O PUNK ROCK NACIONAL NA DÉCADA DE OITENTA: PROPOSTA PARA O ENSINO DE GEOGRAFIA NO ENSINO MÉDIO Márcio Tadeu da Silva Graduando da Faculdade de Geografia da PUC- Campinas [email protected] RESUMO Este artigo discute brevemente a importância do uso da música em sala de aula e faz uma proposta de utilização de letras do Punk Rock nacional em diversos temas de Geografia no Ensino Médio. Os temas são baseados em situações de aprendizagem que fazem parte da Proposta Curricular do estado de São Paulo, pois se busca articular esta análise com a realidade da rede pública de ensino paulista, além de sugerir o aprofundamento das questões, procurando destacar aspectos pouco valorizados na Proposta Curricular. PALAVRAS-CHAVE: Punk Rock, Ensino de Geografia, Ensino Médio INTRODUÇÃO Este artigo tem por objetivos contextualizar brevemente o surgimento do movimento Punk no Brasil, mostrando suas principais características; analisar letras de bandas de Punk Rock da década de 1980; e relacionar as letras analisadas com conteúdos de Geografia para o Ensino Médio. Acredita-se que, ao selecionar músicas com letras significativas e analisá-las relacionando-as a conteúdos de Geografia, se possa criar um diálogo com a realidade e estimular o pensamento crítico dos alunos. Uma das possibilidades para se trabalhar os conteúdos de Geografia no Ensino Médio é o uso de músicas para uma contextualização e melhor aproximação da realidade do alunado. É uma proposta aparentemente simples e de fácil acesso, mas que exige escolha adequada de músicas, principalmente de suas letras, e preparo na integração com os conteúdos. É algo que deve fazer parte do planejamento do professor de Geografia (assim como das demais disciplinas) para que não seja apenas um recurso superficial, mas sim uma Realizado de 25 a 31 de julho de 2010. Porto Alegre - RS, 2010. ISBN 978-85-99907-02-3 1 2 ferramenta de apoio que funcione para que se alcancem os objetivos de reflexão da disciplina. Conforme Campos, uma canção é uma possibilidade das pessoas refletirem sobre a realidade em que vivem, sendo que “[...] algumas músicas possuem uma significação, podem permitir um diálogo com a realidade e por isso elas são, quando têm objetivos definidos, um potencial veículo de educação.” (CAMPOS, 2007b, p. 02). Neste contexto, a utilização de músicas do Punk Rock nacional da década de oitenta é uma das possibilidades pouco exploradas e que pode ser trabalhada. Com a intenção de integrar esta pesquisa à realidade vivida pelos alunos da rede pública do estado de São Paulo, foram selecionados conteúdos de Geografia a partir da Proposta Curricular oficial (São Paulo Faz Escola). Uma das preocupações é que se possa ir além dos conteúdos programados nas apostilas, buscando valorizar o trabalho único que pode ser feito por cada professor, visando uma maior liberdade. Esta pesquisa não é vinculada a nenhuma disciplina de graduação. Ainda não foi aplicada, mas pretende-se em breve a utilizar durante a Prática de Ensino em Geografia na Faculdade de Geografia da PUC-Campinas. O PUNK ROCK NACIONAL NA DÉCADA DE OITENTA O Punk surgiu no início da década de setenta com o conjunto estadunidense Ramones, considerado precursor no estilo. Em seguida apareceram, no Reino Unido, os Sex Pistols. Enquanto nos seus primórdios (como em conjuntos que podem ser considerados pré-Punks, como MC5 e The Stooges) pareceu ser mais uma tentativa de revolução estética e cultural, os Punks do final da década de setenta já possuíam certa politização, ao menos no que se refere a ser música de protesto: protesto contra o ostracismo do Rock Progressivo, protesto contra governos, protesto contra o sistema capitalista etc. Mas ainda estava em um certo contexto de modismos. No Brasil suas origens datam em torno 1976 e, em 1978, a capital paulistana já contava com bandas como AI-5, Restos de Nada, Condutores de Cadáver e, um pouco depois, o Cólera. O Punk não surgiu no Brasil como um modismo importado, mas