com o cotidiano, e a escola o
primeiro grupo social onde as crianças tomam contato com o não cotidiano. É necessário, então, que o
processo educativo faça a mediação entre os conhecimentos escolares e os saberes da vida cotidiana.
Em relação às práticas educativas, faz-se necessário investigar formas de valorizar e relacionar aos
conteúdos escolares as experiências vivenciadas pelos
educandos na família e na comunidade, com o objetivo de valorizar e fortalecer a identidade cultural do
grupo e, assim, propiciar condições para o exercício
pleno da cidadania, sem deixar de considerar a complexidade das relações sociais, econômicas, políticas
e culturais que interferem na vida da comunidade,
trabalhando junto aos educadores a construção de
novas práticas educativas, sensíveis às diferentes visões de mundo, valores, conceitos, conhecimentos e
práticas culturais, visando à adequação do currículo
escolar às condições de vida dos alunos.
Neste sentido:
A práxis é a atividade concreta pela qual os sujeitos se
afirmam no mundo, modificando a realidade objetiva e,
para poderem alterá-la, transformando-se a si mesmos.
É a ação que, para se aprofundar de maneira mais consequente, precisa de reflexão, do autoquestionamento, da
teoria; e é a teoria que remete à ação, que enfrenta o
desafio de verificar seus acertos e desacertos cotejandoos com a prática (KONDER apud FRIGOTTO, 1996,
p. 100).
As práticas educativas, neste caso, fazem a mediação entre o teórico e o mundo, tendo como partícipes professores, alunos, funcionários e familiares,
alicerçados no engajamento, no compromisso, na reflexão, na intencionalidade de mudar. Práticas educativas são tessituras em movimento entre a inclusão e a exclusão, em busca de uma formação humana
para educandos e educadores.
Morin (2001, p.12), ao referir-se à relação ensino e educação, afirma que:
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Dimensões do processo ensino-aprendizagem: desafios à prática docente
a)Educar é organizar uma série de atividades didáticas
para ajudar os alunos a compreender áreas específicas
do conhecimento (ciências, história, matemática);
b)Educar é descobrir potencialidades, refazer caminhos, é
respeitar a autonomia do educando;
c)Educar é relacionar teoria e prática, é aprender a refletir
e refletir junto, é desconstruir a ciência com um novo
olhar;
d) Educar é valorizar o que o aluno traz da família, da rua
e da sociedade;
e)Educar é trabalhar a emoção, o sensorial, o intelecto e a
intuição.
Educar é, pois, incentivar a curiosidade e a admiração que levam à descoberta do novo. A problematização do mundo, matéria-prima dos processos
educacionais, sejam quais forem os conteúdos que
abarquem, necessita da construção não somente de
novas metodologias, mas de metodologias que se
edifiquem por sobre novas sensibilidades, que podem ser compreendidas por meio da cultura midiática. No entanto, as questões educacionais ainda
se encontram no círculo vicioso de seus problemas
viscerais não superados. As próprias tentativas de
resolução desses problemas, apesar de terem como
parâmetro as novas linguagens que a tecnologia ajuda a construir, são infrutíferas à medida que deixam
questões essenciais em aberto.
Espera-se que as doutrinas ou concepções pedagógicas que norteiam nossas práticas possam, por
outro lado, ser questionadas, criticadas e revistas ou,
como explica Cury (1997), que as diretrizes curriculares possam ser traduzidas em diferentes programas
de ensino e, como toda e qualquer realidade, possam
também ser entendidas como resultado de diálogos,
dissensos, controvérsias etc. Assim sendo, as diretrizes não são inacabadas.
Com efeito, a construção do objeto interdisciplinar não nos parece tarefa de fácil realização. A partir de problemáticas, teorias e novas abordagens, entendemos ser possível propor o aprofundamento da
discussão como forma de nos posicionarmos diante
da complexidade que a questão contém. Como muitos educadores têm observado, precisamos recorrer
às reflexões acadêmicas que tratam das questões sobre as qualidades a serem desenvolvidas na vida social, especialmente, se quisermos avançar em termos
Pedagogia em Ação, v. 1, n. 1, p. 1-141, jan./jun. 2009 - Semestral
do verdadeiro debate sobre a qualidade da educação
em nosso país.
Como já vimos, a idéia de preparar melhor o
aluno para um mundo em transformação permanente não depende apenas de melhores recursos didáticos, de melhores condições de trabalho ou da qualificação dos professores, é preciso considerar que
nesse processo de formação, cada vez mais complexo, a educação adquire um outro sentido. Para além
de uma sólida formação científica e cultural, o aluno deve ser preparado para enfrentar os desafios do
mundo contemporâneo do trabalho.
Para além de um de conceito que amplia de forma considerável a nossa percepção acerca dos pressupostos filosóficos, objetivos e conteúdos das disciplinas escolares, a interdisciplinaridade é uma noção
que supõe a existência de diálogos e interações entre professores das diferentes áreas do conhecimento.
De grande valor e interesse para o desenvolvimento do processo ensino-aprendizagem que perpassa
todas as disciplinas escolares, a interdisciplinaridade pode resumir também a ideia de que o processo de construção do conhecimento pelo educando
passa necessariamente pela afirmação de um projeto
curricular, como dimensão cultural, epistemológica e
metodológica do projeto escolar. A formação de um
pensar crítico e categorial caminha, portanto, com a
formação de um pensar social, comprometido e engajado em um Projeto de Sociedade.
A reflexão contínua favorece a metacognição
que, de acordo com Vygotsky (1991), pode significar
a tomada de consciência frente à realidade e à própria aprendizagem. Através da tomada de consciência
frente ao que se sabe e ao que não se sabe, as mudanças podem ser gestadas. Dessa forma, uma aprendizagem significativa pode ocorrer quando se promove
um ensino capaz de provocar mudanças no processo de pensar dos sujeitos, alicerçado numa abordagem de conhecimento interdisciplinar, inserido num
constante processo de ação – reflexão – ação.
Vygotsky diz ainda que:
[...] o pensamento propriamente dito é gerado pela motivação, isto é, por nossos desejos e necessidades, nossos
interesses e emoções. Por trás de cada pensamento há
uma tendência afetivo-volitiva. Uma compreensão plena e verdadeira do pensamento de outrem só é possível
quando entendemos sua base afetivo-volitiva. A linguagem seria então o motor do pensamento, contrariando
19
Vera Lúcia Lins Sant’Anna
assim a concepção desenvolvimentista que considera o
desenvolvimento a base para a aquisição da linguagem.
Vygotsky defende que os processos de desenvolvimento
não coincidem com os processos de aprendizagem, uma
vez que o desenvolvimento progride de forma mais lenta, indo atrás do processo de aprendizagem. Isto ocorre
de forma sequencial. (VYGOTSKY, 1991, p. 101-102).
Compreender o processo de ensino-aprendizagem considerando a abordagem histórico-cultural
significa compreender dialeticamente o homem e
sua relação com o mundo e com a natureza, inserido
num campo de significados. Neste sentido, entendese o desenvolvimento da complexidade humana num
processo interativo que envolve experiências históricas e culturais.
A Epistemologia Genética é a teoria desenvolvida por Jean Piaget, e consiste numa combinação das
teorias então existentes, o apriorismo e o empirismo.
Piaget não acredita que todo o conhecimento seja
inerente ao próprio sujeito, como postula o apriorismo, nem que o conhecimento provenha totalmente
das observações do meio que o cerca, como postula
o empirismo. Para Piaget, o conhecimento é gerado
através de uma interação do sujeito com seu meio, a
partir de estruturas existentes no sujeito. Assim sendo, a aquisição de conhecimentos depende tanto das
estruturas cognitivas do sujeito como de sua relação
com o objeto.
Piaget afirma que:
[...] adquirida a linguagem, a socialização do pensamento manifesta-se pela elaboração de conceitos e relações
e pela constituição de regras. É justamente na medida,
até, que o pensamento verbo-conceptual é transformado
pela sua natureza coletiva que ele se torna capaz de comprovar e investigar a verdade, em contraste com os atos
práticos dos atos da inteligência sensório-motora e a sua
busca de êxito ou satisfação. (PIAGET, 1975, p. 115).
Na concepção piagetiana, a aprendizagem só
ocorre mediante a consolidação das estruturas de
pensamento, portanto a aprendizagem sempre se
dá após a consolidação do esquema que a suporta,
da mesma forma a passagem de um estádio a outro
estaria dependente da consolidação e superação do
anterior.
Os estudos de Vygotsky postulam uma dialética das interações com o outro e com o meio, como
desencadeadora do desenvolvimento. Para Vygotsky
20
e seus colaboradores, o desenvolvimento é impulsionado pela linguagem. Eles acreditam que a estrutura
dos estádios descrita por Piaget seja correta, porém
diferem na concepção de sua dinâmica evolutiva. Enquanto Piaget defende que a estruturação do organismo precede o desenvolvimento, para Vygotsky é o
próprio processo de aprender que gera e promove o
desenvolvimento das estruturas mentais superiores.
Nessa concepção, as interações têm um papel
crucial e determinante. Para definir o conhecimento
real, Vygotsky sugere que se avalie o que o sujeito é
capaz de fazer sozinho, e o potencial, aquilo que ele
consegue fazer com ajuda de outro sujeito. Assim,
determina-se a Zona de Desenvolvimento Proximal
(ZDP) e o nível de riqueza e diversidade das interações determinará o potencial atingido. Quanto mais
ricas as interações, maior e mais sofisticado será o
desenvolvimento.
No processo de ensino-aprendizagem, a mediação favorece a reflexão, respaldada na “coerência” que deve acompanhar a elaboração e execução
do planejamento. O papel do professor passa a ser
o de mediador, alguém que planeja usando de intervenções, encaminhamentos e devoluções para promover o crescimento dos seus alunos, favorecendo o
alcance da autonomia, através do desenvolvimento
do pensar.
A construção do conhecimento se realiza no espaço das representações, constituído por concepções
de várias ordens e pela vivência. Neste espaço, se estabelecem os embates, as contradições, o mal-estar,
onde se dão as relações com o outro (autores, pessoas distantes ou presentes), as relações sociais. Assim,
a sala de aula, os encontros de formação/capacitação no interior das organizações ou fora destas são
espaços de buscas, esforços e de produção de novos
conhecimentos.
Esse paradigma de procura de uma unidade dinâmica
entre os saberes constitui, ao nosso ver, um modelo a
transpor para a escola, quer entre professores dos diferentes grupos disciplinares, quer entre os professores
do mesmo grupo. No plano pedagógico, a análise das
concepções dos alunos parece, assim, justificar-se como
ponto de partida para um caminho dialéctico para cada
disciplina e, também, para um caminho integrador dos
vários saberes numa perspectiva de construção pessoal
que constitui a aprendizagem. (DUARTE, 2005).
Pedagogia em Ação, v. 1, n. 1, p. 1-141, jan./jun. 2009 - Semestral
Dimensões do processo ensino-aprendizagem: desafios à prática docente
Através da mediação, o processo de aprendizagem avança e impulsiona o desenvolvimento dos
indivíduos.
Para Demo (2000), uma aula é construída e o
professor tem o poder de planejá-la, o que pode caracterizar o processo como diretivo.
Na concepção democrática de educação, o planejamento pode ser socializado antecipadamente
através da pauta do encontro, possibilitando ao aluno/trabalhador incluir suas idéias e sugestões. Porém, a participação do trabalhador no processo de
construção da aula/encontro não se restringe a isso.
Este participa também quando faz intervenções, e
sugere encaminhamentos tanto ao professor, quanto
ao próprio grupo.
O processo de mediação, que pode estar alicerçado nas intervenções, encaminhamentos e devoluções, são para Madalena Freire (1995, p.14) “ingredientes do processo de ensino-aprendizagem”.
Além de intervenções, o processo de ensino aprendizagem requer encaminhamentos. Estes se
constituem de:
[...] propostas de atividades dentro da rotina da aula, as
tarefas, os passos a seguir em determinada atividades.
[...] É através dos encaminhamentos que o educador direciona, organiza, delimita o caminho do pensar, sobre
o conteúdo em estudo. Os encaminhamentos oferecem
espaço a interação do sujeito com o objeto do conhecimento. (FREIRE, 1995, p.15).
Percebe-se que as intervenções permitem ao
professor levantar “outras” perspectivas, ou questões
e visões diferentes daquelas que o aluno tem ou hipotetiza. Já os encaminhamentos correspondem ao
“fazer” propriamente dito durante o processo de
aprendizagem. É através deste processo pelo qual o
educador vai construindo os movimentos da devolução, que significa a concretização e a sistematização
dos conhecimentos que estão sendo construídos.
[...] Mas para que isto aconteça, é preciso que eles tenham tido oportunidade de pensar, expor, discutir e
rever idéias, compartilhando e negociando diferenças
de pontos de vista, desconstruindo opiniões apressadas,
contextualizando e problematizando outras, fazendo
previsões, propondo novas alternativas para tentar superar as deficiências detectadas. (CASTRO & CARVALHO, 2001, p.129).
Pedagogia em Ação, v. 1, n. 1, p. 1-141, jan./jun. 2009 - Semestral
A educação deve promover, portanto, a transformação da sociedade, optando por novas relações cotidianas de poder, onde um número cada vez maior
de pessoas possa intervir no grupo social e nas tomadas de decisões. Estas novas relações, baseadas numa
concepção democrática de mundo, pressupõem uma
nova intersubjetividade, onde valores como justiça,
liberdade e solidariedade possam ser vivenciados.
Neste contexto, a concepção metodológica que
embasa as práticas pedagógicas nos processos de formação (especificamente em cursos) ou nos ambientes cotidianos de aprendizagem (nas Organizações
de Aprendizagem) são frutos das visões de mundo,
de educação, de homem e de sociedade dos educadores, gerentes, líderes/coordenadores e da própria
Instituição, expressa no seu Projeto Político/Estratégico. Este passa a ser visto como mediador, articulador de conhecimento e pensamento nos processos de
formação, coordenador dos grupos, promotor de um
ambiente indagador e desafiador.
Como sujeito, vale-se de instrumentos específicos da sua tarefa de ensinar, com a intenção de promover mudanças no comportamento de seus alunos.
Tais instrumentos - intervenção, encaminhamento e
devolução - respaldam a mediação no processo de
construção do conhecimento. Neste sentido, tornase imprescindível a leitura das mais variadas linguagens que compõem as práticas cotidianas.
Em todas as instâncias nas quais educadores reúnem-se para discutir sobre educação, parece haver
um consenso de que a educação básica deveria visar
fundamentalmente à preparação para o exercício da
cidadania, cabendo à escola formar o aprendiz em
conhecimentos, habilidades, valores, atitudes, formas
de pensar e atuar na sociedade através de uma aprendizagem que seja significativa. De fato, para que uma
aprendizagem ocorra, ela deve ser significativa, o que
exige que seja vista como a compreensão de significados, relacionando-se às experiências anteriores e
vivências pessoais dos aprendizes, permitindo a formulação de problemas desafiantes que incentivem o
aprender mais, o estabelecimento de diferentes tipos de relações entre fatos, objetos, acontecimentos,
noções e conceitos, desencadeando modificações de
comportamentos e contribuindo para a utilização do
que é aprendido em diferentes situações.
Se pensarmos na aprendizagem significativa
como o estabelecimento de relações entre significa-
21
Vera Lúcia Lins Sant’Anna
dos, os preceitos de precisão, linearidade, hierarquia,
encadeamento que estão presentes na escola, na organização do currículo e na seleção das atividades,
devem dar lugar a outras perspectivas na qual o conhecimento pode ser visto como uma rede de significados, em permanente processo de transformação
no qual, a cada nova interação, a cada possibilidade
de diferentes interpretações, uma nova ramificação
se abre, um significado se transforma, novas relações
se estabelecem, possibilidades de compreensão são
criadas. Nesse sentido, rompendo com as teorias lineares que dão sustentação ao modelo tradicional de
ensino, em que existem pré-requisitos, etapas rígidas e formais de ensino e aprendizagem, cadeias de
conteúdos, escalas de avaliação da aprendizagem, a
teoria do conhecimento como rede sustenta que a
apreensão de um conceito, idéia, fato, procedimento, faz-se através das múltiplas relações que aquele
que aprende faz entre os diferentes significados desse
mesmo conceito.
3 - Considerações F inais
Nessa perspectiva, o processo de ensino - aprendizagem deve primar por ampliar as dimensões dos
conteúdos específicos dos diversos componentes curriculares, incluindo ações que possibilitem o desenvolvimento e a valorização de todas as competências
e habilidades do educando.
Sendo a escola o local tanto da instrução como
da formação, é fundamental uma ação educativa que
contribua para a construção de uma cidadania fundada na solidariedade, na diversidade, no sincretismo
cultural, no reconhecimento e respeito às diferentes
formas de conhecer, sentir e agir.
Num contexto de globalização crescente, faz-se
necessária uma educação que respeite a diversidade
cultural e que entenda a escola como um espaço de
troca, de diálogo e de descoberta. Não é, entretanto, o que ocorre na maioria de nossas escolas. Nelas,
através de uma ação homogeneizadora a educação
escolar tem ignorado ou calado, com freqüência, as
diferenças e desigualdades dos seus alunos e alunas.
Por isso, a aula deve tornar-se um fórum de debate e negociação de concepções e representações da
realidade, um espaço de conhecimento compartilhado nos quais os aprendizes seja vistos como indivíduos capazes de construir, modificar e integrar idéias,
22
tendo a oportunidade de interagir com outras pessoas, com objetos e situações que exijam envolvimento,
dispondo de tempo para pensar e refletir acerca de
seus procedimentos, de suas aprendizagens, dos problemas que têm que superar.
Nesse sentido, a intenção de uma aprendizagem
significativa, exige uma avaliação a favor do aprendiz, que contribua para torná-lo consciente de seus
avanços e necessidades fazendo com que se sinta responsável por suas atitudes e sua aprendizagem.
O grande desafio à prática docente é a tarefa de
sociabilizar o conhecimento, os múltiplos saberes e a
construção coletiva, desenvolvendo assim, uma mediação por excelência no ato educativo.
ABSTRACT
The present work intends to put up argument about postulates and principles that have oriented the dimensions of the teaching-learning process in the nowadays educational context.
It is necessary to understand the knowledge paradigms that are
emerging, in order to permit that the education professionals
become aware of the concrete possibilities of investigation of
their educative practices. Our goal is to reflect upon the classroom with all of its contradictions, raising questions organized
in effort to solve classroom’s practical problems that are significant for the persons involved and that are, therefore, directly
related to the teaching-learning conceptions brought by them
in different moments of the process. The new educational principle requires from de teacher a new profile, such as having domain of the pedagogical methods and a new attitude and behavior before the society and its teaching practices.
Key words: Education; Teaching; Conception and challenge.
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Educação: a reflexão como elemento norteador na pesquisa e na
produção de conhecimento
Vicente Geraldo Amâncio Diniz Oliveira *
Resumo
O presente trabalho busca dar um enfoque filosófico-educacional acerca da pesquisa e sua implementação. Problematiza acerca da diferença de padrões metodológicos quantitativos e qualitativos,
mostrando seus limites e possibilidades. Acima de tudo, busca mostrar que a pesquisa precisa carregar em seu bojo o elemento da reflexão e da criticidade. Portanto, o papel do educador/pesquisador,
enquanto sujeito que se pensa e pensa a realidade, seria despertar no educando esta mesma postura
emancipadora questionadora e reflexiva na produção de conhecimento e na implementação da pesquisa.
Palavras-chave: Educação; Pesquisa; Produção do conhecimento.
1 - Introdução
E
m décadas passadas, constataram-se nos
meios científicos e espaços acadêmicos o
predomínio e a sucessão de várias vertentes investigativas, cada uma delas buscando evidenciar determinados valores que pudessem
corroborar ou contradizer as molas mestras que subjazem o modo de produção capitalista.
Houve momentos – que, de alguma forma, ainda estão presentes – em que, dentro das instituições
educacionais de ensino superior, para se considerar
um trabalho como “científico”, este deveria esboçarse de acordo com os mesmos padrões metodológicos
de cunho positivista, utilizados e consolidados nas
ciências experimentais do final do século 19 e início do século 20. Apenas a utilização desses modelos
daria o estatuto de cientificidade e o reconhecimento
como “área da ciência”. Dentro de tais exigências, o
que teria validade seria o modelo metodológico a ser
simplesmente reproduzido.
Destarte, esse modelo implicaria na neutralidade
do pesquisador no exercício de suas experimentações
e operacionalizações, na sua capacidade de mensurar
e repetir o estudo nas mesmas condições. Nessa con-
cepção metodológica, todos os fenômenos se mostram passíveis de observação.
O problema que emerge a partir da aplicação
desse modelo de pesquisador é a criação de uma
perspectiva cristalizada e dogmatizada com que este
passa a lidar com a realidade. Nesse sentido, é possível construir instrumentos de mensuração ou de observação controlados e a acreditar de forma absolutizada no uso desses instrumentos e na neutralidade
de intervenções de pesquisa e, consequentemente,
nos dados oriundos dela. Assim, somente esse tipo
de abordagem é o que possibilitaria o conhecimento verdadeiro. Esse paradigma que supervaloriza a
objetividade, em detrimento do próprio sujeito que
conduz os experimentos se impõe, num primeiro
momento, em meados do século XVII, tendo ainda
seus defensores nos meios científicos e acadêmicos.
Destarte, a condução de pesquisas e sua produção nesses moldes mostram-se interligadas a determinadas relações sociais e de poder, que se estruturam tanto em nível geral quanto em grupos ou
espaços institucionalizados.
Surge, a partir do que foi acima evidenciado,
uma série de questionamentos acerca dessa forma de
se fazer ciência. É possível questionar, por exemplo,
*
Graduado em Filosofia e Pedagogia, Doutor em Letras, Pesquisador da PUC Minas, professor nos cursos de Filosofia e Pedagogia. E-mail: [email protected]
Pedagogia em Ação, v. 1, n. 1, p. 1-141, jan./jun. 2009 - Semestral
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Vicente Geraldo Amâncio Diniz Oliveira
a relatividade da metodologia, cujas mensurações sobrepujam o próprio fenômeno, ao não considerar a
subjetividade e os valores intrínsecos a esta, no momento em que o pesquisador coleta e processa dados
pesquisados.
Por outro lado, tanto no meio científico quanto
no âmbito da academia, busca-se dar uma resposta a esse paradigma puramente quantitativo. Assim,
abordagens alternativas sugerem outras formas de
constituição do conhecimento. Em termos gerais,
essas abordagens configuram-se como “metodologias qualitativas”. Tais metodologias privilegiam os
estudos de caso, as abordagens antropológicas, as
observações cursivas, os depoimentos, as histórias de
vida, etc.
Utiliza-se de novos conceitos como, por exemplo, o de dominação, reprodução, representação social, dentre outros. Percebe-se também uma reaproximação com a filosofia, apoiando-se em várias
vertentes deste campo epistemológico. Recorre-se à
fenomenologia, à dialética e, em um número significativo de casos, adota-se uma perspectiva naturalística.
Todavia, o que se pode constatar é que, ao se
buscar metodologias alternativas, ocorre um adesismo de forma acrítica por parte de pesquisadores. A
afirmativa genérica de que nada é neutro pode incorrer no perigo de que a opinião do pesquisador é
o que prevalece, e não o resultado de um aprofundamento sério à luz de uma determinada teoria. Também podem ocorrer problemas no que tange à apropriação de teorias analíticas e o uso dos conceitos de
forma distorcida e superficial.
De fato, adentrou-se por novas formas de abordagens metodológicas. Entretanto, os problemas de
fundo são os mesmos. Quero aqui enfatizar que o
método qualitativo em pesquisa não prescinde do rigor e da consistência dos dados apurados e da posterior análise destes. Isto vale para a pesquisa em toda
a sua amplitude, seja ela de campo, bibliográfica, descritiva, exploratória, etc.
Por vezes, encontram-se dificuldades no que se
refere à própria metodologia empregada. Há dissonância entre a metodologia que é declarada no corpo
do projeto e aquela que de fato é adotada.
Pois bem, este artigo quer refletir sobre como a
educação se dá via pesquisa. Nesse sentido, gostaria,
a partir de uma abordagem filosófico-educacional,
mostrar como o ato de educar pressupõe, acima de
26
tudo, a produção de conhecimento e não simplesmente
a aquisição e mera repetição de conteúdos.
Destarte, cabe àquele que educa despertar no
educando a vontade de conhecer, sendo este o próprio construtor do conhecimento. Isto requer do educador uma postura diferenciada do modo de pensar
tradicional, em que este é visto como um transmissor, que enxerga no aluno um mero receptáculo.
Como, pois, ultrapassar um modelo tradicional quantitativo, como visto na primeira abordagem
metodológica de pesquisa e valorizar o qualitativo,
sem, contudo, nos entregarmos a um raciocínio condicionado ou permanecermos na superfície do dado
imediato?
Se a abordagem quantitativa valoriza uma postura objetiva, na qualitativa a subjetividade não é
colocada de lado. Se o foco, pois, é a subjetividade,
deve-se estar atento para não se resvalar para o subjetivismo. Assim, a “plena atenção” sobre seus atos e
a sua postura como educador possibilitará ao sujeito
não cair em um mero solipsismo.
É nessa perspectiva que o educador estará pronto para, de fato, encaminhar o educando à busca do
conhecimento. Deve-se levar em conta que o estar
pronto se mostra sempre em potência. O ato, o atualizar-se, o rever-se, o questionar-se deve ser visto como
obrigação do educador, pois que a própria realidade
em contínuo devir já o instiga à contínua renovação.
Com efeito, o texto – postulados, bases conceituais, paradigmas, metodologias – deve ser visto
como um ferramental, um meio que, por vezes, deva
ser substituído, para melhor se adequar à proposta de
trabalho, possibilitando, assim, um contínuo diálogo
com o contexto. Nessa perspectiva, o pesquisador poderá ler as entranhas de cada objeto analisado.
O dado particular concernente ao objeto analisado contém em si não apenas o que o distingue de
outros objetos, mas também as relações sociais, materiais e históricas que possibilitaram o surgimento de
sua própria essência, como também a sua aparência.
É na ultrapassagem de um olhar ingênuo, rumo a um
olhar crítico, como diria Paulo Freire, que será possível sairmos do meramente conceptualizado, para filtrarmos pelos nossos próprios olhos. Isto confere ao
sujeito cognoscente a própria autonomia diante do
que já está estabelecido e cristalizado em termos de
conhecimento, isto é, de visão de mundo. Esta atitude, digamos, seria o primeiro passo para o que já foi
Pedagogia em Ação, v. 1, n. 1, p. 1-141, jan./jun. 2009 - Semestral
Educação: a reflexão como elemento norteador na pesquisa e na produção de conhecimento
dito anteriormente e que se configura como produção
de conhecimento via “dado pesquisado”.
Hegel, filósofo alemão, dirá que o verdadeiro conhecimento não se restringe ao imediatismo do objeto, mas que compreende suas relações espaço-temporais a partir dos sentidos histórico, social e humano.
Destarte, há uma negação ao dado imediato, para
posteriormente poder compreendê-lo como sendo
parte de um processo social, e não uma parte isolada
de um todo.
Quero, pois, enfatizar neste artigo não os dados
técnicos de como se dá a produção de conhecimento
“via pesquisa”, mas, acima de tudo, colocar em questão o próprio ser humano que, ao produzir conhecimento, o fará a partir do autoconhecimento que, concomitantemente, o levará ao conhecimento do outro. É
nesse sentido que a construção da identidade não se
limitará ao momento em que o indivíduo se distancia do objeto, em um momento de contemplação.
Torna-se imprescindível a retomada do contato
consigo – mediado pelo trabalho, pelo ato de ensinar,
pela pesquisa – tendo como meta não apenas o autoconhecimento, mas também o conhecimento do outro.
A satisfação da autoconsciência por parte daquele que
ensina só pode ser alcançada pelo contato com a autoconsciência daquele que aprende.
Esta atitude de enxergar no educando o outro
que se elabora, à medida que labora, supera a dicotomia sujeito/objeto que divisamos em uma pedagogia
tradicional, que faz uso de um modelo metodológico
que deve apenas ser reproduzido, como evidenciado
no início deste trabalho.
Para que possamos nos colocar nesta perspectiva
de superação no exercício de nossa profissão como
educadores, e enxergarmos que, à medida que ensinamos, também aprendemos, é necessário, pois, uma
postura de autocrítica perene. Se, de fato, queremos
atingir a autoconsciência, o autoconhecimento, não podemos ter medo de nos confrontarmos.
Em seu livro “Os Sete Saberes Necessários à
Educação do Futuro”, Edgar Morin, no capítulo I,
fala das “Cegueiras do Conhecimento”, quais sejam,
o “erro” e a “ilusão”. Assim se expressa o teórico:
Todo conhecimento comporta o risco do erro e da ilusão. A educação do futuro deve enfrentar o problema de
dupla face do erro e da ilusão. O maior erro seria subestimar o problema do erro; a maior ilusão seria subestimar o problema da ilusão. O reconhecimento do erro e
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da ilusão é ainda mais difícil, porque o erro e a ilusão
não se reconhecem, em absoluto, como tais.
Erro e ilusão parasitam a mente humana desde o
aparecimento do Homo sapiens. Quando consideramos o passado, inclusive o recente, sentimos que
foi dominado por inúmeros erros e ilusões. Marx e
Engels enunciaram justamente em “A Ideologia alemã” que os homens sempre elaboraram falsas concepções de si próprios, do que fazem, do que devem
fazer, do mundo onde vivem. Mas nem Marx nem
Engels escaparam destes erros. (MORIN, 2000, p. 19).
Quando faço uma abordagem acerca de temas
como autoconhecimento, autoconsciência e uma perene
autocrítica pressupõem, acima de tudo, enxergarmos
que temos potencial, dons e talentos, como também
temos nossos limites. Os erros e ilusões que, porventura, carregamos, nem sempre temos consciência
deles.
Entretanto, quando nos colocamos na perspectiva de que o educando – enquanto sujeito que constrói o próprio conhecimento – também nos educa,
será ele que, muitas vezes, nos mostrará os erros e
ilusões que se imbricam aos nossos conhecimentos.
Nesta mesma esteira, em que Identidade e Alteridade
somente se forjam de uma forma relacional, Theodor von Adorno – expoente da Escola de Frankfurt
– em um texto intitulado “Indivíduo” também cita
a Ideologia alemã, quando Marx diz o seguinte: “O
homem Pedro só se refere a si próprio como homem
através de sua relação com o homem Paulo, seu semelhante.” (ADORNO, 1996 , p. 388).
A abordagem de Morin evidencia-se como de
suma importância, pois que, nos meios acadêmicos,
em geral, esta tese de que o conhecimento científico
pode estar – em maior ou menor grau – contaminado por erros e ilusões não se mostra muito bem aceita. Principalmente quando se supervaloriza o paradigma de cunho positivista, em que o conhecimento
científico é visto como um conhecimento de primeira ordem, livre de qualquer subjetivismo, concomitantemente, livre de erros e ilusões.
É possível perceber no meio acadêmico, em geral, críticas contundentes a determinados pressupostos do Positivismo. Porém, esses mesmos pressupostos são utilizados em uma escala bem significativa na
condução do ensino e da pesquisa. Ressalta-se aqui,
uma vez mais, que o rigor da dedução e da necessidade de análise de dados empíricos não deve, nem
pode, ser colocado à margem. Porém, o que se criti-
27
Vicente Geraldo Amâncio Diniz Oliveira
ca, em primeiro lugar, é a absolutização do conhecimento científico em detrimento do que se configura
como “senso comum”.
E, em segundo lugar, o mito criado em torno do
pesquisador, que se coloca de forma neutra na análise dos dados pesquisados. Estes se evidenciam como
dois grandes erros e ilusões do conhecimento, como
argumentado por Morin.
Esses erros e ilusões mostram como o raciocínio positivista se mostra tautológico, algo que a própria escola positivista criticou nas bases explicativas
do mito primitivo. Se o mito era o tipo do conhecimento dogmático, o próprio positivismo também se
explicita como tal, pois tem ele a pretensão de saber
os resultados que serão obtidos mediante o controle
“total” das variáveis em qualquer pesquisa que venha
a ser implementada. Uma vez mais, Morin fala acerca do papel da educação no sentido de denunciar erros e ilusões desse tipo e não reforçá-los:
A educação deve mostrar que não há conhecimento que
não esteja, em algum grau, ameaçado pelo erro e pela
ilusão. A teoria da informação mostra que existe o risco
do erro sob o efeito de perturbações aleatórias ou de ruídos (noise), em qualquer transmissão de informação, em
qualquer comunicação de mensagem. O conhecimento não é um espelho das coisas ou do mundo externo.
Todas as percepções são, ao mesmo tempo, traduções
e reconstruções cerebrais com base em estímulos ou sinais captados e codificados pelos sentidos. Daí resultam,
sabemos bem, os inúmeros erros de percepção que nos
vêm de nosso sentido mais confiável, o da visão. Ao erro
da visão acrescenta-se o erro intelectual. O conhecimento, sob forma de palavra, de idéia, de teoria, é o fruto de
uma tradução/reconstrução por meio da linguagem e do
pensamento e, por conseguinte, está sujeito ao erro. Este
conhecimento, ao mesmo tempo tradução e reconstrução, comporta a interpretação, o que introduz o risco
do erro na subjetividade do conhecedor, de sua visão do
mundo e de seus princípios de conhecimento. Daí os
numerosos erros de concepção e de idéias que sobrevêm
a despeito de nossos controles racionais. A projeção de
nossos desejos ou de nossos medos e as perturbações
mentais trazidas por nossas emoções multiplicam os riscos de erro. (MORIN, 2000, p. 19-20)
Interessante como Edgar Morin mostra como a
nossa afetividade, de maneira alguma, se desvincula
da razão. Portanto, o desenvolvimento de nossa inteligência imbrica-se com o mundo da afetividade. Segundo o teórico, seria possível acreditar na possibilidade de eliminação do risco de erro, recalcando toda
28
a afetividade. Nessa perspectiva, podemos dizer que
o processo ensino-aprendizagem carrega em seu bojo
uma dimensão afetiva. A curiosidade, a paixão, o interesse para Morin seriam a mola mestra da pesquisa
filosófica ou científica. Vale lembrar aqui a afirmativa de Aristóteles quando diz que o filósofo deve ter
a curiosidade e o espanto de uma criança. São justamente a curiosidade e o espanto o que nos move em
busca do conhecimento.
Assim, segundo Morin, a afetividade pode asfixiar o conhecimento. Mas, por outro lado, tem o poder de fortalecê-lo. A capacidade de raciocinar pode
ser diminuída, como também destruída, devido à deficiência emocional. Enfraquecer a capacidade de reação emocional pode estar na raiz de comportamentos irracionais.
Com efeito, não haveria, então, um estágio superior ou anterior da razão que domina a emoção. O que
existe para o teórico francês é um eixo intelecto/afeto.
A capacidade emocional do indivíduo seria, portanto, indispensável ao estabelecimento do comportamento racional.
A supervalorização da dimensão racional no
meio acadêmico, em detrimento do eixo intelecto/
afeto dimensionado por Morin, nos faz retomar a
perspectiva de pensadores, de épocas diversas, que
intentam ultrapassar esse nicho do conhecimento filosófico que reduz a capacidade humana de conhecer
à mera racionalidade. Tomás de Aquino, expoente da
escolástica, chega a afirmar que a razão é a imperfeição da inteligência. A inteligência, nesse sentido, ultrapassa o dado racional. E, portanto, não se fecha no
mundo dos conceitos.
Outra voz que se distingue e se distancia dos filósofos da Modernidade é a de Baruch Spinoza. Para
este, a dimensão emocional e afetiva do ser humano
não deve ser negada e subjugada pela razão. As paixões, nesse sentido, devem ser compreendidas e explicadas como todas as outras realidades da natureza.
Assim, o homem não seria uma exceção à ordem natural. As paixões, portanto, não estariam no âmbito
da fraqueza e da fragilidade humanas ou na impotência de seu espírito. Devem-se, pois, à potência da
natureza, não devendo ser detestadas ou censuradas.
Henri Bérgson, filósofo contemporâneo valoriza, acima de tudo, a intuição como possibilidade do
conhecimento direto. Para Bérgson, a intuição se manifesta quando o instinto se coloca a serviço da inPedagogia em Ação, v. 1, n. 1, p. 1-141, jan./jun. 2009 - Semestral
Educação: a reflexão como elemento norteador na pesquisa e na produção de conhecimento
teligência. O conhecimento pela via intuitiva, nesse
sentido, ultrapassa o dado puramente racional e as
meras conceitualizações, permitindo conhecer o objeto que se revela em todas as suas nuances.
Todos os predicativos humanos colocados por
esses pensadores no plano da inteligência ultrapassam, pois, a pura e simples racionalidade, o que, na
ótica de Morin, ajuda sobremaneira na construção do
conhecimento. Juntando-se a esses predicativos, a valorização e o cultivo do conhecimento científico se
mostram como arma poderosa no desvelamento de
erros e de luta contra as ilusões. Entretanto, os próprios modelos científicos que controlam a ciência
podem desenvolver ilusões. Depreende-se que nenhuma teoria científica se encontra imune do erro.
Por outro lado, o próprio conhecimento científico
não pode, sozinho, tratar de problemas epistemológicos, filosóficos e éticos, enfatiza o teórico. Nesse
sentido, é papel da educação apontar e se dedicar na
identificação de erros, cegueiras e ilusões.
Essa postura de constante revisão é o que poderá dar um estatuto não apenas de cientificidade, mas
também de maioridade e de autonomia à educação.
Cabe à escola, aqui falando especificamente da Universidade, enxergar que ela própria é um reflexo da
sociedade. Sendo a sociedade formada de seres humanos ambivalentes e contraditórios, não poderia ser
a escola diferente. Porém, é a universidade o espaço
privilegiado para se pensar essa mesma sociedade.
Cabe, pois, ao ensino e à pesquisa problematizar
a sociedade em todos os seus aspectos: sociais, políticos, econômicos, religiosos, etc., no sentido de se
pensar um sistema mais justo, o que propiciará a propagação de um pensamento mais condizente com o
real. É preciso enxergar que a sociedade não é um
bloco monolítico ou um todo ordenado isento de
tensões. Ultrapassar os erros e ilusões é ver a realidade
que se mostra ao mesmo tempo contraditória, porém, determinável; racional, mas também, irracional;
organizada, todavia caótica.
Cabe ao conhecimento científico não escamotear essa tensão existencial que determina as relações
entre sujeito e objeto, entre o desejo e a ordem moral vigente. Assim, o pensamento poderá assumir sua
função principal no que se refere ao debate filosóficoeducacional: a não submissão ao status quo vigente.
Não ceder a um sistema coercitivo e, ao mesmo
tempo, permanecer no meio de tudo isso é o granPedagogia em Ação, v. 1, n. 1, p. 1-141, jan./jun. 2009 - Semestral
de desafio do educador, que humildemente deve
passar essa mesma postura ao educando, tendo, porém, a consciência de que pode ou não atingir o seu
propósito.
Theodor von Adorno (1949), em sua “Theorie
der Halbbildung” (Teoria da semicultura), afirma
que, enquanto não forem modificadas as condições
objetivas, haverá uma cisão entre as boas intenções
das propostas educacionais reformistas e as verdadeiras exigências da realidade objetiva. Porém, é justamente porque o cabedal teórico e retórico, em geral,
cultivado nos meios acadêmicos ainda não se encontra reconciliado com a realidade, que é possível realizar sua autocrítica, apontando seus erros e ilusões.
Destarte, é dessa maneira que um paradigma
pode estar também contaminado por erros e ilusões.
Morin afirma que o jogo da verdade e do erro é jogado não apenas na verificação empírica e na coerência
lógica das teorias. Joga-se também – e de maneira
profunda – na “zona invisível dos paradigmas”.
O paradigma, pois, efetua a seleção e a determinação da conceitualização e das operações lógicas.
Determina as categorias fundamentais do conhecimento e opera o controle de seu emprego. É dessa
maneia que as pessoas conhecem, sentem, pensam
e agem consonantes com os paradigmas impostos
culturalmente.
René Descartes é o grande mentor do paradigma que impera no ocidente desde o século XVII. O
seu dualismo mecanicista separa o sujeito do objeto.
Nesse sentido, cada um tem sua esfera própria, algo
que vimos demonstrando no decorrer deste trabalho
e o que, de fato, impede a plena autonomia e criticidade do sujeito. Nessa cisão entre sujeito e objeto,
a filosofia e a pesquisa reflexiva permanecem em um
nicho do conhecimento e a ciência e a pesquisa objetiva de outro. Morin (2000) critica esse paradigma,
afirmando o seguinte:
Trata-se, certamente, de um paradigma: determina
os conceitos soberanos e prescreve a relação lógica: a
disjunção. A não obediência a esta disjunção somente
pode ser clandestina, marginal, desviante. Este paradigma determina dupla visão de mundo – de fato, o desdobramento do mesmo mundo: de um lado, o mundo
de objetos submetidos a observações, experimentações,
manipulações; de outro lado, o mundo de sujeitos que se
questionam sobre problemas de existência, de comunicação, de consciência, de destino. Assim, um paradigma
pode ao tempo elucidar e cegar, revelar e ocultar. É no
29
Vicente Geraldo Amâncio Diniz Oliveira
seu seio que se esconde o problema-chave do jogo da
verdade e do erro.
Consciente de que o paradigma é apenas um
modelo de mundo, é necessário ao educador manter-se criticamente diante do paradigma. O modelo cartesiano, quando engendrado na educação, fez e
continua a fazer com que o educador reforce a cisão
entre sujeito e objeto, ao se colocar como sujeito do
conhecimento e o aluno apenas um recebedor, como
enfatizado anteriormente.
É imperativo que, além de primar por uma educação crítico-reflexiva, ultrapassando a dicotomia
sujeito/objeto, o educador enxergue que a educação
tem uma especificidade insubstituível, nas palavras de
Adorno. Para o filósofo, a educação, enquanto esclarecimento geral, pode também criar um clima espiritual, cultural e social que não dê margem a nenhuma repetição. Repetição, acima de tudo, das mazelas
impetradas pelos regimes políticos aos seus próprios
cidadãos. É necessário que o ensino e a pesquisa trabalhem também a dimensão política do ato de educar. Assim, pois, a educação não é neutra. Pode ela
tanto reforçar o status quo, como também pode ajudar e orientar estratégias cognitivas dirigidas ao educando para que este perceba o jogo ideológico e reaja
a esse jogo. Perceber, problematizar, pensar e buscar
alternativas para a realidade são elementos essenciais
para a implementação do ensino e da pesquisa.
Por outro lado, é a idéia, o conhecimento, que
permitirão essa implementação. E, no dizer de Morin, o principal obstáculo intelectual para o conhecimento se encontra em nosso meio intelectual de
conhecimento. Mas, são justamente as idéias que
possibilitam conceber as fendas e os perigos da própria idéia.
Resulta disso um paradoxo incontornável: “devemos manter uma luta crucial contra as ideias, mas somente podemos fazê-lo com a ajuda de ideias.” (Morin p. 30). Assim, cabe às idéias possibilitar e facilitar
o processo ensino-aprendizagem, como também a construção do conhecimento e a implementação da pesquisa.
Todavia, é preciso enxergar que a idéia tem um papel
mediador que jamais pode se identificar com o real,
o que a transformaria apenas em ideologia. Portanto,
é necessário valorizar e implementar aquelas ideias
que comportem a ideia de que a realidade resiste à
ideia. Este é o trabalho de quem, de fato, educa.
30
ABSTRACT
The present work intends to give an educational-philosophic
focus on the research and its implementation. It identifies the
problem questioning about the difference of methodological
patterns, quantitatively and qualitatively, showing its limits and
possibilities. Above all, it plans to demonstrate that the research
needs to carry within it the element of reflection and criticism.
Therefore, the role of the educator-researcher, as the person
that thinks about himself and thinks about reality, would be to
make arise in the students the same emancipating, inquisitive
and contemplative posture involved on the production of knowledge and implementation of research.
Due to the fact that the society is composed of ambivalent e
contradictory human beings, the school could not be different.
Nevertheless, the university is the privileged place to think
about this same society.
Key words: Education; Research; Production of knowledge.
Referências
ADORNO, T. W. e BECKER, H. Educação para a Autonomia. Araraquara: UNESP, 1994.
ADORNO, T. W. Teoria da semicultura. Educação e Sociedade, Campinas, n. 56, p. 388-411, dez. 1996.
MORIN, E. Os sete saberes necessários à educação do
futuro. 9. ed. São Paulo: Cortez, 2000.
Pedagogia em Ação, v. 1, n. 1, p. 1-141, jan./jun. 2009 - Semestral
Artigos de Alunos
Drogas: a necessidade da parceria família e escola
Anally Valentim Assis de Oliveira *
Orient.: Sérgio de Freitas Oliveira **
Resumo
Este artigo relata o caso de um aluno do Ensino Fundamental II de uma escola da rede privada que
apresentava mau desempenho em termos de socialização e cognição devido ao uso de drogas. Aspectos e questões em termos de cognição, afetividade e socialização estão diretamente relacionados à
ausência dos pais e/ou responsáveis pelo educando; a omissão por parte das escolas em relação a tais
aspectos é também fator considerável. Quando essas referências são colocadas em planos inferiores,
perdem-se valores fundamentais na formação de qualquer ser humano. A necessidade da parceria
entre a família e a escola é o cerne dessa discussão.
Palavras-chave: Drogas e desempenho escolar; Parceria família e escola.
O
presente artigo baseia-se em um estudo
de caso que objetiva analisar o significado da presença efetiva da família e da
escola no trato com educandos usuários
de drogas.
