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Avaliação da Permeabilidade ao Ar em Argamassas Históricas: Uma
contribuição para especificar argamassas de restauro
Valdecir A. Quarcioni (1); Maria A. Cincotto (2); Mário S. Guilge (3); Fábio A. Cardoso
(4); Vanessa P. Rodrigues (5); Murilo D. M. Innocentini (6)
(1) Químico. Pesquisador do IPT. Doutorando do PCC-EPUSP. E-mail:
[email protected]
(2) Química. Pesquisadora Associada do Departamento de Engenharia de
Construção Civil, PCC-EPUSP. E-mail: [email protected]
(3) Técnico do IPT. Graduando em Química. E-mail: [email protected]
(4) Eng. de Materiais. Doutorando PCC-EPUSP. E-mail:
[email protected]
(5) Aluna de graduação em Engenharia Química, UNAERP. E-mail:
[email protected]
(6) Eng. Químico. Prof. Doutor do curso de Eng. Química, UNAERP. E-mail:
[email protected]
Resumo: O trabalho apresenta resultados de permeabilidade ao ar de argamassas da
fachada de um edifício da década de quarenta em São Paulo, exemplar raro de
revestimento em argamassa raspada aparente e em boas condições gerais de conservação.
Paralelamente, foram caracterizadas treze argamassas produzidas em laboratório, com
distintas composições de mistura e usuais em revestimentos no Brasil, para se obter
parâmetros de argamassas produzidas com materiais atuais, em vistas de reparo das áreas
pontualmente degradadas da fachada. Foram comparados os dados de permeabilidade ao
ar e de capilaridade para avaliação das argamassas.
Palavras-chave: argamassa, cal hidratada, cimento Portland, permeabilidade ao ar e
Forchheimer.
Key words: mortar, hydrated lime, Portland cement, air permeability and Forchheimer.
1
INTRODUÇÃO
O mercado nacional brasileiro da construção civil tem se caracterizado pela demanda
crescente de produtividade, racionalização de canteiros de obras e industrialização. Este
cenário é bastante característico na execução de fachadas de edifícios em metrópoles
como São Paulo. Com o surgimento de novas técnicas construtivas e maior
competitividade do mercado as paredes espessas típicas das construções antigas, foram
substituídas por paredes pouco espessas. Por vezes, propiciam a ocorrência de umidade no
interior das edificações, desenvolvimento de microorganismos e penetração de agentes
agressivos como o dióxido de carbono e íons cloreto, que favorecem a degradação do
concreto e das alvenarias. A permeabilidade das argamassas tem sua relevância em termos
de salubridade e durabilidade das edificações, inerente à própria função das argamassas de
proteção dos revestimentos [1].
A permeabilidade dos materiais de construção civil é um parâmetro importante para
avaliar a susceptibilidade com que os fluidos (ar, água, líquidos, gases ou vapores)
permeiam, sob pressão, um meio poroso [2]. É útil na adoção de medidas preventivas
específicas ao se usar diferentes materiais ou sistemas construtivos e, ainda, para limitar
ou controlar o acesso desses fluidos indesejáveis aos materiais e seus componentes. Na
prevenção de ataques de concreto por sulfatos, Mehta [3] considera a permeabilidade, em
algumas situações, mais relevante do que aspectos da composição química do material.
Este trabalho apresenta dados da caracterização da permeabilidade ao ar de argamassas
inorgânicas produzidas sem incorporação de aditivos modificadores de propriedades e
representa um segundo conjunto de dados no âmbito de um projeto de pesquisa dos
autores. Informações complementares a este trabalho (tais como composição química dos
materiais e distribuição granulométrica da areia) foram divulgadas [4] no VII Simpósio
Brasileiro de Tecnologia das Argamassas realizado na cidade de Recife, em que foram
avaliadas algumas condições e parâmetros específicos do ensaio aplicado em argamassas.
Até então, os autores haviam empregado este método de ensaio em materiais refratários e
cerâmicos.
