Hipóteses sobre as propriedades geométricas primárias da asa de um carro voador Régis Zorzo¹, Alexandre Silva de Oliveira² ¹Graduando em Engenharia Mecânica, Universidade Federal do Pampa, [email protected], ² Doutor em Engenharia Agrícola, Professor da Universidade Federal do Pampa, [email protected] Resumo – O anseio de desenvolver um veículo capaz de proporcionar a versatilidade de trafegar em solo e ar enfrenta a problemática do grande volume ocupado pelos mecanismos convencionais de voo, dificultando seu uso em via pública. Dessa forma o presente trabalho objetiva obter hipóteses sobre a geometria inicial de uma asa para o veículo conhecido popularmente como "carro-voador". A metodologia empregada consiste em uma análise numérica e literária para determinar os requisitos aerodinâmicos básicos da asa. Utiliza-se o software XFLR5 que é uma extensão do conhecido XFOIL, desenvolvido para análise de aerofólios, na obtenção das propriedades dos perfis e da asa. Empregam-se conceitos básicos de aerodinâmica, onde é possível chegar às características aproximadas de uma asa de geometria trapezoidal com área alar de 17,31 m², envergadura de 11,77 m e corda na raiz de 1,88 m, sendo que a mesma possui uma razão de aspecto de 8. Palavras-chave: Carro voador, projeto conceitual, sistema aerodinâmico. Abstract – The yearning of to develop a vehicle able to provide versatility of to traffic in land and on air face the problem of the great volume ocuppiee by the conventional flight mechanics, difficulting its use in public way. In this way this work have the objective of to obtain hypothesis involving the initial geometry of a wing to the vehicle popularly known as "flying car". The methodology adopted consists in an analysis based on the bibliography to determine the basical aerodynamical requisits of the wing. It is used the software XFLR5, which is an extension of the well known XFOIL, focused in the analysis of airfoils, in the obtaining the proprieties of the airfoils and of the wing. Using basic concepts of aerodynamics, where it is possible to obtain aproximated characteristics of a trapezoidal shaped wing with area of 17,31 m, wingspan of 11,77 m, root chord fof 1,88 m and with aspect ratio of 8. Keywords: Flying car, aerodynamical system. I. conceptual project, INTRODUÇÃO A busca por meios de transporte mais eficientes e que possibilitem cada vez mais a comodidade e agilidade não é recente. Glenn Hammond já havia desenvolvido o conceito de "carro voador" em 1917 ao projetar Curtiss Autoplane [1]. Desde então o desenvolvimento de tais conceitos se mostra atraente, tornando possível notáveis avanços como no caso do Transition da Terrafugia que nos Estados Unidos da América obteve autorização para a produção na categoria de aeronave leve [2]. São partes essenciais do projeto de uma aeronave a aerodinâmica, estabilidade e controle, cargas estruturais, desempenho e modelo tridimensional detalhado do projeto [3]. A fase que trata da aerodinâmica se destaca por ser ela a responsável por definir as dimensões primárias da aeronave [4]. Dessa forma, o tema de pesquisa refere-se à seleção das propriedades aerodinâmicas iniciais da asa do carro voador. Tem-se como problema de pesquisa: como selecionar as propriedades dimensionais, como peso, área alar, geometria da asa, sem que ocorra inviabilidade construtiva e penalize o tráfego em modo solo? O objetivo geral é apresentar um conceito de asa com suas dimensões primárias e as causas de sua escolha. Mais especificamente almeja-se: 1) apresentar a seleção do aerofólio; 2) demonstrar os princípios utilizados na estimativa da massa total e velocidade mínima; 3) inferir propriedades geométricas, como área, envergadura e corda. A pesquisa é delineada no âmbito de se obter hipóteses acerca das características iniciais para a obtenção de um conceito geométrico de asa para um carro voador. A justificativa do presente trabalho reside na importância da obtenção das características aerodinâmicas primárias, visto que elas apresentam impacto direto em todas as etapas do projeto. Tem-se como hipóteses iniciais que a asa não possuirá dimensões excessivas ao se implementar um acréscimo de carga, objetivando um veículo cômodo para quatro passageiros e um espaçoso porta-malas. II. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA Nesta seção será apresentada uma revisão bibliográfica envolvendo metodologias de projetos, projetos de aeronaves e carros voadores. A. Estruturação de projeto do veículo A parcela da indústria que busca oferecer produtos de alcance mundial vem crescendo, juntamente com a busca pela redução do tempo de desenvolvimento e aumento da vida útil do produto. Dessa forma busca-se a sistematização dos processos voltados ao desenvolvimento de produtos [5]. Um modelo tradicional de desenvolvimento de produto é o apresentado por Rozenfeld et al. [6], o qual é dividido ©Revista Ciência e Tecnologia, v. 18, n. 33, p. 9-15, jul./dez. 2015 - ISSN: 2236-6733 nas macrofases de pré-desenvolvimento, desenvolvimento e pós-desenvolvimento. As macrofases são subdivididas em fases e atividades como mostra a Figura 1. veículos: Aeromobil, Transition e o Pal-V One, onde algumas de suas características são apresentadas na Tabela 1. Tabela 1 – Características técnicas do Aeromobil 3, Transition e do Pal-V One. Figura 1 – Fases de desenvolvimento de produto. Passageiros Sistema de voo Fonte: Retirado de [6]. A Figura 1 apresenta as principais fases adotadas no modelo de referência para o processo de desenvolvimento de produto de Rozenfeld et al. [6], as quais são: planejamento do produto, projeto informacional, projeto conceitual, projeto detalhado, preparação da produção e lançamento do produto. A fase de projeto conceitual trata da busca, criação, representação e seleção de soluções para o problema do projeto. A concepção obtida deve fornecer uma descrição aproximada das formas e princípios de funcionamento do produto, sendo geralmente apresentada com o auxílio de modelos tridimensionais. Nessa fase também se deve buscar mensurar alguns parâmetros críticos para o funcionamento do produto, como formas, dimensões e grandezas que auxiliem na avaliação da concepção. Sendo que dimensões com menores implicações podem ser deixadas para o projeto detalhado [6]. O presente estudo se procede na fase de projeto conceitual. Embora não apresente uma concepção completa, tem a finalidade de obter hipóteses acerca dos parâmetros quantitativos iniciais da solução de voo, já previamente selecionada (asas fixas). B. Carros voadores existentes É comum e de grande valia a utilização de ferramentas que buscam analisar as propriedades dos produtos concorrentes. Uma ferramenta bastante empregada neste quesito é o benchmarking. O benchmarking pode ser definido como um processo de identificação e uso do conhecimento e práticas de outras organizações [7]. Dessa forma é de interesse levantar informações sobre características dos projetos de carros voadores existentes no mercado. Em seus estudos, os autores [8] apresentam os principais carros voadores ao longo da história. Nota-se que há muitos conceitos de carros voadores desenvolvidos, porém são poucos os que se tornaram realidade e é ainda menor o número dos que atingem a etapa de produção. Desses últimos podem se citar três Aeromobil 02 Asas fixas Dimensão em 8,3 m x 6 m modo avião Máxima vel. modo 200 km/h avião Mínima vel. modo 60 km/h avião Velocidade de 130 km/h decolagem Massa máxima 600 kg decolagem Distância de 300 m decolagem máxima Distância de pouso 100 m máxima Número de asas Monoplano Transition 02 Asas fixas Pal-V 02 Asas giratórias 8mx6m - 185 km/h 180 km/h 83 km/h 50 km/h 130 km/h - 667 kg 910 kg 518 m 165 m 100 m 30 m Monoplano Duas pás C. Projeto de aeronaves O projeto de aeronaves pode ser dividido em uma análise bidimensional e uma análise tridimensional. Apesar de todo escoamento real ser tridimensional, a análise bidimensional se mostra de grande importância devido à sua simplicidade e acurácia na obtenção de determinadas propriedades. Por