Cerca de quarenta dias antes do término do primeiro semestre de 2007, ingressava na Escola Sonho
Meu 1 o aluno João Porto 2. Conforme a mãe e o padrasto, o aluno, com quinze anos, estaria prestes a repetir mais uma vez a 7ª série se continuasse na antiga
escola da rede pública. Relataram que, devido ao fato
de saírem cedo para trabalhar e retornarem somente à noite, não tinham muito tempo com o garoto e
o mesmo ficava a maior parte do tempo sozinho. A
mãe relatou que João era um bom menino em casa,
mas não tinha muito interesse pelos estudos e, ultimamente, estava se envolvendo com um grupo de
alunos que também não viam com bons olhos a Escola. Informaram também que não sabiam das constantes advertências e ocorrências recebidas pelo filho. As causas das ocorrências foram as seguintes: ser
surpreendido por um servente enquanto bebia vinho
e fumava um cigarro no banheiro, desacatar profes-
sores, atrasar constantemente para as aulas, ter desempenho insatisfatório em todas as disciplinas.
Infelizmente, os pais tomaram conhecimento da
situação tardiamente. A coordenação da escola anterior ligou para o trabalho da mãe e questionou o fato
de ela não comparecer quando solicitada às reuniões
e encontros escolares. A partir de então, descobriuse que assinaturas foram falsificadas, bilhetes, comunicados e até avaliações não foram entregues. Com
certa lástima, a mãe revelou que brigou com o filho
principalmente pela bebida e pelo cigarro e, ao questionar o aluno sobre o porquê de não comunicar à
mãe sobre os recados, o menino simplesmente disse
que não adiantaria avisá-la, uma vez que ela nunca
tinha tempo para ele.
Bahls e Ingbermann, ao citarem Kumpulainem
e Roine, elucidam:
O baixo desempenho escolar em estudantes pode excluílos, em algum grau, do grupo de estudantes que têm
mais sucesso, levando-os ao envolvimento com pares que
apresentem problemas em aspectos escolares. O impacto do grupo de pares é um fator que interfere no uso de
substâncias, e os autores evidenciam que, quanto maior a
associação com pares desviantes, maior a probabilidade
de desvio e uso de drogas. (KUMPULAINEM; ROINE apud BAHLS; INGBERMANN, 2005, p. 396).
1. Nome fictício para preservar a identidade da escola.
2. Nome fictício para preservar a identidade do aluno.
*
Graduada em Pedagogia com Ênfase em Ensino Religioso pela PUC Minas. E-mail: [email protected]
**
Licenciado em Letras e em Pedagogia. Professor Adjunto da PUC Minas. E-mail: [email protected]
Pedagogia em Ação, v. 1, n. 1, p. 1-141, jan./jun. 2009 - Semestral
33
Anally Valentim Assis de Oliveira
Mediante a complexidade desse caso, a coordenação da Sonho Meu conversou seriamente com os
responsáveis pelo educando. A proposta pedagógica e as normas básicas de conduta e comportamento
exigidos foram expostas. A coordenadora ressaltou
que, semestralmente, a Instituição convida um psicólogo especializado para palestra sobre a temática das
drogas e que tal palestra estaria agendada novamente
para o mês de agosto. A idéia de que a prevenção é a
melhor forma de conscientizar e alertar os jovens foi
ressaltada. O acompanhamento e a assistência pedagógica no caso do garoto foram garantidos, seja
através de observações constantes, seja através de
metodologias e recursos didáticos que propiciem um
melhor aprendizado.
A estudiosa Regina Lúcia Brandão Alencar
explica:
Na ação preventiva, é necessário que haja o reconhecimento de que o problema das drogas precisa ser tratado
delicadamente, por ser complexo e ambíguo. Observase que as informações e os materiais pedagógicos precisam ser adaptados às características e às exigências de
grupos distintos e que a divulgação seja de modo seletivo, dirigindo-se a diferentes grupos: crianças, jovens,
pais, funcionários, professores, de forma que a educação
preventiva influa de maneira significativa sobre a forma
como são percebidas as drogas e a problemática que elas
acarretam no ser humano, na sua família e na sociedade.
(ALENCAR, 1997, p. 6).
A importância da presença efetiva e diária dos
pais e/ou responsáveis na vida escolar dos filhos merece destaque na erradicação e prevenção às drogas
e também em situações em que os alunos não possuem um desenvolvimento considerável e satisfatório em termos de aprendizado, consequentes desses
e de outros problemas. Muitos aspectos e questões
em termos de cognição, afetividade e socialização estão diretamente relacionados à ausência dos pais e/
ou responsáveis pelo educando; a omissão por parte
das escolas em relação a tais aspectos é também fator
considerável.
O doutor e pesquisador José Elias Murad
esclarece:
A família é a base da formação e do desenvolvimento do
indivíduo. Daí a necessidade de pais ou responsáveis estarem sempre em contato com seus filhos, dando amor,
compreensão e carinho, participando de sua vida, esti-
34
mulando atitudes positivas, dando força no desenvolvimento de talentos, dando bons exemplos, estabelecendo
limites, direitos e deveres. (MURAD, 2003, p. 20).
Ciente da monitoria específica a esse aluno, a
coordenadora solicitou que todos os funcionários a
mantivessem informada, especificamente a equipe
docente. Pediu que os professores dialogassem e chamassem o menino para participar e opinar sobre os
conteúdos programáticos ministrados e que desenvolvessem com maior constância trabalhos em grupo, principalmente para propiciar um contato maior
entre o novato e os demais alunos. Caso observassem
qualquer comportamento suspeito associado aos extremos calmaria e indisciplina, deveriam comunicá-la.
Principalmente no início da segunda quinzena
na nova escola, o garoto apresentava uma sonolência incomum. Esse comportamento foi apresentado
inclusive nas aulas de Educação Física e durante o
intervalo do recreio, períodos em que os alunos normalmente podem extravasar e descarregar suas energias. Praticamente um mês havia se passado e, infelizmente, nenhum avanço notado. O garoto não
conversava com os colegas e tampouco atrapalhava
as aulas. Seus cadernos continham alguns poucos rabiscos e desenhos; praticamente nenhuma matéria
registrada. Enfim, não participava, permanecia indiferente, praticamente estático. Em uma dada situação, o aluno foi encontrado dormindo próximo
ao parquinho da Escola. Sem hesitar, a coordenação
decidiu agendar uma reunião urgente com os responsáveis. A coordenadora não fez nenhuma exposição de conclusão precipitada, apesar de presenciar
semelhante situação com um aluno de outra escola
onde havia trabalhado durante considerável tempo;
o parecer em tal escola não foi nada aprazível: uso de
drogas ilícitas.
Murad estabelece distinção entre drogas lícitas
e ilícitas:
As drogas lícitas são as drogas legais, ou seja, aquelas
que são aceitas socialmente. Como exemplo, podemos
citar o tabaco, as bebidas alcoólicas e alguns medicamentos. As drogas ilícitas são produtos ilegais. Seu uso
não é aprovado socialmente. O uso, porte ou tráfico são
considerados crimes. Como exemplo, podemos citar a
maconha, o crack, a LSD-25 e o ecstasy. (MURAD,
2003, p. 16).
Pedagogia em Ação, v. 1, n. 1, p. 1-141, jan./jun. 2009 - Semestral
Drogas: a necessidade da parceria família e escola
Cerca de quarenta dias após o primeiro encontro, a mãe compareceu à Escola. A coordenadora foi
direta e relatou que, sem a presença dos pais, não
conseguiria trabalhar e ajudar o João. Sugeriu também que consultassem um psicólogo e que fosse realizado um trabalho conjunto. As suspeitas quanto ao
uso de drogas ilícitas mais tarde foram confirmadas
pelo padrasto que, em uma das reuniões agendadas,
compareceu juntamente com a mãe do aluno.
Bahls e Ingbermann, ao mencionarem Syder e
Stoolmiller, salientam:
Quando o comportamento de uma criança não é mais
monitorado pelos pais e professores, está estabelecido
o estágio de aprendizagem para atos clandestinos, tais
como roubar, mentir, cabular aulas e usar drogas. O fracasso escolar recorrente e a rejeição pelos pais, professores e colegas convencionais induzem as crianças inábeis
a buscarem colegas que sejam imagens refletidas delas
mesmas. São crianças tristes e com pouca habilidade
escolar, esportiva e social. Por volta dos doze ou treze
anos, os pais e professores podem prontamente identificar quais grupos de crianças são desviantes. (SYDER;
STOOLMILLER apud BAHLS; INGBERMANN,
2005, p. 397).
O desfecho deste caso não foi o esperado pela
Escola e por todos os profissionais que, de alguma
forma, se envolveram na recuperação daquele aluno,
mesmo com o pouco tempo de convívio. Antes mesmo que a equipe pedagógica e educativa conseguisse minimizar os déficits em termos cognitivos e sociológicos e ajudasse no tratamento do garoto, mais
uma vez o João Porto foi transferido. Os responsáveis alegaram mudança residencial e se comprometeram a procurar um tratamento para o filho assim
que chegassem à nova cidade.
Diante deste caso, pode-se perceber que pais e
educadores são sujeitos formadores de valores e opiniões, são referências a serem seguidas e não podem
camuflar questões tão delicadas que necessitam de
reflexões e de algumas ações sem delongas. O adiamento de certas decisões pode comprometer e piorar
o quadro do educando vítima das drogas e vítima de
uma série de elementos que as envolvem e lhes permitem parecer tão atraentes e indispensáveis. Quando essas referências são colocadas em planos inferiores, perdem-se valores fundamentais na formação
de qualquer ser humano. O indivíduo torna-se um
ser mais vulnerável e o fracasso escolar, aliado ora à
Pedagogia em Ação, v. 1, n. 1, p. 1-141, jan./jun. 2009 - Semestral
indiferença, ora à agressividade, ora à passividade, é
indício considerável que revela que algo está errado.
Esse fracasso nunca está isolado, juntamente a ele há
o fracasso como ser social que poderia agir e interagir com seus pares, mas não age; que poderia almejar
e lutar por um ideal que realmente valha a pena e que
faça sentido para e na sua vida, mas essa luta inexiste
para aqueles que não encontram na escola e, especificamente, na família um incentivo, uma motivação
e um sentido.
Referências
ALENCAR, Regina Lúcia Brandão. Informação e cidadania contra as drogas. AMAE Educando, Belo Horizonte, n. 271, p.6-11, out. 1997.
BAHLS, Flávia Rocha Campos; INGBERMANN, Yara
Kuperstein. Desenvolvimento escolar e abuso de drogas
na adolescência. Estudos de Psicologia, Campinas, v. 22,
n. 4, p. 395-402, out. 2005.
MURAD, José Elias. O que é preciso saber sobre as drogas. AMAE Educando, Belo Horizonte, v. 35, n. 313, p.
16-20, mar. 2003.
35
A práxis pedagógica no ambiente hospitalar:
perspectivas e desafios
Resumo
Áurea Vitória Batista *
Íris Gomes de Araújo Pêgo *
Kênia Cristina Ferreira *
Lúcia Souza e Silva *
Marina Lindaura Maranha Contarine *
Vivian de Fátima Albergaria Pereira *
Orient.: Vera Lúcia Lins Sant’Anna **
Este artigo é fruto de um minicurso desenvolvido na disciplina Práticas Educativas da Educação
Infantil e dos Anos Iniciais do Ensino Fundamental do Curso de Pedagogia da PUC Minas. Tem por
finalidade abordar a atuação do pedagogo no ambiente hospitalar e oferecer maiores informações
aos profissionais da educação sobre essa práxis pedagógica. Utilizou-se como metodologia para a sua
realização o levantamento do estado da arte existente através de: pesquisas bibliográficas, trabalho
de campo, entrevista semiestruturada e observação livre. A escolha da metodologia está vinculada
à intenção de aprofundar os conhecimentos já obtidos com a experiência diária do pedagogo que
atua na área hospitalar, desvendando as possibilidades e os desafios que esse profissional encontra ao
desempenhar sua função.
Palavras-chave: Práxis pedagógica; Pedagogia hospitalar; Educando hospitalizado.
1 - Introdução
O
presente artigo aborda o tema pedagogia
hospitalar, focando a atuação do pedagogo nessa área. Tem-se como objetivo
ampliar os conhecimentos dos profissionais da educação sobre o tema, bem como analisar a
práxis pedagógica em dois hospitais de Belo Horizonte.
A Pedagogia Hospitalar é pouco conhecida no
ambiente educacional, por essa razão algumas dificuldades foram enfrentadas ao buscar outros aportes
teóricos. Porém seu conhecimento faz-se necessário
na formação dos profissionais da educação, especialmente do pedagogo, para que este possa atuar junto
aos alunos hospitalizados que necessitam de atendimento pedagógico.
A escolha da metodologia está vinculada à intenção de aprofundar os conhecimentos já obtidos
com a experiência diária do pedagogo que atua na
área hospitalar, desvendando as possibilidades e os
desafios que esse profissional encontra ao desempenhar sua função.
A coleta de dados foi feita através de consulta a
fontes documentais e orais, utilizando como proce-
dimentos metodológicos: análise documental, observação livre e entrevista semiestruturada.
Como referencial teórico, foram utilizadas as
contribuições de Matos e Mugiatti (2006), as fontes documentais das instituições visitadas e os artigos
científicos que propiciaram um maior esclarecimento a respeito do tema.
A observação livre foi realizada no campo da
pesquisa e em equipe, em duas instituições hospitalares denominadas de Hospital HK
e
Hospital HG, com nomes ficticios, visando assim à
preservaçâo da identidade das instituições.
Para que as observações se tornassem um procedimento válido e fidedigno, foi necessário, antes de
tudo, que fossem controladas e sistemáticas. Isto significa que, para se observar, era preciso que estivessem claros os objetivos que se pretendia alcançar.
2 - Pedagogia Hospitalar: em que consiste
Acreditar que o pedagogo atua somente na escola
demonstra uma necessidade de se abrir os olhos para
o diversificado campo de atuação desse profissional.
As práxis pedagógicas se desenvolvem em inúmeras
dimensões do trabalho social e, onde houver proces-
*
Graduandas do 6º período de Pedagogia da PUC Minas.
Doutora em Ciências da Religião. Mestre em Educação. Professora e pesquisadora da PUC Minas.
E-mail: [email protected]
**
Pedagogia em Ação, v. 1, n. 1, p. 1-141, jan./jun. 2009 - Semestral
37
Batista, Á. V.; Pêgo, Í. G. de A.; Ferreira, K. C.; Silva, L. S. e; Contarine, M. L. M.; Pereira, V. de F. A.
so de aprendizagem, o pedagogo tem como contribuir. O hospital é uma dessas dimensões em que a
Pedagogia se faz presente e necessária. Nas palavras
de Freire, citado por Matos e Mugiatti,
Quanto mais me capacito como profissional, quanto
mais sistematizo minhas experiências, quanto mais me
utilizo do patrimônio cultural, que é patrimônio de todos e aos quais todos devem servir, mais aumento minhas responsabilidades com os homens. Não posso, por
isso mesmo, burocratizar meu serviço de profissional e
servidor, numa inversão de valores, mais aos meios do
que aos fins dos homens. (FREIRE apud MATOS;
MUGIATTI, 2006, p.84).
A Pedagogia é o campo da educação que lida
com o processo de construção do conhecimento. Já
o ambiente hospitalar é o centro de referência e tratamento de saúde, e isso, na maioria das vezes, irrompe um espaço de dor, sofrimento e morte, causando uma ruptura nas crianças e nos adolescentes
com os laços que mantêm com seu cotidiano e com a
construção de sua própria aprendizagem. Mediante
a problemática de saúde que requer hospitalização,
surge a necessidade da Pedagogia Hospitalar.
A Pedagogia Hospitalar é uma modalidade de
atendimento pedagógico que, embora seja reconhecida pela legislação como um direito aos alunos hospitalizados que precisam se ausentar do espaço escolar, é pouco divulgada no âmbito educacional e
social.
A hospitalização não impede que a pessoa continue desenvolvendo suas dimensões afetiva, social,
psíquica e cognitiva. Assim como as outras pessoas, o
hospitalizado tem necessidade de aprendizagem. Privá-lo desse direito seria uma atitude preconceituosa,
pois o estar internado não significa que a pessoa seja
ou esteja desprovida de inteligência e muito menos
que ela não precise ser educada sistematicamente.
Refletir sobre a atuação do pedagogo no hospital é pensar num espaço que proporcione às crianças e aos adolescentes enfermos uma educação especial, para que eles possam dar continuidade aos
estudos, mesmo internados por um determinado período de tempo. Como já dizia Libânio (2005), um
dos fenômenos mais significativos dos processos sociais contemporâneos é a ampliação do conceito de
Educação.
O próprio ambiente hospitalar retira das pessoas
38
internadas o espaço de convivência familiar e escolar. A mudança brusca afeta a subjetividade da pessoa em questões de segundo e esta precisa de um
tempo para se recompor, ou mesmo aceitar e assumir as condições impostas por essa nova realidade. O atendimento pedagógico, além de possibilitar
uma aprendizagem, também contribui para a construção da autoestima, da afetividade e da segurança
do hospitalizado.
O trabalho do professor no hospital é muito importante, pois atende às necessidades psicológicas,
sociais e pedagógicas de crianças e jovens em processo de internação. Este profissional precisa ter sensibilidade, compreensão, força de vontade, persistência
e muita paciência para lidar, muitas vezes, com uma
situação de dor e de lentidão na aprendizagem.
Para que o atendimento pedagógico possa ser
uma realidade na maioria dos hospitais e das unidades de saúde, é necessário reconhecer sua importância na vida dos pacientes, saber que, ao sair do hospital, a criança irá retornar à escola, ao seu convívio
familiar e social sem danos a sua convivência.
A criança, quando assistida em longos períodos
de internação, pode contar com a continuidade escolar; além de não perder o vínculo com a escola, sentese mais perto de sua realidade, o que irá contribuir
para uma melhora mais rápida.
Observa-se que a continuidade dos estudos, paralelamente ao internamento, traz maior vigor às forças vitais
da criança (ou adolescente) hospitalizada, como estímulo motivacional, induzindo-a a se tornar mais participante e produtiva, com vistas a uma efetiva recuperação.
Tal fato, além de gerar uma integração e participação
ativa que entusiasmam o escolar hospitalizado, pelo
efeito da continuidade da realidade externa, contribui
ainda, de forma subconsciente, para o desencadeamento
da vontade premente de necessidade de cura, ou seja,
nasce uma predisposição que facilita sua cura e abrevia
o seu retorno ao meio a que estava integrado. (MATOS;
MUGIATTI, 2006, p. 72).
Faz-se necessário esclarecer alguns conceitos
utilizados em torno da Pedagogia Hospitalar, como
o de Hospitalização Escolarizada, Classe Hospitalar
e Atendimento Pedagógico Domiciliar.
A Hospitalização Escolarizada consiste no atendimento ao escolar hospitalizado de forma específica, considerando o seu problema de saúde e sua situação de escolaridade.
Pedagogia em Ação, v. 1, n. 1, p. 1-141, jan./jun. 2009 - Semestral
A práxis pedagógica no ambiente hospitalar: perspectivas e desafios
O Atendimento Pedagógico Domiciliar é aquele no qual são realizados procedimentos pedagógicos
na casa do paciente que não necessita de hospitalização, porém ainda precisa se ausentar da escola por
intervenção médica.
A Classe Hospitalar consiste no atendimento
conjunto de diversos escolares que estão tendo acompanhamento no hospital. Nas palavras de Cecim,
A função do professor de Classe Hospitalar não é de
apenas adquirir espaços lúdicos com ênfase no lazer pedagógico, para que a criança esqueça, por alguns momentos, que está doente ou em um hospital. O professor
deve estar no hospital para cooperar com o processo efetivo de construção da aprendizagem das crianças. (CECIM, 1999, p.43).
Visto dessa forma, o atendimento pedagógico no
hospital assume um caráter sistemático, o que requer
do professor, além de uma boa formação, o domínio
do conteúdo específico da etapa escolar em que se
encontra o aluno / paciente. O pedagogo hospitalar,
no atendimento pedagógico, deve ter seus olhos voltados para o todo, objetivando a humanização.
É importante que o pedagogo tenha clareza de
sua função no hospital, evitando, assim, interferência
no trabalho dos profissionais da saúde; deverá utilizar sua competência e suas habilidades para trabalhar
em conjunto com esses profissionais. Desse modo, é
fundamental que ele conheça o que lhe compete no
ambiente hospitalar, contribuindo para a aprendizagem do aluno hospitalizado.
3 - Origem da Pedagogia Hospitalar
A história da Pedagogia Hospitalar teve seu início em 1935, em Paris, com Henri Sellier. Posteriormente, se estendeu pela Alemanha, por toda a
França, em seguida, por toda a Europa e os Estados
Unidos.
A Segunda Guerra Mundial pode ser considerada como marco decisório de escolas hospital, devido
ao grande número de crianças e adolescentes hospitalizados que, em decorrência da guerra, se encontravam impossibilitados de ir à escola.
Em 1939, foi criado o CNEFEI (Centro Nacional de Estudos e de Formação para a Infância
Inadaptada de Suresnes), com o intuito de formar
professores para exercer a Pedagogia Hospitalar.
Pedagogia em Ação, v. 1, n. 1, p. 1-141, jan./jun. 2009 - Semestral
Nesse mesmo ano, foi criado o Cargo de Professor Hospitalar junto ao Ministério da Educação na
França.
No Brasil, a Pedagogia Hospitalar teve início em
1950, no Rio de Janeiro, no Hospital Jesus. Somente
em 1994, houve o reconhecimento do MEC (Ministério da Educação e Cultura) da importância de se
dar continuidade à educação no hospital. De acordo com Bibiano (2009), o MEC reconhece que, no
Brasil, a Pedagogia ainda não é praticada na maioria
dos hospitais, pois são apenas 850 hospitais que oferecem esse atendimento, em um universo de quase
oito mil unidades.
Quanto aos documentos legais, a Constituição
Federal de 1988 estabelece a educação como direito
de todos e para todos em quaisquer circunstâncias.
De acordo com Bibiano (2009), embora nada específico sobre a classe hospitalar, são leis que se referem a crianças e adolescentes hospitalizados: a Lei n.
1.044/69, que dispõe sobre tratamento excepcional
para alunos portadores de afecções, em suas residências, e a Lei n. 6.202/75, que discorre sobre exercícios
domiciliares às estudantes gestantes.
A LDBEN, Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, Lei n. 9.394/96 também considera a
educação como direito de todos e nela está inserida
a classe hospitalar como educação especial, em uma
visão de educação inclusiva. Essa lei contempla as
crianças e os adolescentes que se encontram hospitalizados e impossibilitados de frequentar as aulas em
razão de tratamento de saúde.
Apenas na década de 1990 é que foram criadas
leis específicas para a classe hospitalar, dentre elas
o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e
a Lei dos Direitos das Crianças e dos Adolescentes Hospitalizados, através da Resolução n. 41, de
13/10/1995. Essa lei estabelece que “Toda criança
tem o direito a ser hospitalizada quando for necessário ao seu tratamento, sem distinção de classe social, condição econômica, raça ou crença religiosa”.
A resolução também dispõe que a criança ou o adolescente hospitalizado deve receber amparo psicológico, quando se fizer necessário, e deve desfrutar de
alguma forma de recreação, de programas de educação para a saúde, e de acompanhamento do currículo escolar de acordo com sua fase cognitiva, durante
sua permanência no hospital. A luta pelos direitos
culminou na Declaração de Salamanca, sobre prin-
39
Batista, Á. V.; Pêgo, Í. G. de A.; Ferreira, K. C.; Silva, L. S. e; Contarine, M. L. M.; Pereira, V. de F. A.
cípios, política e prática em educação especial. Nessa
declaração, encontra-se alicerçada a defesa do acesso
à educação para toda e qualquer criança, independentemente de qualquer condição temporária ou
contínua que apresente.
Em 2001, o Conselho Nacional de Educação,
artigo 13º da Resolução n. 2, utilizou pela primeira vez a nomenclatura “Classe Hospitalar” e definiu
que os sistemas de ensino juntamente aos de saúde
devem organizar atendimento educacional a alunos
impossibilitados de frequentar as aulas devido a um
tratamento de saúde. Com base nisso, em 2002, a Secretaria de Educação Especial do MEC elaborou os
termos reguladores sobre o trabalho nas unidades de
saúde (BIBIANO, 2009).
Os dois hospitais visitados fazem valer esses direitos, demonstrando respeito, carinho e responsabilidade com os seus pacientes.
4 - A Práxis Pedagógica
HG
nos
Hospitais HK
e
Para se analisar a práxis pedagógica no ambiente hospitalar, foram visitados dois Hospitais de Belo
Horizonte.
O Hospital HK era o antigo hospital geral, que
foi reformado e transformado em centro de reabilitação. Inaugurado em maio de 1997, possui capacidade
instalada de 125 leitos. Os programas implantados
nessa unidade são de reabilitação de lesão medular,
cerebral, adulto e infantil; incluindo genética médica e distúrbios neuromusculares; programa complementar ortopédico clínico e cirúrgico. Possui unidades em outras cidades brasileiras.
Nesse hospital, há atendimento a crianças e
adultos com diagnósticos de atraso do neurodesenvolvimento, problemas ortopédicos, paralisia cerebral, acidente vascular cerebral, espinha bífida, doenças metabólicas que afetam o cérebro, diagnóstico
clínico-laboratorial das doenças genéticas, atrofia
muscular espinhal, traumatismo cranioencefálico, lesão medular, paralisia facial periférica, paralisia braquial obstétrica.
A rede de hospitais à qual pertence o Hospital
HK compreende que o atendimento dos pacientes
demanda cuidados especializados, sendo necessária
uma equipe multidisciplinar que atue conjuntamente
para a melhoria da qualidade de vida dos internos.
40
Nesse hospital, o profissional pedagogo trabalha
40 horas com dedicação exclusiva. Essa instituição
possui três pedagogas, porém há uma quarta pedagoga prevista e espera-se uma quinta para integrar
à equipe. Para ingresso como profissional na instituição é necessário que se faça um concurso externo.
Esse concurso é constituído por uma prova teórica
sobre Pedagogia e conhecimentos de língua estrangeira (inglês), prova prática e entrevista. Ressalta-se
também que, para se candidatar a uma vaga como
pedagogo, não são exigidos conhecimentos específicos da área hospitalar.
O concurso é nacional, o candidato aprovado pode ser chamado para qualquer unidade dessa
rede hospitalar. Inicialmente, passa por um treinamento, em um período de seis meses, e é acompanhado por profissionais que estão há mais tempo na
instituição.
A maioria dos pacientes atendidos possui necessidades especiais devido ao fato de estarem internados ali por uma impossibilidade motora e por
patologias, dentre elas lesão cerebral, traumatismo
craniano e paralisia cerebral.
O período que a criança permanece no Hospital
é variado. Isso depende do trabalho que será realizado com ela. Há casos de crianças que ficam internadas durante semanas e até meses.
O pedagogo interage com toda a equipe hospitalar. Ele é considerado parte da equipe. Um exemplo
disso são as reuniões de estudo de casos, nas quais
há pedagogos, psicólogos, fisioterapeutas, professor
de educação física, fonoaudiólogos, enfermeiros, nutricionistas e assistentes sociais, que se reúnem para
discutir o caso de cada paciente.
Os pedagogos avaliam o caso de cada criança e
entram em contato com a escola para saber o que o
paciente está estudando. Estabelecem a forma como
serão enviados os trabalhos e o conteúdo que o aluno
estudaria na escola, para que ele não fique com uma
grande defasagem na sua aprendizagem.
Essa interação com a escola é muito importante,
por isso os pedagogos visitam a escola e fazem um
contato com os professores do paciente.
O pedagogo atende os pacientes em vários espaços. Não há um espaço específico, pois pode ser onde
o paciente possa ter uma facilidade de locomoção,
dependendo da sua necessidade. O pedagogo fica
duas horas com cada paciente e o atende três vezes
Pedagogia em Ação, v. 1, n. 1, p. 1-141, jan./jun. 2009 - Semestral
A práxis pedagógica no ambiente hospitalar: perspectivas e desafios
por semana. Esse horário é chamado de acompanhamento escolar.
Os objetivos da Pedagogia Hospitalar nesse
hospital são: oportunizar diferentes situações significativas de aprendizagens no processo de reabilitação; contribuir para a descoberta e o desenvolvimento de potencialidades do sujeito; contribuir
para que as diferenças humanas sejam percebidas
como possibilidade no universo plural da existência;
dar continuidade ao processo de desenvolvimento e
aprendizado do aluno hospitalizado; contribuir para
a inserção/reinserção escolar e realizar a mediação da
aprendizagem.
Uma das funções do pedagogo no Hospital é
estimular o crescimento intelectual e sociointerativo, além de favorecer a continuidade de aprendizagens escolares e a reintegração das crianças à escola
de origem; mesmo estando doentes, elas continuam
desenvolvendo o processo de aprendizagem do aluno
hospitalizado. O que confirmam Matos e Mugiatti
(2006) ao afirmarem que a presença dos pedagogos
em hospitais tem a finalidade exclusiva e específica
de atender certos aspectos de natureza pedagógica
do enfermo.
A outra instituição visitada foi o Hospital HG,
que visa ao atendimento hemoterápico e hematológico. Ele foi criado em 1985. Em 1989, foi emancipada, vinculando-se à Secretaria do Estado de Saúde
em 1994.
O Hospital HG é, atualmente, pioneiro em redes de unidades hemoterápicas e hematológicas no
país, sendo, dessa forma, responsável pelo planejamento, pela organização, pela coordenação, pela execução e pela avaliação da política Estadual de Sangue
e Hemoderivados de Minas Gerais, em consonância
com a política Nacional do SUS (Sistema Único de
Saúde).
Sua organização se dá em rede descentralizada e
integrada, cujas unidades estão em cidades-polos do
Estado Minas Gerais.
O atendimento pedagógico aos pacientes do
ambulatório teve início no ano de 1996, em decorrência da demanda social relacionada às dificuldades de aprendizagem e à necessidade de continuar ou
iniciar o processo de ensino-aprendizagem.
Esse atendimento é feito por uma pedagoga e
duas estagiárias que, em interação com os demais
profissionais da saúde, desenvolvem suas atividades
Pedagogia em Ação, v. 1, n. 1, p. 1-141, jan./jun. 2009 - Semestral
de forma sistematizada, proporcionando esse vínculo
interativo com família e escola do educando hospitalizado. A pedagoga é formada em Pedagogia e pósgraduada em Psicopedagogia. É também formada
em Gerência e Tecnologia da Qualidade e possui o
Curso de Mestrado em Ciências da Saúde.
Na entrevista, ela informou que o Hospital HG
é uma fundação pública estadual vinculada ao Ministério da Educação e Cultura (MEC), desde 1985.
O atendimento pedagógico, por enquanto, funciona somente no período da manhã, no horário de
7:00 às 13:00 horas.
A Pedagogia Hospitalar dessa instituição emergiu a partir de uma demanda dos profissionais da área
que, preocupados com os problemas relacionados ao
analfabetismo e à evasão escolar, lutaram pela continuidade da trajetória dos estudos de seus pacientes.
O Hospital HG conta com uma equipe multifuncional: hematologistas, psicopedagogo, enfermeiras, fisioterapeuta e dentistas, para o acompanhamento dos pacientes.
A Pedagogia Hospitalar desse ambulatório funciona desde 1996. A princípio, foi nomeada uma pedagoga da Secretaria de Saúde que se encontrava
disponível.
Para acontecer o atendimento pedagógico, é necessário que o pedagogo tenha conhecimento das
doenças de base atendidas no local, das demandas
educativas dos pacientes e da interação com os diversos profissionais que atuam no local.
O atendimento hemoterápico e hematológico é
o eixo norteador da atuação na instituição. O paciente, ao procurar atendimento, é cadastrado no ambulatório e, a partir daí, passa a ter prontuário para cuidar do seu problema de saúde.
O encaminhamento pedagógico desses pacientes é feito pela equipe do ambulatório, À chegada
do paciente a esse setor, escuta-se o mesmo, para
que se possa inteirar do que está acontecendo com
ele e identificar que ações serão aplicadas a cada
problema.
O paciente com alguma defasagem escolar é
atendido individualmente uma vez por semana. Inicialmente, é realizada uma anamnese clínica e escolar do paciente para avaliação de sua queixa, objetivando investigar o seu nível de leitura e escrita. São
usadas técnicas do lúdico e do brincar. A princípio
não se trabalha com livros didáticos. O objetivo é
41
Batista, Á. V.; Pêgo, Í. G. de A.; Ferreira, K. C.; Silva, L. S. e; Contarine, M. L. M.; Pereira, V. de F. A.
ajudar os pacientes em seu desenvolvimento escolar,
porém não segue a programação da escola.
Encaminha-se um documento à escola para que
o paciente não seja considerado faltoso e pede-se que
a instituição dê um retorno.
Dessa forma, existe um elo de atendimento entre a escola, a família e o ambulatório e isso promove uma maior eficiência desse empreendimento. O
tempo de atendimento depende do progresso do
aluno/paciente, aproximadamente sessenta minutos
diários.
Uma estagiária do sexto período de Pedagogia
foi incorporada à instituição com uma proposta do
projeto de sua autoria denominado “Conte Comigo”. Esse projeto foi aceito e desenvolvido na sala de
transfusão de sangue para os pacientes com a “Doença Falciforme”.
Através do lúdico e do pedagógico, esse profissional adentra no espaço da Enfermagem que lida
com a dor e com o choro, com o intuito de amenizar
o sofrimento das crianças.
O auxiliar pedagógico usa esse tempo para escutar a criança e sua família com assuntos relacionados
à saúde, à escola e a seu desenvolvimento físico, emocional e intelectual.
Para tal mediação, utiliza-se de jogos e atividades estruturadas (desenhos, palavras cruzadas), brinquedos e papel em branco.
Não raro, as crianças trazem as atividades da escola como o “Para Casa”, por exemplo. Se a criança
é muito assídua, faz-se uma intervenção pedagógica
específica para ela. Nessa intervenção, tem-se a preocupação em associar o lúdico ao pedagógico, porém
o olhar é sempre voltado para o interesse da criança,
para o que ela mais gosta de fazer.
A proposta inicial era atender somente alunos da
faixa etária até 12/13 anos de vida, porém, mais tarde, viu-se a necessidade do atendimento aos pacientes de l8 aos 24 anos de idade.
O atendimento pedagógico na instituição é mediado por diversos projetos. Tem-se o “Projeto Biblioteca”, que empresta livros para todos os pacientes,
familiares e para os funcionários do HG. O acervo é
formado por seiscentos livros e um arsenal de fitas de
vídeo para crianças, jovens e adultos, como um meio
de incentivar a leitura.
O “Projeto Hemorriso” surgiu de uma parceria
com o Curso de Odontologia de uma Faculdade de
42
Belo Horizonte, que promove a saúde com orientações de higiene bucal.
O pedagogo faz a mediação com essa fundação e orienta os estagiários para que eles abordem
temas que se aproximem mais do gosto da criança
hospitalizada.
As reuniões para ”estudo de caso” e administrativas ocorrem mensalmente, objetivando ações e projetos para melhorar a saúde dos pacientes.
O pedagogo, para atuar no ambiente hospitalar,
tem que ser um profissional com formação mais humanizada e uma compreensão do que é a saúde no
social e no biossocial. Precisa ter um olhar do sujeito
como um todo. Nesse sentido, recorre-se às palavras
de Rita da Glória:
[...] o Pedagogo não tem que se preocupar com o tipo de
instituição e sim com habilidades próprias da Pedagogia
para atuar em qualquer instituição. Quando o Pedagogo
entra em um hospital, não tem que entender de Medicina. Ele tem que ser capaz de indicar os problemas
que geram dificuldades nos mais variados processos de
aprendizagem naquele local, além de estratégias e ferramentas para a resolução dos impasses. (GLÓRIA, 2005,
p.92).
O conhecimento aprofundado da legislação da
saúde e o saber dialogar com as demais áreas é essencial para o bom desempenho de sua missão na
especificidade hospitalar. Porém, precisa demarcar
claramente qual é a sua atuação, delimitar seu espaço como profissional da Educação, saber estruturá-lo
bem e fazer um diálogo interdisciplinar, quiçá transdisciplinar. Seu maior desafio é superar e melhorar a
imagem do pedagogo e dar um retorno profissional.
5 - Considerações F inais
Pelo exposto neste artigo, percebe-se que os desafios são muitos, dentre eles, a valorização da importância do profissional pedagogo em ambientes
que não são a escola.
Ressalte-se que o olhar nas visitas técnicas realizadas foi direcionado pelos olhares de pedagogas que amam o que fazem. Com ética, profissionalismo, sensibilidade, capacitação e amor ao que se
faz é possível realizar um bom trabalho pedagógico
hospitalar.
Pedagogia em Ação, v. 1, n. 1, p. 1-141, jan./jun. 2009 - Semestral
A práxis pedagógica no ambiente hospitalar: perspectivas e desafios
No que se refere à perspectiva, viu-se que é um
campo de atuação que, aos poucos, vem conquistando
seu espaço. É um espaço que só o pedagogo é capaz
de dominar e ocupar com competência. O pedagogo
precisa saber solucionar os problemas relacionados à
aprendizagem no hospital. Para isso, ele tem que ser
um profissional competente, ter engajamento e estar
sempre se atualizando com todos os cursos de que
necessita para ser capaz de exercer bem a sua função
de educador, contribuindo de forma eficaz para que
o hospitalizado sofra o mínimo possível com o seu
afastamento do ambiente escolar e minimize assim o
prejuízo no seu aprendizado.
Além da contribuição na aprendizagem, o acompanhamento pedagógico educacional dentro do ambiente hospitalar poderá resgatar vários sentimentos
nos pacientes/alunos, como aceitação, autoestima,
segurança, uma melhor qualidade de vida e a continuidade do desenvolvimento das potencialidades
que eles apresentam.
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MATOS, Elizete Lúcia Moreira; MUGIATTI, Margarida Maria Teixeira de Freitas. Buscando raízes. In: MATOS, Elizete Lúcia Moreira; MUGIATTI, Margarida
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Pedagogia em Ação, v. 1, n. 1, p. 1-141, jan./jun. 2009 - Semestral
43
Da lousa à tela do computador: as apropriações e usos das
mídias e suas implicações nos processos de aprendizagem
Bruna Guzman de Jesus Rapini *
Lara Pires Ramos *
Orient.: Nilza Bernardes Santiago **
Resumo
O presente trabalho buscou analisar, na perspectiva dos alunos, as apropriações e usos da mídia e
suas implicações nos processos de aprendizagem. Para a realização deste, apoiamos em estudos de
alguns teóricos como Almeida (2005), Moran (2000), Silverstone (2002), Thompson (1999), Melo e
Tosta (2000), Santos (2005), Vieira (2008). Buscou-se compreender a interface educação/comunicação; identificar a presença e uso dos recursos midiáticos na vida escolar e diagnosticar a percepção
dos alunos em relação ao uso de mídias e as possíveis contribuições para a sua formação. Os resultados mostram que existem escolas que não disponibilizam laboratórios de informática; alguns alunos
não possuem computador e internet; as aulas são mais instigantes com a utilização de recursos
tecnológicos; há interesse em obter conhecimentos sobre o computador, seja para a vida pessoal ou
profissional.
Palavras-chave: Educação; Comunicação; Tecnologia; Mídia.
1 - Introdução
A
sociedade atual tem assistido a um vertiginoso e expressivo desenvolvimento
das tecnologias digitais influenciando nas
interações humanas. Os limites geográficos já não são obstáculos para a comunicação entre
diferentes culturas e etnias. Assim como a sociedade,
a educação passa por um processo de reconfiguração devido à necessidade de adaptar-se às novas demandas educacionais, em que o uso das mídias chega
não apenas pelas mãos dos profissionais da educação,
mas pelos alunos que, a cada dia, trazem à sala de
aula uma nova tecnologia.
A pesquisa fundamenta-se na necessidade de
compreender o processo de construção do conhecimento e as relações interpessoais dos alunos, a fim
de contribuir para a inovação da prática pedagógica,
pois acreditamos que essa discussão é capaz de alavancar um processo de reflexão sobre os antigos paradigmas, partindo para uma concepção mais aberta
e colaborativa no processo educativo.
Nesse sentido, foi realizado um estudo qualitativo e quantitativo sobre o uso e a apropriação que os
alunos fazem das mídias e suas implicações no pro*
cesso de aprendizagem, em três escolas da rede pública de ensino de Belo Horizonte.
2 - A interface comunicação/educação
Ao longo dos tempos, foi desenvolvido um contato das mídias com as diversas áreas, dentre elas, a
educação e, por isso, se faz necessário que o conhecimento sobre a mídia seja difundido “criando uma
massa de cidadãos alfabetizados em mídia” (SANTOS, 2005, p.108).
Atualmente, o mundo é construído pelos meios
de comunicação que, por sua vez, fazem, de certa
maneira, a seleção daquilo que devemos conhecer e
o ponto de vista a partir do qual vamos compreender os temas a serem discutidos. Sendo assim, acreditamos que há, nos tempos presentes, uma grande
disputa comunicação-escola-família, na qual “ambos
os lados pretendem ter a hegemonia na influência na
formação de valores, na condução do imaginário e
dos procedimentos dos sujeitos.” (BACCEGA apud
SANTOS, 2005, p. 118).
A relevância dos meios de comunicação no ambiente escolar se deve, em maior amplitude, a suas
características modificadoras, não se restringindo aos
Graduandas em Pedagogia pela PUC Minas.
Mestre em Educação. Professora da PUC Minas. E-mail: [email protected]
**
Pedagogia em Ação, v. 1, n. 1, p. 1-141, jan./jun. 2009 - Semestral
45
Bruna Guzman de Jesus Rapini; Lara Pires Ramos
oferecimentos imediatos que fazemos das mídias. “A
mídia deve ser tratada, atualmente, como elemento de
transformação da sociedade”. (VIEIRA, 2008, p. 32).
Assim, o campo da educomunicação deve ser
considerado como campo que inclui as várias facetas
no que diz respeito à educação para a comunicação,
buscando, dentre outros, o aprimoramento das linguagens e técnicas de produção da informação, do
uso e acesso aos meios de comunicação.
3 - Apropriações e usos da mídia
Apesar da crença do senso comum e de muitos
estudiosos do assunto na ideia de receptores passivos dos produtos da mídia, os estudos de Thompson, bem como outros estudos que seguem a mesma
vertente, “mostram mais de uma vez que a recepção
dos produtos de mídia é um processo ativo e criativo mais do que o mito do assistente passivo sugere”.
(THOMPSON, 1998, p. 42).
Dessa forma, podemos afirmar que cada indivíduo recepciona e apropria os conteúdos midiáticos
de maneira individualizada e significativa, ou seja, “os
conteúdos das mídias são recriados a partir das matrizes individuais”. (VIEIRA, 2008, p. 7). Assim sendo,
fica claro que a recepção de materiais simbólicos não
ocorre de maneira inerte, na medida em que cada indivíduo constrói seus próprios significados a partir da
sua relação com a mídia e da sua própria identidade.
Da mesma maneira que a recepção de bens simbólicos não ocorre de forma passiva, assim também
se configura o processo de aprendizagem. Ao contrário do que vem sendo difundido em muitas escolas,
é preciso esclarecer que a aprendizagem não possui
lugar na emissão e sim na recepção ou mesmo nas
respostas que o alunado dá à mensagem ou ao estímulo original.
Portanto, se faz necessária a quebra de alguns
paradigmas presentes no universo escolar: há que se
ter flexibilidade nos processos pedagógicos, é possível educar entretendo, há várias fontes de aprendizagem e há que se considerar todas elas, ou pelo
menos, a maioria delas, a fim de abraçar o maior
número de perfis de alunos possíveis, alcançando,
dessa forma, resultados satisfatórios no processo de
aprendizagem.
46
4 - A escola, o professor e o uso das mídias
No contexto das evoluções tecnológicas, mais
especificamente do campo comunicacional, a escola
enquanto instituição formadora e os professores enquanto agentes desta formação têm juntos um grande desafio com relação à mídia na escola e para ela.
Não basta somente incluir de forma instrumental o
uso dos meios de comunicação no ambiente escolar.
Há a necessidade de superar tanto esse fato como
também a resistência de muitos professores a essas
novas tecnologias. Isso não depende só de boa vontade do professor e daqueles que fazem parte do processo educativo. Sua formação inicial e continuada
deve permear as formas e estratégias de mediação
quanto ao uso da mídia e um vasto mundo de conhecimento aberto por ela.
Podemos afirmar que a educação para e com a
mídia depende tanto da adequação da escola para essa
realidade, quanto da capacitação e do entendimento
do professor quanto a seu papel nesse processo.
Nessa perspectiva, é importante compreender
também que a aprendizagem não está nas mãos do
professor e em sua possível mediação, e sim no aluno que, por seus meios e interesse, constrói uma rede
de saberes e conhecimentos de sua realidade, inserida em um mundo em constante mudança e evolução tecnológica. Por isso, a inserção de novas tecnologias na escola vai muito além da montagem de
laboratórios e da compra de computadores, TV etc.
Essa inserção está mais relacionada à movimentação
e aceitação de que não se pode fechar os olhos para a
importância que a mídia conquistou na sociedade, já
que seu alcance foi muito além do que muitos estudiosos poderiam imaginar.
A mídia concebida como meio e a educação
como finalidade sintetizam a forma de pensamento necessária para esse processo de formação cidadã,
dando espaço à coexistência harmônica de todas as
formas de expressão da cultura.