2
OBJETIVO
O objetivo do trabalho é caracterizar a permeabilidade ao ar de um revestimento com mais
de sessenta anos, bem como, de treze argamassas convencionais produzidas em
laboratório para se obter dados como subsídio para especificar argamassas, a serem
produzidas com materiais atuais, para reparo de áreas pontualmente danificadas deste
revestimento.
3
PERMEABILIDADE AO AR: CONCEITO E MEDIÇÃO
Comumente tem-se empregado a Lei de Darcy para determinação de permeabilidade de
meios porosos, porém esta considera apenas os efeitos do atrito em relação à queda de
pressão na estrutura porosa, visto que é levado em conta o escoamento laminar.
Diferentemente, a equação de Forchheimer (1), que está sendo aplicada neste trabalho,
indica que a dependência é uma relação parabólica, pois considera a variação de energia
cinética e a densidade do fluido (ρ), como segue [2]:
(1)
Na qual:
Pe = Pressão absoluta de entrada; Ps = Pressão absoluta de saída; L = espessura da
amostra; P = pressão em que são obtidos os parâmetros: µ = viscosidade do ar; ρ =
densidade do ar e vs = velocidade superficial.
Na equação de Forchheimer, o termo associado à constante k1, Darciana, representa os
efeitos viscosos da interação fluido-sólido, a perda de pressão quando a energia é
transformada em calor devido ao atrito interno do fluido e do fluido com as paredes do
meio poroso. Enquanto o termo associado a k2, constante não-Darciana, representa os
efeitos cinéticos causados pela tortuosidade do meio que se manifestam em maiores
velocidades de escoamento [2].
Para aplicação do conceito acima referido, empregou-se um permeâmetro (Fig. 1), em que
o corpo-de-prova é fixado no porta-amostra e submetido à gradientes de pressão numa
face (Pe = pressão de entrada), mantendo-se a outra face à pressão atmosférica (Ps =
pressão de saída).
Para cada gradiente de pressão aplicado, registra-se a vazão resultante (Q), medida por
meio de um bolhômetro. O valor da velocidade de saída do fluido (vs), obtido pela razão
entre a vazão (Q) e a área (A) do corpo-de-prova percorrida pelo fluxo de ar, é aplicado na
equação de Forchheimer (1) para calcular as constantes de permeabilidade (k1 e k2). Os
valores de µ e ρ dependem da pressão e temperatura do ar, facilmente calculados [5].
Figura 1 – Esquema de funcionamento do permeâmetro
Para corpos-de-prova de argamassas com níveis elevados de permeabilidade ao ar, podem
ser empregados outros tipos de fluxímetros comerciais apropriados.
4
ENSAIO DE PERMEABILIDADE AO AR: COLETA,
PREPARAÇÃO DOS CORPOS-DE-PROVA E PARÂMETROS
DE ENSAIO
4.1
Coleta e preparação das argamassas históricas
Foram coletadas duas argamassas da fachada do edifício histórico da década de 40, sede
principal do Instituto de Pesquisas Tecnológicas do Estado de São Paulo – IPT (Tabela 1).
Foram ensaiadas amostras do sistema emboço-reboco e, distintamente, os respectivos
emboço e reboco. A Figura 2 ilustra as amostras ensaiadas e as proporções de mistura [6],
obtidas por ensaio de reconstituição de traço [7] (Tabela 2).
As argamassas foram coletadas por meio de equipamento apropriado para extração e
recortadas para o ensaio, por meio de serra de corte.