exemplo, o coeficiente de sustentação pode ser estudado no plano do escoamento preferencial, de forma que uma análise bidimensional se mostra adequada para a obtenção de valores iniciais [9]. A geração de arrasto, por outro lado, não pode ser modelada apenas de forma bidimensional. O arrasto surge principalmente na forma de arrasto de superfície, de forma e induzido. O arrasto de superfície costuma ser a menos influente forma de arrasto, e surge devido à tensão de cisalhamento na superfície do corpo imerso. O arrasto de forma surge devido à esteira turbulenta que se forma após o descolamento da camada limite. O arrasto induzido surge a partir da geração de vórtices, formados principalmente no processo de geração de sustentação [10]. As duas primeiras formas de arrasto podem ser modeladas adequadamente em duas dimensões, mas o arrasto induzido, o mais influente de todos, por envolver a geração de vórtices, só pode ser modelado em três dimensões. Por isso o projeto de aeronaves se inicia na modelagem em duas dimensões, por ser mais simples e fornecer um ponto de partida. Como a geração de arrasto é inevitável, é coerente que se busque primeiro um perfil de asa que forneça sustentação adequada, para que ©Revista Ciência e Tecnologia, v. 18, n. 33, p. 9-15, jul./dez. 2015 - ISSN: 2236-6733 depois se defina uma geometria de asa que minimize o arrasto [3,9,11]. III. METODOLOGIA Utiliza-se de pesquisa científica na obtenção e análise dos problemas. A pesquisa foi desenvolvida de forma numérica, visando à obtenção de valores de referência para estudos futuros, de maior aprofundamento. Entre as principais questões que envolvem o presente trabalho estão: Quais os requisitos que o sistema aerodinâmico de um carro voador deve respeitar? Qual aerofólio ideal para promover a sustentação necessária para o voo? Quais as dimensões e propriedades, como área alar, corda, perfil aerodinâmico e envergadura que são factíveis para se produzir um carro voador, visto que suas propriedades são limitadas para se manter a trafegabilidade em solo? Emprega-se o programa XFLR5 para a obtenção dos dados. O programa XFLR5 é uma extensão do conhecido XFOIL, o qual é voltado à análise de aerofólios subsônicos. O XFLR5 é formado por diversas rotinas que promovem uma análise completa do aerofólio [12]. O método da qual se vale a presente pesquisa é o princípio do Vortex Lattice Method (VLM), que consiste em modelar a perturbação gerada pela asa por meio da soma de vórtices distribuída ao longo da asa plana. A força de cada vórtice é calculada de modo a satisfazer as condições de contorno apropriadas, isto é, as condições de não penetração na superfície dos painéis. O presente trabalho segue os seguintes passos: Obtenção dos requisitos aerodinâmicos da asa através de pesquisa bibliográfica. Seleção de um perfil de alta sustentação através do software XFLR5, que incorpora o XFOIL. Estimativa das propriedades básicas da asa, como área, envergadura e corda por meio do método Vortex Lattice Method (VLM), linear, empregado através do XFLR5. IV. TEORIA MATEMÁTICA No presente tópico os fundamentos matemáticos são apresentados. A. Seleção do perfil O problema consiste na obtenção e comparação dos coeficientes de sustentação, arrasto e momento para os perfis indicados por [12], NACA 4415, Clark Y, NACA 4412, NACA 2412 e NACA 65(2)-215. Assumem-se dados fictícios para o voo de uma aeronave, onde a densidade do ar 𝜌 na altura de cruzeiro possa ser aproximada a densidade ao nível do mar. O número de Mach é estimado por meio da Equação 1. 𝑀= 𝑣 𝑐 (1) onde 𝑣 é a velocidade do escoamento e 𝑐 é a corda aerodinâmica. O número Reynolds é expresso pela Equação 2, sendo ele uma grandeza adimensional que caracteriza o estado de escoamento. Geralmente em asas de aviões convencionais um número de Reynolds maior que 1 × 10⁷ indica um fluxo turbulento [11]. 𝑅𝑒 = 𝜌. 𝑣. 