5 - A percepção dos alunos sobre o uso e a apro-
priação das mídias em três escolas públicas de
Belo Horizonte
Da amostra pesquisada, 75% dos alunos são do
sexo feminino, 59% declararam cursar a 8ª série ou
Pedagogia em Ação, v. 1, n. 1, p. 1-141, jan./jun. 2009 - Semestral
Da lousa à tela do computador: as apropriações e usos das mídias e suas implicações nos processos de aprendizagem
9º ano do Ensino Fundamental e concentram-se na
faixa etária de 13 a 15 anos.
Quando perguntados sobre os tipos de mídias
a que têm acesso, sendo esta uma questão de múltiplas respostas, a mídia televisiva esteve presente em
94% das respostas, seguida do rádio (87%), da internet (75%) e de outros tipos de mídia (11%), como
telefone celular, multimídia e jornais.
A mídia, hoje, se tornou instrumento indispensável do processo educativo. Seu estudo é fundamental na luta contra o seu domínio, a partir do desenvolvimento crítico-reflexivo sobre o conteúdo que
dissemina. Os recursos midiáticos são ferramentas de
grande potencial para a propagação de ideias, valores
e conhecimentos, contudo, sua contribuição para a
educação no Brasil tem sido aquém de suas possibilidades na formação da cidadania nos educandos.
Dos alunos respondentes, 69% afirmaram possuir
computador, dos quais 57% declaram possuir internet. Quase a totalidade dos alunos, 90%, declarou fazer seus trabalhos de escola utilizando o computador.
A tarefa do docente, então, é auxiliar os alunos
na utilização adequada da internet – na escola ou
fora dela – ao se fazer uma pesquisa, pois não podemos descartar que, apesar de ela trazer vantagens,
traz também alguns problemas como, por exemplo,
a facilidade de dispersão, o acesso a informações que
não são confiáveis nem verídicas, bem como as cópias literais de trabalhos que são comumente feitas
pelos educandos.
Relativamente à utilização de recursos tecnológicos em sala de aula, sendo esta uma questão de
múltiplas respostas, o retroprojetor, a TV e o DVD
foram apontados igualmente em 19% das delas, seguidos por 12% que apontaram a utilização do vídeo;
o computador e o projetor de slides estavam presentes em 9% das respostas; outros equipamentos como
som, celular e outros somaram 12%.
Devemos refletir sobre essa integração no que se
refere ao seu uso. Esses recursos são ferramentas de
ensino que podem ou não ser utilizadas para novas
práticas pedagógicas, que buscam despertar no aluno
o interesse e a capacidade crítica para viajar no mundo das informações. O que vemos, no entanto, em
muitas escolas é a inserção puramente instrumental de meios tecnológicos, que são utilizados para os
mesmos modelos tradicionais de educação.
Pedagogia em Ação, v. 1, n. 1, p. 1-141, jan./jun. 2009 - Semestral
Acreditamos que, por mais que a tecnologia
avance e seja inserida na escola, o professor provavelmente ainda terá garantido o seu lugar de mediador do processo de aprendizagem. As mudanças
ocorridas estarão muito mais ligadas à forma como o
conhecimento é ressignificado a partir da utilização
dos vários recursos tecnológicos disponíveis para o
professor. Sua aprendizagem, nesse sentido, antecede
a do aluno, já que sua concepção sobre as várias maneiras de aprender tem que quebrar velhos paradigmas disseminados por várias décadas.
Quando perguntados se na escola em que estudam existe ou não laboratório de informática, 64%
responderam positivamente. Podemos afirmar que
houve grande incongruência, se separadas as respostas dos alunos das escolas A, B e C, ou seja, alunos de
uma mesma escola responderam de forma diferente a essa pergunta, uns afirmando, outros negando a
existência de laboratório de informática.
Dentre os alunos que afirmaram possuir laboratório nas escolas em que estudam, 36% declararam
não utilizar esse espaço; 19% afirmaram não existir
horário fixo para sua utilização; 6% demonstraram
que o laboratório é utilizado uma vez por semana e
3% declararam que essa utilização é feita várias vezes.
A existência de estrutura física para o trabalho
com recursos tecnológicos não é garantia de seu uso.
A capacitação de muitos professores foi insuficiente,
nos cursos de licenciatura, no que se refere ao uso
de tecnologias como ferramenta pedagógica. E se
esta é uma realidade que ele não domina, a escola
precisa buscar reverter tal situação, criando estratégias que viabilizem o acesso aos conhecimentos necessários para a atuação do professor em ambientes
informatizados.
Ao serem indagados sobre as aulas de informática na escola em que estudam, 70% dos alunos entrevistados responderam que não há aulas de informática na instituição que frequentam. Os outros 30%
têm aulas de informática, sendo que 16% das respostas coletadas explicitaram que as aulas não são lecionadas por um profissional capacitado na área e 12%
indicam que as escolas possuem disponibilidade de
um professor especializado para esse tipo de aula.
Sobre o interesse nas aulas, dos 16% que não
possuem profissional qualificado para ministrar as
aulas, foi possível perceber que 13% dos alunos julgam que as aulas de informática são interessantes, já
47
Bruna Guzman de Jesus Rapini; Lara Pires Ramos
os outros 3% dos discentes expõem que as aulas não
despertam nenhum tipo de interesse neles.
A partir das análises das respostas coletadas, não
podemos afirmar que as aulas de informática oferecidas pelas escolas pesquisadas promovem de fato o
aprendizado do alunado. Entretanto, afirmamos que
essas escolas necessitam de ressignificação no que se
refere a currículo, metodologia, didática, conteúdos e
estratégias de ação – já que as aulas não despertam
interesse em muitos educandos – a fim de alcançar
uma educação que contemple a formação integral
dos educandos, incluindo aqui a formação para atuação em uma sociedade que é cada vez mais tecnológica. Nessa perspectiva, acreditamos que é a partir
das aulas renovadas e participativas que os alunos revivem seus interesses e curiosidades, possibilitando
uma probabilidade maior da apreensão de conteúdos, efetivando a construção do conhecimento.
Questionados sobre o relacionamento virtual
com colegas de turma, a maioria dos alunos, 77%,
deu resposta afirmativa. Os alunos indicaram também como este contato é feito, destacando ferramentas como MSN, sites de bate-papo, Orkut, etc. Nesse sentido, podemos afirmar que, devido à facilidade
de aproximar virtualmente pessoas distantes fisicamente, a internet tornou-se um meio atrativo e sedutor capaz de reaproximar amigos e parentes, fato
presente em nossas próprias vidas. Por isso, a escola
deve buscar incluir essas ferramentas em seu meio,
como forma de estímulo aos adolescentes que, muitas vezes, reclamam da qualidade das aulas que são
ministradas.
Com relação à importância do computador, 31%
relacionaram-na ao ato de estudar, fazer trabalhos e
pesquisas da escola e 21%, ao auxílio à aquisição de
conhecimento, 18% afirmaram que a importância do
computador em sua vida está na possibilidade de fazer várias coisas, 9% mencionaram que a importância do computador está na sua possibilidade de se
relacionarem com parentes e amigos de longe, percentual semelhante às respostas relacionadas à possibilidade de fazer encontros com amigos e fazer novas amizades.
Percebemos, a partir desses dados, que o computador realmente tem tomado lugar na vida dos
alunos, em todos os sentidos, escolar, profissional e
pessoal, permeando relações de amizade, afetivas e
facilitando o desenvolvimento de trabalhos escola-
48
res dentre outros. Este fato reforça a importância da
inclusão e do uso consciente desse recurso midiático
no meio escolar.
De acordo com a opinião dos alunos entrevistados, 92% julgam que as aulas se tornam melhores com o uso de tecnologias e recursos da mídia,
tornando-se mais interativas, dinâmicas, práticas, divertidas e ricas em conteúdos; têm a possibilidade
de fazer trabalhos e ampliar os assuntos discutidos e
acessar informações do mundo, possibilitando mais
atualização e obtenção de maiores conhecimentos.
Outro aspecto levantado pelos alunos é que a utilização de recursos midiáticos e tecnológicos auxilia os
professores. Percebemos que os alunos gostam da interação promovida por esses recursos, pois, de acordo
com eles, as aulas se tornam mais atrativas e interessantes, além de fugirem um pouco da monotonia das
aulas expositivas.
No que tange à formação do indivíduo, perguntamos aos alunos qual a importância do uso de tecnologias e recursos da mídia para a sua formação. A
maioria deles indicou a obtenção de mais informação e mais conhecimento como fator de importância
na utilização de tecnologias e recursos da mídia para
a sua formação.
Observamos que muitos alunos já possuem a
consciência da importância do uso e da apropriação das tecnologias e das mídias para sua formação,
explicitando aspectos como a facilidade de se obter
mais informações, aprender coisas de diversos segmentos o que gera, segundo eles, a construção de
mais conhecimentos para sua formação e atuação na
sociedade e ampliação da visão de mundo.
Outro aspecto comumente abordado nas respostas sobre a importância do uso de tecnologias e recursos da mídia é a questão do universo do trabalho.
Percebemos uma latente preocupação, que parte dos
alunos, referente à necessidade de manejo e de conhecimentos sobre computadores, informática e internet como exigência para sua inserção no mercado
de trabalho.
6 - Considerações finais
Os dados obtidos indicaram que os alunos, apesar de muitos ainda não possuírem computador em
seus domicílios, têm feito o uso frequente desse recurso, para realizar trabalhos e pesquisas escolares ou
Pedagogia em Ação, v. 1, n. 1, p. 1-141, jan./jun. 2009 - Semestral
Da lousa à tela do computador: as apropriações e usos das mídias e suas implicações nos processos de aprendizagem
extraescolares com a finalidade de buscar mais informações sobre determinados assuntos ou até mesmo
para conhecer e se relacionar com outras pessoas, estejam elas distantes ou não.
Constatamos também que até mesmo aqueles
alunos que já possuem computador se mostraram
interessados em obter maiores conhecimentos a respeito das mídias.
Acreditamos que o desejo de conhecimento por
parte dos alunos ocorra pela necessidade que os jovens têm de estarem sempre atualizados e inseridos
na sociedade, inteirados das novidades que ela traz
consigo, além da preocupação com as exigências do
mercado de trabalho que está cada vez mais competitivo e exigindo novas habilidades.
Trabalhar com a utilização de tecnologias e recursos midiáticos pressupõe um currículo diversificado, no qual o tratamento didático dos conteúdos e
das práticas é trabalhado de modo diferenciado, considerando as especificidades, vivências e necessidades
de cada aluno. Apesar de muitos adolescentes restringirem a importância do uso e da apropriação das
tecnologias e das mídias para mera diversão ou bate-papos, compreendemos que, de uma maneira geral, os alunos possuem uma mentalidade consciente
acerca da sua real importância, explicitando aspectos
como a facilidade de se obterem mais informações
para pesquisas e para a construção de seu próprio conhecimento. Além disso, auxilia também na sua formação e na ampliação da visão de mundo de cada
indivíduo.
Os recursos tecnológicos e midiáticos, ao serem
utilizados de forma correta nas instituições escolares,
podem ser configurados como aliados dos docentes,
na medida em que possibilitam uma gama diversificada de aulas. A escola, como uma das principais
instituições da sociedade, tem o dever de ofertar uma
educação de qualidade que possibilite a formação
integral do educando nos aspectos cognitivo, social,
político, cultural e, atualmente, tecnológico.
A importância do computador na vida dos alunos
foi exposta de forma a concluirmos que esse recurso
tem conseguido grande abrangência em todos os setores da vida humana. De acordo com os alunos pesquisados, sua importância vai desde a possibilidade de
pesquisas escolares e aquisição de novos conhecimentos até a possibilidade de conquistar novos amigos,
ponto de partida para novos relacionamentos afetivos.
Pedagogia em Ação, v. 1, n. 1, p. 1-141, jan./jun. 2009 - Semestral
No que diz respeito aos desafios enfrentados pelas instituições escolares no processo de utilização e
apropriação das mídias, sabe-se que as pedras no caminho ainda são muitas, há a problemática da capacitação dos docentes, a facilidade de dispersão, a confusão entre conhecimento e informação, a escassez
de recursos tecnológicos, a necessidade de mudanças
nas metodologias, nas didáticas, nos objetivos e nas
estratégias de ação.
Faz-se necessário que toda a comunidade escolar
esteja de fato envolvida com as metas e finalidades da
inclusão digital no ensino que é criar condições para
que o indivíduo desenvolva suas habilidades pessoais
e profissionais, a fim de melhor viver em sociedade.
Mais do que isso, espera-se que as metas da inclusão
digital passem ao campo das realidades efetivadas.
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50
Pedagogia em Ação, v. 1, n. 1, p. 1-141, jan./jun. 2009 - Semestral
Um caso de inclusão na rede pública de ensino:
estamos mesmo incluindo?
Cynthia Loureiro Amorim *
Orient.: Sérgio de Freitas Oliveira **
Resumo
O presente artigo apresenta o caso de um aluno matriculado na Rede Estadual de Ensino, em Belo
Horizonte, o seu percurso, o movimento de alguns profissionais que o acompanharam, bem como a
constatação da falta de recursos que os profissionais da Rede vivenciam.
Palavras-chave: Inclusão; Rede pública; Ensino.
E
m tempos em que o discurso governamental, no que tange à educação, vem sendo
sobre a necessidade de se alcançar uma
supremacia da qualidade, tanto na formação de docentes quanto no sistema de ensino; em
que os cursos de Pedagogia e, consequentemente,
os professores são frequentemente avaliados, podese, ocasionalmente, ter a impressão de que muitos
subsídios estão sendo oferecidos a esses profissionais
no exercício de suas profissões, bem como aos alunos
que utilizam o sistema público de ensino.
A Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB)
9.394/96, em seu capítulo V, sinaliza que a educação dos alunos com necessidades especiais deve se
dar, preferencialmente, na rede regular de ensino e
aponta uma nova concepção na forma de entender a
educação e a integração dessas pessoas. No entanto,
a constatação desse capítulo não garante que as pessoas com necessidades especiais terão os seus direitos
respeitados.
José 1 foi matriculado em janeiro de 2007, na
6ª série do Ensino Fundamental, em uma escola da
Rede Estadual de Ensino, em Belo Horizonte. Ao
ser matriculado, apresentou um diagnóstico médico
do qual consta que ele apresenta leve comprometimento cognitivo, motor e da fala, decorrente de um
acidente no qual perdera massa encefálica. Anteriormente, estava matriculado em uma escola da Rede
Municipal de Ensino, recebendo formação de acordo com os métodos e processos da Escola Plural,
concluindo, assim, o primeiro ciclo de formação do
Ensino Fundamental I, fora da faixa etária regular.
Por apresentar necessidades educacionais especiais,
fora encaminhado a uma escola particular de ensino 2, onde foi reclassificado para a 5ª série do Ensino
Fundamental.
À medida que transcorria o ano letivo, percebeuse que o aluno apresentava também grande defasagem em termos de aprendizagem, além de dificuldades de interação com o grupo de alunos da sala.
Segundo a professora que o acompanhava, ele era
muito disperso e, às vezes, se isolava não querendo
participar das atividades propostas ou demonstrava
desânimo em relação às aulas.
1. Nome fictício, para preservar a identidade do aluno. O alu- 2. O aluno foi matriculado nessa escola particular devido a
no é filho de pais de idade mais avançada e oriundos de uma uma bolsa que o aluno conseguira, mas que teve somente um
camada social desprivilegiada. Atualmente, o pai é vendedor ano de validade. Trata-se de uma escola que propicia um atenambulante e a mãe dona de casa.
dimento mais individualizado, com turmas reduzidas.
*
Graduada em Pedagogia com Ênfase em Ensino Religioso pela PUC Minas. E-mail: [email protected]
**
Licenciado em Letras e em Pedagogia. Professor Adjunto da PUC Minas. E-mail: [email protected]
Pedagogia em Ação, v. 1, n. 1, p. 1-141, jan./jun. 2009 - Semestral
51
Cynthia Loureiro Amorim
Visando cumprir o que a própria LDB dispõe em
seu capítulo V, art. 58, parágrafo 1º: “haverá, quando
necessário, serviços de apoio especializado, na escola regular, para atender às peculiaridades da clientela
de educação especial”, a Supervisora Pedagógica verificou junto à Inspetora Escolar e à Secretaria Municipal de Educação sobre como proceder com esse
aluno em termos de processo ensino-aprendizagem
e de sua avaliação.
Tendo em vista a dificuldade em se obter apoio e
soluções junto aos órgãos competentes, o aluno, conforme orientações da Inspetora Educacional, passará
a frequentar o Projeto Aluno em Tempo Integral 3 que
acontece na escola no período da manhã. Segundo a
Inspetora, no período em que ele estivesse no Projeto, este receberia suporte e acompanhamento escolar
em relação a leitura, interpretação e raciocínio lógico, teria a possibilidade de participar de atividades
que permitem interação e socialização, como a dança
de rua e a prática esportiva, e de desenvolver hábitos saudáveis, como organização pessoal, higiene, etc.
Por iniciativa da Supervisora Pedagógica e em
acordo com a Inspetora, buscou-se o encaminhamento do aluno a um serviço de psicologia que se
dispôs atendê-lo, gratuitamente, para uma avaliação
e possível acompanhamento. Contudo, a família não
demonstrou interesse em propiciar ao aluno estar
presente nos horários marcados pela clínica. O aluno
acabou sendo retido na 6ª série.
Segundo relatório da professora do Projeto, que
acompanhou o aluno até o final do 1º semestre deste ano, ele ainda apresenta dificuldades em relação à
aprendizagem, mas percebe-se algum avanço em relação ao ano passado, tendo em vista que ele tem realizado algumas das tarefas escolares propostas, fato
que não ocorria anteriormente. O aluno necessita de
um prazo muito longo para realizar algumas atividades, principalmente as de Matemática, tendo havido momentos em que teve a necessidade de contar
os dedos, mas não se nega em ir ao quadro e fazê-la
diante da turma. Quando alguns colegas o auxiliam,
ele as faz em tempo hábil, porém já ocorreu passar
toda a manhã (3 a 4 horas) realizando uma mesma
tarefa que foi programada para 50 minutos. Isso se
3. O Projeto Aluno em Tempo Integral não visa ao atendimento a alunos com necessidades educacionais especiais. O
atendimento deste aluno neste Projeto, segundo informações
da Supervisora, consiste somente numa forma paliativa, com o
objetivo de minimizar o problema.
52
dá não só pelas dúvidas em relação ao conteúdo, mas
pelo fato de ele ficar conversando e brincando com
os outros, deixando a tarefa de lado. Os textos por ele
produzidos contêm muitos erros ortográficos, muitas
palavras são escritas exatamente como ele as pronuncia; no entanto, apresentam sequência lógica (ele não
“desvia” do assunto e os textos apresentam princípio,
meio e fim).
Em relação à disciplina e ao comportamento, apresenta-se quieto e, muitas vezes, apático. Não
participa de jogos e outras atividades em grupos
maiores. Prefere unir-se a dois outros colegas e ficar
correndo pelo pátio da escola. Envolve-se com frequência em discussões, usando palavras de baixo calão para ofender as colegas.
Em conversa informal, a professora que o acompanha no Projeto Escola Integral acredita que o
aluno, em seu tempo, esteja amadurecendo; porém,
como se trata de um processo lento, pensa ser necessário contar com a ajuda de um profissional competente para que José não perca a motivação e o interesse pela aquisição de novos saberes.
Segundo Charlot,
O aluno é também, e primeiramente, uma criança ou
um adolescente, isto é, um sujeito confrontado com
a necessidade de aprender e com a presença, em seu
mundo, de conhecimentos de diversos tipos. Um sujeito é um ser humano, aberto a um mundo que não
se reduz ao aqui e agora, portador de desejos, movido
por esses desejos, em relação com outros seres humanos,
eles também sujeitos; um ser social, que nasce e cresce em uma família (ou em um substituto da família),
que ocupa uma posição em um espaço social, que está
inscrito em relações sociais; um ser singular, exemplar
único da espécie humana, que tem uma história, interpreta o mundo, dá um sentido a esse mundo, à posição que ocupa nele, às suas relações com os outros, à
sua própria história, à sua singularidade [...]. Estudar
a relação com o saber é estudar esse sujeito enquanto
confrontado com a necessidade de aprender e a presença de “saber” no mundo. (CHARLOT, 2000, p. 34)
Atualmente, o aluno encontra-se na escola repetindo a 6ª série e em vias de não ser aprovado. A
Supervisora e a Professora que o acompanharam
mostraram-se preocupadas com a situação do aluno,
no entanto, sentem-se impotentes diante da falta de
providências institucionais.
Pedagogia em Ação, v. 1, n. 1, p. 1-141, jan./jun. 2009 - Semestral
Um caso de inclusão na rede pública de ensino: estamos mesmo incluindo?
Referências
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de dezembro de 1996. Estabelece as diretrizes e bases da
educação nacional. Brasília, 1996. Disponível em: <http://
portal.mec. gov.br/arquivos/pdf/ldb.pdf> Acesso em: 01
nov.2008.
CHARLOT, Bernard. Da relação com o saber: elementos para uma teoria. Porto Alegre: Artmed, 2000.
Pedagogia em Ação, v. 1, n. 1, p. 1-141, jan./jun. 2009 - Semestral
53
Um olhar pedagógico sobre o projeto cultural da FALE/BHtrans
– “leitura para todos” – no interior dos ônibus: repercussões e
alternativas na prática da leitura
Resumo
Cristiane Rute Machado da Silva *
Mayara Marinho Silva Oliveira *
Renata Cristina da Silva Sousa *
Tamara Seabra de Souza *
Orient.: Vera Lúcia Lins Sant’Anna **
A Faculdade de Letras da Universidade Federal/MG vem desenvolvendo desde 2004, em Belo Horizonte, o projeto “Leitura para Todos”, com o objetivo de proporcionar o conhecimento da literatura
brasileira nos ônibus da capital, fomentando assim o gosto pela leitura em seus usuários. Analisar
esse projeto como uma das práticas educativas inseridas na sociedade contemporânea é o principal
objeto desta reflexão. Para isso foram realizadas pesquisas bibliográficas e de campo. A leitura é um
ponto fundamental para o ser humano, pois, por meio dela, ampliam-se visões e interpretações sobre
o mundo e a vida como um todo. Sabe-se que o hábito da leitura é influenciado por diversos motivos
e um deles está ligado à escolarização. Foi possível perceber que o projeto tem repercutido positivamente, servindo de referência para outras cidades brasileiras.
Palavras-chave: Leitura; Literatura; Sociedade; Textos literários e cultura.
1- Introdução
O
presente artigo é fruto de uma pesquisa realizada, com a finalidade de analisar pedagogicamente o projeto “Leitura
para Todos” como prática educativa em
ambiente não escolar. Elegemos como objetivos específicos: identificar como se dão as práticas de leitura dos usuários dos coletivos e apontar as repercussões desse projeto.
Ao longo deste trabalho, desejou-se responder às
seguintes questões:
• Se uma das desculpas do baixo nível de leitura literária das pessoas é a falta de acesso a ela, será que elas
reconhecem esse tipo de projeto como uma forma de
acesso?
• O projeto foi implantado nos ônibus, pois por eles transitam vários indivíduos (analfabetos, analfabetos funcionais, alfabetizados, letrados). De que forma o projeto
pretende contribuir para a elevação do nível de leitura
por meio da Literatura Brasileira?
Buscaram-se as respostas por meio de um formulário dirigido à Faculdade de Letras da Univer*
sidade Federal de Minas Gerais (FALE/UFMG) e
ao responsável que administra o projeto na Empresa de Transportes e Trânsito de Belo Horizonte –
BHTRANS, além de conversa com passageiros de
três linhas de ônibus de Belo Horizonte em cujos
veículos as lâminas estavam afixadas.
2 - Contextualização da leitura e da literatura no Brasil
Os dicionários da língua portuguesa conceituam leitura como “ato, arte ou hábito de ler, aquilo
que se lê”. Solé (1998) amplia o conceito, afirmando
que leitura “é um processo de interação entre o leitor e o texto, neste processo tenta-se satisfazer [obter
uma informação pertinente para] os objetivos que
guiam sua leitura”. Usaremos a palavra leitura nessa
perspectiva.
A leitura faz parte do cotidiano das pessoas. Por
meio dela pode-se agir criticamente e com autonomia na atual sociedade letrada, podendo causar frustração ou desvantagem nas pessoas que não detêm
essa prática. Essa desvantagem pode ser percebida na
sociedade burguesa, conforme Staiger,
Graduandas do curso de Pedagogia da PUC Minas. E-mails:
Doutora em Ciências da Religião. Mestre em Educação. Professora da PUC Minas. E-mail: [email protected]
**
Pedagogia em Ação, v. 1, n. 1, p. 1-141, jan./jun. 2009 - Semestral
55
Silva, C. R. M. da; Oliveira, M. M. S.; Sousa, R. C. da S.; Souza, T. S. de
A arte de ler e de escrever foi durante milhares de anos
monopólio sagrado de pequenas elites. Por volta de
1750, no dealbar da revolução industrial, haviam decorrido quase 5000 anos sobre o aparecimento dos primeiros rudimentos da arte da escrita. Contudo, mais de 90
por cento da população mundial não tinha acesso à arte.
(STAIGER, 1975, p.25)
A difusão da leitura tem sua raiz na necessidade
burguesa que precisava de mão de obra qualificada.
Por essa razão, se escolarizaram os operários, possibilitando o acesso à leitura. Percebe-se que a leitura
é marcada pelo fator de ordem social. Na medida em
que os operários aprenderam a ler, houve a expansão da indústria de produção de livros e do mercado
consumidor de literatura.
Durante o século XIX no Brasil, o livro literário exerceu várias funções na sociedade e, mais uma
vez, ele aparece como fator de ordem social. Como
confirma Sergius Gonzaga (2002), o livro era a mais
perfeita forma de prazer; era uma insubstituível fonte de conhecimento humano; era o próprio espelho
da nação, na qual a pequena elite letrada se reconhecia; era o modelo supremo de correção e elegância do
idioma pátrio.
Com o passar dos anos, os meios de comunicação ganharam lugar e houve uma queda na venda
dos livros, “todavia não deve ser considerada como a
emergência do apocalipse” (GONZAGA, 2002).
Na contemporaneidade, a leitura ainda é influenciada pela ordem econômica: os livros literários
têm um preço muito elevado em relação ao salário
mínimo que o brasileiro recebe. Assim, o nível de
leitura continua baixo se comparado a outros países. A escola procura elevar esse nível, inserindo na
disciplina de Língua Portuguesa fragmentos da literatura ou até mesmo destinando uma aula semanal para esse fim. A escola utiliza os fragmentos em
atividades gramaticais e em interpretação de textos,
buscando sempre incorporar conteúdos à literatura, modificando o significado real da leitura literária,
tornando-a uma obrigação escolar.
Literatura advém do latim litteratura, “que significa arte de compor ou escrever trabalhos artísticos
em prosa ou verso; o conjunto de trabalhos literários
dum país ou duma época” 1.
Sendo a literatura um conjunto de trabalhos literários dum país ou duma época, caberia à escola
1. Dicionário Aurélio Eletrônico, 2008, p. 1.
56
refletir sobre ela criticamente. Se a literatura é utilizada simplistamente, quando o indivíduo está em
processo de escolarização, ao alcançar a fase adulta
provavelmente não verá significado na leitura literária. O que impossibilita a ampliação dos seus horizontes de experiências por meio da leitura e a reflexão sobre seus valores e condutas.
Ao professor cabe selecionar os tipos de textos
viáveis para seus alunos, sendo de extrema importância o uso da literatura no estímulo à leitura [grifo nosso] desde o início da escolarização das crianças. É na escola que a criança aprende a ler e a usar
a leitura.
O exercício da leitura não se restringe apenas
à habilidade de decifração de códigos escritos, mas
estende-se à compreensão, à reflexão e à aquisição
de novos saberes. Portanto, há uma grande diferença
entre ser ledor e leitor: o ledor caracteriza-se como
um sujeito passivo, a quem pouco ou nada lhe acrescenta o ato de ler. Já o leitor é aquele sujeito ativo,
criativo, que consegue ler as linhas e entrelinhas dos
textos. (CORDEIRO, 2006, p. 91).
Ler não é compreender o sentido que o autor
desejou na sua produção, mas inferir significado conforme sua experiência social, pessoal e econômica – o
ato de ler é particular.
Os textos literários vêm sempre carregados da
bagagem cultural, das sensibilidades e questões referentes ao tempo do escritor. “Cada texto, implícita ou
explicitamente, traz perguntas e respostas que transformam em tema uma época, uma ideia, um conjunto de conhecimentos, uma forma de ver e de sentir o
mundo” (CORDEIRO, 2006, p. 93). Assim, os textos literários contêm algumas “lacunas” a serem preenchidas pelos leitores durante suas leituras, cabendo
aos mesmos preenchê-las de acordo com os acontecimentos de sua época, o que faz com que esses textos continuem surpreendendo seus leitores por causa
dessa possibilidade.
Percebe-se que a leitura proporciona prazer ao
leitor e o desenvolvimento das suas capacidades cognitivas, afetivas e psicomotoras.
3 - Trajetória
dos”
do
Projeto “Leitura
para
To-
O projeto “Leitura Para Todos”, implantado em
2004, é uma das atividades feitas pelo programa “A
Pedagogia em Ação, v. 1, n. 1, p. 1-141, jan./jun. 2009 - Semestral
Um olhar pedagógico sobre o projeto cultural da FALE/BHtrans – “leitura para todos” – no interior dos ônibus...
Tela e o Texto”, criado em 1998, que tem como objetivo elevar o índice de leitura da população brasileira (principalmente daqueles que têm pouco acesso
a livros) através da disponibilização dos textos mais
conhecidos e ricos da literatura brasileira – poemas,
contos, crônicas, romances - impressos e plastificados em lâminas no tamanho A4, que são amarradas
nas poltronas dos ônibus de Belo Horizonte. Esse
projeto é uma iniciativa da Faculdade de Letras da
UFMG (FALE) em parceria com a BHTRANS,
empresa patrocinadora de todas as lâminas e de todas as bolsas dos monitores do projeto - responsáveis
por sua manutenção e repercussão.
Ao entrevistar a professora Maria Antonieta Pereira, coordenadora e autora do projeto “Leitura para
Todos”, ela relatou que a iniciativa de se criar esse
projeto surgiu durante a realização de seu curso de
mestrado na Argentina (Buenos Aires), em que sempre via as pessoas lendo diversos tipos de textos e livros dentro do metrô, e também ao ver a ótima idEia
de um homem que xerocava os livros mais conhecidos, encadernando-os com capa de papelão e os vendendo por um preço muito barato, para que toda a
população tivesse acesso a essas obras.
Por ser o ônibus um meio que transporta uma
quantidade significativa e variada de pessoas todos
os dias, escolheu-se desenvolver aí o projeto. Nos
ônibus, passam pessoas que têm muito acesso a livros de vários tipos e qualidades e também pessoas
que têm pouco ou até nenhum acesso a eles.
Como o projeto tem tido boa aceitação pelos
usuários dos ônibus, a sua autora afirmou que: “posteriormente, foram confeccionados livrinhos para
serem vendidos a baixo custo (R$1,99 cada), contendo as obras dos autores mais famosos da literatura brasileira, para incentivar ainda mais a leitura dos
mesmos”.
O projeto conta com a participação do público
através de ligações e de e-mails pelo site do programa “A Tela e o Texto”, no qual as pessoas buscam informações sobre o projeto, sugerem melhorias e enviam textos para que sejam publicados.
4 - Um olhar pedagógico sobre os resultados
da pesquisa
Uma das etapas previstas no trabalho era verificar se o público-alvo do projeto o conhecia e lia as
Pedagogia em Ação, v. 1, n. 1, p. 1-141, jan./jun. 2009 - Semestral
lâminas. Dessa maneira, fomos observar e entrevistar
alguns usuários de três linhas de bairros distintos.
Com base nos relatos, pôde-se perceber a repercussão do projeto. Foram entrevistados 26 usuários
das linhas 2210A, 2256A e 2103. O nível econômico
e social influenciou nos resultados da pesquisa, pois
as linhas 2210A e 2256A são da região norte de Belo
Horizonte e houve grande resistência em responder
às questões. Já na linha 2103, da região oeste, eles foram mais receptivos e interessados na pesquisa.
A primeira pergunta foi: “Você sabe por que estes textos estão afixados nas poltronas dos ônibus?”.
Dos 26 usuários, 12 responderam que sim, 7 que não
e 7 deduziram que fosse um incentivo à leitura. “Penso que é para o povo que não tem acesso a livros por
falta de dinheiro e tempo, principalmente por causa
do dinheiro para comprar livros; para ter acesso aos
nossos escritores, conhecendo um “conto” de Graciliano; Jorge Amado; para o público saber que existe e
não ficar ignorante” (C.R.M., 55 anos).
“Creio que é para distrair os passageiros ou
para incentivar a leitura ou, às vezes, para dar alguma informação sobre a linha e o ônibus”. ( J.C.T., 38
anos).
Ao serem indagados sobre o costume de ler os
textos, obtivemos o seguinte resultado: 13 pessoas
leem, 6 não leem e 7 às vezes leem.
A terceira questão se referiu à opinião dos usuários quanto ao projeto. As respostas foram bem diversificadas: 2 achavam o projeto excelente, 4 ótimo,
6 bom, 7 importante, 1 ruim, para 3 não fazia diferença e 3 não responderam.
Duas pessoas relataram que o projeto “é interessante para quem gosta de ler” (G.P.S., 35 anos); e o
trocador de uma das linhas falou que “faltam figuras nas lâminas, o que torna difícil a interpretação; o
projeto está lidando com pessoas “chucras” e intelectuais” (C.R.T., 25 anos).
A última questão da entrevista indagava sobre a
percepção dos usuários em relação às lâminas como
incentivo à leitura e se lhes acrescentavam algo na
vida. As respostas nos chamaram muita atenção, por
essa razão as falas foram transcritas na íntegra, preservando a identidade dos entrevistados.
A maioria das pessoas respondeu que os textos
são um incentivo à leitura, apenas três disseram que
não, e suas respostas foram: “Não, nada” (D.S.F., 23
anos); “Não, não gosto desse tipo de leitura, leio so-
57
Silva, C. R. M. da; Oliveira, M. M. S.; Sousa, R. C. da S.; Souza, T. S. de
mente a bíblia e livros evangélicos” (H.D.S, 45 anos);
“Eu não acho como incentivo, pois não me chamam
a atenção não” (F.R.G., 32 anos). Fica claro que essas
pessoas não veem motivo algum para as lâminas estarem dentro dos ônibus.
Já as pessoas que afirmaram ser um incentivo
disseram:
“Percebo como um incentivo, ler nunca é demais:
aprimora os conhecimentos; o hábito de ler e escrever; engloba todos os fatores” (A.F.R., 39 anos).
“Sim. A leitura distrai e precisamos muito de ler,
apesar das mudanças que têm acontecido na Língua
Portuguesa, o que acho que não deveria acontecer.
Conheço o projeto desde que começou na linha nº
2 e só agora ele está chegando na periferia. Muda a
vida da gente, tem dia que estamos tristes e a leitura
nos ajuda nesse sentido” (F.T.B., 60 anos).
Além dessas respostas, outros argumentos positivos foram relatados, tais como: estímulo à criatividade; acesso a outras culturas; preenchimento do
tempo livre durante a viagem; aquisição de conhecimentos; aguçar a curiosidade sobre as obras e seus
autores; abranger um grande número de pessoas.
Para algumas pessoas o incentivo depende dos tipos
de textos disponíveis.
Nota-se que os entrevistados, em sua grande
maioria, respondem impulsivamente por desconhecerem o projeto e por não refletirem sobre o mesmo.
Mais uma vez foi possível perceber a influência
do fator econômico e social na prática da leitura, pois
as pessoas que têm o hábito de ler desde a infância
consideram o projeto positivo, enquanto as pessoas
que não o têm não vão adquiri-lo somente lendo as
lâminas presentes nos ônibus. O hábito é constituído ao longo dos anos. Aqueles indivíduos que têm
um alto nível de conhecimento científico, veem as
lâminas como aprimoramento dos conhecimentos,
todavia aqueles menos instruídos academicamente,
mas leitores, as reconhecem além das capacidades e
habilidades cognitivas, mas interligadas à sabedoria
da arte de viver.
5 - Considerações finais
Constata-se, por meio das análises realizadas,
que proporcionar o acesso à leitura de qualidade,
como os textos literários, não é suficiente para fazer
com que as pessoas criem o hábito da leitura. A ini-
58
ciativa da FALE juntamente com a BHTRANS tem
ótimas repercussões desde que o projeto foi implantado, porém o desejo vai de encontro aos obstáculos.
O projeto permite à população ter acesso à literatura brasileira, contudo o que pôde ser percebido é
que o público-alvo não reconhece a importância enraizada nele. Quando projetos como este são realizados, o acesso deixa de ser desculpa e passa a ser incômodo para algumas pessoas; a questão principal é a
escolarização da literatura. Dessa maneira, o projeto
só atinge as pessoas que já têm gosto pela leitura.
Todavia, não há como atender a toda a diversidade cultural, regional e social dos usuários dos ônibus, uma vez que o projeto não visa alfabetizar ninguém, contribuindo apenas para a prática cotidiana
de leitura, sendo quase impossível atingir os analfabetos e as pessoas que têm certos tipos de necessidades educacionais especiais.
Com o projeto, considera-se que toda estratégia
que visa elevar o nível de leitura é pertinente, mas
ainda há muito a ser feito. A mobilização inicial deve
partir da família e da escola, fomentando desde a infância o hábito da leitura, para que haja uma cultura
de leitores literários e escritores na sociedade.
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Pedagogia em Ação, v. 1, n. 1, p. 1-141, jan./jun. 2009 - Semestral
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Importância da contação de histórias como prática educativa no
cotidiano escolar
Resumo
Divina Lúcia de Souza Medeiros Neder *
Érica Cristina Silva Almeida *
Liziane Aparecida Leite Cunha *
Lucilene Cristiane da Silva Fernandes *
Tatiana Lage de Castro *
Thaissa Cristina de Almeida *
Orient.: Vera Lúcia Lins Sant’Anna **
O presente artigo é resultado da síntese de um minicurso direcionado a estudantes de Pedagogia
e professores interessados em enriquecer sua prática pedagógica, que teve como foco a importância da contação de histórias no contexto escolar e para o desenvolvimento das crianças como um
todo, visando apresentar algumas habilidades e técnicas necessárias a um bom contador, bem como
orientá-lo na escolha da narrativa mais adequada à situação educativa. De acordo com pesquisa
bibliográfica prévia, ficou evidenciado que a utilização desse recurso como auxiliar da prática pedagógica potencializa o aprendizado e contribui para o desenvolvimento da personalidade dos alunos
de maneira significativa.
Palavras-chave: Estratégia pedagógica; Motivação. Criatividade; Desenvolvimento cognitivo.
1 - Introdução
N
a sociedade contemporânea, cada vez
mais permeada pelas novas tecnologias,
os educadores se deparam com um novo
desafio: como desenvolver o gosto pela
leitura nas crianças em idade escolar. De acordo com
estudiosos, as crianças que possuem esse hábito têm
potencializado o seu desenvolvimento cognitivo e,
nesse caso, a contação de histórias emerge como valioso auxiliar da prática pedagógica de professores dos
anos iniciais do ensino fundamental. Da mesma forma, eles afirmam que as narrativas estimulam a criatividade, a oralidade, facilitam o aprendizado e ainda
colaboram na formação da personalidade da criança.
Sendo assim, é importante que o professor conheça habilidades e técnicas necessárias a um bom
contador de histórias, bem como saiba escolher a
narrativa mais adequada à situação.
2 - A arte milenar de contar histórias
Desde os tempos mais remotos, o homem descobriu que contar histórias, além de entreter, causava
admiração e conquistava a aprovação dos que as ou*
viam. Pouco a pouco, o contador de histórias tornouse o centro da atenção popular, pelo prazer que suas
histórias proporcionavam a todos.
Na passagem do estado bárbaro para a vida organizada, o contador de histórias,
[...] o pajé, que tinha, só ele, os segredos da arte de dizer,
deixou de ser um mero instrumento de diversão e encantamento popular, para ser depositário das tradições
da tribo, as quais ele deveria transmitir às novas gerações
para serem conservadas e veneradas através dos tempos.
(TAHAN, 1966, p. 17).
Já na Antiguidade, o ato de contar histórias foi
utilizado como meio de propagação das doutrinas
religiosas budistas; os contos se caracterizavam por
um conteúdo religioso.
Na Idade Média, o contador de histórias era respeitado em todos os lugares,
[...] as crônicas atestam que na Boêmia, na Áustria e nas
Ilhas Britânicas, os trovadores, os segréis, os jograis e os
menestréis obtinham passaportes quando outros indivíduos não podiam obtê-los. Esses eram os que, cantando,
recitando, declamando, iam de palácio a palácio, de aldeia a aldeia, contando as histórias tão a gosto popular.
(TAHAN, 1966, p. 17-18).
Graduandas do curso de Pedagogia da PUC Minas. E-mails: [email protected]; [email protected]; lizianelcunha@hotmail.
com; [email protected]; [email protected]; [email protected];
**
Doutora em Ciências da Religião. Mestre em Educação. Professora da PUC Minas. E-mail: [email protected]
Pedagogia em Ação, v. 1, n. 1, p. 1-141, jan./jun. 2009 - Semestral
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Neder, D. L. de S. M.; Almeida, É. C. S.; Cunha, L. A. L.; Fernandes, L. C. da S.; Castro, T. L. de; Almeida, T. C. de
Para Tahan (1966), o ato de contar histórias, desde os tempos mais remotos até os dias atuais, é utilizado como um veículo de verdades eternas, sendo
um meio de conservação de suas tradições, ou difusão de novas ideias, ou seja, ninguém ignora a poderosa influência que a história tem exercido nas reformas sociais por que têm passado os povos.
3 - A
contação de histórias no contexto
escolar
A Contação de Histórias é uma estratégia pedagógica que pode contribuir de forma significativa na
prática docente. Embora essa atividade possa parecer
nada mais que uma oportunidade de distrair e acalmar crianças, no que é bastante eficiente, seus efeitos
vão muito além do entretenimento. Ouvir histórias
estimula a imaginação, educa, instrui e desenvolve as
habilidades cognitivas, além de fornecer o ponto de
partida para se introduzir o conteúdo programático.
O momento da contação de histórias deve, portanto, ser bem aproveitado. O professor precisa explorar essa arte com criatividade e beleza, de modo
a instigar a imaginação das crianças; desenvolver a
oralidade - quando oferecer a elas a oportunidade de
interagir com a história contada; sugerir o reconto,
que propicia um momento de conhecer a percepção
dos alunos, explorar e ampliar seus conhecimentos
lingüísticos; e favorecer a aprendizagem em diferentes disciplinas, ao abordar temas relacionados aos
conteúdos estudados e de interesse dos alunos, de
modo interdisciplinar, de uma riqueza singular.
Embora o tema da Contação de Histórias seja
inevitavelmente relacionado a livros, ele possui dimensões bem maiores. Na televisão e na Internet,
por exemplo, são sugeridas às crianças histórias
com enredos variados, com a narrativa apresentada
de forma tão completa (com sons e imagens), o que
se tornou um grande desafio para a escola, uma vez
que representam um grande atrativo e influenciam
o comportamento dos alunos. Os livros, por sua vez,
ainda guardam em si fabulosos tesouros a serem encontrados, que levam as crianças a criar, rir, se divertir e crescer com a magia das histórias contadas, mas,
para tanto, basta que o professor saiba a melhor maneira de apresentá-las.
62
4 - As
características necessárias a um bom
contador de histórias
Para ser um bom contador de histórias, não é
preciso possuir habilidades específicas, basta apenas
contar com o coração e contagiar o público com seu
entusiasmo. Também é necessário memorizar bem a
história, para torná-la espontânea e envolvente, preocupando-se sempre com a entonação, o timbre de
voz e as expressões faciais, fazendo com que as crianças se transportem para dentro da narrativa e criem
laços identificatórios com ela.
Sempre que possível é conveniente abrir espaço
para que as crianças participem da história, estimulando, assim, a criatividade e a imaginação. Tudo isso
deve culminar numa identificação da criança com o
enredo ou mesmo com os personagens da narrativa em questão, criando nelas sentimentos novos e a
apreensão de novos conceitos.
5 - Os
recursos mais utilizados em contações
de histórias
Para tornar a narrativa mais atraente, é interessante valer-se de diversos recursos, explorando bastante sua criatividade. Esses recursos auxiliam na
contação, uma vez que os personagens tornam-se, de
certa forma, reais, chamando a atenção das crianças
e estimulando sua imaginação.
Para tanto, é necessário que o contador observe
as principais características do público para o qual
ele contará a história, facilitando assim a escolha da
mesma e os recursos a serem utilizados.
Alguns dos recursos mais utilizados são:
• o livro;
• gravuras;
• fanelógrafo (avental próprio para contação de histórias);
• desenhos;
• fantoches
Além dos recursos materiais,os gestos,as vozes e as
roupas também são grandes aliados na contação de histórias, enriquecendo de modo significativo a narrativa.
Pedagogia em Ação, v. 1, n. 1, p. 1-141, jan./jun. 2009 - Semestral
Importância da contação de histórias como prática educativa no cotidiano escolar
6 - A importância do conto na construção da
subjetividade e sua utilização no contexto pedagógico
Uma fábula, uma poesia, um conto, ao serem recitados, podem provocar nos seres humanos as mais
variadas reações, tais como: risos, choros, alegrias,
tristezas, dor, etc. Os elementos simbólicos presentes
numa narrativa conseguem evocar conteúdos psíquicos do indivíduo, os quais o ajudam a construir sua
realidade e a lidar com ela.
