A Influência das Diferenças entre as Sociedades Cartaginesa e

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MARINHA DO BRASIL
ESCOLA DE GUERRA NAVAL
A INFLUÊNCIA DAS DIFERENÇAS ENTRE AS SOCIEDADES
CARTAGINESA E ROMANA NO RESULTADO DA 2ª GUERRA PÚNICA
Por
JOÃO FERREIRA LEAL NETO
Capitão-de-Corveta (IM)
2004
4
O SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ........................................................................................................
A CIVILIZAÇÃO ROMANA..................................................................................
AS ORIGENS DE ROMA..........................................................................................
A EXPANSÃO TERRITORIAL.................................................................................
AS FORÇAS MILITARES ROMANAS....................................................................
A CIVILIZAÇÃO CARTAGINESA.......................................................................
AS ORIGENS E A EXPANSÃO TERRITORIAL DE CARTAGO..........................
A ORGANIZAÇÃO POLÍTICA DE CARTAGO......................................................
CARTAGO, UMA CIDADE DE COMERCIANTES E NÃO DE GUERREIROS..
A PRIMEIRA GUERRA PÚNICA..........................................................................
A SEGUNDA GUERRA PÚNICA...........................................................................
ROMA ERA UM CENTRO DE GRAVIDADE CLAUSEWITIANO NA 2ª GUERRA
...............................................................................................
...........................................................................................................
BIBLIOGRAFIA ......................................................................................................
ANEXO A – MAPA MOSTRANDO A PENÍNSULA ITÁLICA NO SÉCULO III a.C.
ANEXO B - MAPA MOSTRANDO OS TERRITÓRIOS CARTAGINESES
NO SÉCULO III a.C.
NO
ANEXO C – MAPA MOSTRANDO O PERCURSO PERCORRIDO POR ANÍBAL
5
INTRODUÇÃO
O obstáculo que barraria o caminho à hegemonia cartaginesa no
Mediterrâneo era mais o poder político de Roma que o militar [...]. Roma
constituía um fato novo, desconhecido, que surpreendeu os cartagineses. Só
perceberam muito mais tarde (8:105).
Em agosto de 216 a.C. Roma sofreu a maior derrota militar de sua história. Na planície
de Apúlia, à margem direita do rio Aufides, atual Ofanto (1:110), ocorreu a batalha de Canes
onde os romanos, comandados pelos cônsules1 Lúcio Emílio Paulo e Caio Terêncio Varrone,
enfrentaram as tropas cartaginesas, lideradas por Aníbal2, que, há quase dois anos, haviam
invadido a Península Itálica (3:56).
Para derrotar os cartagineses, Roma havia reunido um exército poderoso. Eram 8 legiões
(5:54), totalizando aproximadamente 80 mil homens, recrutados para esmagar o inimigo sob o
peso do número. Aníbal, por sua vez, contava com tropas bastante inferiores em relação às
romanas, estimadas em 65 mil soldados (3:56).
Apesar da superioridade numérica, Roma foi derrotada. Seu exército perdeu 69,2 mil
soldados, 50,2 mil mortos no campo de batalha e 19 mil feitos prisioneiros. Entre as vítimas,
estavam o cônsul Lúcio Emílio Paulo, 29 tribunos militares, 80 senadores e um número
imenso de cavaleiros, ou seja, quase toda a oficialidade legionária (3:57). Em contrapartida, as
baixas contabilizadas pelas forças cartaginesas foram em número bem menor. Aníbal então,
contrariando o conselho de seus generais, recusou-se a marchar sobre Roma a fim de sitiá-la e
ditar os termos da paz, preferindo rumar para o sul onde passaria vários anos combatendo os
romanos e seus aliados na região (9:112). Durante esse período, Roma supera a crise e
consegue inverter o andamento do conflito levando a guerra para o norte da África onde, sob o
comando de Públio Cornélio Cipião, o Africano, derrota Cartago dando fim a Segunda Guerra
Púnica.
Neste ensaio serão estudadas quais foram as possíveis causas da derrota dos cartagineses
perante os romanos, apesar das brilhantes vitórias militares de Aníbal, tendo como propósito
responder a seguinte questão: foi Roma um centro de gravidade clausewitiano na 2º Guerra
Púnica ?
1
Cônsul, cargo que, durante a República romana, correspondia ao de Chefe de Estado. Os cônsules, eleitos pelo
período de um ano, eram encarregados, entre outras funções, de executar as decisões do Senado, chefiar o
Exército e administrar os bens públicos (8:5103).
2
Aníbal Barca, nascido em Cartago em 242 a.C., pertencia a uma família rica e poderosa, sendo filho de Amílcar
Barca, comandante das tropas cartaginesas na 1ª Guerra Púnica. Foi proclamado chefe do Exército cartaginês,
após a morte de seu cunhado Asdrubal, em 221 a.C.. Morreu em 183 a.C. na Bitínia (6: 1206).
6
Para que se tenha plena compreensão do assunto, este trabalho abordará as origens e as
características das sociedades cartaginesa e romana, ressaltando quais eram as principais
diferenças entre as mesmas, e relatará, de maneira sucinta, os fatos históricos mais
importantes do período compreendido desde da 1ª Guerra Púnica, em 246 a.C., até o final da
2ª Guerra Púnica, em 201 a.C..