sim como uma “identificação adaptada à realidade social” daqui (BIVAR, 1982). Realizado de 25 a 31 de julho de 2010. Porto Alegre - RS, 2010. ISBN 978-85-99907-02-3 2 3 O ano de 1982 foi o grande ano para o Punk nacional. Surgiram as primeiras gravações em vinil e aconteceram grandes festivais como “O Começo do Fim do Mundo”, que ocorreu em 27 e 28 de novembro de 1982 no SESC Pompéia em São Paulo, em uma verdadeira demonstração de superação, tendo em vista a origem pobre da maioria dos Punks e a repressão da ditadura militar. Era um movimento do subúrbio que eclodiu em um momento de crise e desemprego, e por mais que a mídia brasileira tentasse descaracterizá-lo e deturpá-lo – como o jornal O Estado de S. Paulo na reportagem “Geração Abandonada” de 1982 – não era possível contê-lo, pois foi uma manifestação espontânea e que surgiu “de baixo”. Os anos oitenta foram grandiosos para o Punk brasileiro; portanto, é sobre este período que as letras deste artigo se referem. O PUNK ROCK E O ENSINO DE GEOGRAFIA A partir desta breve descrição do que foi o movimento Punk no Brasil, entende-se que é importante trabalhar com suas letras em sala de aula. Por ser uma música mais agressiva, prefere-se que a abordagem seja feita com os conteúdos do Ensino Médio, onde os alunos estão em média entre 15 e 17 anos de idade. Pelo fato dos atuais modismos e da produção fonográfica globalizada ditarem os ritmos a serem consumidos é que se busca no Punk uma alternativa de trabalhar com uma música que buscou uma identidade própria no Brasil e, acima de tudo, surgiu na periferia. Isto pode ser mostrado aos alunos e, por mais que a música possa causar certo impacto (por ser bastante agressiva, tendo em vista a música de fácil acesso consumida pelas massas), essa questão pode ser o ponto de partida para se trabalhar com letras de Punk Rock. Em geral as letras de Punk são de fácil entendimento e expressam claramente os protestos, anseios e desejos dos Punks, desejos esses que não são apenas deles. Um exemplo a ser trabalhado em conteúdos como o “mercado de trabalho” e a “segregação socioespacial e exclusão social” na segunda série do Ensino Médio, é a música “Trabalhadores Brasileiros”, do grupo carioca Espermogramix: TRABALHADORES BRASILEIROS (Espermogramix) In: Ataque Sonoro (Coletânea), Ataque Frontal, 1985. Realizado de 25 a 31 de julho de 2010. Porto Alegre - RS, 2010. ISBN 978-85-99907-02-3 3 4 Cinco da manhã ele pega trem lotado / direto pro trabalho / pra ganhar salário / Chega atrasado, cansado e suado / patrão grita bem alto / vai ser descontado / No dia seguinte ele encontra com o patrão / num carro importado / com ar condicionado / Pede um aumento / patrão grita bem alto: / “sai fora daqui, seu porco empregado” / Hora do almoço a marmita requentada / cheiro do azedo da antiga feijoada / Serviço nunca rende parece uma batalha / o cansaço sempre aumenta e a hora ultrapassa / As sete ele larga pra pegar o trem bendito / e a noite ele reza que não seja despedido Esta letra é uma visão das condições sociais e de trabalho de grande parte dos trabalhadores brasileiros no início da década de oitenta. Ao se discutir a distribuição da População Economicamente Ativa (PEA) brasileira por setores de produção, pode-se estender esta discussão para a questão da jornada de trabalho. A letra, referindo-se ao trabalhador pegando o trem às cinco horas da manhã e retornando, para pegar o trem, às sete horas da noite, sugere uma longa jornada de trabalho: em torno de doze horas. Esta ainda é a realidade de muitos brasileiros. Pode-se refletir, e verificar com dados, sobre o que mudou na vida dos trabalhadores desde a Revolução Industrial. Sobre a segregação socioespacial e exclusão social, pode-se analisar a diferença entre o patrão e o empregado. Enquanto o empregado anda de trem lotado, assim como muitos outros trabalhadores, o patrão está de carro importado. Estendendo a linha de pensamento, pode-se considerar a organização espacial