As narrativas em sala de aula podem se tornar ótimas ferramentas para o desenvolvimento da subjetividade dos alunos. Como salientado por Bettlheim,
[...] o poder regenerador dos contos de fadas, por conterem na sua estrutura elementos simbólicos, cria uma
ponte com o inconsciente, integrando os conteúdos arquetípicos e propiciando à criança conforto e consolo
em termos emocionais. (BETTLHEIM apud BUSATTO, 2003, p.15).
O mesmo autor ainda aponta que “através de um
conto, a criança dá vazão aos seus afetos” (BUSATTO, 2003, p. 17). Sendo assim, o conto propicia à
criança experienciar suas emoções, vivê-las em sua
fantasia, sem que precise passar pelas mesmas situações na vida real.
A literatura oral trazida para a sala de aula pode
ser trabalhada de várias formas, em diversas disciplinas escolares. O ato de contar histórias no ambiente
escolar é uma experiência de interação entre contador e ouvinte e ainda amplia o vocabulário do aluno
e sua forma de comunicação, sobrepondo-se a realidade e a fantasia às situações pedagógicas trabalhadas em sala de aula. Segundo Abramovich,
[...] é através duma história que se podem descobrir outros lugares, outros tempos, outros jeitos de agir e de ser,
outra ética, outra ótica. É ficar sabendo história, geografia, filosofia, política, sociologia, sem precisar saber o
nome disso tudo e muito menos achar que tem cara de
aula [...] (ABRAMOVICH, 1995, p.17).
Além disso, a história possibilita o contato das
crianças com o uso real da escrita, leva-as a conhecer
novas palavras, a discutir valores como o amor e o
trabalho e a usar a imaginação, tornando-as criativas
e capazes de pensar.
Pedagogia em Ação, v. 1, n. 1, p. 1-141, jan./jun. 2009 - Semestral
Contudo, a literatura apresentada para a criança
não deve ser usada como pretexto para a atividade,
mas sim, a partir dela, valorizar a oralidade através da
comunicação e a transmissão da cultura.
Utilizadas com habilidade e criatividade, as narrativas podem ser um recurso pedagógico que abrange os mais diversos conteúdos didáticos, além de
propiciar ao professor o acesso à subjetividade dos
alunos e o seu desenvolvimento.
7 - Considerações finais
A contação de histórias é uma importante aliada da prática pedagógica, pois, além de desenvolver
a criatividade, a oralidade e o pensamento crítico,
trabalha na construção da identidade do educando
e abre caminhos para novas aprendizagens nas diversas disciplinas, devido ao seu caráter motivador
sobre a criança.
Sendo assim, é interessante que o professor tenha conhecimento dos benefícios desse instrumento
sobre o desenvolvimento dos alunos, e saiba utilizálo como auxiliar em sua prática.
Referências
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e bobic es. São Paulo:Scipione, 1995.
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Acesso em: 23 out. 2008.
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2008
GILLIG, Jean-Marie. O conto na psicopedagogia. Porto Alegre: Artmed, 1999. 228 p.
MARI, Hugo; MACHADO, Ida Lúcia; MELLO, Renato de. Análise do discurso: fundamentos e práticas.
Belo Horizonte: UFMG, Faculdade de Letras, 2001.
63
Neder, D. L. de S. M.; Almeida, É. C. S.; Cunha, L. A. L.; Fernandes, L. C. da S.; Castro, T. L. de; Almeida, T. C. de
MCWILLIAMS, Barry. Como contar histórias. Idéias
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TAHAN, Malba. A arte de ler e contar histórias. 5. ed.
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VILELA, Mário; SILVA, Fátima. Actas do 1º Encontro
Internacional de Linguística Cognitiva. Porto: Faculdade de Letras do Porto, 1999. 331 p.
64
Pedagogia em Ação, v. 1, n. 1, p. 1-141, jan./jun. 2009 - Semestral
O desenho como prática educativa na educação infantil:
um salto qualitativo na aprendizagem
Resumo
Douglas de Castro Seabra *
Heloísa Helena Galúcio da Costa Aguiar *
Márcia de Souza dos Santos *
Simone Cristina Fernandes *
Wanda Maria Soares Gomes Ribeiro *
Orient.: Vera Lúcia Lins Sant’Anna **
O presente trabalho aborda o tema do desenho na educação infantil como uma prática educativa que
pode vir a contribuir no processo ensino-aprendizagem da criança. Para isso foi necessário, primeiramente, constituir o arcabouço teórico da pesquisa, em seguida, foi elaborado o plano de ação que
viesse a nortear a pesquisa para o próximo passo, a pesquisa de campo. O estudo do tema torna-se
importante uma vez que o profissional da educação infantil deve compreender e utilizar o desenho
como uma prática educativa benéfica ao desenvolvimento da criança e à sua aprendizagem nas séries
iniciais. O trabalho aborda quatro momentos da pesquisa: uma breve historiografia do estudo do desenho infantil, a evolução do desenho infantil, alguns dos tipos de desenho que podem ser utilizados
pelo educador e, por último, a relação existente entre o desenho e a aprendizagem para as crianças
da educação infantil.
Palavras-chave: Desenho infantil; Ensino-aprendizagem; Práticas educativas.
1 - Introdução
O
presente trabalho tem por tema “O desenho na educação infantil como uma
prática educativa” que pode contribuir,
significativamente, para a aprendizagem
dos alunos que estão sendo preparados para ingressar
no Ensino Fundamental e foi realizado no primeiro semestre de 2008. O objetivo geral do trabalho
foi analisar o desenho como um aspecto importante
para o desenvolvimento da aprendizagem na Educação Infantil. Os objetivos específicos foram: verificar
como os alunos elaboram/constroem o desenho a
partir do conteúdo dado; compreender como os aspectos cognitivos, afetivos e psicomotores aparecem
nas atividades desenvolvidas; diagnosticar os tipos
de desenhos com que os professores trabalham e
compreender como os professores trabalham o desenho no processo ensino-aprendizagem na Educação
Infantil.
Cumpre ressaltar que o enfoque do trabalho é
estritamente pedagógico, não abordando, dessa forma, a questão psicológica dos desenhos das crianças,
mas enfatizando a relação desenho-aprendizagem
na educação infantil.
*
**
No intuito de atingir os objetivos propostos inicialmente para a realização de todo o processo investigativo, o artigo foi estruturado em quatro subtópicos: o primeiro apresenta uma breve estruturação
temporal do estudo do desenho e de sua valorização;
o segundo, uma explanação sobre a evolução do desenho infantil desde os seus primeiros traços até os
seis anos, que foi o enfoque da pesquisa; o terceiro
aborda, a partir dos dados da pesquisa, os tipos de
desenho que o educador pode utilizar em sala de aula
e, por fim, a relação do desenho com a aprendizagem
da criança.
2 - Apreciação histórica do estudo do desenho
infantil
De acordo com Meredieu (2004, p. 2-4), o interesse pelo desenho infantil como objeto de estudos e
pesquisas data dos fins do século XIX. A princípio relacionados com os primeiros trabalhos da psicologia
experimental, os estudos foram se diversificando e diferentes disciplinas, como a psicologia, a pedagogia, a
sociologia e a estética, puderam beneficiar-se com tal
contribuição. A partir da percepção desse autor, é possível elaborar uma breve cronologia do tema, a saber:
Graduandos em Pedagogia com Ênfase em Docência e Gestão na Educação Infantil pela PUC Minas.
Doutora em Ciências da Religião. Mestre em Educação. Professora da PUC Minas. E-mail: [email protected]
Pedagogia em Ação, v. 1, n. 1, p. 1-141, jan./jun. 2009 - Semestral
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Seabra, D. de C.; Aguiar, H. H. G. da C.; Santos, Márcia de S. dos; Fernandes, S. C.; Ribeiro, W. M. S. G.
1880-1900 - é reconhecida a originalidade da infância;
influência das ideias de Rousseau, em Pedagogia, que
levou a distinguir diferentes etapas no desenvolvimento
gráfico da criança.
1926 - o desenho é introduzido no tratamento psicanalítico. O “sentido estético” da criança é levado em consideração. A sociologia aborda a comparação entre os
desenhos infantis de diversos países.
Momento atual - os estudos sobre o desenho beneficiaram-se da contribuição – considerável em psicologia
infantil – da obra de Piaget, e prosseguem no sentido de
uma elucidação dos mecanismos da expressão infantil,
expressão que não é mais gráfica e plástica apenas, mas
também gestual e musical. (MEREDIEU, 2004, p. 2).
Inúmeros são os autores, com diferentes olhares,
que analisam e ressaltam o estudo e o reconhecimento do desenho na educação infantil, bem como a sensibilização dos profissionais atuantes nessa área para
usufruírem dessa prática educativa.
3 - Evolução do desenho infantil
O desenho é uma necessidade do homem desde a época das cavernas. Para a criança, o desenho
engloba um conjunto de suas potencialidades e capacidades, pois, quando começa a andar, concomitantemente, já utiliza o lápis para os seus primeiros
rabiscos. Ao utilizá-lo, produz uma “marca”, os primeiros rabiscos. (GREIG, 2004).
Jacques Rousseau descobriu o grafismo como a
maneira própria de ver e de pensar da criança. As
concepções relativas à infância foram mudando e,
face à originalidade do seu desenvolvimento, admitiu-se a especificidade do processo de desenvolvimento do desenho infantil. O desenho constitui uma
língua que possui vocabulário e sintaxe próprios. Os
primeiros rabiscos são realizados sobre livros e folhas. Ao final do seu primeiro ano de vida, a criança é
capaz de produzir seus primeiros traços gráficos, fase
conhecida como de rabiscar ou garatujas. (PIAGET
apud MEREDIEU, 2004).
O ato de fazer a garatuja proporciona prazer à
criança ao ver o desenho em uma superfície, pois
constata o efeito visual de sua ação. Posteriormente,
as garatujas deixam de ser um movimento de ir e vir
para ser mais um movimento mais ordenado, pois
a criança desenvolve a intenção de elaborar as ima-
66
gens, com desenhos presentes no seu ambiente. Ela
sai do espaço do papel para a parede, a areia, ou qualquer outra superfície. Para ela, o desenho serve para
imprimir o que se vê. Por meio do desenho, a criança
cria e recria. (GREIG, 2004).
À medida que rabisca, ela transforma seus rabiscos em círculos, progredindo gradativamente da
“Figura Radiante”, “Figura continente” para realizar,
em seguida, a “Figura Girino” em torno dos 3 anos
e meio, adquirindo o duplo controle de partida e de
chegada, marcado pela realização do círculo, por volta dos 3 anos, e do quadrado, por volta dos 4 anos
(figura mais complexa), como ficou constatado nos
estudos de Greig (2004, p.19). Para passagem do homem-girino para o homem com cabeça, necessita de
um ano para a transformação, porque a cada trimestre a criança alcança enriquecimentos na forma dessa
cabeça, acrescentando nela cílios, sobrancelha, pupila, orelhas ou bochechas, sendo que a diferenciação
de gênero ocorre, basicamente, pelos cabelos, pelos
chapéus e pelas roupas. A casa, o animal e a árvore
participam na evolução e vão dando a noção do espaço. A criatividade está em todo seu esplendor e as
cores são bem marcadas.
O ato de rabiscar é um impulso gráfico primordial. É nos primeiros 3 anos de vida que, segundo
Montagner, existe o confronto do próprio domínio da motricidade e das necessidades básicas com
a ocupação mais ativa do seu espaço (GREIG, 2004,
p.19). No segundo ano de vida, começam as primeiras frases e com elas os dois primeiros desenhos
base, que são o movimento circular e o movimento
de vaivém. Aos 3 anos, a criança diz “eu” e domina
a linguagem corrente, já traça o círculo e já possui a
sociabilidade desenvolvida. Antes mesmo disso, já realiza a figura do girino. Como o desenho consiste em
uma linguagem gráfica, tem várias representações de
acordo com o estágio em que a criança se encontra.
A criança utiliza um verdadeiro repertório de signos gráficos, sol, bonecos, casa, navio. A forma não é
o mais importante, segundo Meredieu (2004), mas
sim a gramática gerativa que permite compreender
como uma criança passa de uma figura para a outra,
como consequência da evolução da criança: determinado tipo de desenho ou figura perde o significado,
sendo substituído por outro, que toma o seu lugar.
O boneco girino dá origem a sóis e suas variações com cabeça humana, depois da mesa quadrada
Pedagogia em Ação, v. 1, n. 1, p. 1-141, jan./jun. 2009 - Semestral
O desenho como prática educativa na educação infantil: um salto qualitativo na aprendizagem
com seus quatro pés. O desenho infantil começa com
formas simples como círculos, quadrados, triângulos,
imagens de abóboras, funil, signos em V que, combinados, geram várias figuras do vocabulário infantil.
O signo vai se enriquecendo e sofrendo mutações
gráficas e plásticas, o que faz com que, por exemplo,
uma criança por volta dos 5 anos tenha a construção
de sua personagem desenhada bem estruturada.
Meredieu (2004, p.20-24) caracteriza como as
Grandes Fases da Evolução, de acordo com o que
Luguet distingue como os quatro estágios na evolução do grafismo infantil:
• Realismo Fortuito: inicia-se por volta de 2 anos e põe
fim ao período chamado rabisco, já começa a realizar o
traçado e dar nome ao seu desenho.
• Realismo Fracassado: inicia-se por volta de 3 e 4 anos
e se sucede de fracassos e sucessos na elaboração dos
traçados.
• Realismo Intelectual: inicia-se em torno de 4 anos e
vai se estender até 11/12 anos. A criança desenha não
aquilo que vê do objeto, mas o que sabe. Assim, a casa é
representada de fora e de dentro e o bebê é representado
na barriga da mãe em forma de transparência.
• Realismo Visual: 12 anos e, às vezes, desde os 8/9 anos.
Grafismo adaptado à produção adulta, às suas leis, perdendo sua autenticidade. As transparências para a criança são uma maneira de traduzir uma experiência afetiva
e especial.
4 - Abordando
diferentes tipos de desenhos
nas práticas educativas
Como pesquisadores, procuramos analisar como
a criança representa graficamente o seu mundo no
desenho, apoiando-nos em trabalhos vinculados a
uma visão construtivista da aquisição de conhecimentos, focando, principalmente, o desenho como
uma importante prática pedagógica na aprendizagem durante a passagem da criança pela Educação
Infantil.
Segundo Piaget citado por Pillar, o desenho
[...] é uma forma de representação que supõe a construção de uma imagem bem distinta da percepção. O
que é desenhado não é, então, a reprodução da imagem
percebida visualmente, nem a imagem mental que a
criança tem do objeto, consiste, sim, na construção gráfica que dá indícios do tipo de estruturação simbólica
Pedagogia em Ação, v. 1, n. 1, p. 1-141, jan./jun. 2009 - Semestral
que a criança tem naquele momento. (PIAGET apud
PILLAR, 1996, p.42).
Conforme o autor, as crianças atribuem diferentes papéis ao desenho, por isso é importante considerar as diversas estratégias criadas por crianças de um
mesmo estágio de desenvolvimento gráfico, para que
isto venha a representar um salto qualitativo em sua
aprendizagem. A criança busca representar no desenho sua visão de mundo e, para isso, toma o real
como referência. Este real, para Piaget, é reconstruído pelo sujeito para apropriar-se dele, e a escola, em
sua função primordial, não pode ignorar o conhecimento que a criança já possui, mas sim deve utilizálo como uma ferramenta facilitadora para a construção dos conhecimentos escolares.
Gardner considera que:
[...] o desenho da criança atinge o seu ápice quando ela
busca explorar as possibilidades e as limitações dessa
linguagem, [...] ela começa a criar cenas com os objetos,
isto é, estabelece um vínculo entre as formas desenhadas
e sua disposição no espaço da folha. (GARDNER apud
PILLAR, 1996, p.47).
Portanto, de acordo com as reflexões de Analice
Dutra Pillar (1996, p. 47-48), ao desenhar, a criança está relacionando seu conhecimento objetivo e
seu conhecimento imaginativo. E, quando se apropria das convenções do desenho, a criança está aprimorando esse sistema de representação gráfica. Isso
quer dizer que, em sua interpretação do espaço, ela
pode valer-se de recursos ilusórios, como um artista.
Na seleção de sujeitos para a pesquisa, procurou-se escolher aqueles que tivessem experiências diferenciadas, sendo estudantes da Educação Infantil
(quatro e cinco anos) e do 1° ano do Ensino Fundamental (seis anos de idade). Foram analisadas as
representações gráficas de oito crianças, quatro de
instituições particulares (de Contagem e Belo Horizonte) e quatro da rede pública municipal (Belo Horizonte e Esmeraldas). Em cada escola, foi realizado
um tipo de atividade, sendo realizadas ao todo quatro atividades, selecionadas entre outras utilizadas
por Pillar (1996, p.57-68) em sua obra, assim especificadas: desenhos espontâneos; desenhos cópia (reprodução de traçados); atividades de registro (desenho da história) e desenhos de observação.
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Seabra, D. de C.; Aguiar, H. H. G. da C.; Santos, Márcia de S. dos; Fernandes, S. C.; Ribeiro, W. M. S. G.
O desenho espontâneo, por se tratar de uma
atividade não dirigida, propicia conhecer o universo simbólico, temático e conceitual da criança, é ela
quem vai escolher o que desenhar, de acordo com os
interesses próprios naquele momento. Nessa modalidade de desenho, o professor encontra uma importante ferramenta para perceber a fase de desenvolvimento de seu aluno, conhecer um pouco da visão de
mundo através dos desenhos, a psicomotricidade e a
personalidade da criança.
Essa atividade foi realizada na Escola Municipal Francisca de Paula, com o aluno A e a aluna B,
ambos com cinco anos de idade e alunos regulares
do 2° Período. Durante o momento em que as crianças desenhavam, foi possível perceber que o aluno A
não utilizou nenhum lápis de cor, apenas o lápis de
escrever, com traços bem marcantes. Seu desenho já
apresenta um esquema corporal típico do realismo
fracassado, com indícios de desenvolvimento para o
realismo visual. Seu desenho retrata duas personagens que têm do lado esquerdo da folha duas flores
que são maiores do que eles, e ainda o desenho de
três corações em cima das figuras.
O desenho da aluna B apresenta um cuidado
maior com a estética do trabalho, fato constatado
quando a aluna desmanchou o desenho de sua personagem e o reelaborou de uma forma diferente. Ela
retratou uma figura feminina sorrindo no centro da
folha, desenhando ao redor flores e uma árvore de
cada lado. A criança está na Idade de Ouro do desenho, pois se percebe em seus traços a evolução do
personagem – a construção do esquema corporal.
O teste de reprodução de traçados, elaborado
por Piaget e outros pesquisadores, tem por objetivo
analisar a construção gráfica de formas geométricas
simples como o círculo, o quadrado, o triângulo, o losango, etc.; por meio da imitação de modelos, numa
tabela pré-definida pelo pesquisador. Piaget diz que
“a imitação nada tem de ‘automática’ ou de ‘involuntária’, mas, pelo contrário, denuncia bem depressa
a existência de coordenações inteligentes, o sujeito
imita apenas o que compreende”.
Essa atividade foi aplicada na Escola Municipal Marieta Rodrigues Soares, com dois alunos com
cinco anos de idade, do 2º Período da Educação Infantil. Para a realização dessa atividade, foi entregue
uma folha com as seguintes figuras, respectivamente:
quadrado, círculo, linha, triângulo e coração. Pode-se
68
observar que o aluno C tentou reproduzir aquilo que
ele conhece dos traçados, sua psicomotricidade está
coordenada, pois, ao segurar o lápis, o aluno demonstra segurança na forma de usá-lo. Ele encontrou um
pouco de dificuldade ao desenhar o triângulo, que é
uma figura que ele ainda não domina aparentemente e que ocasionou um desenho parecido com um
quadrado e, ao final, ele preferiu não colorir. O segundo aluno, caracterizado como aluno D, optou por
colorir os traçados modelo, deixando de cumprir o
objetivo estipulado para essa atividade, que era o de
reproduzir as figuras, e escreveu uma letra nos dois
primeiros desenhos e, após isso, encerrou suas atividades. Segundo relato da sua professora, esse aluno
tem dificuldades cognitivas de realizar as atividades
propostas em sala, ele requer atenção constante na
orientação das atividades diárias.
O desenho da história é uma atividade que consiste em o pesquisador ler uma história para a criança e após, então, a criança simboliza a história através do desenho. O objetivo é analisar como a criança
reconstitui a história contada, através do desenho, e
quais as relações que estabelece entre suas vivências,
a história e sua representação no desenho.
Os dois desenhos analisados foram produzidos
pela aluna E e pelo aluno F, de 6 anos, estudantes
do 1°/9 (antigo 3º Período) do Ensino Fundamental,
no Colégio Paulo Freire. Inicialmente, foi contada a
história “Bibi vai para a escola”; após ouvir a história, a aluna E foi convidada a desenhar. Primeiro, ela
desenhou uma menina e, depois, mais duas crianças,
uma de cada lado. Então, finaliza desenhando lágrimas em todas as crianças. Quando termina, conta
que “Bibi não queria ir para a escola, mas a mãe dela
levou e, quando chegou lá, ela chorou e todo mundo
chorou.”
No desenho dessa aluna, identificamos aspectos do Realismo Intelectual, em que a criança desenha o objeto, não aquilo que vê, mas o que sabe.
Assim, a menina da história é representada não exatamente como ela está no livro, mas de acordo com a
capacidade motora da aluna. Podemos notar, ainda,
que tal desenho é característico da Idade de Ouro
do desenho, segundo a nomenclatura utilizada por
Greig (2004) e Pillar (1996), que é um estágio marcado pela construção de um sistema de relações entre
as representações de forma, de espaço e de cores. A
criança caracteriza suas formas com riqueza de detaPedagogia em Ação, v. 1, n. 1, p. 1-141, jan./jun. 2009 - Semestral
O desenho como prática educativa na educação infantil: um salto qualitativo na aprendizagem
lhes e diversifica seu repertório. Surgem as primeiras
preocupações com a distância entre os objetos e de
suas projeções no espaço.
O Aluno F, após ouvir a mesma história, “Bibi
vai para a escola”, começa a desenhar algumas crianças, apaga o desenho algumas vezes, continua, apaga
e, enfim, termina não colorindo o desenho. Reconta a história de maneira similar à primeira aluna “A
Bibi ficava assistindo televisão e não queria ir para a
escola, aí um dia a mãe dela a levou e, na escola, ela
chorou e todo mundo chorou junto. No final, o pai
dela deu um presente”.
Nesse desenho, podemos afirmar que o aluno se
encontra na fase de Realismo Fracassado, típico de
crianças na faixa etária entre três a quatro anos e se
sucede de fracassos e sucessos na elaboração dos traçados. Tal desenho é típico da Atividade Simbólica,
quando a criança começa a se interessar por representar objetos variados, desenha dentro de um contorno único as partes do objeto sem integrá-las. A
disposição dos objetos no espaço não obedece a um
sistema, cada um é disposto na folha aleatoriamente. A natureza do desenho está relacionada ao modo
realista de representar objetos. Os desenhos com deformações são considerados feios. O erro surge como
imprevisto dentro de um planejamento prévio ou
como ausência de um plano adequado à cena a ser
representada, no desenho refere-se às deformações,
aos borrões, ou ao uso inadequado da cor.
O desenho de observação é realizado na presença de objetos ou imagens, tanto de objetos da natureza como de cenas escolhidas pela criança em livros
de história infantis, em revistas, na televisão etc. O
objetivo da atividade é examinar o que as crianças
pensam sobre as transformações que acontecem com
a imagem observada após registrá-la em desenho.
Dos diversos alunos do Centro Educacional Inconfidentes que realizaram essa atividade, foram selecionados os alunos G e H, com 4 anos de idade, do 1º
Período da Educação Infantil. A imagem selecionada foi a da história “Os músicos de Bremen” (conhecida também pelo nome “Os quatro animais”), que
possui uma imagem de um galo em cima de um gato,
que estão em cima de um cachorro que, por sua vez,
está em cima de um cavalo.
Os alunos, na percepção de Luquet citado por
Meredieu (2004, p. 20-24), se encontram entre o período do realismo fortuito e o do realismo fracasPedagogia em Ação, v. 1, n. 1, p. 1-141, jan./jun. 2009 - Semestral
sado, apresentando sóis e a construção do desenho
através de girinos. Entretanto, o aluno G conseguiu
abstrair a quantidade de animais, tentou escrever o
seu nome e desenhou o chão que coloriu de azul posteriormente, ao contrário do aluno H, que se indispôs, a princípio, por alegar que não sabia desenhar.
Ao ser estimulado, esse aluno conseguiu fazer a atividade, desenhando três animais, sendo que o animal
do meio era menor do que o animal que estava por
cima e sua cabeça ainda estava na direção contrária à
dos outros dois animais, que seriam a representação
gráfica do cavalo e do gato (ou do galo).
5 - A relação desenho/aprendizagem na educação infantil
O desenho da criança, além de ser a primeira
manifestação da escrita humana, é também a primeira forma de expressão usada por ela. Quando a criança desenha, representa sua própria leitura de mundo,
como enxerga a vida e expressa o que sente.
Para Ana Maria Zenicola (2001, p. 77-79), psicopedagoga, o desenho é uma forma de expressão e
comunicação, ligada às artes, ao lúdico, ao que é prazeroso, mas pouco utilizado com tal finalidade pelas
escolas, pelos professores e pelos terapeutas. É comum, hoje em dia, os professores, na fase de alfabetização, separarem a criança dessa forma de expressão.
O resultando é notório, sempre que se pede à criança
que desenhe, sua resposta é quase instantânea “– Eu
não sei desenhar”, diz ela.
O que é este saber? Como querer que a criança use símbolos gráficos (as letras), estipulados pelo
professor, se ela for inibida de utilizar os símbolos
que ela conhece para elaborar sua idéia?
Através do desenho, a criança coloca no papel,
com toda a emoção, suas vivências, seus sentimentos, a visão do seu contexto social, da sua família,
da sua escola etc. De forma descontraída e prazerosa, aprende a desenvolver noções de espaço, tempo,
quantidade, sequência, apropriando-se do próprio
conhecimento, que é construído respeitando seu ritmo. Alem disso, através do desenho livre, ela adquire as primeiras noções da função social da escrita,
pois sua comunicação feita através do desenho pode
ser compreendida por outras pessoas antes que ela
aprenda a escrita convencional.
69
Seabra, D. de C.; Aguiar, H. H. G. da C.; Santos, Márcia de S. dos; Fernandes, S. C.; Ribeiro, W. M. S. G.
Jean Piaget afirma que a criança, quando aprende algo novo, recorre ao que já sabe e apropria-se do
desenho como forma de representação gráfica desde
a primeira vez que tem contato com o lápis e o papel, coordenando os movimentos do braço e da mão
segurando o lápis e o papel (PIAGET apud CARVALHO, 2008).
Mesmo que os desenhos não possam ser interpretados com significado pelo professor e a criança mude de idéia a cada vez que se pergunte o que
ela desenhou, o desenho deve sempre ser valorizado
pelos educadores e a importância dessa valorização
deve ser compreendida e compartilhada com os pais,
uma vez que toda aprendizagem tem seu valor e o
desenho é uma forma de aprendizagem. Quando a
criança é valorizada em algo que sabe, tem prazer
nisto e sente-se estimulada a aprender mais.
6 - Considerações finais
Com esse estudo, foi possível constatar algumas
conclusões do estudo teórico do tema nos resultados
da pesquisa de campo que foi realizada.
Retomando os objetivos iniciais do trabalho, pela
pesquisa, percebeu-se que as crianças que utilizam o
desenho para se expressar, desde a educação infantil,
têm maior facilidade de aprender. O desenho é um
pré-requisito para a aquisição da linguagem escrita
e esse tema deve receber maior ênfase nos cursos de
Pedagogia, visto que sua proposta é formar educadores para atuarem na Educação Infantil e nas séries
iniciais do Ensino Fundamental.
O universo do grafismo infantil é rico em várias
dimensões e, focando a Pedagogia, percebemos que o
desenho é uma ferramenta diagnóstica, lúdica, prazerosa e uma prática educativa relevante para o professor e necessária ao desenvolvimento do aluno. É importante ressaltar, ainda, que os educadores e os pais
valorizem o desenho infantil, pois esta é a primeira
forma de aprendizagem a que a criança tem acesso.
DI LEO, Joseph H. A interpretação do desenho infantil.
3. ed. Porto Alegre: Artes Médicas, 1991. 218 p. (Biblioteca Artes Médicas. Psiquiatria, psicologia, psicanálise).
FREINET, Célestin. O método natural. Lisboa: Estampa, 1977. 3 v.
GREIG, Philippe. A criança e seu desenho: o nascimento da arte e da escrita. Porto Alegre: Artes Médicas,
2004.
LÜDKE, Menga; ANDRÉ, Marli E. D. A. Abordagens
qualitativas de pesquisa: a pesquisa etnográfica e o estudo de caso. In: LÜDKE, Menga; ANDRÉ, Marli E. D.
A. Pesquisa em Educação: abordagens qualitativas. São
Paulo: EPU, 1986. Cap. 02, p. 11-24.
MEREDIEU, Florence de. O desenho infantil. 10. ed.
São Paulo: Cultrix, 2004.
PIETROBON, Sandra Regina Gardacho. Os saberes de
professores da educação infantil: as diversas linguagens.
Disponível em: <www.alb.com.br/anais16/sem13pdf/
sm13ss11_04.pdf>. Acesso em: 10 out. 2008.
PILLAR, Analice Dutra. Desenho e construção do conhecimento na criança. Porto Alegre: Artes Médicas
Sul, 1996.
ZENICOLA, Ana Maria. Avaliação da aprendizagem
através do desenho.. Psicopedagogia: Revista da Associação Brasileira de Psicopedagogia, São Paulo, v. 19, n.
55, p. 77-79, set. 2001.
Referências
CARVALHO, Teresinha Véspoli de. O desenho e a
aprendizagem. Disponível em: <http://edurevista.vilabol.uol.com.br/artigdesenhaaprendizagem.html>. Acesso em: 09 out. 2008.
70
Pedagogia em Ação, v. 1, n. 1, p. 1-141, jan./jun. 2009 - Semestral
A realidade sobre a inclusão de alunos com necessidades
educacionais especiais na escola comum
Ecleide Assis de Souza *
Orient.: Sérgio de Freitas Oliveira **
Resumo
O presente artigo relata um estudo de caso realizado em uma instituição pública inclusiva sobre as
dificuldades que um aluno do 1º Ciclo do Ensino Fundamental com Paralisia Cerebral (PC) enfrenta
devido ao despreparo do professor. De acordo com informações coletadas na escola, o aluno ainda
não tem uma participação ativa nas aulas devido às sequelas da PC, que teve aos seis meses de idade,
por falta de oxigenação cerebral. O aluno com PC tem como característica a falta de controle completo dos músculos de seu corpo, o que o leva a dificuldades motoras e de incoordenação, que podem
afetar desde o seu desenvolvimento físico até sua aprendizagem.
Palavras-chave: Inclusão; Paralisia cerebral; Escola inclusiva.
O
termo Paralisia Cerebral ou, mais corretamente, a Encefalopatia Crônica da Infância designa, segundo Sanvito (1997),
uma série de distúrbios não progressivos
do movimento de postura, resultantes de lesões cerebrais ocasionadas durantes os últimos meses de gravidez, durante o parto, após o nascimento ou até os
três anos de idade.
Uma criança com PC pode apresentar alterações
que variam desde leve incoordenação dos movimentos ou uma maneira diferente para nadar até a inabilidade de segurar um objeto, falar ou deglutir.
O desenvolvimento cognitivo pode ser inteiramente “normal”, mas sempre existirá uma lesão
motora.
O desenvolvimento do cérebro tem início após
a concepção e continua após o nascimento. Quando
ocorre qualquer fator agressivo ao tecido cerebral antes, durante ou após o parto, as áreas mais atingidas
terão a função prejudicada e, dependendo da importância da agressão, certas alterações serão permanentes, caracterizando uma lesão, como é o caso do aluno apresentado.
Nesse sentido, é importante esclarecermos que
nem sempre a PC implica danos para as funções inte*
lectuais, muito embora a comunicação quase sempre
esteja comprometida. É certo que muitas pessoas com
PC podem apresentar um desenvolvimento intelectual segmentado, devido à falta de interação com o meio
ambiente e/ou danos causados pela lesão cerebral.
Em relação ao aluno com PC que está inserido no espaço educacional, é importante que tanto o
corpo técnico administrativo da escola como o professor na sala de aula busquem com a família informações que os auxiliem no desenvolvimento do processo ensino-aprendizagem.
Partindo desse pressuposto, para viabilizar de
fato a inclusão desse aluno com PC na sala de aula,
será necessária a identificação de alguns recursos materiais e atividades que auxiliarão o professor a intervir no processo de desenvolvimento do aluno, favorecendo e facilitando a sua participação nas atividades
realizadas em sala de aula.
Segundo Aranha (2000), para que os professores possam desenvolver estratégias que facilitem
a aprendizagem do aluno com Necessidades Educacionais Especiais na sala de aula, devem se tornar
professores pesquisadores, buscando conhecer cada
aluno, tanto no que se refere às suas características
pessoais (a família os auxiliará nessa tarefa) como,
Graduanda em Pedagogia com Ênf. em Necessidades Educacionais Especiais pela PUC Minas. E-mial: [email protected]
Licenciado em Letras e em Pedagogia. Professor Adjunto da PUC Minas. E-mail: [email protected]
**
Pedagogia em Ação, v. 1, n. 1, p. 1-141, jan./jun. 2009 - Semestral
71
Ecleide Assis de Souza
especialmente, ao seu processo de aprender, antes e
durante todo o processo de ensinar. O professor pesquisador pode criar estratégias para auxiliar a construção de conhecimentos dos alunos com PC que,
devido às suas limitações, muitas vezes terão um nível de desenvolvimento real.
De acordo com Godoi (1998), todas as pessoas que atendem aos alunos com PC desempenham
um papel importante para o seu desenvolvimento integral, assim, deve ser viabilizado um trabalho em
equipe entre as famílias e os profissionais, buscando,
assim, a realização pessoal e social dos alunos, transformando-os em cidadãos ativos e críticos.
Sabemos que a inclusão do aluno com PC em
sala não está totalmente garantida, pois, para Figueiredo (2002), a inclusão vai além da simples inserção
do aluno na escola, implica a escola ter outra lógica,
de modo que não seja possível pensar na possibilidade de ver algum aluno fora dela.
Significa quebrar paradigma, ver a educação como
bem social, compreender a deficiência e enfrentar as
dificuldades que surgirem na prática educacional.
Percebe-se que o aluno não está totalmente incluído por não ter sua coordenação motora preservada e grande dificuldade na fala, daí, a necessidade
de utilizar alguns recursos da Tecnologia Assistiva
(TA), para que o aluno consiga desenvolver suas habilidades e, assim, participar ativamente das atividades propostas na sala de aula.
Para Carmo (1991), deficiência motora é a perda
de capacidade afetando, diretamente, a postura e/ou
o movimento, em consequência de uma lesão, congênita ou adquirida, nas estruturas reguladoras e aftosas do movimento do Sistema Nervoso.
Para Damasceno e Galvão Filho (2003),Tecnologia Assistiva (TA) é toda e qualquer ferramenta ou recurso utilizado com a finalidade de proporcionar uma
maior independência e autonomia à pessoa com NEE.
Segundo Reis (2004), a utilização da TA na educação é uma maneira de ajudar os alunos a se interagirem com o desenvolvimento pedagógico. É muito
importante que o educador saiba selecionar os recursos em sala de aula. É preciso deixar claro que os
recursos da TA na escola servem apenas como uma
ponte entre o sujeito e as tarefas que ele necessita
realizar.
O objetivo desses recursos não é fazer com que
os alunos com Limitações Motoras se tornem um
72
indivíduo “normal”, nem mesmo que ele se adapte às
metodologias do ensino, é sim auxiliar com instrumentos que possam ajudar em suas ações para que
ele possa realizar suas tarefas com o máximo de independência possível.
Verifica-se a importância de que os profissionais
da área de Educação tenham conhecimento sobre os
recursos da TA, assim terão capacidade de buscar novas maneiras de avaliar o desempenho e até mesmo,
de certa forma, facilitar o processo de aprendizagem
dos alunos com Limitações Motoras.
A utilização dos recursos da TA em alunos com
NEE proporciona aos profissionais condições de estarem realizando com os eles atividades que antes
não tinham como ser feitas, esta realidade é de grande importância para o professor.
Portanto, cabe ao professor estar sempre atento
à necessidade individual de cada aluno e buscar promover o desempenho e a inclusão de seu aluno.
Em matéria publicada sobre a inclusão na Revista Nova Escola, Cavalcante (2005) assegura que
a inclusão cresce a cada ano e, com ela, o desafio de
garantir uma educação de qualidade para todos. Na
escola inclusiva, os alunos aprendem a conviver com
a diferença e se tornam cidadãos solidários, sendo
fundamental a participação do professor para que
isto se torne realidade.
De um modo geral, a inclusão desse aluno representa uma grande dificuldade, pois predomina o
desconhecimento sobre a possível integridade das
suas capacidades cognitivas e motoras, por falta de
conhecimento por parte do professor. É de suma importância acreditar nas possibilidades de que o aluno
com PC é capaz de aprender a ler, escrever e participar, ativamente, das atividades escolares.
Referências:
ARANHA, Maria Salete Fábio. Adaptações curriculares de pequeno e de grande porte. Brasília, Ministério da
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Pedagogia em Ação, v. 1, n. 1, p. 1-141, jan./jun. 2009 - Semestral
73
A prática pedagógica diante da violência escolar:
perspectivas e desafios
Elizabeth Rodrigues Ramos *
Kele da Conceição Coelho *
Maria de Fátima Guimarães Francisco *
Orient.: Vera Lúcia Lins Sant’Anna **
Resumo
A violência escolar tem se constituído, nos últimos anos, em um problema social de amplitude mundial. A compreensão dessa temática, no contexto e no cotidiano escolar exige do educador um conhecimento teórico conectado com os problemas da sociedade contemporânea e seus desdobramentos sociais e históricos. Dessa forma, o presente artigo é resultado da pesquisa: “A prática pedagógica
diante da violência escolar: perspectivas e desafios”, que procurou analisar como os professores lidam
com a violência em sua prática pedagógica. Para tanto, esse estudo tem como objetivo promover uma
reflexão sobre as diversas manifestações da violência que compromete o trabalho docente.
Palavras-chave: Violência escolar; Prática pedagógica; Dificuldades e desafios.
1 - Introdução
E
ste artigo aborda os resultados da pesquisa 1 “A prática pedagógica do professor
diante da violência escolar: perspectivas e
desafios”, que foi evidenciado pelas falas
dos professores o seu despreparo para lidar com a
violência escolar.
Diante disso, tem como objetivo promover uma
reflexão sobre as diversas manifestações da violência
escolar que compromete a prática pedagógica do educador, apresentando elementos fundamentais que vão
orientar sua ação no enfrentamento desse fenômeno.
Atualmente, o ambiente escolar configura-se em
um espaço de conflitos que gera medo e insegurança
a alunos, pais e professores, devido à presença da violência cada vez mais intensa, diversa e preocupante
no campo escolar.
Assim, colocar em evidência a questão da violência escolar não é uma exclusividade, uma vez que,
nos últimos anos, já foram feitas pesquisas sobre essa
temática, na maioria dos países.
Na Europa, segundo Sposito (1998), o tema
começou a ser estudado, primeiramente, nos países
escandinavos, no início dos anos setenta, atingindo
outros países como a Inglaterra, a Holanda e a Espanha no final da década de oitenta e início da de
noventa, gerando uma compreensão dos vários sentidos da violência no cotidiano escolar. Foi a gravidade
do tema que levou à constituição da primeira conferência da Comisión Europea sobre Seguridad em La
Escuela, que se realizou em Utrech (Holanda) em
fevereiro de 1997.
Reunindo pesquisadores e representantes governamentais, o objetivo central da conferência foi
discutir a necessidade de se ter escolas mais seguras.
Semelhante situação pode ainda ser identificada em
países como os Estados Unidos e o Japão, onde os primeiros estudos começaram a surgir no ano de 1992.
No Brasil, esse tema ganha espaço nas pesquisas
acadêmicas a partir do final da década de oitenta e
início da década de noventa, sendo ressaltado com
uma maior visibilidade durante o processo de democratização das escolas, conforme Zaluar (1992),
Peralva (2000) e Sposito (2001) que descrevem que
1. Trata-se de uma pesquisa qualitativa com abordagem metodológica da análise documental, observação em sala de aula
e entrevista semiestruturada com educadores de três instituições, sendo uma da rede municipal, uma da rede estadual e
outra de rede particular de ensino, na região metropolitana de
Belo Horizonte.
*
Graduandas em Pedagogia pela PUC Minas.
**
Doutora em Ciências da Religião. Mestre em Educação. Professora da PUC Minas. E-mail: [email protected]
Pedagogia em Ação, v. 1, n. 1, p. 1-141, jan./jun. 2009 - Semestral
75
Ramos, E. R.; Coelho, K. da C.; Francisco, M. de F. G.
aquele foi o momento de eclosão da demanda por
proteção das escolas públicas. Sposito (2001, p. 90)
acredita que “precisavam ser protegidas, no seu cotidiano, de elementos estranhos, os moradores dos
bairros periféricos, atribuindo a eles a condição de
marginais ou delinquentes”.
Com isso, denota-se que o fenômeno da violência é algo histórico presente em vários países, e sua
manifestação está relacionada às transformações da
sociedade. Assim, as construções sociais acerca do
conceito de violência indicam sua temporalidade e
sua contextualização entre diversos grupos sociais.
Portanto, o que pode ser violência hoje pode não ser
amanhã, do mesmo modo que intervenções em relação a essa temática vão se divergindo, conforme muda
o contexto sócio-histórico-cultural em que ela ocorre.
Abordar o tema da violência é dissecá-la em seus
aspectos mais peculiares e sutis, é, pois, remetê-la ao
tempo e ao espaço, é compreendê-la na sua evolução em seus aspectos circunstanciais, em que estão
envolvidas as interações entre os sujeitos e a esfera social que se entrelaçam para a ocorrência desse
fenômeno.
Dado o caráter multifacetado da violência, uma
análise das causas e das relações que geram condutas
violentas no interior da escola tornou-se imprescindível, diante das especificidades relativas ao reconhecimento das situações, como a compreensão de processos mais abrangentes que produzem a violência
como uma componente da vida social e das instituições, em especial da escola.
Nessa perspectiva, torna-se urgente a construção de novos caminhos, novos projetos, emergentes das necessidades e interesses dos principais responsáveis pelo ato educativo, capaz de responder
aos reclamos da sociedade que almeja a formação
do cidadão para os desafios inerentes de um país em
desenvolvimento.
Muitas são as faces e manifestações de violência,
de acordo com Abramovay (2001), propiciando uma
busca incessante de investigação e subsídios para minimização desse fenômeno que inquieta a sociedade contemporânea, exigindo do poder público e de
outras instâncias oficiais, como a escola, a implantação de políticas e ações educacionais para o enfrentamento dessa problemática urbana.
Basicamente, existem os seguintes tipos de violência que estabelecem uma abordagem mais cri-
76
teriosa na definição do termo, possibilitando novas
reflexões sobre a manifestação da violência na sociedade e no interior das escolas, que são a violência estrutural, a simbólica e a institucional.
A violência estrutural se caracteriza por um modelo de ideologia que se faz presente na vida social,
são leis e regras impostas para o controle da sociedade que privilegiam alguns grupos em detrimento de outros, determinando as desigualdades e produzindo a exclusão. As contribuições de Maffesoli
(1987), Michaud (1989) e Arendt (2001) para este
debate nos permitem compreender a violência sob o
aspecto político e social e de como estas dimensões
afetam o cotidiano escolar, possibilitando promover
uma educação includente por meio da minimização
dos efeitos perversos de uma sociedade hierarquizada, tanto culturalmente quanto nas suas estruturas
sociopolíticas.
A violência simbólica, proposta por Bourdieu
(1975), se baseia na fabricação de crenças no processo de socialização, que induzem o indivíduo a se
enxergar e a avaliar o mundo de acordo com critérios e padrões definidos, tratando-se da construção
de crenças coletivas e fazendo parte do discurso da
classe dominante. A violência simbólica caracterizase pela imposição e inculcação de uma cultura escolar própria à classe dominante, que contribui para
a reprodução das estruturas de poder. No centro da
ação pedagógica, confrontam-se duas dimensões: o
conteúdo transmitido e o poder que ordena a relação
exercida pela autoridade pedagógica.
No entanto, ao destacar a existência de padrões
de comportamentos distintos, a tensão que se constitui no ambiente escolar entre os diferentes segmentos
gera formas de discriminação cultural, racial e social,
pois, além das relações de poder que se travam no cotidiano escolar, há também uma ausência da cultura
popular nas práticas pedagógicas e curriculares.
A violência institucional é aquela que é trabalhada e cuidadosamente adaptada à situação, bem como,
é empregada por grupos sociais de maneira sancionada, ou pelo menos é tolerada sem grandes problemas e se manifesta de diferentes formas (física, psicológica, sexual, negligência e abandono).