𝑐 𝜇 (2) O coeficiente de sustentação, arrasto e momento são obtidos por meio do XFLR5, através do número de Reynolds e do número de Mach obtidos pelas equações anteriores. Então se procede com a análise de suas curvas de coeficiente de sustentação e arrasto versus ângulo de ataque. B. Definição da asa As propriedades são obtidas em função das condições críticas de voo, ou seja, para ângulo de ataque de estol, em que se tem a velocidade mínima e a sustentação máxima. Admite-se que a sustentação necessária a ser gerada para tornar possível o voo deva ser igual a massa máxima do veículo (𝐿 = 𝑚𝑎𝑠𝑠𝑎). Em primeiro momento, utilizam-se as propriedades definidas como requisitos aerodinâmicos e as propriedades obtidas na seleção do perfil da asa, em especial o seu coeficiente de sustentação (𝐶𝐿 = 𝑐𝑙 ), para gerar um apanhado de possíveis configurações geométricas para asa. A área da asa 𝑆 é estimada através da Equação 3. 1 𝐿 = . 𝜌. 𝑣 2 . 𝑆. 𝐶𝐿 2 (3) A envergadura 𝑏 é estimada através da razão de aspecto, Equação 4. 𝐴𝑅 = 𝑏2 𝑆 (4) Pode-se escrever a área de um trapézio em função do seu afilamento e da corda raiz. Tendo o afilamento 𝜆 pré-definido encontra-se a corda raiz através de: 𝑐𝑟 = 2. 𝑆 𝑏. (1 + 𝜆) (5) A corda na ponta da asa, 𝑐𝑡, é obtida através do afilamento, que é descrito como: 𝜆= 𝑐𝑡 𝑐𝑟 ©Revista Ciência e Tecnologia, v. 18, n. 33, p. 9-15, jul./dez. 2015 - ISSN: 2236-6733 (6) A corda média aerodinâmica é obtida através da Equação 7 [11]: 𝑐= 2 1 + 𝜆 + 𝜆2 . 𝑐𝑟. ( ) 3 1+𝜆 (7) Após a obtenção inicial da geometria, emprega-se o software XFLR5, por meio do Vortex Lattice Method (VLM), de onde se obtêm novos valores para os coeficientes de sustentação 𝐶𝐿 , arrasto 𝐶𝐷 e momento 𝐶𝑀 para a asa finita. A partir das equações apresentadas anteriormente obtêm-se uma nova geometria, na qual é realizada uma análise tridimensional. V. RESULTADOS E DISCUSSÕES No projeto aerodinâmico há duas etapas principais, o estudo bidimensional, o qual se refere ao perfil, e o estudo tridimensional da asa [3]. Assim sendo, nesta seção apresentam-se as características aerodinâmicas que norteiam a análise bidimensional e a análise tridimensional. Como na fase do projeto conceitual deseja-se chegar a uma estimativa da carga máxima de voo que a asa é capaz de levantar, com base na similaridade do caso com os veículos apresentados na Tabela 1 fixa-se um intervalo de carga máxima de 600 kg a 1000 kg para ser analisado. As características metas apresentadas para geometria da asa são expressas na Tabela 2. Tabela 2 – Especificações Metas. Nº de passageiros Carga máxima de voo Razão de aspecto Envergadura Corda raiz Sistema modo solo Distância de decolagem 4 600 kg<m< 1000 kg 6< AR < 9 b<12 m cr< 2 m Inferior a 2,5 X6m Inferior a 300 m B. Seleção do perfil aerodinâmico da asa A. Características aerodinâmicas Os aerofólios reais, asas, possuem sustentação menor e arrasto maior que os encontrados para os perfis. Isso se deve aos vórtices gerados na borda de fuga da asa, que diminuem a sustentação devido à perda de diferença de pressão. Esse efeito é conhecido como arrasto induzido [10]. Devido ao fato da perda de sustentação ocorrer perto da ponta, pode-se utilizar de artifícios para diminuir tais efeitos, como utilizar uma alta razão de aspecto 𝜆 , conicidade, geometria afinada ou utilizar torção [4]. Embora a asa elíptica tenda a apresentar menor penalidade de arrasto sua construção é complexa, inviabilizando-a no presente trabalho. Já a asa de formato retangular é de construção simples, porém a geração de arrasto é bem superior na ponta. Dessa forma, no presente trabalho opta-se por adotar uma asa de geometria trapezoidal. Valores de afilamento na faixa de 0,45 garantem uma boa relação entre sustentação e arrasto [13]. No presente trabalho utiliza-se um afilamento 𝜆 = 0.56 [14]. Já a razão de aspecto AR possui valores consideráveis entre 6 e 9. Deve-se atentar que embora os efeitos do arrasto sejam menores para alto AR, as dimensões excessivas dificultam o projeto e geram um aumento de peso que pode não ser aceitável [9]. Para facilitar a forma construtiva do sistema responsável por recolher/abrir asas e não proporcionar problemas de