A CIVILIZAÇÃO ROMANA
AS ORIGENS DE ROMA
Diz a lenda que foi Rômulo, o primeiro rei romano, que traçou ao redor do Palatino,
uma das sete colinas de Roma, o sulco sagrado, pomoerium3, que delimitou o contorno urbano
da cidade. O fato é que a lendária fundação de Roma corresponde ao surgimento, por volta do
século VII a.C., de uma federação de tribos latinas que habitavam a Península Itálica
denominada Septimontium (8:5103).
Por volta de 575 a.C., os etruscos4 dominaram a cidade que, na época, era um modesto
centro agropastoril e a transformaram em uma cidade-estado, cercada de muralhas, com uma
florescente atividade manufatureira e intenso comércio. Conforme uma corrente histórica,
foram eles que a batizaram de Rumon, “a cidade do rio” (8:5104).
Roma, nessa época, foi governada por três monarcas etruscos: Tarquínio Prisco,
Sérvio Túlio e Tarquínio, o Soberbo. Este último, por ser violento e despótico, provocou
descontentamentos e revoltas que culminaram com a sua expulsão e a proclamação da
República em 509 a.C. (8:5103).
Com a instauração da República, o poder passou às mãos dos patrícios, os grandes
proprietários de terras, que substituíram o rei por dois cônsules eleitos anualmente. Suas
funções abrangiam o comando do exército e a supervisão das atividades judiciárias.
A República Romana inicialmente pertencia a pouquíssimos cidadãos. Além de possuir
a totalidade das terras e monopolizar a vida religiosa, os patrícios detinham o poder político
em detrimento da massa popular, a plebe. Dessa forma, iniciou-se uma luta de classes que
duraria um século e meio e culminaria, no começo do século III a.C., na vitória da plebe que
3
Pomoerium significa perímetro sagrado.
Etruscos, povo, segundo alguns historiadores, originário da Ásia Menor e que habitava a Península Itálica na
época da fundação de Roma (8:5104).
4
7
obteria igualdade de direitos políticos e cívicos com os patrícios. A ascensão de uma elite
plebéia deu origem a uma classe dirigente comum, a nobreza (8:5104).
Na época dos conflitos com Cartago, o poder político na República Romana,
aparentemente, repousava no equilíbrio de três órgãos que se controlavam mutualmente: os
magistrados, ocupantes de cargos executivos eleitos anualmente, chamados depois de
cônsules; o Senado, composto por membros oriundos da nobreza e encarregado de controlar
os magistrados; e as Assembléias do Povo, reuniões de representantes da plebe. Na prática
porém, todo o poder emanava do Senado, a cidadela da nobreza (8:5104).
A EXPANSÃO TERRITORIAL
A expansão territorial de Roma começou efetivamente com a República, proclamada em
509 a.C., e estendeu-se pelos 350 anos seguintes. A segurança da cidade e suas necessidades
agrícolas foram as principais justificativas para as campanhas contra os povos vizinhos,
habitantes da Península Itálica, região que poderia ser dividida em três grandes partes: ao
norte, a Gália Cisalpina compreendendo a Ligúria (planície do rio Pó) e a Venética; uma
região central compreendendo a Etrúria, a Úmbria, o Picenum, o Samnium e o Latium, onde
fica Roma; e uma região meridional, também chamada Magna Grécia, abrangendo a Apúlia, a
Lucrânia e o Bruttium (1:84). O anexo A mostra a Península Itálica dividida nas três partes
acima descritas.
A expansão romana iniciou-se pela parte central da Península Itálica com a tomada da
cidade de Veios em 396 a.C., na Etrúria. Em seguida, Roma conseguiu submeter os latinos
em 335 a.C., anexando o Picenum e o Latium, e, depois, triunfar sobre os samnitas, em 290
a.C., que habitavam o centro-sul da Itália, cuja vitória assegurou à Roma a posse da Úmbria e
do Samnium (8:5104).
A etapa seguinte foi a anexação da Magna Grécia, sul da Península Itálica, pontilhada,
na época, por cidades-estado gregas, conquistando-a em 272 a.C. após derrotar Tarento, a
mais poderosa cidade da região (8:5104).
O vale do rio Pó, na Ligúria, habitado pelos gauleses, celtas da Gália, que haviam lá se
fixado no início do século IV a.C., foi a última região na Itália a ser conquistada pelos
romanos.
As regiões submetidas à Roma recebiam tratamento diferenciado conforme as
circunstâncias. Algumas tornavam-se estados federados, devendo pagar um tributo e manter
8
uma guarnição romana, supostamente para proteção mas, na verdade, com
objetivo de
garantir os interesses dos romanos na localidade. Essas regiões possuíam porém, a vantagem
de poderem conservar suas leis e seu sistema de governo. Em outros casos, os territórios
conquistados eram mantidos sob a administração direta de Roma, tendo como governadores
cidadãos romanos, eram as províncias.
De uma maneira geral, os territórios sob domínio romano obtinham um privilégio:
alguns de seus habitantes podiam tornar-se eives romani, ou seja, ganhavam direito à
cidadania romana.
A Península Itálica estava, dessa forma, sob domínio romano quando da sua invasão, em
218 a. C., pelo exército cartaginês comandado por Aníbal Barca. Este então, compreendendo
que não tinha forças suficientes para sozinho se contrapor as legiões romanas, procurou,
desde do início da campanha, amealhar aliados entre os povos dominados da península que,
após libertos, pudessem lhe auxiliar na sua luta contra Roma.
AS FORÇAS MILITARES ROMANAS
Os romanos eram um povo guerreiro cuja educação militar começava na infância, nos
ginásios e no Campo de Marte, onde aprendiam a manejar as armas e recebiam uma forte
formação moral (1:87).
A unidade principal dos exércitos romanos era a legião, instrumento que permitiu à
Roma se tornar uma grande potência. Ela teve origem na própria organização, essencialmente
militar, da cidade ao nascer e era comandada por Oficiais romanos que recebiam o título de
tribuno (1:86).
A legião tinha, durante as guerras púnicas, um efetivo normal de 4.500 homens e era
um corpo misto, composto de infantaria pesada e ligeira e cavalaria (1:93).
No início, só podia ser legionário o cidadão romano que possuísse uma certa quantia em
dinheiro estando, dessa forma, o recrutamento reservado aos ricos. Assim, o serviço militar
era regulado por um censo. Cabe porém ressaltar que haviam exceções pois, nos momentos de
crise, podiam ser recrutados cidadãos sem propriedades, sem fortuna e até mesmo os escravos
(1:86).
Com o advento da República e devido a luta de classes entre a aristocracia, os patrícios,
e a plebe, já citada neste trabalho, ocorre uma modificação sob o cônsul Caio Mário que
estende o recrutamento a todos os cidadãos romanos, independente da sua condição social
9
(1:86). Havia uma razão para o interesse dos ricos e pobres em irmanarem-se na condição de
soldados: a expansão territorial de Roma possibilitava a distribuição, entre os que
participassem das campanhas militares, de terras subtraídas dos povos conquistados.
Durante a 2º Guerra Púnica, após a batalha de Canes, quando Roma teve que enfrentar o
momento mais difícil da sua história, fez-se necessário, além de recrutar um número enorme
de soldados, mantendo-se constantemente ativas, por quase toda a segunda fase do conflito,
cerca de 20 a 25 legiões, aperfeiçoar o treinamento dos recrutas e efetuar modificações nos
critérios de concessão de comandos que passaram a se basear exclusivamente na capacidade
individual do comandante (3:63).
Os romanos concluíram que aquela guerra era muito diferente das combatidas até o
momento e que um resultado positivo só poderia ser alcançado com sacrifícios imensos e
muito sangue (3:62).
A CIVILIZAÇÃO CARTAGINESA
AS ORIGENS E A EXPANSÃO TERRITORIAL DE CARTAGO
A tradição clássica atribui a Elissa, ou Dido, filha de um rei de Tiro, a fundação de uma
colônia fenícia na costa norte da África, em 820 a.C., sob o nome de Cart Hadacht , Cidade
Nova. Os gregos transformaram esse nome em Karchedon, e os romanos, em Cartago
(6:1206).
Os cartagineses eram chamados de púnicos pelos romanos, denominação que provém da
palavra poeni, designação latina dada aos feníncios, fundadores de Cartago (7:4834).
Progressivamente, Cartago impôs seu domínio aos entrepostos feníncios do
Mediterrâneo, baseando sua prosperidade no comércio. No século III a.C. quase toda a costa
africana, da Cirenaica a Gibraltar, estava sob o domínio dos cartagineses. Estes também
haviam se apoderado das ilhas Baleares, da Sardenha, da Córsega, de metade da costa oeste da
Sicília e de Malta, ilha do Mediterrâneo central . O mapa do anexo B mostra os territórios
cartagineses no século III a.C..
Cartago impunha aos territórios conquistados o pagamento de grandes tributos anuais,
obrigava os vencidos a se alistarem no seu exército e controlava-lhes rigorosamente o
comércio exterior. O comércio e a exploração desse império tornaram Cartago, no início do
10
século III a.C., o mais rico e poderoso estado mediterrâneo (4:198).
Assim, Cartago, como Roma, governava, além dos seus cidadãos, muitas cidades de raça
estrangeira. No entanto, Roma, de uma maneira geral, dava aos povos dominados um
tratamento melhor que a sua rival pois dividia com as cidades aliadas uma parte dos lucros
das vitórias e procurava criar um partido favorável à metrópole por meio da concessão do
direito à cidadania romana aos homens ricos e influentes da localidade. Cartago, por sua vez,
guardava para si tudo que adquiria e tratava as populações das cidades aliadas como se fossem
um bando de escravos (4:197).
Na 2º Guerra Púnica aquelas diferenças de comportamento para com os aliados
prejudicaram os planos cartagineses de obter o fortalecimento do seu exército invasor por
meio da adesão dos povos libertos do domínio romano na Itália pois, aliado ao fato de Roma
ter conseguido construir sólidas alianças na região, em especial com os latinos, a má fama de
Cartago contribuía para afastar aqueles povos das fileiras de Aníbal (4:198).
A ORGANIZAÇÃO POLÍTICA DE CARTAGO
Assim como em Roma, a organização política de Cartago sofreu uma transformação
passando, com o transcorrer dos anos, de um governo monárquico para uma espécie de
república aristocrática na qual o poder político estava concentrado nas mãos de famílias de
grandes proprietários de terras e ricos comerciantes. Dessa forma, durante as Guerras Púnicas,
Cartago era governada por um conselho denominado Corporação dos Cento e Quatro,
composto pelos representantes da aristocracia, os Juizes (4:191).
Logo, no século III a.C., Roma e Cartago eram Repúblicas cujo poder político estava nas
mãos de uma rica aristocracia. O Senado governava Roma e a Corporação dos Cento e
Quatro, Cartago. A diferença fundamental é que o Senado romano era o representante da
nação no melhor sentido da palavra pois exercia uma política coerente cujo objetivo era o
aumento da riqueza e do poderio militar romano. Assim, não recuavam nos períodos de
adversidade e nem deixavam de aproveitar, por incúria ou hesitação, os benefícios da sorte.
Ao contrário, em Cartago, a Corporação dos Cento e Quatro exercia o governo em benefício
das famílias aristocráticas da cidade, logo, os seus membros não estavam certos se o povo iria
seguí-los nos momentos difíceis para a nação, temendo sempre que o seu poder fosse
usurpado por alguém mais ambicioso.
Dessa forma, os Juizes cartagineses não davam a devida atenção aos grandes temas
11
nacionais, preferindo, muitas vezes, abandonar uma guerra nos momentos em que viam
ameaçados os seus privilégios e as suas riquezas, mesmo quando próximos da vitória (4:196).
CARTAGO, UMA CIDADE DE COMERCIANTES E NÃO DE GUERREIROS.
Como já foi visto anteriormente, ao contrário de Roma que era uma civilização guerreira
que glorificava os seus generais quando se saíam vitoriosos em campanhas militares, Cartago
era uma sociedade governada por uma oligarquia de famílias de ricos comerciantes que
procuravam, sempre que possível, excluir da vida cotidiana o fenômeno da guerra.
Em Roma existia uma relação muito estreita entre direitos políticos e deveres militares.
Em Cartago, ao contrário, não se vê nada parecido. A explicação para esse fato reside na sua
destaca vocação mercantil. Os cartagineses tinham o hábito de examinar as guerras em
termos puramente econômicos. Assim, desejavam que elas fossem sempre de curta duração,
resignando-se em concluí-las sem muita aflição, mesmo com uma derrota, quando a sorte não
lhes houvesse favorecido (3:46).
Como não era possível subtrair para o serviço militar um grande número de cidadãos
cartagineses de suas famílias e afazeres sem prejudicar o comércio e a indústria locais
(tecidos, bijuterias, armas e cerâmicas) (6:1206), Cartago, para formar os seus exércitos,
começou a recorrer, de maneira cada vez mais crescente, aos súditos, aliados e aos
mercenários, organizando uns e outros em divisões autônomas (3:46).
Com o passar do tempo, a presença de mercenários nos exércitos púnicos tornou-se
predominante o que fez com que eles se tornassem muito heterogêneos e pouco disciplinados,
necessitando, na maioria das vezes, de um bom e enérgico comandante para obterem uma
vitória no campo de batalha.
Cartago passou assim, a contar com soldados oriundos de todos os cantos do
Mediterrâneo, como por exemplo: os númidas do norte da África; e os gauleses, numerosos
sobretudo no período da Segunda Guerra Púnica. A partir do século III a.C., no exército
púnico, eram cartagineses somente os oficiais superiores e os comandantes-em-chefe,
escolhidos entre os componentes da aristocracia (3:47).
Apesar da origem aristocrata, os generais cartagineses recebiam um tratamento
impiedoso. Eram expostos a todo tipo de sanção e verdadeiros perigos físicos: não apenas
podiam ser multados, exonerados ou até mesmo condenados à morte em caso de incapacidade,
mas eram constantemente vistos com suspeita por uma oligarquia zelosa do próprio poder e
12
pronta para reagir diante da menor suspeita de que qualquer um deles nutrisse pretensões
autoritárias. Isto fazia com que, freqüentemente, os mais capacitados recusassem a assumir a
tarefa de comando das tropas púnicas (3:47). Essa situação só sofreu modificações com o
início dos conflitos contra Roma quando o comando do exército cartaginês passou a ser
exercido pelos integrantes da família Barca, Almícar, Asdrúbal e finalmente Aníbal (3:48).
Cabe ainda ressaltar que enquanto Roma podia contar com aliados como os povos
latinos que, como soldados, prestavam aos romanos serviços militares tão bons quanto os
prestados pelos seus cidadãos (4:198), Cartago contava em suas tropas com forças pouco
confiáveis pois os mercenários ou aliados dos exércitos púnicos, dependendo das
circunstâncias, podiam passar para o lado do inimigo, como aconteceu, por exemplo, na
batalha de Zama, em 202 a.C., quando a cavalaria númida, aliada dos cartagineses em
campanhas anteriores, bateu-se ao lado dos romanos (3:66).
A PRIMEIRA GUERRA PÚNICA
As relações entre Roma e Cartago iniciaram-se na época da expulsão dos reis etruscos e
da fundação da República, já abordados neste trabalho, com um tratado pelo qual Roma
reconhecia a Cartago, na época o primeiro império marítimo do Mundo,
o direito de
comerciar e controlar a navegação estrangeira em todo o Mediterrâneo ocidental, desde que
não invadisse o mar Tirreno ou atacasse qualquer das cidades latinas aliadas aos romanos
(4:200).
Em 348 a.C. o tratado foi renovado mas, no século seguinte, Roma, senhora da
Península Itálica, começou a ambicionar a Sicília que era grande produtora de trigo, ponto
estratégico para o controle do tráfego comercial e militar no mar Mediterrâneo e estava, na
época, dividida entre os cartagineses, os siracusanos, habitantes da cidade-estado de Siracusa
e os marmetinos, habitantes da cidade-estado de Messina.
O motivo para a guerra surgiu quando Messina, sentindo-se ameaçada por Siracusa,
solicitou ajuda aos romanos, contrariando os interesses de Cartago na região (4:201). Iniciouse assim, a Primeira Guerra Púnica que duraria 23 anos, de 264 a.C. à 241 a.C., e que teve
como principal característica a criação de uma poderosa marinha romana que viria, durante o
conflito, arrebatar de Cartago, de forma definitiva, o domínio dos mares, fato que iria
influenciar significativamente na decisão de Aníbal Barca, alguns anos depois, de transpor os
13
Alpes e proceder, por terra, a invasão da Península Itálica.
Roma, com uma topografia de orla desfavorável , não possuía, até o início da guerra,
grande interesse pela construção naval e pelos empreendimentos marítimos. Essa situação foi
alterada quando surgiu a necessidade de transportar, por via marítima, tropas para a Sicília,
além de se contrapor aos freqüentes ataques das esquadras cartaginesas à portos e cidades
romanas no litoral. Assim, após despender um grande esforço com a construção de navios e
no desenvolvimento de novas táticas de combate no mar, como a utilização dos corvos5, os
romanos passaram a ter uma esquadra poderosa o que lhes possibilitou infligirem em Mylae,
ao norte da Sicília, no ano de 260 a.C., uma grande derrota naval a Cartago (4:203).
Nos anos seguintes, a fortuna continuou a ser fiel aos romanos e eles apoderaram-se das
ilhas de Malta, da Córsega e da Sardenha (4:203).
Em terra, a despeito de uma série de êxitos de pouca importância, Roma foi incapaz de
obter uma vitória rápida sobre Cartago, sobretudo por causa da brilhante estratégia
desenvolvida por Amílcar Barca, pai de Aníbal e comandante das forças púnicas na Sicília,
caracterizada principalmente pela utilização de técnicas de guerrilha contra as legiões romanas
(3:50).
Por fim, travou-se em 241 a.C. um grande combate naval, próximo das ilhas Égatas, no
qual a esquadra romana, comandada pelo cônsul Caio Lutácio Catulo, obteve uma grande
vitória sobre as forças cartaginesas. Sentindo-se incapaz de continuar no conflito, Cartago
então capitulou, renunciando à Sicília e se comprometendo a pagar uma indenização à Roma
de 3.200 talentos ao longo dos dez anos seguintes (4:206).
Com o fim da guerra, toda a Sicília, exceto o território pertencente a cidade-estado de
Siracusa que se tornou aliada dos romanos durante o conflito, passou para a posse dos
vencedores, constituindo-se em uma província romana.
A guerra tinha sido sangrenta e ambos os lados haviam perdido inúmeras vidas. A
diferença é que Roma havia perdido cidadãos e Cartago mercenários. Os romanos porém,
possuíam a arte de recuperar o sangue perdido pela adoção de novos filhos, ao passo que a sua
rival recrutava inimigos como soldados pois, como já foi dito anteriormente, os mercenários
dos exércitos púnicos, por diversas vezes, ao verem contrariados os seus interesses, entravam
em luta contra os generais cartagineses (4:209).
.
A SEGUNDA GUERRA PÚNICA
5
Espécie de pontes que desciam sobre os navios inimigos aos quais se prendiam com ganchos e arpões de ferro.
Estas pontes tornavam as batalhas navais combates corpo a corpo.
14
Procurando compensar as suas perdas territoriais e financeiras na Primeira Guerra
Púnica, os cartagineses, liderados por Amílcar Barca, decidiram ampliar seus domínios na
costa norte da África, atacando os númidas em 237 a.C., e, em seguida, invadir a Península
Ibérica onde conquistaram inúmeras regiões situadas ao sul da atual Espanha (4:211). Assim,
os cartagineses ocuparam as minas de Sierra Morena, onde obtiveram recursos para saldar as
suas dívidas de guerra e preparar uma nova campanha militar contra os romanos.
Em 227 a.C., após a morte de Amílcar Barca, Asdrúbal, seu genro, assume o comando
das tropas e funda a cidade de Nova Cartago, atual Cartagena.
Em 226 a.C. os cartagineses e os romanos, que também possuíam colônias na região,
delimitaram suas áreas de influência na Península Ibérica, assinando um tratado. Nesse
documento, os romanos reconheceram a soberania de Cartago ao sul do rio Ebro, onde estava
localizada a cidade de Sagunto, aliada de Roma.
Com o assassinato de Asdrúbal em 221 a.C., Aníbal, seu cunhado e filho de Amílcar
Barca, torna-se comandante supremo dos cartagineses na Península Ibérica e, em 219 a.C.,
rompe o acordo com os romanos e conquista Sagunto, iniciando, dessa forma, a Segunda
Guerra Púnica.
Cabe ressaltar que, ao assumir o comando do exército cartaginês, Aníbal contava com
apenas 21 anos de idade e estava afastado da cidade de Cartago desde dos 13 anos. Tinha sido
educado para ser um guerreiro e, segundo a lenda, havia sido levado por seu pai, Amílcar, a
um santuário do deus Mellarh onde jurara ódio eterno a Roma (4:211).
Ante a superioridade dos romanos no mar desde da Primeira Guerra Púnica, fato
abordado em parágrafos anteriores, Aníbal, que decidira levar a guerra até a Península Itálica,
resolve conduzir suas tropas por terra, atravessando os Pirineus e os Alpes (4:213). O mapa do
anexo C mostra o percurso percorrido pelas tropas de Aníbal durante a invasão da Itália.
Após transpor o rio Ródano, Aníbal inicia, nos primeiros dias de outubro de 219 a.C., a
travessia dos Alpes com um exército de 70.000 homens, 50.000 a pé e 20.000 a cavalo, tendo,
após 5 meses de caminhada, chegado ao Vale do rio Pó, na Península Itálica, com apenas
26.000 homens, 20.000 a pé e 6.000 a cavalo (4:213).
Aníbal sabia que não tinha como se contrapor a Roma com um exército tão fraco pois
tinha conhecimento que o inimigo poderia dispor de até 750.000 homens (9:107) logo,
esperava obter a vitória com a desagregação do sistema romano que seria alcançada com a
15
libertação das cidades submetidas a Roma na Península Itálica e com a obtenção de aliados
entre esses povos.
Com a notícia da invasão, Roma entra em ebulição e trata de preparar-se para a guerra,
mobilizando suas legiões (9:107).
Acontecem então, três grandes batalhas: Tessino; Trébia; e Lago Trasimeno, todas
vencidas pelos cartagineses graças ao gênio militar de Aníbal. Depois desses sucessos, o
exército púnico avança para o Picenum. Passando próximo a Roma, segue em direção sul,
para a Apúlia. Nesta região seus êxitos sofrem uma interrupção graças à prudência do cônsul
Fábio Máximum que tinha posto a cidade de Roma em estado de defesa (1:106). Devido as
derrotas sofridas pelas legiões romanas, Fábio Máximum estava persuadido de que já não se
tratava de defender a Península Itálica e sim de preservar a capital (4:214).
A guerra de desgaste contra as tropas de Cartago deu resultados positivos. Aníbal, em
situação difícil devido a falta de víveres, já planejava retornar para a Gália Cisalpina, ao norte,
quando a sorte lhe sorriu: a imprudência do cônsul Caio Terêncio Varrone, crítico da
estratégia adotada por Fábio Máximum, ofereceu a Aníbal a oportunidade de combater as
legiões romanas em campo aberto (4:214). Assim, em 216 a.C., os romanos e cartagineses
bateram-se na batalha de Canes cujo resultado foi apresentado na introdução deste ensaio.
Após a batalha, contrariando o seu lugar-tenente Maharbal que, segundo a lenda, teria
dito, naquela ocasião, ao general cartaginês que ele “sabia vencer mas não sabia aproveitar a
vitória” (4:215), Aníbal não ataca diretamente Roma, preferindo rumar para o sul indo se
estabelecer em Cápua onde passa o inverno.
Os estudiosos da história da Antigüidade divergem sobre quais foram as razões que
motivaram Aníbal a tomar a atitude relatada no parágrafo anterior. Muitos porém, concordam
que aquela provavelmente tenha sido a melhor oportunidade para derrotar Roma tida pelo
general cartaginês durante toda a sua campanha na Península Itálica. Assim, a título de
ilustração, serão apresentadas a seguir quais foram essas aludidas razões segundo o historiador
militar Pedro Cordolino F. de Azevedo, incluídas no seu livro: História Militar – Volume I,
pag. 116:
De Canes a Roma havia 384 quilômetros de distância e que só seriam
percorridos pela cavalaria em seis dias no mínimo e pela infantaria em dez.
Se Aníbal quisesse praticar a surpresa de atacar Roma, como diz Canonge,
dentro de seis ou dez dias, ele não teria nenhuma possibilidade de realizar
aquela surpresa e assim vencer.
Além de tudo, é bom saber, Roma dispunha ainda de grande poderio
militar, de 90.000 homens, aos quais Aníbal teria de por em sítio e atacar,
para isso contava com menos de 34.000 homens. Acresça-se que também
não dispunha de material de sítio para a operação.
16
[...] deixando Aníbal de marchar sobre Roma, o que parecia lógico e seguro
a Maharbal, revelou possuir em alto grau o dom de calcular e prever os
fatos, sem se deixar embriagar pelos sucessos colhidos e perder, assim, a
visão das coisas (1:116).
O fato é que, após a vitória em Canes, Aníbal estacionou suas tropas e permaneceu
imobilizado em Cápua, de onde procurou amealhar novos aliados, como Siracusa, na Sicília,
e Felipe, rei da Macedônia (4:216).
Enquanto isso, os romanos que haviam sido tomados de pavor no primeiro momento
após a batalha, recuperavam-se rapidamente, reagrupando suas forças com objetivo de atacar a
retaguarda cartaginesa. Com essa atitude, Roma deixou registrado para sempre na história que
o grande obstáculo de Aníbal não era superar as suas legiões e sim vencer a indomável
perseverança dos romanos (4:217).
Aníbal teve uma prova definitiva dessa perseverança quando, ao tentar um acordo de paz
em que propunha, em troca de diversas indenizações de guerra, a devolução dos soldados
romanos feito prisioneiros no campo de batalha de Canes recebeu como resposta que Roma
não necessitava de prisioneiros que se deixavam aprisionar vivos pois só eram dignos de
honra os que morriam lutando pela sua cidade (4:217).
Com o tempo, Roma colocou-se novamente em condições de atacar os seus inimigos.
Derrotou as forças do rei Felipe da Macedônia, que vieram a Península Itálica para aliarem-se
aos cartagineses, e, em seguida, efetuou uma campanha vitoriosa contra Siracusa que foi
destruída e suas riquezas enviadas à capital dos romanos.
Restava a Aníbal apenas solicitar reforços ao seu irmão Asdrúbal que permanecera na
Península Ibérica, haja vista que os reforços enviados por Cartago, sob comando do seu outro
irmão Magon, haviam sido detidos antes de chegarem à Itália. Além disso, o general
cartaginês não conseguia obter forças em número suficiente na Península Itálica que lhe
permitisse prosseguir com a luta pois, de acordo com o historiador Cesar Cantu na sua obra
História Universal, os povos da região que “desertavam as bandeiras de Roma era porque,
fartos de servirem nas suas legiões, menos dispostos estariam, pois, a servirem nas fileiras de
Aníbal” (4:215). Fracassara assim, o plano cartaginês de obter a vitória amealhando aliados
entre os povos libertados da dominação romana na Itália.
Com Aníbal isolado em suas bases, os romanos prosseguiram sua ofensiva até
Cartagena, na Península Ibérica, onde derrotaram Asdrúbal Barca e expulsaram
definitivamente os cartagineses da Espanha. Asdrúbal ainda tentou reunir-se ao irmão na
Itália, a fim de atender ao seu pedido de reforços, mas foi preso e decapitado.
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Em 211 a.C., Aníbal capitulou em Cápua e, depois de ainda conseguir chegar próximo à
entrada de Roma, foi obrigado a regressar a Cartago para defender a cidade ante a ameaça de
um ataque do Cônsul Públio Cornélio Cipião, o Africano, que, com suas legiões, havia
invadido a África e estava prestes a atacar a capital púnica.
A batalha final da Segunda Guerra Púnica foi travada em 202 a.C., na região de Zama, a
150km de Cartago. Derrotados, os cartagineses foram obrigados a aceitar as severas condições
impostas por Roma, entre as quais, a renúncia aos territórios da Península Ibérica e o
pagamento de uma indenização de 10.000 mil talentos em 50 anos (4:222).
Vencido, após um período em Cartago, Aníbal refugia-se na Síria e, depois, na Bitínia,
onde iria preferir suicidar-se, em 183 a.C., a ser entregue aos romanos que estavam a sua
procura.
ROMA ERA UM CENTRO DE GRAVIDADE
CLAUSEWITIANO NA 2º GUERRA PÚNICA ?
Segundo o escritor e soldado alemão do século XIX Carl von Clausewitz o Centro de
Gravidade (CG) pode ser definido como um ponto ótimo de aplicação de força em uma
guerra. Seria então:
[...]‘um centro de poder e de movimento de que tudo depende, forma-se
por si próprio e é contra este centro de gravidade do inimigo que se deve
desferir o golpe concentrado de todas as forças’. Assim, é o ponto (ou
pontos) onde a aplicação de força pode produzir os melhores resultados e,
no limite, induzir ao sucesso na guerra, isto é, à obtenção do propósito
político. (2:3-28).
O Centro de Gravidade (CG) pode ser muita coisa: segundo Clausewitz,
nos Estados agitados por dissensões internas, normalmente é a capital; em
Estados pequenos que dependem de aliados poderosos, é o exército de seus
aliados; numa confederação de Estados, é a unidade de interesses; numa
sublevação nacional, ele é formado pela pessoa do chefe e pela opinião
pública (2:3-28).
Em vista do acima exposto, qual seria o Centro de Gravidade das forças romanas na
Segunda Guerra Púnica? Verificando o que foi dito anteriormente neste ensaio sobre as
diferenças entre as sociedades romana e cartaginesa, seria bastante razoável supor que o CG
dos inimigos de Cartago estaria na sua organização social e política que possibilitava à Roma
a obtenção de aliados fiéis entre os povos vizinhos e proporcionava aos romanos uma base
moral que lhes dava uma grande energia e uma indomável perseverança que se refletiam em
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um poder militar representado por um exército com forte aspecto nacional.
Essas qualidades acima mencionadas, atribuídas ao povo romano, ficaram bem
representadas no episódio, abordado em parágrafos anteriores deste estudo, no qual o Senado
romano, tendo recebido uma proposta de paz dos cartagineses, recusou-se a negociar o retorno
dos prisioneiros na batalha de Canes alegando que os mesmos não eram dignos de honra pois
haviam-se deixado capturar vivos em vez de morrer lutando pela sua cidade (4:217).
Cabe ainda ressaltar que, apesar de não se referirem explicitamente a um CG, muitos
autores confirmam, em passagens de seus textos, a importância que as organizações políticas
e as qualidades atribuídas aos cidadãos romanos tiveram nos resultados dos conflitos contra
Cartago. Logo, pode-se citar:
-
G. P. Baker, na sua obra: Aníbal: “O obstáculo que barraria o caminho à hegemonia
cartaginesa no Mediterrâneo era mais o poder político de Roma que o militar”
(8:105) ;
-
Cesar Cantu, na obra: História Universal – Livro Quarto, Vol. III:
A comparação dos recursos conhecidos das duas grande potências justifica,
pois, o juízo de um grego intelligente [sic] e imparcial, que disse que
Carthago [sic] e Roma, quando começaram a luctar [sic], eram eguaes [sic]
em forças. Vamos agora vêr [sic] como a energia e a perseverança dos
romanos destruíram a equação (4:119);
-
Montesquieu, na obra: Grandeza dos Romanos, citada por Cesar Cantu em seus
textos:
Crê-se que Hannibal [sic] commetteu [sic] um erro imperdoável não
cercando Roma depois da batalha de Cannes [sic]. É verdade que os
romanos, nos primeiros tempos, tiveram um grande pânico; mas o terror
dos povos aguerridos, que quasi [sic] sempre se transforma em coragem,
não é como o da populaça vil que tem consciência da sua fraqueza (4:215 );
e
-
Bousset, no seu Discurso sobre a História Universal, citado por J. B. Magalhães na
sua obra: Civilização, Guerra e Chefes Militares, afirmava que os romanos
possuíam: “a melhor milícia e a política mais previdente, mais firme e mais
observada que jamais existiu” (9:97) .
Assim, se for considerado que a organização social e o poder político de Roma estavam
representados pela sua capital, onde estavam situadas as sedes do Senado e das outras
instituições da República, pode-se supor que se aquela cidade fosse destruída e seus principais
dirigentes mortos haveria uma grande ruptura no tecido social romano e, dessa forma, seria
inevitável a vitória dos cartagineses que, provavelmente, imporiam uma paz humilhante à
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Roma. Logo, pode-se concluir este ensaio respondendo afirmativamente à questão proposta
como tema: foi Roma um centro de gravidade clausewitiano na 2ª Guerra Púnica ?
CONCLUSÃO
Este ensaio teve o propósito de responder a questão colocada como tema: foi Roma um
centro de gravidade clausewitiano na 2ª Guerra Púnica ? Para atingir a este objetivo foram
estudados os principais fatos históricos da Primeira e da Segunda Guerra Púnica, analisadas as
principais características das sociedades cartaginesa e romana e verificada qual a influência
que as diferenças apontadas entre aquelas sociedades tiveram no resultado dos aludidos
conflitos.
Assim, este estudo demonstrou, entre outras coisas, que:
-
apesar de ambas as sociedades serem organizadas politicamente como uma
República aristocrática, o exercício do poder político em Roma visava o constante
fortalecimento da nação enquanto que em Cartago os seus governantes priorizavam
os seus interesses pessoais em detrimento aos grandes temas nacionais;
-
as forças militares romanas possuíam um forte aspecto nacional pois eram
constituídas basicamente de cidadãos romanos, dessa forma, eram coesas,
disciplinadas e confiáveis. Já as forças militares cartaginesas eram compostas, em
sua maioria, por mercenários e soldados subtraídos dos povos conquistados, assim,
eram pouco confiáveis e precariamente disciplinadas, necessitando, na maioria das
vezes, de um bom e enérgico comandante para obterem uma vitória no campo de
batalha; e
-
apesar de ambas as cidades possuírem sob seu domínio povos de diversas nações,
Roma, de uma maneira geral, dava àquela gente um tratamento melhor do que o
dispensado por Cartago, procurando, dependendo das circunstâncias, conseguir
aliados entre os poderosos da localidade, dando-lhes o título de cidadão romano.
Finalmente, com base na análise dessas diferenças e do relato dos fatos históricos da
Primeira e da Segunda Guerra Púnica, chegou-se a conclusão que o CG dos romanos era a
sua organização social e política que lhes proporcionava: aliados fiéis; uma forte base moral
aos seus cidadãos; e uma força militar com elevado aspecto nacional. Assim, caso fosse
considerado que essa organização estava representada pela sua capital, Roma, onde estavam
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as sedes das suas instituições políticas e os seus principais dirigentes, a resposta para o tema
proposto neste ensaio seria afirmativa.
BIBLIOGRAFIA
1. AZEVEDO, Pedro Cordolino F. de Azevedo. História Militar – Volume I.1 ed. Rio de
Janeiro: Departamento de Imprensa Nacional, 1950.
2. BRASIL. Escola de Guerra Naval. EGN nº 304 A – Guia de estudos estratégicos.
3. BRIZZI, Giovanni. O Guerreiro – O Soldado e o Legionário. 1 ed. São Paulo: Madras,
2003.
4. CANTU, Cesar. História Universal – Livro Quarto – Volume III. 1 ed. Rio de Janeiro:
Empresa Literária Fluminense, 1921.
5. HART, B. H. Liddell. As Grandes Guerras da História. 3 ed. São Paulo: IBRASA,
1982.
6. LAROUSSE, Cultural. Grande Enciclopédia Larousse Cultural. Rio de Janeiro: Nova
Cultura, 1998. v.5.
7. LAROUSSE, Cultural. Grande Enciclopédia Larousse Cultural. Rio de Janeiro: Nova
Cultura, 1998. v.20.
8. LAROUSSE, Cultural. Grande Enciclopédia Larousse Cultural. Rio de Janeiro: Nova
Cultura, 1998. v.21
9. MAGALHÃES, J. B. Civilização, Guerra e Chefes Militares. 1 ed. Rio de Janeiro:
Biblioteca do Exército, 2000.
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ANEXO A
MAPA MOSTRANDO A PENÍNSULA ITÁLICA NO SÉCULO III a.C.
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



ANEXO B
MAPA MOSTRANDO OS TERRITÓRIOS CARTAGINESES
 NO SÉCULO III A.C.
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
 ANEXO C
MAPA MOSTRANDO O PERCURSO PERCORRIDO POR ANÍBAL

 MAPA MOSTRANDO O PERCURSO PERCORRIDO PO

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