XLV CONGRESSO DA SOBER "Conhecimentos para Agricultura do Futuro" DESENVOLVIMENTO E IMPACTOS AMBIENTAIS EM MESORREGIÕES FRONTEIRIÇAS SELECIONADAS NO SUL DO BRASIL A PARTIR DE 1970 LUCIR REINALDO ALVES (1) ; CARLOS AGUEDO NAGEL PAIVA (2) ; JANDIR FERRERA DE LIMA (3) . 1,2.UNISC, SANTA CRUZ DO SUL, RS, BRASIL; 3.UNIOESTE, TOLEDO, PR, BRASIL. [email protected] APRESENTAÇÃO ORAL AGRICULTURA, MEIO AMBIENTE E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL Desenvolvimento e impactos ambientais em mesorregiões fronteiriças selecionadas no Sul do Brasil a partir de 19701 Grupo de Pesquisa: 6 - Agricultura, Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável. Resumo: Este artigo tem como escopo analisar os principais impactos ocorridos no meio ambiente das mesorregiões Oeste Paranaense, Oeste Catarinense, Sudoeste Paranaense e Noroeste Rio-Grandense, reflexos das transformações econômicas e sociais a partir de 1970. A análise da formação histórica e de dados secundários demonstrou que foram o desenvolvimento da produção agrícola mecanizada e da imposição do estilo tecnológico de produção as bases dos principais impactos ao meio ambiente dessa região. Esses impactos fazem-nos refletir sobre a formação de uma sociedade de risco nessa região causada pelos perigos da modernização e industrialização. Assim, o planejamento do desenvolvimento regional deve levar em consideração essas características e particularidades, sendo esse processo um desafio para as esferas governamentais e a comunidade regional em geral no século XXI. Palavras-chaves: Desenvolvimento regional, impacto ambiental, mesorregião, Sul. Abstract: This article has as target to analyze the main impacts occurred in the environment of the mesoregions Paranaense’s West, Catarinense’s West, Southwest’s Paranaense and Noroeste’s Rio-Grandense, consequences of the economic and social transformations from 1970 to now. The analysis of the historical formation and secondary data demonstrated that they had been the development of the mechanized agricultural production and of the imposition of the technological style of production the bases of the main impacts to the 1 Os autores agradecem a professora Dra. Heleniza Ávila Campos pelos seus comentários e sugestões pertinentes quando da apresentação da primeira versão desse texto. Como de praxe, os erros que ainda persistem são de inteira responsabilidade dos autores. 1 Londrina, 22 a 25 de julho de 2007, Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural XLV CONGRESSO DA SOBER "Conhecimentos para Agricultura do Futuro" environment of this region. These impacts make us to reflect about the formation of a society of risk in this region caused for the danger of the modernization and industrialization. Thus, the planning of the regional development must in general take in consideration these characteristics and particularities, being this process a challenge for the governmental spheres and the regional community in century XXI. Key Words: Regional development, environment impacts, mesoregions, Brasil’s South. 1. INTRODUÇÃO O objetivo deste artigo é analisar os impactos gerais ocorridos no meio ambiente das mesorregiões Oeste Paranaense, Oeste Catarinense, Sudoeste Paranaense e Noroeste RioGrandense, reflexos das transformações econômicas e sociais a partir de 1970. Segundo Guivant (1998) o processo de degradação do meio ambiente está numa fase alarmante. Os riscos ambientais e tecnológicos enfrentados atualmente são considerados pela autora não como meros efeitos colaterais do progresso, mas centrais e constitutivos da sociedade moderna, chegando a ameaçar toda forma de vida do planeta, e por isso, estruturalmente diferentes no que diz respeito a suas fontes e abrangência. Para Beck (1996) a sociedade está evoluindo de uma sociedade industrial para uma sociedade de risco. Segundo esse autor o desenvolvimento social passa por três fases, quais sejam: (1°) a sociedade pré-industrial, onde o risco toma a forma de perigos naturais (tremores de terra, seca, etc.) e estão independentes de decisões tomadas por indivíduos, não podendo ser considerados voluntários ou criados intencionalmente, sendo, portanto, efetivamente inevitáveis; (2°) a sociedade industrial, onde os riscos passam a ser dependentes das ações tanto dos indivíduos como de forças sociais de âmbito mais vasto, quer sejam perigos no trabalho devido às máquinas e venenos, quer os perigos do desemprego e penúria ocasionados pela dinâmica do ciclo econômico e pela transformação da estrutura econômica. A culpa ou a responsabilidade pelas ameaças pode ser assegurada confidencialmente e as suas probabilidades em termos estatísticos podem ser calculadas; e (3°) a atual sociedade de risco, onde, sob o impacto dos riscos e perigos modernos, estes métodos de determinar e perceber o risco, atribuindo a causa e distribuindo indenizações, desaparecem irreversivelmente. Com isso, é lançada a dúvida sobre o funcionamento e a legitimidade das modernas burocracias, estados, economias e ciência. Riscos que podiam ser calculados na sociedade industrial tornaram-se incalculáveis e imprevisíveis na sociedade de risco. Neste contexto, os riscos e os perigos modernos que excedem os antigos limites de espaço e tempo, e a riqueza, os privilégios, o estatuto e o poder econômico não oferecem qualquer caminho de fuga. A dimensão dos riscos é tão grande que ricos e pobres, norte e sul são ameaçados de igual maneira (BECK, 1996). Partindo da perspectiva de Beck, analisaremos neste trabalho os fundamentos de alguns problemas ambientais da região composta pelas quatro mesorregiões listadas no início desta seção. De acordo com a literatura, como por exemplo Corrêa (1997) e Ferrera de Lima (2004), esse aglomerado de mesorregiões foi objeto de padrões similares de ocupação e conta com estruturas fundiárias, competitivas e de organização do trabalho bastante próximas. O que nos permite tomá-lo como uma unidade regional, vale dizer, como uma “região” propriamente dita; analisando sua dinâmica de ocupação e os desafios postos à frente nos planos econômico e ambiental. Buscando demonstrar a pertinência destas assertivas, 2 Londrina, 22 a 25 de julho de 2007, Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural XLV CONGRESSO DA SOBER "Conhecimentos para Agricultura do Futuro" estruturamos este trabalho da seguinte forma: primeiramente será apresentada brevemente a evolução do conceito de região; em seguida serão apresentadas as principais características da colonização e ocupação regional; posteriormente, a relação territorial entre homem e natureza e relação com a distribuição das atividades no espaço serão apresentadas; por ultimo algumas considerações sobre o meio ambiente serão levantadas. As considerações finais sumariam este trabalho. 