veterinária em foco

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VETERINÁRIA EM FOCO
Revista de Medicina Veterinária
Vol. 7 - No 2 - Jan./Jun. 2010
ISSN 1679-5237
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VETERINÁRIA EM FOCO
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Dados Internacionais de Catalogação na Publicação - CIP
V586
Veterinária em foco / Universidade Luterana do Brasil. – Vol. 1, n. 1
(maio/out. 2003). –
Canoas : Ed. ULBRA, 2003- .
v. ; 27 cm.
Semestral.
ISSN 1679-5237
1. Medicina veterinária – periódicos. I. Universidade Luterana do Brasil.
CDU 619(05)
Setor de Processamento Técnico da Biblioteca Martinho Lutero
Sumário
107 Editorial
Artigos científicos
108 Aspectos relacionados ao uso do sêmen congelado de garanhões
Paulo Roberto Rojas Scaldelai, Beatriz Ramos Bertozzo, Mônica Yurie Machado
Shiroma, Juliana Bueno de Castro, Carmem Estefânia Serra Neto Zúccari
124 Efeitos do uso de GNRH no momento da IATF e dias pós-parto sobre a taxa de
prenhez em vacas de corte com cria ao pé
Carlos Santos Gottschall, Milena de Vargas Schüler, Carla Tiane Dal Cortivo
Martins, Marcos Rosa de Almeida, Jéssica Magero, Jean Carlos dos Reis Soares,
Hélio Radke Bittencourt, Rodrigo Costa Mattos, Ricardo Macedo Gregory
135 Perda reprodutiva causada pelo footrot em dois rebanhos ovinos no Rio Grande
do Sul
Luiz Alberto Oliveira Ribeiro, Gustavo Felipe Lopes, Fernando Magalhães de
Souza, Carla Menger Lehugeur
141 Inquérito soroepidemiológico para brucelose em suídeos do Brasil
Pedro Moreira Couto Motta, Antônio Augusto Fonseca Jr., Anapolino Macedo
de Oliveira, Kelly Fagundes Nascimento, Paulo Martins Soares Filho, Cláudia
Vieira Serra, Aládio Lopes Jesus, Anselmo Vasconcelos Rivetti Jr., Alberto Knust
Ramalho, Pedro Moacyr Pinto Coelho Mota, Ronnie A. Assis, Marcelo Fernandes
Camargos
148 Amblyomma aureolatum (Pallas, 1772) (Acari: Ixodidae) em Puma concolor:
primeiro registro em Santa Catarina, Brasil
Sandra Márcia Tietz Marques, Rosiléia Marinho de Quadros, Marcelo Mazzolli,
Gino Chaves, Rodrigo César Benedet, Klaus Guinter Lessmann
153 Cirurgia endoscópica transluminal por orifícios naturais: o que é?
Beatriz Guilhembernard Kosachenco, Fabiana Schiochet, Carlos Afonso de
Castro Beck
165 Sutura extramucosa em pontos separados simples e plano único no esôfago torácico
de cães
Ana Maria Quessada, Lucy Marie Ribeiro Muniz, João Macedo de Sousa, Karina
Oliveira Drumond
175 Hiperadrenocorticismo associado com linfossarcoma hepático em cão – relato de caso
Éverton Eilert Rodrigues, Melina Garcia Guizzo, Eduardo de Freitas Costa,
João Pereira Guahyba Bisneto, Simone Tostes de Oliveira, Félix Hilario Díaz
González, Alan Gomes Pöppl
185 Catarata em cães – revisão de literatura
Luciane de Albuquerque, Ana Carolina da Veiga Rodarte de Almeida, Paula
Stieven Hünning, Fabiana Quartiero Pereira, Cláudia Skilhan Faganello, João
Antonio Tadeu Pigatto
198 Hematoma auricular em gato: relato de caso
Fabiana Schiochet, Eloete Teixeira, Paulo Ricardo Centeno Rodrigues, Andréia
Weber Gimosk, Carlos Afonso de Castro Beck, Emerson Antonio Contesini,
Marcelo Meller Alievi, Letícia Mendes Fratini
206 Anestesia para procedimento ortopédico em avestruz (Struthio camelus)
Viviane Machado Pinto, Maria Eugênia Menezes de Oliveira, Jussara Zani Maia,
Maria Inês Witz, Mariane Feser, Mariangela da Costa Allgayer
215 Normas editoriais
Editorial
Prezado leitor, este volume representa o amadurecimento da revista Veterinária
em Foco em relação a nossa proposta inicial. Nesse exemplar estão disponíveis artigos
científicos, relatos de caso e uma revisão de literatura oriundos de diversos pesquisadores
de diferentes instituições públicas e privadas do País.
O volume inicia com um artigo sobre aspectos relacionados ao uso de sêmen
congelado de garanhões com o objetivo de informar o leitor sobre as diferentes
metodologias e etapas envolvidas no uso do sêmen congelado, bem como difundir o
uso dessa técnica. Na sequência, são apresentados resultados sobre os efeitos do uso
de GnRH no momento da IATF e dias pós-parto sobre a taxa de prenhez em vacas de
corte com cria ao pé. A seguir, o leitor terá acesso a um trabalho sobre perda reprodutiva
causada pelo footrot em dois rebanhos ovinos no Rio Grande do Sul. O inquérito
soroepidemiológico para brucelose em suídeos do Brasil, enviado por pesquisadores de
Minas Gerais, é o quarto artigo publicado. Após segue um artigo com registro inédito
de parasitismo por Amblyomma aureolatum em um Puma concolor resgatado pelo
Projeto Puma em Lages, Santa Catarina.
Encontram-se ainda diversos artigos com abordagem clínica e cirúrgica em
pequenos animais, com destaque para a cirurgia endoscópica transluminal, o uso de
sutura extramucosa em pontos separados simples e o plano único no esôfago torácico
de cães. O hiperadrenocorticismo associado com linfossarcoma hepático em cão
também é abordado, assim como a catarata em cães e um relato de hematoma auricular
em gato.
Por fim, é descrita a anestesia para procedimento ortopédico (amputação de asa),
em avestruz.
Boa leitura.
Comissão Editorial
Aspectos relacionados ao uso do sêmen
congelado de garanhões
Paulo Roberto Rojas Scaldelai
Beatriz Ramos Bertozzo
Mônica Yurie Machado Shiroma
Juliana Bueno de Castro
Carmem Estefânia Serra Neto Zúccari
RESUMO
O sêmen congelado atua como seguro biológico do garanhão. Permite o transporte a
longas distâncias e preserva os gametas por tempo indeterminado. As desvantagens advêm da
baixa criorresistência, variação entre raças, garanhões e ejaculados, menores taxas de prenhez e
rendimento de doses por ejaculado. Diferentes metodologias para as etapas envolvidas no uso do
sêmen congelado procuram aumentar a aplicabilidade em nível de campo. A presente revisão aborda
aspectos relacionados à utilização do sêmen congelado de garanhões enfocando número total de
espermatozoides e volume da dose, local de deposição, momento e frequência da inseminação,
transporte espermático, resposta uterina e utilização do sêmen sexado.
Palavras-chave: Criopreservação. Equino. Espermatozoide. Inseminação artificial.
Aspects related to the use of stallion frozen semen
ABSTRACT
The frozen-thawed semen acts like a stallion’s biological insurance, allows the long
distances transportation and preserves the gametes for an indefinite time. The disadvantages
come from low cryoresistance, breed variation, stallions and ejaculates, lower pregnancy rates
and dose-income per ejaculate. Different methodologies for the steps involved in the use of
frozen-thawed semen seek to increase the field applicability. The present review brings up aspects
related to the stallion frozen-thawed semen utilization, focusing total sperm number and volume
of the dose, site, moment and frequency of the insemination, sperm transport, uterine response
and sexed semen utilization.
Keywords: Artificial insemination. Cryopreservation. Equine. Spermatozoa.
Paulo Roberto Rojas Scaldelai é acadêmico de Medicina Veterinária, Faculdade de Medicina Veterinária e
Zootecnia, UFMS. Bolsista PIBIC 2007/08.
Beatriz Ramos Bertozzo é acadêmica de Medicina Veterinária, Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia,
UFMS. Bolsista PIBIC 2007/08.
Mônica Yurie Machado Shiroma é acadêmica de Medicina Veterinária, Faculdade de Medicina Veterinária e
Zootecnia, UFMS. Bolsista PIBIC 2007/08.
Juliana Bueno de Castro é acadêmica de Medicina Veterinária, Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia,
UFMS.
Carmem Estefânia Serra Neto Zúccari é Médica Veterinária, Professora, MSc., Dra., Laboratório de Biotecnologia
da Reprodução Animal, Departamento de Zootecnia, Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia, UFMS.
Endereço para correspondência: Avenida Senador Felinto Müller, 2443. Campo Grande/MS.
E-mail: [email protected]
Veterinária em Foco
Canoas
v.7
n.2
p.108-123
jan./jun. 2010
INTRODUÇÃO
A longevidade dos gametas e a duração do estro são fatores determinantes no
estabelecimento do momento e frequência das inseminações artificias (IA). Além disso,
na espécie equina o momento da ovulação está relacionado ao término do cio e não ao
seu início, como na maioria das espécies domésticas (GINTHER, 1992). Para o sêmen
criopreservado atenção especial deve ser dispensada quanto a esses aspectos, pois o ciclo
congelação/descongelação tanto reduz, em cerca de 50%, o número de espermatozoides
viáveis, como também sua longevidade. Portanto, a IA deve ser efetuada o mais próximo
possível do momento da ovulação (SQUIRES et al., 1999).
Alguns fatores impedem que o sêmen equino congelado seja usado em larga escala,
dentre eles, a variação individual a criopreservação e o baixo rendimento de doses por
ejaculado (MORRIS et al., 2003). Pelo método tradicional as éguas são inseminadas no
corpo do útero, com uma dose mínima de 300 a 500 x 106 espermatozoides (SAMPER,
2001). Novas técnicas de inseminação artificial vêm sendo avaliadas com o objetivo
de aumentar o rendimento de doses/ejaculado. Com o auxílio de histeroscópio ou
pipetas longas flexíveis, um número reduzido de espermatozoides pode ser depositado
sobre ou ao redor da papila útero-tubárica (RIGBY et al., 2001). Estes métodos são de
especial importância quando se utiliza o sêmen sexado por citometria de fluxo, pois são
obtidos apenas cerca de 5 a 15 x 106 espermatozoides/hora (LINDSEY et al., 2001).
A presente revisão tem como objetivo abordar aspectos relacionados à utilização do
sêmen congelado de garanhões, com enfoque sobre número total de espermatozoides e
volume da dose, local de deposição, momento e frequência da inseminação, transporte
espermático, resposta uterina frente ao sêmen e a utilização de sêmen sexado.
REVISÃO DE LITERATURA
Número total de espermatozoides e volume
da dose inseminante
O volume utilizado na inseminação artificial varia de acordo com a técnica
adotada. Valores entre 0,6 a 120 ml resultaram em taxas de prenhez aceitáveis para a
inseminação artificial convencional no corpo do útero (ALLEN et al., 1976; BEDFORD;
HINRICHS, 1994 citados por MORRIS, 2004). Volumes inferiores aos normalmente
utilizados têm sido testados por diminuírem o refluxo uterino (KATILA et al., 2000) e
otimizarem o uso do sêmen congelado.
Morris et al. (2000) trabalharam com sêmen resfriado na inseminação por
histeroscopia e, ao testarem diferentes doses com volumes de 30 a 150 μl, constataram
que a variação no volume não exerceu influência sobre as taxas de prenhez. Doses
de sêmen congelado, com motilidade > 35%, foram comparadas quanto ao volume
(0,5 ml vs 4 ml + 8 ml diluente INRA82) e concentração (100 x 106 vs 800 x 106
Veterinária em Foco, v.7, n.2, jan./jun. 2010
109
espermatozoides), respectivamente, não sendo observada diferença significativa entre
os grupos para a taxa de prenhez (SIEME et al., 2004). Neste estudo as doses com
volume e concentração menores equivaliam a 10% daquelas geralmente recomendadas,
no entanto as taxas de prenhez foram satisfatórias, o que sugere uma reavaliação da
dose mais indicada.
Não há um protocolo padrão adotado mundialmente para a congelação do sêmen
equino. Apesar do número mínimo de espermatozoides/dose inseminante variar entre
reprodutores é importante determinar o menor valor necessário, para se atingir taxas
de prenhez aceitáveis para a maioria dos garanhões. Além disso, dado laboratório
geralmente utiliza uma metodologia única, portanto, o número de espermatozoides/
palheta, como de palhetas/inseminação também varia conforme o laboratório e não
apenas em função do garanhão. Na busca de uniformidade a Federação Mundial de
Reprodução para Cavalos de Esporte (WBFSH) estabeleceu uma concentração mínima
≥250 x 106 espermatozoides viáveis e motilidade progressiva ≥35% (MILLER, 2008).
A maioria dos experimentos na área utiliza essa concentração e motilidade mínimas
para utilização do sêmen congelado.
Uma concentração de 100 a 1600 x 106 espermatozoides/ml pode ser utilizada ao
congelar sêmen em palhetas de 0,5 ml. Nos testes de fertilidade o sêmen deve conter, pósdescongelação, no mínimo 30% de espermatozoides com motilidade progressiva e, em razão
desta variar entre garanhões, deve se obter entre 100 e 400 milhões de espermatozoides
viáveis após a descongelação (SQUIRES et al., 1999). Samper e Morris (1998) reportaram
uma taxa de concepção/ciclo de 73% para éguas inseminadas, 24 e 36 horas após indução
da ovulação, com uma dose de 600 x 106 espermatozoides congelados.
O desenvolvimento da técnica de inseminação artificial com baixa concentração
espermática tem trazido benefícios como aumentar o rendimento de doses/ejaculado e
ser uma ferramenta potencial no aumento da fertilidade de garanhões com subfertilidade
adquirida (SIEME et al., 2004). Para doses inferiores a 5 x 106 espermatozoides totais
(MORRIS; ALLEN, 2002) ou volumes menores que 0,5 ml (MILLER, 2008) a literatura
recomenda, preferencialmente, o uso da histeroscopia para se obter taxas mais altas
de concepção.
A histeroscopia permite que a concentração de sêmen criopreservado seja reduzida
com sucesso para 3 x 106 espermatozoides (MORRIS, 2004). Lindsey et al. (2005)
utilizando a histeroscopia obtiveram 72% de taxa de prenhez para dose de 20 x 106 de
espermatozoides resfriados sexados, em volume de 300 μl, enquanto para inseminação no
corno uterino, guiada por palpação retal, com a mesma dose e volume, esta caiu para 38%.
Samper et al. (2005) trabalhando com palhetas de 0,5 ml e concentrações de 50 a 150 x
106 espermatozoides totais, inseminaram 265 éguas, com pipeta flexível no ápice do corno
uterino ou por histeroscopia. A ovulação foi induzida e as inseminações feitas após sua
detecção. As taxas médias de recuperação embrionária não diferiram significativamente
entre as técnicas, sendo de 50,7% para histeroscopia e 46% para pipeta flexível.
A inseminação com baixa concentração espermática irá maximizar a relação
macho:fêmea e terá muita importância para o sêmen sexado ou quando um número
110
Veterinária em Foco, v.7, n.2, jan./jun. 2010
restrito de doses de sêmen congelado estiver disponível (MORRIS; ALLEN, 2002).
Squires et al. (2000) avaliaram a diferença nas taxas de prenhez considerando quatro
tratamentos: sêmen fresco sexado e não sexado e sêmen congelado sexado e não sexado.
A inseminação era realizada por histeroscopia com 5 x 106 espermatozoides viáveis em
volume de 230 μl. A taxa de prenhez para o sêmen congelado sexado foi inferior (13%;
p<0,05) a dos demais tratamentos, que não diferiram entre si (40, 38 e 38% para fresco
não sexado, fresco sexado e congelado não sexado, respectivamente).
Rotineiramente, as éguas são inseminadas com sêmen fresco no corpo uterino, com
500 x 106 de espermatozoides viáveis, diariamente ou em dias alternados, durante o estro.
Recomenda-se 800 x 106 espermatozoides com motilidade ≥30% após a descongelação
(SIEME et al., 2004). Volkman e Van Zyl (1987) utilizando sêmen congelado em
palhetas de 0,5 ml de dois garanhões para inseminar 60 éguas, relataram um aumento
significativo da taxa de prenhez, de 44 para 73% quando a dose inseminante média se
elevou de 175 para 249 x 106 espermatozoides viáveis. Kloppe et al. (1988) empregaram
sêmen congelado na concentração de 600 x 106 espermatozoides/macrotubo (5 x 240
mm) e obtiveram taxas de prenhez variando de 55 a 60%.
Leipold et al. (1998) ao utilizarem dose inseminante de 320 e 800 x 10 6
espermatozoides viáveis e compararem concentrações de 400 e 1600 x 10 6
espermatozoides/ml congelados em palhetas de 0,5 ml (fatorial 2 x 2), obtiveram
maiores taxas de prenhez (37%) para a concentração de 1600 ao invés de 400 x 106
espermatozoides/ml (22%). O aumento de 320 para 800 x 106 espermatozoides viáveis,
não exerceu diferença significativa nas taxas de prenhez. Diante dos resultados obtidos
os autores recomendam a congelação de 800 x 106 espermatozoides/palheta de 0,5 ml
e uma dose inseminante com 320 x 106 espermatozoides viáveis.
Squires et al. (2003) utilizando dose inseminante única com 800 x 10 6
espermatozoides totais ou duas inseminações pós-ovulação, contendo a metade
do número de espermatozoides totais (400 x 106), obtiveram taxas de recuperação
embrionária de 55% e 60%, respectivamente, não constatando diferença significativa.
Já, para éguas inseminadas duas vezes, após indução da ovulação, com doses de 200
x 106 espermatozoides totais, no corno ou no corpo uterino, as taxas de recuperação
embrionária diferiram significativamente (20% vs 50%, respectivamente).
Da mesma forma, Barbacini et al. (2005) buscando determinar as melhores dose
e frequência para a inseminação artificial, encontraram para éguas inseminadas com
800 x 106 espermatozoides totais pós-ovulação, taxa de prenhez/ciclo em torno de 47%.
A seguir usaram o mesmo número total de espermatozoides, mas comparando uma ou
duas inseminações e obtiveram taxas de prenhez/ciclo significativamente diferentes
(57% e 76%, respectivamente). Por outro lado, éguas que foram inseminadas duas
vezes com 400 x 106 espermatozoides totais por dose atingiram uma taxa de prenhez/
ciclo de 80%, resultado bastante satisfatório.
Metcalf (2005) trabalhando com duas inseminações após indução da ovulação
e com <200, 200 – 400, 400 – 600, 600 – 800 e > 800 x 106 espermatozoides viáveis,
relatou taxas de prenhez de 54%, 70%, 60%, 88,2% e 56,4%, respectivamente.
Veterinária em Foco, v.7, n.2, jan./jun. 2010
111
Concluiu que a dose inseminante entre 600 – 800 x 106 espermatozoides viáveis foi
significativamente melhor que as demais, as quais não diferiram entre si. Entretanto,
Barbacini et al. (2005) testaram duas inseminações, após a indução da ovulação, com
valores de 400 e 800 x 106 espermatozoides e obtiveram taxas de prenhez de 60% e
31% (p>0,05), respectivamente.
A inseminação artificial é seguida de uma endometrite e o uso de doses e volumes
menores parece minimizar esse processo (SIEME et al., 2004). Essa não é a única
vantagem da diminuição da dose e volume inseminantes, levando em consideração o
aumento do rendimento de doses/ejaculado, aumento da fertilidade de garanhões com
subfertilidade adquirida e viabilidade no uso do sêmen sexado. Portanto, doses com
cerca de 300 milhões de espermatozoides viáveis são recomendadas para o sêmen
congelado, mas estudos mostram um crescente sucesso no uso de doses menores quando
associadas às novas técnicas de inseminação artificial.
Local da inseminação artificial
A maximização na utilização do sêmen de determinados garanhões, principalmente
daqueles com infertilidade adquirida, gera discussões quanto à melhor dose a ser usada
e o local de deposição seminal. O objetivo é alcançar uma alta taxa de concepção com
a menor dose, embora o número mínimo de espermatozoides por dose inseminante
varie entre garanhões.
A introdução da técnica de congelação do sêmen equino gerou polêmicas quanto à
sua eficiência na obtenção de taxas satisfatórias de prenhez. Muller (1982) inseminando
175 éguas, com 200x106 espermatozoides/ml viáveis e deposição seminal na porção
média do corpo uterino, obteve uma taxa de prenhez de 40-45%. Em estudo posterior,
Müller (1987) avaliando 959 éguas, relatou taxa de prenhez de 56%, quando a deposição
seminal foi realizada na porção inicial do corpo uterino.
Valores similares foram observados por Cristanelli et al. (1984) que trabalhando
com 108 ciclos estrais de 90 éguas, compararam a eficiência da inseminação artificial
no corpo do útero com sêmen fresco ou congelado de três garanhões. Os autores
constataram que embora não tenham diferido significativamente, as taxas de prenhez
para o congelado (50, 56 e 61%) corresponderam a 86% daquelas obtidas com o sêmen
fresco (67, 67, 61%).
Uma alternativa à deposição do sêmen no corpo do útero é a inseminação no ápice
do corno uterino. Rigby et al. (2000) constataram a presença de espermatozoides viáveis
na junção útero-tubárica após a inseminação no ápice do corno ou na porção média
do corpo do útero. Os autores acreditam que a inseminação artificial no corno possa
aumentar a taxa de prenhez por elevar o número de espermatozoides viáveis no oviduto,
em especial quando se utiliza sêmen congelado, pois o número de espermatozoides
viáveis é reduzido. Embora Squires et al. (2003) tenham obtido uma taxa de recuperação
embrionária menor para inseminação no corno (4/20; 20%) que no corpo do útero (10/20;
112
Veterinária em Foco, v.7, n.2, jan./jun. 2010
50%), os autores atribuem esse pior resultado à inexperiência do técnico em posicionar
corretamente o cateter e também a possível resposta inflamatória uterina mais intensa
pelo fato das éguas terem sido inseminadas 24 e 40 h após a aplicação do hCG.
Güvenc et al. (2005) avaliaram o efeito do número total de espermatozoides na dose
inseminante e do local de deposição do sêmen, corpo do útero e ápice do corno ipsis lateral
ao folículo pré-ovulatório, sobre a resposta inflamatória intrauterina. Verificaram que a
inseminação no ápice do corno uterino com o uso da pipeta plástica flexível associada à
palpação transretal, não aumentou a resposta inflamatória local, sugerindo que o uso de
baixo número de espermatozoides é mais recomendável quando a inseminação é realizada
na extremidade do corno. Por outro lado, Clulow et al. (2008) usando a inseminação
histeroscópica para testar diferentes doses (6, 13 e 25 x 106) e volumes (250, 500 e 1000
µl) de sêmen sexado ou não, adotaram a inseminação convencional no corpo do útero
com 4 ml contendo 500 x 106 espermatozoides móveis, como grupo controle. O método
convencional resultou em taxa de prenhez/ciclo significativamente maior (22/62 ciclos;
35,5%) que aquela com baixo número de espermatozoides, que variou de 0 a 20%, não
diferindo entre sêmen sexado e não sexado.
Squires et al. (2000), comparando a taxa de prenhez entre deposição seminal no
corno uterino com pipeta plástica flexível guiada por ultrassonografia e inseminação
na papila útero-tubárica por histeroscopia, obtiveram valores de 0 (0/10) e 50% (5/10),
respectivamente.
Utilizando sêmen fresco, Buchanan et al. (2000) verificaram que a deposição no
corpo uterino de 500x106 de espermatozoides, em 20 ml de diluidor, resultou em taxa
de prenhez de 90%, significativamente maior que aquela obtida para o ápice do corno
uterino ipsis lateral ao folículo pré-ovulatório contendo 25 x 106 espermatozoides
diluídos em 1 ml de meio (57%). Esta dose por sua vez não diferiu da prenhez observada
no grupo inseminado com 5 x 106 espermatozoides (35%).
Sieme et al. (2004) trabalhando com sêmen fresco, verificaram que éguas com trato
reprodutivo normal tiveram taxa de prenhez superior (27/38; 71%) com inseminações
no corno, com auxílio da histeroscopia, quando comparada ao corpo do útero (18/38;
47,3%). No entanto, o mesmo não foi observado para as éguas com problema no trato
reprodutivo que apresentaram taxas de prenhez de 33,3% (5/15) e 84,2% (16/19), para
inseminações no corno e corpo uterino, respectivamente.
A inseminação artificial rotineiramente realizada no corpo do útero com sêmen
congelado de garanhões resultada em taxa de prenhez equivalente a cerca de 60% a
80% daquela obtida com o sêmen fresco ou refrigerado. A deposição seminal no corno
uterino, por histeroscopia ou com pipeta flexível guiada por palpação transretal, são
técnicas que permitem redução drástica do número necessário de espermatozoides
viáveis, viabilizando o uso de garanhões com subfertilidade adquirida (oligospérmicos),
aumentando o rendimento de doses por ejaculado e possibilitando o uso do sêmen
sexado. Por histeroscopia a deposição seminal pode ser realizada sobre a papila no
ápice do corno uterino, contudo com aplicabilidade limitada devido ao alto custo do
equipamento.
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Momento e frequência da inseminação artificial
A gonadotrofina coriônica humana (hCG) e análogos do hormônio liberador de
gonadotrofinas (GnRH) como o acetato de deslorelina são utilizados para a indução e
sincronização da ovulação, permitindo a escolha do melhor momento para a inseminação
artificial das éguas.
Esses hormônios podem ser administrados por várias vias, dentre elas,
intramuscular, intravenosa ou implantes vulvares, após se detectar folículos com
diâmetro ≥35 mm (KLOPPE et al., 1998; LEIPOLD et al., 1998; MORRIS et al., 2000;
BUCHANAN et al., 2000; SQUIRES et al., 2000; SQUIRES et al., 2003), ou ≥42 mm
(HEMBERG, 2006).
Durante a estação de monta, o uso repetido de hCG pode estar associado a uma
diminuição na eficiência em induzir a ovulação pois sendo uma proteína heteróloga, sua
administração provocará a produção de anticorpos, diminuindo sua eficácia, fato que também
pode ocorrer com o aumento da idade da égua (VOSS, 1993; McCUE et al., 2004).
McCue et al. (2004) constataram que a ovulação em éguas após a administração
de hCG ocorreu dentro de 48 horas em 78,4% dos ciclos, entre 24 e 48 horas em
59,9% e 4,4% não ovularam durante o tratamento. Sugere-se que o hCG não deve ser
usado por mais de uma ou duas vezes durante uma estação de monta, recomendandose o emprego de hormônios alternativos, como os análogos do GnRH, procedimento
preconizado também por Squires et al. (2003).
Morris et al. (2000) utilizaram um protocolo de indução da ovulação com uma
dose intravenosa de 3.000 UI de hCG ou implante subcutâneo de liberação lenta de
GnRH (2,1 mg) administrado 8 horas antes ou no momento da inseminação. A ovulação
ocorreu no segundo dia após a indução em 79,1% das éguas, não havendo diferença
entre o hCG e GnRH para as taxas de prenhez.
Hemberg (2006) determinou o momento da ovulação em éguas tratadas com
acetato de deslorelina (Ovuplant®) e inseminadas uma vez pós-ovulação. As ovulações
ocorreram em média com 39,4 horas dentro de um intervalo de 36 a 48 horas e 94,1%
ovularam 38 a 42 horas após o tratamento, obtendo taxa de prenhez de 45,4%.
Leipold et al. (1998), utilizando inseminação com sêmen congelado pré e pósovulação, em diferentes doses e usando implante de 2,2 mg de análogo de GnRH para
indução da ovulação, detectaram 89,7% delas ocorrendo 48 horas após o tratamento,
com taxas de prenhez variando de 15 a 40%.
Testando estratégias de inseminação artificial, visando racionalizar o manejo
quando da utilização do sêmen congelado, Squires et al. (2003) induziram a ovulação
com a administração intravenosa de 2.500 UI de hCG. Não encontraram diferença para
as taxas de prenhez quando as éguas foram inseminadas dentro de 6 horas pós-ovulação
ou 24 e 40 horas após o hCG (83,3 e 86,6%, respectivamente; p>0,05). Segundo os
autores a alta fertilidade se deveu, provavelmente, à seleção de garanhões férteis e
com boa criorresistência.
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Veterinária em Foco, v.7, n.2, jan./jun. 2010
Segundo Kloppe et al. (1988) as recomendações gerais nos programas reprodutivos
que utilizam sêmen congelado são de inseminar as éguas diariamente durante o cio
ou acompanhar frequentemente o desenvolvimento folicular e inseminá-las uma vez
após a ovulação. As éguas receberam 2.500 UI de hCG intravenoso. Utilizando esses
protocolos em seu trabalho obteve taxas de prenhez de 60 e 55%, respectivamente, não
havendo diferença significativa entre elas.
Barbacini et al. (2005) avaliaram a inseminação em tempo fixo, 24 e 40 horas
após a indução da ovulação com 2.000 UI de hCG intravenoso, ou uma inseminação
pós-ovulação e obtiveram taxas de prenhez de 46% e 47% (p>0,05), respectivamente.
Os autores concluíram que sendo o sêmen de boa qualidade, fertilidade semelhante
é atingida quando as éguas são inseminadas pós-ovulação ou as 24 e 40 horas após a
administração de hCG.
Em síntese, a indução da ovulação é usada rotineiramente para inseminações com
sêmen congelado. O GnRH é a alternativa quando mais de duas doses de hCG forem
empregadas na mesma estação de monta. Em geral, o intervalo entre o tratamento e a
ocorrência da ovulação é superior para o hCG. Além disso, os resultados demonstram
que as taxas de prenhez não diferem entre os indutores. Pesquisas têm demonstrado
que a inseminação artificial em tempo fixo nas éguas é uma estratégia a ser adotada
visando à racionalização do manejo das inseminações.