trafegabilidade em solo é preferível que a envergadura não ultrapasse 12 m e a corda na raiz 2 m. Da mesma forma e baseado nas características dos carros voadores existentes, Tabela 1, espera-se que o sistema em solo não seja maior que 2,5 m de largura e 6 m de comprimento. Sendo a faixa de número de Reynolds obtida através da Equação 2, para dados fictícios de uma aeronave em voo de cruzeiro a 160 km/h e corda média do perfil de 1.5 m, assumindo que a densidade do ar 𝜌 na altura de cruzeiro possa ser aproximada a densidade ao nível do mar de 1,225 kg/m³, sendo a viscosidade do fluido 𝜇 de 1,7894 × 10−5 kg/ms e a velocidade do som a uma temperatura de 20ºC de aproximadamente 343 m/s, temse número de Reynolds aproximado de 4.564.000,00. Notando que geralmente em asas de aviões o fluxo se torna turbulento para número de Reynolds maiores que 1 × 107 . Em avaliação dos perfis NACA 4415, Clark Y, NACA 4412, NACA 2412 e NACA 65(2)-215 [12], obteve-se as curvas da variação do coeficiente de sustentação e arrasto com o ângulo de ataque, conforme Figuras 2 e 3. Figura 2 – Coeficiente de sustentação versus ângulo de ataque. Fonte: Autoria própria. ©Revista Ciência e Tecnologia, v. 18, n. 33, p. 9-15, jul./dez. 2015 - ISSN: 2236-6733 Figura 3 – Coeficiente de arrasto versus ângulo de ataque. A Tabela 3 apresenta estimativas geométricas para asa trapezoidal com a massa máxima variando e velocidade mínima variando dentro do range estabelecido, para uma razão de aspecto 𝐴𝑅 = 8 e afilamento 𝜆 = 0,56. Tabela 3 – Possíveis configurações geométricas para asas trapezoidais com 𝐴𝑅 = 8 e 𝜆 = 0,56. Velocidade Fonte: Autoria própria. Os coeficientes de sustentação 𝐶𝑙 , arrasto 𝐶𝑑 e momento 𝐶𝑚 de um aerofólio possibilitam inferir qual a eficiência na geração de forças de sustentação, arrasto e momento. Em síntese um perfil de alta eficiência detêm altos valores de coeficiente de sustentação e baixos valores de coeficiente de arrasto. Uma condição de interesse ao projeto é o coeficiente de sustentação máximo, visto que com o aumento do ângulo de ataque a sustentação no perfil tende a aumentar até um ponto onde se inicia uma queda rápida. Este fenômeno conhecido como estol, se deve a separação do escoamento no extradorso do perfil. Uma relação de grande importância é a relação entre a razão do coeficiente de sustentação e arrasto com o ângulo de ataque, o qual possibilita inferir a eficiência do perfil, ou seja, o ponto em que é gerada a maior sustentação com a menor penalização de arrasto. Através de uma análise cuidadosa dos gráficos exibidos anteriormente, e visando maximizar a geração de sustentação e minimizar a geração de arrasto, o perfil NACA 4415 foi selecionado, devido ao seu alto coeficiente de sustentação e ao seu baixo coeficiente de arrasto, além do fato de que este perfil garante segurança durante o voo, já que o ângulo de estol é extremamente elevado. C. Análise bidimensional Nesta subseção, utilizando as propriedades do perfil da asa selecionado anteriormente, faz-se estimativas da área alar, envergadura e corda para a asa. Tendo em vista uma asa que possibilite levantar uma carga entre 600 kg a 1000 kg, uma velocidade mínima de até 100 km/h, razão de aspecto mínima de 6 e conforme as propriedades de escoamento e perfil apresentado anteriormente, fez-se uma série de testes iniciais de possíveis geometrias que atendam as Equações 3, 4, 5 e 6. Deixa-se claro que em um primeiro momento não se levou em conta o efeito do ângulo de ataque induzido, pois o mesmo será analisado após se obter as dimensões aproximadas iniciais para asas trapezoidais. Área [m²] Envergadura [m] Corda raiz [m] Corda na ponta [m] Reynolds em cr Reynolds em ct 60 km/h 80 km/h 100 km/h Massa: 600 kg 20,00 11,25 7,20 12,65 2,02 9,48 1,52 7,59 1,21 1,13 0,85 0,68 2,313405×10⁶ 1,295507×10⁶ Massa: 800 kg 26,67 15,00 9,60 Área [m²] Envergadura [m] 14,60 10,95 8,76 Corda raiz [m] 2,34 1,75 1,40 Corda na ponta [m] 1,31 0,98 0,78 Reynolds em cr 2,671290×10⁶ Reynolds em ct 1,495922×10⁶ Massa: 1000 kg Área [m²] 