2. REGIÃO: DA REGIÃO NATURAL ÀS MESORREGIÕES HOMOGÊNEAS Conforme afirma Corrêa (1997, p. 183) “o termo região deriva do latim regio, que se refere à unidade político-territorial em que se dividia o Império Romano. Sua raiz está no verbo regere, governar, o que atribui à região, em sua concepção original, uma conotação eminentemente política”. Entretanto, o termo passou a designar uma dada porção da superfície terrestre que, por um critério ou outro, era reconhecido como diferente de uma outra porção. É um conceito-chave empregado pelos cientistas sociais quando estes incorporam em suas pesquisas a dimensão espacial. Em torno do conceito de região desenvolveu-se intenso debate entre os cientistas sociais, destacando-se os geógrafos e os economistas, à procura de um conceito que fosse comum. Inicialmente os geógrafos, entre 1870 a 1970, desenvolveram três grandes definições de região, quais sejam: a região natural, identificada por uma específica combinação de elementos da natureza como, principalmente, o clima, a vegetação e o relevo; a regiãopaisagem, entendida como o resultado de um longo processo de transformação da paisagem natural em paisagem natural, onde o arranjo dos campos, o sistema agrícola e o habitat rural, mas também o dialeto e os costumes formam um conjunto de características que constituem um gênero de vida; e a região plural, ou seja, entendida a partir de propósitos específicos, não tendo a priori, uma única base empírica, onde é possível identificar regiões climáticas, regiões industriais, regiões nodais, ou seja, tantos tipos de regiões quantos forem os propósitos do pesquisador (CORRÊA, 1997). Por volta de 1970 o pluralismo conceitual, sobre região, estava plenamente estabelecido entre os geógrafos. A partir daí, o conceito de região ganha destaque entre os não-geógrafos que de alguma forma se interessam pela dimensão espacial da sociedade. Assim, novos conceitos de região são introduzidos ampliando ainda mais o pluralismo conceitual. Segundo Anne Gilbert apud Corrêa (1997) três grandes conceitos de região foram instituídos após 1970. O primeiro, reflete a região como uma resposta aos processos capitalistas, entendida como a organização espacial dos processos sociais associados ao modo de produção capitalista. O segundo, a região é vista como foco de identificação, onde há relações culturais homogêneas entre grupos e lugares, sendo uma apropriação simbólica de uma porção do espaço, ou seja, um elemento constituinte de uma identidade. O terceiro, vê a região como meio para interações sociais, ou seja, uma visão política da região com base na idéia de que dominação e poder constituem fatores fundamentais na diferenciação das áreas. Benko (1999) destaca que a partir de uma visão mais economicista alguns conceitos importantes são desenvolvidos após 1950. Inicialmente, passa-se gradualmente da noção de região natural à noção de região econômica. Em seguida, numa proposta de caracterizar melhor as regiões econômicas são distinguidos três tipos de regiões: a região homogênea, de inspiração agrícola; a região polarizada, de inspiração industrial; e, a região-plano ou de programa, de inspiração prospectiva, uma região administrativa, um espaço cujas diversas 3 Londrina, 22 a 25 de julho de 2007, Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural XLV CONGRESSO DA SOBER "Conhecimentos para Agricultura do Futuro" partes relevam de uma mesma decisão. Lajugie apud Benko (1999) sintetiza esse debate com o seguinte conceito de região: A região corresponde a uma área geográfica que constitui uma entidade que permite, simultaneamente, a descrição de fenômenos naturais e humanos, a análise de dados socioeconômicos e a aplicação de uma política. Funda-se em duas características principais: homogeneidade e integração funcional, e resulta, ao mesmo tempo, num sentimento de solidariedade vivida e em relações de interdependência com os restantes conjuntos regionais e com o espaço nacional e internacional. Enfim, estabelecer uma única definição de região é muito complexo. Além disso, a escala da regionalização se alterou significativamente com o fenômeno da globalização a partir dos anos 1980. Neste contexto, a evolução da noção de região fez os economistas, os geógrafos, os historiadores e os sociólogos compreenderem que a região é um produto social gradualmente construído por sociedades nos respectivos espaços de vida. Bordieu (1998) afirma que essa pluralidade de conceitos sobre região nada mais é do que produtos de uma imposição arbitrária, ou seja, uma relação de forças na tentativa de uma delimitação legítima, um jogo de poder simbólico a partir de interesses específicos de cada área. Segundo Paiva (2005) uma região é mais que uma entidade física, é uma construção social. Assim, uma região é o resultado de um processo de regionalização e este processo é função dos objetivos daqueles que o põem em curso. Neste sentido, a escolha pelas mesorregiões supracitadas se deu por constituírem uma região com características similares. Para sustentar essa escolha seguiu-se a delimitação e classificação das mesorregiões homogêneas do Instituto Brasileiro de Economia e Estatística (IBGE). De acordo com o IBGE (1970) as mesorregiões homogêneas foram constituídas levando-se em consideração as áreas que agrupam, dentro de um mesmo Estado, municípios com características físicas, sociais e econômicas aproximadas. Alguns dos critérios estabelecidos para nomear as mesorregiões são: - domínios ecológicos; - áreas de população; regiões agrícolas; - atividades urbanas (industrial e de serviços). Assim, o conceito de espaço homogêneo foi definido como forma de organização da produção. 