Transporte espermático
O transporte espermático é fundamental para que a fecundação ocorra, pois
através dele os espermatozoides colonizam o oviduto. Os gametas masculinos devem
ser transportados até o sítio da fecundação no oviduto, se manter no trato reprodutor
feminino até a liberação do ovócito e estarem fisiologicamente preparados para penetrálo (TROEDSSON et al., 1998).
Nas éguas o estro tem uma duração de 5 a 7 dias e a fecundação pode ocorrer até 6
dias após a monta ou inseminação, portanto é necessário um armazenamento prolongado
de espermatozoides viáveis no trato reprodutivo da fêmea (THOMAS et al., 1994). A maior
porção do ejaculado é depositada no útero da égua durante a cópula. Em função disso a
junção útero-tubárica é a principal barreira que os espermatozoides devem transpor para
atingirem a ampola, o local da fecundação (TROEDSSON et al., 1998).
Após o transporte até o oviduto os espermatozoides se aderem às células do
epitélio tubárico formando o reservatório espermático. Nos mamíferos o reservatório
se forma no istmo do oviduto algumas horas após a monta ou inseminação artificial
(BADER, 1982).
Thomas et al. (1994) avaliaram in vitro como se estabelece a ligação dos
espermatozoides com as células de diferentes regiões anatômicas do oviduto (ampola
e istmo), em diferentes fases do ciclo estral. Os explants celulares foram coletados
de éguas em três fases do ciclo: fase folicular, imediatamente após a ovulação e no
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diestro. As células foram coincubadas com sêmen fresco na concentração final de 50 x
106 espermatozoides/ml e aos 30 minutos, 24 e 48 horas foram retiradas amostras para
avaliar a motilidade e o número de espermatozoides fixados entre as células do oviduto.
A análise por micrografia eletrônica demonstrou que os espermatozoides se ligaram
às células ciliadas e não ciliadas. As células epiteliais do istmo apresentaram maior
número de espermatozoides fixados quando comparadas às da ampola e mais células
se ligaram ao epitélio do oviduto nas fases folicular e pós-ovulação que no diestro. A
motilidade dos espermatozoides fixados foi maior na fase folicular.
Usando as técnicas de inseminação artificial no corpo do útero e no ápice do
corno uterino Rigby et al. (2000) relataram que o número médio de espermatozoides
no oviduto de éguas normais e daquelas com limpeza uterina tardia foi semelhante
entre as técnicas usadas. Os autores sugerem que as éguas com limpeza uterina tardia
necessitam de mais tempo para que os espermatozoides migrem até o oviduto, devido
à contratilidade uterina reduzida.
As células espermáticas ficam retidas no reservatório pela combinação de uma
série de fatores. Dentre eles: constrição localizada do istmo, queda da motilidade
espermática no istmo, fixação às células epiteliais do oviduto, aprisionamento dos
espermatozoides no muco local e o edema da mucosa do oviduto associado à fase
do ciclo estral (THOMAS et al., 1994). In vitro o reservatório espermático aumenta
a viabilidade do espermatozoide equino (TROEDSSON et al., 1998). Sugere-se que
ele possua diferentes funções como redução do risco de poliespermia por liberar uma
quantidade pequena e suficiente de espermatozoides para a fecundação no momento
da ovulação (LEFEBVRE et al., 1995) e previne a capacitação espermática precoce
por manter em nível basal a concentração intracelular de cálcio.
Morris et al. (2000) determinaram que a concentração mínima para a formação de
um reservatório espermático adequado por um a quatro dias é de 1x106 espermatozoides
viáveis.
Scott et al. (2002) descreveram a presença de espermatozoide equino nos tecidos
do trato genital de éguas 18 e 26 horas após a inseminação. Os espermatozoides
estavam presentes na junção útero-tubárica de 70% dos animais. As 18 e 26 horas após
a inseminação os espermatozoides estavam localizados principalmente no lúmen da
junção útero-tubárica e não na porção uterina da papila. Os autores concluíram que a
junção útero-tubárica é o reservatório espermático na égua.
Fiala et al. (2007) avaliaram após 2, 4 e 24 horas da inseminação artificial se a
concentração influenciava no transporte dos gametas até o reservatório espermático.
Utilizando doses de 5x106, 25x106 e 50x106 espermatozoides/ml verificaram que o
número deles presente no oviduto e na junção útero-tubárica foi semelhante para
as concentrações de 25x106 e 5x106 espermatozoides/ml, em todos os momentos
analisados. Os autores sugerem que a resposta inflamatória intensa observada às 4 horas
pós-inseminação é prejudicial ao transporte espermático nesse período. Independente
da concentração testada, 2 horas após a inseminação artificial havia espermatozoides
suficientes para permitir a fecundação na junção útero-tubárica, em mais de 54% das
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éguas, fato observado para 67% e 74% delas as 4 e 24 horas, respectivamente. A partir
das 4 horas após a inseminação o transporte espermático não foi influenciado pela
concentração utilizada.
O transporte e a sobrevivência dos espermatozoides variam de acordo com
a fertilidade da égua, do garanhão e entre sêmen fresco e congelado, sendo que no
trato reprodutor feminino a longevidade do espermatozoide criopreservado é menor
(TROEDSSON et al., 1998).
Bader (1982) inseminou 14 éguas com sêmen fresco e nove com criopreservado
no corpo do útero, imediatamente após ou até 6 horas pós-ovulação. As éguas foram
sacrificadas 2, 4 ou 6 horas após a inseminação, sendo realizados lavados da junção úterotubárica, istmo e ampola do oviduto ipsis lateral à ovulação. O número de espermatozoides
na junção útero-tubárica e oviduto foi muito baixo após 2 e 6 horas da inseminação com
sêmen fresco ou congelado, porém às 4 horas grande número de espermatozoides do sêmen
fresco atingiu a junção útero-tubárica. A habilidade dos espermatozoides congelados
ascenderem ao oviduto e alcançarem à ampola foi muito menor que daqueles do sêmen
a fresco. Os resultados indicam que embora poucos espermatozoides estejam presentes
na junção útero-tubárica e istmo após 2 horas da inseminação, o transporte até a ampola
ainda não se completou, evento observado após 4 horas.
Dobrinski et al. (1995) utilizando sêmen congelado e fresco diluído em meio
à base de leite ou em diluente de congelação, demonstraram que espermatozoides
criopreservados têm uma habilidade reduzida de se ligar às células do oviduto e,
principalmente, se encontram em número reduzido no istmo antes da fecundação. Da
mesma forma, a motilidade foi significativamente menor para o sêmen congelado.
Os autores relatam que o processo de criopreservação modifica a estrutura e o
funcionamento da membrana plasmática através da reorganização dos seus lipídios
e alterações nas ligações entre estes e as proteínas. Possivelmente, as mudanças
nas glicoproteínas e glicolipídeos da membrana impeçam que os espermatozoides
estabeleçam um contato íntimo com as células epiteliais do oviduto, reduzindo assim
a fertilidade do sêmen congelado.
Resposta inflamatória uterina
Após a monta natural ou a inseminação artificial as éguas desenvolvem um
processo inflamatório fisiológico que se caracteriza pelo acúmulo de fluido intrauterino
rico em leucócitos polimorfonucleares. Essa endometrite fisiológica serve para remover
o material estranho presente no útero como excesso de espermatozoides, plasma
seminal, bactérias e diluente (BARBACINI et al., 2003). A limpeza do útero fornece
um ambiente compatível à sobrevivência do embrião quando este ingressa no lúmen
uterino cinco dias após a fecundação (TROEDSSON et al., 1998).
Apesar dos espermatozoides aparentemente não exercerem efeito quimiotático
direto sobre os neutrófilos, eles induzem a quimiotaxia de polimorfonucleares através
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da ativação do sistema complemento, ao contrário do plasma seminal que tem um efeito
inibidor sobre a migração dos leucócitos (TROEDSSON et al., 1998).
A endometrite induzida pelos espermatozoides parece estar associada com
queda na fertilidade das éguas, pois altera o microambiente uterino e prejudica a
sobrevivência do embrião (CARD, 2005). Com o objetivo de avaliar se ocorria queda
da fertilidade do sêmen congelado quando a inseminação era realizada 4 a 10 horas
após uma inseminação prévia, Metcalf (2000) utilizou a inseminação heterospérmica
que compreende o uso de espermatozoides provenientes de mais de um reprodutor. As
éguas foram inseminadas com sêmen congelado do Garanhão A e após a detecção da
ovulação as éguas foram inseminadas com sêmen congelado do Garanhão B, 6 a 10
horas após a primeira inseminação. A taxa de prenhez foi de 82%, sendo o Garanhão B
responsável pela maioria das gestações, porém não houve diferença significativa entre
as inseminações. A autora concluiu que aparentemente a endometrite desencadeada
após a inseminação inicial com sêmen congelado não está associada à infertilidade
das subsequentes até mesmo quando realizada no pico de atividade dos neutrófilos e
da queda da motilidade espermática.
Os resultados reforçam a hipótese de que os neutrófilos fazem fagocitose
seletiva dos espermatozoides anormais e inférteis concomitante à endometrite pósinseminação.
A utilização de baixa concentração e volume de sêmen com deposição direta
na papila da junção útero-tubárica parece reduzir a endometrite pós-inseminação
(LINDSEY et al., 2001). Güvenc et al. (2005), estudando o efeito do número total de
espermatozoides e do local da inseminação na resposta inflamatória do útero equino
concluíram que ambos não afetaram a intensidade da reação inflamatória, medida pelo
número de neutrófilos e presença de fluido no útero, 24 horas após a inseminação. Além
disso, os autores relatam que a inseminação no ápice do corno uterino com auxílio
de pipeta associada à palpação retal não aumentou a irritação da mucosa uterina,
nem a resposta inflamatória local, com o acúmulo de fluido sendo significativamente
menor para dose de 20 x 106 espermatozoides/0,5 ml. Dessa forma, sugerem que um
menor número de espermatozoides é preferível quando a inseminação é realizada na
extremidade do corno uterino.
Fiala et al. (2007) avaliaram o efeito de diferentes concentrações espermáticas e da
presença de plasma seminal ou do diluente sobre a intensidade da resposta inflamatória
no útero 2, 4 e 24 horas após a inseminação artificial. As éguas foram submetidas a seis
tratamentos: (1) 5 x 106 espermatozoides/ml; (2) 25 x 106 espermatozoides/ml; (3) 50 x
106 espermatozoides/ml; (4) infusão de 20 ml de plasma seminal; (5) infusão de 20 ml
de diluente a base de leite desnatado e; (6) controle. Os animais foram sacrificados 2, 4
e 24 horas após os tratamentos. Foram feitos lavados do útero e ovidutos para detectar
a presença de neutrófilos. O número de neutrófilos no lavado uterino das éguas tratadas
foi significativamente maior que no grupo controle demonstrando que o plasma seminal,
diluente e concentração de espermatozoides provocaram uma resposta inflamatória mais
intensa às 4 horas que aquela observada para o controle. Provavelmente, a concentração
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de 50 x 106/ml promoveu um estímulo quimiotático mais intenso através da ativação
do sistema complemento e outros mediadores inflamatórios. A concentração mais
elevada de espermatozoides acelerou o desaparecimento da inflamação devido à maior
eficácia da fagocitose.
Quando a habilidade fisiológica da fêmea de combater a endometrite está
comprometida a inflamação persiste e se torna patológica resultando em queda da
fertilidade, portando é importante considerar a duração da resposta inflamatória em
éguas inseminadas repetidamente com sêmen congelado. A remoção do plasma seminal
durante o processo de criopreservação parece ser um importante fator para uma resposta
inflamatória acentuada após a inseminação, que geralmente é observada clinicamente
ao se utilizar sêmen congelado (TROEDSSON et al., 1998).
Uso de sêmen sexado e não-sexado
A possibilidade de selecionar o sexo do embrião antes da fecundação possui uma
série de vantagens nas espécies domésticas voltadas para a produção de carne ou leite.
Nos equinos estas não são muito evidentes, embora muito desejadas pela maioria dos
criadores (LINDSEY et al., 2001). Johnson et al. (1989) citado por Lindsey et al. (2001)
foi o primeiro a realizar a sexagem pela análise quantitativa de DNA nos cromossomos
de espermatozoides X e Y, produzindo embriões saudáveis de coelhos. O primeiro potro
produzido a partir de sêmen sexado originou-se da inseminação cirúrgica diretamente
no oviduto de 150.000 espermatozoides (LINDSEY et al., 2001).
Os principais fatores que afetam as taxas de prenhez do sêmen sexado são o número
reduzido de espermatozoides disponíveis para a inseminação e sua criopreservação
(MORRIS, 2005). O processo de sexagem é prejudicial para a célula e acredita-se que
o espermatozoide equino seja mais sensível aos procedimentos que o bovino.
Em decorrência da baixa recuperação de células sexadas, passam a ter relevância
técnicas de inseminação que resultem em taxas de prenhez aceitáveis quando o menor
número possível de espermatozoides é utilizado (LINDSEY et al., 2001).
Buchanan et al. (2000) trabalhando com sêmen fresco diluído na dose de 25x106
espermatozoides sexados, avaliaram o efeito da adição de 4% de gema de ovo, visando
aumentar a motilidade, sobre a taxa de prenhez. O sêmen foi depositado no ápice do
corno uterino ipsis lateral ao ovário contendo o folículo pré-ovulatório. A taxa de
prenhez não diferiu (p>0,05) entre os grupos controle e com gema de ovo, sendo de
33% e 50%, respectivamente. O mesmo foi observado no experimento de Squires et
al. (2000) em que a adição de gema de ovo ao diluente do sêmen sexado não afetou
as taxas de concepção.
Lindsey et al. (2000) compararam a fertilidade do sêmen sexado e não-sexado
na dose de 5 x 106 espermatozoides, frente a diferentes técnicas de inseminação, sendo
elas: deposição guiada pelo ultrassom no corno uterino (não-sexado); diretamente
na papila da junção útero-tubárica (não-sexado) e; histeroscópica, na papila uterina
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(sexados). A taxa de prenhez foi maior para a inseminação histeroscópica ao se utilizar
sêmen não-sexado. Porém, a taxa de prenhez com a utilização do sêmen sexado não
foi significativamente menor (25%) que aquela com não-sexado (50%), utilizando
a inseminação histeroscópica. Os autores concluíram que a histeroscopia é mais
recomendada quando se dispõe de baixa concentração de espermatozoides sexados
de garanhão.
A possibilidade de criopreservar o sêmen sexado aumenta consideravelmente a
aplicabilidade desta biotecnologia na indústria equina. O espermatozoide de garanhões
sobrevive por curto período de tempo após a sexagem, portanto as éguas devem ser
inseminadas imediatamente após para que se atinjam boas taxas de prenhez. Em virtude
disso a criopreservação é vantajosa, pois permitirá usar o sêmen no momento e local
desejados.
Comparando as taxas de concepção de éguas inseminadas com 5 x 106
espermatozoides sexados e não-sexados, Squires et al. (2000) utilizaram 40 éguas,
divididas em três grupos: (1) sêmen fresco não-sexado, depositado profundamente no
corno uterino com auxílio de pipeta flexível e ultrassonografia; (2) sêmen fresco nãosexado, diretamente na papila da junção útero-tubárica do corno uterino ipsis lateral ao
ovário com folículo dominante e; (3) sêmen fresco sexado utilizando vídeo-endoscopia.
A taxa de prenhez para o não-sexado foi 50%, enquanto para o sexado de 25%, não
havendo diferença (p>0,05) entre elas. Clulow et al. (2008) também não encontraram
diferença significativa entre as taxas de prenhez ao utilizarem sêmen congelado nãosexado e sexado, porém, a motilidade pós-descongelação do sêmen sexado foi menor
até 90 minutos de incubação, momento a partir do qual não houve mais diferença entre
as amostras.
Squires et al. (2000) conduziram experimentos para avaliar os efeitos da dose e
técnica de inseminação, histeroscópica ou pipeta flexível, comparando sêmen sexado
vs não-sexado e sêmen fresco vs congelado. Embora não tenha sido detectada diferença
significativa entre os grupos, o sêmen congelado sexado resultou na menor taxa de
prenhez, de 13%. Em bovinos é possível criopreservar o sêmen sexado sem queda
significativa da fertilidade, já em equinos os resultados de Squires et al. (2000) levaram
a concluir que a criopreservação do sêmen sexado levou a queda da fertilidade do
sêmen, provavelmente por danos que as técnicas de sexagem por citometria de fluxo
e congelação provocaram na célula espermática.
Uma alternativa para aumentar a longevidade do sêmen sexado é armazená-lo
antes da sexagem. Lindsey et al. (2000) compararam a fertilidade do sêmen sexado com
a do sêmen armazenado sob refrigeração por 18 horas e então sexado. Os resultados do
estudo indicaram que não houve diferença nas taxas de prenhez entre os tratamentos,
sugerindo que é possível armazenar o sêmen refrigerado antes da sexagem sem prejuízos
na fertilidade.
Os experimentos demonstram que a utilização do sêmen sexado na reprodução
equina ainda não é uma prática muito vantajosa em virtude de sua fertilidade reduzida
a campo. Portanto, são necessários estudos tanto para aperfeiçoar a utilização do sêmen
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equino sexado, quanto para aumentar a longevidade deste através de refrigeração ou
criopreservação sem que haja queda significativa da fertilidade.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Em síntese, a dose influencia o grau da resposta uterina, portanto doses menores
associadas às técnicas de inseminação no ápice do corno compensam a menor
longevidade do espermatozoide equino criopreservado, pela deposição dos gametas
nas proximidades do reservatório espermático. Assim, essa associação aumenta o
rendimento das doses disponíveis, com taxas de prenhez equivalentes àquelas da
inseminação no corpo do útero. Além disso, indutores da ovulação viabilizam a adoção
da inseminação artificial em tempo fixo racionalizando o manejo das inseminações.
O sêmen sexado se mostra mais sensível à congelação e resulta em baixas taxas de
prenhez. Estudos sobre a criobiologia do espermatozoide equino associados a estratégias
de aplicação condizentes com a fisiologia reprodutiva das éguas devem ser realizados
visando ao aumento da eficiência reprodutiva da espécie.
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Recebido em: jan. 2009
Aceito em: jul. 2009
Veterinária em Foco, v.7, n.2, jan./jun. 2010
123
Efeitos do uso de GNRH no momento
da IATF e dias pós-parto sobre a taxa de
prenhez em vacas de corte com cria ao pé
Carlos Santos Gottschall
Milena de Vargas Schüler
Carla Tiane Dal Cortivo Martins
Marcos Rosa de Almeida
Jéssica Magero
Jean Carlos dos Reis Soares
Hélio Radke Bittencourt
Rodrigo Costa Mattos
Ricardo Macedo Gregory
RESUMO
A falha na detecção de estros e o anestro pós-parto são as principais causas da baixa fertilidade
nos rebanhos bovinos. Para minimizar estes problemas uma das biotecnologias recomendadas é o
emprego da Inseminação Artificial em Tempo Fixo (IATF). O trabalho avaliou o uso de GnRH no
momento da IATF e o número de Dias Pós-Parto (DPP) sobre o desempenho reprodutivo. Foram
utilizadas 32 vacas de corte com cria ao pé, 15 vacas formaram o grupo GnRH e 17 o grupo controle.
As vacas estavam com data média de 74 DPP por ocasião da IATF.
Os animais formavam um grupo homogêneo sendo manejados em iguais condições. As vacas
receberam no dia “0” 2 mg de benzoato de estradiol e implante intravaginal de progesterona usado
previamente (2º uso), no 6º dia foi aplicado 0,375 mg de Cloprostenol Sódico e no 8º dia, pela
manhã, foram retirados os implantes, separados os bezerros e foi aplicado 0,5 mg de cipionato de
estradiol. No dia 10º dia pela tarde procedeu-se a IATF. Neste momento, aleatoriamente, de cada
duas vacas uma recebia 100μg de análogo sintético ao GnRH. Sete dias após a IATF os animais
Carlos Santos Gottschall – Médico Veterinário. Mestre em Zootecnia. Curso de Medicina Veterinária da
ULBRA.
Carla Tiane Dal Cortivo Martins, Milena de Vargas Schüler, Jéssica Magero – Aluna de Graduação do Curso
de Medicina Veterinária da ULBRA/RS.
Marcos Rosa de Almeida – Aluno de Graduação do Curso de Medicina Veterinária da ULBRA e Bolsista de
Iniciação Científica – PROICT/ULBRA.
Jean Carlos dos Reis Soares – Médico Veterinário do Campo Experimental da ULBRA. Mestrando em Zootecnia
– UFRGS.
Hélio Radke Bittencourt – Estatístico, Mestre em Sensoriamento Remoto e Professor Assistente do Departamento
de Estatística da PUCRS.
Rodrigo Costa Mattos, Ricardo Macedo Gregory – Médico Veterinário. PhD. Pesquisador do CNPq. Professor
da Faculdade de Medicina Veterinária da UFRGS/RS
Endereço para correspondência: Av. Farroupilha, 8001, Bairro São Luís, CEP 92420-280. Canoas/RS. E-mail:
[email protected]
Veterinária em Foco
Canoas
v.7
n.2
p.124-134
jan./jun. 2010
foram alocados em potreiro único com mais 35 vacas e 2 touros por mais 60 dias. Avaliou-se
os efeitos da aplicação do GnRH sobre a Taxa de Prenhez a IATF (TPI), Taxa de Prenhez Final
(TPF) e a influência dos Dias Pós Parto (DPP) sobre a TPI e TPF. A TPI foi de 46,7% e 35,3%,
respectivamente para as vacas do grupo GnRH e controle (P>0,05). A TPF foi de 53,3% e 64,7%,
respectivamente para as vacas do grupo GnRH e controle (P>0,05). Não sendo encontrada relação
no uso do GnRH com as TPI e TPF, para fins analíticos formou-se dois grupos, um grupo (14 vacas)
com média de 57 ±18,4 dias pós parto (DPP57) e outro grupo (18 vacas) com média de 88 ±9,1
dias pós parto (DPP88). Para os grupos DPP57 e DPP88 a TPI foi respectivamente de 42,9% e
38,9% (P>0,05); e a TPF respectivamente de 64,3% e 55,6%, (P>0,05). Não foi constatado efeito
no uso do GnRH nem do DPP sobre a TPI e TPF.
Palavras-chave: Bovinos de corte. Reprodução. IATF. Dias pós-parto.
Effects of the use of GnRH in the moment of fixed-time
artificial insemination and postpartum days on the pregnancy
of the nursing beef cows
ABSTRACT
The lack of estrous detection and the postpartum anestrous are the largest causes of the low
fertility in the beef cattle herds. To minimize these problems one of the recommended biotechnology
it is the use of the fixed-time artificial insemination (TAI). This work evaluated the use of GnRH
at the moment of TAI and the postpartum days (PPD) on the reproductive performance. Data of
the thirty two cows rearing calves were used. Fifty cows formed the group GnRH and 17 the
group control. The PPD of the cows were in medium 74 days for occasion of TAI. The animals
formed one homogeneous group being handled equally. All cows received in the day “0” 2 mg of
estradiol benzoato and one intravaginal implant content progesterone of 2nd use. On the 6th day was
applied 0,375 mg of sodic cloprostenol and in the 8th day, by the morning, the implants were take
off and the calves were separated temporarily and were applied 0,5 mg of estradiol cipionate. On
the 10th day at the afternoon TAI was done. At this time randomly, one of each two cows received
100 µg of synthetic analogue to GnRH. Seven days after TAI the animals were allocated into one
field with more 35 cows and 2 clean-up bulls during 60 days. It was evaluated the effects on the
GnRH application on the Pregnancy rate at TAI (PRTAI) and the pregnancy rate after clean-up
bulls (PRB). The effects of the PPD were analyzed on the PRTAI and PRB. The PRTAI was of
46.7% and 35.3%, respectively for the cows of the groups GnRH and control (P>0.05). The PRB
was of 53.3% and 64.7%, respectively for the cows of the group GnRH and control (P>0.05).
There was not relationship by the use of GnRH with PRTAI and PRB. For analyze the PPD it
was formed two groups. One group (14 cows) with average of 57 ± 18.4 PPD (PPD57) and other
group (18 cows) with average of 88 ± 9.1 PPD (PPD88). In the groups PPD57 and PPD88 the
PRTAI was respectively 42.9% and 38.9% (P>0.05); and the PRB was respectively 64.3% and
55.6% (P>0,05). There was not effect in the use of GnRH at the moment of TAI and nor effect of
PPD on PRTAI and PRB.
Keywords: Beef cattle. Postpartum days. Reproduction. TAI.
Veterinária em Foco, v.7, n.2, jan./jun. 2010
125
INTRODUÇÃO
O desempenho reprodutivo é um dos principais indicadores de produtividade
de um sistema de produção de pecuária bovina e está diretamente relacionado com a
sanidade, nutrição, genética e manejo adequado do mesmo (ROVIRA, 1996). Para a
obtenção da máxima eficiência reprodutiva de um rebanho é necessário que cada vaca
produza um bezerro por ano (THOMAS, 1992). Sendo a gestação média de 280 dias, é
necessário que as vacas concebam até 80 e 85 dias pós-parto para atingirem esta meta.
No entanto, a maioria das vacas no pós-parto está em anestro podendo não conceber no
período esperado (YAVAS; WALTON, 2000). No intervalo parto-concepção, se deve
considerar o prazo de involução uterina que em média dura 40 dias, restando apenas
outros 40 dias em média para uma nova concepção (HAFEZ; HAFEZ, 2004).
Muitas são as biotecnologias disponíveis para aumentar os índices reprodutivos,
destacando-se inseminação artificial em tempo fixo (IATF), a qual visa sincronizar a
ovulação possibilitando inseminar os animais em dia e horário pré-determinado. Esta
técnica elimina a necessidade da detecção de estro, sendo este, o principal problema da
Inseminação Artificial (IA) e traz vantagens também como a concentração de parições no
início da temporada, favorecendo a repetição de cria na temporada de monta subsequente
(FERRAZ et al., 2008; GOTTSCHALL et al., 2008).
A manipulação da atividade ovariana com produtos exógenos permite a sincronização
da ovulação. Atualmente, existem diversos tipos de protocolos para a IATF, sendo a
combinação dupla, tripla ou maior de produtos a base de prostaglandinas, progestágenos,
estrógenos, GnRH e eCG os hormônios mais utilizados. (GOTTSCHALL et al., 2008).
A administração de análogos sintéticos ao GnRH exerce uma função fisiológica
nas fêmeas, induzindo o pico pré-ovulatório de LH (hormônio luteinizante) e
consequentemente a ovulação e/ou a luteinização do folículo induzindo uma nova onda
de crescimento folicular (GOTTSCHALL et al., 2008). Segundo Lucy e Stevenson
(1986) o GnRH aplicado antes da inseminação pode aumentar fertilidade por sua ação
direta ou indireta (por secreção de LH) agindo sobre o folículo ovulatório, resultando
em uma ação semelhante a que ocorre em uma inseminação depois do estro espontâneo.
Estudos prévios em bovinos de leite indicaram que o tratamento com análogo sintético
do GnRH aumentou (SCHELS; MOSTAFAWI, 1978; LEE et al., 1983) ou não a
taxa de concepção de primeiro-serviço (LEE et al., 1983). De forma similar Mee
et al. (1990) descrevem que GnRH administrado ao início do estro não apresentou
efeito sobre a taxa de concepção em vacas de leite. Entretanto, Lee et al. (1983)
identificaram efeito consistente na administração do GnRH sobre o aumento de
fertilidade em vacas repetidoras de estro. Kaim et al. (2003) também encontraram
resultados variados sobre as taxas de prenhez de vacas submetidas a inseminação
após a aplicação de GnRH. Os autores identificaram efeitos positivos do GnRH em
primíparas, mas não em multíparas. Nesse estudo, animais com condição corporal
inferior também foram beneficiadas pela aplicação do GnRH, enquanto animais com
126
Veterinária em Foco, v.7, n.2, jan./jun. 2010
condição corporal superior não foram favorecidos pela aplicação de GnRH. A maioria
dos estudos prévios foi conduzido com vacas leiteiras, que apresentam metabolismo
diferenciado em relação a vacas de corte. Perry e Perry (2009) não encontraram
efeitos favoráveis da aplicação de GnRH sobre as taxas de prenhez por ocasião da
inseminação artificial em vacas e novilhas de corte.
Segundo Short et al., (1990); Williams, (1990) e Yavas e Walton (2000) o anestro
pós-parto é o fator de maior impacto negativo sobre a fertilidade, aumentando o
intervalo do parto ao primeiro cio, e reduzindo a produção de bezerros. A ausência de
ciclicidade é consequência de falha na ovulação de folículos dominantes ocasionados
pela baixa concentração de LH. Segundo Madureira e Pimentel (2005a) o tratamento
com progestágenos estimula o desenvolvimento e a maturação de folículos dominantes,
em vacas em anestro, por aumentar a secreção de LH, estimular o desenvolvimento de
receptores de LH e a síntese de estradiol. Nesse sentido Penteado et al. (2006) estudaram
o desempenho reprodutivo de 2.489 vacas lactantes submetidas a IATF entre 40 a 100
dias após o parto. Os autores dividiram os animais em 5 grupos, resultando em grupo
P40-49 (n=142) os animais foram inseminados entre 40 a 49 dias; grupo P50-59 (n=759)
entre 50 a 59 dias; grupo P60-69 (n=263) entre 60 a 69 dias; grupo P70-79 (n=684)
entre 60 a 69 dias e grupo P>80 (n=641) acima de 80 dias após o parto. A taxa de
prenhez a IATF foi, respectivamente, de 52,82% (75/142); 55,20% (419/759); 52,09%
(137/263); 56,29 (361/684) e 52,11 (334/641); sem diferença significativa (P>0,05).
