SAMIRA MARIA ACHKAR Imunopatologia da infecção rábica em camundongos geneticamente selecionados para máxima ou mínima reação inflamatória aguda Dissertação apresentada ao Programa de Pós-graduação em Ciências da Coordenadoria de Controle de Doenças da Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo, para obtenção do título de Mestre em Ciências. Área de Concentração: Pesquisas Laboratoriais Saúde Pública em Orientadora: Profª. DRª. Cleide Aschenbrenner Consales SÃO PAULO 2006 “É preciso amar as pessoas como se não houvesse amanhã...” Renato Russo DEDICATÓRIA Aos meus pais, Zakhour e Yára, por minha educação, dignidade e caráter! caráter! Aos meus irmãos Mônica, Eduardo, Ricardo e Leila, pela amizade e afeto, e por quem aqui declaro meu eterno amor! Aos meus Chady, sobrinhos Eduardo Amo vocês! e Dhunia, Fernanda. AGRADECIMENTOS À minha orientadora, Cleide Aschenbrenner Consales, pela demonstração de confiança e incentivo ao meu trabalho. À direção do Instituto Pasteur, em nome de Dra. Neide Yume Takaoka e Dra. Ivanete Kotait. À Dra. Maria Luiza Carrieri, por ter permitido a realização deste trabalho. À Dra. Zélia Maria Pinheiro Peixoto, pelo incentivo, desde o ínicio de minha carreira. Aos meus cunhados, Tony e Marisa, por sempre demonstrarem apoio e respeito ao meu trabalho. Aos amigos André Barreto Wilke, Aline Garcia Barbosa e Elpídio Ferreira, pela ajuda na revisão deste trabalho. A todos os meus amigos, pela paciência e amizade, especialmente à: Rosemary Gomes Souza, Karina Picirilli de Jesus, Alex Scartezini Carneiro, Andréa Liza Mazutti, Soraya Sliker, Nancy Marçal Bastos, Marina Suarez, Paulo Henrique Bertazzo, Rafael de Novaes Oliveira, Andréa de Cássia Rodrigues, Graciane Medeiros Caporalle, Luciana Botelho Chaves, Vera Lúcia Galvão, Alexandre Batista e Ana Helena Boamorte. A todos os funcionários e estagiários do Instituto Pasteur, especialmente à Gilberto Souza, Patrícia Januário, Karina da Silva, Dulce dos Santos, Maria S. Cavalcante, Maria Luiza de Souza, Maria Aparecida da Silva e Geralda Ribeiro Fraga. À Maria das Graças Silva, pela colaboração na revisão bibliográfica deste trabalho. Ao Prof. Dr. Idércio Luiz Sinhorini, por ter acreditado na proposta deste trabalho, enriquecendo-o com valiosas sugestões. Ao Dr. Orlando Ribeiro e Dra. Neusa Gallinas, da Seção de Raiva do Instituto Butantan, por terem cedido os animais utilizados nos experimentos. RESUMO ACHKAR, SM. Imunopatologia da infecção rábica em camundongos geneticamente selecionados para máxima ou mínima reação inflamatória aguda. [Immunopathologic in rabies infection in lines of mice selected for high or low acute inflammatory reaction]. 2006. Dissertação de Mestrado em Ciências, Coordenadoria de Controle de Doenças da Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo. A raiva é uma doença que apresenta sintomatologia clínica severa, além de ser altamente letal, entretanto, a resposta inflamatória é pouco evidenciada. Neste contexto, o objetivo deste estudo foi analisar os mecanismos imunopatológicos que ocorrem no Sistema Nervoso Central (SNC) durante a infecção rábica, utilizando como modelo experimental, linhagens de camundongos que apresentam resposta inflamatória aguda (Acute Inflammatory Reaction) máxima (AIRmax) e mínima (AIRmin). Foram utilizadas duas amostras, sendo uma de morcego hematófago (V3) e uma de vírus fixo (PV1 43/4). A titulação de anticorpos anti-rábicos e isótipos IgG1 e IgG2a foi feita por meio da técnica imunoenzimática (ELISA), demonstrando um discreto aumento na produção de IgG e do isótipo IgG1 nos animais infectados da linhagem AIRmax. O período de incubação, determinado por inoculações intracerebrais de suspensões virais contendo 100DL50, foi de 67 dias para a amostra PV1 43/4 e de 9-10 dias para a V3. A mortalidade foi de 100% para ambas as linhagens e não houve diferença quanto à replicação viral. A análise histopatológica de encéfalos e medulas dos camundongos infectados mostrou focos inflamatórios em todas as regiões do SNC, porém, não houve diferença significativa no número de neutrófilos. Corpúsculos de Negri foram observados em praticamente todas as regiões analisadas. Os resultados sugerem que a reação inflamatória aguda não é um fator determinante na infecção pelo vírus rábico. DESCRITORES: raiva, replicação viral, Sistema Nervoso Central/patologia, inflamação, isótipos da imunoglobulina. ABSTRACT ACHKAR, SM. Immunopathologic in rabies infection in lines of mice selected for high or low acute inflammatory reaction. [Imunopatologia da infecção rábica em camundongos geneticamente selecionados para máxima ou mínima reação inflamatória aguda]. 2006. Dissertação de Mestrado em Ciências – Coordenadoria de Controle de Doenças da Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo. Rabies infection is a severe and lethal disease that presents a slight inflammatory response during the infection process. We analyzed the immunopathological mechanisms that occur in the CNS (Central Nervous System) using two lines of mice genetically selected for maximal (AIRmax) or minimal (AIRmin) acute inflammatory reactivity. As viral samples, we adopted the antigenic variant 3 (AgV3) rabies virus from hematophagous bats and the PV1 43/4 fixed virus strain. Titration of specific antibodies was performed by Enzyme Immunosorbent Assay. We observed a slight increase in IgG and IgG1 isotype in the infected AIRmax mice. The incubation period determined by intracerebral inoculation with 100LD50 was 6-7 days for PV1 43/4 and 9-10 days for AgV3. No difference in viral replication was found between AIRmax and AIRmin mice. Mortality was 100% with both viral strains. Histopathological analysis of the brain and spinal cord tissues showed inflammatory foci in all CNS, however, no differences were observed in the number of neutrophils. Negri bodies were also observed in practically all sites analyzed. Taken together, our results suggest that the inflammatory reaction is not a determining factor in susceptibility to rabies infection. DESCRIPTORS: rabies, virus replication, Central System/pathology, inflammation, immunoglobulin isotypes. Nervous LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS ABLV “Australian Bat Lyssavirus” AIR Acute Inflammatory Reaction AIRmax Camundongos selecionados para máxima reatividade inflamatória aguda AIRmin Camundongos selecionados para mínima reatividade inflamatória aguda AV “Aravan Virus” BSA Bovine Serum Albumin CDC Centers for Desease Control and Prevention (USA) CVS Challenge Virus Standard DL50 Dose Letal 50% DUVV “DuvenhageVirus” EBL1 “European Bat Lyssavirus 1” EBL2 “European Bat Lyssavirus 2” ec encéfalo g grama HE Hematoxilina/Eosina IC Intracerebral IgE Imunoglobulina E IgG Imunoglobulina G IgG1 Isótipo 1 da imunoglobulina G IgG2a Isótipo 2 da imunoglobulina G IL Interleucina IM Intramuscular IV “Irkut Virus” K-S Kolmogorov-Smirnov KV “Khujand Virus” log logarítimo LBV “Lagos Bat Virus” Mab-N Anticorpo monoclonal anti-nucleocapsídeo md medula mg miligrama mL mililitro MOKV “Mokola Virus” N Normal NaOH Hidróxido de Sódio Ne Neutrófilos NIH National Institute of Health nm nanômetro OPAS Organização Pan Americana da Saúde PBS Phosphate Buffered Saline PCR Reação em cadeia pela Polimerase pH potencial hidrogênio-iônico PMN Polimorfonucleares PNPP P-nitrophenil-phosphatase disodium hexahydrate PV “Pasteur Virus” qsp quantidade suficiente para RABV Vírus clássico da Raiva RNA Ribonucleic Acid RNP Ribonucleoproteína s desvio padrão SNC Sistema Nervoso Central Th1 T helper type 1 Th2 T helper type 2 ThCD4+ T helper phenotype expression CD4+ V3 Variante 3 VERO Células de rim de macaco verde da África WCBV “West Caucasian Bat Virus” X Média aritmética ºC Graus Celsius % Porcentagem µ micra µg micrograma µL microlitro LISTA DE TABELAS Tabela 1 Relação interlinhagens entre médias e desvios-padrões, durante a replicação viral da amostra PV1 43/4 nos encéfalos e medulas. Tabela 2 Relação interlinhagens entre médias e desvios-padrões, durante a replicação viral da amostra V3 nos encéfalos e medulas. Tabela 3 Relação interlinhagens entre médias e desvios-padrões, durante titulação de IgG anti-rábica e isótipos IgG1 e IgG2a da amostra 59 59 64 PV1 43/4 no SNC Tabela 4 Relação interlinhagens entre médias e desvios-padrões, durante titulação de IgG anti-rábica e isótipos IgG1 e IgG2a da amostra V3 64 no SNC Tabela 5 Porcentagens de neutrófilos encontradas em encéfalos e medulas de camundongos infectados com as amostras PV1 43/4 e V3, em diferentes dias pós-infecção. 