3. OCUPAÇÃO E COLONIZAÇÃO DA REGIÃO EM ANÁLISE: NOTAS GERAIS As quatro mesorregiões que constituem a região de estudo deste artigo (Figura 1) possuem características particulares: segundo a literatura, Corrêa (1997) e Ferrera de Lima (2004) dentre outros, estas quatro mesorregiões apresentam um padrão de ocupação do solo, disponibilidade de recursos e forma de exploração econômica que, num primeiro momento, parecem semelhantes. Estas características foram primordiais para a escolha da região de análise; para além do fato das mesmas não serem objeto da mesma atenção dispensada ao corredor litorâneo, usualmente tomado como aquele que lidera o dinamismo dos três Estados do Sul. Figura 1 - Região de Estudo 4 Londrina, 22 a 25 de julho de 2007, Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural XLV CONGRESSO DA SOBER "Conhecimentos para Agricultura do Futuro" Fonte: IBGE, 2000. Das mesorregiões em análise a primeira a ser colonizada e ocupada foi a Noroeste Rio-grandense. A ocupação deste território foi objeto da mobilização de um conjunto díspar de agentes em um longo período de tempo (Governos Nacionais e Provinciais no Império e na Primeira República, governos municipais e Companhias Colonizadores privadas) e vários grupos étnicos de povoamento (alemão, italiano e misto), conforme sintetiza Figura 2. Entretanto, o certo é que havia uma característica marcante, nesse processo, em relação a propriedade agrícola: constituía-se pela pequena propriedade, explorada diretamente pelo colono e sua família (BERNARDES, 1997). Bandeira (2003) retifica essa afirmativa e acrescenta que o Noroeste gaúcho faz parte de uma das regiões mais dinâmicas do Rio Grande do Sul e o fator dominante desse destaque é a organização inicial das propriedades em torno das pequenas propriedades e da produção agrícola diversificada. Pela Figura 2 é possível observar que o território que forma a mesorregião Noroeste Rio-Grandense foi ocupado, em sua maioria, a partir de 1900, reflexo da expansão das colônias mais antigas, de alemães e italianos. Na parte norte dessa mesorregião houve a entrada de etnias mista, além da presença significativa de comunidades indígenas remanescentes e de comunidades negras. A parte mais antiga de colonização dessa mesorregião se deu com a ocupação jesuítica a partir de 1626, na parte sudeste desse território. Figura 2 - Processo de Ocupação do Território do Rio Grande do Sul 5 Londrina, 22 a 25 de julho de 2007, Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural XLV CONGRESSO DA SOBER "Conhecimentos para Agricultura do Futuro" Fonte: SCP, 2006. De acordo com Bernardes (1997) foi a partir da constituição republicana em 1889 que as terras devolutas passaram ao domínio dos estados e estes passaram a ser os responsáveis pela colonização, diretamente ou por concessões a particulares. Assim, a partir de preocupações estratégicas do Estado são fundadas as primeiras colônias nas matas do Alto Uruguai, sendo elas Ijuí (1890) e Guarani (1891). A construção da ferrovia em 1890 ligando Santa Maria a Passo Fundo impulsionou o povoamento desse trecho. Dessa forma, desencadeou-se um ritmo acelerado de povoamento no Alto Uruguai e no trecho da ferrovia. Posteriormente são criadas as seguintes colônias no Noroeste Gaúcho: Erexim (1908), Santa Rosa (1915) e Guarita (1917). Estas três colônias tiveram a função de enormes clareiras na mata virgem, a partir das quais o movimento de pioneirismo impulsionou o povoamento em todas as direções, estabelecendo a junção entre os núcleos iniciais. Ressaltase que também havia iniciativas particulares de colonização. Enquanto a colonização Estatal vendia indistintamente lotes a quem procurasse a região, imigrantes ou agricultores que se deslocavam das áreas coloniais mais antigas, estabeleceu-se povoamento de etnias mistas. Por outro lado, a tendência das colônias particulares foi a de originar áreas homogêneas, de uma só etnia, ou, pelo menos, em que predominasse fortemente uma etnia (BERNARDES, 1997). Assim, chega-se no ano de 1940 com todas as terras povoadas, ou pelo menos, sem registro de terras devolutas, não somente na mesorregião Noroeste como em todo o Estado do Rio Grande do Sul. 6 Londrina, 22 a 25 de julho de 2007, Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural XLV CONGRESSO DA SOBER "Conhecimentos para Agricultura do Futuro" Durante o processo de povoamento a maior parte das cidades, ou das vilas, originouse de núcleos planejados pelos demarcadores das terras. Foi a circulação intensa entre as “linhas” de lotes, o intercâmbio comercial que naturalmente floresce em uma região de povoamento denso, a necessidade de um local em que se façam os contatos sociais, e ainda mais, a capela exigida pelo espírito religioso dos colonos, protestantes ou católicos, são os principais fatores que determinam a formação dos numerosos povoados na zona colonial. Assim, estes povoados, na maioria das vezes, tornaram-se mais importantes e assumem a categoria de vila ou cidade. Ao lado da atividade comercial, quase todas as vilas e cidades desenvolvem um artesanato e uma indústria variada, para atender às necessidades dos colonos. Deste modo é que as cidades mais antigas tornaram-se centros industriais importantes e destacam-se em população sobre as demais (BERNARDES, 1997). Bernardes (1997) afirma que os descendentes dos colonos tentam manter sua identidade, ou seja, mantêm-se de preferência colonos. Assim, quando não é mais possível economicamente a subdivisão da propriedade nas regiões de colonização mais antigas, passam eles a constituir a nova vanguarda do povoamento e se deslocam para as zonas pioneiras distantes. Nesse sentido, escasseando as terras virgens no Alto Uruguai, avolumam a corrente que se dirigem para o Oeste de Santa Catarina e para o Oeste e Sudoeste do Paraná. Em