Reforçando os resultados Sá Filho et al. (2009) em estudo retrospectivo com 64.033
animais não encontraram efeitos dos dias pós parto sobre a taxa de prenhez em vacas
de corte submetidas a IATF a partir de 30 dias pós parto.
Devido a existência de resultados conflitantes e poucos trabalhos que associem
a administração de GnRH por ocasião da IATF em vacas de corte lactantes o presente
trabalho procurou avaliar o efeito da aplicação do GnRH no momento da IATF sobre
a resposta reprodutiva de vacas de corte e a relação do resultado com o número de
dias pós-parto.
MATERIAL E MÉTODOS
O experimento foi realizado no Campo Experimental da ULBRA (CEULBRA),
localizado na cidade de Montenegro, Rio Grande do Sul. Foram utilizadas 32 vacas de
corte, com cria ao pé, em regime de pastejo de campo nativo, com escore de condição
corporal média de 2,5 em uma escala de 1 a 5 (LOWMAN, 1973). Todas as vacas
estavam com data média de 74 dias pós-parto.
As vacas receberam no dia “0” 2 mg de Benzoato de Estradiol intramuscular
(IM) quando da colocação dos implantes (Primer® – Tecnopec) de 2º uso. No 6º dia
foi aplicado 0,375 mg de Cloprostenol Sódico (IM) (Sincrocio®) em todos os animais.
No 8º dia (36 horas após a PGF2α) foi realizada a remoção dos implantes, o desmame
Veterinária em Foco, v.7, n.2, jan./jun. 2010
127
temporário dos terneiros e a aplicação de 0,5 mg de Cipionato de Estradiol (IM). No dia
10, a tarde, foi realizada a IATF (Figura.1). Neste momento os animais foram divididos
em dois grupos. Um grupo (15 animais) recebeu 100 µg análogo sintético ao GnRH
(acetato de buserelina – Sincroforte®), enquanto o grupo controle (17 animais) que
não recebeu o análogo ao GnRH. Após a inseminação os terneiros foram realocados
com as vacas.
Sete dias após a IATF os animais foram alocados em potreiro único com mais
35 vacas e 2 touros por mais 60 dias. O diagnóstico de gestação foi realizado aos 42 e
aos 137 dias após a IATF por palpação retal.
Para fins analíticos, as mesmas vacas foram divididas em dois grupos conforme média
de intervalo entre partos. Um grupo (14 vacas) com média de 57 ±18,4 Dias Pós-Parto
(DPP57) e outro grupo (18 vacas) com média de 88 ±9,1 Dias Pós-Parto (DPP88).
A análise estatística dos resultados foi feita através do teste do Qui-Quadrado.
Implantes
Remoção implantes
+ BE
PGF2α
+ CE
IATF +GnRH
PRIMER
D0
– GnRH
RT
D6
D8
D10
FIGURA 1 – Protocolo utilizado para sincronização da ovulação.
BE-Benzoato de Estradiol; PGF2α-Prostaglandina; CE-Cipionato de Estradiol;
PRIMER – Dispositivo intravaginal de progesterona; RT- Retirada terneiros; GnRH(análogo sintético ao hormônio liberador de gonadotrofinas – Acetato de buserelina
–Sincroforte®).
RESULTADOS E DISCUSSÃO
A TPI foi de 46,7% e 35,3% respectivamente para as vacas do grupo GnRH e
grupo controle (P>0,05). A TPF foi de 53,3% para as vacas do grupo GnRH e 64,7%
para o grupo controle (P>0,05) (Tabela 1).
128
Veterinária em Foco, v.7, n.2, jan./jun. 2010
TABELA 1– Efeitos do uso de GnRH no momento da IATF sobre as taxas de prenhez a IATF (TPI) e prenhez
após o repasse de touros (TPF) em vacas de corte com cria ao pé.
Grupos
Número
TPI
TPF
GnRH
15
46,7% (7)
53,3% (8)
Controle
17
35,3% (6)
64,7% (11)
Média
32
40,6% (13)
59,4% (19)
Os valores entre parênteses se referem ao número de animais prenhes.
Segundo Schels et al. (1978) e Lee et al. (1983), o tratamento com GnRH na IA,
após a detecção de estro, não teve efeito na taxa de concepção ao primeiro serviço
em vacas de leite. Entretanto, as taxas de prenhez em vacas repetidoras de cio foram
aumentadas com o mesmo tratamento (LEE et al.; 1983, MEE et al.; 1993). Perry e
Perry (2009) não encontraram melhora nas taxas de concepção ao primeiro serviço
com administração de GnRH na IA em vacas de corte. Concordando com o presente
experimento onde também não foi encontrada relação entre o uso do GnRH na IATF
com as TPI e TPF.
Segundo alguns autores (STEVENSON et al. 2000; FERNANDES et al. 2001;
BARUSELLI et al. 2002) os protocolos para IATF que utilizam GnRH para induzir a
ovulação, ao contrário do que ocorre em vacas de leite, ainda apresentam resultados
variáveis quando usados em vacas de corte com cria ao pé, resultando muitas vezes
em baixas taxas de prenhez. Segundo os autores, os baixos resultados de concepção
provenientes da IATF estão relacionadas com a incapacidade do folículo maior resultar
em processo ovulatório. O pico pré-ovulatório de LH desencadeia a ovulação, que
em vacas europeias, ocorre quando o folículo adquire um diâmetro médio de 12 mm
(SARTORI et al. 2001). No momento do pico de LH a assincronia do crescimento
folicular e o tamanho reduzido do folículo dominante, são desafios a serem vencidos
para possibilitar aumento das taxas de ovulação e prenhez da IATF (SIQUEIRA, et
al. 2008).
Na análise dos DPP, entre os animais dos grupos DPP57 e DPP88, a TPI foi
respectivamente de 42,9% e 38,9% (P>0,05); e a TPF respectivamente de 64,3% e
55,6%, (P>0,05) (Tabela 2).
Veterinária em Foco, v.7, n.2, jan./jun. 2010
129
TABELA 2 – Efeitos do número de dias pós-parto (DPP) sobre as taxas de prenhez a IATF (TPI) e prenhez
após o repasse de touros (TPF) em vacas de corte com cria ao pé.
Grupos
Número
TPI
TPF
DPP57
14
42,9% (6)
64,3% (9)
DPP88
18
38,9% (7)
55,6% (10)
Média
32
40,6% (13)
59,4% (19)
Os valores entre parênteses se referem ao número de animais prenhes.
Na avaliação do número de dias pós-parto, o presente experimento não encontrou
diferença significativa entre os grupos analisados, DPP57 e DPP88 em relação a TPI
e TPF.
Segundo Baruselli e Marques (2002) em experimento com 211 vacas da raça
Brangus com boa condição corporal e com média de 63 dias de período pós parto,
observaram que os animais entre o período de 40 e 50 dias, tiveram menor taxa de
concepção que animais com 61 e 70 dias pós parto. Discordando de Meneghetti et al.
(2008) que não encontraram benefícios a IATF com o aumento dos DPPs. De forma
similar a Meneghetti, Penteado et al. (2006) e Sá Filho et al. (2009) não encontraram
efeitos dos dias pós parto sobre a taxa de prenhez em vacas de corte submetidas a
IATF a partir, respectivamente, de 40 e 30 dias pós parto. Convém ressaltar que nos
experimentos de Penteado et al. (2006) e Sá Filho et al. (2009), os autores utilizaram
eCG (Gonadotrofina coriônica equina) nos protocolos de IATF, produto recomendada
para animais em anestro ou submetidos a IATF antes de 40 dias pós parto. No presente
experimento, não utilizamos o eCG.
No presente experimento a TPI média foi 40,6%. Silva et al. (2004) verificaram
48,0% de concepção quando o GnRH foi aplicado no momento da IATF. Baruselli et al.
(2003) obtiveram 59,0% de prenhez na IATF precedida da administração de GnRH. Ayres
et al (2006a) e Ayres et al. (2006b), diagnosticaram 66,7% e 61,59% de prenhez nas vacas
que receberam GnRH. Vaca et al. (2007) observaram 62% de prenhez nas vacas tratadas
com GnRH por ocasião da IATF. Meneghetti et al. (2009) observaram 54,2% de prenhez
em vacas Nelore induzidas a ovulação com GnRH. Ao confrontarmos os resultados
relatados na literatura com a TPI média, observa-se que a administração do GnRH no ato
da inseminação artificial, com o intuito de induzir a ovulação e aumentar a capacidade de
concepção, não favoreceu à prenhez da IATF. Entretanto, resultados semelhantes e até
mesmo inferiores ao deste experimento foram observados em outras pesquisas. Ratificando,
Sá Filho et al. (2010) observaram que 40,1% das vacas que receberam GnRH para induzir
a ovulação emprenharam. Souza et al. (2009) observaram apenas 28,9% de prenhez nas
vacas Holandesas que receberam somente GnRH no momento da IATF. Após o segundo
130
Veterinária em Foco, v.7, n.2, jan./jun. 2010
diagnóstico de gestação para a avaliação da taxa de prenhez final encontrou-se uma TPF
média, 59,4%. Outros experimentos mostram que ao final da estação de acasalamento,
iniciada pelo uso de IATF, taxa de prenhez superior à atingida neste experimento é
factível. Em trabalho com IATF Baruselli et al. (2002) obtiveram 79,0% de prenhez ao
final de um período de repasse de 90 dias. Gottschall et al. (2005) verificaram 70,6% de
prenhez após o repasse de touros. Madureira et al. (2005b) obtiveram 92,7% após 90 dias
de acasalamento. Entretanto, a baixa taxa de ciclicidade das fêmeas, ou seja, o anestro no
período do acasalamento é um fato de importante impacto sobre os resultados reprodutivos
(BARBOSA, et al. 2007). Segundo Gottschall et al. (2005), o desempenho reprodutivo da
vaca está relacionado com a condição corporal do animal e este é reflexo direto do manejo
nutricional à que elas estão condicionadas. Nota-se então que à medida que melhora a
condição fisiológica da vaca aumenta a chance dela emprenhar (FERNANDES, et al. 2001).
Essa relação foi mostrada por Gottschall et al. (2005), onde os autores confrontaram a taxa
de prenhez de vacas com cria ao pé, que geralmente estão em anestro por ação da mamada e
manejo alimentar desfavorável, e vacas solteiras. Estes autores verificaram 58,6% e 83,3%
de prenhez para vacas com cria ao pé e vacas solteiras, respectivamente. Silva et al. (2007)
observaram 62,50% de prenhez final. Bastos et al. (2004) observaram que a prenhez variou
de 30,0% para vacas com ECC=2 a 66,0% para vacas com ECC=3. Segundo Bastos et al.
(2004), uma das possibilidades para a baixa taxa de prenhez de vacas com baixa condição
corporal seja o anestro ou a ovulação de oócitos de baixa qualidade, em decorrência de um
balanço energético negativo em vacas magras. Estas razões podem estar relacionadas ao
resultado da TPF encontrado neste experimento, possivelmente pela baixa taxa de ciclidade
resultante do anestro, atingindo valores inferiores à outros relatados (BARUSELLI, et al.
2002; GOTTSCHALL, et al. 2005; MADUREIRA, et al.2005b). Contudo, outros fatores
também influenciam a resposta reprodutiva ao final da estação de acasalamento precedida de
IATF. Segundo Gottschall et al. (2008), o repasse com touros após a IATF deve preconizar a
proporção adequada de touro:vaca, evitando a perda de capacidade reprodutiva do touro e a
diminuição da taxa de prenhez devido a um possível retorno ao estro sincronizado. Conforme
Barbosa et al. (2007), idade, raça, condição corporal, exame andrológico, libido, hierarquia
social, índice de cios, bem como a topografia, tipo de pastagens e presença de aguadas são
fatores que influenciam a capacidade reprodutiva dos animais em acasalamento.
CONCLUSÕES
Os resultados do presente experimento não apresentaram relação significativa da
administração de GnRH no momento da IATF sobre as TPI e TPF. O número de dias pós
parto não afetou o desempenho reprodutivo de vacas de corte submetidas a IATF.
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Recebido em: ago. 2009
134
Aceito em: fev. 2010
Veterinária em Foco, v.7, n.2, jan./jun. 2010
Perda reprodutiva causada pelo footrot em
dois rebanhos ovinos no Rio Grande do Sul
Luiz Alberto Oliveira Ribeiro
Gustavo Felipe Lopes
Fernando Magalhães de Souza
Carla Menger Lehugeur
RESUMO
O footrot (FR) dos ovinos é considerado o maior problema sanitário da ovinocultura gaúcha.
Existem poucas referências sobre o impacto do FR na produção ovina. O presente trabalho teve
como objetivo determinar a influência dessa infecção na porcentagem de prenhez (PP) de ovinos
criados a campo no RS. Foram estudados dois rebanhos, o rebanho 1, com 880 ovelhas Merino
Australiano, criadas no município de Quaraí (RS); o rebanho 2, com 65 ovelhas cruzas (Crioula x
Texel), criadas em Osório (RS). As ovelhas foram encarneiradas nos meses de outono (março-abril),
com 2% de carneiros férteis. No início do encarneiramento foram examinados todos os cascos de
todas as ovelhas dos dois rebanhos, quando foi estimada a gravidade das lesões numa escala de
1 a 4. O diagnóstico de gestação foi realizado por ultrassonografia aos 60 dias após a retirada dos
carneiros. No rebanho 2 foi estimada, também, a condição corporal (CC) das ovelhas no início
do experimento. A PP das ovelhas sadias e infectadas nos rebanhos 1 e 2 foram respectivamente:
91 87%; 81 e 44%, mostrando diferença estatisticamente significativa entre ovelhas do mesmo
rebanho (P<0,05). A prevalência do FR nos rebanhos 1 e 2 foi de 14 e 26,7%, respectivamente.
Finalmente, no rebanho 2, a CC das ovelhas sadias (3,32) foi superior a do grupo infectado (2,45)
(P<0,001). Os dados sugerem que nesse rebanho, a baixa PP das ovelhas infectadas está associada
a menor CC, detectada no início do encarneiramento.
Palavras-chave: Footrot. Perdas reprodutivas. Percentagem de prenhez. Ovelha. Escore
da condição corporal.
Reproduction losses caused by footrot on two sheep flocks of Rio
Grande do Sul State, Brazil
ABSTRACT
Ovine footrot (FR) is the most pressing problem of the sheep industry of Rio Grande do
Sul (RS) the southern most State of Brazil. No accurate information is available concerning the
economic impact of FR upon the local sheep industry. The aim of this paper was to evaluated the
losses caused by this condition on the pregnancy percentage (PP) of sheep flocks reared in natural
Luiz Alberto Oliveira Ribeiro é Médico Veterinário, Professor Associado do Departamento de Medicina Animal
da Faculdade de Veterinária (UFRGS).
Gustavo Felipe Lopes e Fernando Magalhães de Souza são graduandos em Medicina Veterinária (UFRGS) e
bolsistas do Programa de Iniciação Científica PIBIC – CNPq/UFRGS.
Carla Menger Lehugeur é graduanda em Medicina Veterinária (UFRGS).
Endereço para correspondência: Av. Bento Gonçalves, 9090, P. Alegre, 91540-000, E mail: [email protected]
Veterinária em Foco
Canoas
v.7
n.2
p.135-140
jan./jun. 2010
pastural areas of RS. The study was carried out in two flocks. Flock 1, comprising 880 Australian
Merino ewes, grazed in the district of Quaraí (RS); Flock 2 comprising 65 cross ewes (Crioula x Texel),
grazed in the district of Osorio (RS). The ewes were naturaly mated during autumn (March-April),
using 2% of fertile rams. At the beginning of the mating season all sheep feet were acessed for footrot
lesions, when the severity of the lesions were graded in a scale from 1 to 4. The ewes were scanned
60 days after the finishing of the breeding period. The flock 2 had the ewes body condition score
(CS) evaluated at the time of ram intruduction. The PP of the infected and healthy ewes in the flocks
1 and 2 was: 91 and 87%; 81 and 44%, respectively, showing statistical significancy between ewes
of the same flock (P<0,05). The prevalence of FR on flocks 1 and 2 was 14 and 26,7%, respectively.
Finally, in flock 2, the CS of health ewes (3,32) was significantly higher than the infected ones (2,45)
(P<0,001). The data presented sugest that, at least in this flock, the lower PP observed on the infected
ewes is associated to the lower CC mean detected at the beginning of the breeding season.
Keywords: Footrot. Ovine reproduction losses. Pregnancy rate in sheep. Body condition
score.
INTRODUÇÃO
O footrot (FR) é uma enfermidade contagiosa do casco de ovinos, que leva à
manqueira e consequentemente à redução da produtividade de rebanhos infectados.
A doença é causada pelo Dichelobacter nodosus, cuja proliferação na camada de
cornificação da epiderme leva ao descolamento do casco (EGERTON et al. 1969).
A base dessa ação está ligada a uma potente protease produzida por esse organismo
(ROBERTS; EGERTON, 1969). A doença é prevalente em rebanhos ovinos no Rio
Grande do Sul (RS) e é considerada como o maior problema sanitário da ovinocultura
gaúcha, sendo talvez, em ordem de importância econômica, superado somente pela
verminose gastrointestinal (RIBEIRO, 1978).
Há poucos estudos sobre o impacto do FR na produção ovina. Beveridge (1941),
observando ovinos na Austrália, cita que as perdas econômicas estariam relacionadas
com a redução da condição corporal e o alto custo do tratamento de ovelhas infectadas.
Posteriormente a essa citação, estudos feitos nesse mesmo país, detectaram uma
diminuição de 10% na taxa de crescimento da lã e de 11% no peso vivo em ovinos
infectados com FR (SYMONS, 1978; MARSHALL et al., 1991).
Há pouca informação sobre o impacto do FR na eficiência reprodutiva de rebanhos
ovinos, tanto na literatura internacional, como na brasileira. O presente trabalho teve
como objetivo determinar a influência do FR na taxa de prenhez de dois rebanhos
ovinos, criados extensivamente no RS
MATERIAIS E MÉTODOS
As observações foram realizadas em dois rebanhos ovinos comerciais do
RS. O rebanho 1, constituído por 880 ovelhas da raça Merino Australiano, criadas
em condição extensiva em uma propriedade do município de Quaraí, na região da
Fronteira Oeste do Estado; Rebanho 2, constituído de 65 ovelhas cruzadas (Crioula
X Texel) , criadas em condições extensivas em uma propriedade do município de
136
Veterinária em Foco, v.7, n.2, jan./jun. 2010
Osório, na região Litorânea do RS. As ovelhas dos dois rebanhos foram encarneiradas
durante os meses de outono (março-abril), por monta natural, com 2% de carneiros.
Os carneiros usados foram submetidos a exame dos órgãos genitais externos e exame
biológico do sêmen obtido por eletro-ejaculação. Foram usados somente carneiros que
apresentaram resultados compatíveis com os de animais férteis em exame realizado
antes do encarneiramento.
No início do experimento (dia zero do encarneiramento), foram examinados todos
os cascos de todos os ovinos. A gravidade das lesões foi estimada usando escala proposta
por RIBEIRO (1981), onde zero corresponde à ausência de FR, dois dermatite interdigital
sem descolamento do casco, três descolamento da parte posterior do casco e quatro a
uma lesão grave, envolvendo descolamento de todo o casco. Ovinos foram considerados
como infectados quando um ou mais cascos mostravam graus de 3 ou 4, ou tivessem dois
cascos com lesão de grau 2. Os animais considerados como infectados foram mantidos
identificados com brincos numerados, até a realização do diagnóstico de gestação.
O diagnóstico de gestação foi realizado aos 60 dias após a retirada dos carneiros,
sendo as ovelhas examinadas em pé, sem jejum prévio, utilizando um brete próprio para tal
exame. O exame foi realizado pelo método de ultrassonografia através da região inguinal
direita do animal, utilizando um aparelho modelo Falco, marca Pie Medical, equipado com
um transdutor convexo de 3,5 Mhz. Os dados de cada rebanho, referentes ao número de
ovelhas vazias e o total de ovelhas examinadas, foram registrados em fichas individuais
por propriedade. A percentagem de prenhez (PP) foi calculada conforme a fórmula: PP
= número de ovelhas prenhes / número de ovelhas acasaladas x 100.
No início do encarneiramento (dia zero), no rebanho 2, foi estimada a Condição
Corporal (CC) de todos os animais, usando o método descrito por RUSSEL et al.
(1969). A precipitação pluviométrica mensal e temperatura média, nas áreas das duas
propriedades, durante o período do encarneiramento (março/abril-2007) foi obtida
através do Centro de Meteorologia Aplicada – FEPAGRO/RS.
A análise estatística dos dados foi feita pelo teste do Qui-quadrado e análise da
variância.
RESULTADOS
A PP e a prevalência de FR nas ovelhas dos dois rebanhos estudados são mostradas
na tabela 1. Conforme mostram os dados, a PP no grupo de ovelhas infectadas foi
sempre menor. Especialmente no rebanho 2 essa diferença foi bastante nítida, uma vez
que o grupo sadio mostrou PP=81%, contra 44% (P<0,05), no rebanho infectado. Os
dados mostram também que a prevalência do FR foi maior no rebanho 2 (27,6%) do
que no rebanho 1, cuja prevalência observada foi de 14%. A PP média nos dois grupos
de ovinos dos rebanhos estudados mostrou diferença significativa, sendo a prenhez dos
grupos infectados e não infectados 77,1 e 87,2% respectivamente (P<0,05).
Veterinária em Foco, v.7, n.2, jan./jun. 2010
137
No rebanho 2, onde foi possível estimar a CC, no momento do encarneiramento,
do grupo de ovelhas livres e infectadas com FR, os valores observados foram de 3,32
para o grupo livre de FR e 2,45 para o grupo infectado(P< 0,001).
A precipitação pluviométrica média mensal registrada durante o período do
encarneiramento foi de 280 e 300mm, na propriedade 1 e 2, respectivamente. A
temperatura média nos meses de março e abril variaram de 24,05 e 21,05ºC, em Quaraí
e de 25,2 e 22,05ºC para Osório.
TABELA 1 – Percentagem de prenhez (PP) em ovelhas infectadas e livres de footrot e prevalência da infecção,
em dois rebanhos ovinos do RS, outono/2007.
Grupo
Rebanho
1
Sadios
a-b
2
91a
87ª
b
Infectados
81
44b
Prevalência
14
26,7
Médias seguidas por letras diferentes na mesma coluna apresentam diferença estatística significativa (P<0,05).
DISCUSSÃO
A ocorrência de surtos de FR tem sido relacionada a umidade do solo e a presença
de ovinos cronicamente infectados no rebanho. Na Austrália, em áreas endêmicas, o
início de surtos está associado a precipitações continuadas mensais de 50mm por dois
a três meses e temperatura ambiental acima de 10ºC (GRAHAM; EGERTON, 1968).
No RS, a transmissão da doença é mais frequente no outono e primavera quando
condições de umidade e temperatura são favoráveis. O manejo intensivo de ovinos
nestas duas estações (outono – encarneiramento; primavera-esquila) também favorecem
a transmissão da enfermidade (RIBEIRO, 1978).
As condições ambientais observadas nas duas propriedades estudadas, durante
o período favoreceu a transmissão do FR, uma vez que a precipitação pluviométrica
foi de 280 e 300mm nas propriedades 1 e 2, respectivamente e as temperaturas médias
mantiveram-se superior a 10ºC. Estes valores são bem superiores aos encontrados
em áreas endêmicas de FR na Austrália. A prevalência do FR no rebanho 2 foi de
aproximadamente 27%, superior a prevalência média para essa enfermidade encontrada
em rebanhos gaúchos de 18% (RIBEIRO, 1984).
Estudos mostram que a taxa de prenhez em um rebanho está relacionada com a
taxa de ovulação, concepção e mortalidade embrionária (PLANT, 1981; GUNN et al.,
138
Veterinária em Foco, v.7, n.2, jan./jun. 2010
1984) uma vez que a fertilidade dos carneiros seja garantida. Esses três fatores são,
de certa forma, influenciados pelo manejo e, principalmente, pelo nível nutricional.
Problemas sanitários, como a verminose gastrointestinal e o FR, podem agravar ainda
mais o quadro, por levarem a uma perda do estado nutricional do rebanho, conforme
sugerido por Silva (1992).
Inúmeros trabalhos têm sugerido a avaliação da CC como um método preciso
e prático de estimar o nível nutricional de um rebanho (DUCKER; BOYD, 1977;
PLANT, 1981; GUNN et al, 1984). Ribeiro (2003), observando rebanho Corriedale
no RS, encontrou correlação positiva entre CC e prenhez. No mesmo estudo, ovelhas
com CC entre 3,0 e 4,0 apresentaram a maior taxa de prenhez.
No presente trabalho, os valores de CC encontrados nas ovelhas infectadas do
rebanho 2 foram significativamente inferiores aos observados no grupo de ovelhas
sadias (2,45 e 3,32, respectivamente). O valor médio da CC das ovelhas infectadas foi
de 2,45, bem abaixo do escore relacionado com maior fertilidade em rebanhos ovinos
(RIBEIRO, et al., 2003). Nesse rebanho, a baixa porcentagem de prenhez no grupo
infectado (PP=44%) pode estar relacionada com a baixa CC causada pelo FR, uma
vez que os dois grupos foram mantidos no mesmo potreiro e expostos aos mesmos
carneiros, pelo mesmo período.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Diferenças significativas foram observadas entre as PP do grupo de ovelhas sadias
e infectadas do rebanho 1. Seria importante salientar que não foi detectado nenhuma
alteração patológica, além do footrot, que levasse a diferentes PP observadas nos dois
grupos. Nesse rebanho a prevalência de FR foi de 14%, inferior a prevalência média
descrita para rebanhos gaúchos (RIBEIRO, 1984). Finalmente, não seria correto
comparar os dados de prevalência do FR, PP nos dois rebanhos estudados. Os rebanhos
situam-se em regiões distintas e certamente diferem quanto ao manejo, nutrição,
genética entre outras.
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Recebido em: set. 2008
140
Aceito em: jun. 2009
Veterinária em Foco, v.7, n.2, jan./jun. 2010
Inquérito soroepidemiológico
para brucelose em suídeos do Brasil
Pedro Moreira Couto Motta
Antônio Augusto Fonseca Jr.
Anapolino Macedo de Oliveira
Kelly Fagundes Nascimento
Paulo Martins Soares Filho
Cláudia Vieira Serra
Aládio Lopes Jesus
Anselmo Vasconcelos Rivetti Jr.
Alberto Knust Ramalho
Pedro Moacyr Pinto Coelho Mota
Ronnie A. Assis
Marcelo Fernandes Camargos
RESUMO
A brucelose suína é uma doença infecciosa associada a abortos, infertilidade e aumento da
taxa de mortalidade de leitões desmamados por ninhada. Neste estudo, utilizando-se amostragem
aleatória foram avaliados 3027 rebanhos suídeos de 13 estados brasileiros correspondentes a três
tipos de sistema de criação com o intuito de se verificar a frequência de anticorpos para Brucella
spp por meio do teste do antígeno acidificado tamponado (AAT) e 2- mercaptoetanol (2-ME)/
soroaglutinação lenta. Observou-se uma alta ocorrência de granjas reagentes no AAT, porém
nenhuma foi reagente para Brucella spp no testes confirmatórios 2-ME/soroaglutinação lenta.
Palavras-chave: Brucelose suína. Inquérito. Soroepidemiologia.
Pedro Moreira Couto Motta – Médico Veterinário – Msc – Veterinária – Laboratório Nacional Agropecuário de
Minas Gerais
Antônio Augusto Fonseca Jr. – Farmacêutico, Msc, Doutorando – Veterinária – Laboratório Nacional Agropecuário
de Minas Gerais
Anapolino Macedo de Oliveira – Médico Veterinário, Msc – Veterinária – Laboratório Nacional Agropecuário
de Minas Gerais
Kelly Fagundes Nascimento – Médica Veterinária – Laboratório Nacional Agropecuário de Minas Gerais
Paulo Martins Soares Filho – Médico Veterinário, Msc – Laboratório Nacional Agropecuário de Minas Gerais
Cláudia Vieira Serra – Médica Veterinária, Msc – Veterinária – Laboratório Nacional Agropecuário de Minas
Gerais
Aládio Lopes Jesus – Médico Veterinário, Veterinária – Laboratório Nacional Agropecuário de Minas Gerais
Anselmo Vasconcelos Rivetti Jr. – Médico Veterinário, Msc., Doutorando – UFMG – Veterinária – Laboratório
Nacional Agropecuário de Minas Gerais
Alberto Knust Ramalho – Médico Veterinário – Veterinária – Laboratório Nacional Agropecuário de Minas
Gerais.
Pedro Moacyr Pinto Coelho Mota – Médico Veterinário, Msc., Doutor – Veterinária – Laboratório Nacional
Agropecuário de Minas Gerais.
Ronnie A. Assis – Médico Veterinário, Msc., Doutor – Veterinária – Laboratório Nacional Agropecuário de Minas
Gerais.
Marcelo Fernandes Camargos – Médico Veterinário, Msc., Doutor – Veterinária – Laboratório Nacional
Agropecuário de Minas Gerais.
Endereço para correspondência: Avenida Rômulo Joviano, s/n, Caixa Postal 50, Centro, Pedro Leopoldo, MG,
CEP 33600-000. E-mail: [email protected]
Veterinária em Foco
Canoas
v.7
n.2
p.141-147
jan./jun. 2010
Surveillance for porcine brucelosis in Brazil
ABSTRACT
Porcine brucellosis is an infectious disease characterized by abort, infertility and increased
mortality of weaned piglets. In this study, using random sampling, 3027 swine herds from three
management systems of 13 Brazilian states were evaluated for presence of antibodies for Brucella
spp using buffered Brucella antigen tests (BBAT) and 2 mercaptoethanol/slow serum agglutination
test. It was observed a high occurrence of reagent farms in the card test, but none were positive for
Brucella spp in confirmatory tests (2ME)/slow serum agglutination test.