Caracteriza-se pelo abuso físico e/ou psicológico da criança ou do adolescente por parte de seus
pais biológicos ou adotivos, instituições ou por outro
adulto que possui a guarda da criança, ou mesmo por
Pedagogia em Ação, v. 1, n. 1, p. 1-141, jan./jun. 2009 - Semestral
A prática pedagógica diante da violência escolar: perspectivas e desafios
outros adultos próximos à criança, como parentes
e professores. O abuso infantil envolve a negligência e/ou o abandono por parte do adulto que deixa
de prover as necessidades básicas para o desenvolvimento e o bem-estar da criança ou do adolescente.
Comumente, envolve agressões psicológicas, como
xingamentos ou palavras que causam danos psicológicos à criança, e/ou agressões de caráter físico,
como espancamento, queimaduras ou abuso sexual
que causam danos psicológicos de adaptação afetiva
e interpessoal.
As definições apresentadas para o termo negligência, muitas vezes, estão impregnadas de significados que dependem de valores culturais e pessoais,
sem levar em conta valores de cidadania.
A noção de incivilidade, como matriz para a
análise da violência escolar, tem uma forte repercussão nos estudos realizados na França por Debarbieux
(2002) e Peralva (2000), utilizada para se referir à
gama de problemas com os quais a escola se defronta, tais como: pequenos furtos, agressões verbais e físicas. Por incivilidade se entende uma grande gama
de fatos indo desde a indelicadeza ao vandalismo
(Abramovay, 2001), passando pela presença de vagabundos e/ou de grupos juvenis. As incivilidades mais
inofensivas ameaçam a ordem estabelecida e transgridem códigos elementares da vida em sociedade, é
tudo que causa desordem.
Com relação à depredação escolar, Guimarães
apud Candau (1999) afirmou que “as depredações,
as pichações, as brigas entre alunos e a formação de
turmas e de gangues podem representar uma forma
de persistência social que se nega a submeter-se”.
O bullying caracteriza-se por atitudes agressivas,
intencionais e repetidas, o que define o desejo consciente e deliberado de maltratar uma pessoa e colocá-la sob tensão. Ocorre sem motivação evidente,
adotado por um ou mais estudante contra outro(s),
causando dor e angústia, sendo executado dentro de
uma relação desigual de poder. Os estudos sobre o
bullying, Fante (2008), tiveram início nos anos 70, na
Dinamarca e na Suécia, devido ao aumento do número de suicídios entre crianças e adolescentes. Os
pesquisadores buscaram as principais causas e entre
elas constataram existirem maus tratos cometidos
por parte dos companheiros nas escolas. Esse fato
despertou atenção de psicólogos, que passaram a estudar as formas de relacionamento entre os alunos.
Pedagogia em Ação, v. 1, n. 1, p. 1-141, jan./jun. 2009 - Semestral
Vale destacar que o tema violência nas escolas
comporta múltiplos olhares, percepções e modelos
de análise, como salienta Debarbieux (2002), a necessidade de se proceder a estudos multidisciplinares
e transnacionais, como forma de confrontar experiências distintas e encontrar afinidades que levam a
uma maior compreensão do fenômeno.
Percebe-se, então que o desafio dos professores
é enorme, sendo preciso que eles estejam imbuídos
de compromisso e responsabilidade, sejam portadores de competências e atitudes que os capacitem a
ultrapassar obstáculos de tal ordem.
2 - Violência
escolar: perspectivas e desafios
na prática pedagógica do professor
A tarefa da escola no atual cenário assume as
contradições, as marcas econômicas e políticas que
perpetuam, de forma implícita e explícita, a cultura que permite a aceitação da violência como natural. Então, compreende-se a violência como o uso da
agressividade com fins destrutivos, o desrespeito e a
negação do outro, podendo a ação situar-se no plano
físico, psicológico, sociocultural, político e ético.
Por certo, as pessoas a cada dia estão mais irritadas, impacientes e intolerantes. Os pais, diante das
reflexões empíricas que manifestam, expressam a visão de autonomia perdida diante da convivência com
os filhos, principalmente com os adolescentes.
Assim, como educar crianças diante de tantas provocações, como transmitir valores, atitudes e
comportamentos, estímulos, que vão alicerçar esses
futuros cidadãos, para uma socialização harmônica
dentro de um seio social efêmero? E ainda, como instigar um inocente ao individualismo, induzi-lo para
a valorização dos bens materiais e moldá-lo para a
convicção de ser o melhor sempre, ser bem sucedido,
pois só assim, conseguirá um lugar na sociedade?
Combinar todos esses ingredientes na obtenção
de um bolo perfeito, um ser projetado, estereotipado
ideologicamente pela sua sociedade, é uma missão
conflitante aos educadores e educandos, um grande
paradoxo confrontado por esses atores da educação,
que se veem inertes em decorrência da sua frágil e
ultrapassada formação, inseguros para cumprir tamanha tarefa e solucioná-la a curto prazo.
Dessa maneira, são pressionados, por um lado,
pelos pais dos alunos, que se encontram alienados
77
Ramos, E. R.; Coelho, K. da C.; Francisco, M. de F. G.
e seduzidos pelo magnetismo do capitalismo, e, por
outro lado, pela sociedade consumista, que os responsabiliza pelos fracassos sociais e os incita a procurarem soluções imediatas e argumentos que supram essas questões intrínsecas e emergentes.
Assim sendo, a vida escolar desse profissional
não pode ser condicionada a uma simples tarefa de
transmissão de conteúdos sistematizados do saber. O
que se pretende é a inclusão de hábitos e habilidades
novas a sua formação, a fim de capacitá-lo a construir as estruturas do sujeito crítico, consciente e conhecedor da sua realidade própria de mundo.
Os problemas sociais invadem as relações da sala
de aula, desarticulando a prática do professor. Os
professores, muitas vezes, não conseguem sequer ser
ouvidos pelos alunos, veem a sua prática fragilizada
entre a dicotomia do autoritarismo e da autoridade.
Essas são realidades que o ambiente escolar vivencia. Exemplo disso pode ser comprovado na pesquisa realizada sobre “A prática pedagógica diante da
violência escolar: perspectivas e desafios” na qual os
professores das instituições pesquisadas afirmaram
não saber como lidar com o fenômeno da violência
escolar – 60% dos docentes disseram que não estão
preparados para lidar com a violência.
Qual seria então a função da escola nesse emaranhado de conflitos? E o professor, que tipo de postura
deve adotar, que atitudes desenvolver em sala de aula
para ajudar no controle dos atos da violência cotidiana, até mesmo aqueles provocados por ele próprio?
Em relação aos problemas de convivência na escola, Ramos (2004) reflexiona que eles não são novos, por isso é necessário a escola extrapolar a tensificação de ações punitivas unilateralizadas ao aluno,
uma vez que estas colocam em xeque uma avaliação
que compromete somente as fragilidades do aluno
em detrimento dos demais agentes escolares, perdendo de vista a contextualização ampla dos problemas caracterizados como violentos, os quais têm origens diversas.
Uma educação harmônica exige o desenvolvimento de uma cultura baseada nos princípios de
tolerância, solidariedade e compartilhamento, bem
como no respeito às diferenças e à pluralidade de
opiniões, portanto, essa é uma responsabilidade a ser
assumida por todas as instituições educativas e a escola não pode se omitir desse compromisso, pois ela
tem um papel fundamental na formação de sujeitos
78
conscientes de seus direitos e deveres, superando o
estado de ignorância e autoritarismo rumo à autonomia do pensar e agir de forma ética.
Nesse contexto, a escola como construtora de valores éticos, culturais, sociais e humanos deve incluir
no elenco de suas funções o despertar para práticas
que desenvolvam um ensino de valores para o combate
à violência, senão nas ruas, ao menos, no seu interior,
sensibilizando a comunidade escolar para o desenvolvimento de autoconceito, autocontrole e autoestima, possibilitando a construção do respeito mútuo.
Dessa forma, ela contribui para a desconstrução
de sentimentos destrutivos, minimizando atos violentos que emergem não de pontos distantes, mas
daqueles que estão próximos de nós.
Nessa perspectiva, o professor deve assumir um
relacionamento que não permita que as suas atitudes
se transformem em instrumento de violência no cotidiano da sala de aula e, consequentemente, na escola.
Na visão de Tardif (2008), o professor, na construção de sua prática docente, interage socialmente
com os seus pares. O seu olhar, os seus gestos, enfim,
as suas atitudes permitem que ele mesmo e o aluno
se confrontem com a imagem que têm de si mesmos
e com aquela que projetam dos outros. Coloca-se em
jogo a construção do autoconceito e do projeto que
têm de si mesmos; isso, inegavelmente, acaba refletindo na concepção e no cotidiano da prática pedagógica construída no interior da sala de aula.
Nesse contexto, Tardif (2002) destaca que a prática, como complexa e plural, exige além dos saberes técnico-científicos, os saberes experienciais e uma
reflexão individual e coletiva, mediada pela ética,
num contexto sócio-histórico no qual os professores
exercem sua profissão. Isto porque o ensino caracteriza-se por ser uma ação primordialmente ética, com
finalidades educativas, voltadas ao aluno, principalmente quando se pretende efetivar um desempenho
profissional responsável.
O professor, desse modo, ao gerir a articulação
para enfrentar os desafios violentadores da ação conflitiva da sala de aula, precisa construir uma prática criativa entre seus educandos, transformando o
ambiente escolar num espaço de interações coletivas, com a possibilidade de abrir caminhos para a valorização da cultura do saber, do fazer, do aprender,
do ser e do conviver, como aspectos preponderantes
Pedagogia em Ação, v. 1, n. 1, p. 1-141, jan./jun. 2009 - Semestral
A prática pedagógica diante da violência escolar: perspectivas e desafios
para a apreensão de aprendizagens significativas no
combate à violência escolar (DELORS, 2004).
A dinamização e a sistematização de ensinamentos valorativos de natureza ético-cultural e humana têm o poder de despertar o professor para o
desenvolvimento de um fazer pedagógico cada vez
mais fundado na relação teórico-prática para defender-se das ameaças de uma prática docente carregada de preceitos de violência.
Por isso, se nos apropriarmos de uma cultura de
paz, não apenas fugindo dos conflitos, mas os transformado em oportunidade educativa, encarando-os
como um sinal de alarme que convida para a busca
de soluções respeitando as dimensões sociocognitivas e socioafetivas que estão na base do crescimento
das pessoas ao longo da vida, assim poderemos construir, constantemente, as competências necessárias
para interagir com a realidade emergente e desafiadora da sala de aula.
A forma de relacionamento que o professor deve
assumir na sua prática para não ser ele mesmo o próprio instrumento de violência cotidiana exige uma
pedagogia diferenciada com a utilização de estratégias capazes de minimizar os atos de violência possíveis entre os alunos. Dentre as principais estratégias,
aponta-se o uso de projetos e trabalhos interdisciplinares que abordem temas sobre a violência, assim
como discussões, debates e seminários, incitando novas posturas e atitudes no aluno.
Assim, esse profissional da educação, por sua
vez, deve voltar o seu olhar para o tipo de relação
que mantém com seu educando, preocupando-se em
autoavaliar-se no processo de sua prática para perceber, conscientemente, se está estimulando-o ou não,
se está agredindo-o de alguma forma. Nessa medida,
ele vai conseguir ressignificar a sua ação para buscar
uma prática reflexiva que, na visão de Schön (2000),
supere todas as perspectivas e desafios presentes na
sala de aula.
3 - Considerações finais
Diante da diversidade de situações que comprometem o fazer pedagógico, é importante somar esforços no sentido de atingir a consciência de uma
práxis que transforme a escola em laboratório de
construção de práticas que promovam a sensibilização da comunidade intra e extraescolar, viabilizando
Pedagogia em Ação, v. 1, n. 1, p. 1-141, jan./jun. 2009 - Semestral
uma educação nas dimensões de uma cultura de paz.
No entanto, sabe-se que na trajetória a ser percorrida,
existem vários obstáculos, mas é preciso superá-los.
O desafio, então, é construir uma prática pedagógica capaz de inibir os atos de violência no espaço
escolar e promover, através da educação, mudanças
na cultura escolar, nos sujeitos envolvidos, nas formas de pensar e agir e, consequentemente, nas formas de intervir na realidade cotidiana rumo à construção de uma sociedade melhor.
Dessa forma, sugere-se a reflexão na ação e da
ação do educador, pois estas se encontram ligadas à
sua experiência de mundo. Em uma perspectiva pedagógica, acredita-se que a escola deve ser uma instituição de apoio para minimizar a violência instalada
na sociedade. O processo ensino-aprendizagem é o
ponto de partida para uma mudança significativa do
que se deseja e espera. Não se trata de ignorarmos
os limites da ação docente e da educação escolar de
maneira geral, mas, fundamentalmente, de perceber
as possibilidades de atuação docente na sua prática
em conjunto com a comunidade escolar.
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80
Pedagogia em Ação, v. 1, n. 1, p. 1-141, jan./jun. 2009 - Semestral
Práticas pedagógicas em ambientes hospitalares:
potencializando a saúde através da educação
Érica Cristina Silva Almeida *
Orient.: Maria Eugênia Castelo Branco Albinati **
Resumo
O presente artigo é resultado da síntese de pesquisas bibliográficas sobre o trabalho pedagógico em
hospitais do Brasil e das atividades realizadas pelo grupo de extensão da PUC Minas “Pedagogos da
Alegria”, na pediatria de um hospital de Belo Horizonte. Sendo assim, pode-se afirmar que a Pedagogia em âmbito hospitalar é um processo educativo que acontece fora do contexto escolar, proporcionando novos desafios para o pedagogo. Após o confronto dos aportes teóricos e da vivência em
campo, ficou evidenciado que a atuação profissional do pedagogo pode e deve ir além dos muros
da escola e adentrar nos hospitais, uma vez que foi percebida sua importância na recuperação do
enfermo.
Palavras-chave: Prática pedagógica; Criança. Hospital.
1 - Introdução
A Pedagogia, por estar vinculada ao campo das
Ciências da Educação, muitas vezes é reduzida à prática docente. Entretanto, tal campo do saber abrange, além da área escolar, diversos setores de atuação,
conforme está explicitado nas novas Diretrizes Curriculares Nacionais para o curso, tais como a Pedagogia em âmbito empresarial e a prática pedagógica no
hospital. Desse modo, pode-se dizer que a Pedagogia
em âmbito hospitalar é um processo educativo que
acontece fora do contexto escolar, proporcionando
novos desafios para o pedagogo.
2 - Regulamentação Legal da Prática Pedagógica
Ao longo da história, o Curso de Pedagogia passou por diversas discussões almejando especificar
qual profissional deverá ser formado nesse curso e
em quais áreas ele será apto a atuar. Nessa perspectiva, as Diretrizes para o Curso de Pedagogia, aprovadas em 15 de maio de 2006, visam ampliar o leque
de abrangência das funções do pedagogo, capacitan*
do-o para exercer suas funções em ambientes escolares e não escolares, como descrito no Artigo 4º:
Parágrafo Único: As atividades docentes também compreendem participação na organização e gestão de sistemas e instituições de ensino, englobando:
I.Planejamento, execução, coordenação, acompanhamento, avaliação de tarefas próprias do setor de Educação.
II. Planejamento, execução, coordenação, acompanhamento e avaliação de projetos e experiências educativas
não escolares.
III. Produção e difusão do conhecimento científico-tecnológico do campo educacional, em contextos escolares
e não escolares.
Inúmeras leis nacionais e internacionais, como a
Constituição Nacional e a Declaração de Salamanca, colocam a educação e a saúde como prioridades
na promoção da vida das crianças e dos adolescentes. Seguindo esse pensamento, em 1995, foi criada
no Brasil a Declaração de Direitos da Criança e do
Adolescente Hospitalizado, com o intuito de assegurar seu direito à assistência pedagógico-hospitalar
em situações de internação.
Conforme a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional - LDBEN, a atuação do pedagogo não
Graduanda do Curso de Pedagogia da PUC Minas.
Doutora em Ciências da Saúde (UFMG). Professora da PUC Minas. E-mail: [email protected]
**
Pedagogia em Ação, v. 1, n. 1, p. 1-141, jan./jun. 2009 - Semestral
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Érica Cristina Silva Almeida
se restringe apenas a espaços escolares, mas acontece
também fora desses ambientes, nos lugares passíveis
de práticas pedagógicas, como igrejas, ONG’s, empresas e hospitais. É a este último ambiente que se
dará ênfase neste artigo.
3 - Pedagogia Hospitalar: Linhas Gerais
A Pedagogia em âmbito hospitalar é um processo educativo que acontece fora do contexto escolar.
Constitui-se em um campo de abrangência relativamente novo e, devido a isso, os estudos e a literatura
específica sobre esse tema ainda são escassos. No entanto, apesar de pouco divulgada, a atuação do pedagogo em hospitais é uma área em expansão.
No Brasil, ainda são poucos os hospitais que
oferecem a prática pedagógica como complemento
ao tratamento dos pacientes e, em alguns deles, essa
prática não é desenvolvida pelo pedagogo, mas sim
por outros profissionais, como psicólogos e voluntários não pedagogos que, pelo fato de não a relacionarem a um contexto pedagógico maior, desenvolvem a
atividade “como um serviço de recreação, com atividades ou jogos ‘didáticos’, sem sistemática escolar ou
mesmo instrucional (progressão cognitiva).” (CECCIM, FONSECA, 1999, p. 33).
Para se caracterizarem como “Pedagogia Hospitalar”, as atividades desenvolvidas junto aos pacientes devem ser elaboradas por um pedagogo e ter
um contexto educativo que objetive trabalhar o lado
cognitivo do paciente. É interessante que o pedagogo trabalhe em conjunto com os outros profissionais
do hospital, como médicos, enfermeiros e psicólogos, uma vez que esse tipo de atividade deve levar em
consideração o estado de saúde do enfermo. Segundo Taam citado por Fontes (2005), deve haver uma
adaptação da prática pedagógica ao contexto, tempo
e espaço hospitalares, e não apenas a transferência da
escola para o hospital.
Sendo assim, a prática pedagógica deve respeitar
as peculiaridades do ambiente hospitalar e do paciente, lembrando que o mesmo traz consigo experiências particulares e que o hospital não é um estímulo
para a aprendizagem, por se tratar de um contexto
diferente do visto na escola, onde há a sistematização
de conteúdos.
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4 - Pedagogia em Prol da Saúde do Enfermo
Ser “diferente” e, por isso, ter de ficar “de fora” é muito doloroso; vencer os obstáculos impostos pela doença, ao contrário, é vitória, aprendizagem e desenvolvimento.
Ricardo Burg Ceccim & Eneida Simões da Fonseca
O enfermo, ao se submeter a uma internação,
desvincula-se de seu cotidiano e adota a rotina do
hospital, perdendo, por algum tempo, alguns aspectos
do contato com seu mundo. A vivência no hospital e
a situação em que esse paciente se encontra influem
em seu estado psicológico, refletindo-se em sua saúde física. Confirmando isso, Ceccim e Fonseca (1999,
p. 33), ao analisarem os estudos de Bowlby (1969),
Robertson (1970), Ajuriaguerra (1975) e Lindquist
(1980), afirmam que “o ambiente estranho e o tratamento muitas vezes doloroso a que as crianças são
submetidas quando hospitalizadas podem, de fato,
lesar gravemente o curso de seu desenvolvimento”.
Sabe-se que uma hospitalização é dolorosa para
o enfermo, e as crianças não fogem a essa regra.
Como toda criança sadia, a criança enferma anseia
por brincadeiras e atividades cotidianas e, nesse caso,
“a educação que se processa por meio da Pedagogia
Hospitalar não pode ser identificada como simples
instrução (transmissão de alguns conhecimentos
formalizados). É muito mais que isso”. (MATOS,
MUGIATTI, 2008. p. 47). Por essa razão, o pedagogo tem como proposta o envolvimento da criança em
brincar, estudar e se relacionar - atividades que são
de suma importância para o bem-estar do paciente
em sua recuperação. Sendo assim, um dos objetivos
do pedagogo é tentar resgatar a autoestima e as rotinas cotidianas dessa criança, para que ela continue
estabelecendo vínculos positivos com o mundo.
A prática pedagógica dentro do hospital deve levar em conta diversos fatores, como o tipo e o tempo
da internação, a idade e o quadro clínico da criança,
bem como seus horários em meio à rotina hospitalar.
Por isso, deve-se ter o cuidado de planejar atividades
que comecem e terminem no mesmo dia, pois é possível que o paciente não possa participar da atividade
do dia seguinte, devido a fatores como a obtenção da
alta, a piora no quadro clínico ou a realização de algum exame.
Também é indispensável que o pedagogo mantenha uma ética e guarde o sigilo das informações
Pedagogia em Ação, v. 1, n. 1, p. 1-141, jan./jun. 2009 - Semestral
Práticas pedagógicas em ambientes hospitalares: potencializando a saúde através da educação
sobre os pacientes, expondo esses dados somente
aos profissionais do hospital que também acompanham a evolução do enfermo, respeitando assim sua
individualidade.
A criança, envolvendo-se com as práticas pedagógicas e, principalmente, estabelecendo diálogo
com o pedagogo, reduz sua ansiedade e o medo advindo da doença, além de se ajustar ao ambiente, retomar o elo com o mundo e continuar a desenvolver
o seu potencial cognitivo. Diante desses processos,
segundo as observações de Oliveira (1991), na maioria das vezes ela se recupera mais rápido e aumenta
as suas chances de reintegração na volta para casa.
O aspecto lúdico é uma das principais estratégias utilizadas pelos pedagogos dentro do hospital,
para preservar o que há de sadio na criança e para
contribuir em seu processo de recuperação. Por meio
de jogos e brinquedos, que despertam na criança a
criatividade, a alegria de viver e a vontade de se recuperar, elas ganham ânimo para retornar à sua casa e
às atividades escolares.
Dessa maneira, é necessário que o pedagogo estabeleça um planejamento de atividades a serem realizadas, que podem se modificar e se adaptar de acordo com os limites que a doença impõe às crianças e
aos adolescentes internados, observando idade, diagnóstico, fase da doença, tempo de hospitalização e
vivências anteriores.
Outra estratégia utilizada é a união de atividades
de artes às brincadeiras. Inseridas na rotina da criança hospitalizada, elas possibilitam sua melhor aceitação do processo de internação e agilizam sua recuperação, uma vez que as diversas formas de atuação
artística levam a criança a se desenvolver cognitivamente “através de uma multiplicidade de linguagens:
brincando, falando, lendo, construindo coisas, explorando o mundo, exprimindo afetos através do corpo,
do desenho, do olhar” (GOULART, 2002, p. 54). No
contato com atividades lúdicas e artísticas, o paciente resgata necessidades físicas, psíquicas e sociais importantes para o seu desenvolvimento, já que elas estimulam sua participação espontânea, desenvolvem
a criação de fantasias que o ajudam a transitar no
mundo real, encorajam-no a manifestar sentimentos
e lhe proporcionam momentos de relaxamento.
Pedagogia em Ação, v. 1, n. 1, p. 1-141, jan./jun. 2009 - Semestral
5 - Vivência em Campo: algumas considerações
No Brasil, a prática pedagógica em hospitais
ainda é escassa, apesar da existência de leis que regulamentam esse tipo de atendimento. Alguns hospitais incorporaram ao seu atendimento pediátrico a
“Classe Hospitalar”, que oferece acompanhamento
escolar aos pacientes cuja internação requer um período prolongado de afastamento, ou a doença que
acomete a criança é crônica e a impede de frequentar
regularmente a sala de aula. Já em outros hospitais,
a prática é bem particular, indo de encontro às peculiaridades de cada um deles. No caso do hospital
cuja prática pedagógica será descrita, não existe uma
“Classe Hospitalar”, uma vez que as internações são
de curta duração, fazendo com que rotatividade das
crianças seja grande. Nesse caso, a prática baseia-se
majoritariamente no lúdico.
A observação de um atendimento de pedagogia
hospitalar desenvolvido durante o período de fevereiro a dezembro de 2008 no Setor de Pediatria de
um hospital particular de Belo Horizonte pelo grupo
“Pedagogos da Alegria”, composto por três voluntárias, estudantes do curso de graduação de Pedagogia
da PUC Minas, mostra como a prática pedagógica
atua de forma integrada com os outros atendimentos do hospital e se adequa ao quadro clínico de cada
paciente, estimulando sua vinculação positiva com o
mundo, amenizando sua ansiedade, diluindo suas angústias, conservando seus valores cotidianos, e como
influi diretamente em seu estado de saúde e em sua
recuperação.
O setor de Pediatria do referido hospital acolhe
19 pacientes, com idades entre 6 meses e 16 anos,
acomodados em dez quartos particulares e uma área
de enfermaria com nove leitos. Apesar de o hospital possuir uma Brinquedoteca planejada e equipada
para o desenvolvimento de atividades pedagógicas
com os pacientes, o grupo raramente utilizava esse
espaço, já que os médicos dificilmente liberavam
as crianças para acompanhar a equipe até lá. Dessa forma, as atividades pedagógicas eram desenvolvidas com os pacientes nos leitos, juntamente com
seus acompanhantes. As únicas vezes em que a equipe pôde trabalhar com os pacientes naquele espaço
foram nas ocasiões das festas de comemoração do
Dia das Crianças e da Festa Junina, ambas organizadas pela diretoria do hospital e coordenadas pelos
83
Érica Cristina Silva Almeida
Pedagogos da Alegria. Nesses dias, a equipe, vestida
a caráter, planejou e desenvolveu atividades de jogos grupais, teatro e dança com os presentes, durante
todo o período das festas.
Os Pedagogos da Alegria visitam o hospital todas as quartas-feiras, das 14 às 16 horas. Como a rotatividade do hospital é constante, não é possível ter
conhecimento do tipo de paciente que será encontrado a cada dia (idade, sexo e quadro clínico). Dessa
forma, durante a semana, a equipe se reunia e planejava atividades diversificadas. Sempre prontos para
o inesperado, os Pedagogos da Alegria priorizavam
as atividades lúdicas e artísticas, com embasamento pedagógico. Nas ocasiões de datas comemorativas, tinham como tema a referida festividade, como,
por exemplo, o Descobrimento do Brasil, o Dia das
Mães e o Natal. Nas demais ocasiões, as atividades se
mesclavam entre trabalhos manuais de pintura, colagem e desenho, e atividades de raciocínio lógico,
como origami, quebra-cabeça e jogos diversos.
As conversas com os pacientes e seus acompanhantes eram de praxe e ajudavam a descontrair o
ambiente. Durante o período em que o trabalho foi
observado, a equipe recebeu muitos elogios da coordenação e dos acompanhantes, que, por várias vezes,
também lhe deram sugestões. Da mesma forma, os
pedidos dos pacientes para que a equipe voltasse em
outros dias da semana eram constantes.
Chegando às enfermarias, as voluntárias se identificavam e pediam permissão ao paciente e aos seus
acompanhantes para entrar. Para que o trabalho se
iniciasse, era indispensável essa permissão, caso contrário, a equipe agradecia a atenção e deixava uma
lembrança, como uma escultura de balão colorido,
que encantava tanto as crianças como os adultos que
as acompanhavam. A equipe também seguia as recomendações, para não prejudicar a dinâmica do setor,
como nunca oferecer alimentos aos enfermos, pelo
desconhecimento de dietas específicas.
As atividades eram envoltas por um cuidado especial, uma vez que se deve levar em conta a idade
e o estado de saúde do paciente. Os Pedagogos da
Alegria davam liberdade para que este escolhesse a
atividade que mais lhe agradasse e, quando não, sempre existiam outras possíveis de serem desenvolvidas,
pois a preocupação maior com esse tipo de situação
já era previamente pensada.
84
As atividades que exigiam um esforço maior de
raciocínio não eram oferecidas aos pacientes que se
apresentavam mais abatidos; somente eram dadas
àqueles que demonstravam interesse por elas.
Inúmeras vezes foram presenciados fatos de melhora imediata no quadro dos pacientes, que impressionavam bastante os presentes, como no caso de um
garoto de 5 anos, que não queria comer há dois dias
e a quem o atendimento dos Pedagogos da Alegria
serviu de estímulo para que ele tomasse um copo de
leite, que sua avó insistia em lhe oferecer desde cedo.
Por três vezes, foi possível verificar a diminuição da
febre das crianças atendidas. Da mesma forma, ocorreu o desaparecimento de uma dor crônica, que acometia o paciente durante o dia inteiro, logo depois da
visita da equipe.
Estes e outros fatos foram observados durante o
período em que os Pedagogos da Alegria atuaram na
Pediatria e, devido à ajuda desse trabalho na melhora dos pacientes, a equipe médica, em consenso com
a coordenação do hospital, deu mais autonomia ao
grupo para que pudesse levar as crianças à Brinquedoteca sempre que elas estivessem se sentindo bem.
Da mesma forma, a equipe foi solicitada para trabalhar no Ambulatório de Quimioterapia, cujo atendimento varia entre adolescentes e, principalmente,
idosos, tamanha a melhora percebida nos pacientes
da pediatria.
6 - Considerações F inais
A Pedagogia em âmbito hospitalar é um ramo
que está em vertiginoso crescimento em nosso país.
Cada vez mais os hospitais percebem que a humanização do atendimento auxilia a aceleração da melhora do paciente e que o atendimento pedagógico,
em particular, contribui diretamente na evolução do
quadro clínico dos enfermos.
Cabe ressaltar que a Pedagogia dentro do hospital não se restringe somente ao atendimento escolar,
mas vai mais além, abrangendo o trato da pessoa e do
cognitivo dos pacientes, que estão carentes de atividades que os façam exercitar este lado, que parece ser
deixado de lado durante uma internação. O contato
com os Pedagogos - pessoas diferentes das que compõem a junta médica e do pessoal do hospital - contribui para que o enfermo não perca seus laços com o
Pedagogia em Ação, v. 1, n. 1, p. 1-141, jan./jun. 2009 - Semestral
Práticas pedagógicas em ambientes hospitalares: potencializando a saúde através da educação
mundo corriqueiro, que ficou temporariamente para
trás no momento de sua internação.
Pelo observado em campo, foi impressionante
perceber como os pacientes se transformavam durante o atendimento pedagógico, parecendo esquecer que estavam doentes. As mangueiras de soro tornavam-se invisíveis na hora das brincadeiras e até as
dores desapareciam nesses momentos. Durante as
atividades pedagógicas, o setor de Pediatria virava
um verdadeiro parque e, para completar o cenário,
os pacientes mostravam as crianças que são - apenas
“crianças”, não mais “crianças doentes” - se divertindo como sempre fazem, evidenciando que a alegria
de viver impera dentro delas, independente do lugar
ou da situação em que se encontrem.
Referências
ALBINATI, Maria Eugênia Castelo Branco. Arte-educação. Belo Horizonte: PUC Minas, 2008. (Apostila do
Curso de Pedagogia).
GOULART, Maria Inês Mafra. A criança e a construção do conhecimento. In: CARVALHO, Alysson; SALLES, Fátima; GUIMARÃES, Marília. (Orgs.). Desenvolvimento e aprendizagem. Belo Horizonte: Editora
UFMG, 2002. p. 51-71.
MATOS, Elizete Lúcia Moreira; MUGIATTI, Margarida Maria Teixeira. Pedagogia hospitalar: a humanização integrando educação e saúde. 3.ed. Petrópolis: Vozes,
2008. 181p.
OLIVEIRA, Helena de. A enfermidade na infância: um
estudo sobre a doença em crianças hospitalizadas. 1991.
Dissertação (Mestrado). Instituição Fernandes Figueira Fundação Oswaldo Cruz.
UNESCO. Declaração de Salamanca e enquadramento
da ação na área das necessidades educativas especiais.
Rio de Janeiro: UNESCO, 1994. 47 p.
BRASIL. Conselho Nacional de Educação. Conselho
Pleno. Resolução n. 1. Institui Diretrizes Curriculares
Nacionais para o Curso de Graduação em Pedagogia, licenciatura. Diário Oficial da União, Brasília, p. 1-6. 16
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do Adolescente. Resolução n° 41 de 13 de outubro de
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Disponível em: <http://www.ufrgs.br/bioetica/conanda.
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BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Senado Federal, 1988.
CECCIM, Ricardo Burg; FONSECA, Eneida Simões
da. Classe hospitalar: buscando padrões referenciais de
atendimento pedagógico-educacional à criança e ao adolescente hospitalizados. Integração: Brasília: v. 9, n. 21, p.
31-40, 1999.
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hospitalizada discutindo o papel da educação no hospital.
Revista Brasileira de Educação, n. 29, p. 119-138, maio/
ago. 2005.
Pedagogia em Ação, v. 1, n. 1, p. 1-141, jan./jun. 2009 - Semestral
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A contribuição dos softwares educativos para a
construção do conhecimento
Fernando Soares Silva *
Orient.: Sheilla Alessandra Brasileiro de Menezes * *
Resumo
O artigo procura apresentar as possibilidades e a contribuição dos softwares educativos para o desenvolvimento do raciocínio lógico, das habilidades motoras e cognitivas, além de despertar a melhoria
na motivação e no interesse dos alunos. Segundo os resutados pesquisados, percebe-se que o software possibilita que seja um recurso pedagógico para auxiliar no processo educativo, estimulando o
desenvolvimento de habilidades, respeitando as características individuais. Uma das problemáticas
levantada é que, nas escolas públicas, existem os computadores, todavia não existe um caráter educativo que dialogue com o currículo. O que se tem são atividades isoladas dos conteúdos trabalhados
na sala de aula, sem direcionamento programado. Relata também a importância do uso do computador como ferramenta educacional para potencializar o processo de construção do conhecimento.
Palavras-chave: Softwares educativos; Informática na educação.
1 - Introdução
C
om a facilidade de acesso às Tecnologias
da Informação e da Comunicação, faz-se
necessário ter um olhar pedagógico principalmente ao uso do computador. Um
eletroeletrônico tão cobiçado entre crianças e jovens
que, independente da classe social, está presente, de
forma direta e indireta, no cotidiano desses brasileiros e que a escola não deve ignorar, pois os sujeitos
que dela participam vivem em um mundo mediado
culturalmente por essas tecnologias e chegam à escola impregnados por suas histórias e por seu cotidiano.
De acordo com os estudos de Brasileiro (2002), cabe
à escola buscar estratégias para usar o computador
como ferramenta educacional visando à construção
do conhecimento.
A entrada dos computadores na educação, provavelmente, será propulsora de uma nova relação entre os
professores e alunos, uma vez que a chegada desta tecnologia sugere ao professor um novo estilo de comportamento em sala de aula, talvez, até, independentemente
da forma de utilização que ele faça desse recurso no seu
trabalho. (OLIVEIRA, 1997, p. 92).
*
Claro que a simples utilização de computadores
na educação não garante a aprendizagem, e não é
panaceia capaz de resolver todos os problemas educacionais. Contudo, devemos considerar que existe
uma tendência de democratização do acesso às tecnologias, “aumentando a pressão da sociedade para
as escolas reformularem suas práticas.” (CONTIGO, 2006 p. 43).
Para Chaves (1988), o desconhecimento dos
professores sobre as possíveis formas de utilização
do computador no ensino é a principal barreira para
o uso do computador como ferramenta pedagógica,
pois o seu potencial é subestimado em relação ao que
se poderia fazer.
A relação computador e ensino tem maior evidência a partir da concepção behaviorista de Skinner
e isso já cria resistências para muitos professores que
desconhecem as possibilidades do uso do computador na educação.
A teoria behaviorista de Skinner sobre o condicionamento “ganhou projeção, na medida em que
se mostrou adequada para fortalecer a visão capitalista de produção com o seu modelo de controle do
comportamento humano” (OLIVEIRA, 2001, p. 19)
e essa mentalidade foi adaptada à educação através
Graduado em Pedagogia com ênfase em Ensino Religioso pela PUC Minas. E-mail: [email protected]
Mestre em Educação. Professora titular da PUC Minas. E-mail: [email protected]
**
Pedagogia em Ação, v. 1, n. 1, p. 1-141, jan./jun. 2009 - Semestral
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Fernando Soares Silva
de elogios e castigos, prêmios e punições, aprovações desenvolvidas em um laboratório de informática, tee reprovações, objetivando aumentar o desempenho mos os softwares educativos (SE), que são desenvoldo aluno em sua aprendizagem. A relação do uso vidos com a finalidade de intercalar com o processo
dos computadores na escola com o ensino tecnicis- ensino-aprendizagem, fazendo associação ao conteta que se baseia na memorização e no “treinamento” údo didático através de um programa que ensine e
como saber ligar ou desligar o computador, abrir um divirta ao mesmo tempo.
programa, formatar um texto, decorar atalhos, denOliveira (2001) afirma que o SE é uma classe de
tre outros, é equivocada. É justamente esse paradig- software educacional que se diferencia pela finalidama que norteou o uso dos computadores nas esco- de de levar o aluno a construir determinado conhelas, inspirando certas práticas pedagógicas na função cimento relativo a um conteúdo didático. São difereguladora de comportamento e memorização do rentes dos conhecidos softwares aplicativos que são
aluno, descartando estratégias para o seu desenvol- elaborados com uma finalidade de efetuar diversas
vimento cognitivo.
tarefas, como os do pacote Microsoft Office (Word,
Outra problemática é que, nas escolas públicas, Excel e PowerPoint).
existem os computadores, todavia não existe um caráUm Software Educativo muito conhecido foi
ter educativo que dialogue com o currículo. O que se criado por Seymour Papert. “Fascinado por engrenatem são atividades isoladas dos conteúdos trabalhados gens desde a infância, usou essa paixão na criação de
na sala de aula, sem direcionamento programado.
uma linguagem de programação muito simples e raSegundo Oliveira (2001), a informática pode cional: a linguagem de programação LOGO.” (PEpropiciar uma nova dinâmica ao processo de cons- TITTO, 2003, p. 30).
trução do saber. E o seu uso na escola leva o aluno a
O Logo nasceu nos anos 1970 com base nas reser sujeito de sua própria aprendizagem, construindo ferências teóricas sobre a natureza da aprendizagem
seu conhecimento através de sua relação com o meio desenvolvidas por Piaget. Seymour Papert, pesquide forma dinâsador americamica e interativa,
no que trabalhou
como afirmam
diretamente com
as teorias consele, criou essa lintrutivista e soguagem de comciointeracionista.
putador visanNessas teorias,
do levar o aluno
o aluno é convia
desenvolver
dado a ser sujeiseus esquemas de
to de sua própria
pensamento. Asaprendizagem,
sim nasce a teoconstruindo seu
ria do construconhecimencionismo, que diz
to através de sua
respeito à consrelação com o
trução do conhemeio através do
cimento baseada
computador. Ele
na realização de
funciona apenas
uma ação concrecomo um instru- Figura 1: Conta de Estoque - Momento em que a criança realiza operações matemáticas ta que resulta em
mento lúdico que
um produto palpácatalisa obtenção de conhecimento, refletindo e re- vel, em especial, desenvolvido com o uso do compupresentando a filosofia cognitiva que o abraça. (VA- tador. A linguagem Logo direciona o aluno a descoLENTE, 2003).
brir o conhecimento específico de que precisam ao
E, dentre diversas atividades, além de acessar a manusear o programa do computador. (PAPERT,
Internet, digitar ou formatar textos, que podem ser 1994).
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A contribuição dos softwares educativos para a construção do conhecimento
Os jogos construtivos reforçam as habilidades de raAlém do Micromundos, uma versão brasileira que
ciocínio crítico e os conceitos fundamentais de leituse baseia na linguagem LOGO, atualmente temos
ra, matemática e ciências por meio de experiências de
uma variedade de SE que são desconhecidos pelos
aprendizagem. Já as atividades combinadas permitem à
profissionais da educação. Podemos citar os da emcriança explorar e brincar com conceitos que favorecem
presa Anasoft, os softwares educativos RACIOCIo raciocínio criativo. (COELHO..., [20- ])
NANDO, CRIATIVIDADE, CAIXA DE JOGOS
MATEMÁTICA 1; do grupo Positivo Informática,
Temos outras versões do Coelho Sabido especíos jogos DESCOBRINDO A MATEMÁTICA 1 - ficos para cada idade ou fase escolar. Estão entre os
Cores e Formas, O RESGATE DA MONTANHA SE mais vendidos para instituições de ensino e, prinque trabalha o desenvolvimento do raciocínio lógico, cipalmente, para os pais com o intuito de entreter os
ONDE ESTÁ CARMEN SANDIEGO? que abor- seus filhos.
da conteúdos geográficos e o SUPERMERCADO
Também temos o OFFICE FOR KIDS lançanque oferece ao aluno situações-problema permitindo do em 2007, desenvolvido pela EWord Technologies. O
construir e aplicar os conhecimentos vivenciados no software apresenta uma interface lúdica do Microsoft
dia a dia. Dentre os softwares mais vendidos para as Office, criado especialmente para crianças da educaescolas, está a coleção COELHO SABIDO, desen- ção infantil e dos anos iniciais do ensino fundamenvolvido pela empresa The Learning Company, que de- tal e oferece recursos tecnológicos que estimulam o
senvolve habilidades cognitivas, combinando brinca- desenvolvimento de habilidades de leitura, escrita e
deiras e conteúdos curriculares da educação infantil raciocínio. “Com uma interface capaz de transformar
e dos anos inium recurso origiciais do ensino
nalmente
criado
fundamental.
para os adultos em
Conforum excelente insme a figura 1,
trumento de apoio
na fase chaao processo educamada de Contivo, oferece granta de Estoque
de flexibilidade e
do Coelho Saum ambiente altabido 1ª série,
mente intuitivo e
a criança faz
criativo, adequado
operações de
à idade das crianadição e subças.” (OFFICE...,
tração usando
[20- ]).
as peças de fanSegundo
o
tasias de uma
próprio manual inloja. Cada protitulado de Guia
Figura 2: Interface gráfica do Office for Kids Letras.
blema matemáde Ferramentas, o
tico é exibido na tela em numerais acompanhados de software possibilita que seja um recurso pedagógico
objetos coloridos. Ao contar os objetos apresentados para auxiliar no processo educativo, estimulando o
na tela, a criança desenvolve sua habilidade de somar desenvolvimento de habilidades, respeitando as cae subtrair. A cor de cada peça é igual à cor do número racterísticas individuais.
correspondente, contribuindo para que a criança faça
No pacote de programas, são três softwares disa transição entre adicionar e subtrair objetos.
tintos: Office for Kids Letras, que se assemelha ao MiAlém de abordar conteúdos matemáticos, o SE crosoft Word, o Office for Kids Números, similar ao
Coelho Sabido trabalha conceitos de leitura, ciên- Microsoft Excel, e o Office for Kids Multimeios, que
cias e geometria. Cabe ao professor intercalar com os simula o Microsoft PowerPoint.
conteúdos trabalhados em sala de aula.
Esse recurso contribui para o aperfeiçoamento
da leitura e da escrita do usuário. Ao digitar palavras
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Fernando Soares Silva
erradas, o Papagaio reproduzirá a leitura da palavra ção do aparato educacional não deve ser a de ensinar,
errada. Com uma voz um pouco robotizada, a leitu- mas de promover a aprendizagem.”
ra é de fácil compreensão, considera as pontuações
Percebe-se que as empresas que produzem SE
gramaticais, exclamações e interrogações, propicia ao atualmente têm conseguido acompanhar as atuais
aluno uma reflexão da estrutura gramatical e a cria- tendências pedagógicas, até porque muitas delas têm
ção de hipóteses sobre os erros das palavras digita- em sua equipe multidisciplinar pedagogos que oriendas. Contudo, é importante frisar que esse SE não tam a parte educativa, associando-a às possibilidades
deve ser tomado como algo que independe da orien- da tecnologia. Porém, ainda não é usual nas escotação do professor, deve ser inserido dentro de um las públicas encontrar esse tipo de recurso, ainda que
contexto educacional que leve à reflexão. “Por que o boa parte delas já tenha laboratórios de informática
Papagaio está pronunciando diferente a palavra Xí- montados. Talvez por desconhecimento, acabam uticara? Escreve com CH ou com X? Vamos digitar a lizando os laboratórios da escola para simples criapalavra de outra
ção de e-mails ou
maneira e ouvir
cursos básicos de
a pronúncia?”
Word. Já nas escoO softwalas particulares enre Histórias em
contram-se todos
quadrinhos da
os recursos estrutuTurma da Môrais e pedagógicos
nica direciona o
para potencializar
aluno a desenas suas atividades
volver habilidana utilização desdes de criativise recurso didático,
dade, seqüência
entretanto, muitas
lógica e textual,
vezes não haja repois o usuário
cursos
humanos,
cria as suas próou seja, professoprias histórias.
res que saibam usuO objetivo
fruir do computaprincipal é que a
dor como mais um
criança faça uso
recurso pedagógico,
Figura 3: O Papagaio realiza leitura do texto digitado.
do Software, tenha
que pode auxiliar a
prazer em lidar com ele e possa praticar de maneira construção do conhecimento a partir dos conteúdos
clara e objetiva. Na tela principal do software, temos estudados em sala de aula.
uma variedade de ferramentas, como os personagens
Além de termos um mercado de SE desconhee suas expressões, pano de fundo, objetos e balões cido pelos profissionais da educação, as escolas ende textos. Mas é fundamental o auxílio do profes- contram outras barreiras para o seu uso. Dentre elas
sor para que conduza a atividade para uma organi- as configurações dos computadores, que nem sempre
zação lógica da história em quadrinhos montada por são compatíveis para a instalação dos jogos. Para isso,
seus alunos dentro de uma temática do conteúdo é necessário ter conhecimentos técnicos da área de
curricular.
informática como processadores, memória e espaço
Podemos citar outros SE e suas abordagens, mas disponível no disco rígido, por exemplo. Já houve caé importante frisar que sozinhos não atingem os ob- sos de computadores de escolas não possuírem a conjetivos educacionais. Valente (2003, p. 17), cuja pre- figuração mínima exigida para a instalação do SE.
ocupação está voltada para os aspectos pedagógicos,
Outra barreira, talvez a principal, são os recursos
afirma que o papel do computador na educação se financeiros. As licenças individuais dos SE não têm
define na medida em que se questiona a função da um custo muito alto, mas para um laboratório de inescola e do professor, “uma vez que para ele a fun- formática de uma escola fica além do orçamento.