relação ao Oeste Catarinense, Werlang (2002) afirma que foi colonizado, no início do século XIX, a partir do norte, pelas fazendas de criação de gado bovino, seguido da extração de erva-mate. No entanto, a ocupação efetiva dessa região se deu a partir de 1917, com a instalação das empresas colonizadoras que passaram a comercializar as terras e madeiras da região. Poli (1989) menciona que a fase da colonização caracterizava-se pela penetração de elementos de origem alemã, italiana e polonesa vindos, principalmente, do Rio Grande do Sul. Ressalta-se, que apesar de haver o predomínio destas populações, há a presença de população indígena e luso-brasileira que é significante até os dias de hoje. Analisando-se a mesorregião Sudoeste Paranaense, Lazier (1986) afirma que a colonização foi marcada por diversos conflitos. Primeiramente, na disputa territorial onde Brasil e Argentina pleiteavam a posse da região rica em erva mate e pinheiros araucárias. Posteriormente, com a vitória diplomática do Brasil sobre a demarcação das terras fronteiriças com a Argentina, o conflito transferiu-se para questões internas, mais precisamente entre os estados do Paraná e Santa Catarina. O conflito interno foi caracterizado pela demarcação das terras do sudoeste os seus limites federativos. Com o acordo entre Paraná e Santa Catarina, em 1916 a região Sudoeste passou a pertencer ao Estado do Paraná. De forma geral, a colonização mais intensa dessa região foi realizada pelos colonos vindos do Sul do Brasil, a partir de 1960, de colonos vindos principalmente do oeste catarinense e noroeste gaúcho (PIACENTI e FERRERA DE LIMA, 2002). A mesorregião Oeste Paranaense apresentou os primeiros passos rumo ao processo de colonização no início do século XX. Uma colonização marcada pela exploração extrativista de madeira e erva-mate, no primeiro momento. Num segundo momento, a agricultura familiar será o elemento de ocupação, após 1940 (WACHOWICZ, 1982). No caso da agricultura familiar, sua base étnica foi construída a partir de dois fluxos de colonização: o primeiro oriundo de colonizadoras do Sul do Brasil (Rio Grande do Sul e Santa Catarina); e o segundo, de colonizadoras do Norte do Paraná, impulsionadas pela cultura do café, de fluxo populacional mais heterogêneo, originários de São Paulo, Minas Gerais, Espírito Santo e do Nordeste Brasileiro (COLODEL, 1988). Apesar da ação desses dois fluxos colonizadores, a colonização propriamente dita do Oeste do Paraná só se firmou a partir de 1946, com a chegada de empresas colonizadoras. Essas empresas de origem gaúchas foram responsáveis pela colonização da maioria dos municípios da região. Primeiramente elas realizaram a 7 Londrina, 22 a 25 de julho de 2007, Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural XLV CONGRESSO DA SOBER "Conhecimentos para Agricultura do Futuro" exploração dos pinhais e madeiras de lei e posteriormente elaboraram seu plano de colonização baseada na idéia de pequenas propriedades, lotes de no máximo 10 alqueires, que serviriam para a subsistência de imigrantes italianos e alemães que seriam atraídos para a região. Assim, realizaram a demarcação dos lotes, infra-estrutura das cidades e seleção dos grupamentos humanos que habitariam essas terras. Segundo WACHOWICZ (1982), essas empresas visavam colonos que sabiam trabalhar a terra, tivessem condições técnicas e conhecimentos para progredir. 4. A RELAÇÃO TERRITORIAL ENTRE HOMEM E NATUREZA Conforme apresentado pela descrição sintética da formação histórica do território em análise a relação homem/natureza se deu, primeiramente, pelas colonizadoras que exploravam os recursos naturais com a comercialização, principalmente da madeira e erva-mate. Num segundo momento, com a colonização efetiva, impulsionada pelas empresas colonizadoras e pautada na pequena propriedade rural de colonos oriundos do Noroeste Gaúcho, a exploração era na relação de subsistência. Nesse mesmo período (início do século XX) estavam ocorrendo transformações importantes no mundo, principalmente em relação à divisão internacional do trabalho. Primeiro houve a introdução do estilo fordista de produção que se caracterizava pela produção e consumo em massa. Num segundo momento, mais precisamente no pós-guerra, houve o ingresso do estilo de acumulação flexível de produção, que se baseava no surgimento de setores de produção inteiramente novos, novas maneiras de fornecimento de serviços financeiros, novos mercados e, sobretudo, taxas altamente intensificadas de inovação comercial, tecnológica e organizacional (HARVEY, 1994). Essas transformações impactaram significativamente na regionalização da divisão social do trabalho, do processo de acumulação capitalista, da reprodução da força de trabalho e dos processos políticos e ideológicos. Na área rural os impactos foram ainda mais dramáticos: a modernização, tecnificação e industrialização da agricultura afetaram a estrutura fundiária, as relações de produção, a pauta de produtos cultivados, os sistemas agrícolas, o habitat e a paisagem rural, e as densidades demográficas rurais (CORRÊA, 1986). Neste sentido, Ipardes et al. (2003) afirmam que a partir dos anos 1970 o Oeste e Sudoeste Paranaense integraram-se rapidamente ao movimento de expansão da agricultura moderna que se instaurou no Brasil a partir dessa década, marcado pela introdução maciça, no campo, de avançadas tecnologias de cultivo, de substituição de culturas alimentares pela produção de commodities e de alterações brutais nas relações de trabalho, todos estes elementos altamente poupadores de mão-de-obra. Nesta mesma perspectiva também podem ser analisadas as mesorregiões Oeste Catarinense e Noroeste Rio-Grandense. Bandeira (2003) confirma essas informações e afirma que no Noroeste RioGrandense, inicialmente caracterizado pela produção agrícola diversificada, tendeu a especializar-se a partir de 1970, com a expansão das lavouras mecanizadas de trigo e soja. Assim, principalmente a partir da década de 1970, as mesorregiões analisadas passaram por uma profunda reestruturação de sua base produtiva, ocasionado pela modernização da base técnica de produção, a expansão agropecuária e o esgotamento da fronteira agrícola (1970). Essas mudanças propiciaram uso intensivo das novas áreas e a reestruturação das tradicionais. O resultado foi um forte êxodo rural para os grandes centros urbanos e, principalmente, para outros estados brasileiros. 