Tabela 1: Identificação das argamassas históricas ensaiadas
Argamassas de revestimento
Descrição
LTP – Sistema reboco + emboço
LTP – Emboço
Argamassa de pano de fachada – andar térreo
LTP - Reboco
L1P - Sistema reboco + emboço
L1P – Emboço
Argamassa de pano de fachada – 1º andar
L1P - Reboco
Argamassas
LTP
(emboço)
LTP (reboco)
L1P
(emboço)
L1P (reboco)
Tabela 2: Proporções de mistura das argamassas históricas
Constituintes, % de massa
Traço, em massa
cimento
cal
areia
cimento
cal
areia
aglo/agre
23,9
-
76,1
1
-
3,2
1:3,2
19,7
-
80,3
1
-
4,1
1:4,1
17,3
8,1
74,6
1
0,5
4,3
1:2,9
7,1
21,7
71,2
1
3,1
10,0
1:2,4
Figura 2: Amostras coletadas e preparadas para ensaio
4.2
Preparação, moldagem e cura das argamassas de laboratório
Os corpos-de-prova de argamassas (cilindros de 7,2 X 1,5 cm) empregados no ensaio,
com proporções de mistura de acordo com a Tabela 1, foram confeccionados com cimento
composto com adição de escória de alto-forno (tipo CP II E), cal hidratada cálcica (tipo
CH I), cal hidratada dolomítica (tipo CH III) e areia quartzosa. A areia foi obtida a partir
de três frações de Areia Normal Brasileira [8] e da fração passante na peneira ABNT nº
100 (0,15 mm), que é produzida pelo IPT e as frações calculadas para se obter uma curva
de distribuição granulométrica contínua [9]. Os corpos-de-prova (cps) foram desmoldados
após sete dias e mantidos em sacos plásticos fechados até completar 28 dias, quando
foram colocados em câmara de carbonatação por sete dias, até completa carbonatação de
todas as amostras, retornando à embalagem plástica até a data de ensaio. A execução dos
ensaios de permeabilidade ao ar ocorreu após dez meses da moldagem, em um período de
quatro semanas consecutivas.
A fim de se poder avaliar o desempenho de argamassas tipicamente empregadas no mercado
brasileiro variou-se a composição de mistura das argamassas na proporção
aglomerante:agregado (1:3 e 1:4) e também na relação entre os aglomerantes (1:1, 1:2 e 1:3)
para a mesma proporção de mistura, em volume.
4.3
Condições gerais de ensaio
Os ensaios foram realizados pelo método de escoamento em regime estacionário,
utilizando ar atmosférico em temperatura de 23±3 ºC, pressão atmosférica aproximada de
700 mmHg. As amostras com área útil de 11,9 cm2, foram submetidas a pressões de
entrada variando de 0 a 4 bar. Foram coletados no mínimo cinco conjuntos de valores de
pressão de entrada (Pe), pressão de saída (Ps) e de velocidade superficial do ar (vs) e os
dados obtidos foram aplicados na equação de Forchheimer.
5
RESULTADOS DE ENSAIOS
As Figuras 3 e 4 apresentam os resultados obtidos nos ensaios de permeabilidade ao ar das
argamassas históricas e das argamassas moldadas em laboratório.
1:3 C
1:3 CC
1:3 CD
1:1:6 CC
1:1:6 CD
1:2:9 CC
1:2:9 CD
1:3:12 CC
1:3:12 CD
1:1:8 CC
1:1:8 CD
1:2:12 CC
1:2:12 CD
L1P - SISTEMA
L1P - EMBOÇO
L1P - REBOCO
LTP - SISTEMA
LTP - EMBOÇO
LTP - REBOCO
1,00E-18 1,00E-17 1,00E-16 1,00E-15 1,00E-14 1,00E-13 1,00E-12 1,00E-11
k1 (m2)
Figura 3: Constantes de permeabilidade Darciana (k1), por argamassa
1:3 C
1:3 CC
1:3 CD
1:1:6 CC
1:1:6 CD
1:2:9 CC
1:2:9 CD
1:3:12 CC
1:3:12 CD
1:1:8 CC
1:1:8 CD
1:2:12 CC
1:2:12 CD
L1P - SISTEMA
L1P - EMBOÇO
L1P - REBOCO
LTP - SISTEMA
LTP - EMBOÇO
LTP - REBOCO
1,00E-15
1,00E-13
1,00E-11
1,00E-09
1,00E-07
1,00E-05
k2 (m)
Figura 4: Constantes de permeabilidade não-Darciana (k2), por argamassa
6
CORRELAÇÃO DE DADOS E DISCUSSÃO
6.1
Quanto às argamassas moldadas em laboratório
A partir dos resultados do conjunto geral de ensaios das argamassas foram
correlacionados os teores de cimento com as constantes de permeabilidade ao ar (k1 e k2) e
comparados aos seus coeficientes de capilaridade. Estes dados estão apresentados nas
Figuras 5, 6 e 7. A Tabela 3 apresenta os parâmetros de proporção de mistura que
caracterizam as argamassas, abordados nas correlações de dados.