Keywords: Porcine brucellosis. Survey. Seroepidemiology.
INTRODUÇÃO
A brucelose suína foi diagnosticada pela primeira vez em 1904 por Hutyra
como uma doença infecciosa associada a abortos, infertilidade e aumento da taxa de
mortalidade de leitões desmamados por ninhada. Esta infecção foi por muitos anos
atribuída à Brucella abortus, sendo classificada, em 1929, por Huddleston como
Brucella suis. Ainda assim, B. abortus pode infectar suídeos, principalmente aqueles
criados concomitamente com bovinos (PAULIN, 2003). Além do impacto econômico,
a B. suis é capaz de infectar, em condições naturais, o homem e outras espécies
domésticas.
A infecção por B. suis tem distribuição mundial. Poucos são os achados de
brucelose suína no país, decrescendo sua frequência de 2,19% em um levantamento
feito em 1981 (GARCIA-CARRILLO, 1987) para 0,34% nos últimos levantamentos
(BRASIL, 2000). Esse decréscimo deve-se à intensificação e integração da produção
suína em escala industrial (POESTER et al., 2002). Entretanto, não existem relatos de
estudos amplos sobre a presença de anticorpos para brucelose suína no Brasil.
O objetivo do presente trabalho foi avaliar a frequência de anticorpos para Brucella
spp. em amostras de soro de suídeos colhidas para realização da vigilância ativa para
manutenção da condição de Zona Livre de Peste Suína Clássica (PSC) dos estados
envolvidos no ano de 2003.
MATERIAL E MÉTODOS
O presente inquérito foi realizado na região do país representada pelos estados da
Bahia, Espírito Santo, Goiás, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Paraná,
Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Santa Catarina, São Paulo, Sergipe, Tocantins e
pelo Distrito Federal. Dessa forma, para a realização do inquérito soroepidemiológico,
especialmente em relação à alocação e distribuição das amostras, fez-se necessário
subdividir essa grande região em outras regiões menores. Com base em indicadores
apropriados e de características como proximidade, contiguidade e intensidade de
142
Veterinária em Foco, v.7, n.2, jan./jun. 2010
relacionamento referente ao trânsito e comercialização de animais, buscou-se agrupar
a população em subpopulações, envolvendo rebanhos com características estruturais
e produtivas semelhantes e relacionadas (maior homogeneidade). Foram colhidas
amostras de quatro subpopulações para Granjas de Suínos, Granjas de Javalis e
Criatórios de Suídeos, distribuídas da seguinte maneira:
• Subpopulação 1 – Rio Grande do Sul
• Subpopulação 2 – Santa Catarina
• Subpopulação 3 – Paraná
• Subpopulação 4 – Demais estados da Zona Livre para PSC (SP, MG, RJ, ES,
BA, SE, MS, GO, MT, TO, DF).
As granjas de suínos foram agrupadas de acordo com o número de matrizes
em granjas de 1 a 5, 6 a 25, 26 a 100, 101 a 500 e com mais de 500 matrizes. Foram
amostradas todas as granjas de javalis existentes nos estados envolvidos e para os
criatórios de suídeos foi utilizado como referência o cadastro atualizado de propriedades
com bovinos, pois na maioria dessas propriedades havia criação de suínos para consumo
próprio. O estudo amostral foi realizado em duas etapas: em primeiro lugar foi sorteado,
de forma aleatória, um número apropriado de unidades primárias de amostragem
(propriedades), e posteriormente buscou-se determinar o status do rebanho (infectado
ou não), escolhendo, de forma aleatória, um número apropriado de animais (unidades
secundárias).
Foram realizados dois testes em série, sendo um para triagem e outro confirmatório
para amostras reagentes. Como teste de triagem, foi empregada a prova do Antígeno
Acidificado Tamponado (AAT), utilizando suspensão inativada de Brucella abortus
amostra 1119-3. As amostras reagentes foram submetidas à prova do 2 mercaptoetanol
(2-ME) e soroaglutinação lenta (SAL) (OIE, 2004). No que diz respeito ao critério
de interpretação, adotou-se o da OIE (2004), em que se tratando de suídeos, os testes
não podem ser correlacionados ao indivíduo e sim ao rebanho, levando-se em conta a
situação do mesmo e a área em que se situa, ou seja; um animal positivo no plantel nos
testes confirmatórios (2-ME/SAL), considera-se que o plantel é positivo. Os exames
laboratoriais foram realizados no Laboratório Nacional Agropecuário de Minas Gerais
(LANAGRO/MG).
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Foram amostrados 320 granjas de suínos e 320 criatórios de suídeos (explorações
de subsistência, sem característica comercial) em cada uma das subpopulações 1, 2 e
3 e amostradas todas as granjas de javalis nas três subpopulações. Na subpopulação 4
foram amostradas 313 granjas de suínos, 639 criatórios de suídeos e todas as granjas
de javalis, perfazendo um total de 3027 granjas (Tabela 1).
Veterinária em Foco, v.7, n.2, jan./jun. 2010
143
TABELA 1 – Caracterização da amostragem.
Extrato de produção considerado
Granjas de Suínos
Granjas de Javalis
(GS)
(JA)
Populações
Granja Amostras Granja Amostras TOTAL
Criatórios de Suídeos
(CS)
Granja Amostras Granjas Amostras
Subpopulação 1
320
4569
57
744
320
1471
697
6784
320
4955
46
405
321
649
687
6002
320
3968
13
135
320
1335
653
5438
313
5558
34
517
639
3028
986
9076
TOTAL 1.273
19.050
150
1.761
1.600
6.483
3.023
27.300
Subpopulação 2
Subpopulação 3
Subpopulação 4
A Tabela 2 mostra a porcentagem de granjas e criatórios considerados reagentes
no AAT, os quais foram considerados negativos nos testes confirmatórios de 2-ME/
SAL. Como observado, houve uma grande frequência de reativos nesse teste. Este
fato é esperado uma vez que o método tem por característica a alta sensibilidade e
baixa especificidade, sendo portanto, recomendado para triagem dos rebanhos. Em
parte, acredita-se que os percentuais observados são resultado da presença de agentes
causadores de reações inespecíficas nos rebanhos avaliados, tais como. Yersinia
enterocolitica sorotipo 0:9 em que devido à semelhança dos Lipopolissacarídes (LPS)
de Y. enterocolitica e Brucella spp, ocorrem reações cruzadas (OIE, 2004). Estima-se
em alguns casos que a prevalência de Y. enterocolitica em derivados de suínos seja no
país, acima de 40% (ALBUQUERQUE; CARDOSO, 1999).
144
Veterinária em Foco, v.7, n.2, jan./jun. 2010
TABELA 2 – Porcentagem de granjas de suínos, de javalis e criatórios de suínos reagentes no teste com
antígeno acidificado tamponado (AAT) para Brucella spp. nos respectivos estados da Federação.
Extrato de produção
Unidade federativa
GS
JA
CS
BA
28,5
NA
11,7
DF
33,3
NA
100
ES
84,6
NA
7,1
GO
55,5
100
39,4
MG
8,9
0,2
7,7
MS
85,7
25
25,9
MT
100
100
43,1
RJ
100
100
31,5
SE
37,5
NA
23
SP
28,8
23,8
16,6
TO
100
NA
25,7
NA – Grupo não analisado nessas unidades federativas; GS – Granja de suínos; JA – Granja de javalis; CS –
Criatório de suínos.
A porcentagem apresentada em cada Unidade Federativa representa o quantitativo
de propriedades em que pelo menos um animal foi reativo ao AAT. (Exemplo: Rio de
Janeiro-100% de GS e JA apresentaram pelo menos um animal reativo ao AAT).
O AAT é considerado a melhor alternativa para o diagnóstico massal de rebanhos
(ORGANIZACIÓN INTERNACIONAL DE LA SALUD, 1986). O método se baseia
na maior atividade de IgG1 em pH ácido, reduzindo a atividade de IgM, bem como as
reações inespecíficas. É um método prático e sensível que pode muito bem ser utilizado
em campo. Entretanto, notou-se nesse estudo que não é recomendado para áreas de baixa
prevalência. É provável que a inibição de IgM não seja suficiente para evitar as diversas
reações cruzadas, o que gera o elevado número de falsos positivos. A prova confirmatória
por outro lado, tem uma melhor inibição da IgM, diminuindo substancialmente as
reações inespecíficas. Portanto, para se ter uma maior especificidade, recomenda-se
utilizar os dois testes.
Veterinária em Foco, v.7, n.2, jan./jun. 2010
145
A necessidade de testes confirmatórios pode ser vista por outros trabalhos
relacionados à brucelose. Levantamentos no estado da Bahia, relativos à enfermidade
bovina, encontraram uma prevalência maior de animais positivos, variando de 4,2%
a 8,7%, quando utilizado apenas o método de soroaglutinação lenta (MOURA;
PEDREIRA, 1970; DÓRIA et al., 1982 e VIEGAS, 1984). Ribeiro et al. (2003)
encontraram prevalências mais baixas e ressaltaram que as mesmas se deveram á melhor
precisão dos resultados da combinação de AAT com 2-mercaptoetanol.
Com relação aos títulos estabelecidos para o diagnóstico sorológico da brucelose
suína no país, a Portaria nº 23 de 20/01/76 (BRASIL, 1976), os descrevia, no entanto, foi
revogada. A legislação atual, Instrução Normativa nº 6 de 08/01/2004, que estabeleceu
o regulamento técnico do Programa Nacional de Controle e Erradicação da Brucelose e
Tuberculose Animal (BRASIL, 2004), não descreve tais títulos para suínos. Entretanto
neste estudo, foram adotados os títulos utilizados para bovinos e bubalinos (BRASIL,
2004), pois até então, são os correntemente empregados para o diagnóstico sorológico
da brucelose suína no Brasil. Neste âmbito, sugere-se reavaliar os parâmetros para
o diagnóstico da brucelose suína no país, uma vez que, caso por exemplo os títulos
sorológicos para o diagnóstico nos testes confirmatórios (ponto de corte) sejam mais
baixos que os atuais empregados para bovinos e bubalinos, poderiam ocorrer casos
positivos. .Além disso, caso seja utilizado um antígeno mais específico na prova do
AAT, poder-se-ia reduzir o grande número de animais reagentes na prova de triagem.
Além da investigação da ocorrência de brucelose nos criatórios suídeos do país,
a realização de inquéritos sorológicos como o deste estudo é relevante uma vez que
poderá sinalizar para aqueles estados em que já se encontram em vias de erradicação da
brucelose bovina e bubalina (PNCEBT) como, por exemplo, Santa Catarina, que caso
haja algum foco de brucelose suína, deva-se atentar para a possibilidade de infecção
dos bovinos criados nas proximidades dos rebanhos suídeos.
Este trabalho atende à necessidade citada por diversos autores de um estudo
maior sobre a frequência de anticorpos para Brucella spp no Brasil, visto que
pesquisas anteriores compreenderam apenas localidades específicas (BRASIL, 2000;
FILIPPESEN et al., 2001; MATOS et al., 2004; AGUIAR et al., 2006; MORES et al.,
2006). Neste estudo foram avaliados 3027 rebanhos de 13 estados brasileiros. Além
disso, corrobora estudos de alguns autores em relação à baixa frequência de anticorpos
para Brucella spp. Matos et al. (2004) citaram que a enfermidade não foi considerada
um problema sanitário relevante em Goiânia. O mesmo foi relatado por Filippesen
et al. (2001) no sudoeste do Paraná que, mesmo assim, insistiam na necessidade de
estudos sorológicos contínuos. Soma-se a esses resultados os das amostras testadas
pelos laboratórios credenciados pelo MAPA. Foram testados 26.847 soros no decorrer
do ano de 2005, 25.503 em 2006 e cerca de 9.000 em 2007 (contagem parcial). Todos
foram considerados negativos para brucelose (MAPA, dados não publicados).
A partir da alta amostragem, pôde-se colher um indicativo da frequência de
soropositivos para Brucella spp nos rebanhos de suídeos no Brasil. Ainda que não se
possa concluir sobre a prevalência de rebanhos positivos, infere-se que esta seja baixa.
146
Veterinária em Foco, v.7, n.2, jan./jun. 2010
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Recebido em: jan. 2009
Aceito em: abr. 2009
Veterinária em Foco, v.7, n.2, jan./jun. 2010
147
Amblyomma aureolatum (Pallas, 1772)
(Acari: Ixodidae) em Puma concolor:
primeiro registro em Santa Catarina, Brasil
Sandra Márcia Tietz Marques
Rosiléia Marinho de Quadros
Marcelo Mazzolli
Gino Chaves
Rodrigo César Benedet
Klaus Guinter Lessmann
RESUMO
Este trabalho registra o parasitismo por Amblyomma aureolatum em um Puma concolor
resgatado pelo Projeto Puma em Lages, Santa Catarina, Brasil. Foram encontrados 55 carrapatos
da espécie Amblyomma aureolatum, sendo 37 (67%) fêmeas, 18 (33%) machos e proporção de 2:1.
Das fêmeas, 24 eram ninfas e 13 (1/3) adultas e todos os machos eram adultos. Este é o primeiro
relato de parasitismo por Amblyomma aureolatum em Puma concolor em Santa Catarina, Brasil.
Palavras-chave: Puma concolor. Infestação por carrapato. Amblyomma aureolatum. Santa
Catarina, Brasil.
Amblyomma aureolatum (Pallas, 1772) (Acari: Ixodidae) in Puma
concolor: First report in Santa Catarina, Brazil
ABSTRACT
This work reports the parasitism by Amblyomma aureolatum in Puma concolor rescued
by the Projeto Puma in Lages, Santa Catarina, Brazil. Were found 55 ticks of the Amblyomma
aureolatum species, being 37 (67%) female, 18 (33%) male and ratio of 2:1. From the females,
Sandra Márcia Tietz Marques é Médica Veterinária, Profa., Dra. – Departamento de Patologia Clínica Veterinária,
Faculdade de Medicina Veterinária da UFRGS – Porto Alegre/RS.
Rosiléia Marinho de Quadros é Médica Veterinária e Bióloga – Profa. MSc. – Centro de Ciências Biológicas e
da Saúde – UNIPLAC/Lages/SC.
Marcelo Mazzolli é Biólogo, Dr. – Coordenador da ONG PROJETO PUMA e Prof. do Centro de Ciências Biológicas
e da Saúde – UNIPLAC/Lages/SC.
Gino Chaves é Médico Veterinário, Dr., Prof. do Centro de Ciências Biológicas e da Saúde – UNIPLAC/Lages/
SC.
Rodrigo César Benedet é Biólogo, Membro da ONG PROJETO PUMA, Florianópolis, SC.
Klaus Guinter Lessmann é Biólogo, Membro da ONG PROJETO PUMA, Florianópolis, SC.
Endereço para correspondência: Sandra M. T. Marques, Rua Aneron Corrêa de Oliveira 74, ap. 201, Bairro
Jardim do Salso, Porto Alegre/RS. CEP: 91410-070. E-mail: [email protected]
Veterinária em Foco
Canoas
v.7
n.2
p.148-152
jan./jun. 2010
24 were nymphs and 13 (1/3) were adults and all the males were adults. This is the first report of
parasitism by Amblyomma aureolatum in Puma concolor in Santa Catarina, Brazil.
Keywords: Puma concolor. Tick infestation. Amblyomma aureolatum. Santa
Catarina state. Brazil.
INTRODUÇÃO
O gênero Amblyomma (Acari: Ixididae) possui 106 espécies, 59 encontradas
na região neotropical. Amblyomma aureolatum parasita carnívoros, ocorrendo na
Argentina, Brasil, Colômbia, Guiana Francesa, Paraguai e Suriname (RODRIGUES
et al., 2002). Este gênero tem importância em saúde pública, por parasitar humanos e
ser agente vetorial de enfermidades patogênicas como a babesiose, borreliose e febre
maculosa (ARAGÃO, 1936; BARROS-BATTESTI et al., 2006).
No Brasil, registros de literatura evidenciaram A. aureolatum parasitando
carnívoros das Famílias Felidae, Canidae and Procyonidae (ARAGÃO, 1936;
GUGLIELMONE et al., 2003; LABRUNA et al., 2005). Aragão (1936) relatou que A.
aureolatum era frequentemente encontrado infectando cães em áreas rurais brasileiras.
Na região sul, A. aureolatum foi encontrado parasitando cães no município de Lages,
Santa Catarina (SOUZA et al., 1999; BELLATO et al., 2003). Evans et al. (2000)
relataram o parasitismo em cães domésticos por A. aureolatum no estado do Rio Grande
do Sul. Labruna et al. (2002) identificaram o gênero Amblyomma em nove espécies
de carnívoros silvestres, incluindo Puma concolor, ao longo do rio Paraná, na área da
usina hidrelétrica Porto-Primavera, localizada entre os estados de São Paulo e Mato
Grosso do Sul. Labruna et al. (2005) relataram A. aureolatum parasitando 10% (3/30)
dos pumas amostrados na região sudeste de São Paulo. Em Minas Gerais, Rodrigues e
Daemon (2004) registraram A. aureolatum parasitando cachorro-do-mato (Cerdocyon
thous) em um fragmento de área rural, na zona da mata mineira.
Bechara et al. (2006a) conduziram um estudo com animais silvestres (coati,
veado e tamanduá–bandeira), no pantanal do Mato Grosso, no período de 1996-1998,
identificando o gênero Amblyomma, porém a espécie A. aureolatum não foi registrada.
Bechara et al. (2006b) pesquisaram ectoparasitos em cachorro-do-mato e tamanduábandeira, no Parque Nacional das Emas, na região do serrado, em Goiás, e identificaram
carrapatos das espécies A. cajennense, A. triste, A. nodosum e A. pseudoconcolor.
O objetivo deste trabalho foi de registrar o parasitismo por Amblyomma
aureolatum em um Puma concolor morto por atropelamento no município de Lages,
Santa Catarina.
MATERIAL E MÉTODOS
O município de Lages (27º 48’ S, 50º 20’ W, altitude de 916m) está localizado
na região do planalto serrano, estado de Santa Catarina, região sul do Brasil. Tem área
Veterinária em Foco, v.7, n.2, jan./jun. 2010
149
rural de 2.429 km² e área urbana de 222,4 km². A mata de araucária é a vegetação
predominante e frequentemente entrecortada por extensas áreas de pastagens nativas. O
seu relevo é constituído de um planalto de superfícies planas, onduladas e montanhosas.
O puma foi encontrado pela Polícia Militar Ambiental e resgatado pela organização nãogovernamental (ONG) Projeto Puma, no mês de setembro de 2007, na rodovia SC-431,
distante 12 km da região urbana de Lages. A ONG Projeto Puma tem a missão de estudar
os grandes felinos, visando sua preservação e recuperação (PROJETO PUMA, 2009).
O puma macho foi identificado como Puma concolor. Foi encaminhado para
necropsia na Universidade do Planalto Catarinense (UNIPLAC), em Lages (SC).
À necropsia foram encontrados 22 projéteis ocasionados por arma de fogo. Foram
recolhidos 55 carrapatos que estavam fixados no pavilhão auricular, região axilar e
posição ventral torácica. Os parasitos foram coletados por inspeção visual e tátil com
a utilização de pinças e pente fino. Preservados em etanol 70° GL, os carrapatos foram
encaminhados para confirmação de identificação taxonômica ao Laboratório de Ixodides,
Instituto Oswaldo Cruz (FIOCRUZ/RJ). Os carrapatos coletados foram depositados na
coleção de parasitos da Faculdade de Medicina Veterinária da Universidade Federal
do Rio Grande do Sul (UFRGS).
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Foi identificada a espécie Amblyomma aureolatum (Pallas, 1772) parasitando
Puma concolor. Os carrapatos recolhidos foram distribuídos em: 37 (66,7%) fêmeas (24
ninfas e 13 adultas) e 18 (33,3%) machos adultos e alguns exemplares são mostrados
na Figura 1. Este é o primeiro registro de Amblyomma aureolatum em puma no estado
de Santa Catarina, região sul do Brasil.
FIGURA 1 – Vista dorsal de Amblyomma aureolatum: a) adultos; b) adulto macho e fêmea.
Este relato é semelhante a outros estudos que apontam carnívoros como hospedeiro
primário dos estágios adultos de Amblyomma aureolatum (GUGLIELMONE et al.,
2003; RODRIGUES; DAEMON, 2004; LABRUNA et al., 2005; BECHARA et al.,
2006a; BECHARA et al., 2006b).
150
Veterinária em Foco, v.7, n.2, jan./jun. 2010
Para os carrapatos, fatores abióticos como latitude, altitude e tipo de vegetação
são fundamentais para se determinar a sua sobrevivência e desenvolvimento no meio
ambiente, além da habilidade ou oportunidade de parasitar diversos hospedeiros, tanto
carnívoros quanto pássaros. Pássaros e roedores são os principais hospedeiros dos
estágios de larva e ninfa de A. aureolatum (LABRUNA et al., 2002; ARZUA et al.,
2003; GUGLIEMONE et al., 2003). Portanto, a vigilância deste ectoparasito no meio
silvestre é importante para detectar qualquer alteração em relação a sua população e
aquisição de novos hospedeiros, sendo indicativo de mudanças ambientais.
Entre os grandes felinos, o puma enfrenta o problema de estabelecer território
sobre centenas de quilômetros quadrados com populações adequadas de espécies-presa,
as quais têm escasseado pela caça ilegal e perda de ambiente (MAZZOLLI; HAMMER,
2008). Por esta razão, a dispersão e alterações ambientais podem afetar a população de
predadores e presas, concorrendo para uma melhor avaliação da dinâmica populacional,
enfatizado no estudo de Labruna et al. (2005).
Como o puma foi atropelado em ambiente periurbano e apresentava lesões
decorrentes de projéteis de arma de fogo, supõe-se que buscava alimentação longe
do ambiente silvestre, estava em corredor de dispersão ou estabelecendo território.
Discute-se a possibilidade de sua ocorrência na área ser reflexo do desmatamento na
região, que modificou a paisagem das florestas para campos de pastagem, diminuindo
as espécies presas, permitindo a ampliação da área de ocorrência desta espécie.
Neste cenário, onde a população humana continua a expandir sobre os fragmentos
remanescentes, espécies cinegéticas vulneráveis e aquelas com grande demanda de
território estão entre as mais propensas à extinção (MAZZOLLI; HAMMER, 2008).
Para os felinos silvestres, é necessária a contínua busca por informações nos campos
da saúde, manejo, preservação e recuperação, suas causas e consequências. E sob o
olhar humano deve ser acrescida uma educação formadora preservacionista, para que
esta parcela da fauna brasileira possa permanecer entre nós.
CONCLUSÃO
Confirma-se a presença do carrapato Amblyomma aureolatum em Puma
concolor.
AGRADECIMENTOS
Os autores agradecem à Polícia Ambiental do Estado de Santa Catarina, ao Projeto
Puma e em especial à Dra. Marinete Amorim, Dr. Gilberto Salles Gazeta e Dr. Nicolau
Maués Serra-Freire, da FIOCRUZ/RJ pela identificação taxonômica dos carrapatos.
Veterinária em Foco, v.7, n.2, jan./jun. 2010
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Recebido em: fev. 2009
152
Aceito em: maio 2009
Veterinária em Foco, v.7, n.2, jan./jun. 2010
Cirurgia endoscópica transluminal por
orifícios naturais: o que é?
Beatriz Guilhembernard Kosachenco
Fabiana Schiochet
Carlos Afonso de Castro Beck
Resumo
A abordagem cirúrgica denominada Cirurgia Endoscópica Transluminal por Orifícios Naturais
(Natural Orifice Translumenal Endoscopic Surgery – NOTES) é uma nova alternativa para o acesso
e tratamento de doenças abdominais. Consiste na passagem de um endoscópio através de um
orifício natural do corpo, na perfuração intencional de uma víscera para permitir o acesso à cavidade
peritoneal, e na realização de um procedimento intra-abdominal sob visualização endoscópica.
Inúmeras pesquisas têm sido desenvolvidas para encontrar o melhor acesso transluminal e o melhor
método de fechamento da viscerotomia. Para a utilização ampla desses procedimentos na rotina
clínica humana, os experimentos realizados ressaltam a necessidade de desenvolver um protocolo
operacional padrão que permita a aplicação segura e eficaz das NOTES. O objetivo deste trabalho
foi revisar e atualizar as informações sobre este novo método de cirurgia videoendoscópica.
Palavras-chave: Endoscopia. Laparoscopia. Cirurgia. NOTES. Orifícios naturais.
Natural Orifice Translumenal Endoscopic Surgery (NOTES): What
is this?
Abstract
The surgical approach named natural orifice translumenal endoscopic surgery (NOTES) is
a new alternative for the access and treatment of abdominal diseases. It consists of passage of an
endoscope through a body’s natural orifice, of the intentional perforation of a hollow viscus allowing
Beatriz Guilhembernard Kosachenco – Médica Veterinária, MSc., Professora da Disciplina de Cirurgia Veterinária
da ULBRA Canoas.
Fabiana Schiochet – Médica Veterinária, MSc., Professora do Curso de Especialização em Cirurgia Minimamente
Invasiva do Hospital Moinhos de Vento, Porto Alegre.
Carlos Afonso de Castro Beck – Médico Veterinário, Dr., Professor do Departamento de Medicina Animal da
UFRGS, Porto Alegre.
Endereço para correspondência: Av. Farroupilha 8001, Prédio 60. Bairro São José, Canoas/RS. CEP 92425900. E-mail: [email protected]
Veterinária em Foco
Canoas
v.7
n.2
p.153-164
jan./jun. 2010
the access to the peritoneal cavity, and of the development of an intra-abdominal procedure under
endoscopic visualization. Countless researches have been developed to find the best transluminal
access and the best closure device of the viscerotomy. For the wide use of these procedures in the
human clinical routine, the accomplished experiments point out the need to develop a standard
protocol that allows a safe and effective use of the NOTES. The objective of this work was to review
and to update the information on this new method of videoendoscopic surgery.
Keywords: Endoscopy. Laparoscopy. Surgery. NOTES. Natural orifice.
Introdução
A abordagem cirúrgica denominada natural orifice translumenal endoscopic
surgery (NOTES) é uma nova alternativa ao manejo de doenças abdominais
(VOSBURGH; ESTÉPAR, 2007), e encontra-se em fase experimental (McGEE et al.,
2006). Envolve a perfuração intencional de uma víscera com endoscópio para acesso
à cavidade abdominal (PEARL; PONSKY, 2007).
O progresso da cirurgia associado à inovação de outras áreas tem reduzido
as indicações de laparotomias convencionais. As técnicas de laparoscopia têm sido
associadas com menor dor, menor permanência hospitalar e menores complicações
que a laparotomia. Considerando estes dados, as técnicas de minilaparoscopia podem
reduzir a dor incisional com resultados cosméticos superiores aos da laparoscopia
(WILLINGHAM; BRUGGE, 2007).
O conceito de cirurgia endoscópica transluminal através de orifícios naturais
tem crescido em aceitação desde sua introdução em 2000 (GIDAY et al., 2008). O
grupo denominado NOSCAR (Natural Orifice Surgery Consortium for Assessment
and Research), composto por líderes da Society of American Gastrointestinal and
Endoscopic Surgeons e da American Society of Gastrointestinal Endoscopy, tem
estabelecido a taxonomia, delineado as atuais limitações dos NOTES, e motivado a
unificação de um plano de pesquisa (McGEE et al., 2006). A NOSCAR tem esboçado
os maiores obstáculos às NOTES com o objetivo de obter a certeza de uma transição
segura para a prática clínica, sustentando uma estrutura para enfrentar as adversidades
e encorajar seu crescimento (GIDAY et al., 2008).
A primeira publicação de uma peritoneoscopia transgástrica foi feita no ano de
2004 por Kalloo (PEARL; PONSKY, 2007), e desde então o campo da NOTES tornouse realidade. Em curto período de tempo estes procedimentos tornaram-se viáveis em
vários estudos em animais de laboratório. Com certeza, todos os testes renovam interesse
em encontrar um meio de minimizar os traumas corporais e melhorar a cosmética, com
uma óbvia vantagem psicológica para os pacientes (DALLEMAGNE et al., 2008). O
objetivo deste trabalho foi revisar e atualizar as informações sobre este novo método
de cirurgia videoendoscópica.
154
Veterinária em Foco, v.7, n.2, jan./jun. 2010
Cirurgia endoscópica transluminal por orifícios naturais
O princípio fundamental das NOTES consiste na passagem de um endoscópio
flexível através de um orifício natural do corpo (DELLA FLORA et al., 2007). Como uma
alternativa à cirurgia convencional, com as NOTES eliminam-se as incisões abdominais
e suas possíveis complicações, através da combinação de técnicas endoscópicas e
laparoscópicas para o diagnóstico e tratamento de patologias abdominais (McGEE et
al., 2006). Para Zorron et al. (2008), a criação e o fechamento de uma viscerotomia
são as fundamentais diferenças entre laparoscopia e NOTES.
Nestes procedimentos o endoscópio pode ser inserido através da boca, ânus,
uretra ou vagina (PEARL; PONSKY, 2007). Após uma incisão transvisceral, os
procedimentos cirúrgicos intra-abdominais são realizados (WILLINGHAM; BRUGGE,
2007) utilizando visualização endoscópica (DELLA FLORA et al., 2007).
Giday et al. (2008) citaram a possibilidade do uso das NOTES para intervenção
em traumas abdominais agudos, cirurgia fetal intra-uterina, e em procedimentos em
coluna vertebral. Willingham e Brugge (2007) relataram a peritoneoscopia, biópsia
hepática, linfadenectomia, ligadura de tubas uterinas, ooforectomia e histerectomia,
gastrojejunostomia, colecistectomia, esplenectomia e pancreatectomia parcial como
procedimentos intra-abdominais passíveis de execução através de acessos por NOTES.