8 Londrina, 22 a 25 de julho de 2007, Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural XLV CONGRESSO DA SOBER "Conhecimentos para Agricultura do Futuro" Neste contexto, foi a atividade agrícola a primeira a ser distribuída em todo o território formado pelas quatro mesorregiões em análise. Assim, houve uma homogeneização das culturas cultivadas, com destaque para as culturas temporárias principalmente soja, trigo e milho. Juntamente a isso ocorreu a utilização intensiva de agrotóxicos e fertilizantes químicos nas lavouras ocasionando em grande impacto no meio ambiente. A Tabela 1 reflete parte dessas afirmações. Tabela 1 – Valores absolutos e taxas de crescimento do total das áreas produtivas não utilizadas, utilizadas com lavouras temporárias, e total de tratores das mesorregiões Oeste/PR, Sudoeste/PR, Oeste/SC e Noroeste/RS – 1970/1995 Oeste/PR Terras produtivas não utilizadas (Hectare) 1970 1995 ∆% 96.841 14.085 -85,46 Lavouras temporárias (Hectare) 1970 1995 ∆% 599.111 928.255 54,94 Sudoeste/PR 134.480 19.466 -85,52 380.677 456.541 19,93 Oeste/SC 116.289 57.134 -50,87 633.394 768.573 21,34 Noroeste/RS 211.420 54.354 -74,29 2.612.947 3.094.448 18,43 Mesorregiões Total de tratores 1995 22.985 ∆% 1.232,46 380 9.217 2.325,53 975 17.527 1.697,64 16.775 65.968 293,25 1970 1.725 Fonte: IPEADATA, 2006. A Tabela 1 demonstra o grau de expansão da fronteira agrícola nas mesorregiões destacadas. Nas quatro mesorregiões a área ocupada por terras produtivas não utilizadas diminuiu significativamente, variando entre 50,87% a 85,52%. Da mesma forma, é possível visualizar parte do impacto ocasionado pela mecanização do campo. O aumento do número total de tratores utilizados nessas regiões foi impactante: a mesorregião Sudoeste/PR foi a que apresentou a maior evolução, de 2.325,53% no período de 1970 a 2000; seguido da Oeste/PR, com 1.232,46%; da Oeste/SC, com 1.697,64%. A mesorregião Noroeste/RS apresentou a menor evolução (293,25%), mas apresenta o maior número absoluto de tratores. A evolução da área utilizada com lavouras temporárias ficou na ordem de 18,43% a 54,94% no mesmo período. Glico V. (2006) afirma que a entrada deste estilo de desenvolvimento agrícola esteve associado a ascensão da importância das empresas transnacionais ligadas ao comércio de insumos, à venda de determinados produtos e a venda de pacotes de inovações tecnológicas. Assim, a irreversibilidade das trocas de estrutura de ecossistemas foi determinante para que esta modalidade agrícola se haja dependente das inovações tecnológicas e insumos comercializados pelas empresas transnacionais. Nesta perspectiva, Gligo V. (2006, p. 52) afirma que: El impulso que se dio en particular en las áreas tradicionales de agricultura, la llamada “modernización del campo” fue posiblemente el origen de los principales problemas ambientales de la región. La intensificación de algunos de estos sumados a ciertos procesos históricos, explican la actual realidad ambiental de las agriculturas y sus tendencias. Assim, principalmente a partir de 1970, iniciou-se uma forte expansão da rede urbana regional desse território. Essa rede urbana passou a funcionar estritamente vinculada ao dinamismo da atividade rural e por ela impulsionada. Já, nos anos 80, devido a industrialização e a mecanização agrícola, houve significativa perda da população nas áreas rurais e crescimento das esferas urbanas. Esses dados podem ser visualizados pela Tabela 2. Em todas as mesorregiões a perda de população rural foi significativa, variando entre -27,08% a -65,34%. Por outro lado, a evolução da população urbana ficou na ordem de 252,04% a 527,34%, sendo a mesorregião Oeste/PR a que apresentou a maior evolução. 9 Londrina, 22 a 25 de julho de 2007, Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural XLV CONGRESSO DA SOBER "Conhecimentos para Agricultura do Futuro" Tabela 2 – Valores absolutos e taxa de crescimento da população total, urbana e rural das mesorregiões Oeste/PR, Sudoeste/PR, Oeste/SC e Noroeste/RS – 1970/2000 Mesorregiões Oeste/PR População Total 1970 2000 752.432 1.138.582 ∆% 51,32 População Urbana 1970 2000 148.101 929.092 ∆% 527,34 População Rural 1970 2000 604.331 209.490 ∆% -65,34 Sudoeste/PR 446.360 472.626 5,88 80.401 283.044 252,04 365.959 189.582 -48,20 Oeste/SC 745.638 1.116.766 49,77 177.649 702.616 295,51 567.989 414.150 -27,08 1.791.995 1.959.688 9,36 539.752 1.268.551 135,02 1.252.243 691.137 -44,81 Noroeste/RS Fonte: IPEADATA, 2006. Neste contexto, houve declínio dos empregados do setor primário causado devido à mecanização e tecnificação das propriedades rurais de forma intensificada (a partir dos anos 1970). Esses fatores fizeram com que muitos trabalhadores, intra e inter regionais, migrassem para os centros urbanos da região. Essas características impulsionaram o desenvolvimento e crescimento das atividades urbanas (secundários e terciários) dos municípios, conforme demonstra Tabela 3. Tabela 3 – Valores absolutos e taxas de crescimento da mão-de-obra (MO) ocupada total, dos setores primário, secundário e terciário das mesorregiões Oeste/PR, Sudoeste/PR, Oeste/SC e Noroeste/RS – 1970/2000 Mesorregiões Oeste/PR Sudoeste/PR Oeste/SC Noroeste/RS 1970 266.824 154.079 245.884 635.312 MO Total 2000 % 494.717 85,41 222.639 44,50 551.004 124,09 944.408 48,65 MO Primário 1970 2000 210.254 102.693 127.470 93.835 179.719 217.798 452.288 383.184 % -51,16 -26,39 21,19 -15,28 MO Secundário MO Terciário 1970 2000 % 1970 2000 % 16.661 93.004 458,21 39.909 299.020 649,25 8.186 38.435 369,52 18.423 90.369 390,52 24.315 116.093 377,45 41.850 217.113 418,79 47.247 143.588 203,91 135.777 417.636 207,59 Fonte: Ferrera de Lima, 2004. A Tabela 3 reflete as transformações ocorridas a partir da década de 1970 nas mesorregiões em análise