Tabela 3: Parâmetros de dosagem e dados de caracterização
Argamassas
(*)
Relação
Cimento/
Materiais
secos, em
massa
Relação Água/
Materiais
secos, em
massa
Ar
incorporado
Massa
específica
(%)
(g/cm3)
Coeficiente de
capilaridade
(g/dm2.min1/2)
(**)
0,256
0,137
0,136
0,094
0,092
0,108
0,107
0,074
0,073
0,064
0,061
0,16
0,20
0,21
0,17
0,19
0,18
0,20
0,18
0,19
0,18
0,20
0,18
0,20
4,7
4,7
1,1
6,5
1,5
7,2
1,8
6,4
3,2
7,4
2,1
7,1
2,0
2,09
1,96
1,99
2,00
2,08
1,96
2,03
1,96
2,02
1,99
2,03
1,96
2,03
7,20
13,2
14,5
13,2
14,9
17,7
20,5
18,4
18,2
18,4
22,8
21,3
21,5
1:3 C
1:3 CC
1:3 CD
1:1:6 CC
1:1:6 CD
1:2:9 CC
1:2:9 CD
1:1:8 CC
1:1:8 CD
1:2:12 CC
1:2:12 CD
1:3:12 CC
1:3:12 CD
(*) As argamassas são identificadas pelas proporções em volume de areia úmida, sendo:
C = cimento Portland; CC = cal hidratada cálcica (CH I); CD = cal hidratada dolomítica
(CH III); Aglo = aglomerante; Agre = agregado.
(**) Os ensaios de capilaridade foram executados em corpos-de-prova prismáticos
4x4x16cm, conforme a NBR 15.259/05 [10].
A relação cimento/material seco (ou seja, o total de aglomerante + areia, em massa)
permite avaliar a influência específica do cimento numa dada argamassa, em relação às
propriedades consideradas [11].
1,E-09
y = 2E-09e -30,413x
R2 = 0,8139
K1
1,E-13
1,E-11
1,E-14
1,E-15
1,E-16
0,04
1,E-10
y = 6E-14e -19,114x
R2 = 0,9517
0,09
0,14
K2
1,E-12
1,E-12
0,19
1,E-13
0,24
Cimento/MS
Figura 5: Teor de cimento X Permeabilidade ao ar em argamassas com cal cálcica
1,E-07
1,E-07
1,E-08
1,E-08
1,E-09
1,E-09
1,E-10
-32,46x
K1
1,E-12
1,E-10
K2
y = 1E-09e
R2 = 0,634
1,E-11
1,E-13
1,E-11
1,E-14
1,E-12
1,E-15
1,E-16
y = 6E-14e -21,121x
R2 = 0,683
1,E-17
-0,01
0,04
1,E-13
0,09
0,14
0,19
1,E-14
0,24
Cimento/MS
Figura 6: Teor de cimento X Permeabilidade ao ar em argamassas com cal dolomítica
Com o aumento do teor de cimento nas argamassas verifica-se redução nos valores das
constantes de permeabilidade. Tal efeito é mais evidenciado distinguindo-se os dois
gráficos por tipo de cal utilizada nas argamassas (Figuras 5 e 6).
Ao se considerar os dois tipos diferentes de cal, nota-se que as argamassas preparadas
com cal cálcica (CH I) apresentam melhores correlações que as argamassas preparadas
com cal dolomítica (CH III). Possivelmente, este fenômeno está vinculado à área
específica do material, porém demanda um estudo próprio para entendimento aprofundado
da questão.
Como estudo preliminar a este trabalho foram caracterizadas as áreas específicas BET das
argamassas 1:1:6 CC e 1:1:6 CD, que apresentavam cerca de quatro anos de moldagem e
mantidas acondicionadas em sacos plásticos em ambiente de laboratório, obtendo-se os
valores de 10,7 m2/g e 12,1 m2/g, respectivamente [12]. Verifica-se, portanto, um aumento
significativo de 11,6% na área específica da argamassa com cal dolomítica em relação à
argamassa com cal cálcica, o que pode justificar a menor permeabilidade ao ar das
argamassas de cal dolomítica, como indicado pelos valores de K1e K2.
Coef. capilaridade
25
23
21
19
17
15
13
11
9
7
5
0,05
y = -87,746x + 26,269
R2 = 0,8987
0,1
0,15
Cimento/MS
0,2
0,25
Figura 7: Teor de cimento Vs Coeficiente de capilaridade aos 28 dias
A Figura 7 indica que o aumento do teor de cimento implica na redução do coeficiente de
capilaridade das argamassas.
Associando-se a permeabilidade e a capilaridade ou absorção capilar verifica-se que, para
as argamassas convencionais moldadas em laboratório, à medida que diminui a
permeabilidade ao ar o coeficiente de capilaridade também diminui, porém não há
correlação evidente entre estes dois fenômenos.
No entanto, pode-se considerar que o aumento no teor de cimento levou a uma redução na
porosidade total, mas cabe considerar também que houve redução nos teores de cal dessas
argamassas. Esta questão poderá ser esclarecida caracterizando-se posteriormente a
morfologia e a distribuição do tamanho de poros das argamassas.
6.2
Quanto às argamassas históricas
As argamassas históricas pertencentes ao grupo LTP possuem níveis de permeabilidade
significativamente inferiores às correspondentes do grupo L1P. Verifica-se também que o
reboco da argamassa LTP é que define o grau de permeabilidade do sistema, sendo o
emboço mais permeável.
Tais evidências puderam ser corroboradas com os resultados de análise petrográfica1 e
1
Os grãos de agregado na amostra L-1-P são predominantemente de quartzo e representam 65% do total da
argamassa. A pasta apresenta carbonatação intensa e pervasiva (localmente na interface pasta-agregado) e
representa 15% da argamassa. Os vazios encontram-se sob forma de ar aprisionado, vazios irregulares (0,2 a 1,7
mm) e microfissuras na pasta (espessura 0,04 mm), representando 20% do total da argamassa. Na amostra L-TP os grãos do agregado são compostos em sua maioria de rocha carbonática, com pequenas proporções de
quartzo e representam de 65% a 70% do total da argamassa. A pasta corresponde a 30% da argamassa,
apresenta frente de carbonatação de 7 mm de espessura, com carbonatação moderada a partir de então. Os
vazios concentram-se na interface com o emboço, sob a forma de bolhas de ar aprisionado, vazios alongados ou
esféricos (0,8 mm) e microfissuras (espessura de 0,03 mm) e representam menos de 5% da argamassa [6].
também com as proporções de mistura obtidas a partir das análises químicas dessas
argamassas (Tabela 2).
Estes dados indicam também que as amostras do grupo L1P possuem agregado quartzoso,
enquanto as do grupo LTP agregado calcário.
A análise petrográfica indicou que o reboco L1P está carbonatado, porém com intensidade
maior na interface pasta-agregado e menos intensa na amostra LTP. O reboco L1P possui
um teor elevado de vazios que está vinculado principalmente à presença de cal e pode
também estar associado, subordinadamente, à lixiviação da pasta verificada na região da
superfície. Esta porosidade, como indicado na análise petrográfica, justifica os valores das
constantes de permeabilidade da argamassa.
No reboco LTP, que possui agregado calcário, observa-se que a permeabilidade ao ar é
significativamente inferior, pois o volume de vazios é menor, de três a quatro vezes, em
relação ao reboco L1P com agregado quartzoso. Esta ocorrência está vinculada,
possivelmente, à redução dos vazios de interface quando o agregado é calcário e também
à redução dos vazios da pasta devido à alteração nas proporções de cimento e cal dessas
argamassas. Pela análise petrográfica foi possível verificar ainda que no reboco LTP os
grãos de carbonato sofreram recristalização formando grãos maiores de carbonato,
sugerindo-se que o agregado carbonático atua como elemento indutor de precipitação e,
consequentemente, favorece o adensamento da matriz.
7
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Os dados obtidos na caracterização da permeabilidade ao ar das argamassas evidenciam a
importância de algumas questões indicadas abaixo, como subsídio para seleção de
argamassas para reparo da edificação histórica estudada:
- Seleção do aglomerante: argamassas com teores elevados de cal proporcionaram
permeabilidade ao ar mais elevada, como pôde ser verificado com os rebocos L1P e LTP,
assim como o aumento no teor de cimento promoveu redução na permeabilidade das
argamassas moldadas em laboratório. Cabe considerar que o teor de água de mistura tem
influência relevante na porosidade das argamassas e deve ser analisado devidamente.
A literatura sinaliza que o aumento no teor de cimento favorece a redução da
permeabilidade ao vapor de água em argamassas tradicionais [13] como observado, neste
estudo, com relação à permeabilidade ao ar.
- Proporção de mistura adequada: os dados gerais de permeabilidade das argamassas
moldadas em laboratório, particularmente de K2, sugerem que o aumento no teor de
agregado favorece o aumento da permeabilidade ao ar, devido ao aumento na porosidade
das argamassas. No entanto, esta suposição nem sempre poderá ser válida, mas deve ser
avaliada considerando-se também outros parâmetros como a natureza e a composição dos
aglomerantes e agregados presentes.
- Tipo de agregado: os rebocos das argamassas históricas indicam que o agregado calcário
favoreceu a redução da permeabilidade ao ar devido à interação pasta-agregado, pela
diminuição dos vazios de interface.
O ensaio de permeabilidade ao ar fornece informação referente à área microestrutural
exposta da argamassa suscetível à interação com os agentes deletérios. Portanto, maior
área exposta significa maior suscetibilidade à degradação do material.
Os coeficientes de permeabilidade são parâmetros que retratam a microestrutura da
argamassa e, portanto, podem orientar a tomada de decisão quanto aos parâmetros de
dosagem, composição e aplicação do revestimento de argamassa. Estas informações
podem subsidiar a escolha e a preparação de argamassas para reparo, que devem ser
associadas a parâmetros específicos e requisitos de projetos de restauro de fachadas, como
atenção ao respeito pelo princípio da compatibilidade, ou seja, uso de materiais
compatíveis para garantir um comportamento semelhante ao original [14].
Este trabalho levanta uma série de variáveis que influenciam na permeabilidade ao ar e
julga-se, no entanto, necessária a continuidade de pesquisas para se conhecer
isoladamente a influência das mesmas no fenômeno, como tipo de agregado, quantidade
de água de mistura, natureza da cal e proporção dos aglomerantes.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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para avaliação de desempenho. 2007. 141 f. Dissertação (Mestrado) – Instituto de
Pesquisas Tecnológicas do Estado de São Paulo, 2007, (no prelo).
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Forchheimer. Cerâmica, v. 45, n. 292/293, p. 61-67, 1999.
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[9] Carneiro, A.M.P.; Cincotto, M.A. Areia: distribuição granulométrica para
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capilaridade e do coeficiente de capilaridade. Rio de Janeiro, 2005.
[11] Quarcioni, V. A.; Cincotto, M. A. Influência da cal em propriedades mecânicas de
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AGRADECIMENTOS
Laboratório de Materiais de Construção Civil do Centro de Tecnologia de Obras de Infraestrutura (CT-OBRAS) do IPT;
Laboratório de Limpeza de Gases do Curso de Engenharia Química da Universidade de
Ribeirão Preto – UNAERP;
Laboratório de Microestrutura do Departamento de Construção Civil da Escola
Politécnica da Universidade de São Paulo – Poli/Civil;
À Equipe da Rede de Apoio Tecnológico para Restauração e Conservação do Patrimônio
Histórico (RETECOP) do IPT que atuou no projeto de caracterização da fachada do
Edifício Adriano Marchini.
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