66 LISTA DE FIGURAS Figura 1 Cinética de replicação da amostra PV1 43/4 no SNC de camundongos AIRmax Figura 2 Cinética de replicação da amostra PV1 43/4 no SNC de camundongos AIRmin Figura 3 Cinética de replicação da amostra V3 no SNC de da amostra V3 no SNC de camundongos AIRmax Figura 4 Cinética de replicação camundongos AIRmin Figura 5 Título de anticorpos anti-rábicos e isótipos IgG1 e IgG2a após infecção com amostra PV1 43/4 em camundongos AIRmax, 57 57 58 58 62 determinados pelo método imunoenzimático ELISA Figura 6 Título de anticorpos anti-rábicos e isótipos IgG1 e IgG2a após infecção com amostra PV1 43/4 em camundongos AIRmin, 62 determinados pelo método imunoenzimático ELISA Figura 7 Título de anticorpos anti-rábicos e isótipos IgG1 e IgG2a após infecção com amostra V3 em camundongos AIRmax, 63 determinados pelo método imunoenzimático ELISA Figura 8 Título de anticorpos anti-rábicos e isótipos IgG1 e IgG2a após infecção com amostra V3 em camundongos AIRmin, 63 determinados pelo método imunoenzimático ELISA Figura 9 MAX controle negativo. Corte histológico de hipocampo 67 Figura10 MIN controle negativo. Corte histológico de hipocampo 67 Figura 11 MAX PV1 43/4. Corte histológico de hipocampo com grande 68 quantidade de neutrófilos Figura 12 MIN V3. Foco inflamatório com grande quantidade de 68 neutrófilos Figura 13 Corte histológico evidenciando Corpúsculos de Negri 69 Figura 14 Corte histológico de cortex, mostrando foco inflamatório com 69 aspecto linfocitário ÍNDICE 1 INTRODUÇÃO 25 2 OBJETIVOS 42 2.1 Objetivo geral 43 2.2 Objetivos específicos 44 3 MATERIAL E MÉTODOS 45 3.1 Animais 46 3.2 Amostras virais 46 3.3 Infecção 47 3.3.1 Determinação da DL50 47 3.3.2 Suscetibilidade à infecção 48 3.3.3 Replicação no SNC de camundongos AIRmax e AIRmin 48 3.3.4 Cinética de replicação viral 49 3.4 Titulação de anticorpos 49 3.4.1 Determinação dos títulos de anticorpos 49 3.4.2 Determinação dos títulos dos isótipos IgG1 e IgG2a 50 3.5 Estudo histopatológico 51 3.6 Análise estatística 52 4 RESULTADOS 54 4.1 Infecção viral 55 4.1.1 Determinação da DL50 55 4.1.2 Determinação da suscetibilidade 55 4.1.3 Cinética da replicação viral 55 4.2 Titulação de anticorpos IgG e isótipos IgG1 e IgG2a 60 4.3 Estudo histopatológico 65 5 DISCUSSÃO 70 6 CONCLUSÕES 77 7 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 79 ANEXOS 24 INTRODUÇÃO 1 INTRODUÇÃO Por diversos aspectos a raiva é considerada a mais importante antropozoonose, pois: apresenta letalidade de 100%, representa um alto custo na assistência a indivíduos expostos, seus reservatórios são particularmente eficientes na manutenção e disseminação do vírus e, mesmo com todos os subsídios existentes e o advento da vacina anti-rábica, ainda é um grave problema em Saúde Pública. É, provavelmente, a zoonose conhecida mais antiga, datando do século XXII a.C., tendo citações no Código de Eshunna, escrito na Mesopotâmia (STEELE, 1975). Em 1804, iniciou a denominada Era pré-Pasteuriana, quando Zinke comprovou a infecção a partir da saliva de cães raivosos. Já em 1813, Gruner e Salm constataram a presença de vírus na saliva de herbívoros e, só em 1821, Magendie e Brescher evidenciaram a infecção na saliva de humanos. Em 1879, a infecção em coelhos foi demonstrada por Galtier e Duboué, que confirmaram os primeiros relatos sobre a patogenia da doença (GALTIER, 1881). A Era Pasteuriana iniciou em 1881, ano em que os primeiros informes sobre a doença foram feitos. Deu-se início à utilização do sistema nervoso de animais para o estudo da raiva e ocorreu o primeiro experimento para atenuação do vírus. Em 1882, Louis Pasteur isolou a amostra PV (Pasteur virus) de uma vaca contaminada e em 1885, obteve o vírus “fixo” e a primeira vacina. Pasteur confirmou que apenas o Sistema Nervoso Central (SNC) era alvo do processo infeccioso, após desafiar alguns cães com 26 inoculações de suspensões virais via intracerebral (IC), conseguiu imunizálos, através de inoculações subcutâneas de uma suspensão de vírus atenuado preparada a partir de medulas de coelhos infectados. No mesmo ano, este tratamento profilático foi aplicado em humanos. Pasteur testou a primeira vacina em um garoto, vítima de graves mordeduras de um cão raivoso, aplicando treze injeções de uma suspensão de vírus atenuado, livrando-o da doença. Assim, o êxito da vacina foi alcançado, mesmo sem se conhecer maiores detalhes acerca das propriedades do agente etiológico (PASTEUR, 1885). A raiva é transmitida por um vírus neurotrópico pertencente à ordem Mononegavirales, que é constituída por quatro famílias: Paramyxoviridae, Bornaviridae, Filoviridae e Rhabdoviridae. A família Rhabdoviridae está dividida em seis gêneros, dos quais apenas três causam infecções em mamíferos: o gênero Ephemerovirus, tendo como representante o vírus da febre efêmera bovina; o gênero Vesiculovirus, ao qual se incluem os vírus que causam a estomatite vesicular e vírus relacionados, e o gênero Lyssavirus, dentro do qual se incluem o vírus rábico e os vírus “aparentados” (VAN REGENMORTEL et al., 2000). O vírus rábico possui uma fita simples de ácido nucléico (RNA), não segmentado e tem sentido negativo (3`→ 5`), característica esta dos Mononegavirales. Assim, o RNA serve como molde para uma transcrição autônoma, o que originará moléculas complementares do RNA (sentido positivo), as quais serão traduzidas em novas partículas virais. Possui simetria helicoidal, com uma extremidade arredondada e outra plana, e envoltório lipoprotéico. Seu capsídeo tem forma de projétil e suas dimensões 27 são, em média, de 75 nm de diâmetro por 200 nm de comprimento (VAN REGENMORTEL et al., 2000). Dois elementos estruturais principais constituem o vírus rábico: a ribonucleoproteína (RNP) e o envelope viral, derivado de células hospedeiras durante o brotamento e composto por uma bicamada lipídica, a qual envolve a RNP. O genoma completo é composto por 11932 pb, que codificam as cinco seqüências genômicas responsáveis pela tradução das cinco proteínas que constituem o vírus. São eles: gene N, responsável pela tradução da nucleoproteína N, a qual contém 1750 pb e envolve o genoma viral e tem papel importante na encapsidação (TORDO et al., 1986). A nucleoproteína é produzida em abundância durante a replicação, além de ser o maior componente estrutural do vírus e a maior proteína do complexo helicoidal (WUNNER, 2002). gene P, responsável pela produção da fosfoproteína (P, M1 ou NS), que é constituída por 950 pb e é multifuncional, sendo importante na replicação viral (LAFON & WIKTOR, 1985), além de estar associada à proteína L; gene L, responsável pela produção da proteína L, constituída de 20 a 150 pb. É importante nas atividades enzimáticas necessárias para a tradução de uma polimerase para a síntese do RNA (TORDO et al., 1988; RUPPRECHT et al., 2002). 28 gene M, responsável pela produção da proteína matriz M, que tem 1650 pb e interliga o envelope ao nucleocapsídeo. Por ter papel multifuncional, ou seja, interage com as proteínas virais e com os componentes protéicos da membrana celular, é importante na regulação da replicação viral (DELAGNEAU et al., 1981); gene G, responsável pela produção da glicoproteína G, que contém 1800 pb e é transmembranária e está intimamente relacionada com a indução de anticorpos neutralizantes em indivíduos imunizados, além de servir de receptor na superfície viral e como sítio de ligação de anticorpos (COX et al., 1987). Os lissavírus são sorologicamente distintos dos outros rabdovírus. A característica biológica de muitos deles é que, no primeiro isolamento em animais, eles manifestam um período de incubação longo e, após sucessivas passagens, esse período torna-se mais curto e com duração fixa (WHO, 1992). O vírus da raiva era caracterizado como uma única unidade antigênica, entretanto, a partir da década de 80, diversos estudos sorológicos e antigênicos foram feitos, principalmente com o uso de anticorpos monoclonais anti-nucleocapsídeo (Mab-N) e da técnica de reação em cadeia pela polimerase (PCR). O gene N (gene mais conservado) de setenta amostras de vírus rábicos e vírus relacionados, provenientes de quarenta países, foi analisado para a construção de uma árvore filogenética. Neste contexto, foram definidas