e o impacto destas na alocação da mão-de-obra. Em todas as mesorregiões houve crescimento significativo dos setores urbanos (secundário e terciário) e diminuição da mão-de-obra do setor primário causados em grande parte pela mecanização e tecnificação das propriedades rurais. A única exceção foi a mesorregião Oeste/SC que não apresentou redução da mão-de-obra do setor primário e sim, um pequeno aumento. Juntamente a isso, o rápido crescimento da atividade agrícola foi acompanhado, nas décadas de 80 e 90, pelo surgimento e crescimento de agroindústrias cooperativas. Até meados da década de 80, o conjunto dessas mesorregiões região caracterizava-se como essencialmente agrícola. A partir de então, a indústria local passou a se consolidar e ter sua dinâmica orientada pelo comportamento do agronegócio cooperativo. Da mesma forma, com crescente participação o setor urbano, devido ao processo de urbanização, se expressa em atividades de comércio e particularmente em serviços, refletindo as modernas condições da dinâmica produtiva geral (IPARDES, 2003). Bandeira (2003) destaca, em relação ao aumento das agroindústrias, que a expansão ocorreu principalmente nas cadeias produtivas ligadas ao processamento de carnes suínas, de aves, e de laticínios. Aqui devem se destacar os impactos que a produção de suínos em larga escala gera: estudos já estão alertam sobre a contaminação dos dejetos de suínos nas águas e nas terras. Esse é mais um impacto ao meio ambiente reflexo do desenvolvimento econômico a partir dos anos 1970. Tabela 4 – Valores absolutos e taxa de crescimento do PIB total e setorial das mesorregiões Oeste/PR, Sudoeste/PR, Oeste/SC e Noroeste/RS – 1970/2000 10 Londrina, 22 a 25 de julho de 2007, Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural XLV CONGRESSO DA SOBER "Conhecimentos para Agricultura do Futuro" Mesorregiões Oeste/PR Sudoeste/PR 1970 1.260 PIB Total 2000 9.395 ∆% 645,63 PIB Agropecuária 1970 2000 ∆% 569 1.586 178,73 1970 159 PIB Industrial 2000 ∆% 3.708 2.232,08 PIB Serviços 1970 2000 ∆% 532 3.542 565,79 666 2.583 287,84 360 907 151,94 89 520 484,27 218 975 347,25 Oeste/SC 1.620 9.962 514,94 695 2.813 304,75 379 4.188 1.005,01 546 2.713 396,89 Noroeste/RS 4.795 12.997 171,05 2.110 3.506 66,16 704 3.140 346,02 1.981 5.941 199,90 Fonte: IPEADATA, 2006. Nota: PIB = Valores em R$1.000.000,00 de 2000, deflacionado pelo deflator implícito do PIB nacional2. Pela Tabela 4 é possível visualizar a evolução ocorrida na produção dos setores urbanos através do Produto Interno Bruto – PIB, setorial. Apesar do PIB da agropecuária ter apresentado aumento expressivo, a evolução dos demais setores foi ainda mais impactante. Os maiores valores são encontrados no PIB industrial das mesorregiões Oeste/PR e Oeste/SC, com evolução de 2.232,08% e 1.005,01%, respectivamente. Entretanto, esse processo de introdução da forma capitalista de desenvolvimento em massa não foi positivo em todo o conjunto da região, deixando alguns municípios na posição de periferia regional e intensificando outros na posição central e polarizante. Da mesma forma, o processo de reestruturação econômica regional reforçou a posição de destaque dos municípios pólos. Conforme afirma Benko (1999) a nova divisão internacional do trabalho consolida os centros dominantes, transformadores e de base terciária; e uma periferia dominada exportadora de bens primários e agrícolas. As trocas desiguais impedem a periferia de acumular os meios necessários ao seu arranque e, além disso, os processos de competitividade dos centros polarizadores impõem cada vez mais “barreiras de entrada” e cada vez mais altas. Nas quatro mesorregiões em análise destaca-se os seguintes municípios em relação a polarização regional conforme demonstra o Quadro 1. Quadro 1 – Aglomerações Urbanas e seus respectivos municípios AGLOMERAÇÃO Cascavel (Meso Oeste/PR) Foz do Iguaçu (Meso Oeste/PR) Chapecó (Meso Oeste/SC) Ijuí (Meso Noroeste/RS) Passo Fundo (Meso Noroeste/RS) Eixo articulado de Pato Branco/Francisco Beltrão (Meso Sudoeste/PR) Eixo articulado de Caçador (Meso Oeste/SC) Centro regional: São Miguel d’Oeste (Meso Oeste/SC) MUNICIPIO Santa Tereza do Oeste Toledo Cafelândia Cascavel Corbélia Ibema Foz do Iguaçu Santa Terezinha de Itaipu Chapecó Xaxim Xanxerê Ijuí Cruz Alta Santa Rosa Passo Fundo Carazinho Pato Branco Francisco Beltrão Dois Vizinhos Caçador Fraiburgo São Miguel d’Oeste Joaçaba Concórdia Videira Santo Ângelo Horizontina Panambi Erechim Maraú Fonte: IPEA, 2000. 2 Segundo Souza e Eidelman (2006) o deflator implícito do PIB nacional é um índice de preços, calculado a partir de dados da Renda Nacional e do Produto Nacional. De forma sintética, o deflator implícito do PIB é a variação média dos preços do ano corrente em relação à média dos preços do ano anterior. 11 Londrina, 22 a 25 de julho de 2007, Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural XLV CONGRESSO DA SOBER "Conhecimentos para Agricultura do Futuro" Segundo Geobrasil (2002) a substituição da antiga forma de concentração de estabelecimentos industriais em distritos localizados na periferia das cidades pólo ou nas regiões metropolitanas também estabelece uma nova forma de relação entre produção e meio ambiente. As mudanças na espacialização e na especialização das atividades produtivas definidas pela mundialização da economia rebatem no espaço local e regional, resultando em outros tipos de impactos ambientais, e requerendo nova forma de resposta na adoção da política ambiental. 