33,34 18,75 12,00 Envergadura [m] 16,33 12,25 9,80 Corda raiz [m] 2,61 1,96 1,57 Corda na ponta [m] 1,46 1,09 0,87 Reynolds em cr 2,986593×10⁶ Reynolds em ct 1,672492×10⁶ A Tabela 3 representa possíveis grandezas, onde agora se mostra a importância do estudo dos parâmetros utilizados e dos resultados obtidos sobre a estrutura funcional total do veículo, para que se possa selecionar a melhor configuração. Baseado nas propriedades equilibradas e dentro da faixa de especificações da Tabela 2 seleciona-se o caso de asa trapezoidal de área de 15,00 m², corda na raiz de 1,75 m e corda na ponta de 0,98 m. A carga máxima de voo estipulada será de 800 kg a uma velocidade mínima de 80 km/h. D. Análise tridimensional Nesta seção faz-se novas estimativas para os coeficientes de sustentação e arrasto baseado em uma análise tridimensional da asa trapezoidal, e se obtêm as novas dimensões da asa. Utiliza-se como ponto de partida as propriedades de escoamento, do perfil e geometria apresentadas anteriormente. De onde se afere os novos coeficientes de sustentação e arrasto, e então se calcula a nova área da asa. ©Revista Ciência e Tecnologia, v. 18, n. 33, p. 9-15, jul./dez. 2015 - ISSN: 2236-6733 Faz-se isso para obter dimensões mais próximas as da realidade. Os valores para a nova curva de coeficiente de sustentação versus ângulo de ataque em comparação com o coeficiente de sustentação do perfil é expresso na Figura 4. Figura 5 – Ilustração da asa resultante. Figura 4 – Coeficiente de sustentação versus ângulo de ataque, para asa 3D e seu perfil. Fonte: Autoria própria. Para o novo valor de coeficiente de sustentação em ângulo de estol (𝐶𝐿 = 1.51) da asa, obtêm-se uma nova estimativa para área, envergadura, corda na raiz e na ponta, utiliza-se velocidade mínima de 80 km/h e massa máxima de 800 kg. A Tabela 4 mostra tais resultados. Fonte: Autoria própria. Tabela 4 – Configuração geométrica da asa trapezoidal. Massa Área Envergadura Corda raiz Corda na ponta Corda média aerodinâmica Razão de aspecto Afilamento 800 kg 17,31 m² 11,77 m 1,88 m 1,05 m 1,51 m 8 0,56 Os resultados obtidos para a geometria da asa representam o ponto de partida inicial, sendo que esta possivelmente será reavaliada ao longo do projeto. A ilustração da asa resultante efetuada no programa FreeCad é mostrada na Figura 5. VI. CONCLUSÕES Teve-se como ideia inicial obter as propriedades básicas de uma asa trapezoidal para servir de auxílio as fases iniciais do processo de desenvolvimento de um carro voador. Através da utilização do método numérico Vortex Lattice Method (VLM) empregado por meio do software XFLR5 e de princípios matemáticos simples foi possível chegar as características que não fogem as dos concorrentes, mostrando de certa forma a valia dos resultados. Influiu-se que o aumento da carga máxima de voo proporciona um aumento razoável das dimensões da asa. Podendo representar a necessidade de criar mecanismos mais sofisticados de abertura e fechamento de asas que os existentes. Dessa forma os resultados primários obtidos apontam para uma asa de geometria trapezoidal com área alar de 17,31 m², envergadura de 11,77 m e corda na raiz de 1,88 m, possuindo uma razão de aspecto de 8. ©Revista Ciência e Tecnologia, v. 18, n. 33, p. 9-15, jul./dez. 2015 - ISSN: 2236-6733 Os resultados apresentados possuem valia como auxílio no estudo da obtenção de características básicas da asa. Ressalva-se a necessidade de se fazer uma análise aerodinâmica mais efetiva, visto que a análise expressa é introdutória. Como sugestão para trabalhos futuros tem-se uma análise aerodinâmica mais apurada, valendo-se de técnicas de CFD, além da análise dos efeitos da fuselagem do veículo no escoamento. REFERÊNCIAS [1] BERG, P. Top 10 attempts to build a flying car. Disponível em: <http://www.popularmechanics.com/flight/howto/g803/top-10-attempts-to-build-a-flyngcar/?slide=2>. Acesso em: outubro 2015. [2] ROTHAMN, P. Carro voador é aprovado nos EUA. Editora Abril, 2010. 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