as distribuições temporal e geográfica das amostras em estudo, além de serem estabelecidas as espécies que servem 29 de reservatório para os vírus. A partir disto, foram classificados sete diferentes genótipos do vírus (GOULD et al., 1998), os quais foram divididos em dois filogrupos. O primeiro constituído de cinco genótipos: genótipo 1: vírus clássico da raiva (RABV), correspondente ao vírus rábico encontrado nas Américas, tendo a maior distribuição no mundo, fato que o leva a ser o mais importante epidemiologicamente, estando associado ao maior número de casos. Este sorotipo inclui outros vírus fixos e vírus de “rua” anteriormente isolados de cães, gatos e herbívoros entre os animais domésticos, e de animais silvestres como raposas, gambás, guaxinins e morcegos frugívoros, insetívoros e hematófagos (VELASCO-VILLA et al., 2002); genótipo 4: Duvenhage Virus (DUVV), isolado primeiramente em 1970 de um homem em Warmbaths, no sul da África, infectado por um morcego insetívoro (VELASCO-VILLA et al., 2002); e posteriormente de morcegos insetívoros (Miniopterus schreibersii e Nycteris thebaica) no Zimbabwe e África do Sul (MEREDITH et al., 1971; BINGHAM, 2001); genótipo 5: European Bat Lyssavirus (EBL-1), constituído de isolamentos feitos de morcegos insetívoros do gênero Eptesicus (WHO, 1994); genótipo 6: European Bat Lyssavirus (EBL-2), a partir de isolamentos de morcegos insetívoros do gênero Myotis (WHO, 1994; KING, 2001; POUNDER, 2003); 30 genótipo 7: Australian Bat Lyssavirus (ABLV), isolado de morcegos frugívoros (Pteropus alecto) da costa leste da Austrália em 1996 (VAN REGENMORTEL et al., 2000; GOULD et al., 1998; POUNDER, 2003; TORDO et al., 1998). Ressalta-se que a Austrália foi considerada como sendo um país livre da raiva desde 1867. O segundo filogrupo é constituido por dois genótipos: genótipo 2: Lagos Bat Virus (LBV), descoberto em 1956 na ilha de Lagos, na Nigéria, isolado a partir de inoculação de um “pool” de tecido cerebral e glândulas salivares de um morcego frugívoro (Eidolon helvum) (KEMP et al., 1972); genótipo 3: Mokola Virus (MOKV), isolado em 1968 a partir do “pool” de órgãos de um mussaranho na Nigéria (TORDO et al., 1998), sendo este o único lissavírus que não foi isolado em morcegos. Posteriormente, foram feitos isolamentos em humanos na Nigéria e em felinos na Etiópia e no Zimbabwe (KEMP et al., 1972; NEL, 2001). Além destes sete genótipos, mais quatro variantes foram propostas como membros do gênero Lyssavirus: Aravan Virus (AV), isolado de um morcego insetívoro (Myotis blythi), em 1991, na região do Kyrgyztan, Ásia Central (ARAI et al., 2003; KUZMIN et al., 2003); Khujand Virus (KV), isolado de um morcego insetívoro (Myotis mystacinus), em 2001, na região do Tajikistan, Ásia Central (KUZMIN et al., 2001); Irkut Virus (IV), isolado de um morcego insetívoro (Murina leucogaster), em 2002, na cidade de Irkutsk, Sibéria e West Caucasian Bat Virus (WCBV), isolado de um morcego 31 insetívoro (Miniopterus schreibersi), em 2002, na Rússia (BOTVINKIN et al., 2003; KUZMIN et al., 2003). A raiva é uma doença cíclica que é mantida por um hospedeiro principal, fator este dependente da área geográfica. Dentre os mamíferos suscetíveis, os das ordens Carnivora e Chiroptera são os principais reservatórios. O animal doente é a fonte de infecção, o qual transmite o vírus por contato com eventuais ferimentos ou mucosas, através de lambeduras, arranhaduras e/ou mordeduras; sendo esta última a maneira mais comum de transmissão e de especial importância epidemiológica, pois possibilita uma nova infecção. O vírus pode infectar o suscetível através do contato com mucosas, como olhos, nariz e boca. A transmissão através da inalação de aerossóis foi confirmada em cavernas densamente povoadas por morcegos infectados e em acidentes laboratoriais (CONSTANTINE, 1962). A transmissão oral também pode ocorrer através do manuseio ou consumo de carcaças contaminadas (KUREISHI et al., 1992; TARIQ et al., 1991) ou através de transplantes de órgãos (CDC, 1977; JACKSON, 2005). Na literatura são descritos oito casos de transmissão inter-humana, através de transplantes de córnea de doadores infectados (JAVADI et al., 1996). Na Ásia, ocorrem de 30 a 55 mil casos humanos de raiva, anualmente, sendo que cerca de 7 milhões de indivíduos recebem tratamento contra a doença. Na África, o número de tratamentos profiláticos anuais é de aproximadamente 500 mil, e o número estimado de óbitos, de 5 a 15 mil. Na Europa e América do Norte, os casos não chegam a 50 por ano 32 e o número de tratamentos atinge 100 mil (BELOTTO et al., 2005). Na América Latina, estima-se que a média de número de casos é de 40 por ano e o número de tratamentos, 500 mil. A distribuição da raiva animal é variável, de acordo com a região e a espécie afetada, podendo existir áreas livres e áreas endêmicas ou não, apresentando-se em alguns períodos de forma epizoótica. Em países subdesenvolvidos da Ásia, da África e da América Latina, existe um predomínio da raiva canina, e na América do Norte e Europa, os animais silvestres são os principais reservatórios. No Brasil, as médias anuais de casos de raiva humana notificados têm oscilado, sendo 10 casos em 2002, 17 em 2003, 29 em 2004 e 45 em 2005. Até 2003, o cão era a principal espécie transmissora, sendo que a partir de 2004, os morcegos hematófagos tornaram-se os principais transmissores no Brasil e na América Latina (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2005). Os morcegos habitam praticamente todo o globo, com exceção da Antártica e algumas ilhas remotas, representando aproximadamente 24% das espécies de mamíferos conhecidas (McCOLL et al., 2000). Pertencem à ordem Chiroptera, a qual é constituída por 18 famílias, que se distribuem em 168 gêneros e mais de 1000 espécies (TADDEI, 1996). No Brasil, existem aproximadamente 144 espécies de morcegos, distribuídas em nove famílias. A família Phyllostomidae é constituída de 82 espécies, das quais apenas três são hematófagas: Dyphilla ecaudata, Diaemus yungii e Desmodus rotundus. Esta última habita apenas algumas regiões do Caribe e da América Latina. 33 Quanto à distribuição da raiva em quirópteros, todas as espécies, hematófagas ou não, podem transmitir o vírus, entretanto, a que tem maior importância epidemiológica é a Desmodus rotundus, pois estes animais se alimentam preferencialmente de sangue de mamíferos, o que compromete a sanidade dos animais de interesse econômico. A circulação do vírus em colônias de morcegos não hematófagos tem sido demonstrada através do isolamento da variante 3 (V3) de Desmodus rotundus nesses animais, sugerindo a atuação dos mesmos como “sentinelas” para orientar o controle da doença nos animais domésticos (CARRIERI et al., 2001), bem como de outras variantes próprias de morcegos insetívoros. Dentre os 7 genótipos do gênero Lyssavirus, 6 (1, 2, 4, 5, 6 e 7) têm os quirópteros como hospedeiros principais (TORDO et al., 1996). Outro fator relevante é a indistinção do aparecimento da doença nestes animais em relação à localidade, representando assim um problema emergente de Saúde Pública, além do fato dos morcegos serem animais extremamente versáteis, a ponto de se adaptarem às áreas urbanas a procura de alimento, devido à perda do habitat natural, expandindo, desta maneira, a distribuição da enfermidade. O perfil epidemiológico da raiva no Estado de São Paulo teve uma mudança, com a diminuição de casos em cães e um aumento do número de casos em morcegos, o que consequentemente refletiu na disseminação do vírus em herbívoros e outros animais domésticos. Outro fator importante é o constante isolamento da V3 como resultado de estudos antigênicos das amostras isoladas de cães, gatos, herbívoros e outras espécies de 34 morcegos, o que confirma a presença do morcego hematófago em áreas urbanas e a circulação do vírus no ciclo aéreo (CARRIERI et al., 2001). Esta mudança no perfil epidemiológico da raiva, em que houve uma diminuição dos casos humanos transmitidos por cães e um aumento da transmissão por morcegos, requer uma investigação epidemiológica efetiva já que fatores como: ter hábito noturno, ter maior abrangência geográfica através do vôo e ser versátil à adaptação de novos abrigos, são extremamente vantajosos para que estes animais se proliferem e, consequentemente, disseminem a doença quando o vírus estiver circulante na colônia. Animais de laboratório infectados, experimentalmente, com o vírus rábico morrem após apresentarem, por um período de tempo variável, sintomas clínicos de comprometimento neurológico. A taxa de mortalidade varia segundo a linhagem de animal empregada, idade, via de inoculação e dose infectante do vírus (PERL, 1975). Um dos aspectos surpreendentes da imunopatologia da raiva é a baixa resposta inflamatória no SNC, em contraste com outras infecções virais, em que a inflamação pode ser a maior característica do quadro patológico. A resposta imune, que ocorre durante a infecção rábica, é particular, devido ao SNC ser um sítio imunoprivilegiado, baseado principalmente na restrição da migração de células T e na ausência de células apresentadoras de antígeno específicas, indicando que a existência de um estado imune é menos expresso neste órgão (BAER & YANGER, 1977). Isso ocorre devido à imparidade na circulação cerebral, caracterizada 35 pela barreira hematoencefálica, a qual previne o escape de células em determinadas regiões consequentemente, o do SNC, restringindo desenvolvimento de uma a diapedese reação e inflamatória (MEDAWAR, 1948). Após a infecção experimental por via IC, o vírus rábico pode ser encontrado em altas concentrações no SNC, sem causar grandes modificações histopatológicas. A ocorrência de neurônios picnóticos e modesta infiltração de células inflamatórias perivasculares e subaraquinóides, são as principais observações patológicas em cortes de cérebros infectados e corados pela técnica de Hematoxilina/Eosina (HE). Os Corpúsculos de Negri podem ser reconhecidos nos neurônios infectados quando há preservação do tecido. São massas citoplasmáticas refringentes acidófilas, que podem ser redondas ou ovais, com dimensões de 1 a 20 µ (PERL, 1975). Alguns estudos demonstram o encontro do antígeno rábico em células ependimais de animais inoculados, por via IC, com altas doses infectantes de vírus rábico fixo (JACKSON & REIMER, 1989). Outros estudos têm sugerido que, muitas descrições clínicas de condensação da cromatina em neurônios infectados, podem refletir um processo de apoptose (BOJA et al., 1993; JACKSON & ROSSITER, 1997; JACKSON & PARK, 1998; JACKSON, 1999). Apesar de várias hipóteses apresentadas na literatura, a base fundamental da disfunção neuronal na infecção rábica ainda não foi determinada. Vários aspectos da patogenia da raiva são particularmente 36 importantes, em vista dos mecanismos imunológicos que podem limitar a infecção. A resposta inflamatória é representada por um conjunto de alterações morfológicas e bioquímicas desencadeadas por diversos estímulos e tem como objetivo, recompor a homeostase do tecido injuriado. Para tanto, uma série de eventos se sucede, envolvendo a ação de células fagocitárias, sistema complemento, sistema de coagulação, dentre outros (GALLIN et al., 1988). Outro mecanismo de proteção dotado de especificidade e memória é operado pelo sistema imunológico, com a participação de células imunocompetentes, anticorpos e outros fatores solúveis. A resposta inflamatória e a imune específica estão intimamente relacionadas. A resposta específica pode mobilizar uma reação inflamatória que ocasionalmente, pode ser exacerbada ou destrutiva. Por outro lado, a inflamação pode ser moduladora, aumentando ou diminuindo as reações específicas do hospedeiro. Algumas das células envolvidas na resposta inflamatória são células residentes do tecido conjuntivo: mastócitos e fagócitos mononucleares teciduais. Outras células chegam à área injuriada através da corrente sanguínea: polimorfonucleares (neutrófilos, eosinófilos e basófilos) e as células mononucleares (monócitos e linfócitos). Estas células passam do espaço intravascular para a matriz extracelular, atravessando a barreira 37 de células endoteliais, por mecanismos de adesão e de diapedese (GALLIN et al., 1988). Os neutrófilos, dentre os polimorfonucleares, são componentes predominantes da resposta inflamatória aguda e a primeira linha de defesa contra diferentes infecções. São leucócitos produzidos na medula óssea e, a sua principal função fisiológica é a destruição de microorganismos. Os neutrófilos maduros são células altamente móveis, e respondem a uma variedade de estímulos quimiotáticos específicos, pois possuem moléculas de aderência na superfície. Eles internalizam microorganismos pelo processo conhecido por fagocitose e possuem inúmeros grânulos que contém peptídeos antimicrobianos e enzimas oxidativas, que participam da destruição dos microorganismos internalizados. Os receptores de superfície identificam sinalizações do meio ambiente de onde se encontram. Estes sinais extracelulares são traduzidos em mensagens intracelulares que induzem: mobilidade, aderência, fagocitose, degranulação e produção de superóxidos. (BAGGIOLINI, 1980). O extravasamento do plasma, um fator crucial na inflamação, não é, necessariamente, um processo nocivo; ele pode desempenhar um papel importante na defesa do organismo. O plasma pode carrear fatores hormonais que promovem a migração para o local da injúria, e ser drenado do espaço extracelular, estimulando o sistema linfático. Os vasos linfáticos vão desembocar nos linfonodos regionais ou tecidos linfóides, onde uma resposta imune pode ser iniciada (CALICH & VAZ, 2001; ABBAS et al., 2000). 38 Os linfócitos T auxiliares (ThCD4+), após estimulação antigênica, e dependendo das interleucinas predominantes no microambiente, podem diferenciar-se em subpopulações, com perfis distintos de produção de citocinas. As células Th1 estão envolvidas com a resposta imune celular e as células Th2, auxiliam os linfócitos B na produção de anticorpos (CALICH & VAZ, 2001; ABBAS et al., 2000). As citocinas secretadas pelos dois tipos de linfócitos TCD4+ podem regular o “switching” (inversão) e a expressão de isótipos de imunoglobulinas IgG, em que Th1 regula o “switching” para IgG2a e Th2 para IgG1 e IgE. As citocinas produzidas por linfócitos Th1 e Th2 agem de forma antagonística, estabelecendo uma regulação mútua, isto é, uma subpopulação que é capaz de regular as funções da outra. Os mecanismos que determinam se uma resposta será predominantemente do tipo Th1 ou Th2 ainda não estão bem esclarecidos. Apesar da proteção contra a raiva ser avaliada através da presença de anticorpos neutralizantes, induzidos pela imunização pré ou pós-exposição, a resposta mediada por células tem um papel importante na imunidade contra esta infecção (ROIT et al., 2003; SIVEKE & HAMANN, 1998; ROMAGNANI, 1992). Um modelo introduzido por Biozzi e colaboradores, na década de sessenta, utiliza linhagens de camundongos bons e maus respondedores de anticorpos aos imunógenos naturais complexos, administrados em doses ótimas imunogênicas; nestas condições, a fase de reconhecimento de epítopos imunodominantes é restritiva. Estas linhagens foram obtidas por cruzamentos seletivos bidirecionais, a partir de populações geneticamente 39 heterogêneas, tendo como caráter fenotípico selecionador a produção máxima e mínima de anticorpos (BIOZZI et al., 1979; BIOZZI et al., 1980). Diferentes estudos de interação vírus rábico-hospedeiro têm sido desenvolvidos, utilizando as diferentes seleções independentes desenvolvidas do trabalho conjunto entre os laboratórios de Imunogenética do Instituto Curie de Paris e do Instituto Butantan de São Paulo (NILSSON et al., 1979; CONSALES et al., 1990; De FRANCO et al., 1996). Um novo processo de Seleção Genética Bidirecional para obtenção de linhagens de camundongos para alta (AIRmax) e baixa (AIRmin) resposta inflamatória aguda (AIR – Acute Inflammatory Reaction) foi desenvolvido por estímulo com Biogel. O processo seletivo foi iniciado a partir de uma população F0, geneticamente heterogênea, resultante do cruzamento equilibrado de oito linhagens isogênicas, sendo: A/J, BALB/cJ, CBA/J, C57BI/6J, DBA2/J, SJL/J, SWR/J e P/J, e desenvolveu-se nas sucessivas gerações, pela escolha de casais com fenótipos extremos, com base na determinação da concentração protéica e do número de leucócitos, três dias após injeção subcutânea de partículas não imunogênicas e não biodegradáveis de Biogel (microesferas de poliacrilamida). A partir da F17, pôde-se chegar à população ideal, ou seja, animais que atingiram a homozigose para a inflamação. Neste contexto, a principal característica fenotípica selecionada foi a habilidade, destas linhagens de recrutarem leucócitos polimorfonucleares ao foco inflamatório (STIFFEL et al., 1987; STIFFEL et al., 1990; IBAÑES et al., 1992). 40 A caracterização do conteúdo celular presente no exsudato inflamatório dos animais da AIR foi realizada através da técnica de citometria de fluxo. Os resultados revelaram que, devido ao fato do exsudato presente na linhagem AIRmax ser mais atrativo para propriedades quimiotáticas e hematopoiéticas, eles apresentam um maior número de PMN e de proteínas, além da atividade da medula óssea ser maior, pois estes animais apresentam maior quantidade de precursores celulares a partir deste órgão. Entretanto, as duas linhagens apresentaram mesmo nível de expressão de moléculas de adesão e do processo de fagocitose. Os animais AIRmIn apresentaram maior propensão a apoptose espontânea dos neutrófilos (RIBEIRO et al., 2003). Em vista da grande diferença quanto à reatividade inflamatória aguda, estas linhagens selecionadas representam um modelo original para o estudo dos possíveis mecanismos imunopatológicos que ocorrem no SNC durante a infecção rábica. 41 OBJETIVOS 2 OBJETIVOS 2.1 Objeti vo geral Analisar comparativamente, nas linhagens de camundongos para máxima (AIRmax) e mínima (AIRmin) resposta inflamatória aguda, os possíveis mecanismos imunopatológicos envolvidos na infecção rábica. 43 2.2 Objetivos específicos Analisar a cinética de replicação das amostras de vírus fixo PV1 43/4 e da variante 3 (V3) isolada de morcego Desmodus rotundus; Avaliar os anticorpos anti-rábicos IgG e dos isótipos IgG1 e IgG2a, durante a cinética de replicação viral; Analisar a presença de focos inflamatórios e de Corpúsculos de Negri no SNC, durante a cinética de replicação viral. 44 MATERIAL E MÉTODOS 3 MATERIAL E MÉTODOS 3.1 Animais Foram utilizados grupos de camundongos, machos e fêmeas, de 6 a 8 semanas de idade, das linhagens com reatividade inflamatória aguda de máxima e mínima intensidade, provenientes das gerações F38 e F39, cedidos pelo Laboratório de Imunogenética do Instituto Butantan; camundongos heterogêneos machos e fêmeas, de 11 a 14g N:NIH, do Biotério Central do Instituto Butantan e camundongos heterogêneos albinos suíços, machos e fêmeas, de 11 a 14g e lactentes, do Biotério do Instituto Pasteur de São Paulo. 3.2 Amostras virais Vírus rábico fixo PV inativado, produzido em células VERO (células de rim de macaco verde da África), lote 06/03, com título de 106.0 DL50/0.03mL, cedido pela Seção de Raiva do Instituto Butantan. Vírus rábico fixo PV1 43/4, suspensão a 20% de cérebro de camundongo, liofilizado e diluído em tampão PBS/BSA a 0.075% 0,01M, com título de 105.67 DL50/0.03 mL, cedido pela Seção de Raiva do Instituto Butantan. 46 Amostra 1957-M/2001, isolada de morcego hematófago (Desmodus rotundus), procedente da área rural do município de Tapiratiba, São Paulo e caracterizada no Instituto Pasteur de São Paulo, como variante 3 (V3), através da técnica de imunofluorescência indireta, utilizando o painel de anticorpos monoclonais anti-nucleocapsídeo viral, produzido pelo CDC, Atlanta - USA, referencial definido pela OPAS para a tipificação antigênica de amostras de vírus rábico isoladas nas Américas. A suspensão preparada a partir de cérebros de camundongos lactentes após duas passagens, apresentou título de 10 4,25 DL50/0.03 mL. 3.3 Infecção 3.3.1 Determinação da DL50 A dose letal 50% (DL50) ideal para cada uma das amostras do vírus rábico, foi previamente determinada na Seção de Raiva do Instituto Butantan, em camundongos heterogêneos N:NIH e nas linhagens AIRmax e AIRmin, no Instituto Pasteur. A DL50 foi calculada pelo método de Reed & Muench (REED & MUENCH, 1938), sendo a dose de 100DL50, considerada ideal para ambas as amostras virais. 47 3.3.2 Suscetibilidade dos camundongos das linhagens AIRmax e AIRmin, à infecção com as amostras do vírus rábico Camundongos das linhagens AIRmax e AIRmin foram inoculados por via IC com 30µL das suspensões, contendo 100DL50 dos vírus PV1 43/4 e V3. Os animais foram observados por 30 dias, anotando-se diariamente a mortalidade. O tempo médio de sobrevida, para as duas linhagens, foi calculado em função da média de mortalidade ocorrida após a infecção. 3.3.3 Replicação das amostras do vírus rábico no SNC de camundongos AIRmax e AIRmin Grupos de 30 camundongos AIRmax e AIRmin foram infectados com 30µL das amostras virais, contendo 100DL50. Os animais foram anestesiados, sangrados por punção do plexo retro-orbital e eutanasiados para posterior colheita dos cérebros, nos dias 3, 4, 5, 6 e 7 pós-infecção com a amostra de vírus PV1 43/4 e nos dias 6, 7, 8, 9 e 10 com a V3. Os encéfalos e medulas foram acondicionados em nitrogênio líquido, para a determinação da cinética de replicação viral e estudo da histopatologia da infecção e os soros foram acondicionados a -20ºC, para a titulação de anticorpos anti-rábicos IgG e dos isótipos IgG1 e IgG2a. 48 3.3.4 Cinética de replicação viral determinada em camundongos heterogêneos albinos suíços A partir dos encéfalos e medulas dos camundongos AIRmax e AIRmin acondicionados em nitrogênio líquido, para cada amostra viral e para cada dia pós-infecção, foi realizado um “pool” de três amostras e preparadas suspensões a 20% (peso/volume) em tampão PBS/BSA 0,075% 0,01M. Grupos de 10 camundongos heterogêneos albinos suíços, com 11 a 14 g, foram inoculados por via IC com 30µL de cada uma das suspensões virais diluídas na razão 10 (10-1 a 10-5). Os animais foram observados diariamente, sendo avaliada a progressão da doença, e o título viral determinado através do método de Reed & Muench. 3.4 Titulação de anticorpos 3.4.1 Determinação dos títulos de anticorpos anti-rábicos durante o estudo da cinética de replicação viral Os soros dos camundongos AIRmax e AIRmin infectados e acondicionados a temperatura de -20°C, conforme descrito no item 3.3.3, foram descongelados e submetidos ao preparo de um “pool”, a partir de três amostras de soros para cada um dos dias pós-infecção. Os títulos de IgG foram calculados pela técnica imunoenzimática (CONSALES, 1999). 49 (ELISA) clássico Microplacas foram sensibilizadas com 50µL/orifício do vírus rábico PV lote 06/03, na concentração 1,25µg/mL em PBS pH 7.4 0,01M e incubadas a 4°C por 18 horas. Após incubação, as microplacas foram lavadas com PBS Tween 20, por cinco vezes, e os sítios livres, bloqueados com 200µL de PBS-gelatina a 1% e então incubadas à temperatura ambiente por três horas. Após este período e a cada etapa da reação, foram realizadas lavagens como mencionado acima, e a seguir, adicionados 50µL das amostras de soros e dos controles positivo e negativo, em duplicata, diluídos na razão 2. As microplacas foram incubadas a 4°C por 18 horas. A seguir, foram adicionados 50µL de anticorpo de cabra anti-IgG total de camundongo, conjugado à fosfatase alcalina, diluído a 1:10000 em PBS gelatina 0,1%. Após 1 hora de incubação à temperatura ambiente, foram adicionados 50µL do substrato P-nitrophenil-phosphatase disodium hexahydrate, diluído em tampão dietanolamina pH 9.8 na concentração de 1mg/mL. Após 30 minutos, a reação foi interrompida com solução de hidróxido de sódio 1N, e a densidade óptica, determinada em leitor de ELISA. A absorbância específica igual ou maior a 0,150 foi considerada como reação positiva. Os títulos de anticorpos anti-rábicos foram expressos como log2 da recíproca da maior diluição dos soros. 3.4.2 Determinação dos títulos dos isótipos IgG1 e IgG2a anti-rábicos, durante o estudo da cinética de replicação viral. Os títulos dos isótipos IgG1 e IgG2a foram determinados através do método imunoenzimático (ELISA) de captura (CONSALES, 1999). Microplacas foram sensibilizadas com 50µL/orifício do vírus rábico PV/VERO 50 06/03, na concentração de 1,25µg/mL e incubadas à 4°C por 18 horas. Após incubação, as microplacas foram lavadas com PBS Tween 20 por cinco vezes, e os sítios livres, bloqueados com 200µL de PBS-gelatina 1%, para posterior incubação à temperatura ambiente por três horas. Após este período e a cada etapa da reação, foram realizadas lavagens, como anteriormente mencionado e, a seguir, adicionados 50µl das amostras de soros e dos controles positivo e negativo em duplicata, diluídos na razão 2. As microplacas foram mantidas à 4°C por 18 horas. A seguir, foram adicionados 50µl dos anticorpos monoclonais biotinilados anti IgG1 e anti IgG2a de camundongo, na concentração de 8µg/mL e as microplacas mantidas a temperatura ambiente, por uma hora. Posteriormente, foram adicionados 50µL de avidina conjugada à fosfatase alcalina, na diluição de 1:10000 em PBS-gelatina 0,1% e, após uma hora de incubação à temperatura ambiente, foram adicionados 50µL do substrato P-nitrophenilphosphatase disodium hexahydrate diluído em tampão dietanolamina pH 9.8, na concentração de 1mg/mL. Após 30 minutos, a reação foi interrompida com solução de hidróxido de sódio 1N e a densidade óptica determinada em leitor de ELISA. A absorbância específica igual ou maior a 0,150 foi considerada como reação positiva. Os títulos de anticorpos dos isótipos IgG1 e IgG2a foram expressos como log2 da recíproca da maior diluição dos soros. 3.5 Estudo histopatológico Os encéfalos e medulas, conforme descrito no item 3.3.3, foram retirados do nitrogênio líquido, colocados separadamente em 10mL de fixador Karnowsky e a seguir, desidratados e incluídos em parafina. Cada 51 amostra foi submetida a cortes histológicos aleatórios, de 5µ de espessura, para confecção das lâminas, as quais foram coradas pela técnica de Hematoxilina-Eosina (HE), para a detecção de detalhes morfológicos e corpúsculos de inclusão. Os cérebros dos animais AIRmax e AIRmin, mantidos como controles negativos, também foram submetidos ao preparo de lâminas e corados pelo método de HE (Figuras 9 e 10). As lâminas coradas por HE foram lidas em microscópio com ocular de aumento de 10 vezes e objetivas com aumento de 400 vezes e as imagens, capturadas com câmera fotográfica. Foram estabelecidos critérios para a leitura e posterior contagem de neutrófilos, sendo que cada lâmina foi dividida em 10 campos aleatórios, os quais foram diferenciados quanto à região do SNC (hipocampo, córtex, cerebelo e medula). Com a finalidade de evitar vícios de contagem sobre os campos comuns em um mesmo corte, foi utilizado um esquema pelo qual se dividiram as lâminas em quadrantes, fazendo-se a leitura num determinado sentido. 3.6 Análise estatística Para a análise estatística, foram utilizados os testes de Kolmogorov-Smirnov (K-S), Levene, t de Student e Mann-Whitney para verificar se as diferenças interlinhagens foram estatisticamente significativas durante a cinética de replicação viral das duas amostras no SNC e na produção de igG anti-rábica e dos isótipos IgG1 e IgG2a. 52 Foi aplicada a relação AIRmaxec x AIRminec para expressar os resultados de média e desvio padrão da replicação viral nos encéfalos e AIRmaxmd x AIRminmd, nas medulas. Para verificar a igualdade (homogeneidade) das variâncias, foi utilizado o teste Levene, tendo como parâmetro o resultado de p< 0,05 (DAWSON & TRAPP, 2003). Em seguida, foi aplicado o teste não paramétrico de K-S, para verificar se a distribuição de freqüências de uma dada variável poderia ser considerada normal, ou seja, p< 0,05 (SIEGEL, 1975). Para comparar duas médias de amostras independentes, quando houve igualdade de variâncias pelo teste de Levene (p< 0,05), foi aplicado o teste paramétrico t de Student (DAWSON & TRAPP, 2003). Quando a distribuição das freqüências de uma dada variável não foi considerada normal, foi utilizado o teste não paramétrico Mann-Whitney, que verifica a diferença entre a distribuição de duas populações. Todos os testes foram feitos através de software estatístico SPSS 10.0 for windows, com nível de significância de 5%. 53 RESULTADOS 4 RESULTADOS 4.1 Infecção viral 4.1.1 Determinação da DL50 para as amostras virais PV1 43/4 e V3 Após inoculação IC com as amostras em estudo, foi confirmada 100DL50 como a dose ideal infectante. 4.1.2 Determinação da suscetibilidade de camundongos AIRmax e AIRmin, após infecção via IC com as amostras virais PV1 43/4 e V3 Os animais inoculados foram observados diariamente quanto à sintomatologia e não houve diferença na suscetibilidade à infecção entre as duas linhagens para ambas as amostras virais, sendo o período de incubação de 6 a 7 dias para a PV1 43/3 e de 9 a 10 dias, para a V3. 4.1.3 Cinética da replicação viral determinada em camundongos heterogêneos albinos suíços Após inoculação IC, observou-se que, para ambas as linhagens de camundongos, a amostra PV1 43/4 replicou-se de forma crescente a 55 cada dia pós-infecção, apresentando maiores títulos virais nos encéfalos em relação às medulas (Figuras 1 e 2). Entretanto, a amostra V3, replicou-se de forma irregular, sendo que os títulos virais foram praticamente iguais nos encéfalos e nas medulas (Figuras 3 e 4). O teste de Levene é aplicado quando há igualdade das variâncias e se a distribuição for normal (K-S). São condições para definir seu uso ou não: teste t de Student e teste Mann-Whitney. São estes dois testes que irão responder se há diferença estatisticamente significativa (p<0,05) entre as médias. Os resultados das médias e dos desvios padrões durante a cinética de replicação viral, estão expressos nas tabelas 1 e 2. A igualdade das variâncias, durante a cinética de replicação viral, foi analisada através do teste Levene. Na análise da replicação viral, para a amostra PV1 43/4, a variância foi de 0,9 e 0,6 para encéfalos e medulas respectivamente e, para a amostra V3, de 1,0 e 0,7. A distribuição de freqüências das variáveis foi analisada pelo teste K-S, demonstrando que, nos encéfalos, a freqüência foi de 0,7 e 0,6 na amostra PV1 43/4 e V3, respectivamente e, nas medulas, 0,8 e 0,9. Para variâncias iguais observadas durante a cinética de replicação viral, foi aplicado o teste t de Student, demonstrando que, para a amostra PV1 43/4, a variância foi de 0,8 nos encéfalos e 0,7 nas medulas e, para a amostra V3, 0,3 nos encéfalos e 0,6 nas medulas. 56 ec md 6,0 5,0 Título Log10 4,0 3,0 2,0 1,0 0,0 3º dia 4º dia 5º dia 6º dia 7º dia Dias pós-infecção Figura 1 - Cinética de replicação da amostra PV1 43/4 no SNC de camundongos AIRmax 6,0 ec md 5,0 Título Log10 4,0 3,0 2,0 1,0 0,0 3º dia 4º dia 5º dia 6º dia 7º dia Dias pós-infecção Figura 2 - Cinética de replicação da amostra PV1 43/4 no SNC de camundongos AIRmin 57 ec md 6,0 5,0 Título Log10 4,0 3,0 2,0 1,0 0,0 6º dia 7º dia 8º dia 9º dia 10º dia Dias pós-infecção Figura 3 - Cinética de replicação da amostra V3 no SNC de camundongos AIRmax ec md 6,0 5,0 Título Log10 4,0 3,0 2,0 1,0 0,0 6º dia 7º dia 8º dia 9º dia 10º dia Dias pós-infecção Figura 4 - Cinética de replicação da amostra V3 no SNC de camundongos AIRmin 58 Tabela 1: Relação interlinhagens entre médias e desvios-padrões, durante a replicação viral da amostra PV1 43/4 nos encéfalos e medulas. AIRmax AIRmin PV x s x s Ec 4,0 1,9 3,7 2,1 Md 2,5 1,3 2,2 1,0 x : média s: desvio padrão Levene K-S AIRmaxec X AIRminec p= 0,9 AIRmaxmd X AIRminmd p= 0,6 AIRmaxec X AIRminec p= 0,7 AIRmaxmd X AIRminmd p= 0,8 t de Student AIRmaxec X AIRminec p= 0,8 AIRmaxmd X AIRminmd p= 0,7 Tabela 2: Relação interlinhagens entre médias e desvios-padrões, durante a replicação viral da amostra V3 nos encéfalos e medulas. AIRmax AIRmin V3 x s x s ec 3,4 0,9 2,8 1,0 md 2,8 1,1 3,2 1,2 x : média s: desvio padrão Levene K-S AIRmaxec X AIRminec p= 1,0 AIRmaxmd X AIRminmd p= 0,7 AIRmaxec X AIRminec p= 0,6 AIRmaxmd X AIRminmd p= 0,9 t de Student AIRmaxec X AIRminec p= 0,3 AIRmaxmd X AIRminmd p= 0,6 59 4.2 Titulação de anticorpos IgG e isótipos IgG1 e IgG2a durante a cinética de replicação viral Os títulos de IgG nos soros de camundongos das linhagens AIRmax e AIRmin, infectados com as amostra em estudo, conforme descrito no item 3.3.3, foram titulados pelo método de ELISA clássico e os isótipos IgG1 e IgG2a, pelo método de ELISA de captura. Os títulos de IgG para a amostra PV1 43/4 mantiveram-se altos durante todo o período de infecção e praticamente não houve diferenças interlinhagens. Entretanto, em relação ao isótipo IgG1, a diferença foi três e cinco vezes maior nos dias 6 e 7 pós-infecção, para os camundongos da linhagem AIRmax, respectivamente. Para o isótipo IgG2a, os títulos mantiveram-se constantes durante todo o período, não havendo diferença entre as linhagens (Figuras 5 e 6). Os títulos de IgG para a amostra V3 foram três vezes maiores nos dias 8 e 10 pós-infecção para os camundongos AIRmax, e os títulos de IgG1, cinco vezes maiores no dia 10, nos camundongos da linhagem AIRmax, quando comparados aos AIRmin e, conforme ocorreu com a amostra PV1 43/4, pôde-se observar que com a amostra V3, os títulos do isótipo IgG2a também mantiveram-se constantes e iguais para ambas linhagens de camundongos (Figuras 7 e 8). Através do teste Levene, foi analisada a igualdade das variâncias para a titulação de anticorpos anti-rábicos, durante a cinética de replicação viral, sendo de 0,9 e 0,01 na relação de encéfalos e medulas com a amostra PV1 43/4 e de 0,7 e 0,02, para a amostra V3. 60 O teste K-S demonstrou que, a distribuição de freqüência das variáveis a partir da titulação de IgG anti-rábica foi de 0,9 e 0,03 em encéfalos e medulas infectados com a amostra fixa e, de 0,7 e 0,04, para a amostra V3. Quanto à análise da diferença entre a distribuição de populações de anticorpos anti-rábicos, foi aplicado o teste Mann-Whitney, sendo para a amostra PV1 43/4, o resultado de U= 0,1 e para a V3, U= 0,3. Os resultados das médias e dos desvios padrões na produção de IgG e dos isótipos IgG1 e IgG2a durante a cinética de replicação viral, estão expressos nas tabelas 3 e 4. 61 12,0 IgG IgG1 IgG2a 10,0 Título log2 8,0 6,0 4,0 2,0 0,0 3º dia 4º dia 5º dia 6º dia 7º dia Dias pós-infecção Figura 5 - Título de anticorpos anti-rábicos e isótipos IgG1 e IgG2a após infecção com amostra PV1 43/4 em camundongos AIRmax, determinados pelo método imunoenzimático ELISA IgG IgG1 IgG2a 14,0 12,0 Título Log2 10,0 8,0 6,0 4,0 2,0 0,0 3º dia 4º dia 5º dia 6º dia 7º dia Dias pós-infecção Figura 6 – Títulos de anticorpos anti-rábicos e isótipos IgG1 e IgG2a após infecção com amostra PV1 43/3 em camundongos AIRmin, determinados pelo método imunoenzimático ELISA 62 12,0 IgG IgG1 IgG2a 10,0 Título Log2 8,0 6,0 4,0 2,0 0,0 6º dia 7º dia 8º dia 9º dia 10º dia Dias pós-infecção Figura 7 – Títulos de anticorpos anti-rábicos e isótipos IgG1 e IgG2a após infecção com amostra V3 em camundongos AIRmax, determinados pelo método imunoenzimático ELISA IgG IgG1 IgG2a 12,0 10,0 Título Log2 8,0 6,0 4,0 2,0 0,0 6º dia 7º dia 8º dia 9º dia 10º dia Dias pós-infecção Figura 8 – Títulos de anticorpos anti-rábicos e isótipos IgG1 e IgG2a após infecção com amostra V3 em camundongos AIRmin, determinados pelo método imunoenzimático ELISA 63 Tabela 3: Relação interlinhagens entre médias e desvios-padrões, durante titulação de IgG anti-rábica e isótipos IgG1 e IgG2a da amostra PV1 43/4 no SNC. AIRmax PV AIRmin x s x s IgG 7, 6 2,8 1,0 2,0 IgG1 4,4 2,2 3,0 0 IgG2a 3,0 0 3.0 0 x : média s: desvio padrão Levene K-S AIRmaxec X AIRminec p= 0,9 AIRmaxmd X AIRminmd p= 0,01 AIRmaxec X AIRminec p= 0,9 AIRmaxmd X AIRminmd p= 0,03 Mann-Whitney U= 0,1 Tabela 4: Relação interlinhagens entre médias e desvios-padrões, durante titulação de IgG anti-rábica e isótipos IgG1 e IgG2a da amostra V3 no SNC. AIRmax V3 AIRmin x s x s IgG 10,2 1,1 8,4 1,5 IgG1 5,0 1,9 3,6 0,5 IgG2a 3,0 0 3,0 0 x : média s: desvio padrão Levene K-S AIRmaxec X AIRminec p= 0,7 AIRmaxmd X AIRminmd p= 0,02 AIRmaxec X AIRminec p= 0,7 AIRmaxmd X AIRminmd p= 0,04 Mann-Whitney U= 0,3 64 4.3 Estudo histopatológico Foram feitas leituras das lâminas coradas através da técnica de HE, conforme citado no item 3.5. As lâminas controles também foram submetidas à coloração e fotografadas (Figura 9 e 10). A presença de focos inflamatórios não foi limitante para a captura das imagens, as quais foram fotografadas e, concomitantemente, feitas as contagens dos neutrófilos (Figuras 11 e 12). A presença de corpúsculos de inclusão foi observada em maior quantidade em neurônios infectados com a amostra fixa de vírus rábico (Figura 13). Durante a leitura das lâminas, além dos neutrófilos, foram encontradas evidências de focos inflamatórios, como: manguitos perivasculares, populações de linfócitos (Figura 14), infiltrados celulares, entretanto, as evidências que compõem o quadro ilustrativo não contemplam em alguns aspectos a resposta inflamatória aguda. As porcentagens de neutrófilos encontradas nos animais inoculados com a amostra PV1 43/4 foram discretamente maiores na linhagem AIRmin, fato que pode ser explicado devido aos animais AIRmax apresentarem uma resposta inflamatória aguda muito rápida ao estímulo antigênico. Praticamente não houve diferença entre as linhagens nos camundongos inoculados com a amostra V3 (Tabela 5). Quanto à região cerebral, para as duas amostras, houve maior número de neutrófilos no encéfalo em relação à medula, entretanto, nas lâminas infectadas com a amostra PV1 43/4, houve maior concentração de 65 neutrófilos no hipocampo e com a V3, no córtex, sendo que o número de neutrófilos decresceu durante a evolução da infecção. Tabela 5: Porcentagens de neutrófilos encontradas nos encéfalos e medulas de camundongos infectados com as amostras PV1 43/4 e V3, em diferentes dias pós-infecção. LINHAGEM TECIDO Ec MAX Md Ec MIN Md PV V3 DIA %Ne DIA %Ne 5 70 8 70 6 42 9 87 7 56 10 75 5 30 8 30 6 58 9 13 7 44 10 25 5 63 8 70 6 59 9 78 7 92 10 66 5 37 8 30 6 41 9 22 7 8 10 34 66 Figura 9 – MAX controle negativo. Corte histológico de hipocampo Figura 10 – MIN controle negativo. Corte histológico de hipocampo 67 Figura 11 – MAX PV1 43/4. Corte histológico de hipocampo com grande quantidade de neutrófilos Figura 12 – MIN V3. Corte histológico de hipocampo evidenciando foco inflamatório com grande quantidade de neutrófilos 68 Figura 13 – Corte histológico de córtex evidenciando Corpúsculos de Negri em neurônios infectados Figura 14 – Corte histológico de cortex, mostrando foco inflamatório com aspecto linfocitário 69 DISCUSSÃO DISCUSSÃO Diversos modelos experimentais têm sido utilizados na tentativa de esclarecer os possíveis mecanismos imunopatológicos envolvidos na infecção rábica. Dentre esses modelos, incluem-se camundongos isogênicos, entretanto, por não terem sido selecionados com base em parâmetros imunológicos, estas linhagens apresentam um potencial imune mediano, já que a freqüência de alelos com características extremas encontra-se reduzida (LODMELL, 1985). Estudos anteriores, nos quais foram utilizadas linhagens boas e más respondedoras de anticorpos das Seleções III e IV, demonstraram que, animais inoculados com amostra de vírus rábico fixo CVS, não apresentaram diferenças interlinhagens, em relação à sensibilidade inata, porém, após a imunização e desafio, foram observados índices de proteção superiores nas linhagens boas respondedoras de ambas as seleções. A participação da resposta humoral na resistência adquirida a este patógeno foi pela primeira vez imunogeneticamente demonstrada (NILSSON et al., 1979; De FRANCO, 1996). Na Seleção I, camundongos bons respondedores de anticorpos apresentaram resistência inata significativamente superior, após infecção por via IM (intramuscular) com a amostra de vírus rábico fixo PV. Esta resistência aumentada foi atribuída à maior síntese de IFN-γ no SNC durante a infecção, provavelmente pelo processamento mais lento do antígeno rábico pelos macrófagos dos camundongos da linhagem boa respondedora 71 de anticorpos, permitindo assim, melhores condições de apresentação do antígeno (CONSALES et al., 1990). Sendo a reação inflamatória um importante mecanismo de defesa que interage e até modula a expressão das reações imunes específicas, foram utilizadas, neste estudo, linhagens com reatividade inflamatória aguda de máxima e mínima intensidade, cuja principal característica fenotípica selecionada, é a habilidade que estas linhagens têm em recrutar células inflamatórias e mediadores ao sítio de agressão (IBAÑEZ et al., 1992). Em estudos realizados com camundongos AIRmax e AIRmin inoculados com proteínas heterólogas, antígenos bacterianos e veneno de Bothrops jararaca, foi observado que o processo seletivo não afetou a resposta imune específica, nem a mediada por células, entretanto, as linhagens diferiram em relação à resposta inflamatória local, na qual os camundongos da linhagem AIRmax apresentaram maior reatividade inflamatória, com significante aumento de infiltrado celular no local da inoculação. Esta diferença indica que a modificação geral da resposta inflamatória local em animais desta seleção independe do agente utilizado na indução deste tipo de resposta (ARAUJO et al., 1998; VIGAR et al., 2000; CARNEIRO et al., 2002). As infecções virais que acometem o SNC, na grande maioria são letais, pois se trata de um sítio imunoprevilegiado, no qual as funções imunes são restritas e os vírus têm desenvolvido mecanismos eficazes que lhes permitem adaptarem-se e escapar da resposta imune, disseminando-se pelo hospedeiro. O vírus rábico, após invadir o SNC, permanece invisível ao 72 sistema imune, provavelmente pelo mecanismo de apoptose, ou seja, a morte programada de neurônios infectados (THEERASURAKARN & UBOL, 1998). Na infecção natural pelo vírus rábico, são observadas poucas lesões neuropatológicas e focos inflamatórios, entretanto, a sintomatologia clínica é bastante severa, levando o indivíduo à morte. Isso pode ser explicado devido ao fato de ocorrer uma disfunção dos neurônios e não a morte destas células, dado aos mecanismos efetores imunes, incriminados com o dano imunopatológico. Para tanto, a utilização de modelos animais para estudar os mecanismos envolvidos na apoptose induzida pelo vírus rábico, podem proporcionar um melhor entendimento desta disfunção neurológica (JACKSON, 2002). A progressão da infecção no SNC é acompanhada pela produção de citocinas e de diferentes mediadores, como o óxido nítrico e outras neurotoxinas endógenas. Isso resulta na migração de células T através da barreira hematoencefálica, entretanto, sendo incapaz de controlar a progressão da infecção. A produção de óxido nítrico em animais infectados vem sendo investigada, sendo relacionada com a severidade dos sintomas clínicos e à presença de células inflamatórias (AKAIKE et al., 1995). Durante a infecção rábica, uma seqüência de estímulos físicos, químicos e biológicos rompe a integridade do organismo através de eventuais lesões acometidas por arranhaduras, mordeduras e/ou lambeduras de animais infectados, podendo desencadear um processo inflamatório, o qual pode se caracterizar por: febre, alterações sanguíneas 73 como a vasodilatação, leucocitose, aumento da permeabilidade vascular, hemoconcentração e aumento da síntese protéica de fase aguda (WEISSMAN, 1988; KOJ, 1985). A infecção por amostra de vírus fixo CVS limita a inflamação do SNC, estimulando a produção de agentes neuroprotetores, como a IL-6, destruindo as células T migratórias. Em contrapartida, a infecção do SNC por amostra de vírus PV desencadeia uma inflamação mais severa e, consequentemente, os neurônios infectados são destruídos e a propagação da infecção através do cérebro é interrompida. A destruição de células infectadas com o vírus PV é um mecanismo dependente de células T para o controle da neuroinvasão (GALELLI et al., 2000, BALOUL & LAFON, 2003). Os morcegos são animais que, quando infectados, além de causarem prejuízos para a pecuária, são responsáveis pela diminuição de produtividade devido a repetidos ataques, causando: infecções secundárias às feridas, anemia devido à perda de sangue, depreciação da pele, além de serem uma ameaça à saúde humana. Atualmente, a raiva aparece com mais freqüência em morcegos não-hematófagos e animais domésticos (cães e gatos), fato confirmado através do isolamento da V3 destes animais. Associações entre as variantes do vírus, hospedeiros e a área geográfica, indicam a existência de uma sintonia entre a variante e a espécie hospedeira; que se caracteriza pelos mecanismos de patogenia que produzem manifestações clínicas singulares para a perpetuação do vírus, além do equilíbrio natural ecológico (CHARLTON, 1994). 74 Durante o estudo da infecção rábica com as amostras PV1 43/4 e V3, utilizando linhagens de camundongos AIRmax e AIRmin, pôde-se observar diferenças na replicação viral nos encéfalos e medulas, para ambas amostras virais; sendo que, para o vírus fixo PV, conforme esperado, a replicação aumentou durante o período de infecção, atingindo o pico no sétimo dia pós-infecção, sendo maior no encéfalo, comparado à medula. Quanto à infecção das linhagens com a amostra V3, a replicação se manteve praticamente igual durante quase todo o período de infecção, não havendo diferença acentuada na replicação viral no encéfalo em relação à medula, sendo o período de incubação de dez dias. Apesar das diferenças observadas no período de incubação, a mortalidade para ambas as linhagens foi de 100%. Os dados histopatológicos foram compatíveis aos encontrados na literatura. Em virtude da técnica de coloração por HE não ser adequada para a diferenciação de células inflamatórias, este experimento restringiu-se à observação de: vasos sanguíneos rodeados por PMN, neurônios em degeneração, áreas com gliose focal, infiltrados perivasculares e a presença de corpúsculos de inclusão. Entretanto, como foram utilizadas linhagens reativas à inflamação aguda, estabeleceu-se as contagens de neutrófilos, por serem células que fazem parte do processo inflamatório agudo. Na análise de produção de IgG anti-rábica nos soros dos animais infectados, detectaram-se discretas diferenças interlinhagens, sendo superior nos camundongos AIRmax. Em relação aos isótipos de IgG, houve uma diferença interlinhagem dos títulos de IgG1 para os animais AIRmax, sugerindo que a estimulação de população T helper 2 induziria a liberação 75 de IL-4, que ativa os linfócitos B na produção de anticorpos (ROMAGNANI, 1992). De acordo com os testes estatísticos utilizados para verificar as diferenças interlinhagens durante a infecção com as amostras PV1 43/4 e V3, observou-se que, durante a replicação viral, houve igualdade das variâncias, já que para ambas as linhagens, o resultado foi maior, sendo p>0.05. A distribuição de freqüências das variáveis também foi considerada normal, já que o resultado, para todos os parâmetros analisados, foi p>0.05. Como houve igualdade nas variâncias, foi aplicado o teste t de Student, demonstrando não haver diferença significativa entre os resultados obtidos após infecção com as duas amostras em estudo. Na análise de populações de anticorpos anti-rábicos feita através do teste de Mann-Whitney, verificou-se não ter diferença significativa na distribuição de IgG e os isótipos IgG1 e IgG2a, já que U>0.05. 76 CONCLUSÕES 6 CONCLUSÕES Não houve diferença interlinhagens durante a cinética de replicação viral para ambas as amostras em estudo, entretanto, a amostra PV1 43/4 replicou-se de forma crescente, apresentando maiores títulos nos encéfalos e a V3, de forma irregular, com títulos praticamente iguais nos encéfalos e medulas. As linhagens AIRmax e AIRmin apresentaram poucas diferenças na resposta imune humoral específica durante a cinética de replicação das amostras de vírus rábico PV1 43/4 e V3. Houve superioridade da linhagem AIRmax em produzir IgG1, o que pode estar relacionado a uma tendência de estimulação preferencial de subpopulações Th2 nos animais desta linhagem. Durante a cinética de replicação viral, foram observados Corpúsculos de Negri em neurônios infectados com ambas as amostras virais, porém, em maior quantidade nos infectados com a amostra PV1 43/4. As duas amostras apresentaram focos inflamatórios, entretanto, em relação às linhagens, houve um discreto aumento nos animais AIRmin. 78 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 7 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS1 Abbas AK, Liatman AH, Pobs JJ. Citokines: Cellular and molecular Immunology 4ed. Philadelphia: Saunders Company 2000. Akaike T, Weile E, Schaefer M, Fu ZF, Koprowski H, Dietzchold B. Effect of neurotropic virus infection on neuronal and inducible nitric oxide synthase activity in rat brain. J Neurolovirol 1995; 1: 118-25. Arai YT, Kuzmin IV, Kameoka Y, Botvinkin AD. 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Tampão dietanolamina pH 9.8 1mg/mL 10% Dietanolamina Merk 0,5 Mmol/L MgCl2 Merk Tampão de lavagem - PBS Tween 20 Concentração 50 vezes 0,5M Na2HPO4 0,5M KH2PO4 Concentração uma vez Solução na concentração 50 vezes 100mL Tween 20 2,5mL H2O bidestilada qsp Anticorpos monoclonais 5000mL biotinilados anti-IgG1 e anti-IgG2a de camundongo Produto Zymed 04-6140 e 04-6240, San Francisco, CA Concentração: 8µg/mL Anticorpo de cabra anti-IgG total de camundongo conjugado à fosfatase alcalina Produto: Sigma A2179, Saint Louis, USA Substrato P-nitrophenil-phosphatase disodium hexahydrate Produto: PNPP, Sigma 104® Avidina conjugada à fosfatase alcalina Produto: Sigma A 7294 Polyoxyethylenesorbitan monolaurate (Tween 20) Produto: Sigma P 1379 Fixador Karnowsky Paraformaldeído 40% 100mL Água destilada 900mL Fosfato monobásico de Sódio Fosfato dibásico de Sódio (anidro) Material Microplacas de 96 orifícios Produto: Nunc, Maxi Scorp, Denmark Equipamentos Leitor de ELISA com filtro 405nm Produto: Multiskan®EX Microscópio com aumento de 400x e retículo 10x10 na ocular Produto: NIKON eclipse E800 Câmera Produto: CoolSNAP – ProCF color 4g 6,5g