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Pedagogia em Ação, v. 1, n. 1, p. 1-141, jan./jun. 2009 - Semestral
A contribuição dos softwares educativos para a construção do conhecimento
das no laboratório, ou seja, mediando a atividade e
propiciando aos alunos um ambiente de construção
de conhecimento. Para isso, o SE não deve exigir
grandes conhecimentos computacionais dos discentes e o seu uso como ferramenta educacional deve
se mostrar útil e proveitoso no processo de ensinoMas existem outros softwares considerados edu- aprendizagem.
O SE, por mais simples que seja, desperta nos
cativos no mercado, inclusive alguns estão disponíalunos atenção e
veis para downconcentração, além
loads gratuitos na
de trabalhar a coorInternet. Jogos em
denação motora e o
Flash estão em alta,
raciocínio lógico. Teporque
ocupam
mos SE que trabapouco espaço no
lham a percepção vicomputador e são
sual: identificação de
de fácil instalação.
cor, forma, tamanho
Porém, ao procurar
e sequências. Outros
nos sites de buscas,
abordam a organizao professor deve ter
ção espacial: reconhealguns critérios.
cimento de posição,
Como identiespaço e lateralidade.
ficar um SoftwaE a maioria dos SE
re Educativo dos
possui a exploração
jogos convenciode palavras e escrita,
nais? O que caracdesafios com númeteriza um Software
ros, cores e formas.
Educativo? OliveiAlém do mais, ao rera (2001) apresenta
Figura 4: História em quadrinhos da Turma da Mônica
correr aos SE, o aluno
algumas “dicas” para
é
estimulado
a
familiarizar-se
com o equipamento
que o professor identifique e selecione o programa
de informática e com os softwares, incluindo-o no
mais adequado ao seu contexto escolar:
mundo digital.
Portanto, muito se pode fazer através do uso dos
• Definição e presença de uma fundamentação pedagógisoftwares educativos como ferramenta pedagógica que permeie todo o seu desenvolvimento;
• Finalidade didática, por levar o aluno/usuário a “cons- ca. Segundo Ferreira (2008), para que isso acontetruir” conhecimento relacionado com seu currículo es- ça, há necessidade de um contínuo crescimento dos
profissionais envolvidos na educação. Esta é a tarecolar;
• Interação entre aluno/usuário e programa, mediada pelo fa mais árdua: promover mudanças significativas e
abandonar preconceitos, resistências e a mesmice
professor;
• Facilidade de uso, uma vez que não se devem exigir do informatizada.
Se a escola não sabe fazer, tem que buscar parceria, que
possa dar assessoria completa, tanto na parte pedagógica quanto na parte de capacitação de profissionais. Isso
é partilhar, delegar e acreditar que se pode, através de
ações coletivas, obter a essência da eficácia como resposta. (FERREIRA, 2008).
aluno conhecimentos computacionais prévios, mas permitir que qualquer usuário, mesmo que em um primeiro
contato com a máquina, seja capaz de desenvolver suas
atividades.
Claro que o SE não contém um plano de aula
já pronto. É o professor que relaciona o conteúdo
desenvolvido em sala com as atividades direcionaPedagogia em Ação, v. 1, n. 1, p. 1-141, jan./jun. 2009 - Semestral
ABSTRACT
The article tries to present the possibilities and contributions of
educational software for the development of logical, cognitive
and motor abilities, and awaken the improvement in motivation and interest of students. Reported the importance of using
the computer as an educational tool to enhance the process of
knowledge construction.
Key words: Educational softwares; Computer science in education.
91
Fernando Soares Silva
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92
Pedagogia em Ação, v. 1, n. 1, p. 1-141, jan./jun. 2009 - Semestral
Hiperlexia: sua complexidade e características
Irene de Fátima Alves Ribeiro *
Raquel Christina Moreira Lemos *
Orient.: Vera Lúcia Lins Sant’Anna **
Resumo
Este estudo apresenta uma análise reflexiva sobre a Síndrome da Hiperlexia em crianças, suas principais características e sua correlação com o autismo. Apresenta, também, importantes considerações
deste novo saber, tanto no âmbito educacional como âmbito da saúde, pois a Síndrome da Hiperlexia torna-se cada vez mais um desafio para esses profissionais que, muitas vezes, não dispõem
de conhecimentos necessários para diagnóstico. Estudos realizados mostram que essas crianças se
sentem desconfortáveis diante de acontecimentos inesperados, preferindo que tudo seja realizado da
mesma maneira, se apegando às mesmas coisas, vendo a mudança como algo muito difícil. A criança
hiperléxica tem um processo incomum de aprendizagem, por isso precisa de ajuda para dominar as
aptidões que envolvem tocar e sentir o mundo real.
Palavras-chave: Hiperlexia; Síndrome; Educação; Saúde.
1 - Introdução
H
iperlexia é o nome dado às habilidades
de reconhecer letras e números, de desenvolver a leitura precoce, e à dificuldade de compreensão da fala e de socialização com outros indivíduos, além de apresentar um
comportamento atípico. É uma habilidade que pode
ser identificada a partir dos dez meses de idade.
Para Olivier (2007, p. 94), uma das caracteristicas da hiperlexia se menifesta pela “grande habilidade e necessidade de ler tudo o que encontra, desde
outdoors, placas, até revistas e jornais. Mas, muitas
vezes, sem entender o significado do que se lê [...]”.
Além de ser uma condição de desenvolvimento
relacionada ao autismo, a hiperlexia precisa ser alvo
de estudos e pesquisas por ser considerada um dos
mais complexos distúrbios, que possui sintomas e características variados, dificuldades no diagnóstico e,
principalmente, pouca literatura a seu respeito.
2 - Conceituação
lexia
e caracterização da
Hiper-
Olivier (2007, p. 92) afirma que “crianças com
*
**
aprendizagem acelerada de leitura e de escrita podem até se autoalfabetizar e se tornar autodidatas,
com excelente memória e capacidade para cálculos
complicados”. Isto significa que a facilidade de ler
apresentada pela criança simplesmente aparece e
fica.
No entanto, a hiperlexia apresenta deficiências
no desenvolvimento da linguagem e da comunicação, como no autismo. Apesar de incomum, a hiperlexia, quando presente, deve ser levada em conta no
diagnóstico, devido a seus mecanismos ainda apresentarem pouca compreensão.
A hiperlexia é confundida com o autismo por
apresentar semelhanças em suas caracteristicas.
Para a National Society for Autistic Children,
citada por Gauderer,
Autismo é uma inadequacidade no desenvolvimento que
se manifesta de maneira grave, durante toda a vida. É
incapacitante, e aparece tipicamente nos três primeiros
anos de vida. Acontece cerca de cinco entre cada dez mil
nascidos e é quatro vezes mais comum entre meninos do
que meninas. É uma enfermidade encontrada em todo
mundo e em famílias de toda configuração racial, étnica
e social. Não se conseguiu provar nenhuma causa psicológica no meio ambiente destas crianças que possa causar
Graduandas em Pedagogia com Ênfase em Ensino Religioso pela PUC Minas.
Doutora em Ciências da Religião. Mestre em Educação. Professora da PUC Minas. E-mail: [email protected]
Pedagogia em Ação, v. 1, n. 1, p. 1-141, jan./jun. 2009 - Semestral
93
Irene de Fátima Alves Ribeiro; Raquel Christina Moreira Lemos
autismo [...]. (NATIONAL SOCIETY FOR AUTISTIC CHILDREN apud GAUDERER, 1993, p. XI)
Gauderer (1993) apresentou essa definição de
forma resumida, para que possamos entender melhor o autismo. Para ele, esta é a forma mais atualizada do termo. Entendemos, portanto, que não existe
uma causa especifica para o autismo e nem determinada pessoa, ou seja, a incidência do autismo pode
atingir qualquer pessoa.
Para a Organização Mundial da Saúde,
Autismo infantil é uma síndrome presente desde o nascimento, e se manifesta invariavelmente antes dos trinta
meses de idade. Caracteriza-se por respostas anormais
a estímulos auditivos e visuais e por problemas graves
quanto à compreensão da linguagem falada [...]. (ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE, 1984).
A definição da OMS nos possibilita melhor
compreensão sobre a ocorrência do autismo, e nos
proporciona um conhecimento sobre ele. A partir
desse conhecimento, podemos reconhecer a grande
importância da educação para o desenvolvimento
integral da criança, pois é a partir da interação que se
percebe o desenvolvimento da linguagem e do comportamento, é na fase escolar que pais e professores
percebem alterações comportamentais na criança.
Assim, torna-se mais fácil o diagnóstico de autismo.
Para tanto, é preciso que nós, professores, tomemos
cuidado na identificação do autismo em crianças, levando-se em conta simplesmente suas características, pois a hiperlexia apresenta algumas características comuns ao autismo.
Entretanto, vale ressaltar que criança, quando
apresenta a síndrome da hipelexia, possui dificuldades em detectar o sentido daquilo que lê. A leitura
age como forma de alimentação para o cérebro, que
é atraído cada vez mais pelas letras e pelos números,
desencadeando uma busca compulsiva de leitura.
Dessa forma, a hiperlexia é considerada um conjunto de sintomas presente em crianças que mostram
certo retardo em determinadas áreas de seu desenvolvimento. A partir dos parâmetros dados pela Associação Americana de Hiperlexia (1990 )ela pode
ser constituída por quatro características básicas:
• Capacidade precoce para ler, mais do que poderia ser
esperado para a idade;
94
• O desenvolvimento de uma intensa fascinação por letras
e números;
• Uma significativa dificuldade para compreender a linguagem falada;
• Dificuldades em suas habilidades sociais.
O termo hiperlexia foi identificado, originalmente, como um estilo de aprendizagem incomum,
desde a década de 1960, quando o termo foi utilizado pela primeira vez pela Associação Americana de
Hiperlexia. Só a partir da última década que a hiperlexia tem sido associada ao espectro do autismo
aqui no Brasil, pois os mecanismos existentes nesta
síndrome ainda são pouco compreendidos e difundidos nas áreas da educação e saúde.
A hiperlexia, muitas vezes, é confundida com
autismo, embora uma criança hiperléxica possa apresentar características semelhantes a essa síndrome.
Segundo Olivier,
A hiperlexia é um dos mais complexos distúrbios, não
só pela variação de sintomas e características como também pela dificuldade no diagnóstico, visto que a pouca
literatura existente tende a generalizar o distúrbio em
alguns aspectos. Sua definição mais usada é “desordem
de linguagem com preciosa habilidade para a leitura”.
(OLIVIER, 2007, p.91).
Entendemos que a capacidade de atenção das
crianças, normalmente, é pequena, e menor ainda nas
hiperléxicas. Em certos casos, é muito difícil manter
as crianças concentradas em um determinado assunto, mesmo que este seja interessante, e este aspecto
vem sendo considerado um desafio realmente sério
tanto para os pais como para os professores.
As crianças hiperléxicas, além de apresentarem
um grau mínimo de atenção, ainda aprendem a ler
antes de saberem falar. Os portadores dessa síndrome possuem uma leitura compulsiva, ou seja, leem
tudo que tem forma de letra que aparece à sua frente.
Quando brincam com bloquinhos de construção, em
vez de erguerem torres, formam letras. Se olharem
um suporte da mesa, veem uma letra H. Interessamse pelos programas de televisão que exibem muitos
números e letras, telecurso, roleta, entre outros.
Apesar de se interessarem tanto pela leitura, as
crianças hiperléxicas não compreendem bem o que
leem. Apresentam um apego à rotina e não gostam
de atividades planejadas de última hora.
Pedagogia em Ação, v. 1, n. 1, p. 1-141, jan./jun. 2009 - Semestral
Hiperlexia: sua complexidade e características
Os estudos realizados mostram que essas crianças se sentem desconfortáveis diante de acontecimentos inesperados, preferindo que tudo seja realizado
da mesma maneira, se apegando às mesmas coisas,
vendo a mudança como algo muito difícil. A criança hiperléxica tem um processo incomum de aprendizagem, por isso precisa de ajuda para dominar as
aptidões que envolvem tocar e sentir o mundo real.
3 - Considerações finais
Considerando as políticas educacionais inclusivas, o aluno deve ser cada vez mais atendido em seus
interesses, necessidades e potencialidades, cabendo
à escola rever suas concepções e paradigmas educacionais, lidando com as evidências que o desenvolvimento humano oferece. O desenvolvimento de uma
criança hiperléxica depende de se desenvolver nela
o idioma e as habilidades de compreensão. Fala intensiva, terapia e programas de intervenção poderão
contribuir para se alcançar esse objetivo.
A síndrome da hiperlexia é pouco conhecida
tanto na área da saúde como na educação. Devido
à sua complexidade, alguns profissionais a confundem com outras síndromes, principalmente com o
autismo. Por isso, é necessário que crianças hiperléxicas tenham acompanhamento de profissionais
qualificados, como fonoaudiólogos, para ajudar no
desenvolvimento da linguagem, professores especialistas em dificuldades de aprendizagem, psicólogos
para trabalhar a interação social, além dos neurologistas e psicopedagogos. Acreditamos que, num trabalho multidisciplinar, conseguir-se-á alcançar o objetivo fundamental que é o desenvolvimento integral
da criança.
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Pedagogia em Ação, v. 1, n. 1, p. 1-141, jan./jun. 2009 - Semestral
95
Indisciplina: possível indício de dificuldade de aprendizagem
Kely Aparecida de Oliveira *
Orient.: Sérgio de Freitas Oliveira **
Resumo
Este artigo trata de um estudo de caso realizado a partir da percepção da indisciplina como indicativo de problemas na aprendizagem. Foi baseado na entrevista com a supervisora pedagógica de
uma escola da rede estadual, em Ribeirão das Neves (MG), e na análise de relatório que continha as
estratégias utilizadas no desenvolvimento do trabalho de intervenção.
Palavras-chave: Indisciplina; Problemas de aprendizagem.
A
supervisora pedagógica, na entrevista,
comentou que este caso era apenas um
entre tantos vivenciados no cotidiano de
uma escola pública. O estudo de caso foi
realizado, a princípio, com cinco alunos na faixa etária de 11 a 13 anos, matriculados no 6º ano. Apesar de sua experiência, relatou que foi a primeira vez
que atendeu todos os professores se queixando dos
mesmos problemas na mesma sala de aula. Diante das queixas, não apenas ela, mas a escola, foi se
conscientizando das dificuldades dos professores em
trabalhar com alunos com déficit de aprendizagem,
dificuldades de leitura e interpretação, e problemas
disciplinares na mesma sala de aula, juntamente com
outros alunos que não tinham melhor desempenho
por influência deles.
Devido à indisponibilidade dos professores para
atendê-los de forma exclusiva, a supervisora decidiu reunir esses alunos e fazer com eles um trabalho
diferenciado. O objetivo era desenvolver atividades
extraclasse, aproveitando algumas horas do tempo
escolar para trabalhar a leitura, a escrita e a interpretação em textos sobre valores, ética e educação, pois
a maioria deles tinha comportamentos agressivos e
antissociais.
*
Para dar início ao processo, foram realizadas reuniões com os pais desses alunos para informar a sua
situação na escola, apresentar a proposta de intervenção, obter outras informações importantes sobre eles
e, a partir daí buscar auxílio de outros profissionais.
No início do trabalho extraclasse, a supervisora pedagógica e a professora identificaram que três
dos cinco alunos seriam encaminhados para o Projeto Escola em Tempo Integral, pois precisavam de
incentivo, sabiam ler e interpretar, mas tinham baixa
autoestima e não encontravam prazer no que lhes era
ensinado. Tinham “preguiça de ler”, por isso atrapalhavam a atenção e o aprendizado dos outros alunos.
A participação desses alunos no Projeto seria uma
possibilidade de que o conhecimento fosse produzido para uma transformação de atitude e abertura
para o crescimento.
A prática pedagógica adotada se baseou no pensamento de Paulo Freire (1996) de que “ensinar não
é transferir conhecimento, mas criar possibilidades
para a sua produção ou a sua construção”, e era exatamente o que eles precisavam para se desenvolverem.
Consta no relatório que, após duas semanas no Projeto, os alunos se comportavam melhor até nos momentos de refeição, liam e produziam bons textos.
Graduada em Pedagogia com Ênfase em Ensino Religioso pela PUC Minas e Professora de Ensino Religioso na Rede Estadual
de Ensino. E-mail: [email protected]
**
Licenciado em Letras e em Pedagogia. Professor Adjunto da PUC Minas. E-mail: [email protected]
Pedagogia em Ação, v. 1, n. 1, p. 1-141, jan./jun. 2009 - Semestral
97
Kely Aparecida de Oliveira
Os outros dois alunos, um de 12 e outro de 13
anos, irmãos, após o relatório enviado pela psicopedagoga e o relato dos pais sobre a trajetória escolar
deles, ressaltando que o período introdutório foi interrompido algumas vezes devido a problemas familiares, prosseguiram na oficina de leitura organizada
pela professora e pela supervisora. Precisavam, realmente, de atividades que propiciassem o letramento
e de incentivo ao prazer de aprender através da leitura, da escrita e da interpretação.
Conforme os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) de Língua Portuguesa,
lescentes, quando os profissionais envolvidos se tornarem mais comprometidos e se contentarem apenas quando atingirem bons resultados. Um estudo
de caso não pode ser simplesmente um documento
para arquivo, mas exemplo vivo de práticas pedagógicas de qualidade.
[...] o trabalho com leitura tem como finalidade a formação de leitores competentes e, consequentemente, a
formação de escritores [...]. Se o objetivo é formar cidadãos capazes de compreender os diferentes textos com
os quais se defrontam, é preciso organizar o trabalho
educativo para que experimentem e aprendam isso na
escola. (BRASIL, 1997).
FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. São Paulo: Paz e Terra, 1996.
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Brasília: Ministério da Educação e da Cultura, 1997.
SOARES, Magda. Alfabetizar e letrar: um diálogo entre
a teoria e a prática. Rio de Janeiro: Vozes, 2005.
O trabalho foi desenvolvido com diversos tipos
de textos, livros, vídeos nas aulas de português e nas
aulas extras com a única professora que se propôs a
participar do projeto de intervenção.
Como afirma Soares,
[...] não se ensina a gostar de ler por decreto, ou por imposição, nem se formam letrados por meio de exercícios
de leitura e de gramática rigidamente controlados. Para
formar indivíduos letrados, a escola tem que desenvolver
um trabalho gradual e contínuo. (SOARES, 2005).
O trabalho contribuiu significativamente para a
melhoria da aprendizagem e do comportamento dos
alunos, pois, a partir das atividades diferenciadas e
atrativas por elas propostas, eles passaram a prestar
mais atenção em todas as aulas, a participar e começaram a ajudar outros colegas.
Não foi apenas um trabalho de letramento, mas
um trabalho de socialização que influenciou positivamente no desenvolvimento cognitivo, psicológico e social daqueles alunos e, consequentemente, na
melhoria do processo de ensino-aprendizagem da
sala de aula da qual faziam parte.
A partir do caso relatado, podemos considerar
que o sucesso da avaliação e da intervenção depende
muito da capacidade do pedagogo de busca, envolvimento, articulação, acompanhamento e liderança,
pois a educação só fará a diferença na vida de ado-
98
Pedagogia em Ação, v. 1, n. 1, p. 1-141, jan./jun. 2009 - Semestral
A Educação Religiosa no ensino fundamental:
desafios e perspectivas à prática docente
Resumo
Luzinete Rodrigues dos Santos *
Michelle Lopes Faria *
Nilmair Machado de Oliveira *
Pollyana Patrícia Dada *
Sheilla Letícia de Castro Ferreira *
Vanessa Pereira de Carvalho *
Vívian Souza Ribeiro *
Orient.: Vera Lúcia Lins Sant’Anna **
O presente artigo aborda os desafios da Educação Religiosa no Ensino Fundamental, levando em
consideração a prática dessa disciplina nas escolas públicas (estadual e municipal) e nas escolas confessionais cristãs. O artigo faz uma reflexão relacionada com as diferenças entre a concepção de
Educação Religiosa nas escolas públicas e nas escolas confessionais cristãs, levando em consideração
a historiografia da Educação Religiosa no Brasil, explicando a origem da disciplina – que recebia o
nome de Ensino Religioso –, o caminho que foi traçado por ela, os rumos que tomou ao longo da
história e os desafios que enfrentou para se tornar uma disciplina reconhecida na grade escolar. O
objetivo desse artigo é analisar a proposta da disciplina Educação Religiosa desenvolvida nas escolas
públicas (estadual e municipal) e nas escolas confessionais cristãs.
Palavras-chave: Educação religiosa; Escolas públicas e confessionais; Formação docente.
1 - Introdução
O
que se pretende discutir neste artigo é a
proposta para a Educação Religiosa nas
escolas públicas e nas escolas confessionais cristãs, porque, embora sua concepção tenha sofrido modificações, – inicialmente,
como evangelização e catequese, posteriormente, um
modelo ecumênico –, a Educação Religiosa vigente
tem como pressuposto fundamental a formação básica do cidadão e a sistematização do fenômeno religioso, conforme as orientações da Lei n. 9.394/96.
Sabemos que a Educação Religiosa possui como
conteúdo fundamental para se trabalhar o fenômeno
religioso e os valores éticos na sociedade, levando em
consideração que o ser humano tem sua religiosidade, sua religião. Por isso, é necessário entender a sua
prática docente.
O desafio da prática docente diante das diversas
concepções da Educação Religiosa no Brasil nos ajuda a levantar as seguintes questões: Como ser educador da disciplina Educação Religiosa no século XXI?
Como lecionar uma disciplina que ainda apresenta
orientações da Igreja? Como educar sem desenvolver
proselitismo? Como ajudar o aluno a compreender o
*
fenômeno religioso numa sociedade tão pluralista e
secularizada? Qual a concepção de Educação Religiosa nas escolas públicas e nas escolas confessionais
cristãs? Qual a proposta de educação religiosa nas
escolas públicas e nas escolas confessionais cristãs?
2 - Uma visão historiográfica do Ensino Religioso no Brasil
No período de 1500 a 1800, o Ensino Religioso era uma forma de evangelização e catequese, de
acordo com o Sumo Pontífice e o Monarca de Portugal. No período de 1823 a 1889, a religião é mecanismo para fortalecimento do Estado e o que acontece
na escola é o ensino da religião Católica Apostólica
Romana como forma de “manipulação” social. Com
a implantação do regime republicano, no período
de 1890 a 1930, ocorre a separação Igreja e Estado, e prevalece o ideal positivista. Foi proclamado o
ensino laico na Primeira Constituição, 6ª alínea do
artigo 72: “Será leigo o ensino ministrado nos estabelecimentos públicos”. Nesse período, o Ensino
Religioso não ocorria nas escolas públicas, somente
nas escolas privadas católicas.
Graduandas em Pedagogia com Ênfase em Ensino Religioso pela PUC Minas.
Doutora em Ciências da Religião. Mestre em Educação. Professora da PUC Minas. E-mail: [email protected]
**
Pedagogia em Ação, v. 1, n. 1, p. 1-141, jan./jun. 2009 - Semestral
99
Santos, L. R. dos; Faria, M. L.; Oliveira, N. M. de; Dada, P. P.; Ferreira, S. L. de C. ; Carvalho, V. P. de; Ribeiro, V. S.
A partir de 1931, o Ensino Religioso volta a
ocorrer na escola pública em caráter facultativo. Na
constituição de 1934, foi assegurado pelo artigo
153:
O ensino religioso será de matricula facultativa e ministrado de acordo com os princípios da confissão religiosa do aluno, manifestada pelos pais e responsáveis,
e constituirá matéria dos horários nas escolas públicas
primárias, secundárias, profissionais e normais.
Essa lei não foi bem aceita pelos chamados escolanovistas, por causa do ensino laico e da gratuidade
do ensino público já garantidos na educação brasileira. No Estado Novo, de 1937 a 1945, o Ensino Religioso perde seu caráter de obrigatoriedade, por não
implicar em obrigação para mestres e alunos.
No terceiro período republicano, de 1446 a 1964,
o Ensino Religioso é visto como dever do Estado,
respeitando a liberdade religiosa do aluno que frequenta a escola. Ocorrem discussões sobre a natureza
da matéria.
No quarto período republicano, de 1964 a 1984,
o Ensino Religioso é obrigatório para a escola e possibilita ao aluno o direito de optar pela disciplina no
ato da matrícula. Na década de 1970, começa a existir uma distinção entre catequese e Ensino Religioso.
Em 1971, ocorre uma abertura para a disciplina de
Ensino Religioso com a Lei n. 5.692/71, em seu artigo 7º, parágrafo único, quando diz: “O ensino religioso, de matrícula facultativa, constituirá disciplina
dos horários normais dos estabelecimentos oficiais
de 1º e 2º graus”.
No período de 1986 a 1998, devido aos novos
paradigmas que afetam a educação, criando incertezas, procedem nas escolas divergências com as concepções vigentes da educação, devido à crise cultural
vivida pela sociedade. Com isso, o Ensino Religioso busca a sua redefinição como disciplina, adotando uma metodologia adequada aos princípios que o
configuram como elemento da escola, e não da igreja.
Em 1985, com a nova Lei de Diretrizes e Bases no
Congresso Nacional, ocorrem propostas em vista da
permanência do Ensino Religioso no currículo, para
permitir ao educando ter compreensão de sua religiosidade e convivência com as diferenças. Em 1997,
o Congresso Nacional decreta a Lei n. 9.475/97, que
dá nova redação ao artigo 33 da Lei n. 9. 394/96, de
100
20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes
e bases da educação nacional:
Art.33- O ensino religioso, de matrícula facultativa, é
parte integrante da formação básica do cidadão, constitui disciplina dos horários normais das escolas públicas
de ensino fundamental, assegurado o respeito à diversidade cultural religiosa, vedadas quaisquer formas de
proselitismo.
§ 1º - Os sistemas de ensino regulamentarão os procedimentos para a definição dos conteúdos do ensino
religioso e estabelecerão as normas para habilitação e
admissão dos professores.
§ 2º - Os sistemas de ensino ouvirão entidade civil,
constituída pelas diferentes denominações religiosas,
para a definição dos conteúdos do ensino religioso.
(BRASIL, 1997).
E, hoje, temos em vigor sobre a disciplina Ensino Religioso o que dita a Constituição Federal,
promulgada em 1988, no artigo 210, parágrafo 1º
do capitulo III da ordem social: “o ensino religioso, de matrícula facultativa, constituirá disciplina
dos horários normais das escolas públicas de ensino
fundamental”.
A partir da formulação dos Parâmetros Curriculares Nacionais de Ensino Religioso e da nova LDB,
a nomenclatura dessa disciplina sofreu mudanças
significativas em diversas escolas, como, por exemplo: Educação Religiosa, Ensino para a vida, entre
outros. “A exemplo da Câmara de Educação Básica,
que em 1998 considerou o Ensino Religioso como
área de conhecimento e mudou a sua nomenclatura para Educação Religiosa, também a Secretaria de
Estado da Educação [...]”. (DANTAS, 2002, p. 77).
A história do Ensino Religioso no Brasil ainda
nos remete a questionar a dimensão religiosa dessa disciplina, já que temos a herança da religião católica, ainda significativa na Educação Religiosa das
nossas escolas. Será necessário compreender qual é o
papel do Ensino Religioso nas escolas públicas hoje
em dia?
Conforme Fernandes:
[...] olhando a história do ensino religioso no Brasil
desde o Período Colonial até hoje, nota-se que ainda é
necessário um verdadeiro reconhecimento da dimensão
religiosa que auxilia o educando a superar os desafios e
conflitos oriundos da própria natureza religiosa inerente
a todo ser humano. (FERNANDES, 2000, p. 25)
Pedagogia em Ação, v. 1, n. 1, p. 1-141, jan./jun. 2009 - Semestral
A educação religiosa no ensino fundamental: desafios e perspectivas à prática docente
No Brasil, os educadores, formadores e pedagogos estão refletindo e pesquisando para apresentar o
conceito de Ensino Religioso, sua prática pedagógica, a definição dos seus conteúdos e a metodologia
para ser aplicada na sala de aula.
Analisar a historiografia da disciplina é o primeiro passo para descobrir os desafios e as perspectivas. O Ensino Religioso passou por caminhos cheios
de atropelos, deixando cicatrizes, passando por várias
tendências presentes em cada época. É necessário repensar a sua proposta, contextualizando para a realidade da comunidade escolar, visando a uma didática que
contribua para a formação integral do aluno na construção da cidadania, conforme as orientações da LDB.
3 - Metodologia
A pesquisa foi desenvolvida em duas escolas públicas (municipal e estadual) localizadas na cidade de
Contagem, em dois colégios confessionais católicos
e escolas confessionais protestantes que estão situadas na cidade de Belo Horizonte. Possui enfoque
qualitativo, além de contar com a contribuição bibliográfica de diversos autores, para respaldar nossa temática. Os dados foram obtidos através dos seguintes procedimentos: pesquisa teórica documental,
questionários realizados com seis professores, análise
do Projeto Político Pedagógico das escolas visitadas
e conversa informal. Para cada escola, foi usada uma
cor como pseudônimo para preservar a identidade da
escola visitada.
4 - Caracterização da Educação Religiosa nas
Escolas Públicas e Escolas Privadas Confessionais Cristãs
4.1 - Escolas Públicas
A escola pública tem como base os Parâmetros
Curriculares Nacionais (PCN). Os princípios básicos, tais como liberdade, valores, respeito, não violência, trabalhados na Educação Religiosa, contribuem
para a formação total do ser humano, sendo que a
ética é fundamental na relação com o outro, para que
não ocorra qualquer tipo de violência. Durante sua
aplicação na escola e na sua interação com outras disciplinas, é que a Educação Religiosa se fortalece e se
Pedagogia em Ação, v. 1, n. 1, p. 1-141, jan./jun. 2009 - Semestral
diferencia da catequese, pois seu conteúdo ganha uma
forma estimulante no processo ensino-aprendizagem,
trabalhando valores e princípios essenciais para a vida.
No que se refere ao Ensino Religioso na escola, sua importância é indiscutível. No entanto, é ao ser ministrado,
em sua prática cotidiana, que os desafios são apresentados. É na interação com outras áreas do conhecimento,
buscando despertar o sentido da vida e do transcendente, que o Ensino Religioso vai se solidificando e se diferencia da catequese, que é específica da comunidade de
fé. (FERREIRA, 2001, p. 50).
A Educação Religiosa nas escolas públicas ocorre de forma diferenciada para cada ciclo, sendo, no
primeiro ciclo, um período de introdução em que o
aluno é iniciado no trabalho metodológico, no qual o
objetivo é que os alunos compreendam os significados que os símbolos religiosos têm na vida das pessoas, já que se procura considerar a vivência de cada
indivíduo. Os conteúdos para o primeiro ciclo são os
ritos, os símbolos, a história das narrativas sagradas,
os ritos e as teologias.
No segundo ciclo, a Educação Religiosa estimula o diálogo, baseando-se nas ações concretas do indivíduo no tempo e no espaço. É necessária a preocupação do professor quanto às práticas religiosas de
cada aluno.
No terceiro ciclo, ocorre um aprofundamento no
qual o aluno é avaliado pela sua capacidade de exercitar seu pensamento lógico. Nesse período, são incluídas a filosofia, a história e a sociologia das tradições religiosas.
No quarto ciclo, os elementos básicos religiosos se
fundamentam no diálogo do dinamismo da formação
da consciência. Nesse momento, é importante a experiência pessoal de liberdade como condição básica
para inserção no pluralismo, e é necessário que exista
um desafio para os valores na superação do eu pessoal.
4.2 - Escolas Confessionais Católicas
Nas escolas confessionais católicas, a disciplina
Educação Religiosa garante aos alunos o reconhecimento do fenômeno religioso e o aprofundamento dos
valores cristãos a partir de suas vivências. A Educação Religiosa no Ensino Fundamental trabalha conteúdos ligados à formação do ser humano como um
ser que pensa e que realiza ritos religiosos e suas dife-
101
Santos, L. R. dos; Faria, M. L.; Oliveira, N. M. de; Dada, P. P.; Ferreira, S. L. de C. ; Carvalho, V. P. de; Ribeiro, V. S.
rentes percepções de espaço, tempo, verdade e comunicação, apresentando alguns ritos nas religiões, seguindo as orientações dos PCN de Ensino Religioso.
A disciplina Educação Religiosa trabalha a alteridade, a construção da identidade, a transcendência, o conhecimento, a ciência, a fé, a crença, a linguagem, a religião e também estudos sobre Deus no
cotidiano do século XXI, discutindo a ação de fé e a
cidadania. A concepção de Educação Religiosa visa
à religiosidade, que é uma raiz de todas as dimensões da vida, e a Educação Religiosa tem, portanto,
também a função de ajudar na unidade da pessoa.
Distingue-se da catequese, que não será ministrada
na sala de aula, entretanto, existe a possibilidade de
o aluno realizar catequese ou crisma, que é opcional
para quem deseja.
4.3 - Escolas Confessionais Protestantes
As escolas confessionais protestantes seguem as
orientações dos PCN de Ensino Religioso, mas trabalham a Educação Religiosa no modelo confessional, que apresenta o caráter catequético, dando ênfase à religião da própria escola. A educação se baseia
numa perspectiva cristã. Acreditam que, através da
educação, podem-se inserir valores religiosos e éticos. Deus é percebido como um modelo a ser seguido e que deve ser respeitado, pois é o criador de
todo o universo. As escolas confessionais protestantes consideram os princípios bíblicos a base de cada
matéria do currículo escolar. A Bíblia é usada como
referência na sala de aula.
5 - Uma análise pedagógica sobre a pesquisa realizada no âmbito escolar
A escola é um lugar de construção de conhecimento e de ajuda na socialização dos alunos, então, o conhecimento religioso deve estar disponível
para todos que desejam aprender, porque, afinal, ele
é um conhecimento humano. A escola é um lugar de
formação e preparação do aluno para integração na
sociedade, e a Educação Religiosa, sem dúvida, contribui para essa função. Por isso, é necessário que o
professor da disciplina Educação Religiosa tenha uma
formação que possibilite sua atuação na sala de aula.
Os sistemas de ensino estabeleceram normas
para habilitação e admissão dos professores. Por isso
102
é exigida certa especialização nos conteúdos a serem
lecionados. O professor precisa ter claros os objetivos
da escola, a formação integral do educando e o conhecimento da dimensão religiosa do aluno.
A necessidade de profissionais qualificados para o desempenho da função no Ensino Religioso levou o sistema de ensino, algumas universidades, bem como entidades religiosas, à implementação e implantação de cursos
de formação. (CARON, 1999 , p. 35).
Nas escolas pesquisadas, encontramos quatro
professores habilitados, sendo dois com especialização na área da disciplina Educação Religiosa que
trabalham nas escolas confessionais católicas; nas
escolas públicas, os professores possuem graduação
com ênfase em Ensino Religioso; e, nas escolas protestantes, os professores têm habilitação em Pedagogia, o que não os impede de lecionar a disciplina
Educação Religiosa.
Sobre a questão de formação de professores, infelizmente, existem poucos cursos de qualificação na
área de Educação Religiosa, podendo-se destacar o
curso de Pedagogia com Ênfase em Ensino Religioso oferecido pela Pontifícia Universidade Católica
de Minas Gerais.
A PUC Minas, em 1996, em parceria com a SEEMG
[Secretaria de Estado da Educação de Minas Gerais]
criou o Curso de Pedagogia com Ênfase em Ensino Religioso, para atender à determinação já anteriormente
sugerida pela Lei 9.394/96, então em estudo, e defendida explicitamente pela Lei 9.475/97 em seu parágrafo
2°, que determina que os professores de Ensino Religioso fossem habilitados. (SILVA, 2007, p. 101-102).
O professor precisa estabelecer diálogo com seus
alunos para a compreensão da realidade religiosa que
vivemos. Hoje, no mundo moderno, existem muitos
conflitos religiosos, mudanças de valores e desvalorização do sagrado. É na partilha das opiniões e na
troca de experiência que o professor e o aluno podem
construir conhecimentos sobre o fenômeno religioso.
[...] o profissional de Ensino Religioso, pelo acesso ao
conhecimento, e a compreensão do fenômeno religioso
presente em todas as culturas, para o exercício pedagógico no âmbito social, cultural, antropológico, filosófico,
ético, pedagógico, científico e religioso na escola. ( JUNQUEIRA, 2002, p. 112).
Pedagogia em Ação, v. 1, n. 1, p. 1-141, jan./jun. 2009 - Semestral
A educação religiosa no ensino fundamental: desafios e perspectivas à prática docente
Sobre a concepção de Educação Religiosa, que
é um conhecimento sistemático da dimensão religiosa, faz parte da área do conhecimento. Na escola,
o educando terá um espaço para conhecer e refletir
sobre sua religião e as demais existentes. Não será
uma vivência de fé, mas um conhecimento sobre religião. Do ponto de vista da escola leiga e pluralista,
espera-se da Educação Religiosa uma educação da
religiosidade que está inerente no ser humano, “religiosidade é a dimensão mais profunda da totalidade
da vida humana. É a busca da abertura ao transcendente, àquilo ou àquele que ultrapassa a superfície
da vida, o sentido radical da existência”. (FERNANDES, 2000, p. 27).
Os professores, ao responderem os questionários
sobre a concepção da Educação Religiosa, identificam essa disciplina como estudo do fenômeno religioso e dos valores éticos e apresentam a importância
dessa disciplina para que o aluno tenha uma relação
melhor no mundo em que vive. Uma síntese dessa
concepção fica clara na resposta do professor do Colégio Amarelo:
Trabalhar a religião sem proselitismo, mesmo em escola
confessional, o Ensino Religioso deve ser área de conhecimento, se não for assim, corre o risco de ser visto como
piegas pelos alunos. Deve ser compreensão do fenômeno
religioso para entender a sociedade e a si próprio para
viver melhor no mundo, ou seja, o Ensino Religioso tem
a missão de ajudar o educando a buscar o sentido da
própria existência. (Professor do Colégio Amarelo).
De acordo com a pesquisa, os alunos reagem de
forma receptiva à disciplina Educação Religiosa; das
seis escolas entrevistadas, somente uma apresentou
que os alunos têm uma reação negativa em relação
à disciplina. Nas escolas protestantes, a recepção dos
alunos apresenta uma participação ativa. Conforme
o professor do Colégio Cinza, “Acolhem bem a disciplina e os conteúdos propostos para os estudos, inclusive os de credo não católico”. (Professor do Colégio Cinza).
Os desafios para lecionar disciplina Educação
Religiosa, de acordo com os entrevistados, são: o desinteresse dos alunos, os alunos considerarem que a
disciplina não reprova, a não valorização da matéria,
a concepção que os alunos têm de que a disciplina é
ensino da religião católica.
Pedagogia em Ação, v. 1, n. 1, p. 1-141, jan./jun. 2009 - Semestral
Foi muito complicado, porque muitos alunos são agitados e rebeldes. A resistência inicial foi grande quando
imaginaram que o estudo sobre Ensino Religioso era
sobre as religiões, principalmente, a católica. Ao entenderem melhor a proposta, começaram a se interessar pelos conteúdos. (Professora da Escola Estadual Verde).
Para o aluno, a falta de conhecimento sobre o
que é Educação Religiosa provoca esse desinteresse.
É necessário, primeiramente, esclarecer para turma
o que é a disciplina, quais são os objetivos da Educação Religiosa e que a Educação Religiosa não é
catequese. A Educação Religiosa é muito importante porque ajuda na formação humana, na conduta
moral e ética. Ser educador não é uma tarefa fácil,
constitui grande desafio; muitos alunos, conforme a
pesquisa, não têm interesse pela disciplina. Ensinar
é levar o aluno a reconhecer a disciplina Educação
Religiosa de forma consciente, despertar no educando o entusiasmo pela matéria, através de atividades
diversificadas e lúdicas. “Educar é, sobretudo, fazer a
criança indagar, interessar-se pelas coisas, questionar
o que não sabe e o que sabe inventar saídas, sempre
partindo do mundo cultural dado, preexistente e em
ambiente lúdico.” (ANDRADE, 1993).
Os pressupostos levantados pelos professores
entrevistados das seis escolas com relação à prática educativa remetem às diversas atividades: “aulas
expositivas, pesquisa no laboratório de informática,
projeções de slides, livros, exercícios em sala, para
casa, debates e seminários.”(sic),conforme apresenta
o professor do Colégio Cinza. Os recursos didáticos são bem diversificados, essa variedade de recursos ajuda na “produção” do conhecimento, nas relações interpessoais e indicam formas criativas que
auxiliam na transmissão do conteúdo. “O novo perfil
do Ensino Religioso está vinculado à noção de dinamicidade. È um espaço que precisa estar conectado
à dinâmica dos fatos e que precisa se apropriar do
movimento que perpassa as relações interpessoais.”
(MENEGHETTI, 2002, p. 54).
Em relação ao acompanhamento do trabalho realizado pelo professor, por parte da coordenação da
escola, somente uma dentre as seis escolas pesquisadas deu uma resposta negativa para essa questão.
A direção das demais escolas tem uma participação
ativa nesse acompanhamento. O acompanhamento acontece “O tempo todo. Avaliam os projetos, os
planejamentos mensais que são elaborados a partir
103
Santos, L. R. dos; Faria, M. L.; Oliveira, N. M. de; Dada, P. P.; Ferreira, S. L. de C. ; Carvalho, V. P. de; Ribeiro, V. S.
do planejamento trimestral entregue a cada professor” (professor do Colégio Amarelo).
A Educação Religiosa frente ao século XXI,
conforme as repostas dos professores, é uma educação que seja voltada para o estudo da ética e dos valores, a valorização da cultura religiosa, o fenômeno
religioso em vista do diálogo inter-religioso, a busca
da unidade pela paz. É o reconhecimento de que o
aluno é um ser integral. Esse conceito é amplo, mas é
realmente uma síntese da nova concepção de Educação Religiosa. “O Ensino Religioso, valorizando o
pluralismo e a diversidade cultural presente na sociedade brasileira, facilita a compreensão das formas
que exprimem o Transcendente na superação da finitude humana e que determinam, subjacentemente,
o processo histórico da humanidade”. (PCN de Ensino Religioso, 1998, p. 30).
A Educação Religiosa ajuda na formação dos
valores éticos, proporciona aos alunos reflexões ligadas ao fenômeno religioso. O aluno, adquirindo o conhecimento dessa disciplina, pode ser mais coerente nas suas decisões, tornando-se capaz de vivenciar
atitudes éticas e morais. A Educação Religiosa ajuda
o educando a ter uma postura mais crítica diante da
realidade, adquirindo um respeito pela diversidade
cultural e religiosa.
6 - Considerações F inais
Esta pesquisa foi de suma importância para nossa formação acadêmica, tendo em vista que nos proporcionou contato maior com a disciplina Educação
Religiosa.
Com o estudo da historiografia da Educação Religiosa, percebemos que houve mudanças na disciplina, primeiramente era catequese, devido à nossa colonização. A Educação Religiosa foi mantida como
evangelização para sustentar as doutrinas da Igreja
Católica. Entretanto, a partir das emendas na constituição para a manutenção da Educação Religiosa no
currículo das escolas, a disciplina perdeu seu caráter
essencialmente cristão para se transformar em ensino laico. Porém, identificamos que, mesmo com tantas modificações, existem ainda escolas que optam
por lecionar a disciplina de forma confessional.
A formulação dos Parâmetros Curriculares Nacionais de Ensino Religioso trouxe inovações para
disciplina, principalmente no fato de abolir o prose-
104
litismo, seguindo as orientações da Lei n. 9.475/97,
que dá nova redação ao artigo 33 da Lei n. 9. 394/96,
que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. Os PCN de Ensino Religioso remetem à
questão do estudo do fenômeno religioso e da atitude moral, como consequência do fenômeno religioso e do respeito às diversas tradições religiosas e aos
valores éticos.
E o que temos hoje, em vigor, sobre a disciplina
Educação Religiosa é o que determina a Constituição Federal, promulgada em 1988, no artigo 210: a
disciplina passa a ser reconhecida como área de conhecimento, fazendo parte da grande curricular. A
Educação Religiosa é um conhecimento sistemático
da dimensão religiosa. A disciplina possibilita a reflexão sobre o que é religião, abrangendo os seguintes
assuntos: Culturas e Religiões, Escrituras Sagradas,
Ritos, Teologia, Ethos. Não será uma vivência de fé,
mas um conhecimento sobre o que é religião e sua
importância no mundo.
Nas escolas pesquisadas, a Educação Religiosa é
apontada como essencial na formação do educando.
Sendo a religiosidade a raiz de todas as dimensões da
vida, a Educação Religiosa tem, portanto, também a
função de ajudar na formação do educando.
É importante ressaltar que a disciplina possibilita uma reflexão, levando o educando a respeitar
a diversidade cultural. Das seis escolas analisadas,
quatro delas têm a proposta baseada nas orientações dos PCN de Ensino Religioso, e as duas instituições educacionais confessionais protestantes seguem as orientações da sua própria doutrina, dando
à disciplina um caráter catequético, com o intuito de
evangelizar os alunos, fundamentado-se nos valores
bíblico-cristãos.
Diante dessa constatação, queremos registrar
nossa surpresa de que, nos colégios católicos, o ensino da disciplina se dá de forma dialética, abrangendo
a pluralidade de acordo com os PCN de Ensino Religioso, contrariando nossa hipótese inicial que considerava que todas as escolas confessionais de cunho
religioso lecionam a disciplina Educação Religiosa
com caráter catequético.
Em relação à prática docente, percebemos que é
necessário que o professor desperte no aluno o sentido da vida para que ele possa refletir o sentido de sua
existência, promovendo o desenvolvimento de uma
postura crítica frente à sociedade. A sociedade aprePedagogia em Ação, v. 1, n. 1, p. 1-141, jan./jun. 2009 - Semestral
A educação religiosa no ensino fundamental: desafios e perspectivas à prática docente
senta um pluralismo na dimensão religiosa, cada aluno tem sua liberdade de escolha.
No Brasil, as tradições religiosas apresentam
suas raízes orientais, ocidentais e africanas, o que
exige do professor uma sensibilidade maior para a
pluralidade, consciente de que, para o aluno, ele será
o mediador dessas manifestações religiosas. Diante
desse pluralismo religioso, o aluno vai descobrir as
outras religiões numa atitude de abertura para o outro que tem uma religião diferente da sua, tendo uma
postura respeitosa. As religiões são diferentes, mas
buscam o mesmo objetivo, encontrar com o criador,
e somente pela ética podemos respeitar cada manifestação religiosa do outro e até perceber a beleza de
cada religião na sua diversidade.
Percebemos que o desafio da disciplina Educação Religiosa seja a formação do professor; é necessário ter uma preparação para lecionar essa disciplina, uma formação que ajude a superar os medos
para trabalhar determinados assuntos. A Educação
Religiosa não envolve somente a questão religiosa, a
disciplina trata da formação humana, ética e cultural. O professor precisa ser qualificado para desempenhar essa função. O professor precisa esclarecer a
concepção da disciplina, rever sua prática pedagógica, definir seus conteúdos e utilizar uma metodologia adequada.
De acordo com a proposta para a implementação
da disciplina, é de extrema importância que o professor tenha uma formação adequada para lecionar,
para que não seja pautado em sua confissão religiosa,
e esteja aberto à diversidade religiosa. No decorrer da
pesquisa, identificamos que dos seis professores das
escolas analisadas, quatro deles possuem formação
específica para ministrar a disciplina, resultando em
trabalho dinâmico; há investimento no lúdico durante as aulas, pois têm clareza dos objetivos da disciplina devido à formação que tiveram e buscam trabalhar
em sala de aula o respeito pela diversidade religiosa.
Os outros dois professores não têm uma formação
especificamente relacionada à docência da Educação
Religiosa, mas possuem autorização para lecionar,
não havendo empecilho para atuarem na área. Eles
lecionam a matéria voltada para o proselitismo, seguindo os objetivos da proposta pedagógica da escola.
Tendo em vista os recursos didáticos utilizados
pelos professores pesquisados, consideramos importantes os debates e as reflexões, já que possibilitam
Pedagogia em Ação, v. 1, n. 1, p. 1-141, jan./jun. 2009 - Semestral
ao aluno maior compreensão do assunto. No que diz
respeito aos conteúdos, destacamos a abordagem das
diferenças religiosas retratadas em sala de aula, propiciando um conhecimento amplo, evitando o proselitismo no caso das escolas públicas.
Outro grande desafio é levar os alunos a compreenderem a importância da disciplina em sua formação escolar. Os alunos não têm interesse, porque
acham que a disciplina é somente “falar de Deus”,
“de Igreja”. Essa é a missão do professor, apresentar
para o aluno a natureza da disciplina. Educar é levar o aluno a conhecer a realidade religiosa de forma consciente, despertar no educando o entusiasmo
pelo conteúdo.
Levantamos algumas questões para as quais ainda não temos resposta: Como o aluno compreende
a disciplina Educação Religiosa? Será que a disciplina Educação Religiosa, na prática, contribui mesmo para a formação do cidadão? O aluno aprende a
respeitar as outras religiões a partir do conhecimento adquirido? Será necessário, na próxima pesquisa
sobre a Educação Religiosa, fazer um recorte para
perceber as implicações da disciplina na vida social
do educando.
A importância da Educação Religiosa na escola
é fundamental, visto que essa disciplina permite refletir sobre os valores éticos, a autenticidade da integridade humana e a colaboração para a construção de uma sociedade melhor. Para nossa formação
acadêmica, é significativo conhecermos nossa área de
atuação, levando em consideração que, estando qualificados, poderemos trabalhar integralmente os objetivos da disciplina Educação Religiosa.
Como professores de Educação Religiosa, após
realizarmos esta pesquisa, reafirmamos nosso desejo
de exercer a docência do Ensino Religioso, sabendo
que temos muito a oferecer, já que possuímos uma
qualificação que nos habilita a lecionar.
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09.394/96, 20 de dezembro de 1996.
105
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106
Pedagogia em Ação, v. 1, n. 1, p. 1-141, jan./jun. 2009 - Semestral
Transtorno de conduta
Michelle MarquesTeixeira Ornelas *
Orient.: Sérgio de Freitas Oliveira **
Resumo
Vários quadros psicopatológicos podem ser identificados na infância. Normalmente, tais problemáticas são focalizadas no contexto escolar e, entre esses quadros, encontra-se, com frequência, o
diagnóstico de Transtorno de Conduta. Nos estudos realizados, pode-se entender que o Transtorno
de Conduta está frequentemente integrado ao Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade
(TDAH) e a Transtornos das Emoções (ansiedade, depressão, obsessão-compulsão). Também se associa a baixo rendimento escolar e a problemas de relacionamento com colegas, trazendo limitações
acadêmicas e sociais ao indivíduo. O presente artigo relata o estudo de caso de uma criança com esse
diagnóstico e apresenta as principais características desse transtorno.
Palavras-chave: Transtorno de conduta; Comportamento escolar.
O
Transtorno de Conduta é um dos transtornos psicológicos mais frequentes na
infância e um dos maiores motivos de
encaminhamento ao psicólogo infantil.
Na Classificação Internacional de Doenças
– CID 10 (ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DE
SAÚDE, 1993), esse transtorno é descrito como um
padrão repetitivo e persistente de conduta antissocial, agressiva ou desafiadora, com violação de normas sociais ou direitos individuais. Os sinais dessa
problemática são assimilados pelo discurso (psico)
pedagógico como decorrentes de uma “falta de limites” na educação ou de uma ausência real da figura
paterna na dinâmica familiar.
Os sintomas do Transtorno de Conduta surgem
no período compreendido entre o início da infância
e a puberdade e podem persistir até a idade adulta.
Eventos de vida podem favorecer a persistência do
comportamento antissocial na adolescência e na idade adulta. O ambiente escolar, dependendo de suas
características, pode incentivar ou desestimular o
comportamento antissocial.
Transtorno de Conduta está frequentemente integrado ao Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH) e a Transtornos das Emoções
(ansiedade, depressão, obsessão-compulsão). Também se associa a baixo rendimento escolar e a problemas de relacionamento com colegas, trazendo limitações acadêmicas e sociais ao indivíduo.
Os fatores agregados ao comportamento antissocial na infância, na maioria dos casos, são: receber
cuidados maternos e paternos inadequados, viver em
meio à discórdia conjugal, ser criado por pais agressivos e violentos, ter mãe com problemas de saúde
mental, residir em áreas urbanas e ter nível socioeconômico baixo.
De acordo com Grunspun (1999), o que possibilita o diagnóstico de um transtorno é o impacto da
combinação de sintomas e sinais no paciente ou no
ambiente, no que diz respeito à área emocional, da
conduta, do desenvolvimento e do relacionamento.
No caso do Transtorno de Conduta, os sinais
são mais observados no sexo masculino e os critérios
para seu diagnóstico, conforme o DSM IV, compreendem a possibilidade dos seguintes comportamentos antissociais: níveis excessivos de brigas ou intimidação; crueldade com animais ou outras pessoas;
destruição grave de propriedades; comportamento
incendiário; roubo; mentiras repetidas; cabular aulas
ou fugir de casa; birras incomuns, frequentes e gra-
*
Psicóloga e graduanda em Pedagogia com Ênfase em Necessidades Educacionais Especiais pela PUC Minas. E-mail: [email protected]
**
Licenciado em Letras e em Pedagogia. Professor Adjunto da PUC Minas. E-mail: [email protected]
Pedagogia em Ação, v. 1, n. 1, p. 1-141, jan./jun. 2009 - Semestral
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Michelle MarquesTeixeira Ornelas
ves; comportamento provocativo, desafiador; e desobediência grave e persistente.
Segundo Wajnsztejn (2005), o tratamento de
crianças com Transtorno de Conduta deve ser multimodal para ser útil e deve enfocar as vulnerabilidades médicas, psicodinâmicas, cognitivas, educacionais, familiares e ambientais de cada indivíduo.
Isto posto, esse transtorno será ilustrado com um
estudo de caso de uma aluna do 2º ano do 1º ciclo
do Ensino Fundamental com o referido diagnóstico. Evitando citar nomes, a aluna será denominada
como Luma e a escola inclusiva onde ocorreu o estudo de caso como Escola S.
Luma chegou à Escola S no início de 2007, com
sete anos. Cursava o 1º ano do 1º ciclo do Ensino
Fundamental pela segunda vez, a pedido da mãe.
Residia com a mãe e com os avós maternos e
dormia no quarto junto com a mãe. Os pais são separados, não dialogavam entre si e a criança presenciou
muitas brigas do casal.
A família tinha vergonha do comportamento
“grosseiro” de Luma com as outras pessoas e em lugares públicos. No entanto, estavam preocupados com
a sua aprendizagem e interação com outras crianças.
Logo nos primeiros dias de aula, além de já possuírem uma queixa da mãe, os professores de Luma
perceberam um comportamento diferente dos demais colegas. Agredia fisicamente os colegas, era impulsiva, impunha suas vontades, não gostava de ser
contrariada, respondia aos professores, falava palavrões, não aceitava carinho, não cooperava com os
colegas, quebrava regras e combinados, tinha atitudes masculinas, falava engrossando a voz, verbalizava
o desejo de ser homem, só ficava na companhia dos
meninos, além de dificuldades de aprendizagem.
A mãe de Luma logo foi convocada pela coordenadora, para explicar sobre a origem de tais comportamentos e, nessa ocasião, relatou que Luma sofreu
muita pressão na escola anterior para ler e escrever,
pois esta acreditava que Luma tinha defasagem pedagógica e resistência em aprender. Luma já tinha
feito exames neurológicos e nada foi diagnosticado.
A coordenação percebeu a necessidade da ajuda
de um especialista para obter um diagnóstico. Então, Luma foi encaminhada para uma avaliação psicológica, pois as questões ultrapassavam o limite do
pedagógico.
108
A partir das descrições da escola sobre o comportamento de Luma e de uma breve entrevista investigativa com a mãe, a psicóloga responsável pela
avaliação psicológica “fechou” a problemática da
criança com o diagnóstico de Transtorno de Conduta, explicitando como figura da autoridade ainda em
formação, tentativa de transgredir as regras, função
materna difusa e dificuldade em definir o seu lugar/
espaço.
As decisões tomadas como estratégias de intervenções para ajudar Luma a superar ou minimizar o
problema detectado foram: mudança de casa, onde
Luma passou a ter um quarto só para ela; comunicação entre os pais de Luma, sendo mais tolerantes
um com o outro; frequência de Luma em terapia semanal; compreensão da agressividade de Luma pela
escola; mostrar-se carinhosa e afetiva com ela; investir no seu letramento; apoio na leitura; atendimento individual durante algumas atividades para que
Luma compreenda o que lhe é solicitado e mantê-la
centrada.
O “importante é que a criança seja elogiada para
ganhar cada vez mais estímulo. Ao mesmo tempo,
é preciso exigir deveres e severidade, porque estas
crianças não querem ser tratadas como doentes. Todas as exigências devem corresponder à capacidade
da criança”. (FISCHINGER, 1970, p. 82-83).
Com o passar do tempo, muita dedicação e carinho de todos os envolvidos no caso, Luma conseguia
alcançar sucessos em sua caminhada: maior tolerância com o outro; maior afetividade nas suas relações
e durante a escuta (apesar de ainda encontrar dificuldades em perder e aceitar opiniões contrárias às
suas); mostra-se mais gentil e carinhosa; reflete mais
e pensa antes de agir, conseguindo se conter; respeita
regras e combinados; brinca com as meninas; raramente volta a engrossar a voz para falar; e encontrase alfabética (porém, não lê com ritmo, dificultando
a compreensão do que lê).
Este estudo de caso vem ocorrendo há 1 ano e
4 meses e continua em andamento. Certamente, foi
através dessa intervenção que a Luma começou a
progredir e vem progredindo até hoje.
Enfim, como afirma Santos (2005), não basta
apenas identificar o sintoma, é necessário adaptar-se
à situação e buscar parceria. Com um trabalho solitário, é difícil, mas com um trabalho no qual profissionais se empenham, dedicando-se um pouco mais,
Pedagogia em Ação, v. 1, n. 1, p. 1-141, jan./jun. 2009 - Semestral
Transtorno de conduta
é possível lidar com a diversidade da aprendizagem
escolar. O papel da família e da escola em aceitar
propostas de intervenção e participação, buscando uma abordagem coletiva e valorizando os avanços de cada aluno conforme seu ritmo de aprendizagem, é a base fundamental para a inclusão social e
o sucesso do atendimento pedagógico, psicológico e
psicopedagógico.
Referências
FISCHINGER, Bárbara Sybille. Considerações sobre
paralisia cerebral e seu tratamento. Porto Alegre: Sulina, 1970.
GRUNSPUN, H. Crianças e adolescentes com transtornos psicológicos e do desenvolvimento. São Paulo:
Atheneu, 1999.
MANUAL diagnóstico e estatístico de transtornos mentais: DSM-IV-TRTM : texto revisado. Porto Alegre:
Artmed, 1995. 880p. (Biblioteca Artmed )
ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DE SAÚDE. Classificação de transtornos mentais e de comportamentos
da CID 10: descrições clínicas e diretrizes diagnósticas.
Porto Alegre: Artes Médicas, 1993.
SANTOS, Marta Carolina dos. Relatórios e estudo de
casos clínicos: uma leitura multidisciplinar no espaço
psicopedagógico. Gaspar: Atigos, 2005.
WAJNSZTEJN, Alessandra B. Caturani. Dificuldades
escolares: um desafio superável. São Paulo: Ártemis,
2005.
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Inclusão e escolarização de alunos autistas
Regiane de Carvalho *
Orient.: Sérgio de Freitas Oliveira **
Resumo
O artigo relata um estudo de caso realizado pela equipe pedagógica e docente de uma Unidade Municipal de Educação Infantil - UMEI de Belo Horizonte que, ao constatar um aluno autista na escola,
buscou meios para alcançar o aluno e facilitar o seu processo de inclusão e escolarização de forma
conjunta, objetivando identificar procedimentos, práticas e intervenções pedagógicas que pudessem
colaborar de maneira eficaz.
Palavras-chave: Inclusão; Autismo; Escolarização de autistas.
1 - Introdução
A
presente pesquisa foi baseada na observação participante de uma escola de
Educação Infantil da Rede Municipal de
Ensino – UMEI (Unidade Municipal de
Educação Infantil), que atende a um aluno com Síndrome de Autismo. Levando em consideração que se
trata de crianças que fogem de um “padrão normalizado” e que muitas vezes são prejudicadas em relação ao acesso e ao convívio escolar, tendo em vista
que a educação é direito de todos, conforme disposto
na Constituição Federal de 1988, em seu art. 205, a
área desta pesquisa é delimitada pelo problema de
identificar procedimentos que podem ser desenvolvidos de forma a promover os processos de inclusão,
ensino-aprendizagem e socialização de crianças com
necessidades educacionais especiais por apresentarem autismo, no espaço escolar.
Devido a privações e práticas não condizentes
de alunos com necessidades especiais, buscou-se desmistificar esses conceitos, com o propósito de identificar alternativas pedagógicas adequadas ao desenvolvimento socioeducativo de crianças com síndrome
do Autismo, respeitando suas limitações e o tempo
de que necessitam para aquisição de conhecimentos.
Dessa forma, observaram-se as intervenções que
auxiliam o processo de aprendizagem e o desenvolvimento da criança autista, analisou-se como funciona
o processo de inclusão promovido pela escola e pelo
educador e as possibilidades a serem alcançadas por
crianças autistas, quando inseridas no meio escolar.
Nessa perspectiva, a hipótese desta pesquisa
norteia que, através do acesso à escolarização aliado
a outras intervenções que possam promover a interdisciplinaridade, como: psicopedagogia, fonoaudiologia, psicologia, musicoterapia, psicomotricidade e
outros, poderemos proporcionar-lhes melhor desenvolvimento do ensino-aprendizagem e a inserção no
meio. A educação é a base de toda construção social,
intelectual, de interação e crescimento individual, é
mais do que cuidar de crianças, é abrir a elas o caminho da cidadania, levando em conta que quem tem
deficiência é capaz de muitas coisas, como ler, escrever, fazer contas, correr, brincar e até ser independente. O importante é que, se a criança for estimulada
a descobrir seu potencial desde cedo, as dificuldades
deixam de persistir em tudo o que ela faz, ou seja, ela
precisa de novos desafios para aprender a viver cada
vez mais com autonomia, e não há lugar melhor do
*
Graduanda em Pedagogia com Ênfase em Necessidades Educacionais Especiais pela PUC Minas. E-mail: regianecarvalho2@
gmail.com
**
Licenciado em Letras e em Pedagogia. Professor Adjunto da PUC Minas. E-mail: [email protected]
Pedagogia em Ação, v. 1, n. 1, p. 1-141, jan./jun. 2009 - Semestral
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Regiane de Carvalho
que a escola para que isso se concretize.
2 - Desenvolvimento
O Autismo Infantil (AI) é uma síndrome definida por alterações presentes desde idades muito
precoces, tipicamente antes dos três anos de idade, e
que se caracteriza sempre por desvios qualitativos na
comunicação, na interação social e no uso da imaginação. É um distúrbio do desenvolvimento que surpreende pela diversidade de características que pode
apresentar. Descrito em 1943, por Kanner, o AI tornou-se, em razão de características singulares e integrantes, um dos desvios comportamentais infantis
mais estudados, debatidos e disputados. Por não ter
ainda uma causa específica, é chamado de Síndrome
por ter um conjunto de sintomas que caracterizam o
distúrbio.
Facilitar o processo de inclusão de crianças com
necessidades especiais é um primeiro passo a ser dado
ao se tratar da escolarização e socialização dessas
crianças. Devemos levar em conta que a palavra “inclusão” não é apenas um aspecto a ser desenvolvido
pela escola, mas por todos profissionais nela envolvidos. A Declaração de Salamanca – documento sobre
princípios de Educação Inclusiva, de 1994 – estabelece que a escola inclusiva seja aquela que contempla
muitas outras necessidades educacionais especiais:
crianças que têm dificuldades temporárias ou permanentes, que repetem o ano, sofrem exploração sexual, violação física ou emocional e outros. Tudo isso
colabora para que o estudante tenha cerceado o direito de aprender e crescer. A escola só ensina a todos
quando está atenta às necessidades de cada aluno, em
vez de enfatizar as limitações. A educação inclusiva
desafia a escola a ser mais representativa da diversidade que existe na sociedade, tornando-se mais justa. Acreditamos que a inclusão de crianças com necessidades educacionais especiais por apresentarem
autismo deva ser realizada de forma criteriosa e bem
orientada, variando de acordo com as possibilidades
de cada aluno.
As crianças autistas evoluem em seu desenvolvimento cognitivo, se forem estimuladas a interagir
com pessoas e objetos, sendo então capazes de elaborar seus próprios conhecimentos por meio da descoberta e da criação de novas relações entre os fatos do
mundo real. Ferreira (1993) aponta que o desenvol-
112
vimento intelectual é o processo pelo qual as estruturas da inteligência se constroem progressivamente,
através da contínua interação entre sujeito e o meio
externo.
A criança autista, em relação ao desenvolvimento intelectual normal, passa pelos mesmos estágios
de desenvolvimento, porém, em um ritmo lentificado e com períodos de flutuações, caminhando para
um estado de estagnação. Para Ferreira (1993), o
comportamento deve ser considerado de acordo com
seu modo de elaboração e interpretado em função
do seu processo construtivo. A escola deve descobrir meios adequados de atuação pedagógica para levar ao alcance desses alunos os conhecimentos socialmente disponíveis. O trabalho pedagógico com
crianças com necessidades educacionais especiais
busca supera, as barreiras que aumentam ainda mais
as diferenças.
O autista tem um nível de eficiência que, ao ser
estimulado de forma adequada, lhe permitirá o desenvolvimento de suas capacidades e da personalidade como um todo. Ferreira acrescenta:
O conhecimento do mundo real se faz de forma paralela
e dialética ao desenvolvimento dos esquemas sensóriomotores, ou seja, a criança aprende sobre os objetos de
sua realidade ao mesmo tempo em que descobre suas
possibilidades de agir sobre eles e desenvolve suas habilidades perceptomotoras. (FERREIRA, 1993, p. 107).
3 - Metodologia
Os procedimentos metodológicos desenvolvidos
nesta pesquisa apoiaram-se na iniciativa de acompanhar uma criança com síndrome de Autismo, na
Rede Regular de Ensino.
Em um primeiro momento, foi realizado um levantamento do relatório clínico-médico da criança,
com a tentativa de classificar e conhecer o grau de
severidade da síndrome.
Em um segundo momento, partiu-se para uma
etapa de observação direta em que foram identificadas as atividades desenvolvidas pelo corpo docente,
se estavam de acordo com a necessidade do aluno, a
relação social com os colegas e os processos de inclusão realizados pela escola.
Após essa observação, trabalhou-se com a aplicação de aspectos discutidos e pesquisados pela
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Inclusão e escolarização de alunos autistas
equipe pedagógica e docente, levando em conta as
adaptações do contexto educacional e a flexibilização do currículo escolar, visando atender as dificuldades do aluno. Buscou-se também informar sobre
as características da síndrome de Autismo e realizar
metodologias de trabalho em conjunto com os professores responsáveis pelo aluno, enfatizando o seu
desenvolvimento.
Dessa forma, tentou-se identificar pontos negativos e positivos, modificações ocorridas na criança durante o processo de ensino-aprendizagem, seu
comportamento pessoal e social, os progressos alcançados ou não, as perspectivas e o processo de inclusão
da criança na Rede de Regular de Ensino.
4 - Principais Resultados
A instituição escolhida para observação da criança autista foi uma UMEI (Unidade de Educação Infantil) de Belo Horizonte. No período da observação, a criança, que chamaremos de João 1, tinha cinco
anos de idade, estava no 2º Período, diagnosticada
com grau leve da síndrome de Autismo.
Através dessa observação, identificou-se que
João muitas vezes prefere brincar sozinho e tende a
tomar os brinquedos dos colegas para si. Ele fala sem
dificuldades, mas com pouquíssima frequência escuta-se sua voz. Ele contas com um estagiário na sala
para auxiliá-lo em todos os momentos. As UMEIs
são bastante inclusivas, com espaços preparados para
recebimento de deficientes físicos. A Prefeitura estava promovendo minicursos sobre Autismo, no período observado.
A professora responsável pela sala diz que João
costuma fazer as atividades, mas muitas vezes rejeita e não aceita continuar. Não há qualquer atividade
direcionada para o João, a não ser procedimentos da
vida diária, como ir ao banheiro, se vestir, comer sozinho, escovar os dentes, sendo tudo isto já conquistado por ele, segundo informações da professora. Na
sala de aula há um mural contendo fotos da rotina
do dia, o que facilita o entendimento da criança. Ele
é bem aceito pelos colegas, apesar de muitas vezes
rejeitá-los e não aceitar brincar em grupo. Ele age
com naturalidade e algumas vezes nem percebemos
as suas dificuldades.
A equipe pedagógica e docente iniciou toda a
trajetória identificada na metodologia desta pesquisa
e os resultados estão sendo analisados e discutidos
entre eles, buscando o desenvolvimento integral do
aluno e uma inclusão satisfatória.
5 - Considerações F inais
Analisando os dados obtidos através da observação presencial, pôde-se constatar que muitas são as
barreiras enfrentadas por professores despreparados
para o atendimento de crianças que apresentam necessidades especiais por apresentarem autismo, demonstrando que o acesso dessas crianças na Rede
Regular de Ensino torna-se pouco motivado. Os resultados demonstram a falta de capacitação e de conhecimento sobre a Síndrome e suas características,
o que leva à falta de empenho dos professores.
A UMEI (Unidade Municipal de Educação)
onde foi realizada a observação presencial se mostra cada vez mais inclusiva e alguns professores se
atualizam com minicursos oferecidos, o que facilita
o atendimento mais direcionado às crianças com necessidades especiais. A equipe pedagógica busca um
trabalho conjunto sempre visando o desenvolvimento do aluno autista. Mas a realidade em outras escolas é diferente, principalmente quando se trata de
Redes Públicas.
Comprova-se que o acesso de crianças autistas em ambientes escolares comuns pode promover
grandes avanços quanto ao seu desenvolvimento nos
processos de ensino-aprendizagem, socialização e
inserção ao meio social, principalmente quando contamos com profissionais capacitados na escola e o
auxilio de uma equipe multidisciplinar, como: médicos, psicólogos, musicoterapeutas, dentre outros,
no atendimento dessas crianças. De acordo com informações prestadas pela coordenadora, os trabalhos
realizados com o aluno estão sendo analisados e discutidos, buscando-se o desenvolvimento do aluno e
novas práticas que vão surgindo no decorrer da trajetória educacional.
Referências
CAVALCANTE, Meire. Caminhos da Inclusão. Nova
Escola, São Paulo, n. 11, p. 9-15, out. 2006.
1. Nome fictício, para preservar a identidade do aluno.
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Regiane de Carvalho
FERREIRA, Izabel Neves. Caminhos do aprender: uma
alternativa educacional para a criança portadora de deficiência mental. Brasília: Coordenação Nacional para Integração da Pessoa Portadora de Deficiência (CORDE),
1993. 162 p.
MELLO, Ana Maria S. Ros de. Autismo: guia prático. 2.
ed. Brasília: CORDE, 2001. 85 p.
SCHARTZMAN, José Salomão. Autismo infantil. Brasília: Coordenadoria Nacional para Integração da Pessoa
Portadora de Deficiência (CORDE), 1994. 56 p.
114
Pedagogia em Ação, v. 1, n. 1, p. 1-141, jan./jun. 2009 - Semestral
Comunicações
Comunicações
A voz no trabalho docente
Gustavo Bruno Bicalho Gonçalves *
1 - Introdução: a voz
A voz é um atributo humano fundamental para
a qualidade de vida das pessoas, pois é ela o que dá
suporte e intensidade à fala, meio de comunicação
fundamental nas relações interpessoais.
A voz é, também, fonte de prazer, na medida em
que permite expressar-nos, portanto, cantar, comunicar nossos sentimentos, pedir ajuda, nos posicionarmos frente ao outro, etc. Porém, a voz não é apenas
meio de comunicação, ela é, também, meio de trabalho no caso dos “profissionais da voz”, categoria em
que se inserem os professores.
Convido vocês a imaginarem alguém com sérios
problemas de voz: deficiência respiratória por uma
doença nos pulmões, por exemplo. Uma pessoa nessas condições fala uma frase e já precisa tomar ar novamente, para depois descansar um pouco, não consegue falar por mais que dez minutos. Há uma série
de profissões que seriam contraindicadas para essa
pessoa por um médico otorrinolaringologista, por
um fonoaudiólogo ou por um médico do trabalho,
por exemplo: cantor, teleatendente, vendedor, locutor, repórter, orador, enfim, existe uma longa lista de
profissões que contam com a boa qualidade vocal de
seus trabalhadores, chamados “profissionais da voz”.
Parece ser evidente que a docência também é uma
profissão desse tipo, na qual a voz é de uma importância central e que nenhum médico a recomendaria
a uma pessoa com “deficiência respiratória por uma
doença nos pulmões”.
Os professores necessitam da voz para exercer
seu trabalho, que pode ser extremamente prejudicado caso ela venha a lhes faltar. Infelizmente, devido a uma sobredeterminação de fatores emocionais,
orgânicos e ambientais, professores em todo mundo
vêm apresentando problema de voz, em alguns casos
chegando até a deixar de lecionar. As precárias condições de trabalho encontradas nas escolas são consideradas uma causa determinante na tentativa de explicar esse quadro. Frequentemente a voz é o único
recurso que o professor possui para alcançar o aluno
e, ainda assim, precisa competir com o alto nível de
ruído em sala de aula. A voz é utilizada por muito
tempo e em alta intensidade. Trata-se de um problema abrangente: em todo o mundo, os professores
sofrem sintomas relacionados ao uso nocivo da voz
o que, de várias formas, relaciona-se às suas precárias
condições de trabalho.
2 - Saúde vocal e trabalho docente
A organização do trabalho define riscos para os
trabalhadores a partir da escolha da tecnologia empregada nos processos, bem como na definição das
condições de trabalho. Tais escolhas podem impor ao
trabalhador condições dentro das quais não seja possível responder com plasticidade e adaptar-se funcionalmente, ocasionando o adoecimento. Por exemplo,
o ruído é uma carga física e uma condição normal e
tolerável em pequena intensidade e curto período de
tempo, não apresentando risco ao trabalhador nesses níveis. Porém, uma longa jornada em ambiente
ruidoso induz ao estresse e pode ocasionar sintomas
como dor de cabeça, irritabilidade e até uma perda
auditiva induzida pelo ruído, além de trazer grandes
riscos para a voz. O professor recebe várias influências do contexto em que realiza seu trabalho, que determinam as formas como ele utiliza seu corpo e suas
formas de adaptar-se, que por vezes se traduzem em
doenças e, frequentemente, em doenças vocais.
Sendo a voz um dos problemas de saúde que
mais afligem os docentes, surge a pergunta sobre as
especificidades do trabalho docente que levam os
*
Doutorando em Políticas Públicas e Formação Humana. Mestre em Educação. Bacharel em Psicologia e Fonoaudiologia. Professor do Curso de Pedagogia com Ênfase em Necessidades Educacionais Especiais da PUC Minas em 2008.
E-mail: [email protected]
Pedagogia em Ação, v. 1, n. 1, p. 1-141, jan./jun. 2009 - Semestral
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Gustavo Bruno Bicalho Gonçalves
professores a comportarem-se de forma tão nociva à
sua saúde vocal. As relações entre a gestão escolar e
a organização do trabalho docente nos parecem um
caminho interessante para tentar esclarecer os condicionantes dos usos que os professores fazem de sua
voz em sala de aula.
No Brasil, os docentes atuantes na educação básica pública convivem com precárias condições de
trabalho para realizar atividades que exigem grande responsabilidade e comprometimento. É significativo que, vulgarmente, a atividade do professor de
escola pública seja definida como assentada no “cuspe e giz”. A expressão transmite, basicamente, duas
idéias: a da centralidade que a voz ocupa como meio
de trabalho nessa profissão e a da precariedade que
vive o professor para executar seu trabalho em uma
sala de aula. Os meios que ele possui praticamente se restringem à sua voz e ao giz (que pode causar
alergia, prejudicando a voz), e é principalmente por
esses meios que ele realiza seu trabalho. A centralidade da voz no trabalho docente contribui para o
aumento da prevalência de disfonias, trazendo importantes consequências para o sistema público de
ensino e constituindo-se em tema de grande relevância social.
O problema do absenteísmo de professores doentes coexiste com o de professores disfônicos que
aprendem a conviver com a disfonia em sala de aula.
Se o absenteísmo prejudica o aluno pela interrupção das aulas, o professor que permanece doente em
seu posto também o prejudica por seu estado de saúde debilitado e pela dificuldade em expressar-se com
clareza. Ademais, o aumento do esforço para falar
leva-o a assumir maiores cargas de trabalho, aumentando seu desgaste. Os professores disfônicos precisam repetir mais vezes para serem compreendidos, e ao custo de um maior esforço físico para cada
enunciado.
O local por excelência onde se concentram as atividades do professor na escola e onde ele faz um uso
mais intenso da voz é a sala de aula. Os eventos que
ocorrem na sala de aula parecem ser o que, de modo
mais direto, se relacionam ao desgaste do professor
ao determinar seus deslocamentos, seu cansaço, sua
intensidade vocal, seu grau de relaxamento, etc. Isso
faz com que seja importante identificar os fatores de
risco presentes nas salas de aula, como conforto térmico, qualidade do ar (umidade, partículas suspen-
118
sas), níveis de ruído, infraestrutura e número de alunos por sala. Entretanto, não se pode tomar a sala
de aula de forma descontextualizada. Na sala de aula
está a maior parte do trabalho visível do professor,
mas é imprescindível que sejam analisados outros
aspectos do trabalho docente, que também contribuem para o desgaste, como as pressões de tempo,
o trabalho levado para casa, relacionamentos estressantes com os colegas, múltiplas jornadas, planos de
carreira e política de remuneração defasados. Outros
espaços, tais como reuniões pedagógicas e secretarias
de governo, contribuem para definir a sala de aula e
o seu contexto, logo devem estar presentes tentativas
de análise do trabalho docente.
3 - Alternativas para um uso mais saudável da
voz no trabalho docente
As atuais formas de abordar os problemas de
voz entre professores situam-se entre o atendimento clínico especializado, depois do adoecimento do
professor, visando a sua cura e implicando em seu
provável afastamento; e a realização de projetos educativos e de prevenção em escolas, visando divulgar
para os professores noções de higiene vocal, saúde
vocal, abuso e mau uso vocal, além de despertar a
atenção dos professores para possíveis problemas de
voz. Essas formas de abordar o problema enfocam
o sujeito antes que o contexto que gerou seu adoecimento. Outros tipos de abordagem privilegiando significativas mudanças na estrutura escolar, tais
como aquisição de aparelhos de microfones, amplificadores, diminuição do tamanho das turmas, reformas de espaços para otimização da acústica, são
considerados demasiadamente caros, embora talvez
fossem bastante eficazes na redução dos problemas
de voz em professores e até melhores que as medidas
individualizantes acostumadas.
Esse tipo de abordagem que privilegia o atendimento ao indivíduo doente ou em risco, em detrimento de uma reflexão mais aprofundada sobre
o contexto do adoecimento, pode ser arriscado. Ele
pode fundamentar uma postura em que pouco se faz
pela modificação das condições objetivas de trabalho
e acabar indo contra os interesses dos professores enfermos, desmotivando-os a buscarem melhores condições de trabalho e de uso da voz e, ainda, sentirem-
Pedagogia em Ação, v. 1, n. 1, p. 1-141, jan./jun. 2009 - Semestral
A voz no trabalho docente
se culpados pela própria doença, quando na verdade
muitas vezes são vítimas.
Procurando tentar distinguir, até onde fosse possível, os fatores contextuais dos fatores pessoais na
gênese das doenças relacionadas à voz, realizei um
estudo no qual foi observado que, para incentivar
a participação dos alunos, dirigir e ritmar a turma,
os professores respondiam às exigências das tarefas
pedagógicas por meio de mecanismos de hipersolicitação da voz, como distorcer a voz, gritar e falar
em alta intensidade. Esses comportamentos foram
identificados tanto no ensino do conteúdo quanto
na organização do processo da aula e, em parte, eram
causados pela competição com ruídos. Nesse estudo observou-se, ainda, que os professores desenvolviam estratégias de autopreservação vocal, como usar
meios didáticos alternativos que não sobrecarregavam a voz, evitar a competição com o ruído ou praticar higiene vocal (beber muita água, comer maçã no
intervalo, usar pano úmido para apagar o quadro, não
gritar e outras atitudes simples que visam à proteção
da voz). Essas estratégias, às vezes, eram desenvolvidas por eles próprios, a partir da sua experiência, com
vistas a se autopreservarem e, às vezes, resultavam de
orientações colhidas com especialistas, como fonoaudiólogos. Contudo, mesmo sabendo de um modo
ou de outro o que teriam que fazer para preservarem
sua saúde vocal, eles nem sempre podiam mobilizar
as estratégias desenvolvidas e acabavam incorrendo
em hipersolicitação vocal.
Os resultados da pesquisa sugerem que mudanças na organização do trabalho docente, como diminuição do nível de ruído e do número de alunos
por sala e implementação da pedagogia de projetos,
podem contribuir para a prevenção da hipersolicitação em sala de aula e, consequentemente, da disfonia
ocupacional entre os docentes, melhorando, assim, a
qualidade de vida desses profissionais. Pode-se também recomendar que sejam criadas sessões de formação para professores nas quais eles possam compartilhar as estratégias de autopreservação – até então,
em sua maior parte, individuais –, servindo para a
elaboração de estratégias coletivas.
4 - Conclusão
Gostaria agora de retomar a questão levantada anteriormente sobre se o trabalho docente seria
Pedagogia em Ação, v. 1, n. 1, p. 1-141, jan./jun. 2009 - Semestral
mesmo um trabalho realizado por um “profissional
da voz”. Supondo que nosso trabalhador hipotético com “deficiência respiratória por uma doença nos
pulmões” viesse a trabalhar em uma escola, seu desempenho profissional estaria comprometido, não
é mesmo? Por mais bem intencionado e esforçado
que fosse esse professor, dificilmente ele conseguiria superar a sua jornada de trabalho. Seria improvável que ele, sozinho, conseguisse ministrar conteúdos
durante várias horas e vários meses para barulhentas turmas de trinta alunos em diferentes estágios de
aprendizagem, diferentes origens sociais e diferentes
habilidades, tudo isso sem agravar seus problemas de
saúde. Apesar da forte tendência em acreditar que
não, que ele não seria capaz, há um exemplo na história da pedagogia que nos faz questionar essas crenças: Célestin Freinet.
Célestin Baptistin Freinet (1896-1966) foi um
importante pedagogo, idealizador da Pedagogia Ativa, um método de ensino que revolucionou o modo
de pensar a relação ensino-aprendizagem, deixando
discípulos e inspirando a obra de muitos intelectuais
como Dewey, Anísio Teixeira e Paulo Freire. Freinet
era, também, o portador das desvantagens descritas
no início do texto: “deficiência respiratória, doença
nos pulmões, não consegue falar por mais que dez
minutos”, deficiências que se relacionam de modo
essencial com sua pedagogia, pois, segundo seus biógrafos, foi essa sua dificuldade que o levou a procurar
uma nova maneira de dar aulas.
Seu método defende a praticidade e a integração
de idéias no trabalho na sala de aula e a centralidade
do trabalho desenvolvido pelo aluno no processo de
construção de sua aprendizagem. São idéias que colocam o professor no papel de facilitador e buscam
valorizar a autonomia e a capacidade criativa dos
alunos, os quais deveriam, eles sim, ter “voz ativa”.
Tal era o valor que Freinet atribuía à ação e ao trabalho para a formação do aluno, que dizia ele: “quanto
menos falar, mais coisas você fará”, frase que também
dá a dimensão do papel que a voz ocupava na prática
desse pedagogo; um papel muito menos central do
que observamos na prática de grande parte dos professores, ainda hoje.
Freinet escreveu uma lista de trinta invariantes
pedagógicas, nas quais procurou resumir seus pensamentos. A de número vinte destaca-se para todos
que criam ser a docência algo a ser exercido por um
119
Gustavo Bruno Bicalho Gonçalves
“profissional da voz”, ao dizer: “fale o menos possível”. Esta invariante não apenas sintetiza uma idéia
pedagógica bem sucedida, como também vem ao encontro das expectativas de profissionais comprometidos com a saúde vocal do professor, preocupados
com o uso intenso e frequentemente nocivo que os
professores fazem de sua voz em sala de aula, e nos
coloca uma questão: Como organizar o trabalho pedagógico de modo que o professor não fale tanto?
Responder a esta pergunta de um modo satisfatório pode contribuir para melhorar a qualidade de
vida dos professores, que tanto têm sofrido por problemas de voz. Pode, ainda, significar tirá-lo do desconfortável lugar no qual vem sendo colocado, de um
“profissional da voz”, que deve aprender técnicas vocais e realizar práticas preventivas para a saúde vocal
(que ajudam, sim, mas frequentemente são paliativas
e insuficientes). Não se trata de substituir a prescrição
de exercícios vocais pela prescrição de práticas pedagógicas inspiradas na pedagogia ativa como meio de
prevenir os problemas de voz. Isso, igualmente, poderia contribuir para a culpabilização do professor
que não conseguisse implementar mudanças didáticas significativas em suas aulas. Trata-se de refletir
sobre o trabalho docente e propiciar meios para que
as práticas ativas de ensino possam se desenvolver,
para melhor proveito dos alunos e dos professores.
Referências
FREINET, Celestin. Pedagogia do bom senso. São Paulo: Martins Fontes, 1985.
GONÇALVES, Gustavo Bruno Bicalho. Uso profissional da voz em sala de aula e organização do trabalho
docente. 2003. Dissertação (Mestrado em Educação) Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte.
UNESCO. Condiciones de trabajo y salud docente:
estudios de casos en Argentina, Chile, Ecuador, México,
Perú y Uruguay. Santiago: Oficina Regional de Educación para América Latina y el Caribe, 2005.
120
Pedagogia em Ação, v. 1, n. 1, p. 1-141, jan./jun. 2009 - Semestral
Comunicações
O processo ensino-aprendizagem do aluno com síndrome de
Down na rede regular de ensino
Jaqueline Soares Fonseca *
Orient.: Sérgio de Freitas Oliveira **
Natália 1 possui síndrome de Down. Segundo
Fátima Alves (2007), em seu Livro “Para entender a
Síndrome de Down”, a síndrome de Down, também
conhecida como Mongolismo ou Trissomia do 21,
genericamente doença localizada no cérebro, encefalopatia, não é progressiva, possui tendências para melhoras espontâneas, pois seu Sistema Nervoso Central (SNC) continua a amadurecer com o tempo.
Estimular é fundamental, por isso a família deve
contribuir muito desde o nascimento da criança. A
grande importância da estimulação se dá pela necessidade da criança de vivenciar experiências que permitam seu desenvolvimento, respeitando sua deficiência e explorando suas habilidades. Natália, desde
que nasceu, tem todo o carinho da família, que sabia
das dificuldades que a criança ia enfrentar, por isso
sempre buscaram informações sobre a síndrome. O
tempo todo que está em casa a criança é estimulada
com livros, jogos e orientada na realização de atividades por todos da família, passo importantíssimo
para que a criança se desenvolvesse.
Silva (2002) enfoca os aspectos pedagógicos a
serem desenvolvidos com o aluno com síndrome de
Down, quando diz que frequentar a escola regular
permitirá à criança especial adquirir, progressivamente, conhecimentos cada vez mais complexos que
serão exigidos da sociedade e cujas bases são indispensáveis para a formação de qualquer indivíduo.
Vale ressaltar que a Declaração de Salamanca
(UNESCO, 1994) garante o direito que todos os sujeitos com deficiência têm perante o ensino escolar.
É destacado que aqueles com necessidades educacionais especiais devem ter acesso à escola regular, que
deveria acomodá-los dentro de uma pedagogia centrada na criança, capaz de satisfazer a tais necessidades, contribuindo assim para uma sociedade mais
inclusiva e alcançando uma educação para todos.
Hoje com 8 anos, Natália frequenta a rede regular de ensino, em uma Escola Municipal de Contagem, além de ter atendimento especializado em uma
escola especial em outro turno para facilitar seu desenvolvimento. Natália está matriculada no 3º ano
do1º ciclo e possui acompanhamento de estagiário
para ajudar no desenvolvimento das atividades que
algumas vezes são diferenciadas ou adaptadas, pois a
aluna ainda está em processo de alfabetização, visto
que a maioria da turma já é alfabetizada. A aluna tem
ótima relação com professores, colegas e demais funcionários. Natália é muito sorridente, comunicativa e
tem boa memória.
A aprendizagem da pessoa com síndrome de
Down ocorre num ritmo mais lento. A criança demora mais tempo para ler, escrever e fazer contas.
No entanto, a maioria das pessoas com essa síndrome tem condições de ser alfabetizada e realizar operações lógico-matemáticas.
A aprendizagem tem sempre que partir do concreto, pois o aluno com síndrome de Down tem dificuldade de abstração. Os profissionais ligados à Natália na escola utilizaram materiais concretos, jogos,
atividades lúdicas para facilitar o processo ensinoaprendizagem da aluna.
Em matemática, a aluna apresenta grande dificuldade. É necessário proporcionar uma atividade
lúdica que deve ser acompanhada e dirigida, pois a
aluna tem muita dificuldade de assimilar quantidade
com o numeral. Noções de tamanho (grande e pequeno), peso e altura (alto e baixo) são assimilados
por ela.
O aprendizado não pode ser isolado, tem que
acompanhar a vida prática, tem que ser inserido num
contexto real em que o aluno possa perceber o seu
significado concreto.
Contudo, não podemos esquecer que todo o processo é normal, são muito inteligentes e esforçados e
1. Nome fictício, para preservar a identidade da aluna.
*
Graduanda em Pedagogia com Ênfase em Necessidades Educacionais Especiais pela PUC Minas.
**
Licenciado em Letras e em Pedagogia. Professor Adjunto da PUC Minas. E-mail: [email protected]
Pedagogia em Ação, v. 1, n. 1, p. 1-141, jan./jun. 2009 - Semestral
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Jaqueline Soares Fonseca
a lentidão para a realização das atividades é normal,
pois cada aluno possui um ritmo. É dever do educador respeitar as limitações e facilitar o ensino de
maneira que o aluno possa se desenvolver de forma
satisfatória; todos têm capacidade de aprender.