5. MEIO AMBIENTE: SOCIEDADE/NATUREZA SOCIEDADE, NATUREZA E RELAÇÃO Segundo o Relatório Geobrasil (2002), a incorporação das novas áreas ao espaço econômico nacional, associou-se a um processo de urbanização e de industrialização que significou, simultaneamente, a desconcentração econômica e demográfica rumo ao interior, resultando na expansão e adensamento da rede urbana nacional, que passa a contar com a presença de cidades grandes e de numerosas cidades médias fora do eixo litorâneo de ocupação histórica do território brasileiro. Da mesma forma, a incorporação dos recursos naturais constituirá a condição central da ampliação da fronteira econômica do país, depois de atingida a escala de concentração industrial e financeira em torno do núcleo paulista. Nesse sentido, embora obedecendo a lógicas e momentos diferenciados de expansão/inserção no mercado interno e externo, tanto as regiões periféricas mais próximas do planalto das araucárias do oeste do Paraná, como as mais distantes dos Cerrados no planalto central além do Nordeste ou da Amazônia, foram sendo incorporadas à fronteira de recursos do país. A forte associação entre urbanização e industrialização caracteriza os processos de dinâmica territorial, populacional e econômica na história do Brasil. De uma economia de base agrária, o país transformou-se, em um espaço de tempo de 30 anos, numa sociedade altamente urbanizada e industrializada, registrando em números esta transição. Esse processo produziu efeitos diversos sobre o ambiente natural – fruto dos impactos sobre os ecossistemas na implantação de infra-estrutura e na exploração dos Recursos Naturais para a industrialização – e sobre as cidades – resultado da intensa migração de população e da nova dinâmica de instalação de atividades econômicas no espaço. A partir da segunda metade da década de 1990, a nova dinâmica econômica instaurada no mundo conduziu ao atual contexto urbano – industrial do Brasil, refletindo na organização do espaço e nas relações entre mercados, as inovações trazidas pela globalização, que surgiram e se somaram às heranças materializadas nas fases anteriores. As modificações na estrutura produtiva internacional vêm provocando intensa reformulação na lógica de localização espacial das indústrias e de suas atividades complementares. A nova ordem espacial instaurada mundialmente conduz o esvaziamento das grandes metrópoles mundiais de suas atividades industriais tradicionais, substituindo-as por uma variedade de serviços que atendem às unidades produtivas implantadas dentro e fora do país. Essas transformações entram na perspectiva de Beck (1996) sobre a emergência de uma sociedade de risco. Assim esse autor afirma que os perigos causados pela modernização e industrialização, seria complementada pela perda das tradições e da individualização nos domínios do trabalho, vida familiar e identidade própria. A sociedade de risco se caracteriza pelos impactos dos riscos e perigos modernos, onde os métodos de determinar e perceber os 12 Londrina, 22 a 25 de julho de 2007, Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural XLV CONGRESSO DA SOBER "Conhecimentos para Agricultura do Futuro" riscos desaparecem irreversivelmente. Com isso, é lançada à dúvida sobre o funcionamento e a legitimidade das modernas burocracias, Estados, economias e ciência. Riscos que se podiam calcular na sociedade industrial tornaram-se incalculáveis e imprevisíveis na sociedade de risco. Como alternativa Ficher (2003) remete a noção de aménagement. Segundo o autor aménagement se define como: (...) o conjunto das intervenções do poder público baseadas em objetivos públicos e em projetos sociais coletivos e que visam, pela aplicação de políticas de monitoramento (resposta a uma demanda expressa) e de políticas de treinamento (antecipação de uma solicitação futura), a requalificar espaços degradados ou em crise, a aumentar a atratividade e os potenciais de certos territórios, a garantir um mínimo de equilíbrio inter-regional dentro do espaço nacional (FICHER, 2003). Aliado a isso existe um fator de complexidade, pois o aménagement remete a uma perspectiva territorial. Assim, todas as considerações que podem ser desenvolvidas a respeito dos espaços e dos territórios são marcadas por um fator que dá complexidade à dimensão espacial: a diversidade dos atores que intervêm no aménagement (população, eleitos, administrações, coletividades, empresas e Estado). Neste sentido, levando-se em conta esta diversidade dos atores, considera-se que hoje a concorrência espacial se expressa em todos os níveis escalares. Assim, as políticas de aménagement devem se adequar às necessidades das populações; não se pode, então, “abrir mão” de partes do território. As mesmas políticas devem satisfazer às exigências de rentabilidade e de competitividade das empresas; não se pode então “negligenciar” as novas tecnologias nem os espaços dinâmicos (FISCHER, 2003). O planejamento como aménagement vem complementar a idéia de planejamento sustentável. Nesta perspectiva Pires (2003) o planejamento do desenvolvimento sustentável vem reafirmar valores que pareciam condenados em função do grau de destruição engendrado pelo próprio padrão de desenvolvimento. É na verdade uma revalorização da racionalidade da sociedade moderna, na medida em que pretende conciliar a noção de crescimento, manipulação do futuro, suspensão dos conflitos e correção das distorções, por meio de implementação de uma solução ótima, e resgatar a noção de que se trata de uma sociedade entendida como civilização universal. CONSIDERAÇÕES FINAIS Este artigo analisou, a partir de dados secundários e da formação histórica, os impactos gerais ocorridos no meio ambiente das mesorregiões Oeste Paranaense, Oeste Catarinense, Sudoeste Paranaense e Noroeste Rio-Grandense, reflexos das transformações econômicas e sociais a partir de 1970. A análise da formação histórica evidenciou que os primeiros impactos ambientais ocorreram a partir da destruição da floresta original e a introdução de uma produção agrícola de caráter de subsistência num primeiro momento. Esses impactos ocorreram na mesorregião Noroeste Rio-Grandense a partir de 1940, e posteriormente nas demais regiões após 1960 quando a colonização e ocupação se deu de forma mais intensa. Após 1970 com a imposição do estilo tecnológico de produção os impactos foram mais intensos. O primeiro impacto foi a homogeneização da produção agrícola pautada na cultura temporária de grãos, principalmente soja, trigo e milho. Com isso, a utilização de 13 Londrina, 22 a 25 de julho de 2007, Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural XLV CONGRESSO DA SOBER "Conhecimentos para Agricultura