Título: Função na Ecologia Autores: Nei de Freitas Nunes-Neto, Ricardo Santos do Carmo & Charbel Niño ElHani Informações sobre os autores Nei de Freitas Nunes-Neto: Professor Assistente I da Universidade Federal da Bahia (UFBA) e Doutorando do Programa de Pós-Graduação em Ecologia e Biomonitoramento da UFBA. Grupo de Pesquisa em História, Filosofia e Ensino de Ciências Biológicas, Instituto de Biologia, UFBA. Email: [email protected] Ricardo Santos do Carmo: Doutorando do Programa de Pós-Graduação em Ensino, Filosofia e História das Ciências (UFBA-UEFS). Grupo de Pesquisa em História, Filosofia e Ensino de Ciências Biológicas, Instituto de Biologia, UFBA. Email: [email protected] Charbel Niño El-Hani: Professor Associado I da Universidade Federal da Bahia (UFBA). Pesquisador Bolsista de Produtividade do CNPQ, nível 1C. Professor do Programa de Pós-graduação em Ecologia e Biomonitoramento (UFBA) e do Programa de Pós Graduação em Ensino, Filosofia e História das Ciências (UFBA-UEFS). Grupo de Pesquisa em História, Filosofia e Ensino de Ciências Biológicas, Instituto de Biologia, UFBA. Email: [email protected] Endereço para correspondências: Rua Barão de Jeremoabo, s/n – Ondina, SalvadorBahia, Brasil. CEP: 40170-115. Função na Ecologia Nei de Freitas Nunes-Neto, Ricardo Santos do Carmo & Charbel Niño El-Hani Resumo: O objetivo central deste trabalho é investigar os significados atribuídos ao termo função – e seus pressupostos subjacentes – no campo da ecologia. A pertinência desta tarefa é clara, na medida em que temas como função e teleologia têm sido quase que exclusivamente discutidos no contexto do pensamento evolucionista (ver, e.g., Allen et al., 1998; Ariew et al., 2002) e, não obstante, também as explicações em ecologia estão amplamente povoadas por expressões teleológicas e funcionais. É interessante notar que enquanto a biologia evolutiva tem mostrado mais amadurecimento em torno da linguagem teleológica e funcional, não verificamos esta mesma situação na Ecologia. Se, por um lado, há um parco desenvolvimento dos debates filosóficos sobre função na ecologia, por outro, alguns ecólogos têm buscado maior clareza sobre os significados do termo nesta ciência (e.g., Petchey & Gaston, 2002; Almeida, 2004; Jax, 2005). Contudo, tais análises, via de regra, passam ao largo dos debates filosóficos sobre função e teleologia, os quais avançaram enormemente a partir da segunda metade do século XX. Por exemplo, Kurt Jax (2005) conclui que há quatro significados básicos para função na ecologia, mas nenhum deles está apoiado numa abordagem proveniente da filosofia da biologia. Tal desconhecimento ou negligência dos debates filosóficos empreendidos durante o século XX pesarão contra qualquer abordagem sobre função na ecologia. Em vista desse problema, adotamos como marcos de referência de nossa análise os debates contemporâneos sobre função na filosofia da biologia. Nesta linha, defendemos uma ligeira reinterpretação do argumento a favor do consenso dualista, proposto inicialmente por Peter Godfrey-Smith (1993). Isto significa que há dois modelos distintos de função na biologia. De um lado, o modelo etiológico-selecionista presente, por exemplo, em Larry Wright (1973), Ruth Millikan (1998[1989]) e Godfrey-Smith (1998[1994]) e, de outro, o modelo de função como papel causal, cujo primeiro formalizador foi Robert Cummins, em 1975. Após uma apresentação e discussão dos fundamentos de tais concepções, realizamos uma breve análise dos argumentos em torno do conceito de função construídos na comunidade de ecólogos. Esta análise é representativa dos discursos destes na medida em que foca sobre teorias ou modelos centrais na ecologia contemporânea, como o programa de pesquisa sobre Biodiversidade e Funcionamento Ecossistêmico (Tilman et al., 2001; Naeem et al., 2002) e, além disso, sobre os debates atuais acerca do significado e importância da expressão “diversidade funcional” (Petchey & Gaston, 2002). A partir da análise dos argumentos e definições dos ecólogos, notamos que o modelo etiológico-selecionista de função não é adequado à ecologia porque os sistemas ecológicos não podem resultar de seleção natural. Ao invés, a noção de função como papel causal parece ser mais coerente com os interesses e pressupostos epistêmicos da ecologia, na medida em que esta concepção sobre o termo está desvinculada de qualquer consideração evolutiva. A partir desta conclusão, o próximo passo será, portanto, a construção de um modelo de função como papel causal aplicável à ecologia. Pretendemos, dentre outras coisas, que esta construção epistemológica tenha implicações para o estabelecimento de uma filosofia da ecologia com bases mais sólidas. Referências Allen, C.; Bekoff, M.; Lauder, G. (eds.) 1998. Nature’s purposes – analyses of function and design in biology. Cambridge, MA: MIT Press. Almeida, A. M. R. 2004. O Papel Funcional da Biodiversidade: Uma Análise Epistemológica do Programa de Pesquisa Biodiversidade-Funcionamento Ecossistêmico. Salvador-BA, Brazil: Graduate Studies Program in History, Philosophy, and Science Teaching, Federal University of Bahia and State University of Feira de Santana (Masters’ Thesis). Ariew, A.; Cummins, R.; Robert, P.; Perlman, M. (eds.) 2002. Functions: new essays in philosophy of psychology and biology. Oxford: Oxford University Press. Caponi, G. 2001. Biología funcional vs. biología evolutiva. Episteme, 12: 23–46. Cummins, R. 1998[1975]. Functional analysis. In: C. Allen, M. Bekoff, and G. Lauder, G. (eds.) 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