do espaço urbano no contexto das desigualdades sociais, consequentemente, a segregação socioespacial e a exclusão social: precárias condições de moradia de grande parte da população que convive nos grandes centros urbanos ao lado de condomínios de luxo, habitados por uma minoria que possui alto poder aquisitivo. O tema da pobreza também pode ser verificado quando citado na letra que o trabalhador vai “ganhar salário”, o que sugere que sua renda seja mínima, e também almoçando uma “marmita requentada” com o “cheiro do azedo da antiga feijoada”. A questão da alimentação pode ser associada às questões sociais precárias em quem muitos vivem. Além disso, pode-se verificar a diferença de classes sociais. Ainda que muitos sejam contrários à afirmação de que a sociedade possui classes, a estrutura da sociedade em classes sociais pode ser verificada empiricamente nas relações de trabalho. Realizado de 25 a 31 de julho de 2010. Porto Alegre - RS, 2010. ISBN 978-85-99907-02-3 4 5 O tema pobreza é abordado por diversas bandas, muito provavelmente devido a origem humilde da maioria dos punks, além da consciência adquirida do movimento sobre esta questão. A banda santista de Punk/Hardcore, Psychic Possessor, traz grandes contribuições em diversos temas em seu segundo álbum “Nós Somos a América do Sul”, de 1989; no tema pobreza sua contribuição fica por conta da música “Vítimas da Miséria”. VÍTIMAS DA MISÉRIA (Psychic Possessor) In: Nós Somos a América do Sul (Psychic Possessor), Cogumelo Discos, 1989. Olhe para o chão / Você não está vendo? / Preste atenção / No que está acontecendo / Crianças passando fome / Você vai encontrar / Futuros marginais / Aprendendo a matar / Serão o futuro / Aprendendo a roubar / Virando marginais / Sem estudo, sem lar / Vítimas da miséria É uma música com letra simples, mas que tem um importante significado. Ao se discutir a questão da “segregação socioespacial e exclusão social” em Geografia, não se pode deixar de visualizar o cotidiano dos pobres e os motivos que levam muitos jovens à entrarem na vida do crime. De acordo com a análise de Campos (2007a) sobre a letra da canção “O meu guri”, de Chico Buarque, se vê na atualidade crianças trabalhando para os agentes do narcotráfico, os tendo como ídolos, além de darem pouco valor às suas vidas e as de outras pessoas, sendo que a solução normalmente colocada pela mídia é a prisão destes, fazendo uma limpeza nas ruas, “[...] e não se percebe que as causas estão bem antes, nas suas condições de vida e de moradia, na ausência de valores que permeia nossa sociedade, do pouco cuidado com a infância que a sociedade brasileira sempre se caracterizou.” (CAMPOS, 2007a, p. 214). Essa limpeza nas ruas já promoveu muitas vítimas. O massacre da Candelária é um exemplo significativo, onde no centro do Rio de Janeiro, em 23 de julho de 1993, um grupo de homens encapuzados atirou contra aproximadamente 50 menores de rua que dormiam na calçada da Igreja da Candelária. Analisando a letra da música “Vítimas da Miséria” pode-se encontrar grande semelhança com a análise que foi feita por Campos (2007a) da letra de “O meu guri”, ainda que esta letra seja mais simples. Verificando a parte da letra onde se diz “Olhe para o chão / Você não está vendo? / Preste atenção / No que está acontecendo / Crianças passando fome / Você vai encontrar / Futuros marginais / Aprendendo a matar”, pode-se verificar, Realizado de 25 a 31 de julho de 2010. Porto Alegre - RS, 2010. ISBN 978-85-99907-02-3 5 6 sob a ótica de grande parte da sociedade, crianças pobres vivendo nas ruas sendo ignoradas, e que terão muito provavelmente seu destino relacionado ao narcotráfico ou ao crime organizado em geral. Enquanto em “O meu guri” é uma mãe subletrada que não percebe a relação que seu filho tem com o crime, em “Vítimas da Miséria” aponta-se a exclusão social que muitos não conseguem enxergar. É o ainda papel ativo da ideologia neoliberal, onde se acusa cada pessoa como única responsável por seu sucesso e por seu fracasso, que encobre a relação entre o crime e a pobreza, que não é vista pela sociedade em geral. E o destino destes, quando não a morte, muito provavelmente pode ser o de serem trancafiados nos sistemas prisionais, que comprovam sua ineficiência tendo em vista o alto índice de presos reincidentes cumprindo pena. É o complemento da letra desta música em que se diz “Serão o futuro / Aprendendo a roubar / Virando marginais / Sem estudo, sem lar / Vítimas da miséria”, que permite vislumbrar um futuro pouco feliz para essas crianças. Outro tema que pode ser abordado com letras de Punk é o da questão ambiental. É um tema que está em moda na atualidade, e que parece estar cada vez mais sendo abordado pela ótica do senso comum, que vem sendo há anos alimentado por informações superficiais por parte dos meios de comunicação. A letra da música “Verde”, da banda paulista Cólera, que faz parte de seu terceiro álbum de estúdio “Verde, Não Devaste” de 1989, aborda a questão ambiental. VERDE (Cólera) In: Verde, Não Devaste! (Cólera), Devil Discos, 1989. Onde haviam riachos limpos / Hoje só vemos estrume humano / O chão que era coberto por folhas secas / Está encoberto pelo concreto Quem quer que mate à toa / Quem queima e corta / Florestas e reservas / Só pensa em lucrar / Mas isso é roubar Minha vida, sua vida, nossas vidas / Dependem do verde / Minha vida, sua vida, nossas vidas / Dependem do verde, dependem do verde já! O homem já inventou máquinas que voam / Mas não inventou o verde / O homem já criou cérebros e bombas / E esqueceu do verde O homem não pensa muito / Na hora de explorar / Por mais que destrua vidas / Só pensa em lucrar / Mas isso é roubar Ponha ele em pé, com a serra elétrica / Corte no início da perna / Corte no início da perna / Código de indústria pra fazer papel / Ou armarinho de luxo / Ou armarinho de luxo Realizado de 25 a 31 de julho de 2010. Porto Alegre - RS, 2010. ISBN 978-85-99907-02-3 6 7 Apesar de a abordagem parecer estar restrita ao senso comum, ela pode ser trabalhada em diversos temas. Ao se tratar da situação de aprendizagem “A defesa dos pontos sensíveis do meio ambiente: os tratados sobre o clima e a biodiversidade”, da primeira série do Ensino Médio de acordo com a Proposta Curricular paulista, sugere-se utilizar esta letra. A questão do clima é razoavelmente discutida pela sociedade e, de acordo com a Proposta, a perda da biodiversidade também deve ser. Praticamente toda a cobertura vegetal do planeta já sofreu modificações devido a ação antrópica. No verso em que se diz “Quem quer que mate à toa / Quem queima e corta / Florestas e reservas / Só pensa em lucrar / Mas isso é roubar” pode-se instigar os alunos a pensarem em quem são os responsáveis por essa devastação florestal. Pode-se afirmar, ao contrário do que ideologicamente é colocado como verdadeiro que toda a humanidade é responsável pelos problemas do planeta (como se dependesse única e exclusivamente das ações individuais para combatê-los), que existem grandes corporações que são as maiores responsáveis pela devastação do meio natural. Existe um debate sobre a questão ambiental fazer parte ou não do aporte teórico da Geografia; porém, ao se levar este debate ao encontro das ações das grandes corporações, pode-se neutralizar essa dúvida e verificar como estas empresas alteram o espaço geográfico conforme suas ambições. “As corporações transnacionais” é um conteúdo previsto para o segundo semestre da primeira série do Ensino Médio e deve ser articulado com a questão ambiental. É importante verificar quem é “o homem que não pensa muito” e que “Na hora de explorar / Por mais que destrua vidas / Só pensa em lucrar”. É necessário estimular o pensamento crítico dos alunos com essas indagações para se verificar que, por de trás do conceito de humanidade, que é genérico, existe o homem concreto. Deve-se verificar quem são os atores hegemônicos que detém o poder e que promovem a devastação do ambiente. Ao se tratar da Geografia Política, na terceira série do Ensino Médio, com o tema “a questão étnico-cultural”, quando a Proposta Curricular indica verificar os focos de tensão existentes no mundo, sugere-se que maior atenção seja dada à Ásia Ocidental e, principalmente, à questão palestina, tendo em vista a grande quantidade de informações fornecidas pelos meios de comunicação, mas que pouco esclarecem os conflitos ali existentes. Realizado de 25 a 31 de julho de 2010. Porto Alegre - RS, 2010. ISBN 978-85-99907-02-3 7 8 Uma letra de música que pode ser utilizada é “Política Sionista”, da banda paulista de Punk/Hardcore Lobotomia, que faz parte de seu primeiro disco, também chamado “Lobotomia”, de 1986. POLÍTICA SIONISTA (Lobotomia) In: Lobotomia (Lobotomia), New Face Records, 1986. Sob um pretexto pacifista / Exterminam civis a sangue frio / São as vidas humanas sempre pagando / Pelos lucros de uma guerra sionista Política sionista de uma / Guerra racista / Guerra sionista de políticos fascistas Assassinos de bandeira defensiva / Escolhem suas vítimas palestinas / Bombardeando Beirute / Recobrindo o Líbano de sangue Política sionista de uma / Guerra racista / Guerra sionista de políticos fascistas Ostentando um fanatismo religioso / São utilizados como instrumento / para manter interesses econômicos / E servir como uma base militar Política sionista de uma / Guerra racista / Guerra sionista de políticos fascistas Primeiramente deve-se verificar o que foi o Sionismo político, tendo em vista o destaque que é dado nesta letra e, consequentemente, as implicações e conflitos consequentes da política sionista para a criação do Estado de Israel. Os versos “Sob um pretexto pacifista / Exterminam civis a sangue frio / São as vidas humanas sempre pagando / Pelos lucros de uma guerra sionista”, evocam a explicação do que é esta guerra sionista, os motivos de ser chamada de racista, a questão econômica envolvida e a importância de dissociá-la do judaísmo em geral. Acredita-se que, para o entendimento da criação do Estado de Israel e da questão palestina, seja necessário conhecer as características naturais da região, o Acordo de Sykes-Picot e suas implicações, as principais religiões da região (islamismo e judaísmo), o processo de ocupação regional, o envolvimento da ONU (principalmente na partilha da Palestina pós-Segunda Guerra Mundial) e os conflitos consequentes da criação do Estado de Israel, em acordo com a proposta de análise proposta por Campos (2009). De acordo com Campos, “No século XX, o controle da Ásia Ocidental pelas grandes potências transformou esta área em uma das âncoras do comércio mundial e, posteriormente, em um dos graves problemas da geografia política global.” (CAMPOS, 2009, p. 02). Portanto, verifica-se a importância de uma análise apurada do conflito Israel-Palestina. Parte da letra, onde se diz “Assassinos de bandeira defensiva / Escolhem suas vítimas palestinas”, pode ser interpretada como relacionada aos diversos ataques Realizado de 25 a 31 de julho de 2010. Porto Alegre - RS, 2010. ISBN 978-85-99907-02-3 8 9 promovidos pelo Estado de Israel aos palestinos, ditos como preventivos, como a Guerra dos Seis Dias, onde foi fechado o canal de Suez, ampliou a área ocupada por Israel, ocorreu o aumento do êxodo de palestinos e sírios para os campos de refugiados, o aumento de ataques palestinos aos judeus de todo o mundo, e a retaliação israelense por ar e por terra nos países vizinhos (CAMPOS, 2009, p. 48). Em todas as guerras são feitas muitas vítimas civis e, devido a este fato, entende-se que seja importante explicar os conflitos da região para ilustrar a associação feita na letra da música com o movimento político sionista, os pontos convergentes e divergentes desta associação. A continuação do verso anterior diz “Bombardeando Beirute / Recobrindo o Líbano de sangue”. Esta parte da letra faz referências ao ano de 1981, quando Israel bombardeou Beirute, assim como pode ser incluída a pressão feita pelo governo israelense para que os guerrilheiros da Organização para a Libertação da Palestina (OLP) abandonassem o Líbano no ano seguinte. Além do que foi proposto, sugere-se que os outros versos da letra sejam analisados mais detalhadamente, assim como os das outras músicas citadas, mas que devido ao espaço aqui limitado, não pode ser feito. CONSIDERAÇÕES FINAIS Muitas outras letras de músicas de bandas Punks da década de oitenta podem ser utilizadas para tratar temas relevantes dentro do ensino de Geografia no Ensino Médio. A música “Yankees Go Home” da banda Garotos Podres (1988) pode ser utilizada para tratar o tema do papel do Brasil no sistema internacional, do imperialismo estadunidense, e da submissão de diversos países às políticas dos EUA. A música “Vivo na Cidade”, da banda Cólera (1986), pode ser utilizada para trabalhar o tema urbanização e direito à cidade. A letra de “Miséria e Fome”, da banda Inocentes (1983), permite trabalhar a questão da pobreza e, simultaneamente, o período da ditadura militar e a censura, pois a banda foi obrigada a modificar sua letra pelo órgão censor para que pudesse ser publicada. Outras letras punks podem ser utilizadas para trabalhar diversos temas em sala de aula. Portanto, acredita-se que esta proposta esteja constantemente em construção e depende Realizado de 25 a 31 de julho de 2010. Porto Alegre - RS, 2010. ISBN 978-85-99907-02-3 9 10 de quem a utilizar para que seja ampliada ou melhorada, assim como se verificar a sua eficácia. A utilização de músicas para trabalhar os conteúdos de Geografia no Ensino Médio é um excelente recurso de apoio ao professor, mas para isso deve-se analisar detalhadamente as letras e planejar sua inserção no programa de ensino. Mais do que um recurso pedagógico, é uma possibilidade de ir além do material didático adotado oficialmente na maioria das escolas – as apostilas da rede privada (sistemas de ensino) e as apostilas da rede pública (como o São Paulo Faz Escola, no caso paulista) –, e aprofundar questões relevantes que não fazem parte dos programas oficiais. A utilização de letras do Punk Rock nacional no ensino de Geografia ganha em importância quando verificada a origem do movimento Punk, os seus objetivos e seus anseios. É da união de jovens das classes menos privilegiadas e oprimidas que surge este movimento, em um momento de crise e de desemprego. Pode-se verificar nas letras abordadas certo nível de politização dos punks, a consciência dos problemas brasileiros e mundiais, e a reivindicação por um mundo mais justo, que se dá através de seus protestos e denúncias. A partir disto reitera-se a importância em se trabalhar com letras do Punk Rock nacional em sala de aula, em um ensino de Geografia que vise a formação do cidadão, que estimule o pensamento crítico dos alunos e que pretenda demonstrar o papel ativo que estes devem ter como cidadãos na sociedade. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BIVAR, Antonio. O que é punk? 2ª ed. São Paulo: Brasiliense, 1982. CAMPOS, Rui Ribeiro de. As Crianças nas Guerras: uma discussão para o ensino superior de Geografia. 2007a. Boletim Paulista de Geografia. São Paulo: Associação dos Geógrafos Brasileiros – Seção São Paulo, nº. 86, jul. 2007, p. 191-220. CAMPOS, Rui Ribeiro de. O Uso da Música Popular Brasileira na Aula de Geografia. In: VI Encontro Nacional de Ensino de Geografia, 2007, Uberlândia (MG). Concepções e Realizado de 25 a 31 de julho de 2010. Porto Alegre - RS, 2010. ISBN 978-85-99907-02-3 10 11 fazeres da Geografia na Educação: diversidade em perspectiva. São Paulo: Associação dos Geógrafos Brasileiros, 2007b. CAMPOS, Rui Ribeiro de. A Geografia Política da Ásia Ocidental. Campinas (SP): PUC-Campinas, 2009 (mimeo). MOREIRA, Gastão. Botinada! A Origem do Punk no Brasil. Vídeo-documentário. São Paulo: Produtora ST2, 2006. Realizado de 25 a 31 de julho de 2010. Porto Alegre - RS, 2010. ISBN 978-85-99907-02-3 11