Vias de acesso
As pesquisas têm se voltado em encontrar uma melhor via de acesso à cavidade
peritoneal (DALLEMAGNE et al., 2008). Na atualidade as abordagens mais
comumente relatadas nos experimentos em animais e em procedimentos em humanos
são a transgástrica, transcolônica, transvesical (DELLA FLORA et al., 2007; DRAY
et al., 2008) e transvaginal (ISARIYAWONGSE et al., 2008; ZORNIG et al., 2008;
ZORRON et al., 2008).
Ko et al. (2007), Ryou et al. (2008a) e Simopoulos et al. (2008) citaram que
após a incisão visceral, estas são ampliadas em seus diâmetros com auxílio de balão
de expansão radial para permitir a passagem do endoscópio.
Experimentos com acesso transgástrico em suínos, associados à punção com
agulha de Veress na região periumbilical e pneumoperitôneo (Figura 1) foram
desenvolvidos por Ko et al. (2007). As abordagens transgástricas foram realizadas na
junção do corpo do estômago com o antro pilórico através de punção da parede do
estômago, com auxílio de um eletrobisturi, após o estabelecimento do pneumoperitôneo
(Figura 2). O local da punção era dilatado com auxílio de balão esofágico (Figura 3)
e, então, o endoscópio avançava para cavidade peritoneal.
Veterinária em Foco, v.7, n.2, jan./jun. 2010
155
FIGURA 1 – Vista intraperitoneal da agulha de Veress depois de estabelecido o pneumoperitôneo.
Fonte: Ko et al., 2007.
FIGURA 2 – Acesso transgástrico: punção da parede do estômago.
Fonte: Ko et al., 2007.
FIGURA 3 – Dilatação do orifício da punção com balão esofagiano.
Fonte: Ko et al., 2007.
156
Veterinária em Foco, v.7, n.2, jan./jun. 2010
Em seus procedimentos de colecistectomia sem cicatriz aparente, Zornig et al. (2008)
utilizaram uma combinação das técnicas transvaginal e transumbilical com sucesso em
20 pacientes operados. A abordagem transvaginal tem demonstrado ser de pouco risco e,
quando associada à laparoscopia, o controle da introdução transvaginal dos instrumentais
torna-se mais seguro. Como a inserção de instrumentais através do fórnix posterior da
vagina e a sutura destas feridas são facilmente realizadas, tem-se a vantagem de reduzir-se
a necessidade de um grande número de cirurgiões no momento cirúrgico.
Zorron et al. (2008) realizaram quatro colecistectomias por via transvaginal
em pacientes humanas, e relataram como vantagem, além do fácil acesso, a melhor
orientação espacial sem a necessidade de retroflexão do endoscópio e a possibilidade
de fechamento sob visão direta. Outra vantagem desta via é a redução dos riscos de
infecção quando comparados às técnicas de abordagem transgástrica e transcolônica, nas
quais os instrumentais que entram na cavidade abdominal encontram-se contaminados
(ZORNIG et al., 2008). Para Dellamagne et al. (2008), a experiência dos ginecologistas
desenvolvendo procedimentos transvaginais tem demonstrado segurança com taxa de
infecção de 0,001%, lesões retais de 0,002% e sangramento localizado de 0,2%. Como
fundamental desvantagem, Zorron et al. (2008) referiram a exclusividade da técnica
para pacientes femininos.
No experimento de Isariyawongse et al. (2008) em suínos, os acessos NOTES
combinados, vaginal e gástrico (Figura 4), resultaram em excelente visualização e
em rápida facilidade na troca de uma variedade de equipamentos laparoscópicos e
endoscópicos para execução de tarefas cirúrgicas de nefrectomia.
FIGURA 4 – Acesso NOTES combinado, transgástrico/transvaginal, para procedimento de nefrectomia.
Fonte: Isariyawongse et al., 2008.
Ko et al. (2007) não encontraram qualquer dano estomacal ou outra complicação
intraperitoneal relacionada ao acesso transgástrico utilizado em suas pesquisas, tanto
nos exames endoscópicos realizados duas semanas após os procedimentos, como nas
necropsias (Figura 5). Nestes experimentos foram realizadas irrigações intragástricas
com um litro de solução antibiótica composta de neomicina e polimixina B antes da
punção da parede estomacal.
Veterinária em Foco, v.7, n.2, jan./jun. 2010
157
FIGURA 5 – Completa cicatrização da parede gástrica no sítio da punção.
Fonte: Ko et al., 2007.
Segundo Della Flora et al. (2007), nas técnicas de colonotomia há a necessidade
de extensiva preparação do local de acesso para a remoção e desinfecção fecal, já que
as fezes poderiam obstruir o equipamento e apresentar grande risco de infecção. Ryou
et al. (2008b) prepararam seus pacientes com múltiplos enemas aquosos até que o
cólon distal estivesse limpo de partículas de matéria fecal, o que era confirmado por
uso de endoscópio não estéril, atingindo 50 cm de extensão. Então, uma suspensão
de um grama de cefazolina diluída em 500 ml de água estéril era instilada através do
endoscópio. Após dez minutos, esta solução era aspirada e o cólon era lavado com 60
ml de PVPI a 10%. A anti-sepsia da região anal e glútea era finalmente realizada.
Viscerorrafia
Dray et al. (2008) citaram que o maior desafio das cirurgias NOTES encontra-se
no fechamento dos acessos transluminais. Em virtude das NOTES poderem conduzir a
complicações sépticas após incisões em trato digestório, o desenvolvimento de métodos
de fechamento seguros (ZORRON et al., 2008), a prova de vazamentos e que minimizem
os potenciais riscos relacionados à contaminação (DALLEMAGNE et al., 2008), é o
próximo passo na evolução deste tipo de procedimento (ZORRON et al., 2008).
Métodos para fechamento de micro perfurações e perfurações de tamanho médio em
endoscopia envolvem aposição tecidual com diferentes tipos de clipes (BERGSTRÖM
et al., 2008). O fechamento das gastrotomias e colonotomias inclui vários métodos como
endoclips, jumbo clips, endoloops (DELLA FLORA et al., 2007), suturas interrompidas
simples, suturas em dois planos e sutura em bolsa de fumo (RYOU et al., 2008a), ou
ainda protótipos para sutura (RYOU et al., 2007; RYOU et al., 2008b).
Para Zorron et al. (2008), nos primeiros experimentos com acesso transgástrico,
o fechamento da ferida representou um risco de complicações, o qual ainda persiste.
158
Veterinária em Foco, v.7, n.2, jan./jun. 2010
Nas abordagens transgástrica e transcolônica, Zornig et al. (2008) relataram haver
dificuldade no fechamento das feridas e também que cujos fechamentos têm altos riscos
de graves complicações. Para Ryou et al. (2008b), os métodos de sutura que incluem
a espessura total da víscera têm o risco de ocasionarem perfurações em outros órgãos
próximos ao estômago ou intestino visto que são realizadas pela luz do órgão que
serviu de acesso à cavidade abdominal. Segundo Zorron et al. (2008), casos de micro
abscessos, peritonite e óbito ocorreram em experimentos relatados.
Ko et al. (2007) citaram não encontrar complicações em seus experimentos,
mesmo quando os locais do acesso transgástrico permaneciam sem aplicação de clipe
endoscópico, apenas com a contração da parede da víscera. Em pesquisa com suínos
vivos, Ryou et al. (2008b) aplicaram, nos acessos transgástrico e transcolônico, um
protótipo de sutura denominado LSI que realiza a incisão e pré-aplica uma sutura em
bolsa de fumo que ao final do procedimento é fechada com auxílio de um nó de titânio.
Embora os exames histológicos tenham revelado a presença de micro abscessos no local
das incisões, os autores consideraram promissor este método de incisão e sutura.
Para Bergström et al. (2008), é necessário o desenvolvimento de um instrumento
simples e de fácil uso para as suturas das perfurações viscerais. Seu grupo desenvolveu
uma técnica de sutura simples, segura e de fácil aplicação que permite o fechamento
das perfurações e aproximação tecidual em quase todo trato gastrointestinal com acesso
por endoscopia (Figura 6).
FIGURA 6 – A) Fio fixado a “T-tag” inserida na luz da agulha. A agulha avança a partir da bainha até a
profundidade de penetração desejada. B) A bainha azul atua como um obstáculo à penetração além do
desejado. A “T-tag” é forçada para o interior do tecido por uma haste que a empurra e é inclinada para que
se mantenha firmemente dentro do tecido. C) A agulha é recarregada com outra “T-tag” e posicionada do
outro lado do defeito. D) A segunda “T-tag” é adaptada à parede tecidual. E) Os dois fios são apertados juntos
passando através de um cilindro. O tecido é tracionado até a aproximação dos bordos teciduais. F) Um pino é
introduzido no cilindro imobilizando os dois fios. Os fios são cortados com uma guilhotina.
Fonte: Bergstrom; Swain, 2008.
Veterinária em Foco, v.7, n.2, jan./jun. 2010
159
Endoscópio
A capacidade para manipular e intervir no tecido enquanto simultaneamente é
mantida a visualização e estabilidade de trabalho são as chaves principais neste tipo
de procedimento, conforme citam Malik et al. (2006).
Segundo Willingham e Brugge (2007), nos procedimentos NOTES o endoscópio
deve ser flexível para que possa ser passado através do orifício natural e possuir
duplo canal par evitar a necessidade de outros portais e incisões da parede abdominal
(ISARIYAWONGS et al., 2008).
Como desvantagem do endoscópio flexível Pearl e Ponsky (2007) relataram que
a flexibilidade inerente do endoscópio impede que seja mantido um campo de trabalho
estável. Durante procedimentos com acesso transgástrico, uma curvatura acentuada
na região pelvínea pode ser requerida para a visualização do quadrante superior
direito do abdômen, e o endoscópio pode resistir a este posicionamento. Além disso,
a retroflexão inverte a imagem endoscópica, complicando a cirurgia. Simopoulos et
al. (2008) utilizaram um gastroduodenoscópio com duplo canal para a realização
de colecistectomias, peritoneoscopias, gastrojejunostomias e salpingectomias em
suínos através de acesso transgástrico e observaram algum grau de dificuldade na
manipulação do instrumental em virtude da curvatura do endoscópio no interior da
cavidade abdominal, além de constatarem aumento no tempo cirúrgico. Os autores
citaram que a ausência de endoscópios com maior flexibilidade que os atuais e a
inabilidade em usar os instrumentais acessórios livremente tornam as cirurgias
como as colecistectomias, procedimentos mais difíceis, de maior tempo cirúrgico e
extremamente perigosas.
Para Zornig et al. (2008), o uso do endoscópio rígido tradicional utilizado pelo
acesso transumbilical foi eficiente nas 20 colecistectomias realizadas, e os autores
relataram dificuldades associadas à manipulação do endoscópio flexível dentro da
cavidade abdominal devido a pouca experiência dos cirurgiões com este tipo de
equipamento. Zorron et al. (2008) utilizaram com sucesso um único portal transvaginal
para passagem do colonoscópio tradicional e dos instrumentais para a colecistectomia
nas quatro pacientes operadas.
O uso de instrumentais laparoscópicos tradicionais quando aplicados por trocarte
transvaginal, combinando a abordagem transgástrica e transvaginal, é viável para
realização de nefrectomia por NOTES conforme demonstraram Isariywongse et al.
(2008), em estudos com modelo experimental suíno.
Pneumoperitôneo
Em colecistectomias via transvaginal em suínos, Zorron et al. (2008) utilizaram
5-6 mmHg de pressão de CO2 para insuflação da cavidade abdominal através do
colonoscópio. Ryou et al. (2008b) promoveram o pneumoperitôneo com uma agulha de
Veress inserida percutaneamente na linha média do abdômen caudal dos modelos suínos,
160
Veterinária em Foco, v.7, n.2, jan./jun. 2010
mantendo a pressão de CO2 intraperitoneal de 8 a 10 mmHg para os procedimentos
por via transcolônica.
Ko et al. (2007) citaram que a promoção prévia do pneumoperitôneo através de
agulha de Veress adaptada a insuflador auto-regulável facilitou a incisão gástrica inicial
e a entrada na cavidade peritoneal, sem danos aos demais órgãos, adicionando segurança
aos procedimentos NOTES. Estes autores mantiveram a pressão de CO2 intra-abdominal
em 12 mmHg. Os exames de necropsia realizados duas semanas após as cirurgias não
revelaram complicações associadas à punção com a agulha de Veress.
Vantagens das NOTES
Há um número de benefícios potenciais no uso de NOTES quando comparado
com as técnicas cirúrgicas tradicionais como laparotomia e laparoscopia. A maioria
das substanciais vantagens está associada com a ausência de qualquer superfície de
incisão, incluindo a eliminação de infecções em sítio cirúrgico e de qualquer cicatriz
visível (DELLA FLORA et al., 2007).
Para Anvari e Marescaux (2008), a utilização dos NOTES permite a redução da
necessidade de anestesia e medicação para dor. Giday et al. (2008) relataram que avançados
procedimentos endoscópicos podem ser realizados utilizando sedação profunda, o que
sugere que procedimentos transluminais poderiam ser desenvolvidos sem anestesia geral
e intubação endotraqueal como nas cirurgias laparoscópicas e convencionais.
As infecções nos sítios cirúrgicos são complicações comuns que ocorrem em 2
a 25% dos pacientes, dependendo do tipo de cirurgia desenvolvida. Considerando-se
que o local mais comum de desenvolvimento bacteriano é a pele, a ausência de incisões
cutâneas em NOTES pode eliminar as infecções em sítio cirúrgico nos procedimentos
abdominais (McGEE et al., 2006).
Os mesmos autores citaram que a hérnia incisional é a segunda complicação mais
comum decorrente da cirurgia abdominal, ocorrendo em 4 a 18% das cirurgias abertas
e em 0,02 a 3% das incisões laparoscópicas. Por evitar incisões externas que criam um
defeito na parede abdominal, o acesso interno oferecido pelos procedimentos NOTES
pode erradicar completamente a hérnia incisional como complicação pós-operatória
(WILLINGHAM; BRUGGE, 2007).
A redução dos riscos de aderências pós-operatórias, que ocorrem em mais de
90% dos pacientes submetidos a cirurgias abdominais, é outra vantagem deste tipo de
procedimento (McGEE et al., 2006). A maioria das aderências pós-operatórias têm como
sítio a incisão abdominal, inclusive nas laparoscopias (WILLINGHAM; BRUGGE,
2007) Ryou et al. (2008b) observaram aderências salpingocolônica e colovesicular em
animais de seus experimentos com NOTES por abordagem transcolônica.
Os procedimentos NOTES também tem potencial para serem utilizados no
tratamento de pacientes com obesidade mórbida (DELLA FLORA et al., 2007;
Veterinária em Foco, v.7, n.2, jan./jun. 2010
161
VOSBURGH; ESTÉPAR, 2007), pois evitam o acesso à gordura subcutânea
(WILLINGHAM; BRUGGE, 2007). Pacientes com carcinomas obstrutivos nos quais
o acesso aos órgãos intra-abdominais via parede abdominal é muito difícil e com riscos
de complicações relacionadas à ferida cirúrgica aumentadas, também são indicações
para esta nova modalidade cirúrgica (DELLA FLORA et al., 2007). Há relatos da
possibilidade da aplicação potencial dos NOTES em crianças (McGEE et al., 2006).
Desvantagens das NOTES
Como desvantagens os NOTES apresentam um potencial de complicações
semelhantes às da cirurgia laparoscópica, e dificuldades como visibilidade reduzida,
dificuldade de manobras intra-abdominais e na apreensão tecidual pelo aumento
das distâncias, e necessidade de instrumental especializado (DELLA FLORA et al.,
2007).
Muitos estudos têm sido desenvolvidos a respeito das infecções e impacto
imunológico das NOTES, os quais muitas vezes têm apresentado equivalência aos de
laparoscopia e cirurgia abdominal convencional (PEARL; PONSKY, 2007).
Questões a serem pesquisadas
Conforme o Hawes et al. (2008), as principais dificuldades na difusão dos
procedimentos NOTES encontram-se na segurança do acesso à cavidade peritoneal,
no fechamento gástrico/intestinal, na prevenção da infecção, no desenvolvimento de
métodos de suturas, na manutenção da orientação espacial, no desenvolvimento de um
protocolo operacional padrão, no manejo das complicações iatrogênicas intraperitoneais
e na identificação de eventos fisiológicos desfavoráveis. Della Flora et al. (2007)
citaram questões específicas a serem pesquisadas e que deverão ser direcionadas aos
seguintes pontos:
Estudar em pacientes clínicos as vantagens reais ao evitar incisões na parede
abdominal: Há redução clinicamente significativa no tempo de cicatrização após
a cirurgia? As taxas de infecção são reduzidas quando as incisões abdominais são
evitadas? A taxa de sobrevida dos pacientes de NOTES é comparável às dos pacientes
de laparotomias ou laparoscopias? Os benefícios cosméticos das NOTES superam
suas desvantagens?
Para estudo em animais: Os procedimentos cirúrgicos tradicionais podem ser
desenvolvidos com sucesso ao utilizar as NOTES? As infecções da cavidade abdominal
podem ser evitadas ou minimizadas? O fechamento das viscerotomias pode ser realizado
eficientemente? Os efeitos adversos como lacerações de órgãos e hemorragias podem ser
minimizados em nível aceitável? As taxas de sobrevida e tempo de recuperação seguidos
aos procedimentos NOTES são comparáveis àqueles dos procedimentos similares
realizados através de acessos tradicionais como laparotomia e laparoscopia?
162
Veterinária em Foco, v.7, n.2, jan./jun. 2010
Conclusão
As NOTES ainda estão em estágios iniciais de desenvolvimento e novas
tecnologias serão necessárias para se obter acessos e fechamentos confiáveis. Estudos
bem sucedidos em animais e em pacientes humanos devem ser conduzidos para
determinar a segurança e eficácia das NOTES no contexto clínico.
Procedimentos NOTES e estudos devem ser desenvolvidos seguindo regras
rígidas, como os critérios desenvolvidos pelos membros da NOSCAR através do
desenvolvimento de um protocolo operacional padrão.
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Recebido em: jan. 2009
164
Aceito em: jun. 2009
Veterinária em Foco, v.7, n.2, jan./jun. 2010
Sutura extramucosa em pontos
separados simples e plano único
no esôfago torácico de cães
Ana Maria Quessada
Lucy Marie Ribeiro Muniz
João Macedo de Sousa
Karina Oliveira Drumond
Resumo
Propõe-se nova técnica de esofagorrafia em cães com o objetivo de facilitar as manobras
cirúrgicas. Foram utilizados 30 animais divididos em dois grupos, nos quais foram feitas
esofagotomias torácicas. Nos cães do primeiro grupo, a incisão foi longitudinal e nos do segundo
grupo, transversal. A esofagorrafia, em todos os cães, foi feita em plano único com pontos separados
simples e fio de algodão, com exclusão da mucosa. Em todos os cães foram feitas radiografias
contrastadas do esôfago no pré-operatório e semanalmente no pós-operatório. Trinta dias após a
cirurgia todos os animais foram eutanasiados e foi colhido material para exame histológico. A técnica
cirúrgica revelou-se de fácil execução e todos os animais se recuperaram bem. As radiografias
após a cirurgia revelaram dilatação esofágica em alguns animais, principalmente os do grupo 2.
No entanto, ao tempo de 30 dias, a cicatrização do esôfago foi equivalente aos do grupo 1. Ao
exame macroscópico, observaram-se apenas aderências do mediastino e pleura à cicatriz esofágica.
O exame histológico revelou cicatrização normal. Concluiu-se que a sutura em questão pode ser
utilizada em esofagotomias torácicas no cão, apresentando cicatrização anatômica e diminuindo
a possibilidade de complicações.
Palavras-chave: Canino. Cirurgia. Esofagorrafia. Esôfago torácico.
Single-layer extramucosal interrupted sutures in thoracic
esophagus of the dogs
ABSTRACT
It was proposed a new technique for closure of the thoracic esophagotomy, with the objective
to facilitate the surgical procedure. It was used 30 dogs, divided in two groups. All the animals were
Ana Maria Quessada é Médica Veterinária, Doutora, Professora do Departamento de Clínica e Cirurgia Veterinária,
Centro de Ciências Agrárias, Universidade Federal do Piauí (UFPI).
Lucy Marie Ribeiro Muniz é Médica Veterinária, Doutora, Professora do Departamento de Cirurgia Veterinária e
Reprodução Animal, Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da UNESP de Botucatu.
João Macedo de Sousa é Médico Veterinário, Doutor, Professor do Departamento de Clínica e Cirurgia Veterinária,
Centro de Ciências Agrárias, UFPI.
Karina Oliveira Drumond é Médica Veterinária, Doutoranda em Ciência Animal, UFPI.
Endereço para correspondência: Rua Visconde de Parnaíba, 3377, apto. 1301, Horto Florestal, 64.049-570,
Teresina, PI. E-mail: [email protected]
Veterinária em Foco
Canoas
v.7
n.2
p.165-174
jan./jun. 2010
submitted to thoracic esophagotomy. In group 1, the esophagic incision was longitudinal and in
group 2, transversal. The esophagic closure, similar in both groups, was performed with single-layer
extramucosal interrupted sutures, using cotton thread. Radiographic examination with contrast was
performed in the preoperative period and weekly following the surgery. The dogs were euthanatized
30 days after the surgery, and material was collected for histopathologic examination. The surgical
technique was successfull and the dogs recovered normally. Radiographic examination after surgery
revealed esophagic dilatation in some animals, especially on the group 2. However, at the time of
30 days, the healing of the esophagus was equivalent to that of group 1.Gross examination revealed
only adhesions among esophagic scar to parietal pleura, and mediastine. The surgical scar showed
good and anatomic healing. The histopahologic examination revealed normal healing. We can
conclude that this surgical technique can be indicated for thoracic esophagotomy closure in the
dog, showing anatomic healing, and decreasing complications.
Keywords: Canine. Surgery. Esophagorraphy. Thoracic esophagus.
INTRODUÇÃO
Ao longo da história cirúrgica mundial, as estenoses, fístulas e deiscências
resultantes de cirurgias nas vísceras do aparelho digestório justificam o temor de sua
presença, pois frequentemente evoluem com excessiva morbidade e não raro para
o óbito. A controvérsia sobre o melhor tipo de sutura permanece até os dias atuais
(ORRINGER et al., 2007).
Entre as operações realizadas no tubo digestivo, as efetuadas no esôfago se
revestem de especial interesse, devido à maior frequência de complicações (Glatz;
Richardson, 2007). A falta da serosa, que auxilia no desenvolvimento de um
selamento, a constante movimentação resultante da deglutição e respiração, a tensão
na sutura devido à falta de mobilidade que o esôfago exibe em relação à sua posição
e a falta de uma estrutura como o omento para facilitar a proteção da ferida, faz com
que o esôfago seja mais propício a deiscência de sutura (Olsen, 2002; KYLES,
2007). Outros fatores sistêmicos como síndrome de resposta inflamatória sistêmica,
sepse e instabilidade hemodinâmica intraoperatória também interferem negativamente
na cicatrização esofágica (SALUM et al., 1996). Desta forma, complicações pósoperatórias são comuns em cirurgias esofágicas e incluem deiscência, estenose,
pneumonia, infecção e regurgitação (HEDLUND; FOSSUM, 2007).
Embora seja clássica a utilização de sutura em plano duplo no fechamento do
esôfago (HEDLUND; FOSSUM, 2007), estudos em anastomoses esofágicas cervicais
de cães demonstraram que a sutura em plano único reduz complicações pós-operatórias
(fístulas e estenoses) quando comparada com sutura em plano duplo (Nigro et al.,
1997).
Em cirurgia experimental, a maioria das pesquisas realizadas sobre esôfago foi
realizada a nível cervical. Isto acontece porque as complicações decorrentes de cirurgias
esofágicas no segmento torácico são mais graves e, muitas vezes, fatais (Normando
Jr. et al., 2006), desencorajando os profissionais a trabalharem neste segmento. No
entanto, a maior parte das patologias esofágicas em cães se localiza na porção torácica
(Gonzalez; Iwasaki, 2001). Levando-se em consideração estes aspectos, o
166
Veterinária em Foco, v.7, n.2, jan./jun. 2010
presente trabalho tem o objetivo de avaliar a sutura extramucosa em pontos separados
simples, com fio de algodão e plano único no esôfago torácico de cães, por meio de
avaliação clínica, estudo radiográfico e histológico. O estudo objetiva aperfeiçoar a
técnica cirúrgica das esofagotomias torácicas, na tentativa de diminuir o tempo de
transoperatório e as complicações decorrentes da intervenção, bem como contribuir
para o tratamento de afecções localizadas neste segmento esofágico.
MATERIAL E MÉTODOS
O presente trabalho foi desenvolvido na Faculdade de Medicina Veterinária
e Zootecnia (FMVZ) da Universidade Estadual Paulista (UNESP), campus de
Botucatu.
Foram utilizados 30 cães, sem raça definida, de ambos os sexos, provenientes
do Biotério Central da UNESP, escolhidos ao acaso, com peso variando entre 5,5kg e
18,5kg, divididos em dois grupos, por sorteio. No dia anterior à cirurgia, os cães foram
submetidos a exame clínico e banho carrapaticida com amitraz. Foram feitas radiografias
contrastadas do esôfago com sulfato de bário (30g em 100 ml de água) na dose de 6
ml/kg. Os cães foram internados no canil da pós-graduação da FMVZ.
Após jejum sólido de 12 horas e hídrico de seis horas, foi feita tricotomia da região
torácica esquerda, entre a quarta e sétima costelas, e lavagem com água e sabão. Como
medicação pré-anestésica, foi utilizada levomepromazina na dose de 1 mg/kg por via
intravenosa e atropina na dose de 0,0044mg/kg, por via subcutânea. Foi canulada uma
veia (cefálica ou safena lateral) e transfundida gota a gota, solução fisiológica. Foi injetado
thiopental sódico a 2,5% (utilizando-se como dose padrão, 12,5 mg/kg) na dose suficiente
para permitir intubação. A sonda traqueal foi acoplada ao aparelho de anestesia e foi
administrada uma mistura de oxigênio e halotano em concentração suficiente para que
o animal fosse mantido no III estágio de anestesia. Foi também introduzida uma sonda
oro-esofágica. Imediatamente antes da abertura da cavidade torácica, foi administrada
succinilcolina, na dose de 0,1mg/kg, via intravenosa e o animal foi mantido sob respiração
controlada por pressão positiva intermitente com respirador.
Após anti-sepsia de rotina, foi feita toracotomia intercostal lateral (Fossum,
2007), penetrando-se no sexto espaço intercostal. Uma vez aberta a cavidade torácica,
o esôfago foi localizado (com o auxílio da sonda oro-esofágica) e exposto por dissecção
romba e cortante do mediastino e tecido circundante. O esôfago foi cuidadosamente
elevado até a abertura do tórax, onde foi mantido com a ajuda de uma pinça hemostática
curva, que foi passada por baixo do esôfago com os ramos fechados. O esôfago foi
isolado por meio de compressas e foi feita uma incisão de tamanho médio (de acordo
com o porte do animal), atravessando todos os planos da parede esofágica. Nos animais
do primeiro grupo foi feita uma incisão longitudinal. Nos animais do segundo grupo foi
feita uma incisão transversal. As incisões esofágicas foram fechadas em plano único,
com exclusão da mucosa, utilizando-se pontos separados simples feitos com fio de
algodão cirúrgico n° 2-0 (Figura 1).
Veterinária em Foco, v.7, n.2, jan./jun. 2010
167
FIGURA 1 – Cão, fêmea, 18 kg, SRD. Adventícia de esôfago torácico ao término da sutura em pontos
separados simples com fio de algodão.
Ao término da sutura esofágica, o esôfago foi reposto à sua posição anatômica,
a cavidade foi inspecionada e foram retirados coágulos e outros materiais estranhos.
A cavidade torácica foi irrigada com solução fisiológica, que foi retirada a seguir com
o auxílio de compressas. Antes de se fechar a cavidade, os pulmões foram insuflados
gradativamente para eliminar áreas atelectásicas. O fechamento da parede torácica
foi feito, inicialmente, aproximando-se as costelas com fio de algodão tipo cordonê
utilizando-se pontos em Sultan. Os músculos intercostais foram suturados com suturas
simples contínuas com fio de algodão cirúrgico n° 2-0. Todos os músculos incisados
foram suturados da mesma forma e separadamente, de modo que a mobilidade da
parede torácica não ficasse mecanicamente restrita.
No momento do fechamento da cavidade torácica, os pulmões foram insuflados
para restabelecer a pressão negativa da mesma. A pele foi fechada com pontos separados
simples, com fio de algodão n° 2-0. Durante a cirurgia, foi administrada penicilina
benzatina por via intramuscular, na dose de 30.000 UI/kg, em todos os animais. A
respiração permaneceu controlada até que o animal retornasse a respiração espontânea.
Após a cirurgia, os cães foram alimentados com dieta líquida assim que se
recuperaram da anestesia. Esta alimentação perdurou por três dias, quando, então,
passou-se à ração comercial.
A ferida operatória foi examinada diariamente, foi limpa com solução fisiológica
e recoberta com pomada à base de nitrofurano. Uma semana após a cirurgia, foram
retirados os pontos cutâneos e em todos os animais foram realizadas radiografias
contrastadas do esôfago. Este procedimento foi repetido semanalmente até a eutanásia
dos cães.
Os animais foram eutanasiados e necropsiados 30 dias após a cirurgia. Durante
a necropsia, foram anotadas todas as alterações provocadas pela cirurgia e outros
dados de interesse. Na oportunidade, o esôfago foi dissecado e foi feita a retirada de
um segmento esofágico de aproximadamente 20 cm, incluindo a cicatriz cirúrgica.
168
Veterinária em Foco, v.7, n.2, jan./jun. 2010
Esta peça foi lavada em água corrente e foi aberta. A cicatriz cirúrgica na mucosa
foi cuidadosamente examinada para observação de possíveis fístulas. Foi colhido
fragmento da região operada para preparação de cortes histológicos a fim de se proceder
à análise microscópica. As lâminas foram coradas com hematoxilina-eosina. Os cortes
histológicos foram feitos com a espessura média de 4 a 6 micrômetros.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
A execução da sutura foi fácil e rápida nos animais dos dois grupos. Não houve
dificuldade na identificação da mucosa, pois, quando se incisou a parede esofágica,
ocorreu pequena retração da mucosa, facilitando a sua exclusão da sutura.
A exclusão da mucosa na sutura do esôfago é considerada uma vantagem
(Medeiros et al., 1975; RANEN et al., 2004), pois sua vascularização é delicada,
sofrendo necrose mesmo com pequenos traumatismos. O tempo de regeneração da
mucosa esofágica no cão é bastante rápido quando não existe comprometimento de sua
vascularização (Medeiros et al., 1975), como aconteceu na pesquisa. Isso ocorreu
porque a cicatrização eficiente de uma ferida esofágica deve ocorrer principalmente entre
as camadas submucosas (RANEN et al., 2004), pois a submucosa é que dá sustentação
à sutura esofágica (Dallman, 1988), por ser rica em colágeno (Otero et al., 1980),
essencial na cicatrização (Genzini et al., 1992). Os resultados obtidos corroboram
com a não necessidade de se incluir a mucosa nos planos de sutura. Inclusive evitar a
passagem do fio de sutura pela mucosa diminui a possibilidade de estenoses relacionadas
ao tipo de sutura ou ao fio de sutura (Ranen et al.; 2004),
Em relação ao número de planos da sutura esofágica, é clássica a utilização de
dois planos de sutura (HEDLUND; FOSSUM, 2007). No entanto, nas suturas em dois
planos, o plano interno tem pouco valor, pois o tecido englobado sofre um processo de
necrose isquêmica (Medeiros et al., 1975). Por isso, o plano único é muito utilizado
em outros segmentos do tubo digestivo (Acosta et al., 1975; Steele, 1993; Nieto
et al., 2006) e também no esôfago (RANEN et al., 2004; HEDLUND; FOSSUM, 2007)
com vantagens como: menor quantidade de material estranho nos tecidos, aumentando
sua resistência e diminuindo o grau de fibrose (Acosta et al., 1975); minimização
do risco de protrusão da mucosa e aposição mais precisa das extremidades incisadas
(Steele, 1993) e diminuição da possibilidade de estenose esofágica relacionada ao
tipo e ao fio de sutura (RANEN et al., 2004). Todas estas vantagens foram confirmadas
no estudo realizado, concluindo-se que o plano único deve ser indicado também no
esôfago torácico (RANEN et al., 2004; HEDLUND; FOSSUM, 2007). Na realidade,
mais importante do que o número de planos são os cuidados técnicos (KYLES, 2007),
como sutura em tecido sadio e com boa vascularização e união das extremidades sem
tensão (Medeiros et al., 1975; Otero et al., 1980; OLSEN, 2002), pois hipoxemia
pós-operatória é a causa mais importante de deiscência em cirurgia esofágica (TAKEDA
et al., 2003). Todos estes cuidados técnicos foram tomados neste experimento, o que
culminou, junto com a técnica proposta, em ausência de complicações como fístulas,
Veterinária em Foco, v.7, n.2, jan./jun. 2010
169
estenoses e deiscências, as quais podem ocorrer no pós-operatório de cirurgias esofágicas
(HEDLUND; FOSSUM, 2007).
A maioria dos autores aponta os pontos interrompidos como os mais adequados
para o tecido esofágico (Medeiros et al., 1975; HEDLUND; FOSSUM, 2007).
A indicação de pontos separados se deve ao fato de que este tipo de sutura evita
disseminação de infecção e dificulta a formação de estenose (RANEN et al., 2004).
Estas vantagens se fizeram presentes no estudo em questão, o que leva a concluir que
os pontos interrompidos devem ser os de escolha na sutura do esôfago torácico de cães.
Além disso, o mais importante na sutura esofágica é a utilização de técnica atraumática,
independente do padrão de sutura (OLSEN, 2002; KYLES, 2007).
Em relação ao fio de sutura optou-se pelo fio de algodão por ser um fio de
baixo custo (Boothe, 2007). Além disso, o fio de algodão foi utilizado em cirurgias
esofágicas experimentais em cães (ACOSTA et al., 1975) e em cirurgias em humanos
(Fonseca et al., 2002). Uma técnica meticulosa na sutura do esôfago influencia mais
no resultado final do que o fio utilizado (OLSEN, 2002; KYLES, 2007).
As radiografias contrastadas revelaram discreta dilatação esofágica em alguns
animais (principalmente no segundo grupo), mas, após 30 dias, a maioria dos cães
estava sem dilatação esofágica. Provavelmente a dilatação esofágica foi relacionada ao
trauma vagal no trans-operatório (TWEDT, 1997) a qual pode regredir espontaneamente
ao cessar o trauma (O´BRIEN et al., 1980). Ao tempo da eutanásia, nenhum cão
apresentou sinais clínicos de patologia esofágica (HEDLUND; FOSSUM, 2007). Nos
esofagogramas, observou-se, na maioria dos animais dos dois grupos, passagem do
contraste sem problemas.
Uma das causas de deiscência esofágica no segmento torácico é a ausência de
omento no tórax para tamponar a sutura (OLSEN, 2002). Neste estudo, a ausência de
tamponamento não influiu no aparecimento de deiscências que não foram detectadas.
Mesmo sem essa estrutura, ocorreram aderências na linha de sutura, evidenciando que
pode ocorrer um tamponamento na sutura esofágica no tórax pela pleura mediastinal ou
pleura visceral, sendo esta última observada ao exame microscópico, em alguns casos.
O esôfago deve ser mantido em repouso após procedimento cirúrgico (BONFADA,
2005). No entanto, o repouso esofágico é praticamente impossível, pois o esôfago está
sujeito a constante movimentação devido à deglutição de saliva e respiração (Olsen,
2002), podendo, o animal, receber alimentos logo após a cirurgia (HEDLUND;
FOSSUM, 2007). Isto foi feito neste experimento sem que ocorressem problemas
relacionados a esta dieta. O esôfago pode cicatrizar durante alimentação oral, mesmo
que a incisão esofágica não tenha sido suturada (Stick et al., 1981).
Nos resultados encontrados neste trabalho, houve somente um caso de estenose
discreta sem sinais clínicos, mostrando que a técnica foi eficaz em prevenir estenose
em esofagotomias longitudinais e transversais no cão. A ausência de casos de estenoses
graves pode ser atribuída à exclusão da mucosa na sutura já que a lesão da mucosa pode
ser um fator crucial no desenvolvimento de estenose (OLSEN, 2002), provavelmente por
170
Veterinária em Foco, v.7, n.2, jan./jun. 2010
necrose da mucosa, que ocorre sempre na linha de sutura quando a mucosa é incluída
(Medeiros et al., 1975).
À necropsia, foram observadas aderências em graus variáveis na região operada
em todos os animais. A maior ou menor quantidade de aderências não teve relação com
o grupo ao qual pertenciam. Aderências são achados comuns em cirurgias esofágicas
quando se utiliza fio multifilamentar como algodão, seda e categute (Acosta et al.,
1975; Kumar et al., 1990).
Na macroscopia, a adventícia, tanto no primeiro grupo como no segundo,
apresentou resultados semelhantes, como era de se esperar e estava completamente
cicatrizada em todos os animais.
Em todos os cães, a mucosa estava completamente cicatrizada e também não
foram observadas alterações patológicas como fístulas e infecções. Nos animais do
primeiro grupo (incisão longitudinal), a cicatriz tinha um aspecto excelente, fazendose necessária, às vezes, palpação para localizá-la, pois se confundiam com as pregas
normais do esôfago (Figura 2). Nos animais do segundo grupo, com incisão transversal,
a cicatriz estava mais evidente (Figura 3). Provavelmente, isto se deve ao fato de que as
incisões longitudinais são mais anatômicas, acompanhando as pregas esofágicas, mas
as transversais não acompanham as pregas e nem a disposição das fibras musculares.
Resultados semelhantes foram relatados em esofagotomias torácicas longitudinais e
transversais em cães (RANEN et al., 2004).
FIGURA 2 – Segmento de esôfago torácico canino no qual foi realizada esofagotomia longitudinal. Aspecto da
cicatriz na face mucosa, 30 dias após a cirurgia.
Veterinária em Foco, v.7, n.2, jan./jun. 2010
171
FIGURA 3 – Segmento de esôfago torácico canino, no qual foi realizada esofagotomia transversal. Aspecto da
cicatriz na face mucosa, 30 dias após a cirurgia.
Microscopicamente, em todos os animais, na região da sutura, que corresponde às
camadas submucosa, muscular e adventícia do órgão, observou-se reação granulomatosa
do tipo corpo estranho ao redor do fio. Esta reação era composta predominantemente por
células mononucleares. Os fragmentos do fio estavam englobados por células gigantes
ou envolvidos por macrófagos, que possuíam citoplasma vacuolizado. Em alguns focos
de reação, notou-se presença discreta de neutrófilos. Tecido conjuntivo proliferado,
no qual entre os fibroblastos, havia presença marcante de feixes colágenos e vasos
neoformados, circunscrevia a reação e estendia-se da mucosa à adventícia do órgão.
O epitélio da mucosa, na região da sutura, apresentou-se regenerado. Os elementos da
reação inflamatória descritos no exame histopatológico foram também observados por
outros autores que realizaram trabalhos com as mesmas características (Medeiros
et al., 1975), o que representa uma cicatrização normal, que ocorre quando se usa fio
de algodão no esôfago (Acosta et al., 1975).
Os resultados encontrados, nas condições deste experimento, permitem concluir
que a sutura extramucosa em plano único com pontos separados simples pode ser
utilizada para suturar incisões transversais e longitudinais no esôfago torácico de
cães, permitindo cicatrização anatômica. Os resultados foram melhores em feridas
longitudinais do que em feridas transversais, pois a incisão longitudinal acompanha as
pregas esofágicas, facilitando a cicatrização. O tipo de sutura utilizado foi fundamental
na ausência de complicações pós-cirúrgicas, principalmente estenose e deiscência, as
quais não foram observadas nos animais do experimento.
172
Veterinária em Foco, v.7, n.2, jan./jun. 2010
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Recebido em: dez. 2008
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Aceito em: mar. 2009
Veterinária em Foco, v.7, n.2, jan./jun. 2010
Hiperadrenocorticismo associado
com linfossarcoma hepático em cão –
relato de caso
Éverton Eilert Rodrigues
Melina Garcia Guizzo
Eduardo de Freitas Costa
João Pereira Guahyba Bisneto
Simone Tostes de Oliveira
Félix Hilario Díaz González
Alan Gomes Pöppl
RESUMO
O hiperadrenocorticismo (HAC) ou síndrome de Cushing é um distúrbio decorrente do
excesso de glicocorticoides endógenos ou exógenos, resultando em altas concentrações de cortisol
no plasma. No Brasil, o tratamento mais eficaz disponível é a administração criteriosa de mitotano.
Para monitoramento destes pacientes, testes periódicos de estimulação com ACTH tornam-se
necessários para evitar crises de hipocortisolismo. O objetivo deste trabalho foi relatar um caso de
hiperadrenocorticismo pituitário-dependente associado com linfossarcoma hepático em uma cadela
da raça Poodle de 10 anos de idade, em tratamento para HAC há um ano. Em revisão clínica os
proprietários relataram ocorrência de emese, inapetência e prostração. O exame clínico evidenciou
icterícia e algia abdominal. Descartou-se ocorrência de leptospirose por exames sorológicos e
PCR de amostra de urina, bem como hipoadrenocorticismo por teste de estimulação por ACTH.
Ecograficamente ficou evidente a existência de hepatomegalia com presença de massas heterogêneas
e bordos irregulares. Uma biópsia aspirativa com agulha fina guiada por ultra-som evidenciou
tratar-se de um linfossarcoma, com a paciente indo a óbito dias após realização da biópsia.
Palavras–chave: Síndrome de Cushing. Hiperadrenocorticismo. Linfossarcoma.
Éverton Eilert Rodrigues, Melina Garcia Guizzo, Eduardo de Freitas Costa e João Pereira Guahyba Bisneto
são alunos de graduação do curso de Medicina Veterinária da Universidade Federal do Rio Grande do Sul.
Félix Hilario Díaz González é Professor Doutor do Departamento de Patologia Clínica da Faculdade de Veterinária
da Universidade Federal do Rio Grande do Sul.
Simone Tostes de Oliveira e Alan Gomes Pöppl são Médicos Veterinários Doutorandos pelo Programa de
Pós-Graduação em Ciências Veterinárias da Universidade Federal do Rio Grande do Sul.
Endereço para correspondência: Av. Bento Gonçalves, 8824; Porto Alegre/RS.
CEP: 91540-000. E-mail: [email protected]
Veterinária em Foco
Canoas
v.7
n.2
p.175-184
jan./jun. 2010
Hyperadrenocorticism associated with hepatic lymphosarcoma
in a dog – case report
ABSTRACT
Hyperadrenocorticism or canine Cushing´s syndrome is a hormonal disturbance due to
excessive endogenous glucocorticoid production or glucocorticoid excessive administration,
resulting in high cortisol plasma levels. In Brazil, criterious mitotane administration is the most
available efficient treatment. ACTH stimulation tests must be performed periodically with the
aim of avoid hypocortisolism crisis in these patients. The purpose of this work was to report a
pituitary-dependent hyperadrenocorticism (PDH) associated to hepatic lymphosarcoma in a 10
years old female Poodle that was being treated for PDH during one year. In a clinical revision
owners report sickness, inappetence and prostration. Clinical examination evidenced icterus and
abdominal pain. Leptospirosis was excluded by sorologic trial and by urinary PCR, as well as
hypoadrenocorticism from ACTH stimulation test. Ultrassonography evidenced hepatomegalia
with many heterogenic mass with irregular boards. Fine needle aspirative biopsia ultrassom guided
evidenced lymphosarcoma. The patient died few days after biopsia.
Keywords: Cushing’s syndrome, hyperadrenocorticism, lymphosarcoma.
INTRODUÇÃO
O hiperadrenocorticismo (HAC) é uma desordem endócrina que frequentemente
acomete os cães estando associado ao excesso de glicocorticoides sistêmicos
(FELDMAN; NELSON, 2004). A origem do distúrbio pode ser adreno-dependente
(primária ou tumor adrenocortical funcional), pituitário-dependente (secundária) ou
iatrogênico (administração prolongada e/ou excessiva de corticoides exógenos), sendo
a forma pituitária-dependente a mais comum, afetando cães geralmente com menos
de 20 kg e sendo observada em até 85% dos casos de HAC diagnosticados (ZERBE,
1999). Cães com HAC em geral são de meia idade a idosos e as raças mais afetadas
são Poodle, Daschund, Yorkshire Terrier, Pastor Alemão, Beagle, Labrador e Boxer
(PETERSON, 2007).
Independente da origem do HAC, os sinais clínicos mais frequentemente
observados incluem poliúria, polidipsia, polifagia, aumento do volume abdominal,
fraqueza muscular, obesidade, hepatomegalia, apatia, alopecia, respiração ofegante,
letargia, atrofia testicular nos machos e anestro persistente nas fêmeas (FELDMAN;
NELSON, 2004; PETERSON, 2007). Além da observação do histórico e sinais
clínicos, exames complementares como hemograma, bioquímica sérica e urinálise
devem ser solicitados para auxiliar no diagnóstico. São esperadas as seguintes
alterações: leucograma de estresse, aumento na atividade sérica das enzimas alanina
aminotransferase (ALT) e fosfatase alcalina (FA), hiperlipidemia, hiperglicemia
moderada e baixa densidade urinária (GRECO, 2004). O diagnóstico definitivo obtémse através do teste de supressão com baixa dose de dexametasona (FELDMAN et al.,
1996; ZERBE, 2000; PETERSON, 2007). A ecografia abdominal é bastante útil no
processo diagnóstico, auxilia na diferenciação da origem (pituitária ou adrenal) da
176
Veterinária em Foco, v.7, n.2, jan./jun. 2010
doença, além de prover uma série de informações sobre os demais órgãos abdominais
(BARTHEZ et al., 1995).
No Brasil, o fármaco de escolha para o tratamento do HAC pituitário-dependente
é o mitotano, que causa necrose progressiva das zonas fasciculada e reticular do
córtex da adrenal, diminuindo o nível sérico de cortisol sem afetar a zona glomerulosa
(FELDMAN et al., 1992; DeCLUE et al., 2004). Recentemente, outros países estão
adotando o trilostano por causar menos efeitos colaterais, a terapêutica ser mais simples
e por aumentar a taxa de sobrevida do animal (BRADDOCK et al., 2003; CLEMENTE
et al., 2007; REINE, 2007). O monitoramento do paciente com HAC deve ser feito
com base na normalização dos sinais clínicos e através da realização periódica de testes
de estimulação com ACTH (hormônio adrenocorticotrófico) para avaliar a reserva
funcional da glândula, e desta forma auxiliar na segurança do tratamento, com objetivo
de evitar crises de hipocortisolismo (ZERBE, 2000; HILL et al., 2004; FELDMAN;
NELSON, 2004).
O linfoma (linfossarcoma) é definido como uma neoplasia linfoide que afeta
primariamente os linfonodos e outros órgãos parenquimatosos, sendo um dos distúrbios
proliferativos mais comuns na clínica de pequenos animais (VAIL; OGILVIE, 2003).
Diversos protocolos quimioterápicos são descritos para tratamento, pois o linfossarcoma
é a malignidade mais quimiorresponsiva em medicina veterinária. A prednisona,
por seus efeitos imunomoduladores, é frequentemente empregada para aumentar a
resposta ao tratamento (WITHROW; MacEWEN, 2007). A ocorrência de uma doença
linfoproliferativa como o linfoma em um paciente com hipercortisolismo poderia ser
pouco provável em decorrência dos efeitos linfolíticos dos corticoides (FELDMAN;
NELSON, 2004). Algumas vezes é preconizado o tratamento exclusivamente com
prednisona em pacientes cujos proprietários não aceitam protocolos quimioterápicos
mais agressivos, promovendo uma resposta de curta duração (VAIL; OGILVIE,
2003).
O objetivo deste trabalho foi relatar um caso de linfossarcoma hepático em uma
cadela com HAC pituitário-dependente.
RELATO DO CASO
Uma cadela da raça Poodle de 10 anos de idade (Figura 1), pesando 8,3 kg e
apresentando histórico de HAC de origem pituitária há aproximadamente um ano,
estava sendo monitorada através de testes periódicos de estimulação com ACTH
mantendo-se com o cortisol dentro da faixa de controle, entre 10 – 50 ng/mL (a meta
do tratamento da síndrome de Cushing é manter o cortisol pós-ACTH entre 10 e 50
ng/mL), por administração de mitotano em fase de manutenção (50 mg/kg/semana
dividido em dois dias). Durante este período, a paciente apresentou um quadro isolado
de hipoadrenocorticismo iatrogênico, facilmente revertido pela administração de
prednisona e suspensão temporária do mitotano.
Veterinária em Foco, v.7, n.2, jan./jun. 2010
177
FIGURA 1 – Paciente em acompanhamento de tratamento para hiperadrenocorticismo apresentada com queixa
de emese, inapetência e fraqueza. O abdômen da paciente apresenta-se discretamente abaulado e a pelagem
não apresenta alopecia ou rarefação pilosa.
Numa determinada revisão periódica da paciente, os proprietários relataram sinais
clínicos de emese, anorexia, cólicas e fadiga. Ao exame clínico, a paciente apresentava
as mucosas, pele da pina e esclera levemente ictéricas, normotermia (38,4°C), boa
hidratação, tempo de preenchimento capilar menor que dois segundos, frequência
cardíaca de 138 bpm, algia à palpação na região abdominal cranial e uma massa
palpável próximo da região esternal, sugerindo alteração no fígado ou baço. Também
foi detectada uveíte e pústulas pelo corpo, além de ter sido levantada a possibilidade
do cão ter entrado em contato com ratos.
Solicitou-se hemograma, exames bioquímicos com determinação da atividade
sérica da ALT e FA e urinálise com pesquisa de espiroquetas em campo escuro. Foi
realizada sorologia para Leptospira spp, bem como reação em cadeia da polimerase
(PCR) para a detecção de DNA de leptospiras patogênicas em amostra de urina. Um
teste de estimulação por ACTH foi realizado através da administração de tetracoside
(ACTH sintético) na dose de 5 µg/kg por via IV com mensuração de cortisol sérico
após uma hora da aplicação da medicação.
Até que se tomasse conhecimento dos resultados dos exames, a terapêutica indicada
foi composta por metoclopramida (0,5 mg/kg VO TID por 5 dias), ranitidina (1 mg/
kg VO TID por 5 dias), prednisona (0,5 mg/kg VO SID até obter melhora clínica) e
enrofloxacina (5 mg/kg VO BID por 21 dias). A pesquisa de espiroquetas em campo escuro
obteve resultado negativo, assim como a PCR, apesar do título de 1:100 para Leptospira
icterohaemorrhagiae na sorologia. O resultado do teste de estimulação com ACTH foi
de 100,8 ng/mL, afastando a possibilidade de hipoadrenocorticismo iatrogênico.
Os resultados dos exames complementares demonstraram plasma discretamente
ictérico no hemograma (Tabela 1). O perfil bioquímico apontou hipercolesterolemia,
hipercalemia, um leve aumento das globulinas e aumento da atividade sérica da ALT e
FA (Tabela 2), estas duas últimas sugerindo lesão hepática. Na urinálise foram detectadas
bilirrubinúria, proteinúria e densidade urinária baixa (Tabela 3).
178
Veterinária em Foco, v.7, n.2, jan./jun. 2010
TABELA 1 – Hemograma apresentando os valores obtidos da paciente
e os de referência para a espécie canina.
Hemograma
Paciente
Referência
Paciente
Referência
Leucócitos (µL)
8.700
6.000 – 17.000
Eritrócitos (106/µL)
Segmentados
6.699
3.000 – 11.500
Hematócrito (%)
6,99
5,5 – 8,5
49
37 – 55
Eosinófilos
261
100 – 1.250
Monócitos
348
150 – 1.350
Hemoglobina (g/dL)
15,8
12 – 18
VCM (fL)
70
60 – 77
Linfócitos
1.392
1.000 – 4.800
CHCM (%)
32,2
32 – 36
Observações
1. Plasma ictérico
TABELA 2 – Perfil bioquímico apresentando os valores obtidos da paciente
e os de referência para a espécie canina.
Perfil Bioquímico
Tipo de amostra: soro
Hemólise da amostra: ausente
Paciente
Proteínas totais (g/L)
Referência
Paciente
Referência
68
54 – 71
Ureia (mg/dL)
20
21 – 60
Albumina (g/L)
23,2
26 – 33
Glicose (mg/dL)
64
65 – 118
Globulinas (g/L)
44,8
27 – 44
Fósforo (mg/dL)
3,9
2,6 – 6,2
Creatinina (mg/dL)
0,5
0,5 – 1,5
Potássio (mol/L)
8,44
3,5 – 5,1
Colesterol total (mg/dL)
388
135 – 270
ALT (UI/L)
1330
0 – 102
Frutosamina (mmol/L)
236
170 – 338
FA (UI/L)
1459
0 – 156
TABELA 3 – Urinálise apresentando os valores obtidos da paciente e os de referência para a espécie canina.
Urinálise
Exame físico
Cor
Consistência
Aspecto
Densidade específica (1,015 – 1045)
Amarelo
Fluida
límpido
1,010
pH (5,5 – 7,5)
Pigmentos biliares
Proteína
7,4
+++
++++
Exame químico
Observações
1. Método de colheita: Micção natural. 2. Presença de gotículas de gordura. 3. Bacteriúria leve.
Foi realizada uma ecografia para investigação da origem da massa intra-abdominal
(Figura 2). Observou-se hepatomegalia com parênquima heterogêneo, manchas
Veterinária em Foco, v.7, n.2, jan./jun. 2010
179
hiperecogênicas difusas e de contorno pouco definido, sendo sugerida uma biópsia hepática.
Os proprietários não aceitaram inicialmente a realização de BAAF (biópsia aspirativa
com agulha fina), sendo acrescentados à terapêutica inicial, ácido ursodesoxicólico (15
mg/kg VO BID por 30 dias), doxiciclina (5 mg/kg VO BID por 15 dias) e silimarina (7
mg/kg VO SID por 30 dias). A prednisona e enrofloxacina foram suspensas.
FIGURA 2 – Imagem ecográfica do fígado da paciente evidenciando parênquima heterogêneo e a presença de
um nódulo hiperecogênico com cerca de 1,2 cm de diâmetro (seta).
Após cerca de 30 dias, observou-se na ecografia uma redução na definição
das áreas hiperecogênicas que passaram a apresentar-se de forma mais difusa pelo
parênquima hepático, sendo então autorizada a realização do exame citológico do
fígado (biópsia), o qual foi realizado a partir de um aspirado com agulha fina guiado
por ultra-som. O resultado evidenciou um material constituído de linfoblastos alterados
e em grande quantidade, compatível com linfossarcoma hepático (Figura 3). Após o
diagnóstico de linfossarcoma, a paciente sobreviveu por mais cinco dias e veio a óbito.
A necropsia da paciente não foi autorizada pelos proprietários.
FIGURA 3 – Citologia de material aspirado do fígado da paciente por meio de BAAF guiada por ultra-som
evidenciando a presença de grande quantidade de linfócitos com volume nuclear aumentado, cromatina em
padrão granular e redução do volume citoplasmático (seta), recebendo o diagnóstico citológico de linfossarcoma
hepático. Coloração Wrigth-Giemsa, aumento de 400 x.
180
Veterinária em Foco, v.7, n.2, jan./jun. 2010
DISCUSSÃO
Através do histórico e dos sinais clínicos apresentados pela paciente, inicialmente
suspeitou-se de hipoadrenocorticismo iatrogênico causado pela administração contínua
de mitotano (FELDMAN; NELSON, 2004). Essa hipótese foi descartada baseada
no teste de estimulação de ACTH e no achado clínico de plasma ictérico, este não é
esperado no hipocortisolismo.
Outra suspeita foi de hepatite causada por leptospirose, devido ao relato de
possível contato com ratos e a sintomatologia desta enfermidade ser a mesma descrita
na anamnese (NELSON; COUTO, 2006). O resultado da sorologia com titulação
mínima indicava que a paciente poderia ter entrado em contato com o sorovar em algum
momento da vida e que mantinha uma taxa baixa de anticorpos ou indicava um título
vacinal. A PCR de amostra urinária foi negativa, indicando que não estava ocorrendo
eliminação ambiental de leptospira pela urina. A literatura não suporta a leptospirose
como uma condição indutora de linfossarcoma, não sendo provável qualquer relação
entre estas afecções no presente relato.
Até o momento tornava-se evidente uma possível hepatopatia. Os testes
bioquímicos apontaram a atividade sérica da ALT aumentada, caracterizando lesão
dos hepatócitos (LASSEN, 2004). A atividade da FA também esteve aumentada em
decorrência da colestase e do cortisol acima da faixa considerada de controle para
cães com Cushing, demonstrando a existência de hipercortisolismo (LASSEN, 2004;
FELDMAN; NELSON, 2004).
Apesar da faixa de referência de cortisol para cães saudáveis estar entre 60 e
170 ng/mL, o objetivo do tratamento da síndrome de Cushing é manter o paciente
com cortisol pós-ACTH entre 10 e 50 ng/mL, faixa onde considera-se o paciente com
um controle excelente e observa-se a total remissão dos sinais clínicos e alterações
laboratoriais. O valor de cortisol da paciente em 100,8 ng/mL configura descontrole da
doença, mesmo estando dentro da faixa de referência para cães normais, e indicaria a
necessidade de retomada do tratamento com mitotano em fase de indução (25 mg/kg
BID) caso a paciente não estivesse inapetente e com episódios de emese (FELDMAN;
NELSON, 2004). Valores acima de 220 ng/mL são compatíveis com o diagnóstico de
hiperadrenocorticismo (ZERBE, 2000).
De acordo com González & Silva (2006), a hipercolesterolemia na presença de
icterícia, poderia ser associada à colestase, uma vez que a obstrução dos canalículos
biliares impede a exportação da bile e, consequentemente, do colesterol. Contudo,
hipercolesterolemia é um achado comum no HAC não compensado (FELDMAN;
NELSON, 2004). A albumina e ureia com níveis abaixo do normal podem ser
explicadas pela inapetência crônica, mas principalmente por insuficiência hepática,
já que são sintetizadas no fígado. O nível da glicose apresentado justifica-se pelos
mesmos motivos acima, pois sua manutenção é baseada na gliconeogênese hepática.
(LASSEN, 2004).
Veterinária em Foco, v.7, n.2, jan./jun. 2010
181
Segundo Fighera et al., (2002) e Morris & Dobson (2007), a hipercalemia
explica-se pela ocorrência de síndrome paraneoplásica característica de linfossarcoma.
Na urinálise, a detecção de bilirrubinúria grave corrobora com o diagnóstico de
alteração hepática, descartando a hipótese de hemólise excessiva devido aos níveis
normais do eritrograma (LASSEN, 2004). Para Shaw & Ihle (1999), a densidade
urinária diminuída ocorre pelo excesso de cortisol, causando a inibição da secreção
de vasopressina (ADH). A isostenúria observada na paciente poderia ser decorrente
do próprio linfossarcoma, uma vez que a presença de isostenúria é um indicativo da
existência de poliúria/polidipsia (WATSON, 2005). Cardoso et al. (2004), relataram a
poliúria/polidipsia como um sinal clínico do linfoma canino. Apesar disso, na opinião
dos proprietários a ingestão de água estava sob controle em valores inferiores a 100
mL/kg/dia. A proteinúria pode ser explicada por uma glomeruloesclerose, patologia
que causa fibrose nos glomérulos e é decorrente da hipertensão sanguínea comumente
observada em cães com HAC (HURLEY; VADEN, 1998). A bacteriúria leve não
parece ser significativa tendo em vista que a forma de colheita foi por micção natural
podendo ter ocorrido contaminação e por não haver evidência de cistite no sedimento
urinário (piúria, hematúria, bacteriúria). A realização de cultura e antibiograma é sempre
recomendada em amostras de urina de cães com baixa densidade urinária, tendo em vista
que a diluição da urina pode mascarar as evidências citológicas de infecção urinária
(FELDMAN; NELSON, 2004, WATSON, 2005).
A partir do resultado da biópsia do fígado, com linfoblastos alterados e em
excessiva quantidade ficou evidente tratar-se de linfossarcoma hepático (MORRIS;
DOBSON, 2007). O linfossarcoma é uma neoplasia de caráter maligno e evolução
rápida, frequentemente relatado em cães e que se origina em órgãos linfoides sólidos
como linfonodos, baço ou fígado (FIGHERA et al., 2002). É a neoplasia hematopoiética
mais comumente relatada em cães, totalizando aproximadamente 90% dos casos de
neoplasias hematopoiéticas (MOULTON; HARVEY, 1990) e 5 a 10% de todas as
neoplasias de cães (CARDOSO et al., 2004). O histórico e os achados físicos dependem
da localização anatômica e dos órgãos acometidos (FIGHERA et al., 2002; CARDOSO
et al., 2004). Sinais como emese, inapetência e perda de peso estiveram presentes
nesta paciente e foram identificados em vários cães no estudo de Cardoso et al. (2004).
Sinais menos comumente associados ao linfossarcoma como icterícia e hepatomegalia
estiveram presentes nesta paciente.
A existência de hipercortisolismo concomitante ao linfossarcoma pode ter sido a
razão pela qual algumas anormalidades comumente associadas ao linfossarcoma não
foram observadas, como por exemplo, linfadenomegalia/linfadenopatia, observada
em 87% dos casos de linfossarcoma (CARDOSO et al., 2004). O cortisol em excesso
provavelmente mascarou alguns destes sinais, já que é um hormônio que promove
linfólise quando em excesso (GRECO, 2004). O óbito da paciente poucos dias após
a realização do BAAF, não permitiu a realização de qualquer tentativa de tratamento
quimioterápico.
182
Veterinária em Foco, v.7, n.2, jan./jun. 2010
CONCLUSÃO
A descrição simultânea de HAC e linfossarcoma trata-se de um caso incomum,
pois as duas doenças foram encontradas associadas na paciente. Como o linfossarcoma
é altamente maligno e na maioria dos casos leva a morte rapidamente, talvez tenha sido
possível diagnosticar a tempo as duas enfermidades em função do hipercortisolismo,
pois pode ter controlado, em parte, a evolução do linfossarcoma pelos seus efeitos
imunossupressores.
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Recebido em: fev. 2009
184
Aceito em: jun. 2009
Veterinária em Foco, v.7, n.2, jan./jun. 2010
Catarata em cães – revisão de literatura
Luciane de Albuquerque
Ana Carolina da Veiga Rodarte de Almeida
Paula Stieven Hünning
Fabiana Quartiero Pereira
Cláudia Skilhan Faganello
João Antonio Tadeu Pigatto
RESUMO
A catarata é a principal causa de cegueira tratável em cães, para qual a única forma de
tratamento é a remoção cirúrgica. Sua origem pode ser metabólica, senil, inflamatória, tóxica,
nutricional, induzida por fármacos, traumática ou primária relacionada à raça. O diagnóstico é
realizado após a obtenção de midríase e utilizando a biomicroscopia com lâmpada de fenda. O
diagnóstico diferencial deve ser feito de esclerose da lente. Nos últimos anos, o sucesso da remoção
da catarata tem aumentado, principalmente após o desenvolvimento da técnica de facoemulsificação.
Este trabalho é uma revisão de literatura sobre catarata em cães, incluindo etiologia, patogenia,
sinais clínicos, diagnóstico, tratamento e prognóstico desta afecção.
Palavras-chave: Catarata. Cães. Cirurgia.
Cataract in dogs – a review
ABSTRACT
Cataract is a leading cause of treatable blindness in dogs. Surgery is the only method of
restoring vision in a patient blinded by cataracts. Its origins may be due to hereditary, metabolic,
senile changes, trauma, nutritional deficiencies, toxins, drugs, radiation therapy, and inflammation.
Diagnosis of cataracts is made after mydriasis using slit-lamp biomicroscopy. The differential
diagnostic for cataracts is nuclear sclerosis. Surgery is the only method of restoring vision in a
Luciane de Albuquerque é acadêmica de Medicina Veterinária, Universidade Federal do Rio Grande do Sul
(UFRGS).
Ana Carolina da Veiga Rodarte de Almeida é Médica Veterinária, Mestranda do Programa de Pós-graduação
Ciências Veterinárias da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).
Paula Stieven Hünning é Médica Veterinária, Mestranda do Programa de Pós-Graduação Ciências Veterinárias
da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).
Fabiana Quartiero Pereira é Médica Veterinária, Mestranda do Programa de Pós-Graduação Ciências Veterinárias
da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).
Cláudia Skilhan Faganello é acadêmica de Medicina Veterinária, Universidade Federal do Rio Grande do Sul
(UFRGS).
João Antonio Tadeu Pigatto é Médico Veterinário, Doutor, Professor Adjunto, Departamento de Medicina Animal,
Faculdade de Veterinária da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).
Endereço para correspondência: Prof. João A. T. Pigatto – Av. Bento Gonçalves, 9090. Bairro Agronomia. Porto
Alegre, RS. 91540-000. E-mail: [email protected]
Veterinária em Foco
Canoas
v.7
n.2
p.185-197
jan./jun. 2010
patient blinded by cataracts. The success rate of cataract surgery has risen significantly during last
years, especially after introduction of phacoemulsification. This paper is a study based in literature
review, about cataract in dogs, including etiology, pathogenesis, diagnostic, options of treatment
and prognosis of this affection.
Keywords: Cataract. Dogs. Surgery.
INTRODUÇÃO
A catarata é a opacidade das fibras ou da cápsula do cristalino, sendo a principal
causa de cegueira tratável em cães (ADKINS; HENDRIX, 2005).
O diagnóstico é baseado no exame com biomicroscopia com lâmpada de fenda
realizado após obtenção de midríase. O exame da lente é fundamental para se detectar
a presença, localização e extensão da opacidade do cristalino (BARNETT, 1985;
ORÉFICE; BORATTO, 1989).
O tratamento da catarata é cirúrgico. As técnicas de remoção da catarata evoluíram
nas últimas décadas. Inicialmente, houve uma mudança da extração intra para a
extracapsular convencional do cristalino e para a facoemulsificação (BARROS, 1990;
DZIEZYC, 1990; GLOVER; CONSTANTINESCU, 1997; KEIL; DAVIDSON, 2001).
Os principais avanços técnicos da cirurgia de catarata estão ligados à consolidação e
ao aprimoramento da facoemulsificação que atualmente é a técnica de eleição para o
tratamento de pacientes com catarata, quer em Medicina quer em Veterinária (ADKINS;
HENDRIX, 2005; BARROS, 1990; BOLDY, 1988).
Atualmente a taxa de sucesso para a extração da catarata varia de 80 a 95%,
dependendo da seleção criteriosa do paciente e da técnica utilizada (GILGER, 1997).
Objetiva-se, com este trabalho, auxiliar para a abordagem da catarata permitindo
identificação precoce, diagnóstico preciso e tratamento eficaz.
CRISTALINO
O cristalino ou lente é uma estrutura biconvexa, transparente, avascular que está
sustentado atrás da íris pelas fibras zonulares (Figura 1). Anterior à lente está o humor
aquoso e posteriormente o humor vítreo (ORÉFICE; BORATTO, 1989; SLATTER,
2005). As fibras zonulares se originam no corpo ciliar, alterações na tensão dessas
fibras, devido às contrações do músculo ciliar, alteram a curvatura do cristalino e
consequentemente a sua dioptria. O bulbo do olho possui a capacidade de ajuste do seu
foco devido à capacidade do cristalino de alterar sua forma de acordo com a distância
dos objetos. Esse fenômeno denomina-se acomodação. Os cães possuem a musculatura
do corpo ciliar menos desenvolvida do que os humanos, resultando em uma dioptria
de 40 em comparação com o homem que possui uma dioptria de 20 e um alto poder de
acomodação visual. Com o avanço da idade o poder de acomodação diminui devido à
redução da elasticidade do cristalino (SLATTER, 2005; TEIXEIRA, 2003).
186
Veterinária em Foco, v.7, n.2, jan./jun. 2010
FIGURA 1 – Cristalino de cão. Observa-se lente sem opacidade e ligamentos zonulares.
Fonte: PIGATTO, J. A. T. Serviço de Oftalmologia Veterinária UFRGS.
A lente é composta por um núcleo e um córtex que são envolvidos por uma cápsula
anterior e posterior. Seu volume em cães é de aproximadamente 0,5 ml, seu eixo ânteroposterior é de 7 mm e seu diâmetro equatorial pode variar de 9 a 11,5 mm (TEIXEIRA,
2003). A cápsula possui na sua face anterior, uma camada epitelial unicelular, que ao
nível do equador, se diferencia em fibras lenticulares que vão se dispondo, em forma
concêntrica, ao redor do núcleo, assim formando a camada cortical. Ela é composta
por fibras de colágeno e carboidratos complexos, possuindo propriedades elásticas
que regulam o formato da lente. É impermeável a moléculas grandes como albuminas
e globulinas, mas permite a passagem de água e eletrólitos. Sua espessura é de 8 a 12
μm na região equatorial, 50 a 70 μm na porção anterior e apenas 2 a 4 μm na porção
posterior (GELLAT; GELLAT, 2001; ORÉFICE; BORATTO, 1989; PLAYTER, 1977;
SLATTER, 2005).
O córtex é composto por células jovens, lenticulares dispostas em camadas
interdigitadas ao redor do núcleo que é formado por células mais velhas, de maior
densidade e menos transparentes que as do córtex (PLAYTER, 1977).
O cristalino consiste basicamente de água, proteínas, minerais, carboidratos e
lipídeos (GLOVER; CONSTANTINESCU, 1997). A proporção de proteínas varia de
acordo com a espécie, idade e dimensão da lente. Devido ao seu caráter avascular, o
metabolismo da lente depende basicamente dos nutrientes e do oxigênio proveniente do
humor aquoso. Distúrbios nessa composição afetam o metabolismo e a transparência
lenticular (SLATTER, 2005). A principal função do cristalino é a refração dos raios
luminosos em direção a retina e a acomodação visual (ADKINS; HENDRIX, 2003;
GLOVER; CONSTANTINESCU, 1997; SLATTER, 2005).
Veterinária em Foco, v.7, n.2, jan./jun. 2010
187
CATARATA
A catarata é a opacidade da lente ou de sua cápsula e é considerada uma das
causas mais frequentes de cegueiras em cães (DAVIDSON; NELMS, 1999; KEIL;
DAVIDSON, 2001; PARK et al., 2009; PLAYTER, 1977; ).
A opacificação do cristalino impede que os feixes luminosos incidam sobre a retina e
com isso não ocorre formação da visão (ADKINS; HENDRIX, 2003, SLATTER, 2005).
Embora os caninos sejam na medicina veterinária, a espécie mais acometida
pela opacificação da lente, estudos demonstram a ocorrência dessa afecção em outras
espécies, incluindo os felinos (DAVID; HEATH, 2006; WILLIAMS; HEALTH, 2006),
equinos (DZIEZYC, 1990), coelhos (ASHTON et al., 1976), avestruz (GONÇALVES et
al., 2006), lhamas (GIONFRIDDO; BLAIR, 2002), roedores (MUNGER et al., 2002),
leopardos (COOLEY, 2001), entre outras.
O mecanismo de formação da catarata não está totalmente elucidado. Acredita-se
que qualquer interferência que ocorra na nutrição da lente, metabolismo energético e/ou
proteico e no equilíbrio osmótico podem resultar na opacificação lenticular (SLATTER,
2005). Estudos apontam que a catarata resulta da combinação de uma série de eventos
onde ocorre agregação de proteínas lenticulares, aumento das proteínas insolúveis,
estresse osmótico, disfunções no metabolismo energético, alterações no metabolismo
nutricional, mudanças na concentração de oxigênio, exposição a toxinas e alterações
de concentrações iônicas. Essas alterações acarretam a vacuolização ou precipitação
das proteínas do cristalino que produzem perda da sua transparência (GLOVER;
CONSTANTINESCU, 1997).
A catarata é comumente classificada de acordo com a sua etiologia, idade de
aparecimento, grau de desenvolvimento e localização. Com relação à etiologia, a
catarata pode ser hereditária ou adquirida. A hereditariedade da catarata foi descrita
em várias raças de diferentes espécies como cães, gatos e cavalos (SLATTER, 2005).
Estudo prévio, demonstrou que qualquer raça de cães pode ser acometida por catarata,
contudo a incidência em cães da América do Norte é maior nas raças como Boston
Terrier (11,11%), Poodle miniatura (10,79%), American Cocker Spaniel (8,77%),
Standard Poodle (7,00%), e Schnauzer Miniatura (4,98 %) (GELLAT; MACKAY, 2005).
Adkin e Hendrix (2005), também verificaram que as raças Cocker Spaniel, Schnauzer
em miniatura, Boston Terrier, Poodle em miniatura e Bichon Frise foram as raças mais
acometidas pela opacificação da lente.
Entre as causas mais comuns das cataratas adquiridas, encontram-se as doenças
metabólicas, trauma ocular, a inflamação intraocular, as deficiências nutricionais, o
choque elétrico e a radioterapia (SLATTER, 2005). A idade dos cães no início da
formação da catarata, bem como seu histórico completo, pode ajudar a determinar a
causa (BAUMWORCEL et al., 2009; DAVIDSON; NELMS, 1999).
A incidência de catarata em cães diabéticos chega a 68%, sendo considerada
a manifestação ocular mais comum nos caninos com diabetes mellitus (BASHER;
188
Veterinária em Foco, v.7, n.2, jan./jun. 2010
ROBERTS, 1995). As enzimas responsáveis pelo metabolismo normal da glicose
tornam-se saturadas, ocasionando excesso de sorbitol que se acumula na lente,
aumentando assim o estado osmótico da lente o que resulta em posterior estado de
intumescência da lente. A catarata diabética geralmente cursa com surgimento agudo
e é bilateral (BEAM et al., 1999; RICTHER et al., 2002).
Com relação à idade de aparecimento, a catarata pode ser classificada como
congênita, juvenil ou senil (SLATTER, 2005).
Cataratas congênitas são frequentemente observadas em raças como Schnauzer
miniatura e Labrador (DAVIDSON; NELMS, 1999). Em outras espécies, como equinos
e bovinos, as cataratas congênitas podem ser observadas antes de duas semanas de idade.
Geralmente são observadas de forma secundária ou em associação a outras alterações,
como membrana pupilar persistente, persistência da artéria hialoide, microftalmia e
anormalidades diversas (SLATTER, 2005). A catarata juvenil geralmente acomete cães
até seis anos de idade e a catarata senil é aquela que atinge cães com idade superior a sete
anos, afetando com maior frequência o núcleo do cristalino, sendo geralmente precedida
de esclerose nuclear (GLOVER; CONSTANTINESCU, 1997; SLATTER, 2005).
Quanto à localização anatômica, a catarata pode ser capsular, subcapsular, zonular,
cortical, nuclear, polar, axial ou equatorial (DAVIDSON; NELMS, 1999; SLATTER,
2005).
A classificação pelo estágio de desenvolvimento inclui incipiente, imatura, madura
e hipermadura (BARNETT, 1985; BAUMWORCE et al., 2009; DAVIDSON et al., 1991,
l). Na catarata incipiente ocorre opacidade em até 15 % do cristalino o que não acarreta
perda da visão. Ela pode aparecer apenas como áreas focais enbranquecidas na lente. O
estágio imaturo (Figura 2-A) envolve a opacidade entre o estágio incipiente e a catarata
madura. Neste estágio ainda é possível visualizar o reflexo do fundo de olho. No estágio de
catarata madura (Figura 2-B) o cristalino está totalmente opacificado e o reflexo de fundo
de olho e a visão estão ausentes, o que conduz ao déficit visual. Na catarata hipermadura
as proteínas corticais se tornam líquidas, normalmente deixando a cápsuIa enrugada. O
córtex se liquefaz devido à proteólise, sendo possível visibilizar o reflexo do fundo de
olho (BARROS, 1990; DAVIDSON; NELMS, 1999; TEIXEIRA, 2003).
Veterinária em Foco, v.7, n.2, jan./jun. 2010
189
FIGURA 2 – Catarata em cães. (A) Catarata imatura e (B) catarata madura.
Fonte: PIGATTO, J. A. T. Serviço de Oftalmologia Veterinária UFRGS.
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO DA CATARATA
O principal sinal clínico da catarata é a opacificação da lente e a diminuição
da acuidade visual do animal relatada pelo proprietário. O diagnóstico da catarata
é estabelecido com base na anamnese e no exame oftálmico (BARNETT, 1985;
BAUMWORCEL et al., 2009; DAVIDSON; NELMS, 1999; TEIXEIRA, 2003). A
opacificação pode estar presente em um ou em ambos os olhos. A maioria dos sinais
clínicos relacionados à catarata tem evolução lenta, exceto nos casos relacionados a
doenças sistêmicas, como o diabetes mellitus, onde a opacificação progride rapidamente.
Nas cataratas maduras ou hipermaduras bilaterais ocorre a perda da visão (BEAM et
al., 1999; RICHTER et al., 2002).
Normalmente no exame oftálmico, utiliza-se biomicroscopia com lâmpada de
fenda ou oftalmoscopia direta para confirmar o diagnóstico da opacificação lenticular,
o exame é melhor realizado com a pupila dilatada (BARNETT, 1985; ORÉFICE;
BORATTO, 1989).
É importante diferenciar a catarata da esclerose (SLATTER, 2005). A esclerose
nuclear consiste num processo fisiológico, que acomete cães geralmente com idade
superior a sete anos e sua ocorrência é sempre bilateral (BARNETT, 1985). A esclerose
ocorre devido ao aumento da densidade do núcleo ocasionado pela formação de novas
células lenticulares no equador da lente que forçam a migração das células velhas em
direção a zona nuclear (SLATTER, 2005).
Clinicamente, o cristalino com esclerose não interfere na observação do reflexo do
fundo de olho (Figura 3). Porém, quando associada à catarata, a visualização do reflexo
do fundo de olho fica prejudicada ou impossível de ser identificada (PLAYTER, 1977).
A esclerose não acarreta na perda da visão, não sendo necessária a intervenção
cirúrgica. A perda da visão ocorre somente em casos em que a esclerose esteja associada
à catarata madura ou hipermadura (BARNETT, 1985; PLAYTER, 1977).
190
Veterinária em Foco, v.7, n.2, jan./jun. 2010
FIGURA 3 – Cão com esclerose da lente. Fonte: PIGATTO, J. A. T. Serviço de Oftalmologia Veterinária UFRGS.
O tratamento para catarata é cirúrgico e as técnicas incluem a remoção intracapsular,
a extracapsular manual e a facoemulsificação (GLOVER; CONSTANTINESCU, 1997;
KEIL; DAVIDSON, 2001; MAGRANE, 1989).
Na extração intracapsular da catarata, o cristalino é removido por inteiro sendo
utilizada apenas nos casos de luxação do cristalino (Figura 4). Nesta técnica, a incidência
de descolamento de retina é mais elevada do que nas técnicas extracapsulares (DAVIDSON
et al., 1990; GLOVER; CONSTANTINESCU, 1997). Quando a remoção da catarata era
rotineiramente conduzida empregando-se o procedimento intracapsular, obtinham-se bons
resultados em apenas 29% dos cães operados (MAGRANE, 1989).
FIGURA 4 – Cão com luxação da lente. Fonte: PIGATTO, J. A. T. Serviço de Oftalmologia Veterinária UFRGS.
Veterinária em Foco, v.7, n.2, jan./jun. 2010
191
Na remoção extracapsular manual, após ampla incisão de córnea de
aproximadamente 12 mm, a porção central da cápsula anterior é removida para acessar
a catarata. Nessa técnica a cápsula posterior do cristalino é preservada, evitando com
isso prolapso do corpo vítreo e descolamento de retina (DAVIDSON et al., 1999;
PIGATTO, 2004). Valendo-se da técnica extracapsular convencional em cães obtinha-se
retorno da função visual em entre 79% e 85,7% dos casos operados (BARROS, 1990;
ROOKS et al., 1985).
Nos últimos anos, os principais avanços da cirurgia de catarata estão ligados à
consolidação e ao aprimoramento da facoemulsificação. Surgida no final da década
de 60, quando o cirurgião norte-americano Charles Kelman a apresentou em um
encontro da Academia Americana de Oftalmologia, a facoemulsificação passou por
inúmeros aperfeiçoamentos incluindo, novos aparelhos, lentes intraoculares dobráveis,
desenvolvimento de substâncias viscoelásticas e formas diferenciadas de fragmentação
do cristalino, entre outras (ARSHINOFF, 1999; BAGLEY; LAVACH, 1994; GILGER,
1997; MILLER et al., 1987).
A facoemulsificação consiste na fragmentação ultra-sônica do cristalino, que
é aspirado do bulbo do olho por uma incisão corneana de cerca de 3 mm (Figura
5). Comparada às demais técnicas de remoção da catarata, a facoemulsificação
proporciona os melhores resultados (BOLDY, 1988; DZIEZYC, 1990; PIGATTO, 2004;
WHITLEY et al., 1993; WILKIE; COLITZ, 2009). Dentre as principais vantagens da
facoemulsificação, comparativamente às demais técnicas, estão a pequena incisão,
a manutenção da pressão intraocular intraoperatória e a pouca manipulação das
estruturas internas ao globo ocular (CHEE et al., 1999; GILGER, 1990; PIGATTO,
2004; TEIXEIRA, 2003; WARREN, 2004). Incluem-se ainda como vantagens da
facoemulsificação sobre as técnicas manuais, menor contaminação, menor inflamação
intraocular pós-operatória, menor tempo operatório e a reabilitação precoce da visão
(BOLDY, 1988; GLOVER; CONSTANTINESCU, 1997; KOCH et al., 1993; MILLER
et al.,1997; MURPHY, 1980).
O sucesso da cirurgia de catarata em cães tem aumentado acentuadamente nos
últimos 15 anos, especialmente devido ao desenvolvimento da facoemulsificação,
alcançando o índice de 80 a 95% de resultados satisfatórios (GILGER, 1997;
ÖZGENCIL, 2005, TAYLOR et al., 1995; WILKIE; COLITZ, 2009).
192
Veterinária em Foco, v.7, n.2, jan./jun. 2010
FIGURA 5 – Técnica de facoemulsificação em cães.
Fonte: PIGATTO, J. A. T. Serviço de Oftalmologia Veterinária UFRGS.
O implante de lente intraocular em cães após a remoção da catarata é tecnicamente
possível (NASISSE et al., 1991; TEIXEIRA, 2003). Em virtude das diferenças de
tamanho e de poder refrativo, as lentes intraoculares de uso humano devem ser evitadas
e somente devem ser empregadas lentes específicas para a espécie canina (DAVIDSON
et al., 1991; NASISSE et al., 1991). Em humanos após a remoção da carata são utilizadas
lentes de 18 dioptrias. Em cães existem diferenças anatômicas e no mecanismo de
acomodação visual, em relação ao homem, fazendo-se necessário uma lente de poder
dióptrico mais elevado com 40 dioptrias (TEIXEIRA, 2003; KOPALA, 2008).
A implantação da lente intraocular melhora o poder óptico do afácico e ajuda a
diminuir a opacidade da cápsula posterior pós-operatória. Porém, complicações como
luxação da lente implantada e inflamação intraocular transitória, são possíveis de
acontecerem (DAVIDSON; NELMS, 1999). A lente mais utilizada em cães é constituida
por material polimerizável, no entanto, existem lentes intraoculares produzidas com
outros materiais, como silicone e hidroxietilmetacrilato (GILGER, 1997).
Veterinária em Foco, v.7, n.2, jan./jun. 2010
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Em casos onde a remoção da catarata não seja realizada, poderá ocorrer uveíte
lente induzida devido à perda de proteínas da lente acarretando uma resposta autoimune
(BARROS, 1990; CURTIS et al, 1991; DAVIDSON, et al, 1990). Essa condição precisa
necessariamente ser tratada. As complicações mais comuns da uveíte lente induzida
são glaucoma e phthisis bulbi. Além disso, cataratas hipermaduras acarretam risco
maior de subluxação ou luxação da lente, o que pode levar a complicações secundárias
(DAVIDSON; NELMS, 1999; SLATTER, 2005).
CONCLUSÕES
A catarata é a principal causa de cegueira tratável em cães. O tratamento é unicamente
cirúrgico e tem sido demonstrado que o diagnóstico precoce aliado à remoção da catarata
utilizando a facoemulsificação permite a obtenção de resultados satisfatórios.
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Recebido em: jan. 2009
Aceito em: abr. 2009
Veterinária em Foco, v.7, n.2, jan./jun. 2010
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Hematoma auricular em gato: relato de caso
Fabiana Schiochet
Eloete Teixeira
Paulo Ricardo Centeno Rodrigues
Andréia Weber Gimosk
Carlos Afonso de Castro Beck
Emerson Antonio Contesini
Marcelo Meller Alievi
Letícia Mendes Fratini
RESUMO
O hematoma auricular ou oto-hematoma é um acúmulo de sangue dentro das camadas de
cartilagem do pavilhão auricular e é frequentemente observado nos cães e raramente nos gatos.
A causa dos oto-hematomas ainda não é bem compreendida, no entanto, em muitos casos, parece
que a agitação da cabeça ou coçadura das orelhas causada por dor ou irritação associadas com otite
externa (geralmente otite bacteriana em cães e otite parasitária por Otodectes cynotis em gatos)
são os responsáveis. O objetivo terapêutico para o hematoma auricular consiste na identificação
da origem da irritação, drenagem do hematoma, manutenção da aposição dos tecidos, redução da
deposição de fibrina e impedimento da recidiva. O caso relatado é de um felino, Siamês, fêmea, 16
anos de idade, 4 kg de peso. A queixa do proprietário era prurido intenso nos ouvidos e aumento
de volume no pavilhão auricular direito. No exame clínico foi diagnosticado hematoma auricular
direito e observado presença de secreção otológica bilateralmente de coloração escura, aspecto
seco e com grande quantidade de ácaros (visualizados macroscopicamente). Foi prescrito para o
tratamento da otocaríase diazinon solução otológica e selamectina. O paciente foi encaminhado
para cirurgia para a correção do oto-hematoma, apresentando bom resultado. Conclui-se que o
procedimento cirúrgico foi adequado.
Palavras-chave: Oto-hematoma. Cirurgia. Gato.
Fabiana Schiochet – Médica Veterinária, MSc., Aluna do Programa de Pós-Graduação em Ciências Veterinárias
da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre.
Eloete Teixeira – Médica Veterinária Autônoma, Especialista, Porto Alegre.
Paulo Ricardo Centeno Rodrigues – Médico Veterinário, Especialista, Professor Adjunto do Curso de Medicina
Veterinária da Universidade Luterana do Brasil, Canoas.
Andréia Weber Gimosk – Médica Veterinária Autônoma, Porto Alegre.
Carlos Afonso de Castro Beck – Médico Veterinário, Doutor, Professor Adjunto do Departamento de Medicina
Animal da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre.
Emerson Antonio Contesini – Médico Veterinário, Doutor, Professor Adjunto do Departamento de Medicina
Animal da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre.
Marcelo Meller Alievi – Médico Veterinário, Doutor, Professor Adjunto do Departamento de Medicina Animal da
Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre.
Letícia Mendes Fratini – Aluna de Graduação, Faculdade de Veterinária, Universidade Federal do Rio Grande
do Sul, Porto Alegre.
Endereço para correspondência: Rua das Acácias, 107. Bairro Cantegrill, Viamão/RS. CEP 94450-902.
E-mail: [email protected]
Veterinária em Foco
Canoas
v.7
n.2
p.198-205
jan./jun. 2010
Aural hematoma in cat: Case Report
ABSTRACT
Aural hematoma is a blood accumulation within the cartilage layers of the ear pinna. It is
frequently observed in dogs and rarely in cats. The exact cause of aural hematoma is still poorly
understood, however, in many cases, the reason seems to be the head shaking or ear scratching,
from pain or irritation associated with external otitis (usually bacterial otitis in dogs and parasitary
otitis for Otodectes cynotis in cats) are responsible. The therapy objective for aural hematoma
consists on identification of the main reason of the irritation, the draining of hematoma, the
maintaining of the tissue supply, the reduction the fibrin storage and to avoid recurrence of the
hematoma. The reported case is about a 16-year-old female siamese cat, weighing 4 kg. The
owner’s complaint was severe itching in both ears and an increase in volume on right aural
pinna. Aural hematoma on right ear, presence of dry and dark secretion and a lot of mites in
both ears (seen macroscopically), were diagnosticated on clinical examination. The prescripted
treatment for ear infestation was diazinon aural solution and selamectine. The patient was taken
to surgery to correct the aural hematoma. The result was really good, so the surgical procedure
was appropriated.
Keywords: Aural hematoma. Surgery. Cat.
INTRODUÇÃO
Hematoma auricular ou oto-hematoma é o acúmulo de sangue dentro da placa
cartilaginosa auricular (FOSSUM, 2005). Henderson e Horne (1998) citam que
os ramos da grande artéria auricular que penetram na cartilagem são a origem da
hemorragia e o sangramento entre as cartilagens continua até que a pressão interna
se iguale à pressão das artérias nutrizes. Fossum (2005) acrescenta que o rompimento
vascular ocorre em consequência da fratura cartilaginosa provocada por movimentos
de ondas sinusoides, geralmente decorrentes da agitação da cabeça. Fibrina é
depositada nas paredes do hematoma, produzindo um seroma sanguinolento. Com
a cronificação, a fibrose e a contração promovem o espessamento e a deformação
da orelha.
Segundo Henderson e Horne (1998) a causa dos oto-hematomas ainda não é bem
compreendida, no entanto, em muitos casos, é autoinfligido pelo ato de coçar e pela
agitação da cabeça. As causas subjacentes compreendem as afecções inflamatórias que
afetam o pavilhão auricular ou o canal auditivo externo, como as associadas a corpos
estranhos, atopia, alergia alimentar, infecção bacteriana (geralmente em cães), infecção
levedural, ácaros óticos (geralmente em gatos), entre outros (SMEAK, 1998). Alguns
animais, porém, não apresentam evidências de otopatias intercorrentes e a formação de
hematoma pode estar associada com aumento na fragilidade capilar, como por exemplo,
na doença de Cushing (FOSSUM, 2005).
Smeak (1998) relata que o hematoma auricular é mais frequentemente observado
nos cães e menos frequentemente nos gatos.
Veterinária em Foco, v.7, n.2, jan./jun. 2010
199
O diagnóstico é realizado durante o exame físico, no entanto, deve-se diagnosticar
e tratar a otopatia subjacente para diminuir a probabilidade de recorrência (FOSSUM,
2005).
Com relação ao tratamento ele pode ser clínico ou cirúrgico e tem como objetivo
drenar a lesão e evitar a recorrência tanto imediata quanto a longo prazo (HARVEY
et al., 2004b). Henderson e Horne (1998) citam que no tratamento conservador a
aspiração com agulha pode drenar o hematoma e restaurar a posição dos tecidos, caso
seja utilizada logo após a sua formação, e se o hematoma tornar a se formar, a repetição
da aspiração raramente é bem sucedida. Harvey et al. (2004b) acrescentam como
tratamentos conservadores a drenagem com dreno de Penrose, drenagem e instilação
de glicocorticoide e drenagem por vácuo. A instilação de glicocorticoide dentro da
ferida é criticada por alguns autores, pois pode retardar a cicatrização, além de separar
os tecidos (HENDERSON; HORNE, 1998).
De acordo com Harvey et al. (2005) o tratamento mais solidamente bem sucedido
nos casos de hematomas auriculares é o tratamento cirúrgico através da drenagem
incisional e sutura. Para Fossum (2005) o tratamento cirúrgico além de evitar sua
recorrência, mantém a aparência natural da orelha.
Relato do Caso
O caso relatado é de um felino, Siamês, fêmea, 16 anos de idade, 4 kg de peso.
A queixa do proprietário era prurido intenso nos ouvidos e “inchaço” no pavilhão
auricular direito.
No exame clínico observou-se aumento de volume flutuante na superfície
côncava do pavilhão auricular direito, compatível com hematoma auricular (Figura
1) e presença abundante de secreção otológica bilateral de coloração escura e aspecto
seco (Figura 2).
Figura 1 – Hematoma auricular presente na orelha direita.
200
Veterinária em Foco, v.7, n.2, jan./jun. 2010
Figura 2 – Visualização de cerume escuro e ressecado na orelha com hematoma auricular.
Junto a esta secreção foi visualizado, com auxílio de um otoscópio, uma grande
quantidade de ácaros compatíveis com Otodectes cynotis. O exame otoscópico no
canal auditivo externo não foi possível, pois o mesmo encontrava-se edemaciado. Foi
prescrito para o tratamento da otocaríase diazinon solução otológica a cada 12 horas
após limpeza prévia do canal auditivo e selamectina tópica a cada 30 dias. Esta foi
prescrita também para todos os contactantes. Para correção do oto-hematoma o paciente
foi encaminhado para cirurgia. Foram solicitados hemograma, creatinina, ureia, ALT
e fosfatase alcalina como exames pré-cirúrgicos e todos se encontravam dentro dos
valores fisiológicos para espécie.
O paciente foi pré-medicado com diazepam 0,4mg/kg IM, acepromazina
0,05mg/kg IM e butorfanol 0,2mg/kg IM. Foi administrado profilaticamente
ampicilina sódica 20mg/kg IV. A indução constou da utilização de propofol 4mg/
kg IV. Na manutenção anestésica utilizou-se isofluorano ao efeito, vaporizado em
oxigênio a 100%, através do sistema anestésico Baraka (aberto) com respiração
espontânea. Durante o procedimento, foi administrado solução de ringer lactato de
sódio intravenoso na dose de 10ml/kg/h.
Com a tricotomia já realizada posicionou-se o animal em decúbito lateral.
Foi realizada a anti-sepsia na sequência álcool – álcool iodado – álcool. O conduto
auditivo externo foi protegido com gaze estéril. Foi dado início ao procedimento
cirúrgico incisando em forma de “S” a superfície côncava da orelha direita, expondo
dessa forma o hematoma e seu conteúdo (Figura 3). Os coágulos e a fibrina foram
removidos e a cavidade foi lavada com solução de cloreto de sódio a 0,9%. Utilizou-se
fio mononylon 3-0 para sutura, o padrão foi isolado simples verticalmente à incisão,
abrangendo cartilagem e pele da superfície convexa e côncava da orelha (Figura 4).
A incisão não foi incorporada na sutura. Após o término da cirurgia foi colocada uma
atadura protetora sobre a orelha apoiada na cabeça. Recomendou-se a continuação do
tratamento clínico para otocaríase, além de cetoprofeno (1mg/kg), SID, por três dias,
tramadol (1mg/kg), TID, por dois dias, limpeza diária da ferida cirúrgica com solução
Veterinária em Foco, v.7, n.2, jan./jun. 2010
201
de cloreto de sódio a 0,9% e uso de colar elisabetano. A sutura foi removida com 14
dias de pós-operatório com bom estado de cicatrização.
Figura 3 – Visibilização de fibrina e coágulos presentes no oto-hematoma.
Figura 4 – Sutura utilizada no reparo do hematoma auricular.
Resultados e Discussão
Conforme Harvey et al. (2004a) a causa subjacente do hematoma auricular é
desconhecida e vários estudos têm sido propostos para explicar a patogenia da lesão e da
sua causa. Num dos estudos, encontrou-se 59% dos cães e 76% dos gatos com hematoma
auricular parasitados por Otodectes cynotis. Nesse mesmo estudo foi sugerido que os
antígenos liberados pelos ácaros do ouvido, em processo de alimentação, poderiam
estar envolvidos em uma ação imunomediada que terminaria em hematoma auricular.
Para Leite (2002) a otocaríase por Otodectes cynotis é a causa mais comum de otite
externa em gatos.
202
Veterinária em Foco, v.7, n.2, jan./jun. 2010
A felina do caso relatado apresentava uma quantidade significativa de ácaro,
conferindo com a associação de ácaro com oto-hematoma em gatos encontrado na
literatura. De acordo com Fossum (2005), o hematoma auricular apresenta aspecto
patognomônico e um dos objetivos terapêuticos consiste na identificação da origem
da irritação (HENDERSON; HORNE, 1998).
Clinicamente são achados altamente sugestivos de otocaríase, a presença de
secreção provenientes do ouvido de coloração acastanhada (GRACE, 2004) com aspecto
de borra de café (LUCAS et al., 2004) e presença de ácaros superficiais de coloração
branca (MATTOS; HOFFMANN, 2008), vistos frequentemente movimentando-se em
resposta ao calor do otoscópio (GRACE, 2004). Estes fatos foram também observados
no caso relatado.
Alguns gatos com otocaríase apresentam quantidades maciças de cerúmen e não
apresentam sintomas clínicos, ao passo que outros apresentam prurido intenso (LUCAS
et al., 2004). Harvey (2004a) acrescenta que três ácaros já é o suficiente para causar
patologia e o aparecimento dos sinais clínicos. No caso relatado um dos sinais clínicos
era o prurido intenso, e provavelmente, este prurido provocou a agitação da cabeça e
consequente autotraumatismo, originando o hematoma.
Com relação ao tratamento cirúrgico do oto-hematoma o procedimento mais
comumente usado envolve incisão dos tecidos sobrejacentes ao hematoma, evacuação
dos coágulos sanguíneos e da fibrina e manutenção da cartilagem em aproximação com
suturas até que se consiga formar o tecido cicatricial (FOSSUM, 2005). Essas incisões
podem ser retas, cruzadas, ou em forma de S. No caso descrito utilizou-se a incisão
em forma de S por acreditar que atinge melhor as dimensões do hematoma, além de
evitar deformidade por contratura. Um número amplo de pontos foi utilizado devido
ao tamanho extenso da cavidade e para evitar a formação de bolsa e consequentemente
acúmulo de fluído e recidiva do hematoma, como citado por Henderson e Horne
(1998).
Para tratamento da otocaríase produtos antiparasitários são indicados. Topicamente
Larsson et al (2002) citam preparações a base de piretrinas, tiabendazol, amitraz e
ivermectina otologicamente. O fipronil a 9,7% também se mostrou eficaz no uso
otológico num estudo com 25 gatos (UINJCENZI; GENCHI, 2000). Em outro estudo
realizado por Souza et al. (2006) com 10 cães o diazinom contido em solução otológica
foi eficaz no tratamento de infecções por Otodectes, com 100% de eficácia. No relato
de caso optou-se pelo diazinon (e associações) pela eficácia obtida em experiências
anteriores e pela facilidade de aplicação. Sistemicamente, alguns autores citam a
ivermectina, a milbemicina, a selacectina e a moxidectina (LUCAS et al., 2004). Esses
tratamentos são indicados porque o ácaro pode ser encontrado em outras partes do corpo
(NASCENTE et al., 2006). A selamectina foi o fármaco escolhido no caso relatado,
devido à sua praticidade e segurança. Esse tratamento foi indicado também para os
contactantes, devido ao ácaro ser contagioso, podendo os demais animais, mesmo sem
sinais clínicos, estarem contaminados (LUTTGEN, P.; ROSYCHUK, 1997).
Veterinária em Foco, v.7, n.2, jan./jun. 2010
203
CONCLUSÃO
Nenhuma complicação pós-operatória a curto ou a longo prazo (período de três
anos) foi observada, concluindo-se que o procedimento cirúrgico foi adequado. O
sucesso do tratamento cirúrgico deveu-se também ao tratamento da etiologia do otohematoma.
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Aceito em: abr. 2009
Veterinária em Foco, v.7, n.2, jan./jun. 2010
205
Anestesia para procedimento
ortopédico em avestruz
(Struthio camelus)
Viviane Machado Pinto
Maria Eugênia Menezes de Oliveira
Jussara Zani Maia
Maria Inês Witz
Mariane Feser
Mariangela da Costa Allgayer
RESUMO
O objetivo deste trabalho é descrever a anestesia para procedimento ortopédico (amputação
de asa), em avestruz. Após jejum sólido de 12 horas, foi realizada contenção física e aplicação de
midazolam e butorfanol e indução anestésica com cetamina. A ave foi intubada e a anestesia mantida
com halotano, em sistema anestésico inalatório circular com reinalação. Durante os períodos pré,
trans e pós-anestésico não foram observadas complicações e uma hora após o fim do procedimento
a ave estava em estação. De acordo com os parâmetros cardíacos e respiratórios avaliados e pressão
arterial média, o protocolo anestésico estabelecido para o procedimento ortopédico em avestruz
foi efetivo proporcionando uma anestesia com bom relaxamento muscular, livre de complicações,
além de uma recuperação anestésica tranquila.
Palavras-chave: Avestruz. Anestesia. Cirurgia ortopédica.
Anesthesia for orthopedic surgery in African ostrich
(Struthio camelus)
ABSTRACT
This summary aims to describe the anesthesia for orthopedic surgery (wing amputation)
in African ostrich. After a 12-hour-fasting period a physical restraint and premedication of
midazolam and butorfanol were carried out and later the anesthesia induction by ketamine. The
ratite was intubated and the anesthesia kept by inhalation of an anesthetic agent (halothane). During
presurgery, transurgery and postsurgery, any complications were observed and one hour after the
anesthetic procedure, the bird was recovered. According to the parameters of cardiac and respiratory
Viviane Machado Pinto, Jussara Zani Maia, Maria Inês Witz e Mariangela da Costa Allgayer – Professores
Adjuntos do Curso de Medicina Veterinária da Universidade Luterana do Brasil (ULBRA) – Canoas/RS.
Maria Eugênia Menezes de Oliveira e Mariane Feser – Médicas Veterinárias Autônomas.
Veterinária em Foco
Canoas
v.7
n.2
p.206-214
jan./jun. 2010
frequencies as well as the arterial pressure observed, the anesthetic protocol was effective for the
wing amputation surgery in the African ostrich.
Keywords: African ostrich. Anesthesia. Orthopedic surgery.
INTRODUÇÃO
As aves apresentam particularidades anatômicas, fisiológicas e comportamentais
que devem ser consideradas e há poucos estudos relatando os efeitos dos anestésicos na
grande diversidade de espécies que existe nesta classe animal (NATALINI, 2007). O
avestruz (Struthio camelus) vem sendo criado para fins comerciais há aproximadamente
100 anos. No Brasil só em 2004, o rebanho de avestruzes era de 170.000 animais e, em
2005, o número aumentou para 335.425, representando uma taxa de crescimento de
97% (MUNIZ, 2006). Na rotina dos criatórios, são realizados diversos procedimentos
para a manutenção da sanidade das aves, assim o uso de agentes anestésicos injetáveis
possibilita a imobilização e manipulação dos animais, diminuindo a ocorrência de
estresse e o risco de acidentes. Entretanto, ainda há poucos relatos de protocolos
anestésicos para a contenção desta espécie e particularidades que possam interferir na
administração dos fármacos (CARVALHO et al. 2007).
Nas aves, a anestesia geral pode ser mantida com um agente anestésico inalatório,
sendo que o primeiro obstáculo ocorre durante a indução ou recuperação anestésica, na
qual as aves devem ser contidas para prevenir acidentes. O capuz é um tipo de contenção
física utilizado para deixar a ave mais tranquila, reduzindo risco de hipertermia por
estresse (UOV, 2008). A medicação pré-anestésica tem como objetivo minimizar traumas
físicos, diminuir estresse e agitação (GUIMARÃES; MORAES, 2000), além de reduzir
a concentração do anestésico inalatório durante a manutenção anestésica (NATALINI,
2007). A indução anestésica pode ser com fármacos injetáveis ou anetésicos inalatórios.
A indução direta na máscara, deverá ter uma atenção especial relacionada com padrão
respiratório, pois nesta espécie pode ocorrer rápida depressão. Após indução, um tubo
endotraqueal pode ser facilmente colocado e a anestesia pode ser mantida por tempo
indeterminado (BRUNING; DOLENSEK, 1986).
Todas as espécies de aves irão apresentar rápida diminuição na temperatura
corporal, sendo recomendado manter o animal aquecido para auxiliar a manutenção
da temperatura. Aferições cloacais de 34,5°C a 35°C têm sido observadas em
procedimentos com 2-3 horas de duração, sem que o animal tenha desenvolvido
complicações anestésicas (BRUNING; DOLENSEK, 1986). O padrão respiratório e
a frequência cardíaca variam inversamente com o tamanho da ave. O maior indicador
de profundidade anestésica é a avaliação do padrão respiratório. A respiração se torna
menos frequente e mais curta com o aprofundamento da anestesia. Como a apneia
pode rapidamente levar à morte, mensurações constantes devem ser realizadas durante
a anestesia e a ventilação deve ser instituída logo que a ave não apresente respiração
espontânea. Além disso, a frequência cardíaca também deve ser monitorada com
estetoscópio ou com monitor cardíaco. Os eletrodos do monitor cardíaco podem ser
colocados na região caudal e esterno ou nas posições convencionais. O complexo
Veterinária em Foco, v.7, n.2, jan./jun. 2010
207
rs na derivação II, que nos mamíferos é positivo, nas aves é normalmente negativo
(BENNETT, 1999). Ludders e Mathews (1996) apresentam um demonstrativo destes
parâmentros em anestesias realizadas, utilizando vários tranquilizantes e sedativos
em diferentes procedimentos cirúrgicos em nove avestruzes e dez emas no Colégio de
Medicina Veterinária no Texas, em 1992.
Para o controle do plano anestésico são utilizados alguns reflexos. O reflexo
palpebral está presente somente em planos muito superficiais, assim como o movimento
reflexo em resposta a estímulo. O reflexo corneal (manifestado com o movimento
da terceira pálpebra através do olho em resposta ao estímulo corneal) e o reflexo de
pedalada permanecem por bastante tempo e são geralmente lentos, mas presentes em
um plano cirúrgico de anestesia (LINN; GLEED, 1987).
Quando possível, o avestruz deve se ambientar com a clínica ou hospital antes
do procedimento anestésico para reduzir o estresse. Após a adaptação da ave ao novo
local, é comum aparecerem outros sinais clínicos que não haviam sido observados
anteriormente (LUDDERS, 2001). O comportamento do paciente é importante, mas
não é o suficiente para avaliar seu estado de saúde. É importante se obter o peso
correto, porque as penas podem fazer com que se estime um peso maior para uma
ave magra. A preparação para a anestesia deverá levar em conta o temperamento, o
procedimento cirúrgico e a equipe disponível para auxiliar. Avestruzes jovens (+/- 30
kg peso) podem ser tratadas da mesma forma que outras espécies de aves, podendo
apresentar hipoglicemia, hipotermia, hipotensão e hipoventilação quando anestesiadas
(LUDDERS; MATTHEWS, 1996).
RELATO DE CASO
Foi encaminhado ao Hospital Veterinário da Universidade Luterana do Brasil um
avestruz (Struthio camelus), fêmea, de 8 meses e 36,7kg, que apresentava dificuldade
de deambulação. A ave apresentava fratura de úmero e por isso mantinha a asa caída,
frequentemente pisoteada durante a locomoção, sendo indicado amputação do membro.
Após jejum sólido de 12 horas, foi colocado um capuz sobre a cabeça da ave (Figura
1), e esta foi encaminhada ao bloco cirúrgico.
208
Veterinária em Foco, v.7, n.2, jan./jun. 2010
FIGURA 1 – Contenção física de avestruz com capuz facilitando a pesagem da ave.
Como medicação pré-anestésica (MPA) foi utilizado midazolam e butorfanol,
ambos na mesma seringa, e na dose de 0,5mg/kg, por via IM. A indução anestésica foi
realizada após 15 min da MPA, com cetamina na dose de 4mg/kg administrada na veia
jugular direita. Após indução, o paciente levou em torno de 20 segundos para ficar em
decúbito esternal, foi encaminhado à mesa operatória e intubado com sonda orotraqueal
n°16, até cerca de 1/3 da traqueia (Figura 2) e conectado ao sistema anestésico circular
com absorvedor de CO2.
FIGURA 2 – Avestruz após indução anestésica, intubado com sonda orotraqueal n° 16.
Veterinária em Foco, v.7, n.2, jan./jun. 2010
209
A manutenção anestésica foi realizada com halotano em vaporizador calibrado,
e o fluxo de oxigênio foi mantido em 4 litros/min. A veia tibial caudal foi acessada no
membro posterior direito, com catéter de polietileno rígido n°20 e a fluidoterapia foi
mantida com uma taxa de infusão de 5ml/kg/hora. Foram conectados: o manguito do
monitor de pressão no membro posterior direito e os eletrodos do monitor cardíaco no
membro anterior direito, membro posterior esquerdo e pescoço. Os parâmetros como
frequência cardíaca (FC), frequência respiratória (FR), pressão sistólica (PS), pressão
diastólica (PD) e pressão média (PM) foram observados e anotados a cada 5 min. A
temperatura cloacal (TC) foi aferida a cada 10 min. Logo após intubação, o fluxo de
halotano foi mantido em 3,5%, sendo modificado de acordo com alterações do plano
anestésico, conforme demonstra a Tabela 1.
O procedimento cirúrgico durou 40 min, mas o paciente continuou anestesiado
com a concentração de halotado mantida 1%, para realização de curativo. Ao término
da anestesia a ave permaneceu intubada até que apresentasse reflexo palpebral e de
deglutição. Passados 20min, foi observado elevação da cabeça e presença de consciência.
Foi necessário mais 40 minutos para que a ave ficasse em estação.
TABELA 1 – Parâmetros mensurados na ave e fluxo de halotano utilizado, durante anestesia.
Tempo (min) FC (bpm) FR (mpm)
5
PS
PD
PM
TC (°C)
Fluxo Halotano (%)
84
8
----- -----
-----
40,6
3,5
10
91
8
209
172
185
40,4
3,5
c
85
12
209
171
183
40,3
3,5
a
80
16
197
161
175
------
3,0
75
16
203
152
172
40,2
2,5
73
16
196
130
158
------
2,5
35
72
16
197
126
154
40,3
2,5
40
71
16
193
142
159
------
2,5
45
64
16
197
139
162
40,2
2,0
50
66
16
198
134
161
------
2,0
d
65
16
198
134
161
40,3
2,0
60
65
16
199
140
160
------
2,0
65e
65
16
197
144
156
40,4
1,0
15
20
25
30
55
b
OBS.: a presença de reflexo corneal, b ausência de reflexo corneal,
c
início da cirurgia, d final da cirurgia, e final da anestesia.
210
Veterinária em Foco, v.7, n.2, jan./jun. 2010
DISCUSSÃO
Para a realização da anestesia e cirurgia, o avestruz foi mantido em jejum
sólido durante 12 horas, o que, de acordo com Ludders (2001), é uma recomendação
controversa. Em geral, aves não devem fazer jejum, mas em alguns casos é
recomendado jejum por não mais do que 2 a 3 horas antes da anestesia, devido a
sua alta taxa metabólica, pobre reserva de glicogênio hepático e pela possibilidade
de desenvolver hipoglicemia durante a anestesia. Entretanto, a regurgitação e
subsequente obstrução aérea podem ocorrer nas aves que não passaram por jejum.
Alguns veterinários recomendam que aves com baixo peso recebam alimentação
durante toda à noite. Na experiência do autor, o jejum durante toda à noite reduz a
incidência de problemas associados à regurgitação, não sendo deletério para o animal
quando este não se encontra em um balanço metabólico negativo, que pode predispor
ao desenvolvimento de hipoglicemia.
Para a contenção da ave antes da anestesia, foi utilizado um capuz para bloquear
a visão. Conforme UOV (2008), os avestruzes jovens podem ser apanhados segurando
as pernas firmemente acima do chão. No caso de animais adultos, a cabeça é apanhada
e imediatamente é colocado um capuz, para que a visão do animal seja bloqueada.
Uma vez bloqueada a visão, o animal sente-se completamente dominado, sendo
possível conduzi-lo facilmente, através de uma pressão no corpo para baixo, para
impedir que pule.
Como medicação pré-anestésica, o avestruz recebeu midazolam e butorfanol
ambos na dose de 0,5mg/kg IM, na mesma seringa. Guimarães e Morais (2000) relatam
que a medicação pré-anestésica pode ser indicada para aves com pescoço longo para
minimizar os traumas físicos, e antes da indução da anestesia com máscara para reduzir
o estresse e agitação. Ludders (2001) comenta que pré-medicações como tranquilizantes,
sedativos e analgésicos, são frequentemente utilizadas para a anestesia em aves, pois
é reduzida a quantidade de anestésico inalado, necessário para manter a anestesia.
O midazolam é frequentemente utilizado como tranquilizante e facilita a contenção
e indução anestésica. Embora não exista nenhum estudo investigando seu efeito na
concentração alveolar mínima (CAM), o que se sabe é que com o seu uso ocorre uma
redução na quantidade requerida de anestésico inalatório, diminuindo a depressão
cardiovascular, tipicamente associada a estes anestésicos. O butorfanol (1mg/kg IM)
além de analgésico também possui efeitos na redução da CAM. Ludders e Matthews
(1996) recomendam o midazolam, na dose de 0,4mg/kg por via IM e citam que este
parece ser efetivo como MPA. Concordando com os autores acima o protocolo utilizado
como MPA na contenção química do avestruz se mostrou satisfatório produzindo efeito
analgésico, sedativo e relaxante muscular.
A indução anestésica foi realizada com cetamina, na dose de 4mg/kg, administrada
na veia jugular direita, concordando com Ludders e Mathews (1996) e Linn e Gleed
(1987), que acreditam que a cetamina seja uma droga confiável, sendo que a dose da
droga a ser administrada, varia de espécie a espécie, mas geralmente é inversalmente
proporcional ao peso. Murphy e Fialkowski (2001) descrevem que injeção intravenosa
Veterinária em Foco, v.7, n.2, jan./jun. 2010
211
de cetamina induz rapidamente anestesia, sendo que quando se administra um
benzodiazepínico previamente, a recuperação tende a ser tranquila, porém, mais
lenta. Já a tiletamina-zolazepam, por via IM ou IV, produz indução satisfatória, mas
a recuperação pode ser brusca e prolongada. Carroll (2001) indica a utilização de
diazepam, no dose de 0,2 a 0,3mg/kg e a cetamina, na dose de 2,2mg/kg por via IV
para a anestesia de avestruzes.
A anestesia da ave foi mantida com anestésico inalatório, conforme sugestão
de Linn e Gleed (1987) que descrevem esta técnica como método de escolha para
procedimentos demorados, porque pode ser mantida por longo período de tempo,
sendo que a profundidade da anestesia pode ser controlada. O anestésico inalatório
utilizado foi o halotano, que de acordo com Bruning e Dolensek (1986) é um agente
anestésico satisfatório para produzir anestesia geral em avestruzes. Já Bennett (1999)
discorda, e considera o isoflurano o anestésico de escolha para as aves, sendo este
totalmente excretado pelo sistema respiratório, e desencadeando mínimos efeitos
nos sistemas e órgãos. Ludders et al. (1988), descrevem que a anestesia inalatória
com halotano em oxigênio tem sido utilizada em várias espécies, porém causa alta
incidência de arritmias e várias mortes em psitacídeos. Bennett (1999) cita que a
indução anestésica utilizando halotano com concentração entre 2,5-3% em aves de
grande porte ocorre em 2-4 minutos. Na manutenção anestésica é recomendada uma
concentração de 0,5-1,5%, sendo que a recuperação anestésica se dá em 3-5 min após
o fechamento do vaporizador. Bradicardia, hipotensão e hipotermia podem ocorrer
com o uso do halotano, mas os problemas podem ser rapidamente solucionados,
quando se finaliza a anestesia.
Apesar de Ludders et al. (1988) e Goelz et al. (1990) comentarem que a anestesia
inalatória com halotano tem sido utilizada em várias espécies de aves, porém causa
alta incidência de arritmias (GREENLEES et al., 1990). Não foi observada nenhuma
arritmia neste caso.
Entre os parâmetros mensurados durante a anestesia do avestruz, foi observado
FC entre 64-91 bpm, FR 8-16 mpm, PS 193-209, PD 126-172 e PM 154-185,
conforme dados demonstrados na Tabela 1. Os valores coletados discordam dos valores
encontrados por Ludders e Mathews, (1996). Utilizando midazolam (0,67mg/kg) e
cetamina (6,8 mg/kg) para realização de imobilização, os autores observaram que a
FC e FR, assim como a PS, PD e PM se mantiveram em valores menores do que os
observados no avestruz do caso relatado. Isso pode ter relação com a idade das aves e
com o procedimento realizado, já que a amputação é um procedimento mais invasivo.
É importante ressaltar que as doses utilizadas para a anestesia não foram as mesmas e
que o paciente era de menor tamanho.
O avestruz se recuperou da anestesia, mantendo-se em estação1 hora ap do final
do procedimento anestésico. Conforme Ludders e Matthews (1996) a recuperação
anestésica, proveniente de uma anestesia inalatória é geralmente prolongada, mesmo
quando todos os cuidados foram tomados para manter um plano anestésico superficial,
ou quando se diminui a concentração do gás no final da cirurgia. Entretando, segundo
212
Veterinária em Foco, v.7, n.2, jan./jun. 2010
Bennett (1992) o tempo de recuperação pode variar de três a cinco minutos, 9,8 ± 3,55
minutos (GUIMARÃES, 1999) e cinco e 15 minutos (SKARDA et al., 1995).
CONCLUSÃO
Os parâmetros mensurados de FC, FR, PS, PD, PM, presença ou ausência de
reflexo corneal e temperatura cloacal, apresentaram-se dentro da média esperada para
a espécie, não demonstrando alterações dignas de nota durante os períodos pré, trans e
pós-anestésicos. Conclui-se que o protocolo anestésico estabelecido para o procedimento
ortopédico em avestruz foi efetivo proporcionando uma anestesia com bom relaxamento
muscular, livre de complicações, além de uma recuperação anestésica tranquila.
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Recebido em: nov. 2008
214
Aceito em: abr. 2009
Veterinária em Foco, v.7, n.2, jan./jun. 2010
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Deve ser claro e conciso, em caixa alta e negrito, sem ponto final, em português
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dentro do parênteses (SOARES, 1993; SOARES; SILVA, 1994; SILVA et al., 1998).
Referências devem ser redigidas em página separada e ordenadas alfabeticamente
pelos sobrenomes dos autores, elaboradas conforme a ABNT (NBR-6023).
Tabelas e figuras
As Tabelas e Figuras devem ser numeradas de forma independente, com números
arábicos. As Tabelas devem ter o título acima das mesmas, escrito em letra igual à do
texto, mas em tamanho menor.
As Figuras devem ter o título abaixo das mesmas.
Tabelas e Figuras podem ser inseridas no texto.
Endereço para correspondência
Revista VETERINÁRIA EM FOCO
Av. Farroupilha, 8001 - Prédio 60 - Sala 01
São José / RS - Brasil
CEP: 92425-900
E-mail: [email protected]
Disponível eletronicamente
www.ulbra.br/medicina-veterinaria/rfoco.htm
216
Veterinária em Foco, v.7, n.2, jan./jun. 2010
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