A inclusão está caminhando e, assim como na
escola da Natália, é necessário que os profissionais
busquem informações sobre seus alunos com necessidades especiais e promovam pequenas ações para
beneficiá-los, garantindo assim uma escola para
todos.
Referências
ALVES, Fátima. Para entender a Síndrome de Down.
Rio de Janeiro. Wak, 2007.
SILVA, Roberta Nascimento Antunes. A educação especial da criança com Síndrome de Down. In: BELLO, José
Luiz de Paiva. Pedagogia em foco. Rio de Janeiro, 2002.
Disponível em: < http://www.pedagogiaemfoco.pro.br/
spdslx07.htm>. Acesso em: 09/05/2009.
UNESCO. Declaração de Salamanca e Linha de Ação
Sobre Necessidades Educativas Especiais. Trad. Edílson Alkmim Cunha. Brasília: CORDE, 1994.
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Pedagogia em Ação, v. 1, n. 1, p. 1-141, jan./jun. 2009 - Semestral
Comunicações
Escrita de sinais: uma nova trajetória para pessoas surdas
Neusa Donata de Souza Nascimento *
Orient.: Sérgio de Freitas Oliveira * *
A sociedade, em geral, utiliza o canal oral-auditivo como principal veículo de comunicação, enquanto as pessoas surdas, que representam uma minoria nessa mesma sociedade, utilizam-se do canal
visual-espacial. Isto porque os ouvintes aprenderam
a se comunicar oralmente, utilizando a língua oral de
seus pais, enquanto os surdos aprenderam a utilizar a
língua de sinais, também natural dos seus pais, sendo crianças surdas filhas de pais surdos. No caso de
crianças surdas filhas de pais ouvintes, a situação se
torna mais grave, porque a comunicação entre ambos
é fraca, devido à incompatibilidade linguística.
Quando as crianças chegam à idade de frequentar as salas de aula, surge o problema: Onde matricular o filho? Escolas inclusivas ou de educação especial? Anos mais tarde, percebe-se que essa pessoa
surda pouco sabe da língua portuguesa e sua representação ortográfica apresenta falhas de estruturação
e erros evidentes.
Em contato com alunos de uma escola da rede
municipal de Belo Horizonte, apresentamos o projeto de Escrita de Sinais para alunos surdos. Nessa escola, identificamos vários alunos que possuíam
necessidades específicas, dentre eles o que mais me
chamou a atenção foi o Rafael .
Rafael tem nove anos e é surdo, possui problemas
de coordenação motora fina e se desenvolve com certo atraso em relação aos demais alunos de sua idade.
É um menino de pouca comunicação e com grandes
dificuldades na língua de sinais. Rafael necessitava
de um acompanhamento específico, o que antes não
havia sido notado.
Identificar palavras da Língua Portuguesa sempre
foi desafio para nós, pessoas surdas. Com a chegada da
escrita de sinais em 1997, alguns passos foram dados,
mas há muito que se fazer. Problemas no desenvolvimento educativo de crianças surdas são comuns a todos.
*
O processo de ensino-aprendizagem do aluno
surdo necessita de maior abrangência e da adaptação
da Língua Portuguesa para LIBRAS (Língua Brasileira de Sinais) e vice-versa. O ensino de palavras em
si não facilita sua compreensão, mas o contexto delas
em situações do dia a dia facilita seu conhecimento.
Rafael, aos poucos, conhecia o que suas mãos poderiam falar, e falar melhor. Foi assim que ele pôde perceber que, apesar de ser o único a conversar daquela
maneira em sua casa, ele era capaz de tudo também,
assim como seus pais.
A escrita de sinais despertou em crianças como
o Rafael o poder de transcrever através das mãos o
que se forma em seu intelecto e em seu imaginário,
transportando-os para o papel. Olhares de fascínio
ao perceber que as configurações de mãos são como
letras e as expressões faciais, as sílabas!
Esses são os motivos da importância da escrita
de sinais para o registro da cultura surda. Os surdos,
com certeza, teriam mais motivação e criatividade
para registrar sua cultura e história, sem se preocupar
com o registro em outras línguas, pois isso poderá ser
feito por tradutores, para outras línguas.
Segundo Quadros,
A escrita da língua de sinais capta as relações que a
criança estabelece com a língua de sinais. Se as crianças (surdas) tivessem acesso a essa forma de escrita para
construir suas hipóteses a respeito da escrita, a alfabetização seria uma consequência do processo. A partir
disso, poder-se-ia garantir o letramento do aluno ao
longo do processo educacional. (QUADROS, 2003).
Referência
QUADROS, Ronice Müller de. Educação de surdos: a
aquisição da linguagem. Porto Alegre: Artes Médicas,
2003.
Graduanda em Pedagogia com Ênfase em Necessidades Educacionais Especiais pela PUC Minas. E-mail: neusinhapedagogia@
yahoo.com.br
**
Licenciado em Letras e em Pedagogia. Professor Adjunto da PUC Minas. E-mail: [email protected]
Pedagogia em Ação, v. 1, n. 1, p. 1-141, jan./jun. 2009 - Semestral
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Comunicações
A força da pedagogia tradicional: uma explicação
Sérgio de Freitas Oliveira *
Numa perspectiva histórica da educação e da didática no Brasil, podemos identificar, nos nossos 460
anos de história, três momentos: de 1549 a 1974; de
1974 a 1984; e de 1985 até hoje.
O primeiro, eu denominaria de passado; o segundo, de transição; e o terceiro, de atualidade.
O primeiro momento, que durou 425 anos, representa 92,5% de nossa história. Nesse período, temos o que chamamos, genericamente, de Pedagogia
Tradicional, em que o plano de instrução se baseia na
Ratio Studiorum 1. Esse é o paradigma.
O ensino tem uma visão humanista de cultura
geral, é enciclopédico e alheio à realidade da vida e ao
contexto social. A didática tem caráter formal, com
base no intelecto e no conhecimento. A metodologia
de ensino é um conjunto de regras e normas prescritivas que visam à orientação do ensino e do estudo.
Nesse modelo, o ensino está centrado no professor, que transmite a todos os alunos, indistintamente, a verdade universal e enciclopédica. O professor
é o centro do processo e o aluno é receptivo, passivo.
A disciplina é forma de garantir atenção, silêncio e
ordem.
Nesse período, tivemos alguns movimentos, mas,
na essência, a linha predominante se manteve. A escola não considera a realidade brasileira, seus aspectos político, econômico e social.
No final desse período, após 1964, em face do
projeto desenvolvimentista, cujo objetivo era a aceleração do crescimento socioeconômico do país,
mantendo a mesma linha da Pedagogia Tradicional,
a escola passa a se ocupar com a preparação de recursos humanos necessários à incrementação desse
crescimento.
A Pedagogia se inspira nos princípios de racionalidade, eficiência e produtividade. É a lógica fabril.
A ênfase se dá no planejamento didático formal, nos
materiais instrucionais. A didática visa ao produto.
Esses 10 anos, de 1964 a 1974, começam a movimentar o pensamento.
Nos 10 anos subsequentes, de 1974 até o fim do
regime militar, 1984, vivemos o segundo momento, a transição. Esse período representa 2% da nossa
história. É o início da crítica da educação dominante com as “teorias crítico-reprodutivistas”. Podemos
afirmar que aqui está o divisor de águas entre o passado e o presente.
O movimento crítico-reprodutivista é o ponto
de partida para a superação da didática supostamente neutra e a busca de uma didática mais condizente
com o momento atual da formação do professor.
O terceiro momento, os 5,5% restantes da nossa
história, se situa a partir de 1985, com a Nova República, até os nossos dias.
O marco inicial foi o I Congresso Brasileiro de
Educação, cuja tônica foi a discussão e a disseminação da concepção crítica de educação. É o surgimento da Pedagogia Crítica, interessada no homem concreto, inserido num contexto histórico.
A educação, aqui, não está centrada no professor
ou no aluno, mas na questão da formação do homem
e sua realização na sociedade. A escola passa a ser o
espaço de negação da dominação e não reprodutora
da estrutura social vigente.
A didática ultrapassa métodos e técnicas, procurando associar escola-sociedade, teoria-prática, conteúdo-forma, técnica-política, ensino-pesquisa, ensino-avaliação, professor-aluno.
Há uma mudança no modo de pensar e de agir do
professor. Despontam o professor crítico e a didática
crítica, contextualizada e socialmente comprometida.
A didática crítica enfatiza quatro pressupostos:
1.a educação como prática social, processo construtivo e
permanente de emancipação humana;
1. Rigoroso método de ensino elaborado pelos jesuítas no final
do século XVI.
*
Licenciado em Letras e em Pedagogia. Professor Adjunto da PUC Minas. E-mail: [email protected]
Pedagogia em Ação, v. 1, n. 1, p. 1-141, jan./jun. 2009 - Semestral
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Sérgio de Freitas Oliveira
2.a democratização da escola pública, com ensino de melhor qualidade para as classes populares;
3.o professor como agente social, com a missão de desvelar os pressupostos presentes nos processos de modernização;
4.a metodologia de pesquisa, propiciando a apropriação
ativa do conhecimento e o desenvolvimento das habilidades de investigação.
A Pedagogia Crítica pressupõe uma visão contextualizada e multidimensional do processo pedagógico, uma leitura plural do objeto, mediante diferentes pontos de vista. O ensino é prática social
concreta, o que implica uma mudança na relação
professor- aluno-conhecimento.
A grosso modo, identificamos esses três momentos que marcaram, significativamente, a mudança da
concepção da didática no Brasil e a sua contribuição
no processo educacional da atualidade.
No entanto, a rigor, não podemos dizer que eles
se sucederam e se substituíram. Quatrocentos e vinte
e cinco anos, 92,5% de história, não se apagam facilmente. Apesar das discussões, das pesquisas, das
experiências, das iniciativas que propõem rupturas
mais radicais com o passado, a Pedagogia Tradicional ainda está muito presente na educação hoje.
Estamos impregnados por aquele modo de pensar e fazer a educação. Essa concepção está arraigada.
Muitas vezes, o que fazemos é apenas dar uma roupagem nova, moderna, às velhas ideias e aos velhos
modelos.
Mudar o modo de pensar e de fazer educação,
desvencilharmo-nos das amarras do passado, das velhas concepções e dos velhos paradigmas, demandará
ainda um enorme esforço.
É uma questão de mudança de mentalidade, e
isso não se faz da noite para o dia. Afinal, 425 anos é
praticamente toda a nossa história. E o ser humano
é, por natureza, conservador e resistente a mudanças.
Quer mudar, gostaria de mudar, sente que é preciso
mudar, mas é temeroso. Teme arriscar. Teme o novo.
Em educação, o tempo é importante. Os resultados só aparecem no longo prazo. É preciso acreditar
e fazer. O tempo mostrará o resultado!
126
Referências
CANDAU, Vera Maria. A didática em questão. 14. ed.
Petrópolis: Vozes, 1997.
CANDAU, Vera Maria et al. Magistério: construção cotidiana. 4. ed. Petrópolis: Vozes, 2001.
SAVIANI, Dermeval et al. Desenvolvimento e educação
na América Latina. 3. ed. São Paulo: Cortez: Autores Associados, 1985.
SAVIANI, Dermeval. Escola e democracia: teorias da
educação, curvatura da vara, onze teses sobre educação e
política. 12. ed. São Paulo: Cortez : Autores Associados,
1986.
VEIGA, Ilma Passos Alencastro. Didática: uma retrospectiva histórica. In: LOPES, Antônia Osima et al. Repensando a Didática. 23. ed. Campinas: Papirus, 2006.
Pedagogia em Ação, v. 1, n. 1, p. 1-141, jan./jun. 2009 - Semestral
Comunicações
Escola e tecnologia: uma aliança necessária
Sérgio de Freitas Oliveira *
O grande desafio da escola, hoje, é exatamente este: como ajustar uma instituição multissecular, consolidada, aos avanços e às novidades que
a ciência moderna, numa sociedade globalizada,
disponibiliza?
A instituição escolar, historicamente, sempre se
utilizou das tecnologias no desenvolvimento do seu
currículo. As tecnologias tiveram espaço na escola –
e sempre foram bem-vindas – trouxeram vida e alento para o trabalho pedagógico.
Se fizermos uma retrospectiva, poderemos ver
que os avanços da ciência se fizeram presentes na
vida escolar e foram ferramentas que contribuíram,
enormemente, para o trabalho do professor e a construção do conhecimento dos alunos.
A título de exemplo, destacamos o telescópio, o
microscópio, o rádio, o slide e o projetor de slides, o
retroprojetor, o episcópio (que projeta imagens opacas, como páginas de livros e figuras), o gravador de
som (indispensável nas aulas de língua estrangeira)
e os materiais instrucionais que foram produzidos
para facilitar o trabalho escolar.
O acesso a esses recursos, às vezes, era difícil
e dispendioso e contava com muitas resistências.
Como hoje!
Então, o que temos de diferente?
Vivemos em um mundo mais veloz. Com o
avanço da ciência e da tecnologia, numa sociedade
globalizada, parece que não existe hoje, apenas ontem e amanhã. O tempo passa tão rápido que nem
percebemos o agora. O novo fica velho depressa, a
novidade logo fica ultrapassada, o longe ficou perto,
é logo ali, na distância de um simples toque.
E a escola, como fica? A escola não acompanha
esse ritmo. É atropelada por ele. A escola é o espaço da reflexão, da sedimentação, da construção. E a
construção não é instantânea, é processual, e o processo é lento e gradual.
*
É aqui que entra a questão. Como sincronizar
os ritmos, o da escola e o da vida? A escola não pode
parar no tempo – nem o tempo – nem impedir que
a ciência avance. E os avanços da ciência não podem, simplesmente, ignorar a escola, até porque esses avanços passam também pela escola.
O desafio, então, se coloca no repensar a escola e os
seus currículos, integrando neles as novas tecnologias.
Precisamos definir novos paradigmas, coerentes com
as demandas da nova sociedade e do novo homem.
O currículo, nesse novo modelo, não é algo cristalizado e estanque. É dinâmico, dialógico e transformativo. É um currículo que vislumbra um novo
perfil de homem e de sociedade, redefinindo a função social da escola. Não é um currículo previamente estabelecido, mas um currículo em construção,
visando ao aluno real, seu alvo, o ser em formação,
como concretização do Projeto Político Pedagógico,
que expressa a identidade da escola e o seu compromisso com a sociedade em que se insere.
Portanto, um novo currículo e uma nova escola, sintonizada com o seu tempo, um tempo que dá
ênfase ao desenvolvimento das competências, numa
sociedade em que se reconhecem as diferenças, mas
se luta contra a exclusão, em que se valoriza a competitividade, mas não se abre mão da solidariedade.
A escola e o currículo não têm mais a mera função de transmissão do conhecimento e do saber acumulado – eles estão à nossa disposição, a qualquer
momento, basta clicar. Precisamos de mais, precisamos de alguém que saiba o que fazer com esse conhecimento, que crie, que ouse, que se arrisque, que
invista no desconhecido, que pesquise.
Para isso, as novas tecnologias precisam entrar
mais nas escolas, para ajudar na construção e na execução dos novos currículos.
Há, como sempre houve, resistências. Hoje, cada
vez menos e menores. A tecnologia, cada vez mais,
Licenciado em Letras e em Pedagogia. Professor Adjunto da PUC Minas. E-mail: [email protected]
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Sérgio de Freitas Oliveira
vai se incorporando à nossa vida, a ponto de não haver alternativa, nem volta. Todos os processos da vida
moderna pressupõem tecnologia sofisticada, acessível e de fácil uso. Até os mais velhos e os mais resistentes se veem, inevitavelmente, diante das novas
tecnologias: um telefone celular, o caixa eletrônico, o
cartão de crédito, a consulta à página da Receita Federal, da Previdência ou do Departamento de Trânsito, o controle remoto, os aparelhos eletrônicos e os
seus comandos, etc.
Cada vez mais se desfaz o mito do difícil, do não
dou conta, da coisa do outro mundo, do não tem um
jeito mais fácil, do antigamente era melhor. As pessoas vão se adaptando, naturalmente, ao novo jeito
de ser e de viver no mundo. Vão incorporando as tecnologias como inerentes ao próprio viver.
E a escola não pode fugir disso, desse mesmo
processo. As novas tecnologias vão se incorporando ao dia a dia da escola, inevitavelmente. Primeiro,
porque quem frequenta a escola vive neste mundo,
cercado de tecnologia por todos os lados e usufruindo das facilidades que ela proporciona. Em segundo
lugar, porque a escola está neste mundo e preparando pessoas para viverem e se inserirem neste mesmo
mundo. Assim, não cabe pensarmos em dois mundos. A escola está neste mundo e deve estar sintonizada com ele, contribuindo para a qualidade de vida
do homem no planeta, em todos os aspectos.
Os recursos tecnológicos devem estar disponíveis e marcar presença ativa na escola dos nossos dias,
contribuindo, efetivamente, para que os pilares da
educação para o século XXI (DELORS, 2000) não
sejam apenas frases de efeito de um discurso vazio.
O novo homem que idealizamos e queremos
precisa aprender a conhecer, a conviver, a fazer e a
ser. Nisso consiste o seu desenvolvimento como pessoa integral.
As tecnologias, no entanto, não fazem isso sozinhas, mas podem contribuir enormemente como
ferramentas utilizadas com competência e propriedade no processo ensino-aprendizagem.
Outrora, havia os que sabiam e ensinavam, e os que
não sabiam e deviam aprender. Hoje, vivemos numa
sociedade aprendente. Apesar de todos saberem muitas coisas, todos precisamos aprender – e muito. E estamos sempre aprendendo e descobrindo coisas novas,
novas formas de fazer e de melhorar a vida no mundo.
Em decorrência disso, a escola não pode prescin-
128
dir da incorporação das novas tecnologias à sua práxis. A escola e a educação não podem ignorar a necessidade de um diálogo permanente com o homem
e a sociedade na qual ele se insere, buscando uma
perfeita sincronia, no sentido etimológico do termo ,
ou seja, um ajustamento perfeito ao tempo, à época,
enfim, ao momento histórico.
É preciso, no entanto, ter em mente que a incorporação das novas tecnologias ao cotidiano escolar, ao
fazer pedagógico, não se dará a não ser por um processo político de gestão, que envolve sensibilização,
convencimento e investimento. Elas devem entrar
pela porta da frente, não podem cair de paraquedas
ou entrar pela porta dos fundos na calada da noite.
É imprescindível um movimento de sensibilização dos docentes para a importância, as vantagens e os
ganhos de qualidade que essa aliança poderá proporcionar. Vencida essa etapa, passamos ao segundo estágio: a capacitação dos profissionais para lidar com a
tecnologia, com competência, explorando todo o seu
potencial. Só então caberá o investimento e as portas
poderão se abrir, que ela será muito bem recebida.
É uma via de mão dupla. Se se adotar a via de
mão única, em que o gestor simplesmente investe
uma grande soma de recursos e traz para dentro da
instituição toda a tecnologia disponível, a mais sofisticada, a “última palavra”, inevitavelmente, toda essa
tecnologia ou será subutilizada ou, o que é mais provável, se tornará obsoleta sem ter sido ao menos desembalada, como já vimos em inúmeras denúncias
feitas a escolas, hospitais e órgãos públicos, que jogaram milhares de reais e dólares pelo ralo, transformando em sucata ferramentas que poderiam
contribuir para um salto de qualidade nos serviços
prestados à sociedade.
Referências
DELORS, Jacques et al. Educação: um tesouro a descobrir. 8. ed. São Paulo: Cortez, 2000.
MARINHO, Simão Pedro P. Novas tecnologias e velhos
currículos: já é hora de sincronizar. Revista E-Curriculum, São Paulo, v. 2, n. 3, dez. 2006. Disponível em <http://
www.pucsp.br/ecurriculum/artigos_v_2_n_1_dez_2006/
novas tecnologias-velhos curriculos_V2_.pdf>. Acessado
em 20 jun. 2009.
Pedagogia em Ação, v. 1, n. 1, p. 1-141, jan./jun. 2009 - Semestral
Comunicações
A Educação Especial e a Inclusão Social
Soraya Fátima dos Santos *
Orient.: Sérgio de Freitas Oliveira * *
Os alunos com necessidades educacionais especiais vêm conquistando, aos poucos, seu espaço dentro das escolas, sendo hoje constatado um amplo
empreendimento no ensino, projetando-se as escolas
para oferecer oportunidades para os alunos aprenderem e desenvolverem, naturalmente, habilidades
que são importantes para torná-los independentes,
competentes, produtivos e felizes em diversas áreas
da vida humana.
O presente artigo tem como objetivo contribuir
para que as pessoas possam se informar sobre as várias formas que devem ser acionadas, para que ocorra
a verdadeira inclusão nas escolas em geral.
As pessoas que apresentam necessidades especiais são a minoria da população brasileira e, em sua
maioria, possuem uma triste e vasta experiência de
exclusão, que se traduz em grandes limitações nas
possibilidades de convívio social e na utilização de
equipamentos, além de serem submetidos a vários tipos de discriminação.
Anteriormente, pessoas com deficiência eram
tratadas como doentes, hoje se têm estudado formas
e buscado soluções para seus problemas, no que diz
respeito à inclusão e à educação especial. Com o surgimento de algumas escolas especiais e de centros
de reabilitação, a sociedade começou a admitir que
pessoas com deficiência poderiam ser úteis se recebessem tratamentos adequados. Então, a questão da
deficiência saiu do âmbito da saúde para o âmbito da
educação, pois ser deficiente não é ser doente.
A prática da inclusão social paralela à educação especial se baseia em princípios diferentes dos
convencionais: a aceitação das diferenças individuais, valorizando cada pessoa e sua convivência dentro
da diversidade humana, em meio à cooperação e à
solidariedade. Incluir, nesse sentido, significa, então,
modificar a sociedade como fator importante para a
pessoa com necessidades especiais buscar seu desenvolvimento e exercer sua cidadania.
A escola que inclui todos os alunos, reconhecendo suas diferenças, promove a aprendizagem e
atende às necessidades de cada um. Com todo esse
movimento em prol dos alunos com necessidades
educacionais especiais, há uma nova maneira de ver
essas pessoas, pois estamos diante de um quadro
que exige adaptações e até mesmo uma reformulação de valores e currículos. A educação especial já
está acontecendo nas escolas; contudo, é preciso promover essa inclusão com consciência e com a devida
preparação, caso contrário, poderemos desencadear
um processo que acabaria por excluir esses alunos
dentro da própria escola.
A transformação mais difícil é a da mentalidade
de docentes e pais de alunos, que acreditam que as
escolas especiais são a solução educativa ideal para
pessoas com deficiências. Às vezes, alguns pais, temendo certo cuidado excessivo, matriculam seus filhos com necessidades especiais em escolas regulares
inclusivas e sofrem, antecipadamente, com uma discriminação que, muitas vezes, nem chega a ocorrer.
Os docentes, por sua vez, não se preocupam em se
aperfeiçoar e se capacitar, alegando que, uma vez formados para lidar com crianças “normais”, não precisam se preocupar com a questão da inclusão, e têm às
vezes, até por comodidade, certo desânimo em olhar
para a educação especial de forma positiva.
Não importam quais dificuldades ou diferenças possam ter. As escolas inclusivas precisam reconhecer e responder às necessidades diversificadas de
seus alunos, acomodando diferentes estilos e ritmos
de aprendizagem, assegurando uma educação com
qualidade para todos mediante currículos apropriados, mudanças organizacionais, estratégias de ensino
*
Graduanda em Pedagogia com Ênfase em Necessidades Educacionais Especiais pela PUC Minas.
E-mail: [email protected]
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Soraya Fátima dos Santos
e até mesmo o uso de recursos especiais como forma
de comunicação suplementar ou alternativa.
O plano curricular das escolas deveria ser adequado de forma a atender aos diferentes interesses
e capacidades de seus alunos. Aos que têm necessidades educacionais especiais deveriam ser oferecidas diferentes formas de apoio, desde uma ajuda
mínima em classe comum, até programas adicionais
de suporte à aprendizagem, bem como a atenção de
professores especialistas e de uma equipe externa de
apoio, como fonoaudiólogos, psicólogos, fisioterapeutas etc.
A professora, com o apoio da coordenação da escola, poderia criar soluções e estratégias, a partir do
reconhecimento particular e individual de cada aluno, dentro de uma perspectiva de desenvolvimento
das potencialidades, respeitando seus desejos e valorizando suas habilidades dentro de suas possibilidades, desde uma adaptação que possibilite a acessibilidade ao computador até as atividades da vida diária,
como mobilidade e acesso a vários lugares, pois de
nada adianta admitir, por exemplo, um aluno deficiente visual numa escola, sem que haja um professor/monitor com habilidade para ensinar em Braille,
que tenha disponibilidade de ledores, ou um aluno
cadeirante em uma escola onde todos os acessos são
feitos por escadas e não há uma rampa sequer dentro dela.
Na educação especial, não devemos esperar que
a criança com necessidades educacionais especiais se
adapte à escola, mas que esta se transforme de maneira a possibilitar, de fato, a inclusão da criança.
Precisamos focalizar o desenvolvimento das pessoas
com necessidades especiais, a partir dos pressupostos
gerais que orientam a sua concepção de desenvolvimento com as pessoas consideradas normais.
A escola que inclui pessoas, sem discriminação, e
reconhece suas diferenças promove a aprendizagem,
atendendo às necessidades individuais que venham a
surgir. Com todo esse movimento em prol dos indivíduos com necessidades educacionais especiais, surge uma nova vertente para interpretar essas pessoas,
pois estamos diante de um quadro que exige adaptações e até mesmo reformulações dos valores sociais.
Devemos valorizar as habilidades de cada aluno e nos concentrar nelas, porque é a partir daí que
ele dará início ao seu desenvolvimento, podendo ser
percebida, então, a sua capacidade real.
130
Referências
GUIMARÃES, Arthur. Inclusão que funciona: Os caminhos para transformar a escola e passar a atender todos
os alunos. São Paulo: Abril. 2003.
WISE, Liz; GLASS, Chris. Trabalhando com Hannah:
uma criança especial em escola comum. Porto Alegre:
Artmed, 2003.
Pedagogia em Ação, v. 1, n. 1, p. 1-141, jan./jun. 2009 - Semestral
Resumos de Monografias / TCC
Resumos de Monografias / TCC
CUNHA, Adriana Santos; GUEDES, Ana Karina Vieira; FERNANDES, Cíntia Maria Roque; SOUSA, Elaine
Fernandes de; PINHEIRO, Elizângela Chagas. A influência do pedagogo na elaboração qualitativa de softwares educativos: um estudo comparativo da participação desse profissional na elaboração de programas. 2008. 60f.
Monografia (conclusão de curso) – Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, Departamento de Educação
– Pedagogia, Belo Horizonte.
A influência do pedagogo na elaboração qualitativa de softwares educativos: um estudo comparativo da participação desse profissional na
elaboração de programas
CUNHA, Adriana Santos; GUEDES, Ana Karina Vieira; FERNANDES, Cíntia Maria Roque; SOUSA, Elaine Fernandes de; PINHEIRO, Elizângela Chagas
Resumo
A presente pesquisa aborda “A influência do pedagogo na elaboração qualitativa de softwares educativos: um
estudo comparativo da participação desse profissional na elaboração de programas.” Este estudo teve como
objetivos definir a área de produção de Softwares Educativos como um campo de atuação do pedagogo,
identificar as funções desse profissional na construção de Softwares Educativos e, por fim, verificar a qualidade de Softwares Educativos, enfatizando a importância ou não da participação desse profissional na construção dos mesmos. Centrou-se em uma avaliação qualitativa dos softwares produzidos por duas empresas
distintas, Empresa V e Empresa T. Foram aplicados questionários direcionados ao pedagogo e ao técnico das
respectivas empresas, bem como foi realizada uma avaliação qualitativa e quantitativa desses softwares através de um “Roteiro de Avaliação do Software”, sugerido por Oliveira, Costa e Moreira (2001). Esta pesquisa
desdobrou-se em três capítulos e uma consideração final, apresentando a importância da atuação do pedagogo e os resultados obtidos pela avaliação dos softwares das empresas citadas.
Palavras-Chave: Software Educativo; Avaliação Qualitativa; Pedagogo e Empresa.
Graduandas do Curso de Pedagogia PUC Minas.
Orient.: Nilza Bernardes Santiago. Mestre em Educação pela PUC Minas. E-mail: [email protected]
Pedagogia em Ação, v. 1, n. 1, p. 1-141, jan./jun. 2009 - Semestral
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Resumos de Monografias / TCC
SILVA, Adriane Vieira da; ANTÔNIO, Andréia Aparecida; JESUS, Marilu Ferreira de; BARBOSA, Patricía Maria;
REZENDE, Sandra Maria Fontes. A contribuição ludo-pedagógica no processo de aprendizagem no universo da
educação infantil. 2007. 46f. Monografia (conclusão de curso) – Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais,
Departamento de Educação – Pedagogia, Belo Horizonte.
A contribuição ludo-pedagógica no processo de aprendizagem no universo da educação infantil
SILVA, Adriane Vieira da; ANTÔNIO, Andréia Aparecida; JESUS, Marilu Ferreira de; BARBOSA, Patricía Maria; REZENDE, Sandra Maria
Fontes
Resumo
Nosso objetivo nesta pesquisa foi evidenciar como vem sendo abordado a prática do ludo-pedagógico na
educação infantil, em especial com crianças de 3 a 5 anos. Priorizamos este estudo/reflexão em uma instituição educacional da rede municipal de Belo Horizonte.
Nesse contexto, convidamos os profissionais da educação infantil e quem se interessasse pelo objeto de pesquisa apresentado a refletirem conosco sobre essa questão, tendo como eixos: a singularidade da criança nas
suas formas próprias de ser e de se relacionar com o mundo; a função humanizadora do brincar e o papel do
diálogo entre adultos e crianças; e a compreensão de que a escola não se constitui apenas de alunos e professores, mas de sujeitos plenos, crianças e adultos, autores de seus processos de constituição de conhecimentos,
culturas e subjetividades.
A pesquisa traz a avaliação das questões que permeiam o brincar, buscando ter a compreensão a respeito da
formação da criança através da brincadeira.
Palavras-chave: Aprendizagem; Crianças; Ludo-pedagógico; Lúdico. Brincadeiras; Jogos.
Graduandas do Curso de Pedagogia com Ênfase em Ensino Religioso da PUC Minas.
Orient.: José Leão Marinho Falcão Filho. Mestre em Educação. Professor da PUC Minas. E-mail: [email protected]
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Pedagogia em Ação, v. 1, n. 1, p. 1-141, jan./jun. 2009 - Semestral
Resumos de Monografias / TCC
LOPES, Ana Lúcia de Souza; GOMES CÓ, Ivone; COSTA, Luciana Tereza Silva. Escolas-Referência: proposta
mineira de educação na pauta das políticas públicas educacionais vigentes. 2008. 60f. Monografia (conclusão de curso)
– Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, Departamento de Educação – Pedagogia, Belo Horizonte.
Escolas-Referência: proposta mineira de educação na pauta das políticas públicas educacionais vigentes.
LOPES, Ana Lúcia de Souza; GOMES CÓ, Ivone; COSTA, Luciana Tereza Silva
Resumo
Esta pesquisa é uma versão adaptada de um estudo analítico que contempla as dimensões política, social,
econômica e cultural da atual proposta mineira de educação implantada na rede estadual de ensino. Acreditamos na potencialidade da sua difusão entre os educadores e demais interessados no assunto, a fim de contribuir no âmbito das inovações do Sistema Educacional e colaborar com a pesquisa acadêmica do setor.
Apresentamos uma abordagem científica ousada em seu aspecto qualitativo, sobre os pontos relevantes do
tema sugerido, em busca do diagnóstico das condições de operacionalização do projeto no contexto escolar,
frente aos imperativos do mundo moderno que se orientam pela lógica gerencial do mercado, direcionada ao
controle de qualidade do ensino público brasileiro.
Palavras-chave: Educação. Escola; Ensino público; Qualidade; Políticas públicas.
Graduandas do curso de Pedagogia PUC Minas.
Orient.: Vera Lúcia Lins Sant’Anna. Doutora em Ciências da Religião. Mestre em Educação. Professora e pesquisadora da PUC
Minas. E-mail: [email protected]
Pedagogia em Ação, v. 1, n. 1, p. 1-141, jan./jun. 2009 - Semestral
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Resumos de Monografias / TCC
ALCÂNTARA, Bárbara Regina Rodrigues de; SANTOS, Cátia Regina Ferreira dos; SOARES, Íris Nazaré Nogueira; ROCHA, Letícia Aparecida; SILVA, Renata Soares Reis da; AGUIAR, Selma Ferreira. Educar para preservar:
A educação ambiental no cotidiano escolar como possibilidade propulsora de uma geração ecológica. 2007. 60f. Monografia (conclusão de curso) – Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, Departamento de Educação – Pedagogia, Belo Horizonte.
Educar para preservar: A educação ambiental no cotidiano escolar como possibilidade propulsora de uma geração ecológica
ALCÂNTARA, Bárbara Regina Rodrigues de; SANTOS, Cátia Regina Ferreira dos; SOARES, Íris Nazaré Nogueira; ROCHA, Letícia Aparecida; SILVA, Renata Soares Reis da; AGUIAR, Selma Ferreira
Resumo
Este trabalho inicia-se com uma caracterização sócio-histórica da Educação Ambiental, que vai desde os
nossos ancestrais até os dias atuais. Em seguida, propõe uma abordagem sobre a Educação Ambiental como
saber específico, visando à conscientização capaz de promover uma maior sensibilização, focando a sustentabilidade na comunidade escolar, a partir dos elementos do processo ensino-aprendizagem.
O trabalho apresenta um estudo de casos sobre a questão ambiental em duas escolas da Região Metropolitana de Belo Horizonte, que levantam questões no âmbito da realidade escolar.
O trabalho objetiva um processo educativo que favoreça a formação e o desenvolvimento de futuras gerações
ecológicas, capazes de atuar em seu tempo vigente, proporcionando um futuro sustentável.
Palavras chave: Educação Ambiental; Saber específico; Sustentabilidade; Geração ecológica.
Graduandas do Curso de Pedagogia com Ênfase em Ensino Religioso da PUC Minas.
Orient.: Vera Lúcia Lins Sant’Anna. Doutora em Ciências da Religião. Mestre em Educação. Professora e pesquisadora da PUC
Minas. E-mail: [email protected]
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Pedagogia em Ação, v. 1, n. 1, p. 1-141, jan./jun. 2009 - Semestral
Resumos de Monografias / TCC
SOUZA, Deise Keli de; ALEME, Elisabeth Efigênia Duarte Severino; CURTY, Lucimar; GUARDA, Márcia Rivane; SILVA, Sarah Paulina da Silveira; LEITE, Vilma da Conceição Braga. O fracasso escolar como desencadeador
da exclusão no ato educativo: perspectivas e desafios. 2008. 59f. Monografia (conclusão de curso) – Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, Departamento de Educação – Pedagogia, Belo Horizonte.
O fracasso escolar como desencadeador da exclusão no ato educativo: perspectivas e desafios
SOUZA, Deise Keli de; ALEME, Elisabeth Efigênia Duarte Severino; CURTY, Lucimar; GUARDA, Márcia Rivane; SILVA, Sarah Paulina da
Silveira; LEITE, Vilma da Conceição Braga
Resumo
A presente pesquisa focaliza as questões que causaram o fracasso escolar a partir de uma visão macro e micro
do mundo, por meio de análise do processo histórico. Para isso, retoma o surgimento da escola na Antiguidade, contextualizando a educação em períodos, para chegar à análise do processo da educação brasileira e,
principalmente, no Estado de Minas Gerais. Os elementos centrais do fracasso escolar evidenciam que as
mudanças políticas poderiam estar ligadas a conceitos e práticas originárias da elite, pois a educação visava
atender a seus anseios e ideologias. Várias são as teorias que atentaram para os desafios do fracasso escolar:
a tradicional, cuja característica é a valorização intelectual, cientificista, enquanto a Escola Nova buscava o
psicológico e os processos pedagógicos e a qualidade da aprendizagem. Em outras perspectivas, os desafios
do fracasso escolar são direcionados por várias teorias: visto como uma patologia, carência cultural e racial
influenciando o processo de ensino.
A ideologia de uma educação de qualidade para todos implementa uma discussão rumo à redemocratização
do país, para isso buscam-se políticas e práticas pedagógicas como alternativas que possam favorecer condições para assegurar a aprendizagem dos alunos e sua permanência na escola. Novas propostas políticas vieram ocupar lugar na educação como um meio de minimizar o fracasso escolar, principalmente no Estado de
Minas Gerais: a proposta da Escola Sagarana e o Projeto Escolas-Referência, todos com o mesmo objetivo,
porém com propostas diversificadas, sob uma nova lógica educativa.
Palavras-chave: Fracasso escolar; Proposta política; Escola de qualidade.
Graduandas do curso de Pedagogia PUC Minas.
Orient.: Orient.: Vera Lúcia Lins Sant’Anna. Doutora em Ciências da Religião. Mestre em Educação. Professora e pesquisadora
da PUC Minas. E-mail: [email protected]
Pedagogia em Ação, v. 1, n. 1, p. 1-141, jan./jun. 2009 - Semestral
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Resumos de Monografias / TCC
ROCHA, Gabriela Alvarenga da; HENRIQUE, Mariana Carla Nassif; REGGIANI, Marina Costa Pinto. A educação de jovens e adultos como fator de transformação social. Belo Horizonte: 2008. 60f. Monografia (conclusão de
curso) – Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, Departamento de Educação – Pedagogia, Belo Horizonte.
A educação de jovens e adultos como fator de transformação social
ROCHA, Gabriela Alvarenga da; HENRIQUE, Mariana Carla Nassif; REGGIANI, Marina Costa Pinto
Resumo
O presente trabalho de conclusão de curso apresenta uma análise a respeito do aspecto social da Educação
de Jovens e Adultos ministrada na escola Y desde o ano de 2004. Faz-se uma análise da EJA enquanto um
campo político, de formação e investigação, que está comprometido com a educação das camadas populares
e com a superação das diferentes formas de exclusão e discriminação existentes em nossa sociedade, as quais
se fazem presentes tanto nos processos educativos escolares quanto não escolares.
A pesquisa também abrange a ação do profissional da EJA ao promover o ensino e a aprendizagem dos alunos, ou seja, como o processo de alfabetização acontece. É preciso procurar e experimentar métodos e técnicas que proporcionem a integração do analfabeto com determinado contexto, o que, consequentemente, fará
sentido para sua aprendizagem.
Palavras-chave: Educação de Jovens e Adultos; Processo ensino-aprendizagem; Transformação social; Paulo
Freire.
Graduandas do curso de Pedagogia PUC Minas.
Orient.: Nilza Bernardes Santiago. Mestre em Educação e Professora da PUC Minas. E-mail: [email protected]
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Pedagogia em Ação, v. 1, n. 1, p. 1-141, jan./jun. 2009 - Semestral
Resumos de Monografias / TCC
BATISTA, Irani; OLIVEIRA, Janaice Cândida de. Pedagogia Afetiva: uma proposta alternativa que visa melhorar a
qualidade da relação professor/aluno no processo ensino aprendizagem. Belo Horizonte: 2008. 60f. Monografia (conclusão de curso) – Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, Departamento de Educação – Pedagogia, Belo
Horizonte.
Pedagogia Afetiva: uma proposta alternativa que visa melhorar a qualidade da relação professor/aluno no processo ensino aprendizagem
BATISTA, Irani; OLIVEIRA, Janaice Cândida de
Resumo
Este trabalho aborda a importância da Pedagogia Afetiva, como uma alternativa para a educação atual. Faz
uma critica ao ensino que volta seu olhar, para o desenvolvimento cognitivo, esquecendo-se do lado afetivo
do educando. Valoriza a relação Professor/Aluno, no processo ensino aprendizagem, através de uma educação mais afetiva. As técnicas utilizadas no desenvolvimento da pesquisa seguiram de observações diretas
e indiretas, de entrevistas semi-estruturadas com os alunos, com aplicação dos questionários direcionadas
para os supervisores, professores, e alunos nas escolas pesquisadas. Foi realizada, análise documental, com o
plano político pedagógico e o regimento escolar das Instituições envolvidas, para comprovar a cientificidade da pesquisa, e alcançar os objetivos almejados seguido de diversas reflexões de teóricos da educação que
abordam sobre a Pedagogia Afetiva.
A importância desse trabalho justifica-se pela necessidade de fazer uma reflexão a cerca das práticas educativas exercidas no cotidiano escolar. A escolha do tema fundamenta-se na importância de se conhecer uma
prática educativa que valoriza a relação professor/aluno, pois tem como objetivo investigar as relações interpessoais no âmbito educacional
Palavras-chave: Afetividade; Cognição; Relação professor/aluno; Diálogo.
Graduandas do Curso de Pedagogia PUC Minas.
Orient.: Vera Lúcia Lins Sant’Anna. Doutora em Ciências da Religião. Mestre em Educação. Professora e pesquisadora da PUC
Minas. E-mail: [email protected]
Pedagogia em Ação, v. 1, n. 1, p. 1-141, jan./jun. 2009 - Semestral
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Resumos de Monografias / TCC
SILVA, Ludmila Antunes da; ARAÚJO, Rafaela Luiza Barbosa; GARCIA, Renata Lacerda; REIS, Sheila Viana
dos. Pedagogia Empresarial: as atribuições do pedagogo no setor de recursos humanos. Belo Horizonte: 2008. 60f.
Monografia (conclusão de curso) – Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, Departamento de Educação –
Pedagogia, Belo Horizonte.
Pedagogia Empresarial: as atribuições do pedagogo no setor de recursos humanos
SILVA, Ludmila Antunes da; ARAÚJO, Rafaela Luiza Barbosa; GARCIA, Renata Lacerda; REIS, Sheila Viana dos
Resumo
Esta monografia aborda o tema “Pedagogia Empresarial: as atribuições do pedagogo no setor de Recursos
Humanos”, expondo a necessidade que o mercado de trabalho tem de encontrar profissionais preparados e
capacitados para trabalharem nas organizações, fato que despertou o interesse de se elaborar uma pesquisa
sobre pedagogia empresarial. Ela mostra que um pedagogo tem muito a oferecer atuando num setor de Recursos Humanos, ajudando a promover uma significativa melhora no bem-estar dos funcionários de uma
empresa e na construção de projetos e meios que promovam essa reflexão. Revela que o pedagogo pode atuar numa empresa, executando atividades de treinamento e desenvolvimento de pessoal, proporcionando um
quadro de profissionais qualificados e capazes de atender às necessidades de crescimento e desenvolvimento
da empresa. Visando alcançar esse objetivo, a monografia apresenta abordagens históricas e conceituais da
pedagogia, expõe o que é Pedagogia Empresarial e utiliza as empresas “X”, “Y” e “Z” como objeto de análise
sobre o tema. Por fim, faz uma análise do tema apresentando as funções, atribuições e contribuições que um
pedagogo pode dar para o desenvolvimento e crescimento dos funcionários numa empresa.
Palavras-chave: Pedagogia Empresarial. Pedagogo e treinamento.
Graduandas do Curso de Pedagogia PUC Minas.
Orient.: Nilza Bernardes Santiago. Mestre em Educação e Professora da PUC Minas. E-mail: [email protected]
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Pedagogia em Ação, v. 1, n. 1, p. 1-141, jan./jun. 2009 - Semestral
Resumos de Monografias / TCC
COSTA, Luiza Fátima da Silva; DINIZ; Maria dos Anjos da Silva Carvalho; LACERDA; Marta Alves Marçal de;
MENDES; Raquel de Araújo Pereira. O TDAH no cotidiano escolar: a importância de um trabalho multidisciplinar
visando ao sucesso da aprendizagem. 2008. 60f. Monografia (conclusão de curso) – Pontifícia Universidade Católica
de Minas Gerais, Departamento de Educação – Pedagogia, Belo Horizonte.
O TDAH no cotidiano escolar: a importância de um trabalho multidisciplinar visando ao sucesso da aprendizagem
COSTA, Luiza Fátima da Silva; DINIZ; Maria dos Anjos da Silva Carvalho; LACERDA; Marta Alves Marçal de; MENDES; Raquel de Araújo
Pereira
Resumo
O presente trabalho sobre o Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade no âmbito escolar aborda, de maneira clara e objetiva, a definição do tema, bem como as características com ênfase na idade escolar,
as possíveis causas, diagnóstico, tratamento e orientações aos pais, profissionais da educação e demais pessoas sobre como lidar com crianças que apresentam as características do TDAH. A criança com TDAH exige
uma atenção especifica por parte do educador, por isso ele precisa estar preparado para contornar as dificuldades, sendo um mediador entre essa criança e as demais. É relevante que o professor possa atuar em parceria com a equipe multidisciplinar, pois somente os profissionais competentes e especializados são capazes de
elaborar um diagnóstico, já que as crianças agitadas e sem limites podem ser estigmatizadas como hiperativas. É essencial que haja reconhecimento por parte dos pais e dos educadores de que o TDAH é uma doença
que precisa ser diagnosticada e tratada, a fim de evitarem prejuízos no decorrer dos anos.
Palavras-chave: Transtorno do Déficit de Atenção; Hiperatividade.
Graduandas do Curso de Pedagogia da PUC Minas.
Orient.: Vera Lúcia Lins Sant’Anna. Doutora em Ciências da Religião. Mestre em Educação. Professora e pesquisadora da PUC
Minas. E-mail: [email protected]
Pedagogia em Ação, v. 1, n. 1, p. 1-141, jan./jun. 2009 - Semestral
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