do Futuro" agrotóxicos e fertilizantes artificiais cresceu de forma significativa contaminando águas e solos sem restrições. A homogeneização e mecanização da produção agrícola fizeram com que a utilização da mão-de-obra rural fosse reduzida drasticamente ocasionando um êxodo rural nunca antes visto. O resultado foi a redução drástica da população residente nas áreas rurais e expansão da população urbanas. Assim, nas áreas urbanas, a geração de lixo urbano e a falta de saneamento foram visualizadas nesse processo de crescimento econômico a partir de 1970 em todas as mesorregiões em análise. Portanto, de forma geral, fica evidente que a origem dos principias problemas ambientais das mesorregiões analisadas foi dada pela mecanização da agricultura de subsistência e pela imposição do estilo tecnológico de produção. Este último produziu efeitos diversos sobre o ambiente natural, a partir da agro-industrialização, e sobre as cidades resultado da intensa migração de população e da nova dinâmica de instalação de atividades econômicas no espaço. Esses impactos supracitados fazem-nos refletir sobre a formação de uma sociedade de risco nessa região causada pelos perigos da modernização e industrialização. Dessa forma, o planejamento do desenvolvimento dessa região deve levar em consideração essas características. Além disso, como as quatro mesorregiões são, em sua essência, rurais deve-se avaliar as cadeias produtivas existentes de modo a identificar as etapas dessas cadeias que mais produzem impactos ao meio-ambiente de forma a minimizá-los. Assim, planejar o desenvolvimento regional pautado nesses critérios e especificidades torna-se um dos desafios do século XXI para as esferas governamentais e a comunidade regional em geral. Bibliografia BANDEIRA, Pedro. Origens, evolução e situação atual das desigualdades no Rio Grande do Sul. In: GONÇALVES, Maria Flora; BRANDÃO, Carlos Antônio; GALVÃO, Antônio Carlos. (Orgs.). Regiões e cidades, cidades nas regiões: o desafio urbano-regional. São Paulo: Unesp/Anpur, 2003. BECK, Ulrich. A sociologia do risco. In: GOLDBLATT, David. Teoria social e ambiente. Lisboa: Insituto Piaget. 1996. BENKO, Georges. A ciência regional. Oeiras - Portugal: Celta, 1999. BERNARDES, Nilo. Bases geográficas do povoamento do estado do Rio Grande do Sul. Ijuí: Unijuí, 1997. 147 p. BORDIEU, Pierre. O poder simbólico. 2 ed. Rio de Janeiro: Beitrond Brasil, 1998. COLODEL, José Augusto. Obrages e companhias colonizadoras: Santa Helena na história do Oeste Paranaense até 1960. Santa Helena: Prefeitura Municipal, 1988. CORRÊA, Roberto Lobato. Trajetórias geográficas. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1997. CORRÊA, Roberto Lobato. Região e organização espacial. São Paulo: Ática, 1986. 14 Londrina, 22 a 25 de julho de 2007, Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural XLV CONGRESSO DA SOBER "Conhecimentos para Agricultura do Futuro" FERRERA DE LIMA, Jandir. La diffusion spatiale du développement économique regional: l’analyse de la diffusion au sud du Brésil dans le XXº siècle. Thèse de Doctorat. DSH – Université du Quebec à Chicoutimi, 2004. FICHER, André. A dimensão espacial no ‘aménagement’ do território – o exemplo francês, RA´E GA, n. 7, Curitiba: ed. UFPR, 2003, p. 9-17. GEOBRASIL. Perspectivas do meio ambiente no Brasil. Brasilia: Edições Ibama, 2002. GLIGO V., Nicolo. Estilos de desarrollo y medio ambiente en América Latina, un cuarto de siglo después. Santiago de Chile: Naciones Unidas, 2006. GUIVANT, Julia S. A trajetória das análises de risco: da periferia ao centro da teoria social. BIB. Rio de janeiro, n. 46, p. 3-38, 1998. IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Banco de dados agregados – SIDRA. Disponível em: <http://www.ibge.gov.br> Acesso em: 15 ago. 2006. IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Divisão do Brasil em micro-regiões homogêneas - 1968. Rio de Janeiro: IBGE, 1970. IPARDES – Instituto Paranaense de Desenvolvimento Econômico e Social. Leituras regionais: mesorregião geográfica Oeste Paranaense. Curitiba: IPARDES, 2003. IPEA (Instituto de Pesquisa Econômica e Aplicada). Redes urbanas regionais: Sul. Brasília: IPEA, 2000. (Série caracterização e tendências da rede urbana no Brasil, 6). Convênio IPEA, IBGE, UNICAMP/IE/NESUR, IPARDES. IPEADATA. Dados macroeconômicos e <http://www.ipeadata.gov.br> Acesso em: 15 nov. 2006. regionais. Disponível em: HARVEY, David. Condição Pós-Moderna. São Paulo: Edições Loyola, 1994. LAZIER, Hermógenes. Análise histórica da posse de terra no sudoeste paranaense. Curitiba: SECE/BPP. 18 ed. 1986. PAIVA, Carlos Aguedo Nagel. O que é uma região de planejamento com vistas ao planejamento endógeno e sustentável. In: PRIMEIRAS JORNADAS DE ECONOMIA REGIONAL COMPARADA. Anais... Porto Alegre: FEE/PUC-RS, CD-ROM, 2005. PIACENTI, Carlos Alberto.; FERRERA DE LIMA, Jandir. (Coord.). Análise do impacto dos reservatórios das hidroelétricas no desenvolvimento econômico microrregional. Toledo: UNIOESTE/Campus de Toledo/CCSA/Curso de Ciências Econômicas. maio/2001 /maio/2002. 266p. (UNIOESTE/Campus de Toledo/Fundação Araucária. Projeto 612.) Projeto concluído, 2002. 15 Londrina, 22 a 25 de julho de 2007, Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural XLV CONGRESSO DA SOBER "Conhecimentos para Agricultura do Futuro" PIRES, Mauro Oliveira. A perspectiva do desenvolvimento sustentável. In: LITTLE, Paul E. (Org.). Políticas ambientais no Brasil: análises, instrumentos e experiências. Brasília: IIEB, 2003. POLI, Jaci. Caboclo: pioneirismo e marginalização. Cadernos do CEOM, Chapecó: Fundeste, ano 4, v. 1/2, 1989. p. 7-11. SCP (Secretaria da Coordenação e Planejamento do RS). Atlas socioeconômico do Rio Grande do Sul. Disponível em: <http://www.scp.rs.gov.br/ATLAS/default.asp>, Acesso em: 13 set. 2006. WACHOWICZ, Ruy Christovam. Obrageros, mensus e colonos: historia do oeste paranaense. Curitiba: Ed. Vicentina, 1982. WERLANG, Alceu. A colonização do Oeste Catarinense. Chapecó: Argos, 2002. 16 Londrina, 22 a 25 de julho de 2007, Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural