Hiléia - Edição Nº. 3

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ANO-2
JUL-DEZ
2004
03
A
Hiléia – Revista de Direito Ambiental da Amazônia, se constitui em espaço destinado à apresentação e divulgação
das reflexões produzidas no processo de construção do conhecimento humano, jurídico e humanístico-jurídicoambiental, desenvolvido no âmbito do Programa de Pós-Graduação em Direito Ambiental da Universidade do Estado do
Amazonas.
Nesse sentido, refletir desde os contextos da existência, significa proporcionar e criar os espaços de lutas. Lutas pelo
conhecimento, pelo direito, pela vida e dignidade humana. Assim, este periódico científico que se consolida como
espaço para divulgação e reflexão do direito ambiental, tem no contexto amazônico e brasileiro e, em sentido mais
ampliado, em trocas geopolíticas e cognoscitivas mais iguais na correlação sul-norte/norte-sul, espiralando a seara da
complexidade do mundo sóciobiodiverso. Almeja-se, portanto, constituir-se, pelo diálogo, em âmbito plural e
heterogêneo para convergências de conhecimentos e alternativas, com perspectivas transdisciplinares nas abordagens
e conteúdos, assim como interinstitucional e translocal nos sujeitos.
ANO-2, N.º 3 – JULHO-DEZEMBRO/2004 – ISSN: 1679-9321
Revista de Direito
Ambiental da Amazônia
Os contextos diversos e complexos do mundo contemporâneo, em relação constante e paradoxal, com o acirrado
processo de globalização econômica e cultural, implicam em transformações sociais, jurídicas, econômicas e políticas,
gerando novos problemas e conflitos, especialmente no que concerne ao direito e ao seu estudo. A verticalidade do
discurso global que busca legitimar os processos de universalização da cultura do mercado quer seja na vertente única
da produção e do consumo capitalistas, transformando tudo em mercadoria, ou, na imposição de modelos de
normatividade supostamente eficazes para proporcionar o desenvolvimento, provocam uma certa idéia de que não existe
solução fora desses parâmetros, favorecendo um renovado processo econômico neocolonial.
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GOVERNADOR DO AMAZONAS
Eduardo Braga
VICE-GOVERNADOR DO AMAZONAS
Omar Aziz
SECRETÁRIO DE ESTADO DA CULTURA
Robério Braga
SECRETÁRIA DE ESTADO DA CIÊNCIA E TECNOLOGIA
Marilene Corrêa
REITOR DA UNIVERSIDADE DO ESTADO DO AMAZONAS
Lourenço dos Santos Pereira Braga
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ANO-2, N.º 3
MANAUS, JULHO-DEZEMBRO, 2004
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Copyright © 2006
Governo do Estado do Amazonas
Secretaria de Estado da Cultura
Universidade do Estado do Amazonas – UEA
UNIVERSIDADE DO ESTADO DO AMAZONAS
Reitor Lourenço dos Santos Pereira Braga
Vice-Reitor Carlos Eduardo Gonçalves
PRÓ-REITORIA DE PÓS-GRADUAÇÃO E PESQUISA
Pró-Reitor Walmir de Albuquerque Barbosa
ESCOLA SUPERIOR DE CIÊNCIAS SOCIAIS
Diretor Randolpho de Souza Bittencourt
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM DIREITO AMBIENTAL
Coordenador Fernando Antonio de Carvalho Dantas
COORDENADORES(AS)
Profa. Cristiane Derani
Prof. Sérgio Rodrigo Martinez
COORDENAÇÃO EDITORIAL
Prof. Fernando Antonio de Carvalho Dantas
CONSELHO EDITORIAL
Prof. Fernando Antonio de Carvalho Dantas
Prof. Luiz Edson Fachin
Prof. David Sánchez Rubio
Prof. Ozório José de Menezes Fonseca
Profa. Cristiane Derani
Prof. Sérgio Rodrigo Martinez
Profa. Solange Teles da Silva
PROJETO GRÁFICO
Kintaw Design
Solicita-se permuta
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REVISÃO
Edições Kintaw
FICHA CATALOGRÁFICA
Ycaro Verçosa dos Santos– CRB-11 287
Hiléia: Revista de Direito Ambiental da
Amazônia. ano 2, n.º 3. Manaus: Edições
Governo do Estado do Amazonas / Secretaria de
Estado da Cultura / Universidade do Estado do
Amazonas, 2006.
284 p.
ISSN: 1679-9321 (Semestral)
1. Direito Ambiental – Amazônia I.
Universidade do Estado do Amazonas
CDD: 344.046811
CDU 344 (811)
UNIVERSIDADE DO ESTADO DO AMAZONAS – UEA
Programa de Pós-Graduação em Direito Ambiental
Rua Leonardo Malcher, n.º 1728, 5.º andar,
Centro, CEP: 69010-170
Manaus – Amazonas – Brasil
Tel./Fax. 55 92 3627-2725
E-mail: [email protected]
Site: www.pos.uea.edu.br/direitoambiental/
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SUMÁRIO
A P R E S E N T A Ç Ã O . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .0 9
PARTE I
LOS MOVIMIENTOS SOCIALES Y LA CONSTRUCCIÓN DE UN NUEVO
SUJETO HISTÓRICO
F r a n ç o i s H o u t a r t . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .1 3
UN MUNDO QUE SE HUNDE: LOS COLAPSOS ECOSOCIALES,
ONTOLÓGICOS Y GLOBALES
E d u a r d o S a x e - F e r n á n d e z . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .2 5
TRÊS MEDIÇÕES, UMA REGIÃO TROPICAL DE FRONTEIRA, E APENAS UM ACHADO:
DESENVOLVIMENTO SOCIOECONÔMICO DA REGIÃO AMAZÔNICA
BRASILEIRA, 1953-1996
J o s é A u g u s t o D r u m m o n d . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .7 5
EL DERECHO AMBIENTAL EN ARGENTINA
C a r l o s B o t a s s i . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .9 5
MODERNIDADE: NASCIMENTO DO SUJEITO E SUBJETIVIDADE JURÍDICA
M a r i a d e F á t i m a S . W o l k m e r . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .1 2 1
POLÍTICA INDIGENISTA DO AMAZONAS: PERSPECTIVAS E
TENDÊNCIAS NO SÉCULO XXI
M a r c o s A n t o n i o B r a g a d e F r e i t a s . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .1 4 9
PARTE II
CONSIDERAÇÕES JURÍDICAS SOBRE O MANEJO COMUNITÁRIO DE ESTOQUES
PESQUEIROS: O EXEMPLO DA AMAZÔNIA BRASILEIRA
Serguei Aily Franco de Camargo
A n a C a r o l i n a S u r g i k . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .1 6 5
REFLEXÃO DO DIREITO DAS “COMUNIDADES TRADICIONAIS”
A PARTIR DAS DECLARAÇÕES E CONVENÇÕES INTERNACIONAIS
J o a q u i m S h i r a i s h i N e t o . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .1 7 7
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PARTE III
A FUNÇÃO SÓCIO-AMBIENTAL
COMO NOVO PARADIGMA DA PROPRIEDADE CONTEMPORÂNEA
A l a i m G i o v a n i F o r t e s S t e f a n e l l o . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .1 9 9
ANÁLISE DA CULPABILIDADE E DA RESPONSABILIDADE DO DANO AMBIENTAL:
REFLEXÕES A PARTIR DE UMA MISSÃO DE FISCALIZAÇÃO DO IBAMA NO INTERIOR
DO ESTADO DO PARÁ
D a n i e l A b r a h ã o d o N a s c i m e n t o . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .2 1 7
SOCIEDADE CIVIL RESÍDUOS SÓLIDOS E CONSCIENTIZAÇÃO
M a r i a R o s a l v a d e O l i v e i r a S i l v a . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .2 3 9
PARTE IV
D I S S E R T A Ç Õ E S D E M E S T R A D O (j u l h o - d e z e m b r o / 2 0 0 4 ) . . . . . . . . . . .2 5 1
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CONTENTS
P R E S E N T A T I O N . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .0 9
PART I
SOCIAL MOVEMENTS AND THE CONSTRUCTION OF A NEW
HISTORICAL SUBJECT
F r a n ç o i s H o u t a r t . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .1 3
A WORLD THAT SINKS: ECO-SOCIAL, ONTOLOGICAL
AND GLOBAL COLLAPSES
E d u a r d o S a x e - F e r n á n d e z . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .2 5
THREE MEASUREMENTS, ONE BORDER TROPICAL REGION
AND ONE FINDING: SOCIO-ECONOMIC DEVELOPMENT
IN THE BRAZILIAN AMAZON
J o s é A u g u s t o D r u m m o n d . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .7 5
ENVIRONMENTAL LAW IN ARGENTINA
C a r l o s B o t a s s i . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .9 5
MODERNITY: BIRTH OF THE SUBJECT AND LEGAL SUBJECTIVITY
M a r i a d e F á t i m a S . W o l k m e r . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .1 2 1
INDIGENIST POLICY IN THE STATE OF AMAZONAS:
PERSPECTIVES AND TRENDS
M a r c o s A n t o n i o B r a g a d e F r e i t a s . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .1 4 9
PART II
LEGAL CONSIDERATIONS ON COMMUNITY-BASED
MANAGEMENT OF FISH STOCKS: THE EXAMPLE OF BRAZILIAN AMAZON
Serguei Aily Franco de Camargo
A n a C a r o l i n a S u r g i k . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .1 6 5
REFLECTIONS ON THE RIGHTS OF “TRADITIONAL COMMUNITIES” FROM THE
PERSPECTIVE OF INTERNATIONAL DECLARATIONS AND CONVENTIONS
J o a q u i m S h i r a i s h i N e t o . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .1 7 7
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PART III
SOCIO-ENVIRONMENTAL FUNCTION AS A
NEW PARADIGM OF CONTEMPORARY PROPERTY
A l a i m G i o v a n i F o r t e s S t e f a n e l l o . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .1 9 9
ANALYSES OF CULPABILITY AND RESPONSIBILITY OF
ENVIRONMENTAL CRIME: REFLECTIONS FROM THE PERSPECTIVE
OF AN INSPECTION MISSION IN THE STATE OF PARÁ
D a n i e l A b r a h ã o d o N a s c i m e n t o . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .2 1 7
CIVIL SOCIETY, SOLID RESIDUES AND AWARENESS
M a r i a R o s a l v a d e O l i v e i r a S i l v a . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .2 3 9
PART III
M A S T E R D E G R E E D I S S E R T A T I O N S ( 2 0 0 4 ) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .2 5 1
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APRESENTAÇÃO
A
Hiléia, Revista de Direito Ambiental da Amazônia, configura espaço
para publicação das reflexões construídas no âmbito do Programa de
Pós-graduação em Direito Ambiental da Universidade do Estado do Amazonas
ao passo em que para si convergem as contribuições de pesquisadores externos
em cujo pensar manifestam a imprescindível relação do conhecimento com a
realidade.
O número três que ora encaminhamos a comunidade científica congrega
– como nas edições anteriores – o esforço compartilhado de professores e
pesquisadores do Direito, do Direito Ambiental e de áreas afins em construir
um conhecimento jurídico permeado pelo diálogo inter e transdisciplinar, para
a compreensão e explicação do complexo espaço amazônico.
Neste sentido, da defesa da função sócio-ambiental como novo
paradigma da propriedade contemporânea, como postura crítica de Alaim
Giovani Fortes Stefanello ao novo sujeito histórico de François Houtart, as
abordagens cingem-se do compromisso com o futuro, nas densas reflexões
sobre o presente, como nos mostra Eduardo Saxe-Fernández ao diagnosticar os
colapsos eco-sociais, ontológicos e globais, e José Augusto Drummond ao
abordar o desenvolvimento socioeconômico da Amazônia, entre outros que
integram o presente volume da Hiléia.
Agradecemos aos colaboradores, ao Magnífico Reitor da Universidade
do Estado do Amazonas, professor Lourenço dos Santos Pereira Braga, pelo
incansável apoio ao PPGDA, ao mestrando Alaim Giovani Fortes Stefanello,
representante discente do mestrado e presidente do Centro de Estudos em
Direito Ambiental da Amazônia, ao professor Sérgio Rodrigo Martinez e
Rafael Calixto pela elaboração e revisão dos resumos em língua estrangeira e,
finalmente, ao patrocínio da Caixa Econômica Federal, contribuição
inestimável para a cultura jurídica no Amazonas.
Fernando Antônio de Carvalho Dantas
Presidente do Conselho Editorial
Hiléia – Revista de Direito Ambietal da Amazônia, n.o 3 | jul-dez | 2004
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PARTE I
LOS MOVIMIENTOS SOCIALES Y LA CONSTRUCCIÓN DE UN NUEVO SUJETO HISTÓRICO
F r a n ç o i s H o u t a r t . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .1 3
1. Por que un nuevo sujeto histórico? . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .14
2. Los movimientos sociales . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .17
3. Como construir el nuevo sujeto histórico? . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .20
UN MUNDO QUE SE HUNDE: LOS COLAPSOS ECOSOCIALES, ONTOLÓGICOS Y GLOBALES
E d u a r d o S a x e - F e r n á n d e z . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .2 5
Introducción . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .26
1. Los colapsos ontológicos ecosociales . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .33
2. El colapso social mundial . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .43
3. El colapso ecológico mundial . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .58
Conclusiones . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .70
TRÊS MEDIÇÕES, UMA REGIÃO TROPICAL DE FRONTEIRA,E APENAS UM ACHADO:
DESENVOLVIMENTO SOCIOECONÔMICO DA REGIÃO AMAZÔNICA BRASILEIRA, 1953-1996.
J o s é A u g u s t o D r u m m o n d . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .7 5
Introdução. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .76
1. Contexto analítico . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .76
2. Medição n.º 1 - Haller e colaboradores testando diretamente a . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .79
hipótese de Bunker com dados macro-regionais válidos para 1970 e 1980
3. Medição n.º 2 - FJP, FIBGE e IPEA constróem uma base de dados original . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .82
4. Medição n.º 3 – mudanças anuais no Amapá, 1953-1996 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .87
Sintese e Conclusões. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .90
EL DERECHO AMBIENTAL EN ARGENTINA
C a r l o s B o t a s s i . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .9 5
1. Ambiente y Derecho Ambiental . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .96
2. Los Principios Generales del Derecho Ambiental . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .99
3. Las Relaciones Internacionales . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .102
4. Los Artículos 41 y 43 de La Constitución Nacional . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .103
5. Reparación Del Daño Ambiental . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .110
6. Legislación Ambiental . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .116
7. Protección Administrativa y Judicial del Medio Ambiente . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .117
Síntesis Final . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .119
MODERNIDADE: NASCIMENTO DO SUJEITO E SUBJETIVIDADE JURÍDICA
M a r i a d e F á t i m a S . W o l k m e r . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .1 2 1
Introdução . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .122
1. Modernidade e Nascimento do Sujeito . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .122
2. A Questão do Direito na Modernidade . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .141
Conclusão . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .146
POLÍTICA INDIGENISTA DO AMAZONAS: PERSPECTIVAS E TENDÊNCIAS NO SÉCULO XXI
M a r c o s A n t o n i o B r a g a d e F r e i t a s . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .1 4 9
1. Breve contextualização da política indigenista no cenário nacional . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .150
2. A Política Indigenista do Amazonas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .151
3. Princípios norteadores da política indigenista no Estado do Amazonas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .154
4. Política indigenista e o movimento indígena . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .156
Considerações finais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .159
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LOS MOVIMIENTOS SOCIALES Y LA
CONSTRUCCIÓN DE UN NUEVO
SUJETO HISTÓRICO
François Houtart*
Sumário: 1. Por que un nuevo sujeto histórico? 2. Los movimientos sociales; 3. Como construir
el nuevo sujeto histórico?
Resumo: Este artigo trata da temática dos
movimentos sociais em face da construção de
um novo sujeito histórico. Na sua primeira
parte, o artigo busca explicar o porquê da
necessidade de um novo sujeito histórico. Para
tanto, é estabelecida uma evolução histórica
na qual se destaca o papel do Capitalismo na
estruturação da divisão entre capital e
trabalho. Ao se demonstrar como o modelo
capitalista busca a acumulação de riquezas,
verifica-se o estabelecimento das contradições
do modelo, ao passo em que impõe sua
dominação sobre povos e populações, cujo
alcance atualmente é global. Nesse sentido,
observa a necessidade da construção de um
novo sujeito histórico popular, plural e
democrático, capaz de atuar sobre essa
realidade existente. Na sua segunda parte, o
artigo trata dos movimentos sociais, nascidos
das contradições do modelo capitalista.
Demonstra suas dificuldades e sugere como
tais movimentos devem proceder para atuarem
enquanto sujeitos históricos responsáveis pela
transformação do modelo atual. Na sua parte
final, o artigo procura demonstrar que a
construção de um novo sujeito histórico
perpassa pela criação de uma consciência
coletiva ética e analítica da realidade. Para
tanto, alguns exemplos são apresentados de
atores coletivos, cujas contribuições
demonstram a possibilidade do surgimento de
um novo sujeito histórico.
Abstract: This article deals with the thematic
of the social movements in face of the
construction of a new historical subject. In its
first part, the article explains the reason why
the new historical subject is requested. In
order to do that, it is established a historical
evolution in which the role of Capitalism in
the arrangement of the division between
capital and work. It demonstrates the
contradictions of the model, while it imposes
its domination on peoples and populations,
whose currently reach is global. In this sense,
it observes the necessity of the construction of
a new popular historical subject, plural and
democratic, capable of acting on this existing
reality. In its second part, the article deals with
the social movements, born from the
contradictions of the capitalist model. It
demonstrates its difficulties and it suggests
how such movements must proceed to act
while responsible historical subjects for the
transformation of the current model. In its
latter part, the article seeks to demonstrate that
the construction of a new historical subject
goes by the creation of an ethical and
analytical collective conscience of the reality.
As to that, some examples of collective actors
are presented, whose contributions demonstrate the possibility of a new historical subject.
Palavras-chave: Movimentos Sociais; Sujeito
Histórico; Sociedade.
Key-words: Social Movements; Historical
Subject; Society.
*
Doutor em Sociologia. Professor da Universidade de Louvain-la-Neuve, Bélgica. Diretor da Revista Alternatives Sud. Diretor
do Centro Tricontinental – CETRI. Presidente do Fórum Mundial de Alternativas
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Este encuentro: “No al ALCA - Otra América es posible”, se hizo
tradición y forma parte de manera estratégica del pacto del Nuevo Sujeto
Histórico. Podemos situar este proceso al final de los años 80, 25 años después
del Consenso de Washington y 10 años después de la caída del muro de Berlín.
Un tal paso fue preparado por varias iniciativas: el PPXXI (People’s
Power twenty one) en Asia, el encuentro “intergaláctico” de los Zapatistas en
Chiapas, el Otro Davos que reunió al principio de 1999, varios movimientos
sociales de 4 continentes en Zúrich y en Davos, la misma semana que el Foro
Económico Mundial.
Todo eso desembocó por una parte en la cadena de protestas sistemáticas
contra los centros de poder global: OMC, Banco Mundial, FMI, G8, Cumbre
Europea, Cumbre de las Américas y por otra parte sobre los Foros Sociales
mundiales, continentales, nacionales y temáticos, lugares de convergencia de
movimientos y organizaciones luchando contra el neoliberalismo. Los
movimientos sociales jugaron un papel central en este proceso. Se trata ahora
de esbozar un cuadro general de reflexión sobre la marcha de los eventos.
1.
POR QUE UN NUEVO SUJETO HISTÓRICO?
La historia de la humanidad se caracteriza por una multiplicidad de
sujetos colectivos, portadores de valores de justicia, de igualdad, de derechos
y protagonistas de protestas y luchas. Recordamos por ejemplo, la revuelta de
los esclavos, las resistencias contra las invasiones en África y Asia, las luchas
campesinas de la Edad Media en Europa, las numerosas resistencias de los
pueblos autóctonos de América, los movimientos religiosos de protesta social
en Brasil, Sudan, China.
Un salto histórico se da cuando el capitalismo construye, después de 4
siglos de existencia, las bases materiales de su reproducción que son la división
del trabajo y la industrialización. Nace el proletariado como sujeto potencial, a
partir de la contradicción entre capital y trabajo. Los trabajadores están
sometidos al capital dentro del proceso mismo de la producción haciendo que
la clase obrera sea totalmente absorbida al igual que constituida por el capital.
Es lo que Carlos Marx llamó la subsumpción real del trabajo por el capital.
La nueva clase se transformó en sujeto histórico cuando se construyó en
el seno mismo de las luchas, pasando del estatuto de “una clase en sí a una
clase para sí”. No era el único sujeto, pero sí, el sujeto histórico, es decir el
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instrumento privilegiado de la lucha de emancipación de la humanidad, en
función del papel jugado por el capitalismo. Este último no se situaba
solamente en el plan de la economía, sino también orientaba la configuración
del Estado-Nación, las conquistas coloniales, las guerras mundiales, sin hablar
de su papel como vehículo privilegiado de la modernidad. Evidentemente la
historia de la clase obrera como sujeto histórico no fue lineal. Hubo el paso de
movimiento a partido político y del plan nacional al plan internacional, pero
también éxitos y fracasos, victorias y recuperaciones.
Hoy día, el sujeto social se amplifica. El capitalismo realiza un nuevo
salto. Las nuevas tecnologías extienden la base material de su reproducción: la
informática y la comunicación, que le dan una dimensión realmente global. El
capital necesita una acumulación acelerada para responder al tamaño de las
inversiones en tecnologías cada vez más sofisticadas, para cubrir los gastos de
una concentración creciente y encontrar las exigencias del capital financiero
que después de la flotación del dolar en 1971 se transformó masivamente en
capital especulativo.
Por estas razones, el conjunto de los actores del sistema capitalista
combatieron tanto el keynesianismo y sus pactos sociales entre capital, trabajo
y Estado, el desarrollo nacional del Sur (el modelo de Bandung, según Samir
Amin) como el desarrollismo cepalino (en América Latina) y los regímenes
socialistas. Empezó la fase neoliberal del desarrollo del capitalismo llamada
también el Consenso de Washington. Esta estrategia se tradujo en una doble
ofensiva, contra el trabajo (disminución del salario real, deregulación,
deslocalización) y contra el Estado (privatizaciones). Hoy asistimos también a
una búsqueda de nuevas fronteras de acumulación, frente a las crisis tanto del
capital productivo como del capital financiero: la agricultura campesina que
tiene que convertirse en una agricultura productivista capitalista, los servicios
públicos que deben pasar al sector privado y la biodiversidad, como base de
nuevas fuentes de energía y de materia prima.
El resultado es que ahora todos los grupos humanos sin excepción están
sometidos a la ley del valor, no solamente la clase obrera asalariada
(subsumpción real), sino los pueblos autóctonos, las mujeres, los sectores
informales, los pequeños campesinos, bajo otros mecanismos, financieros
(precio de las materias primas o de los productos agrícolas, servicio de la deuda
externa, paraísos fiscales, etc) o jurídicos (las normas del FMI, del Banco
Mundial de la OMC), todo eso significando una subsumpción formal.
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Otro resultado es el hecho que el carácter destructor del capitalismo
(según la expresión de Schumpeter) toma el paso sobre su carácter creador (de
bienes y servicios). Más que nunca, el capitalismo destruye, como lo notaba
hace casi más de un siglo y medio, Carlos Marx, las dos fuentes de su riqueza:
la naturaleza y los seres humanos. En verdad, la destrucción ambiental afecta
a todos y la ley del valor incluye hoy a todos. La mercantilización domina la
casi totalidad de las relaciones sociales, en campos cada vez más numerosos
como el de la salud, la educación, la cultura, el deporte o la religión.
Además, la lógica capitalista tiene su institucionalidad. Recordemos
primero que se trata de una lógica y no de un complot de algunos actores
económicos (sino bastaría convertirlos y corregir abusos y excesos). Me
acuerdo de un empresario de Santo Domingo, testigo de Jehová, que decía a
propósito de sus obreros, que amaba de un amor muy cristiano: “llamo mis
trabajadores, magos, porque no sé como pueden vivir con el salario que les
doy”. El cambio exige una acción estructural, hoy globalizada, de actores
determinados con agendas precisas.
El capitalismo globalizado tiene sus instituciones: la OMC, el Banco
Mundial, el FMI, los bancos regionales y también sus aparatos ideológicos:
medios de comunicación social, cada vez más concentrados en pocas manos.
Finalmente, goza del poder de un imperio, los Estados Unidos. El dolar de este
país es la moneda internacional. Los Estados Unidos tienen el único derecho
de veto en el Banco Mundial y en el FMI, y un veto compartido en el Consejo
de Seguridad. Este país conserva casi un monopolio en el campo militar, con
la alta mano sobre la OTAN y la capacidad de empezar guerras preventivas. No
duda a intervenir militarmente en Irak o Afganistán para controlar las fuentes
de energía. Sus bases militares se extienden en el mundo entero y el gobierno
se atribuye la misión de reprimir las resistencias en el mundo entero, sin dudar
en utilizar la tortura y el terrorismo. Sin embargo, el imperio tiene sus
debilidades. La naturaleza se venga, la oposición antiimperialista hoy es
mundial. Otras señales de debilidad permiten a Imanuel Wallenstein de pensar
en lo que él llama “el largo siglo XX”, dominado por el capitalismo podría
encontrar su fin en la mitad de este siglo.
Por todas estas razones, el nuevo sujeto histórico se extiende al conjunto
de los grupos sociales sometidos, tanto los de la sumisión real (representados
por los llamados “antiguos movimientos sociales”) que los de la sumisión
formal (“nuevos movimientos sociales”).
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El nuevo sujeto histórico a construir será popular y plural, es decir
constituido por una multiplicidad de actores y no por la “multitud “ de la cuál
hablan Hardt y Negri. Un tal concepto es vago y peligroso porque
desmovilizador. La clase obrera guardará un papel importante, pero
compartido. Este sujeto será democrático, no solamente por su meta, sino por
el proceso mismo de su construcción. El será multipolar, en los varios
continentes y en las diversas regiones del mundo. Se tratará de un sujeto en el
sentido pleno de la palabra, incluyendo la subjetividad redescubierta,
abarcando todos los seres humanos, constituyendo la humanidad como sujeto
real (Franz Hinkelammert en su libro El Sujeto y la Ley, coronado por El
Premio Libertador). El sujeto histórico nuevo debe ser capaz de actuar sobre la
realidad a la vez múltiple y global, con el sentido de emergencia exigido por el
genocidio y el ecocidio contemporáneo.
2.
LOS MOVIMIENTOS SOCIALES
Los movimientos sociales son el fruto de contradicciones, hoy día
globalizadas. Para ser verdaderos actores colectivos suponen, según Alain
Touraine, un carácter de historicidad (situarse en el tiempo), una visión de la
totalidad del campo dentro del cual se inscriben, una definición clara del
adversario y una organización. Son más que una simple revuelta (las
“jacqueries” campesinas) más que un grupo de intereses (cámara de comercio),
más que una iniciativa autónoma del Estado (ONG).
Los movimientos nacen de la percepción de objetivos como metas de
acción, pero para existir en el tiempo necesitan un proceso de
institucionalización. Se crean roles indispensables para su reproducción social.
Así nace una permanente dialéctica entre metas y organización, con el peligro
de dominación de la lógica de la reproducción sobre las exigencias de los
objetivos. Hay un infinito número de ejemplos de esta dialéctica en la historia.
Así, el cristianismo nació, como lo dice el teólogo argentino Ruben Dri,
como “el movimiento de Jesús”, expresión religiosa de protesta social,
peligrosa para el imperio romano y reprimida por este último. Se transformó
por su inserción en la sociedad romana en una institución eclesiástica,
siguiendo el modelo de la organización política, centralizada, vertical y a
menudo aliada con los poderes de opresión. El peso institucional no mató el
espíritu, pero introdujo una contradicción permanente. El Concilio Vaticano II
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constituyó un esfuerzo de restablecer el predominio de los valores del mensaje
evangélico sobre el carácter institucional, pero en los años siguientes, él fue
bastante recuperado por una corriente de restauración.
Otro ejemplo es el caso de muchos sindicatos obreros y partidos de
izquierda. Fueron iniciativas de los trabajadores o de los medios populares en
lucha. Con el tiempo se transformaron en burocracias definiendo sus tareas en
términos solamente defensivos, es decir en función de la agenda del adversario
y no del proyecto de transformación radical del sistema. En el caso particular
de los partidos políticos, es la lógica electoral que predomina sobre el objetivo
original y que define las prácticas, lo que significa una lógica de reproducción
y no una perspectiva de cambio profundo (revolucionario). Eso no impide la
presencia de muchos militantes auténticos en estas organizaciones, pero
significa que están encerrados en una lógica que los sobrepasa.
Sin embargo la realidad social no está predeterminada y se puede actuar
sobre los procesos colectivos. Para que los movimientos sociales estén en
posición de construir el nuevo sujeto social hay dos condiciones preliminares.
En primer lugar tener la capacidad de una crítica interna con el fin de
institucionalizar los cambios y asegurar una referencia permanente a los
objetivos. En segundo lugar, captar los desafíos de la globalización, que a la
vez son generales y específicos al campo de cada movimiento: obrero,
campesino, de mujeres, populares, de pueblos autóctonos, de juventud, en
breve de todos los que son las víctimas del neoliberalismo globalizado.
Pero existen también otras exigencias. Los movimientos sociales que se
definen como la sociedad civil tienen que precisar que se trata de la sociedad civil
de abajo, recuperando así el concepto de Gramsci que la considera como el lugar
de las luchas sociales. Eso impide de caer en la trampa de la ofensiva semántica
de los grupos dominantes, como el Banco Mundial, para los cuales ampliar el
espacio de la sociedad civil significa restringir el lugar del Estado, o también en
la ingenuidad de muchas ONGs para las cuales la sociedad civil es el conjunto
de todos los que quieren el bien de la humanidad. En el plan global, la sociedad
civil de arriba se reúne en Davos y la sociedad civil de abajo en Porto Alegre.
Otra exigencia para construir el nuevo sujeto histórico es construir el
vínculo con un campo político renovado. En los primeros tiempos de los Foros
Sociales había un real miedo hacia los órganos de la política, en parte por
razones justas: repudio de la instrumentalización por necesidades electorales o
como simple herramienta de partidos en el poder, y en parte por una actitud de
principio anti-estatal, especialmente en ciertas ONGs. De ahí, el éxito de las
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tesis de John Holloway que se pregunta como cambiar las sociedades sin tomar
el poder. Si se trata de afirmar que la transformación social exige mucho más
que la toma del poder político formal, ejecutivo o legislativo, esta perspectiva
es plenamente aceptable, pero si significa que cambios fundamentales como
una reforma agraria o una campaña de alfabetización se pueden realizar sin el
ejercicio del poder, es una total ilusión..
Así, los movimientos sociales deben contribuir a la renovación del
campo político, como lo indica muy bien Isabel Rauber en su libro Sujetos
políticos. La pérdida de credibilidad de los partidos políticos es una realidad
mundial y es urgente de encontrar la manera de realizar una reconstrucción del
campo. Un ejemplo interesante es el la República Democrática del Congo
(Kinshasa), donde los movimientos y organizaciones de base se movilizaron
para la organización de las elecciones de julio 2006. Después de 40 anos de
dictadura y de guerras (en los últimos 5 años hubo más de 3 millones de
víctimas), las fuerzas populares de la base de la población, a pesar de todos los
esfuerzos de fragmentación del país para controlar más fácilmente los recursos
naturales, afirmaron la necesidad de defender la integridad de la nación y
salvaron esta última de su desmantelamiento. Por otra parte, ellas están
inventando formas de democracia participativa, conjuntamente con la
democracia representativa. Miles de organizaciones locales, de mujeres, de
campesinos, de pequeños comerciantes, de jóvenes, de comunidades cristianas
católicas y protestantes, se movilizaron para presentar candidatos, ligados por
pacto a las comunidades (portavoces y no representantes como lo dice la ley de
consejos comunales de Venezuela), al nivel local y provincial, con algunos a
nivel nacional, pero sin candidato a la presidencia, porque estiman que primero
debe consolidarse el proceso desde abajo. Es una verdadera reconstrucción de
un campo político, casi completamente destruido por las prácticas (corrupción
y tribalismo) de los partidos existentes.
Finalmente, será muy importante para las convergencias de los
movimientos sociales encontrar la manera de aglutinar las numerosas
iniciativas populares locales que no se transforman en movimientos
organizados, a pesar del hecho que representan una parte importante de las
resistencias (a nivel de pueblos o de regiones, contra una represa, contra la
privatización del agua, la electricidad, la salud, contra la entrega de selvas a
empresas transnacionales, etc.). Existen ejemplos, como en Sri Lanka,
MONLAR, la organización que lucha para la reforma agraria y que reagrupa
más de 100 iniciativas locales, además de ser un movimiento campesino
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nacional. Realizaron una acumulación de fuerzas capaces de actuar al nivel del
país, como órgano de protesta (manifestaciones nacionales) y también de
diálogo y de confrontación con el Gobierno y con el Banco Mundial.
3.
COMO CONSTRUIR EL NUEVO SUJETO HISTÓRICO ?
Varios pasos son necesarios para producir el nuevo sujeto histórico. La
primera condición es de elaborar una consciencia colectiva basada sobre un
análisis de la realidad y sobre una ética.
En cuanto al análisis se trata de utilizar instrumentos capaces de estudiar
los mecanismos de funcionamiento de la sociedad y de entender sus lógicas,
con criterios que permitan distinguir efectos y causas, discursos y prácticas. No
se trata de cualquier tipo de análisis, sino del aparato teórico crítico lo más
adecuado para responder al grito de los de abajo. Exige un rigor metodológico
alto y una apertura a todas las hipótesis útiles para este fin. La opción en favor
de los oprimidos es un paso precientífico e ideológico, que va a guiar la
elección del tipo de análisis, sin embargo este último pertenece al orden
científico sin concesión posible. Es un saber nuevo que ayudará a crear la
conciencia colectiva.
Tomamos un ejemplo contemporáneo. Se habla mucho de los objetivos
del Milenio, decididos por los jefes de Estado en Nueva York en el año 2000.
¿Quién podría estar en contra de la eliminación de la pobreza y de la miseria
(pobreza absoluta) y en favor del desarrollo? Por eso hubo unanimidad.
Además del hecho que el objetivo para el año 2015 es solo reducir de la mitad
la extrema pobreza, lo que significa que en este año todavía el mundo se
encontrará con más de 800 millones de pobres (ya una vergüenza), todo indica
que será muy difícil lograr los objetivos previstos. La razón es que no se criticó
la lógica fundamental del tipo de desarrollo que favorece a los 20 % de la
población de los países del Sur. Esta minoría crece de manera espectacular,
formando una base de consumo apreciable para el capital y acentuando la
visibilidad de una cierta riqueza. Al mismo tiempo, las distancias sociales
aumentan. Para entender esta contradicción se debe criticar el concepto mismo
del desarrollo, del cual dependen los criterios adoptados para definir los
objetivos del Milenio. No entran en su definición elementos cualitativos come
el bienestar, la igualdad, la soberanía alimentaria y otros más. Es por eso que
Marta Harnecker en el Centro Miranda de Caracas, trabaja sobre la creación de
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herramientas analíticas para medir los criterios del desarrollo. De hecho, los
conceptos utilizados por las Naciones Unidas son los del mercado y no los de
la vida de los seres humanos.
El segundo elemento que contribuye a la construcción de una conciencia
colectiva es la ética. No se trata de una serie de normas elaboradas en abstracto,
sino de una construcción constante por el conjunto de los actores sociales en
referencia a la dignidad humana y al bien de todos. Las definiciones concretas
pueden cambiar según los lugares y las épocas y cuando se trata de la realidad
globalizada, la perspectiva ética tendrá que ser elaborada por el conjunto de las
tradiciones culturales: eso es el concepto real de los derechos humanos. La
ética en este sentido no es una imposición dogmática, sino una obra colectiva
que tiene sus referencias en la defensa de la humanidad.
Podemos decir que el logro principal de los Foros Sociales, como
convergencias de movimientos y de organizaciones populares, ha sido la
elaboración progresiva de una conciencia colectiva, con varios niveles de
análisis y de comprensión y con una ética a la vez de protesta contra todo tipo
de injusticia y desigualdad, y de construcción social democrática de “un otro
mundo posible”. La existencia de los Foros es en si mismo un hecho político,
además de los muchos otros logros, como la constitución de redes, el
intercambio de alternativas, el funcionamiento en su seno de la Asamblea de
los movimientos sociales y la contribución de intelectuales comprometidos.
Después de la elaboración de una conciencia colectiva, el segundo paso
necesario es la movilización de los actores plurales, populares, democráticos y
multipolares. Aquí nos encontramos con el aspecto subjetivo de la acción. Los
actores humanos son seres completos y no actúan solamente en función de la
racionalidad de las lógicas sociales. El compromiso es un acto social
caracterizado por un elemento afectivo fuerte y aún central. De ahí, la
importancia de la cultura como conjunto de las representaciones de la realidad
y también de los innumerables canales de su difusión: el arte, la música, el
teatro, la poesía, la literatura, la danza. La cultura es una meta, pero también un
medio de emancipación humana.
Lo mismo se puede decir papel potencial de las religiones, donde se
encuentran referencias existenciales humanas fundamentales: la vida, la
muerte, en referencia con una fe que se puede compartir o no, pero que no se
puede ignorar. Eso fue un error grave de un cierto tipo de socialismo. El
potencial religioso libertador es real. Además las religiones pueden aportar una
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espiritualidad y una ética colectiva y personal indispensables para la
reconstrucción social.
El tercer elemento esta constituido por las estrategias para lograr los tres
niveles de alternativas. El primero es la utopía, en el sentido de lo que no existe
hoy, pero que puede ser realidad mañana, es decir una utopía no ilusoria, sino
necesaria como decía el filósofo francés Paul Riqueur. ¿Que tipo de sociedad
queremos? ¿Cómo definir el postcapitalismo o el socialismo? La utopia
también es una construcción colectiva y permanente, no una cosa que viene del
cielo. Necesita para su cumplimiento una acción a largo plazo: cambiar un
modo de producción no se hace con una revolución política, aún si ella puede
significar el inicio de un proceso. El capitalismo tomo cuatro siglos para
construir las bases materiales de su reproducción: la división del trabajo y la
industrialización. Los cambios culturales que son parte esencial del proceso
tienen un ritmo diferente de las transformaciones políticas y económicas.
Los otros dos niveles, el medio y el corto plazo, dependen de las
coyunturas, pero deben ser el objeto de estrategias concertadas y realizadas en
convergencia, entre actores sociales diversos. Son el lugar de las alianzas. Sin
embargo, no es la simple suma de alternativas en los sectores económicos,
sociales, culturales, ecológicos, políticos que permitirá a un sujeto histórico nuevo
de salir adelante. Se necesita una coherencia. Esta última también sera obra
colectiva y no el resultado de un monopolio del saber y del conocimiento por una
vanguardia depositaria de la verdad. Será un proceso constante y no un dogma.
Desde este punto de vista es importante subrayar el carácter indispensable
de algunos actos colectivos estratégicos, aún parciales, pero que reagrupan un
conjunto de actores sociales diversos en una iniciativa significante en relación
con la dimensión utópica del proyecto global. Felizmente existen varios
ejemplos en este sentido, de los cuales recordamos dos.
La campaña contra el ALCA reunió muchos movimientos sociales,
desde los sindicatos hasta los campesinos, pasando por las mujeres y los
indígenas. ONGs de diversos índoles se juntaron a la iniciativa. En algunos
países Iglesias tomaron posición contra el tratado. Se utilizó métodos muy
variados de acción, hasta referéndums populares que recogieron millones de
firmas. Otro ejemplo es el plan alternativo popular de reconstrucción después
del tsunami en Sri Lanka. El plan oficial administrado por el Banco Mundial
preveía esencialmente el desarrollo del turismo internacional y no respondía a
las necesidades de base de la población mayoritaria. Era la manera de acelerar
la política neoliberal de alcance mundial. Por eso se constituyó una alianza
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amplia de movimientos y organizaciones sociales, incluidas instituciones
budistas y cristianas, para oponerse al plan gubernamental y proponer
soluciones alternativas.
Frente a la necesitad de una perspectiva de acción al nivel mundial, dos
iniciativas complementarias se tomaron la red “En Defensa e la Humanidad”,
fundada en México bajo la impulsión de Pablo González Casanova y que tiene
capítulos de varios países, especialmente latinoamericanos y el “Llamamiento de
Bamako” promovido por el Foro Mundial de Alternativas (iniciado en Lovainala-Nueva en 1996 en ocasión al 20° aniversario del Centro Tricontinental y
fundado oficialmente en El Cairo el año siguiente), el Foro del Tercer Mundo
(Dakar), Enda (una ONG africana) y el Foro Social de Mali. En Defensa de la
Humanidad propuso la constitución de una promotora destinada a reunir y
proponer acciones comunes y el Llamamiento de Bamako definió 10 áreas para
pensar y proponer actores colectivos y estrategias, inspirándose en gran parte del
Manifiesto de Porto Alegre elaborado por un grupo de intelectuales durante el
Foro Social Mundial de 2005. Estas dos iniciativas complementan el trabajo de
la Asamblea de Movimientos que dentro de cada Foro elabora un documento y
propone campañas (como la manifestación contra la guerra en Irak, que en 2003,
reunió más de 15 millones de personas en 600 ciudades del mundo).
Finalmente dentro de la perspectiva general se necesitan victorias
parciales pero significantes. Mantener la acción, entretener la motivación,
exige resultados. No se trata de cualquier logro, sino de los que movilizaron
varios actores sociales en una acción común, sobre objetivos relacionados a
una visión de conjunto y de dimensión global. Hay también en este aspecto
varios ejemplos importantes. De nuevo se puede citar la campaña
latinoamericana contra al el Alca. En Europa, el no al tratado constitucional
elaborado en una orientación neoliberal y con una sumisión a los Estados
Unidos en el campo militar, es otro ejemplo. El rechazo con éxito del contrato
de primer empleo en Francia y el abandono de la base naval de los Estados
Unidos de Vieques en Puerto Rico, después de una larga movilización popular
son otros casos de ejemplos. Y en el ámbito político, la elección del primer
presidente indígena en Bolivia tiene también un sentido muy amplio de victoria
en los planes culturales, sociales, y económicos.
En conclusión podemos decir que ya esta trazado el camino para pasar
de la elaboración de una conciencia colectiva a la construcción de actores
colectivos y que todo eso anuncia el amanecer del sujeto histórico nuevo.
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UN MUNDO QUE SE HUNDE: LOS
COLAPSOS ECOSOCIALES,
ONTOLÓGICOS Y GLOBALES
Eduardo Saxe-Fernández*
Sumário: Introducción; 1. Los colapsos ontológicos ecosociales; 2. El colapso social mundial;
3. El colapso ecológico mundial; Conclusiones.
Resumo: Este artigo trata da temática de crise
atual mundial, em seus aspectos globais,
ecológicos, sociais e existenciais. Em sua
primeira parte, procura demonstrar como a
história da humanidade é cercada de conflitos
e destruições sociais e ambientais. O artigo faz
um aporte sobre a questão dos conflitos, cujas
conseqüências em esfera global provocam
destruição. Na segunda parte do artigo é
observada a análise sobre os colapsos
ontológicos ecosociais. Nessa parte, o artigo
procurar elucidar os conceitos básicos sobre a
temática e estabelecer sua evolução, até o
entendimento da idéia de colapso mundial, o
qual é apresentado como decorrência do atual
modelo de crescimento econômico e consumo
dos recursos naturais. Socialmente, trata dos
efeitos atuais do modelo econômico mundial,
sobre a concentração de renda, o
empobrecimento da população mundial e os
efeitos sobre a crise na qualidade de vida da
população mundial. Ao seu final, destaca
como o modelo capitalista, manipulador da
natureza, ao sustentar uma visão patriarcal e
militarista do mundo, proporciona a
ocorrência do colapso global.
Abstract: This article deals with the thematic
of world-wide current crisis, in its ecological,
global and social aspects. In its first part, it
aims to demonstrate how the historical part of
the humanity is surrounded by conflicts,
whose effects are social and environmental
destructions. The article deals with the
question of the conflicts, whose consequences
cause destruction in global sphere. In the
second part of the article, the analysis of ecosocial ontological collapses is observed. In
this part, the article aims to elucidate the basic
concepts of thematic and to establish its
evolution, until the understanding of the
world-wide collapse idea, which is presented
as result of the current model of economic
growth and consumption of the natural
resources. Socially, it deals with the current
effect of world-wide economic model, with
the income concentration, with the
impoverishment and the effect on the crisis in
the quality of life of the world-wide
population. At its end, it highlights how the
capitalist model, manipulator by nature, when
supporting a patriarchal vision of the world,
provides the occurrence of the global collapse.
Palavras-chave: Colapsos Sociais; Ecologia;
Globalização.
Key-words: Social Collapses; Ecology;
Globalization.
*
Professor Titular da Escola de Relações Internacionais da Universidad Nacional da Costa Rica.
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INTRODUCCIÓN
Durante la mayor parte de su historia, la humanidad ha sobrevivido y ha
sucumbido en conflictos y destrucciones sociales y ambientales. Muchos grupos,
pueblos, naciones, parajes, regiones y continentes se autodestruyeron, o fueron
destruidos, en guerras (muerte y esclavitud) o provocando (o sufriendo) cataclismos
ecológicos; o ambos. La humanidad sobrevivió, creció y se extendió por casi todos los
continentes durante los últimos cuatro millones de años, pese a esas destrucciones. En
América, la megafauna del Pleistoceno fue destruida por los cambios climáticos que
conducían al Holoceno, así como por la acción de predadores humanos. Las grandes
civilizaciones históricas antiguas, sin embargo, florecieron hace no mucho tiempo, por
ejemplo los sumerios vivieron apenas hace unos cinco o seis mil años.1 Con ellas
empezó a crecer la capacidad humana para alterar la naturaleza y para matar ( animales
y, sobre todo, otros seres humanos). Luego, con la expansión europea (cristianismo
capitalista) a todo el planeta desde hace apenas unos seiscientos años y sobre todo a
partir del siglo XIX, las dimensiones de los procesos destructivos militares,
económicos, sociales, políticos, y ambientales, no han cesado de magnificarse, como
regla básica de supervivencia de esa civilización (Cf. Leakey & Lewin, 1997).
Durante el siglo XX esa capacidad de muerte mundial llegó a significar,
disponer de armas capaces de matar al menos 500 veces a cada persona viva en
el plantea. En el siglo XXI el capitalismo del patriarcado tardío profundiza la
destructividad y autodestructividad humanas, centrando la “humanidad” en el
hiperegoísmo posesivo agresivo. Instila esa violencia universalmente
hacia/desde cada persona (sujeto de pro-terror y contra-terror), conforme la
naturaleza holocénica y la sociedad humana colapsan.
Hoy día, militarmente, EE.UU. y Rusia y estados sucesores de la URSS
mantienen capacidades para destruir unas 300 veces a cada ser humano vivo en
el planeta, solamente empleando armas termonucleares y sin contar
convencionales, bioquímicas y otras. Francia, Inglaterra, Israel, la RP China, la
India, y Pakistán, también poseen capacidades militares termonucleares para
infligir graves daños al mundo y la humanidad.
Social y económicamente, a principios del siglo XXI cristiano, unos 600
millones de personas controlan más del 75% de la riqueza mundial, mientras
que otros 5.400 millones de personas deben compartir el 25% restante; y 1.200
1
26
Véase el clásico de S.N.Kramer (1962), sobre los grandes aportes sumerios a las civilizaciones, incluyendo la escritura.
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millones de las personas tratan de sobrevivir con algo más del 2% de la riqueza
mundial. Al mismo tiempo, los aparatos militares del mundo cuestan casi 1
billón de euros (un millón de millones) al año; se gastan decenas de millones
de dólares en el consumo superfluo (incluyendo decenas de miles de millones
de euros para las mascotas domésticas, por ejemplo), o para realizar
exploraciones espaciales. El derrumbe moral de esta contradicción señalada
por Marcuse, lanza a la humanidad por la senda de la violencia. Para que no
nos hastiemos de la violencia (como preveía Kant), se la hace el centro del
individuo que a su vez es centro ideológico, y se la salpica con mucha pimienta
sexual, desarrollando patologías psicosociales que se expresan en éticas
nihilistas y tanásicas.
Si los recursos no fueran despercidiados de esa manera, en menos de un
lustro los centenares de millones de pobres podrían solucionar sus problemas
de vivienda, salud, educación y de fuentes de trabajo. Esos recursos serían
también suficientes para implementar nuevas fuentes y formas de organización
del espacio y la vida, energéticas y productivas, de las que ya tenemos
suficiente conocimiento científico y concreción tecnológica. Con la
reconstrucción social mundial, además, la muy vapuleada y devastada
naturaleza podría empezar a reconstituirse. Un resultado similar se puede
obtener, en solo un año, imponiendo un impuesto del uno por ciento (1%) a las
200 corporaciones más grandes del mundo.
Ecológicamente, observamos que los procesos destructivos tienden a
encadenarse, provocando sinergias devastadoras entre diferentes ecosistemas o
componentes de los mismos. Las características de cruciales procesos
ecológicos mundiales se van extremando, agudizándose sus características
(más frío y más calor, más lluvia y más sequía; “rupturas” repentinas de la
atmósfera o de montañas y laderas, o la creciente extensión de zonas
desoxigenadas en el mar – donde sucumbe la vida). No sabemos cuándo esas
sinergias provocarán un “salto”, un colapso, un cataclismo, como por ejemplo
nuevas y mayores rupturas o desagregaciones de la atmósfera mundial.
El capitalismo global, triunfante y guerrero ha sido y es excluyente, no
solo de todo otro sistema (social político económico y militar), sino
especialmente de la mayoría de lo/as seres humanos; y es excluyente de la
naturaleza, porque solo se relaciona con ella destruyéndola o sustituyéndola.
En el siglo XXI, el capitalismo “equivale” a un cáncer en metástasis, que ataca
la humanidad y el planeta, pues su crecimiento destruye al ser que le da origen
pero que no constituye su sentido.
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El continuado centramiento en el petróleo como fuente estratégica
energética y la articulación del aparato militar de EE.UU. y las otras grandes
potencias alrededor de este “régimen internacional”, son el principal foco de
problemas ambientales y político militares del planeta. Continuar basando el
régimen energético/económico en el consumo de petróleo, es la apuesta
irresponsable de quienes dirigen ahora EE.UU. (dueños de empresas
petroleras, e institucionalmente ubicados en el sector de seguridad y militar).
Para garantizarse el control mundial de este recurso estratégico que empieza a
escasear cada vez más, y como componente central de su aspiración
hegemónica, EE.UU. primeramente se apoderó de Afganistán y más
recientemente de Irak. Así, según Oliver Roy, la rápida expansión de los
talibanes afganos y la toma de Kabul el 26 de setiembre de 1996, “...no pueden
comprenderse sin el apoyo directo de los servicios paquistaníes, con el acuerdo
de Estados Unidos y Arabia Saudita, en el marco de un gran proyecto que
apunta a la exportación de los hidrocarburos de Asia central por Afganistán y
Pakistán, en detrimento de Irán y Rusia.”(1999: 221).
Más bien, es de prever que EE.UU. tendrá que retirar tropas de Europa
y del Asia del Pacífico, para concentrarse en las zonas petrolíferas meso
orientales, lo cual ofrecerá más margen de maniobra a la UE y a las emergentes
grandes potencias asiáticas (China, Japón, India, Corea).
Respecto de Irak, tanto Clinton como Bush II. lo han atacado utilizando
argumentos falsos, de acuerdo con planificaciones realizadas por los militares
de EE.UU. Así por ejemplo, durante la administración Clinton, mientras el jefe
de inspectores de la ONU, Richard Butler, “adobaba” los informes sobre
posesión de armas de destrucción masiva, siguiendo indicaciones del
Pentágono, un observador menos comprometido con la agresión de EE.UU. a
Irak sostenía que “...un arma está siempre constituida por dos elementos, la
carga y el lanzador; una y otro faltan en Bagdad... Excepto seis misiles Scud
que se sepa, Irak no tiene ya lanzadores aptos para bombardear a sus vecinos.
No es, pues, capaz de dispersar sobre ellos cargas químicas o
bacteriológicas”(Gresh: 1999: 93). Más recientemente, en el mes de noviembre
de 2003 venció el plazo que diera el Congreso de EE.UU. a sus militares, para
que presentaran pruebas sobre la posesión de armas de destrucción masiva por
parte del Irak de Sadam Hussein, pero esas pruebas siguen sin aparecer.
La “política de los hechos cumplidos” que aplicaba la dirigencia nazi
alemana es ahora también utilizada por Washington, característicamente en una
guerrra civilsocial mundial que cada día más opone a EE.UU. al resto del
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mundo, y a quienes poseen riqueza y poder, en general, frente a quienes cada
vez están más excluidos de una vida humana digna. Similarmente, la guerra
civilsocial mundial (Guerra contra el Terrorismo) implica la instauración de la
guerra como “institución nacional/internacional” para enfrentar y resolver
problemas y conflictos. Implica también la profundización y aceleración de la
destrucción de la naturaleza. Así, los “peligros” de destrucción masiva, social
y ecológica, adquieren ahora dimensión de “colapsos mundiales”.
Las guerras por los recursos, y el recurso a la guerra que caracterizaron
el imperialismo clásico decimonónico y que fueran esgrimidos por el régimen
nazi alemán (con mayor propiedad jurídica que hoy EE.UU. -Cf. González,
2005), reaparecen con el intento de hegemonía emprendido por el gobierno de
Washington, que también se autoconcibe como imperial si no ya como
imperialista.
(Su dificultad estriba en implantar o mantener una hegemonía en
condiciones de rechazo generalizado de la población (que se convierte, toda
ella, en “potenciales terroristas” para la doctrina oficial; población que es
tratada consecuentemente, por ejemplo por protestar contra la política de
mentiras para justificar la guerra), pero además, en un contexto mundial de
colapsos ecosociales, empleando medios que aceleran y agudizan la
destrucción del planeta (capitalismo mafioso de guerra estructural). Y,
particularmente, sus dificultades estratégicas aumentan si “debe hacerlo
militarmente, por haber sido atacado”, ya que la sobrerreacción y la
prepotencia en que incurre EE.UU., en el fondo ocultan debilidad estratégica:
a principios del siglo XXI no le es posible mantener la hegemonía
productivamente como entre 1945-1967, pero tampoco es posible mantenerla
financieramente como hasta el estallido de la burbuja electrónica a finales de
la ´decada de 1990 y la paralela salida a mercado del euro retador. La
hegemonía ideológica se ha venido derrumbando, conforme el patrioterismo de
guerra evolucionó hacia formas neo fascistas: rechazo y desprecio del derecho
y los tratados internacionales y sobre todo humanitarios, y discursos y política
cínicos (por ejemplo, Bush II burlándose, en una escena filmada para la
televisión en su despacho, porque no han aparecido las “armas de destrucción
masiva” de Sadam Hussein), que después de las experiencias históricas del
siglo XX en el fascismo euroasiático y en el posterior epígono periférico
(articulado por EE.UU.), ya no engañan a toda la gente, incapaces de ocultar
las torturas, las masacres, el desconocimiento de las leyes nacionales e
internacionales, el carácter ilegal e inhumano de tal régimen).
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El instrumento más a mano y aparentemente cada vez más necesario,
para la oligarquía de EE.UU. y mundial es el militar. Apuestan por la guerra de
agresión, eufemísticamente llamada “guerra preventiva”. EE.UU. solo
vislumbra una salida de crisis exitosa, mediante la guerra, esto es, mediante la
generación de anarquía sistémica para, en esas turbulentas aguas (“guerra
mundial contra el terrorismo”), aprovechar el diferencial de poder militar (que
es el decisivo en tales coyunturas –obviamente creen en el Pentágono y la Casa
Blanca), y así recuperar/reafirmar el control del planeta.
Se trata claramente de un hegemón en crisis, actuando como retador de
sí mismo, en tanto “heredero” del sistema internacional westfaliano que busca
destrozar. Como señala Carlos Eduardo Martins, durante
...(l)as confrontaciones que se establecieron en los períodos de
caos sistémico, los Estados que vieron frustrados sus proyectos de
dominación desarrollaron características fuertemente imperiales
de intervención... En el nuevo período histórico que se avecina,
los proyectos para mantener el capitalismo histórico buscarán
articular, desde el hegemón, un conjunto de fuerzas oligárquicas
bajo formas cada vez más fascistas. Esto se observa nítidamente
en las reacciones del gobierno Bush al atentado del 11 de
setiembre (2002: 36-37).
Martins aquí asume a EE.UU. como hegemón, pero hay que señalar que
lo es solamente en dimensiones militares (y no políticas ni económicas ni
ideológicas) y ello con crecientes dificultades, conforme la carrera
armamentística creada por su doctrina de guerra preventiva, hace que otros
estados y sujetos internacionales desarrollen medios para contrarrestar (a veces
con soluciones muy baratas) las costosas iniciativas militares y de espionaje de
EE.UU.
El costo del aparato policíaco militar en regímenes fascistoides siempre
ha sido superior al que pueda proporcionar una economía moderna
(similarmente con el socialismo burocrático estalinista), por lo que se torna
necesario apoderarse de riquezas o recursos adicionales, mediante la fuerza
(“raids” de saqueo). Para lograr esto, es necesario que la economía esté
hiperconcentrada en inmensos oligopolios mundiales, y en sistemas político
sociales articulados hobbesianamente, con un Leviatán de leviatanes (el estado
de EE.UU. y los grupos, camarillas y mafias asociadas en todo el mundo). Se
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trata, hoy, de un capitalismo rapaz como nunca antes (porque se acaban los
recursos; porque la “gente” puede ser tratada “peor que animales; como
enemigos”), inestable y cada vez más apoyado en las fuerzas armadas y de
seguridad, que discriminan entre “humanos” y “no humanos” (judíos,
comunistas, homosexuales para Hitler o Pinochet; “terroristas
fundamentalistas islámicos” o toda persona que no esté de acuerdo con Bush
II. hoy). Tales aventuras, históricamente tienden a terminar en tragedias y
genocidios de grandes proporciones. Esta vez, se trata de la destrucción del
mundo y de la humanidad.
Consecuentemente, no solo avanza el planeta de manera irreversible en
los procesos de destrucción ambiental y social, sino que para los estrategas del
grupo en el poder en EE.UU., esa destrucción y la consecuente inseguridad
ontológica, necesariamente (“!por dicha y suerte!” – pensarían lo/as así
interesado/as) van acompañadas por una creciente (“e imparable”) demanda
por seguridad, lo cual resultará en un buen negocio para ello/as (como
abanderado/as del aparato militar industrial universitario), además de
garantizarles la continuidad al frente del estado washingtoniano. Esta es la
dimensión “placentera” del dilema de la seguridad. La dolorosa es que la
amenaza no cesa de crecer y consecuentemente el pánico de los tiranos –por no
mencionar el dolor de la vida humana y la naturaleza destruidas, que no
incumbe a esos personajes.
Mientras continue la guerra mundial contra el terrorismo, el grupo Bush
espera allegar recursos tales, que los coloquen como uno de los más ricos en el
planeta. A su vez, tal riqueza se acumula recibiendo contratos del Pentágono en
Irak y aprovechándose de los elevados precios del petróleo. Se centra en los
sistemas militares y de seguridad. Y, con estos dos instrumentos, petróleo y
poder militar, pretenden mantenerse en el poder indefinidamente o ser parte y
voz líderes, de él. Esto que quieren hacer o que están tratando de hacer, se
parecería a la guerra emprendida por Julio César contra las Galias, cuando
mató millones de galos para apoderarse de sus riquezas y posesiones, y vendió
como esclavos a otros millones. Con esas bases financieras pudo sostener sus
ejércitos y, con ellos, se lanzó a buscar la dictadura en la Roma aún
republicana. Ahora a principios del siglo XXI, ese grupo en EE.UU. (y otros en
otros lados –Berlusconi o Putin vienen a la mente) busca un primer momento
de “principado”, dentro de esquemas oligárquicos (se mantiene poder del
senado-congreso, pero ya sería secundario) imperiales digitales.
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La tendencia generalizada de este capitalismo de guerra final
permanente, apunta a la corporatización de las principales instituciones
sociales, destruyéndose o tergiversándose el “estado” en sentido hegeliano, en
tanto “algo” que lograba escapar a la dura tenaza corporativa – la jerarquía de
la dominación/explotación económico social –. El “estado” era una instancia
en la que las personas no sufrían esa jerarquía autoritaria de la familia, la
empresa o la corporación mercantil o artesanal, la iglesia y el ejército. En el
siglo XXI, estas corporaciones recapturan, “reforman”, adaptan y achican al
Estado, para que las proteja y para que las establezca como los espacios de la
persona, eliminando el espacio de la libertad (individual, grupal o social) que
el antiguo “estado” creaba. Renacen las oligarquías y las dictaduras (por
ejemplo en Rusia o Indonesia). La “democracia” se articula ahora mediante
“referendos”, que se deciden en campañas publicitarias lavacerebros. Así, los
grupos ricos y poderosos que acaparan el poder, también son dueños de los
medios de información, y llevan a cabo la conducción política mediante
sucesivos referendos/elecciones que “venden” figuras (Swarzenegger en
California o Arias en Costa Rica) o propuestas. La “democracia por referendo”
se hace posible por la situación de terror o pánico a la que se induce a la
población, sea por violencia social (criminalidad) o por violencia política
(guerra civil, terrorismo oficial y opositor). Así se consolida el gobierno del
aparato de seguridad y los medios de comunicación.
La apuesta (literalmente) que hace EE.UU. busca una hegemonía
imposible (por el impacto de las destrucciones social ecológicas), y el esfuerzo
que dedica a ella precipita al mundo (incluyendo a EE.UU. mismo) en colapsos
militares, económicos, sociales y ecológicos, en la locura del frenesí asesino (el
asesinato es el centro de la estética actual), para pretender, ilusamente, que los
ricos sobrevivan un poco más que los demás (morituri), entre ruinas que crecen
y en una orgía de sangre inocente.
En síntesis, el mercado capitalista es un componente del ecosistema
mundial que viene creciendo incesantemente, engullendo cada vez más
recursos del planeta y sujetando a sus leyes de hierro a la humanidad entera, la
mitad de la cual sobrevive mala e indignamente. Ese mercado es el mercado de
los ricos que participan y se benefician, los demás sirven en él para apenas
sobrevivir, o son marginados funcionales (megaparo estructural). Ese
(“mítico”) “mercado” ha desbordado la capacidad y los límites del ecosistema
mundial y de la biosfera, los “peligros” de destrucción social y ecológica
(“ecosocial”) alcanzan dimensiones (por ejemplo, escasez de petróleo a corto
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plazo) de colapso, que inducen, entre los mismos dueños del capital, respuestas
y soluciones de guerra, militarización y fascistización universales. Este
extremismo se tiñe de fundamentalismo cristiano, y representa el último
recurso de EE.UU. y sus asociados, para intentar ser quienes sobrevivan en las
catástrofes sociales y ecológicas que azotarán el planeta en los próximos
lustros, provocadas por ellos mismos en sus afanes egoístas posesivos.
En el resto del presente artículo, discuto la noción de “colapsos
ontológicos ecosociales”, en sus dos dimensiones, la social y la ecológica.
Busco mostrar justamente el carácter terminal y de derrumbe que adquieren
cada vez más estos procesos a escala mundial.
El paralelo colapso mundial resultante de las tendencias que enfatizan y
centran la política y la sociedad en la guerra (el colapso militar), es el tema
indirecto de este trabajo (los ataques terroristas son respuestas, inhumanas, a
los ataques y políticas imperialistas, también inhumanos).
1.
LOS COLAPSOS ONTOLÓGICOS ECOSOCIALES
1.1 La noción de “colapso”
Para alguien o alguno/as, una “amenaza” significa la existencia de
muchas o crecientes probabilidades de que a cierto plazo (generalmente no
muy lejano) se padezca humillación, injuria, enfermedad, daño, destrucción,
muerte. Generalmente se reconocen dos acepciones: una social personal,
cuando alguien o alguno/as dan a entender con actos o palabras que se quiere
hacer algún mal a otro/a u otro/as; y la otra acepción, que es “impersonal” o
referida a lo no humano en general, incluyendo lo natural, tiene tres fases: (1)
anunciar, (2) presagiar o (3) ser inminente algún daño. La inminencia es la
última fase de la amenaza, y se confunde casi con el “peligro”. Pues la amenaza
puede aumentar, con lo que las probabilidades de daño también crecen,
mientras que los plazos para que eso suceda tienden a reducirse.
Correspondientemente, un “peligro” aparece cuando la amenaza deja de ser
inminente y empieza a cumplirse y realizarse. La destrucción que trae ese
creciente peligro puede ampliarse hasta afectar los componentes y relaciones
básicos de las personas o entidades perjudicadas, dañadas. En el siguiente
momento, la destrucción continúa aumentando y alcanza una magnitud y/o
intensidad tales que producen el “colapso” de esa o esas personas o
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entidadespersonas. Tanto el peligro como el colapso implican “destrucción”,
pero en el caso del colapso se trata de encadenamientos de destrucciones
locales o singulares, que alcanzan dimensiones cada véz más generales. En los
colapsos, tiende además a reducirse el gradualismo de los procesos, y
aumentan “caídas”, “desplomes”, “derrumbes”, “extinciones en masa”,
“bombardeos, hambrunas o genocidios en cada vez más países”, etc., de
carácter repentino, súbito. El colapso significa la última fase de vida de esos
seres vivos, o de la existencia – en determinadas condiciones y formas –, de
objetos o cosas.
No resulta problemático emplear la noción de “colapso” para
comprender los procesos internacionales y mundiales. Por ejemplo, es
fácilmente comprensible para referirse a una parte cada vez más significativa
de especies animales, incluyendo no solamente mamíferos sino muchos
reptiles, aves, peces e insectos, que desaparecen para siempre cada día.
Tampoco es difícil aplicar la noción a la sociedad humana: cada vez más hemos
sufrido, o hemos venido contemplando con horror, “en directo o en los
imaginarios”, el asesinato de humanos como base de la vida cotidiana; hemos
visto sociedades devastadas o simplemente desaparecidas.
Aparte de nosotro/as mismo/as, podemos observar cómo otros seres
vivos, y también inanimados (paisajes y comarcas), padecen amenazas o
peligros, o colapsan. En particular, es posible señalar niveles de amenazas,
peligros y colapsos, en sociedades y en ecosistemas o componentes de ellos.
1.2 La dimensión ontológica
La ontología es una rama de la filosofìa que estudia lo que es y lo que
no es, en cuanto tales, y por consiguiente es considerada como la dimensión
fundante de lo que se piense sea “real” e “irreal”. “Ser” y “no ser” constituyen
el predicado más general que se puede dar a (o que “puede tener”) cualquier
ser o cosa. Un equivalente del ámbito “vital” es “vida” y “muerte”. La
ontología estudia las formas y características de lo que es y/o no es, de lo
“vivo” y de lo “muerto”, “en general”. Ahora bien, si dentro de la ontología
destacamos alguna entidad específica de la totalidad de lo que es, o bien
destacamos a la totalidad misma, como “creadora”, “ordenadora”, “productora
de sentido”, o “copresente”, entonces abandonamos la ontología y nos
ubicamos en otra rama de la filosofìa, la metafisica.
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Para este caso basta con la la dimensión ontológica, que puede
considerarse análoga a predicar, respecto de la humanidad (plural e individual):
“su existencia y sentido, implicando la posibilidad de expresar al máximo las
mismas capacidades humanas” (Cf. Herrera Flores, 2001; Sánchez Rubio,
1999; 2003).
En el caso de la dimensión social, el “punto de referencia” para realizar
la comparación que permita determinar ese “ser humano” como “ser social”,
por definición se da y no se da históricamente, aunque en la historia podamos
encontrar ejemplos de aspectos y tendencias. Se ha ubicado en un desideratum
para nuestras vidas hoy y mañana, y para las vidas de quienes vivirán después
que nosotros ya no lo hagamos. Los genocidios, las masacres, los asesinatos,
las torturas, las enfermedades, el hambre, los secuestros, los encarcelamientos,
las persecusiones, el odio y la venganza, la prepotencia y el exclusivismo, el
amor a la violencia (cultura del asesinato), la extinción del grupo social, la
desaparición de costumbres, de lenguajes, de imaginarios, la represión
psicosocial y particularmente sexual, y la agresión contra seres vivos e
inanimados, todo acompañado de un culto a la Violencia, alcanzan niveles
delirantes a principios del siglo XXI, y son los “constituyentes” de ese “punto
de referencia” de definición de “lo humano”, en los pensamientos y los
discursos oficiales.
Para al menos un tercio de la humanidad, hoy su situación es de colapso
total, mientras un grupo cada vez más pequeño concentra riquezas inenarrables
y poderes dictatoriales, y el conjunto enloquece en la ansiedad insaciable de
conciencias engolosinadas con el adrenalinazo orgásmico de la muerte del/a
“otro/a”...
Respecto de la naturaleza del planeta (incluye humanos, pero se refiere
sobre todo a animales, plantas y minerales), la “dimensiòn ontológica”, en
tanto desideratum se refiere a las características que mostraba este planeta a
principios del Holoceno (hace unos 13.000/10.000 años). Es decir, tomamos al
Holoceno como punto de referencia o comparación en la historia de la
naturaleza de la Tierra (Cf. Leakey & Lewin, 1997). La comparación se hace,
entre esa época y las situaciones y las tendencias históricas y actuales, de
creciente impacto negativo (destrucción) que la humanidad inflinge a (contra)
la naturaleza.
Durante la década de 1960 empieza a emerger una conciencia social
sobre la destrucción de la naturaleza, haciéndose eco de anteriores voces que
advertían sobre la destrucción de especies animales y vegetales, sobre los
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impactos nocivos de las contaminaciones atmosféricas, terrestres y acuáticas
por productos o desechos industriales o militares (químicos o radioactivos, por
ejemplo). En los siguientes diez años, esa preocupación daría a paso al
surgimiento de iniciativas y explicaciones donde se planteaba que la relación
humanidad naturaleza era contradictoria o dualista en las consecuencias de la
civilización “occidental-capitalista-cristiana”, pero que no necesariamente
debía de ser así. Hacia la década de 1980 la conciencia del peligro de
destrucción generalizada (ontológica) de la naturaleza ya lo planteaba como
gravísimo y evidente.
Durante la década de 1990 se hicieron buenos propósitos que no se
cumplieron y continuó la destrucción ecológica (Fracaso de la conferencia de
Río de Janeiro sobre el medio ambiente, no ratificación del Protocolo de Kioto,
por ejemplo); de manera que a partir de 2001, cuando la administracion Bush
II emprende una nueva Guerra Mundial y el planeta se recentra alrededor de la
violencia institucionalizada (militar, policial) para garantizar a los ricos la
exclusividad de la propiedad de todo la “propiedad-mundo”, entonces esos
peligros ecológicos se transforman en colapsos.
Es decir, establecemos una especie de “definiciòn” o “medida” de lo
humano (social, grupal, individual), y también de lo natural, que exprese esas
dimensiones, no necesariamente en su plenitud ideal, pero sí en plenitud de
posibilidad real de existencia, justicia e igualdad, así como en la expresión no
represiva de nuestra humanidad y de la naturaleza del planeta. Lo “social” en
tanto “humanidad”, y la “humanidad” en cuanto bondad-belleza-justicia (por
ejemplo), tienden a colapsar y desaparecer en un desenfreno imparable,
ideológico y práxico, de sangre y violencia. Por su parte, la destrucción de la
naturaleza del Holoceno, es una especie de “daño colateral” que resulta de esa
tendencia social ontocida. Podemos establecer entonces “parámetros” o
“paradigmas heurísticos” de humanidad y de naturaleza, e intentar “medir” la
distancia que se establezca entre la “situación” (no la “realidad”) de la
humanidad y la naturaleza en determinado momento, respecto de esos
parámetros o paradigmas.
Notamos así un proceso histórico de expansión de la civilización,
primero cristiana y luego capitalista (siempre patriarcal), euro-americana, a
escala mundial. También notamos que desde del siglo XIX hasta hoy (2005),
esa civilización entra en una etapa de economía industrial fundada en energías
altamente contaminantes como el carbón, el petróleo y la fisión nuclear, y que
implica utilizar todos los recursos sociales y naturales del planeta, a una escala
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cada vez mayor. Se trata de un sistema socio económico y político ideológico
que tiene por bandera “el progreso”, “el crecimiento del capital” como
condición de supervivencia del capital, es decir, el crecimiento ilimitado de “la
producción y la productividad”. El capitalismo cristiano, sin embargo, es
excluyente en tanto la riqueza y el poder se concentran cada vez más en menos
personas, y en tanto se autodefinen como el único “sistema” (económico o
religioso) posible. Notamos que a partir del siglo XVIII, la situaciòn del resto
de las civilizaciones y regiones del planeta se ha venido deteriorando, mientras
que la civilizaciòn del capitalismo cristiano ha aumentado sin cesar su
participación en la renta mundial.
La diversidad social se ha deteriorado y muchas naciones desaparecen
en el anonimato empobrecido o bombardeado de los suburbios o los campos
desolados de África, América Latina y Asia, en países devastados como
Angola, Ruanda, Nicaragua, Haití, Afganistán, Irak (para solamente citar dos
de cada continente). Los otros países de estas regiones muestran “islas de
desarrollo”, pero que se ven rodeadas por crecientes devastaciones sociales y
ecológicas y, por tanto, las sociedades y en particular los ricos, se esconden y
parapetan cada vez más, tras fuertes barreras protectoras de carácter militar y
policíaco. Mientras tanto, decenas de millones mueren de hambre y
enfermedades curables, al menos un tercio de la humanidad vive en
condiciones de “pobreza absoluta”, según la definía el mismo Robert
MacNamara (uno de sus responsables al frente del FMI), como: “condiciones
de vida tan limitadas por la desnutrición, el analfabetismo, la enfermedad, la
miseria ambiental, el alto ìndice de mortalidad infantil y la reducida esperanza
de vida, que están muy por debajo de cualquier definición razonable de
decencia humana” (MacNamara, 1994).
Similarmente, la diversidad biológica se reduce sin tregua: día a día se
agregan muchos nombres a la inmensa lista de especies vegetales y
animales que desaparecen para siempre. El clima está alterándose,
calentándose por el llamado efecto invernadero que provocan nuestros “gases”,
haciendo a la atmósfera más lluviosa y tormentosa conforme el calor derrite los
hielos y el agua agregada se distribuye en los océanos y la atmósfera.
Empeoran todas las condiciones ambientales para que continuemos viviendo;
estamos en medio de una gran extinción de vida de la que somos responsables
y culpables.
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1.3 Evolución del concepto
He desarrollado el concepto de “colapsos ontológicos ecosociales”
(E.Saxe Fernández, 1996, 1999, 2003), a partir de la noción de “peligros”
ontológicos ecosociales, que conviene precisar.
La noción de “peligro ontológico” fue planteada originalmente, aunque
de forma parcial, por el filósofo alemán Günther Anders en su ensayo “Tesis
para la Era Atómica” (Anders, 1975). Llamaba la atención sobre la existencia
de una amenaza real, a cargo de un arma con un potencial destructor
inimaginable, capaz ciertamente de provocar la muerte de la inmensa mayoría
de la población humana, y de causar daños ambientales (elevados niveles de
radiación a escala mundial durante muchos años), acaso fatales para el resto de
los organismos vertebrados, de muchos invertebrados y de la mayoría de las
plantas. El peligro termonuclear es ontológico, en el sentido de significar
“prácticamente” la destrucción de la especie humana y gran parte de la
naturaleza, en una Hiroshima Universal. Según Anders, ese “peligro
termonuclear” (la capacidad de EE.UU. y la URSS a partir de la década de
1970, de destruirse recíprocamente cientos de veces con bombas
termonucleares), se nos torna invisible, aunque siga siendo constitutivo, pues
resulta “supraliminal”. Se trata de algo tan grande que no lo podemos “ver”, y
es el opuesto correspondiente de la dimension “subliminal”, la cual se refiere a
estímulos visuales (por ejemplo), tan pequeños que escapan a la conciencia de
quien “ve” (anuncios minúsculos en pantallas de cine; contenidos ideológicos
–como una bandera- en el trasfondo esfuminado de una escena fílmica o
televisiva). El peligro termonuclear es tan gigantesco, que escapa a la
percepción, el razonamiento y el juicio, por las dificultades que tenemos para
procesarlo en nuestro cerebro:
No solamente la imaginación ha dejado de estar al lado de la
producción, sino que también el sentimiento ha dejado de estar a
la par de la responsabilidad. Todavía podría ser posible imaginar
o arrepentirse por el asesinato de un semejante, o aun de
compartir la responsabilidad por ello. Pero figurarse la
eliminación de cien mil semejantes definitivamente sobrepasa
nuestro poder imaginativo. Entre más grande sea el efecto posible
de nuestras acciones, tanto menos capaces somos de
representárnoslo, de arrepentirnos o de sentir responsabilidad
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por él. Entre más ancho es el abismo, tanto más débil es el
mecanismo de frenado. Eliminar cien mil personas apretando un
botón es algo incomparablemente más fácil que destazar a un
individuo. Lo “subliminal”, el estímulo demasiado pequeño como
para generar una reacción, ya ha sido reconocido en la
psicología. Más significativo, sin embargo, aunque no haya sido
visto ni mucho menos analizado, es lo “supraliminal”, el estímulo
demasiado grande como para generar una reacción, o para
activar algún mecanismo de frenaje (1975: 94).
Hacia mediados de la década de 1990, junto con C. Brugger, propusimos
entender por “peligro”:
...algo que efectivamente tiene la capacidad y la tendencia a
amenazar la existencia de determinado ente... para poner en
jaque mate la continuidad de nuestra especie y la misma
organización de la naturaleza en su forma cuaternaria (E.SaxeFernández & C. Brugger, 1996: 52).
Este peligro termonuclear de Anders, entonces, lo he definido en primer
lugar como peligro “ontológico”, por su significación (alcance): se refiere a la
destrucción de la sociedad humana y de la naturaleza (del Holoceno; desde
circa 8.000 adne). Además, se trata de un peligro ontológico “metafísico”,
pero en un sentido particular, en tanto algo que ha sido inminente desde 1945
y sobre todo desde la década de 1970 (y no ha cesado con el fin de la Guerra
Fría), pero que no ha tenido lugar. El peligro termonuclear es una amenaza
total permanente para los humanos desde Hiroshima y Nagasaki, y sobre todo
a partir del empleo del espacio circundante como nuevo “océano” mundial en
el que operan los sistemas militares. Pero es invisible porque está más allá del
azul del cielo y oculto bajo las olas del mar o en silos y túneles... Es invisible
porque no hemos tenido una guerra total termonuclear (y con todas las demás
armas) entre EE. UU. y la URSS, lo cual facilitaba el ocultamiento y la
invisibilización del peligro, como señala Anders, convirtiéndolo entonces en
algo “meta- físico”.
En segundo lugar, a partir de la noción de “peligro ontológico
termonuclear” es posible concebir un “peligro ontológico militar” en general,
que incluya tanto las armas termonucleares como las convencionales, las
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bioquímicas y otras. En este caso, el carácter “metafísico” o invisibilización se
diluye (relativamente). Sin embargo, permanece oculto a la inmensa mayoría
de la población e incluso a los políticos, el carácter central que adquiere el
aparato militar y de seguridad durante todo el siglo XX y hoy con mayor
intensidad y tamaño.
En tercer lugar, a partir de las nociones de “peligro ontológico
termonuclear” y de “peligro ontológico militar”, es posible construir las
nociones de “peligro ontológico social” y de “peligro ontológico ecológico”.
Con ellas hacemos referencia a procesos destructivos terminales, en los
ámbitos psicosociales y naturales, y que durante las últimas dos décadas del
siglo XX alcanzan una dimensión de “inminencia”, señalada por esa
calificación como “peligros”. Al final del siglo XX y especialmente a partir del
11 de setiembre de 2001, esos “peligros” tienden a convertirse en colapsos.
Es que la noción de “peligro” o “inminencia” de catástrófe parecía
adecuada aún en 1992, y muchos en esa década de los años 1990 se
entusiasmaban creyendo que el neoliberalismo institucionalista globalista, y la
ausencia de “guerra mundial” (fin de la Guerra Fría), servirían para enfrentar y
superar esos peligros ontológicos. Ahora se podrían dedicar los esfuerzos a
detener la destrucción social y natural, la guerra finalmente ya no haría falta y
poco a poco desaparecería, en un sueño post histórico de eternidad globalista
comercial.
Sin embargo, el mismo globalismo neoliberal ha sido violento,
fraudulento, mafioso, rapaz. Las admiinistraciones de William Clinton
navegaron la cresta de una ola especulativa mafiosa que institucionalizó el
saqueo (por ejemplo de América Latina desde la década de 1980, de la antigua
URSS y los “tigres” asiáticos durante la de 1990). Luego, el retorno al poder
en EE. UU. del grupo Bush mediante el fraude electoral, a partir de setiembre
de 2001 ha quedado signado por la nueva Guerra Mundial “contra el
terrorismo”. El grupo en el poder ejecutivo está lidereado por Bush I, e incluye
miembros de varias administraciones republicanas, desde Nixon (R.Perle y H.
Kissinger, por ejemplo). El vicepresidente, la consejera de seguridad nacional,
los ministros de guerra y de exteriores, junto con el presidente y otros altos
funcionarios, bajo la batuta (“oculta”) de Bush I, han venido preparando un
plan de gobierno desde al menos finales de la década de los noventa, que
facilite la centralidad del aparato militar y de seguridad en la política, “para
siempre jamás”, articulando la vida del planeta en enfrentar crecientes riesgos
a la seguridad, y guerras permanentes contra los levantamientos de los pobres,
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los excluídos, los “infieles”, por el control de los (cada vez más escasos)
recursos del planeta, y bajo la ideología totalitaria de la “guerra mundial contra
el terrorismo”. Los atentados del 11 de setiembre de 2001 “activaron” esos
planes, que se han puesto en marcha con rapidez – una de las condiciones de
su éxito es seguir la política de los “faits accomplis” (hechos cumplidos), es
decir, actuar y luego negociar lo que convenga. Esta práctica se había
desterrado en las relaciones entre las grandes potencias y las superpotencias, a
partir del fin de los regímenes nazi fascistas en Europa y Japón. La llamada
doctrina de guerra preventiva y la toma de los principales recursos petroleros
del planeta por este grupo (para su control político estratégico por EE.UU.;
para su control económico estratégico por el grupo en el poder), caracterizan la
política de esta potencia. Adicionalmente, pero de manera crucial, se trata de
un grupo compuesto por miembros de las agencias de “inteligencia” (nuevo
nombre que recibe el espionaje), policíacas, y militares. Están en el poder, por
lo demás, ya desde que Bush I asumiera la conducción de la fase final de la
guerra contra la URSS, igualmente dirigida por los aparatos de seguridad y
espionaje (Andropov) – característica que se continua en la figura de Putin.
En Costa Rica, por ejemplo, también, los dos vicepresidentes de la
administración Pacheco provienen del área policíaca, y hay tendencias hacia la
conformación de un “bloque” mediático-policial-cristiano, para eventualmente
sustituir a los partidos políticos, siguiendo los modelos de pseudo democracia
“conservadora activa” representados por Berlusconi en Italia, Collor de Mello
y Fujimori (“Fujicolor”) en Brasil y Perú, y por Reagan, Bush I, Bush II y
Szwarzenegger en EE.UU.
La dirección político militar de EE.UU., en campaña por adueñarse del
planeta lo más rápido y extensamente posible (pero en situación de colapsos
ecosociales; con unas fuerzas armadas capaces de destruir enemigos pero
carentes de organizaciones o entidades capaces de reconstruir los países que
devasta; padeciendo de “percepciones incoherentes” y de “irresponsabilidad
organizada”), actúa como principal depredador del sistema mundial. Pues
opera a nivel local y nacional tanto como internacional, mediante la amenaza,
la intimidación, la coerción, la coopción, la guerra psicológica y clandestina, el
embargo y el boicot, el asesinato y la agresión militar directa. En esto, la
política del grupo Bush II está basada en la de Sharon en Israel: respecto a la
percepción y definición de los “enemigos”, y respecto a los “métodos” para
atacarles. Desde la experiencia y la perspectiva que tenemos en América
Latina, África, Asia, y Europa, sobre gobiernos estructurados alrededor de la
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“lucha contra el terrorismo”, de las “doctrinas de seguridad nacional” y de
“enemigos religiosos de la nación”, notamos grandes similitudes con la
dinámica política en EE.UU. Resulta fatal para la humanidad y el planeta, que
la dirigencia policíaco militar de EE.UU. muestre y tienda a desarrollar rasgos
similares a los que encontráramos en el pasado reciente en nuestra región, en
los gobiernos de Pinochet, de Videla, o de los generales brasileños o
guatemaltecos.
La situación actual es de “degradación ontológica”, por el tipo de guerra
que tiene lugar. Se trata de una “guerra mundial interna”, civil y social
(“civilsocial”), que adquiere prioridad sobre cualquier otra actividad, y que
resulta un fardo adicional demasiado pesado para la persona humana, la
sociedad y la economía. Los gastos de un billón de euros (un millón de
millones) en actividades militares a nivel mundial son inmorales, porque
extienden el “desprecio” por un prójimo definido como “excluido”, “no
humano”; y porque afianzan la creencia – la definición de situación – en la
necesidad del asesinato. Esos gastos son además improcedentes, es decir, no
solamente resultan “improductivos” sino sobre todo “agravantes” o “dañinos”
para enfrentar los actuales colapsos ontológicos ecosociales (y por supuesto
incluyendo la misma amenaza termonuclear-militar). Sin embargo, la salida de
crisis propuesta por el grupo Bush se basa en fortalecer y establecer a la muerte
como eje central de la vida.
Las predicciones hobbesianas de analistas como Robert Heilbroner
adquieren entonces nuevo significado. En 1991 se preguntaba si había
esperanza para el “hombre” (Sic), y respondía:
La perspectiva para el hombre es dolorosa, desesperada, y la
esperanza que se pueda tener por su futuro parece ciertamente
muy escasa”(1991:20).
Agregaba que:
Cuando los hombres pueden aceptar, e incluso deleitarse, con la
destrucción de sus contemporáneos vivos, cuando pueden mirar
con indiferencia o irritación el destino de quienes viven en
tugurios, se pudren en prisión, o mueren de hambre en tierras que
solamente tienen sentido en tanto lugares de vacaciones, ¿por qué
habría que esperar que realizaran acciones dolorosas, requeridas
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para prevenir la destrucción de generaciones futuras cuyos
rostros nunca vivirán ellos para contemplar? Pero aún más, ¿No
maldecirán a esas generaciones futuras, cuyos derechos a la vida
solamente pueden honrarse sacrificando el disfrute presente; y, si
se llegara a tener que escoger, no las condenarán a la no
existencia, al escoger el presente antes que el futuro? (1991:169).
Advierte sobre el surgimiento de “gobiernos de hierro” que practicarán
“coerción gubernamental”.
Hoy se hace evidente que la “salida de la crisis” que lleva adelante el
gobierno de EE.UU. agrava dramáticamente la crisis mundial, pues ahora la
situación es otra vez una guerra mundial, incluyendo paralelamente el
rechazo al derecho y los tratados internacionales y humanitarios, desdén y
menosprecio por las medidas de protección o promoción humana, social o
ambiental, en organizaciones o institucionalizaciones multilaterales y en
negociaciones equitativas, tanto como el rechazo a que sus ciudadanos, en
particular los miembros de sus fuerzas armadas, puedan verse sometidos a
procesos jurídicos en la Corte Penal Internacional. Al mismo tiempo, se trata
de una política de engaño y mentiras (Irak no tenía “armas de destrucción
masiva”), y de una estrategia militar de terrorismo de estado (eliminación de
libertades civiles en EE.UU.; tratamiento criminal a enemigos y prisioneros).
De manera que, a partir del 11 de setiembre de 2001, oficialmente, las
originales “amenazas” ontológicos pasan, de estar en una situación de peligro,
a una nueva situación de tendencias crecientes a los colapsos.
La precipitación de colapsos tiende a darse cuando un subsistema (por
ejemplo un país como Afganistán) se derrumba, y en poco tiempo estos
colapsos particulares se encadenan y provocan colapsos regionales o
mundiales, como señalaremos en la siguiente sección.
2.
EL COLAPSO SOCIAL MUNDIAL
La paradoja del desarrollo es que el tremendo éxito de la
civilización industrial moderna será la causa de su colapso y
ruina (Lewis: 1998: 45-46; énfasis ESF).
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La economía política del capitalismo mundial implica que “el mercado”
tiende a crecer indefinidamente, como característica derivada de la
competencia y como estrategia para aumentar las ganancias. El subsistema
económico es un componente del ecosistema mundial, que crece hasta llegar a
sustituir y absorber todo el ecosistema del planeta. Ya la economía ha sustituido
a la ecología en cada vez más ámbitos de la vida social humana (hasta la
educación es articulada ahora desde perspectivas mercantilistas). Actualmente,
los grupos y sectores dominantes en los mercados oligopólicos internacionales,
se disponen a adueñarse de la naturaleza “virgen”, es decir, prácticamente de
todas las plantas y los animales, y de paso acabar con las últimas sociedades
articuladas en torno a la agricultura. Similarmente, con esos y otros
conocimientos se disponen a ofrecer, a quien pueda pagar, terapias y
medicamentos que pronto llegarían a extender la duración de la vida humana –
con buena salud física y mental – hasta 150 o 200 años.
El determinismo tecnológico es un supuesto ideológico que ha tendido a
reemplazar a la noción de “progreso”, otrora dominante en el sistema de
supuestos sociales del capitalismo cristiano. Representa el “mecanismo”
mental y social, justificador y significativo de que la “actual” o pasada
distribución y organización del poder y la riqueza, podrán perpetuarse ad
aeternum, gracias a los “milagros tecnológicos”. Pues tanto los etnocidios y
masacres, y los ecocidios necesarios para “evitar que los pobres se apoderen de
todo”, así como el necesario “aislamiento” y “privacidad” de lo/as dueño/as del
planeta, solamente pueden garantizarse por medio de la fuerza más brutal
posible – en lo que conocemos de la historia de la vida. Entonces, los
conocimientos y tecnologías militares o “de seguridad”, tienden a convertirse
en el centro de las actividades de investigación científica y desarrollo
tecnológico. Representan una creciente carga para la sociedad y el fisco, sobre
todo de EE.UU., lo cual limita a este Leviatán.
La historia de la vida en el planeta y la de la humanidad durante el siglo
XX ha venido avanzando y sobrepasando umbrales de destrucción, inéditos
desde hace unos 65 millones de años; pues “los dueños del mundo” creen que
destruyendo la vida planetaria lograrán alcanzar su felicidad y libertad
supremas. Los mayores riesgos los corren esos “dueños” y la misma
humanidad. Pero, ciertamente, muchísimas personas consideran que su
situación personal y social es “especial” o excepcional, por riqueza o poder, o
por ubicación en el planeta – supuestamente lejos de crisis económicas,
sociales, ecológicas, políticas o militares. Esta creencia es muy errada, pues las
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magnitudes de la intervención contra la naturaleza son de alcance planetario, y
la exclusión social alcanza límites intolerables y características degradantes y
degradadas, explosivas social, política y éticamente, tanto en el edificio del
Pentágono como en los palacios de Saddam Hussein.
Pero sobre todo es muy errado creerse inmune a las dimensiones sociales
del colapso ontológico mundial (crisis, desastres y catástrofes), porque tales
creencias tienen como base una ética nihilista que se nutre del cinismo, el
engaño y la indiferencia. La “salvación” o el “bienestar” individual o grupal a
corto plazo, garantizadas por riqueza y poder, facilitan “no ver” o “no darle
importancia” o “significado” al sufrimiento de al menos un tercio de la
“humanidad” que no vive “humanamente” y que más bien malmuere en vida.
El cinismo nihilista entonces facilita considerar esa inhumanidad “compatible”
con la abundancia violenta, prepotente, glotona y tacaña. La actual “ética” de
quienes tienen poder y riqueza, que por tanto aparece en las instituciones
sociales y culturales dominantes, y que se sustenta tanto en el neoliberalismo
como en el ethos de la guerra, considera culpable y por tanto inmoral o no
ético, al/a pobre y excluido/a. Su supuesta “falta de iniciativa” es causa de sus
males. Para la ética oficial, nadie más que esas mismas personas son
responsables de su “condición”. Pero, como se trata de la mayoría de la
población del mundo, entonces es necesario invertir el argumento, señalando
que la minoría posesiva y violenta es la responsable de los problemas de
todo/as.
2.1 Socialmente
Desde el fin de la Segunda Guerra Mundial (1939-1945), disponemos de
información más exacta o completa, sobre cómo la mayoría de la humanidad
viene sufriendo un proceso de creciente empobrecimiento económico,
marginación social y exclusión política e ideológica. Al mismo tiempo, una
minoría ha venido aumentando sostenidamente su participación en el control
del poder y la riqueza del planeta. A partir del neoliberalismo globalista
institucionalista del último tercio del siglo XX, se magnifican sin embargo las
tendencias sociales parasitarias y corruptas, incluyendo la mafización y
oligarquización de la política y la economía, por la concentración de la
dirección económica en la especulación financiera y la sobreexplotación o
ganancia extraordinaria que se obtenga en coyunturas internacionales creadas
ad hoc, incluyendo el saqueo, desmantelamiento y destrucción de los bienes
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públicos (transporte, energía, comunicación, finanzas), mediante la
privatización, en numerosos países de América Latina, Africa y Asia, pero
también en el mismo corazón metropolitano, donde los escándalos financieros
han arrastrado por los suelos las reputaciones de las firmas bancarias y
financieras más importantes del mundo, y donde también avanzan el
desempleo, la pobreza y la violencia.
Las nuevas oligarquías (son las “clases globalistas” de Petras y
Veltmeyer, 2002) que toman el poder en el mundo a partir de la década de
1970, se sustentan en dos pilares, el control de los medios de comunicación y
el uso cada vez más intenso y extenso de los medios de control y represión
jurídicos, policíacos y militares. El caso de Berlusconi en Italia es
paradigmático en este sentido, ya que controla toda la televisión privada y,
desde el gobierno, también la televisión pública. Adicionalmente, los grupos en
el poder, como en el caso de EE.UU., también son grupos relativamente
interconectados de empresas, que prosperan rápidamente gracias a las
concesiones y contratos adjudicados por funcionarios que no se sonrojan por
los conflictos de intereses, y aceptados por rivales y público mediante
campañas y engaños propagandísticos, o violencia jurídica, policíaca y militar.
Las nuevas oligarquías metropolitanas ejercen su poder económico al frente de
conglomerados transnacionales financieros, industriales y comerciales. Un
puñado de mega corporaciones y un puñado de áreas metropolitanas controlan
y utilizan la inmensa mayoría de la riqueza del mundo. Según Escobar (1995:
212), las naciones industrializadas (o centros metropolitanos) del mundo
representan el 26 por ciento de la población, pero producen el 78 por ciento del
PNB mundial, y significan el 81 por ciento del consumo de energía, el 70 por
ciento de los fertilizantes químicos, y el 87 por ciento de los armamentos
mundiales. De acuerdo con los informes del Programa de las Naciones Unidas
para el Desarrollo (PNUD) para 1996 y 1997:
• Entre 1970 y 1985 el número de pobres creció un 17 por ciento, pese
a que la producción auménto un 40 por ciento.
• En 1996, 800 millones de personas pasaban hambre y 500 millones
sufrían de malnutrición crónica.
• Cada año morían alrededor de 17 millones de personas, a causa de
enfermedades curables como la diarrea, el paludismo o la
tuberculosis.
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• Entre 1987 y 1993 (8 años), el número de personas con ingresos
diarios inferiores a un dólar de EE.UU., aumentó en 100 millones.
• En más de cien países el ingreso por habitante en 1996 era inferior al
de 15 años antes. Es decir, en 1996 casi 1.600 millones de personas
vivían peor que al inicio de la década de 1980.
• Ciento treinta millones de niño/as no asistían a la escuela primaria, y
275 millones a la secundaria. (En Costa Rica, la matrícula de
secundaria excluye a más del 30 por ciento de la población en edad).
• En los países más desarrollados la población casi no crece, pero el
número de desempleados llegó a casi 40 millones antes de la crisis de
2001, más de tres veces el número de desempleados de principios de
la década de 1970. Adicionalmente, 100 millones de personas en
estos países ricos, tienen ingresos que son la mitad o menos de los
ingresos individuales medios del país corrrespondiente. En EE.UU.
casi 50 millones de personas no tienen seguridad social, y en
Londres, una de las grandes megalópolis del capital, 400.000
personas no tienen hogar.
• En los países de la antigua URSS, el número de pobres pasó, del 4
por ciento en 1988, al 32 por ciento en 1994.
Por su parte, los economistas españoles Berzosa, Bustello y De la Iglesia
(2001), señalan que:
La diferencia entre el ingreso de los países ricos y el de los países
más pobres era de alrededor 3 a 1 en 1820, de 35 a 1 en 1950, de
44 a 1 en 1973, y de 72 a 1 en 1992... la distancia entre las
personas ricas y pobres se eleva a 140 a 1. El 20 por ciento más
rico supone el 81.2 por ciento del comercio mundial, el 94.6 por
ciento de los préstamos, el 80.6 por ciento del ahorro interno, y el
80.5 por ciento de la inversión interna. Mientras que el 20 por
ciento más pobre sólo participa con el 1.0 por ciento en el
comercio mundial, con el 0.2 por ciento de los préstamos
comerciales, con el 1.0 por ciento en el ahorro interno, y el 1.3
por ciento de la inversión interna (pp.27-28). Según las últimas
estimaciones del Banco Mundial, nuestro mundo se caracteriza
por una gran pobreza en medio de la abundancia. De un total de
6.000 millones de habitantes, 2.800 – casi la mitad – viven con
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menos de dos dólares diarios, y 1.200 – una quinta parte – con
menos de un dólar al día (p.35).
Adicionalmente, las Corporaciones Trans Nacionales (CTNs), la
inmensa mayoría de las cuales tiene su base nacional territorial en EE.UU.,
la UE y Japón, “llevan a cabo el 70 por ciento del comercio internacional y el
80 por ciento de la inversión extranjera”. Además, las CTNs controlan el 80 por
ciento de la tierra sembrada con productos de exportación, y 20 CTNs
controlan el 90 por ciento de las ventas de pesticidas (Chatterjee & Finger,
1994: 112, 106).
El poderío político de estas oligarquías incluye el control de los
gobiernos de las grandes potencias, las instituciones financieras internacionales
(IFIs) y hasta la misma ONU.
Ya no es posible dejar sin considerar el carácter cada vez más rapaz de
las nuevas oligarquías que controlan las gigantescas corporaciones
transnacionales y los gobiernos centrales. No solamente es el caso en América
Latina, como hemos señalado (1999), sino también en EE.UU. Un ejemplo de
esto ha salido a la luz pública, aunque muchísimos otros, y la tendencia, siguen
tan campantes:
Enron, cuya quiebra en 2001 fue la mayor de la historia mundial,
ha sido un ejemplo de cómo los sistemas económico y político de
Estados Unidos favorecen tendenciosamente a los ricos en
detrimento de los pobres. Cuando Enron se desplomó, se estima
que tanto sus trabajadores como el accionista medio perdieron
entre 25.000 y 50.000 millones de dólares en la cotización de sus
fondos de pensiones y de sus acciones porque ni la compañía ni
sus auditores, la firma Arthur Andersen, dijeron la verdad acerca
de la peligrosa situación de la compañía. Los ejecutivos de la
empresa, sin embargo, cobraron sus beneficios por adelantado y
huyeron con cientos de millones de dólares. Enron robó otros
50.000 millones de dólares manipulando el mercado de energía
eléctrica de California: provocó una escasez artificial de
electricidad e hizo subir los precios. También estafó a los
contribuyentes de todo el país: como la desregulación de la era
Clinton hizo posible la transferencia de fondos a paraísos fiscales
en el extranjero, Enron no pagó ningún impuesto federal sobre la
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renta en cuatro de los cinco años previos a su bancarrota...
(Hertsgaard, 2003: 158-159).
Más abajo, este autor agrega que:
...la desigualdad tiene todos los visos de hacerse màs profunda en
los años venideros, porque la administración Bush y el Congreso
continúan favoreciendo a los más ricos en sus políticas fiscal y de
gasto, y porque la economía de Estados Unidos ya no genera
suficientes empleos bien pagados como para sostener a una clase
media estable.
Los colapsos sociales tienden a generalizarse sobre todo en América
Latina, África y Asia. Entre la guerra de EE.UU. contra Vietnam (a partir de
1962) y su guerra contra Irak (2004), muchos países y regiones han acabado
devastados por hambrunas, sequías o inundaciones, y guerras. Según
O´Connor (1994:17), a mediados de la década de 1990, estos subcontinentes ya
podían considerarse “una zona de desastre económico, social, y ecológico”. En
ellos, como indicador, cada día mueren más de 35.000 (treinta y cinco mil)
niños, víctimas de enfermedades surgidas de no comer y por vivir
constantemente hambrientos (FAO, 2001).
Y el desempleo, la pobreza y la exclusión también crecen en los centros
metropolitanos. Frank (2000), destaca que, durante el boom especulativo de la
década de 1990, el 89 por ciento del capital transado en esos medios estaba en
manos del 10 por ciento de los hogares más ricos. Bill Gates, por ejemplo,
posee más riqueza que el 40 por ciento más pobre de la población total de
EE.UU. (más de 100 millones de personas). El número de personas sin seguro
social, o pobres, en EE.UU., ha aumentado desde que tomó posesión la
administración Bush II, según informaciones dadas a conocer por la oficina de
censos del gobierno a finales de setiembre de 2003. Y, entre 2003 y 2004, otro
millón y medio de personas pasó a situación de pobreza.
El capitalismo ya no puede pretender ser bueno “para todo/as”,
abiertamente reconoce que hay “perdedores”, aunque no es capaz de
comprender el significado político, social, ético y ontológico de que esos
morituri sean la inmensa mayoría de la humanidad. Pues a ese
“reconocimiento” de fracaso universal no le pueden ofrecer más explicación
que “la falta de iniciativa individual”. Las consecuencias destructivas y
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genocidas del capitalismo, son consideradas como una “limitación inevitable”
de la sociedad humana frente a algo más allá de nuestro “control” (en el siglo
XIX construían un “ídolo” de la “Naturaleza hostil o indomable”; a principios
del siglo XXI se trata de los inexplicables designios del ídolo del “Mercado”).
Los tejidos y entretejidos sociales (para emplear la conocida metáfora)
de todas la sociedades, durante la Guerra Fría crecieron y se tensaron
desmesuradamente y empezaron a mostrar fracturas, conforme crecían los
peligros ontológicos militares y ecosociales, característicos de aquella “carrera
sin fin de militarización”. Durante la actual fase de “colapso”, es cada día más
evidente como las fibras sociales sobrepasan la tensión y se deshilachan, se
sueltan, se separan, se rasgan, se rompen, se deshacen, se pudren. Las formas
de operación de quienes tienen poder y riqueza, se fundamentan en la rapiña,
el robo, el engaño, y se articulan en estructuras mafiosas. Se trata de nuevas
oligarquía mafiosas, muy violentas y ávidas de poder, obtusas, dogmáticas e
intolerantes, sin capacidad de liderazgo social o político. Quienes tienen poder
y riqueza se parapetan detrás de tecnologías y cegueras, cada vez más
prepotentes y también cada vez más impotentes para “detener” – o al menos
“no ver” – los derrumbes sociales, el hundimiento de los grupos, sectores,
clases, contendientes, de ambos o de todos los bandos: “ganadore/as y
perdedore/as” pierden. Se trata de una situación en la que nadie gana, aunque
esos expertos en “hacer dinero”, no lo lleguen a entender.
2.2 Económicamente
La expansión mundial del capitalismo, y sus repetidos reacomodos
imperialistas desde que se industrializaran y desarrollaran los mercados
metropolitanos, no solamente vienen causando devastaciones y crecientes
colapsos ecológicos. También han tenido como consecuencia un proceso de
concentración de la riqueza, que prácticamente empieza con las sucesivas
expansiones europeas (Griega, Romana, Cristiana) y de EE.UU., y que hoy
alcanza dimensiones extremas.
En estos primeros años del siglo XXI, al ampliar el número de
“excluidos” del mercado capitalista globalizado, por extraordinarios
incrementos en la composición orgánica del capital, la economía entra en una
serie de recesiones que dan paso a crisis deflacionarias en las que resulta
imposible vender la grandísima y variadísima producción de mercaderías,
porque sus precios resultan inaccesibles para la inmensa mayoría de la
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población, gran parte de la cual está desempleada y sobrevive en las economías
informales, marginales, o de beneficencia.
La teoría marxista de la crisis del régimen del capital sostiene que:
...la economía capitalista no tiene como finalidad la satisfacción
de necesidades, sino la obtención de ganancias. Y la ganancia es
tanto más alta cuanto más alta es la tasa de plusvalor y cuanto
más grande es el capital, en igualdad de circunstancias. Además,
solo las empresas que cuentan con una alta concentración de
capital son capaces de racionalizar la producción, de aplicar
técnicas modernas, de reducir al mínimo los costos, de alcanzar
un alto rendimiento. Por estas razones, el capital trata de
comprimir el salario y de acumular la parte más grande posible
de ganancia. A través de este mecanismo, se reduce la capacidad
de consumo y se fuerza la capacidad productiva. El consumo de
la población, cuyos miembros son en su mayor parte asalariados
y trabajadores a sueldo, no crece al mismo tiempo que la
producción social. La divergencia entre la producción y el
consumo efectivo de la sociedad, aumenta con el progreso técnico
(Moszkoskowa, 1978: 21-22).
Esta tendencia se vería agravada justamente con la aceleración del
progreso técnico y la eliminación de empleos. Los estancamientos o
crecimientos lentos en las economías, así como simplemente la necesidad de
aumentar las ganancias, multiplican las presiones para reducir las plantillas de
obrero/as y empleado/as, sustituyendo personal con nuevos equipos y
tecnologías. Esto además permite negociar desde posiciones de fuerza con los
representantes laborales, amenazándoles con mayores despidos y exigiendo
reducciones de salarios, de feriados, de prestaciones sociales y sanitarias, etc.
Estos procedimientos aumentan efectivamente las ganancias al corto plazo,
pero las desinflan al largo o estructural plazo. Pues sus acciones reducen la
capacidad de compra de los mercados, y de ahí que las ventas crezcan poco de
año en año.
Dos breves descripciones de la crisis (que se pueden considerar como de
subconsumo o como de sobreproducción) que afectara al capitalismo mundial
a finales de la década de 1920 y principios de la de 1930, pueden ilustrar una
serie de similitudes entre aquella coyuntura y las tendencias actuales:
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El análisis del Institut für Konjunkturforschung de Berlín, realizado en
1931, que enfatiza el aspecto del subconsumo:
La observación empírica señala, con toda precisión, una doble
circunstancia que precedió la actual crisis económica mundial en
el campo de las mercancías y que la provocó. Por una parte está
la sobreproducción agrícola y por otra la industrial... La crisis
del año 1929 aparece como la consecuencia lógica de una
desproporción entre la producción y la capacidad de consumo. El
ingreso monetario de las grandes masas no basta para alcanzar
el ritmo de la producción... En todas las etapas del capitalismo
avanzado... podían observarse ya desde 1929 tensiones entre la
esfera del ingreso y la del capital... Tensiones que en esta ocasión
constituyen la “causa principal” de la crisis. Con esto, la teoría
del subconsumo se ha llevado la palma, en esta ocasión
(Wagemann, 1931: pp. 333-341).
El análisis de la crisis mundial de 1929 por Bahamonte Magro,
catedrático de economía en Madrid, realizado en 1998, que enfatiza el aspecto
de la sobreproducción:
La producción, globalmente considerada, ha superado... las
necesidades reales, condicionadas por una distribución
sumamente desigual de la renta. El contexto se agrava por el
mantenimiento de precios de monopolio gracias a los acuerdos
internacionales tipo cartel – que unifican precios y reparten
mercados –, provocando una acumulación de stocks sin vender.
Sobre este esquema actúa la crisis financiera que, al dislocar los
acuerdos, provoca desajustes que desembocan en una brusca
afluencia de stocks al mercado, y la consiguiente caída inmediata
de los precios... (L)as tensiones de la sobreproducción arrancan
del desfase pronunciado entre unos precios agrícolas cuyo
aumento es menos rápido que el de los productos
manufacturados, disminuyendo la capacidad de compra del
sector agrario. Por otra parte, la existencia de elevadas tasas de
paro... también restringe la capacidad de consumo... (La
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producción mundial se disparó) por encima de los niveles
sociales de absorción (1998: 11-12).
En el debate que siguió a la gran crisis económica de finales de la década
de 1920 y principios de la de 1930 se pueden distinguir entre, explicaciones
“endogenistas” que consideraban que la estructura económica interna de la
economía genera fluctuaciones que alteran los equilibrios, y las explicaciones
“exogenistas”, que consideraban que fuerzas externas a la estructura
económica eran responsables de tales fluctuaciones. Natalie Moszkowska,
ubicada en la corriente endogenista (que es la que en este momento más nos
interesa), en un trabajo publicado en 1936 (Ed. en español de 1978), parte de
considerar que las empresas típicas del capitalismo tardío son grandes
monopolios o carteles y elevada concentración del capital, en condiciones de
racionalizar la producción, de aplicar técnicas avanzadas, de reducir los costos
al mínimo y de lograr elevadas tasas de rentabilidad. Es así que el capitalismo
del siglo XX ha llegado a desarrollar fenómenos teóricamente ajenos a él y más
bien propios de otro sistema económico. Lo cual no quiere decir que los
fenómenos que aparecen sean “socialistas”, sino, como los denomina
Moszkowska, son fenómenos económicos del “capitalismo tardío”
(Spätkapitalismus). Este capitalismo tardío se caracteriza por breves períodos
de prosperidad y largos períodos de depresión: el empobrecimiento relativo se
torna absoluto.
La autora concentra el análisis en la relación que se da entre innovación
técnica y disminución del salario real, porque el progreso técnico desvaloriza
la fuerza de trabajo. Todo aumento de la productividad por introducción de
nuevos medios productivos, hace que los salarios nominales disminuyan. Se da
entonces una desproporción entre producción y consumo, y entre ahorro e
ingresos, generándose una crisis de subconsumo que se agudiza conforme
aumenta el crecimiento desproporcionado de la composición técnica del
capital. La postura de la autora es relevante hoy, en tanto discute a partir del
desencanto generado por la derrota de la revolución en Alemania a finales de
la Primera Guerra Mundial. Por eso afirma que hay una desproporción “total”
entre el poder contractual obrero y el patronal, por lo cual es imposible una
confrontación favorable a los obreros. Esta no es solamente la condición
general en el sistema capitalista, sino que se ve profundizada en el capitalismo
tardío. La condición de debilidad permanente de cada trabajador hacia el
patrón. Por eso la autora considera a la fuerza de trabajo como una variable
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dependiente (y no independiente como corresponde más con el marxismo), con
lo que enfatiza los impactos depresivos de un capitalismo ampliamente
dominado por las corporaciones transnacionales, que realizan gran parte de sus
negocios entre ellas y con grandes consumidores públicos o estatales, y que
supuestamente no pierden mucho con la ausencia de los sectores trabajadores
en los mercados de consumo.
La limitación del trabajo de la referida autora, reside en que no considera
las dimensiones políticas y militares que enmarcan las actividades económicas,
y que pueden agravar o aliviar las tensiones derivadas de las crisis, mediante
algún tipo de intervención – tanto liberales como estatistas (por ejemplo
Keynesianos) asignan tareas (regulatorias, directivas, etc.) a los sistemas
políticos. En el capitalismo tardío, además, un rasgo peculiar es el
relativamente importante papel que cumplen los sistemas militares en las
economías de las potencias capitalistas, de forma sistemática (o integrada) a
partir de la Segunda Guerra Mundial, con el desarrollo de “complejos militares
industriales universitarios”, especialmente en EE.UU., Inglaterra, Francia y la
URSS.
El capitalismo del siglo XXI padece una crisis de sobreproducción. Es el
abismo cada vez más ancho que existe, entre las capacidades y necesidades
productivas, que se ahonda gracias a nuevos conocimientos científicos y
tecnologías, por una parte, y la reducción cada vez mayor del consumo de la
población, sobre todo por el crecimiento del desempleo estructural, incluyendo
los sectores “informalizados”, los “marginalizados” y los “excluidos, en primer
lugar quienes no tienen cómo trabajar. Susan George (2001) plantea esto
lúcidamente:
El futuro del libre mercado depende... de quién recibe los
beneficios del crecimiento. Si la recompensa va a parar a la mitad
inferior de la población, la inmensa mayoría de estas personas
relativamente pobres utilizarán su dinero para el consumo y
mantendrán la demanda boyante. Si, por el contrario, la
recompensa va destinada al tramo superior de la escala social,
los receptores colocarán sumas aún mayores en los mercados
financieros en lugar de adquirir bienes y servicios. Como
consecuencia, la demanda caerá, trayendo consigo el aumento de
las existencias, la superproducción y el estancamiento” (p.20).
“Cada empresa gigante intenta ganar una ventaja temporal
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realizando inversiones en tecnología de vanguardia con una
aportación mínima de mano de obra. Como consecuencia, hay
demasiadas fábricas notablemente eficientes que producen
demasiados bienes para demasiados pocos compradores
solventes. Las empresas, al mismo tiempo que despiden a sus
trabajadores, reducen la plantilla de sus clientes. No se ha
encontrado nada que sustituya la sabiduría de Henry Ford: paga
a tus trabajadores lo suficiente como para que puedan comprar
tus coches. Dado que es matemáticamente imposible vender todos
los automóviles (y muchos otros productos) que se producen
actualmente, es obligado que se produzcan reorganizaciones
importantes, pese a lo cual las empresas siguen cerrando
modernas fábricas para construir otras aún más modernas en
otro lugar, generalmente contratando a menos trabajadores a los
que pagan también menos... La saturación crónica fue uno de los
factores que provocaron la Gran Depresión de los años treinta;
ahora se dan la mayoría de elementos necesarios para que se
produzca otra (pp.46-47; Énfasis ESF).
Los citados Berzosa, Bustello y De la Iglesia (2001: 167), opinan
justamente que el desempleo tecnológico de principios del siglo XXI se debe a
la presencia de tres tendencias:
• Crecimiento de la oferta de trabajo;
• Mejoras en la productividad; y
• Débil crecimiento de la demanda real.
El ataque neoliberal contra los salarios, le ha permitido al capital
transnacional apoderarse de la política y la ideología. Esto ha reducido la
capacidad política no solamente de quienes trabajan, sino sobre todo también
de quienes no trabajan “oficialmente”, ya que realizan actividades en
economías informales o domésticas. Las nuevas “libertades” del capital
conducen a la rápida concentración de los recursos, por la capacidad para
“comprimir” los salarios y en general los ingresos de quienes no son dueños
del capital. El ataque neoliberal contra los salarios es entonces decisivo para
explicar la debilidad “estructural” de la demanda mundial. La actual crisis de
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sobreproducción y/o subconsumo tiende a profundizarse y a no encontrar
solución, por tres motivos al menos:
PRIMERO. Precipita el agotamiento y la devastación de los recursos y
los entornos naturales planetarios, y por tanto dispone cada vez menos de los
recursos adicionales o nuevos, necesarios para relanzar la produccion y/o para
mantener el status quo ambiental. A principios del siglo XXI, señalaba
S.George (2001):
... la escala de la actividad económica ejercerá una presión
extrema sobre los límites de la biosfera e incluso sobre la
capacidad del planeta para sostener la vida... Varias señales
indican que el competitivo sistema de mercado ya está haciendo
que se sobrepasen ciertos umbrales naturales, incluidos algunos
que quizá no reconozcan las autoridades políticas hasta que sea
demasiado tarde... Las tensiones ecológicas... se traducirán en
una mayor inestabilidad política y en el aumento de los conflictos
armados” (p. 26). “Ni las empresas gigantes ni las comunidades
ni las personas acaudaladas pueden, con independencia de los
bienes que posean, librarse de las consecuencias de la
degradación ecológica. Incluso ellas parecen impotentes para
detener el proceso, y son un ejemplo de la paradoja de unos
beneficiarios que son incapaces de proteger el sistema que les
beneficia.
SEGUNDO. La crisis general se enmarca en una dinámica centrada en
el sector financiero especulativo, como señalan diversos autores, por ejemplo
Sader:
A pesar de los avances tecnológicos del período (especialmente
los vinculados a la informática), la mayoría de los capitales
circula en el mundo dentro del circuito financiero, gran parte de
los cuales están directamente vinculados con la especulación. El
propio financiamiento del “boom” de las empresas informáticas
se dio a través de capitales volátiles que, una vez en regresión,
arrastran con ellos también a ese sector que, según los ideólogos
de la “nueva economía”, estarían exentos de crisis (2001: 93).
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La crisis económica recurrente y con tendencias a convertirse en
permanente, tiene como expresión significativa el colapso del régimen
financiero internacional que Duncan (2003) denomina “el patrón dólar” (“the
dollar standard”). Desde que la administración Nixon-Kissinger desligara el
valor de la moneda nacional de EE.UU. del valor del oro a principios de la
década de 1970, este país ha podido endeudarse y mantener grandes déficits de
cuenta corriente, vendiendo (sobre todo a extranjeros y socios comerciales)
instrumentos de la deuda nacional del banco central. El valor del dólar ha
colapsado ya varias veces antes (administraciones Nixon y Carter), y ha estado
perdiendo terreno recientemente, ahora frente a un competidor capaz de
convertirse en moneda de reserva por el volumen de su producción y de su
comercio. (Cf. también Arnold, 2002).
Las oligarquías mafiosas del capital financiero internacional encuentran
un apoyo valiosísimo en las instituciones financieras internacionales
“multilaterales” o “públicas” (FMI, Banco Mundial, BID, por ejemplo). De
consuno, corporaciones transnacionales, bancos privados, e instituciones
financieras internacionales, actúan para que esos agentes privados se hagan
dueños de los principales activos de muchos países, o para realizar grandes
robos mediante la especulación con las monedas. Así, por ejemplo J. SaxeFernández y G. C. Delgado Ramos (2004), han mostrado cómo el Banco
Mundial viene siendo un agente crucial en la privatización o destrucción de las
principales empresas y servicios de México. M. Chossudovsky (1999), por su
parte, ha mostrado cómo capitales especulativos, conjuntamente con el Banco
Mundial, saquearon Brasil entre finales de 1998 y primeros meses de 1999,
apoderándose de unos 40.000 millones de dólares, especulando con papeles
estatales de Brasilia y con los valores del Real y de la moneda de EE.UU. y
haciendo, al mismo tiempo, que el estado brasileño aumentara su deuda externa
en un monto similar. Es decir, el dinero empleado por el banco central de Brasil
para “sostener” el Real y pagar a quienes poseían papeles estatales, pasó, del
Banco Mundial (articulador de un conjunto de agentes estatales y privados), a
través del Banco Central de Brasil, a manos de los especuladores (incluyendo
agentes privados que habían aportado parte del dinero “prestado” a Brasil).
El carácter financiero especulativo de la crisis tiende a ser compatible
con climas de guerras, subiendo y bajando las acciones bursátiles según la
marcha de las confrontaciones por apoderarse de recursos económicas claves;
guerras entre las grandes potencias y también de las grandes potencias contra
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países pobres hasta hace poco “independientes” y hasta aliados de EE.UU. o la
UE (Irak o Afganistán, por ejemplo).
Guerras convencionales y no convencionales. Guerras internas, guerras
policìacas, guerras secretas, guerras clandestinas, guerras sucias, incluyendo
“limpiezas étnicas” o “nacionales” como las que lleva a cabo Israel contra el
pueblo Palestino (y que EE.UU. imita en Irak).
TERCERO. La actual crisis de subconsumo o sobreproducción afecta
negativamente la incorporación de nuevos conocimientos y tecnologías,
excepto en las esferas militar y policíaca. Lo cual resulta en que la ampliación
de los mercados, necesaria para una eventual recuperación, se dirige a
submercados especializados: elites y oligarquías metropolitanas y
dependientes, y sistemas militar policíacos.
Cualquier análisis del colapso social mundial debe también referirse a la
forma en que se enfrentan y tratan de resolver los problemas y dilemas,
señalando destacadamente la recurrencia a la intimidación, la violencia (de
muchos tipos) y la guerra. El siglo XX ha sido el más monstruoso de toda la
historia, centenares de millones de personas perdieron la vida en varias guerras
mundiales (Ia, IIa, “Fría” y “Norte-Sur”), muchísimas más sufrieron heridas,
quedaron lisiadas y psicosocialmente traumatizadas, perdieron sus entornos
ontológicos definicionales (redes interpersonales y sociales, casas/habitaciones,
barrios, pueblos, ciudades, empresas, instituciones, naciones, paisajes, recursos
y medio ambiente naturales). La capacidad para destruir se multiplicó por
millones de veces desde 1900, en ella se funda la ética y la moralidad de las
personas, grupos y países que ostentan el poder y riqueza y que pese a todas las
atrocidades continúan proclamándose y auto definiéndose como “humanistas”,
“demócratas”, “respetuosos de los derechos humanos”, etc.
3.
EL COLAPSO ECOLÓGICO MUNDIAL
Dos componentes estrechamente vinculados vienen precipitando al
planeta hacia una “sexta extinciòn” (Leakey & Lewin, 1997): la destrucciòn
cada vez mayor de los ecosistemas del planeta, y la privatización violenta de
todos los ecosistemas y recursos naturales por parte de los ejércitos (locales y
de las potencias) y las corporaciones transnacionales de las grandes potencias.
Primero consideraré los procesos de destrucción de la naturaleza, y luego los
de su apropiación. Este artículo se complementa con el siguiente, en el que se
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discute la imbricación del petróleo como recurso energético principal, con la
crisis mundial y con su actual militarización.
La ecología adquiere cada vez mayor relevancia como área
interdisciplinaria de estudios a partir de la década de 1970, cuando cambia su
perfil epistemológico, reorganizando la discusiòn sobre las relaciones de los
organismos vivos respecto del ambiente que los rodea, para considerarla desde
y para sus dimensiones políticas.
En 1972 se celebró en Estocolmo una primera Conferencia de las
Naciones Unidas sobre el Medio Ambiente. Para ese momento, el llamado
Club de Roma ya había presentado su conocido informe Los límites del
crecimiento, que se publica en medio de la crisis petrolera de mediados de esa
década (1973). El informe sostenìa que el “desarrollo” tal como se llevaba a
cabo conducía a la catástrofe ecológica, y la crisis energética venía a confirmar
esta aseveración. En las potencias capitalistas de entonces se generó un
movimiento “ecologista”, que significaba un estadio superior de las
preocupaciones y la organización política sobre la naturaleza, y que planteaba
la necesidad de transformar la mentalidad, y los estilos de vida y de
“desarrollo” de la humanidad (sobre todo de los ricos), como única forma para
evitar un colapso ecológico generalizado.
En algo más de 30 años el “movimiento ecologista” ha crecido
impetuosamente por todo el planeta, en cada persona cada dìa hay màs
conciencia de la destrucciòn ambiental. Durante la década de 1980, el
movimiento ecologista creció mucho, pero al mismo tiempo su agenda se vio
cooptada por los organismos financieros internacionales (OFIs) (el Fondo
Monetario Internacional, el Banco Mundial, el Banco Interamericano de
Desarrollo, y otros). En esta década, los países pobres o del “Sur” pierden
muchas conquistas políticas y económicas (tanto internas como
internacionales) frente a un emergente neo imperialismo del “Norte”, que
utiliza el control financiero y la deuda externa de los países pobres, para
obligarles a realizar procesos en los que sus economías son forzadas a
“ajustarse” para contribuir con el bienestar de gobiernos y empresas de las
grandes potencias (acreedores). Hay un retroceso en las políticas energéticas,
sobre todo en EE.UU., que desestimulan la exploración de alternativas y que
enfatizan el petróleo, el gas, el carbón y la energía nuclear.
A nivel epistemológico, es de destacar cómo el movimiento
ambientalista se ve penetrado por los paradigmas economicistas neoliberales
que predominan a partir de los gobiernos de Reagan en EE.UU., de Thatcher
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en Inglaterra, y de su precursor, amigo y protegido, Pinochet, en Chile. Estos
paradigmas adquirieron carácter oficial cuando la Academia de Ciencias de
Suecia ofrece el Premio Nóbel a Milton Friedman, arquitecto del experimento
chileno e inspiraciòn del neoliberalismo.
Por su parte, la ecología introduce el paradigma economicista neoliberal
inintencionadamente y más bien como una paradoja cruel. Pues lo que buscaba
el movimiento ecologista (Informe de la Comisión Brutland, por ejemplo) era
cuestionar las ideas, las políticas y las prácticas económicas y de desarrollo,
responsables por la creciente destrucción social y ecológica. El resultado, sin
embargo, conduce a postular y a tomar como supuesto para el análisis, que no
debería existir incompatibilidad entre desarrollo económico y salud ecológica.
De aquí obtenemos una “conciliación entre mercado y naturaleza”, que se va a
articular conceptualmente en la noción de “desarrollo sostenible” o
“sustentable”. Los OFIs, los gobiernos de las potencias y sus empresas
transnacionales, así como las ONGs que se financian en gran medida por
subsidios de esos estados y empresas, y finalmente también gobiernos,
empresarios, académicos y activistas ecologistas del “Sur”, acabaron por
aceptar, y asumir en sus discusiones y análisis, esa noción de “desarrollo
sostenible”. Y, sobre esta base, durante la década de 1990 y durante los
primeros años del siglo XXI, se han organizado nuevas instituciones y
programas, que conforman un marco ideológico, jurídico, e institucional, el
cual sirve para que las grandes potencias y sus empresas se apropien de todos
los ecosistemas y recursos naturales del planeta.
Del 3 al 14 de junio de 1992 se celebró en Rio de Janeiro la Conferencia
de las Naciones Unidas sobre Medio Ambiente y Desarrollo (CNUMAD),
conocida como “Cumbre de la Tierra”, en la que se plantearon importantes
aspiraciones y metas para la década de 1990, que se consideraba “crucial” para
estabilizar y empezar a regenerar el deteriorado planeta. Al mismo tiempo, en
la Declaración correspondiente encontramos elementos del “desarrollo
sostenible” que abren las puertas a las corporaciones transnacionales:
Principio 12: Los Estados deberían cooperar en la promoción de
un sistema económico internacional favorable y abierto que
conduzca al crecimiento económico y al desarrollo sostenible de
todos los países, a fin de abordar en mejor forma los problemas
de la degradación ambiental. Las medidas de política comercial
con fines ambientales no deberían constituir un medio de
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discriminación arbitraria o injustificable, ni una restricción
velada al comercio internacional. Se deberían evitar medidas
unilaterales para solucionar problemas ambientales que se
producen fuera de la jurisdicción del país importador. Las
medidas destinadas a tratar los problemas ambientales
transfronterizos o mundiales deberían, en la medida de lo posible,
basarse en un consenso internacional (Consejo de la Tierra,
2002:58) (Énfasis ESF).
Principio 16: Las autoridades nacionales deberían procurar
fomentar la internalización de los costos ambientales y el uso de
instrumentos económicos, teniendo en cuenta el criterio de que, el
que contamina debe, en principio, cargar con los costos de la
contaminación, teniendo debidamente en cuenta el interés público
y sin distorsionar el comercio ni las inversiones internacionales.
(Ibid, p. 59). (Énfasis ESF).
Por su parte, la llamada Agenda 21 es más clara y explícita respecto del
papel que jugarán las corporaciones transnacionales, aunque sin mencionarlas
en cuanto tales. El primer apartado de esa Agenda, sobre cooperación
internacional, empieza con el “comercio y desarrollo sostenible”, que busca
“detener el proteccionismo y expandir el comercio mundial”, y que exige de
los países que se dediquen a “Facilitar la integración de todos los países en la
economía mundial y en el sistema comercial internacional” (2002: 69).
Adicionalmente, se indica que:
Los gobiernos deberán alentar al GATT, a la UNCTAD y otras
instituciones para realizar las siguientes actividades: – Tratar
que las normas y reglamentaciones ambientales no constituyan
restricciones al comercio... Ubicar las políticas ambientales
dentro de un marco jurídico-institucional que responda
adecuadamente a los cambios productivos y comerciales (Idem, p.
70).
La última de las tres principales políticas económicas que recomienda
esta Agenda pide:
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Aumentar la capacidad de ajustes de las economías mediante la
aplicación de políticas macroeconómicas y estructurales” (Loc.
Cit.). Igualmente, se recomienda que los “países en desarrollo”
procedan a “Estimular el sector privado, fomentar la actividad
empresarial y eliminar obstáculos institucionales (Idem.).
Sin embargo, otros documentos de la Cumbre de la Tierra, como el
Tratado de las ONGs, Declaraciones sobre Medio Ambiente y Desarrollo, son
más críticos de las corporaciones transnacionales de las potencias. Por esto y
por la agenda política de los sectores conservadores en EE.UU., el compromiso
de este país, crucial para hacer avanzar la agenda, al final quedò estancado por
la división entre el ejecutivo a favor del tratado y la oposiciòn conservadora del
congreso – que anteponía a cualquier consideración ambientalista o humanista,
el beneficio económico de las empresas de EE.UU. y la ventaja político militar
de ese estado.
Así como en la doctrina económica vigente durante esa década de 1990,
también en las dimensiones ambientales, el “internacionalismo neoliberal
globalista” miraba con optimismo un futuro sin guerras ni confrontaciones. Así
por ejemplo, el Worldwatch Institute indicaba en su propuesta para tal
Conferencia, que, en 1992:
... el mundo se encuentra en mejor situación para adoptar
medidas eficaces... la guerra fría ha concluido y, por primera vez
en varios decenios, Este y Oeste colaboran. Por otra parte, los
debates ideológicos entre el Norte y el Sur son ya mucho menos
destemplados, al aceptar varias naciones ricas la responsabilidad
de aplicarse a la solución de los problemas medioambientales de
la Tierra, y comprender los países pobres que la degradación del
medio ambienta amenaza su bienestar. En Río, se encontrarán en
un terreno común: el de la necesidad de acometer un esfuerzo
mundial para salvar el planeta (Brown, 1992)
El problema del internacionalismo neoliberal globalista, en este caso
como en otros (sus “costos sociales”, por ejemplo), fue que la doctrina y la
política más bien estimularon, protegieron y organizaron, una profundización
sin precedentes en el crecimiento de las disparidades sociales a nivel mundial,
y de destrucción natural. Por eso no es de extrañar que, según esa ONG citada,
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entre 1972 y 1992, los esfuerzos por detener la destrucción de la naturaleza,
“sólo han visto alguno que otro éxito suelto... A escala planetaria, casi todos los
indicios son negativos.” (1992:17).
A continuación advierte que: ...la salud del mundo se ha menoscabado
a un ritmo inaudito (Idem., p.18) (Énfasis ESF).
Doscientos millones de hectáreas de bosques se cortaron en ese lapso de
20 años, una superficie equivalente a casi la mitad del territorio de EE.UU. En
1980 se talaban 11 millones de hectáreas de bosques vírgenes, y en 1989 se
talaron 17 millones de hectáreas. En otro estudio, Myers estima que hace unos
8.000 años aproximadamente, al comienzo de la actual época del holoceno, el
planeta disponía de unas 6.000.000.000 (seis mil millones) de hectáreas de
bosques, equivalentes al 40% de todos los territorios mundiales. Al año 1988,
unos 2.400.000.000 ha de bosques ya habían sido talados (Myers, 1988). Entre
1972 y 1992, los desiertos aumentaron en el mundo en unos 120 millones de
hectáreas; y se perdieron unas 480 millones de toneladas de la capa de suelo
superior, que sirve para la agricultura. Para este autor, “La contaminación
atmosfèrica es un problema persistente en cientos de grandes urbes y en
infinidad de zonas rurales de todo el mundo” (p.23). Después de presentar
casos de destrucción ecológica atmosférica y del recurso hídrico, señala que:
“A escala planetaria, los síntomas de deterioro son incluso más inquietantes, y
los procesos en curso, más difìciles de cambiar” (p.25).
Respecto a la acelerada destrucción de la capa de ozono por emisiones
de cloro fluro carbonos (CFC), Worldwatch Institute señalaba que:
...aunque la producción de CFC se interrumpiera
inmediatamente, el desgaste de la capa de ozono continuará
durante dos o tres décadas y es muy probable que las capas
superiores de la atmósfera tardasen varios decenios en
recuperarse (Loc. Cit).
Adicionalmente, la cantidad de carbono que entra en la atmósfera como
resultado de quemar combustibles (sobre todo petróleo y carbón), representaba
6.000.000.000 (seis mil millones) de toneladas en 1990, es decir, casi una
tonelada per cápita. Kluger estima que, entre 1950 y 2001, la atmósfera
terrestre recibió cerca de 500.000.000.000 (quinientos mil millones) de
toneladas métricas de bióxido de carbono (Kluger, 2001).
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Por estos motivos, en el movimiento mundial ecologista que se articuló
para la reunión de Rio de Janeiro en 1992, pese a grandes y a veces insalvables
diferencias, una gran mayoría de participantes consideraba que la década de
1990 iba a ser decisiva para salvar o perder gran parte de la naturaleza, e
incluso arriesgar inminentemente graves colapsos generales (planetarios).
Las expectativas no se han cumplido, pues el neoliberalismo
institucionalista globalista ha tenido mucho éxito en profundizar, agravar y
precipitar crisis económicas, sociales y ambientales. Así, por ejemplo, en el
Informe Anual del World Watch Institute para 1995, se señala que “El consumo
de granos excedió nuevamente a la producción en 1994, reduciendo los acopios
mundiales de grano por segundo año consecutivo...” (1995: 18). “Si la
elevación en las temperaturas que prevaleciera desde finales de la década de
1970 hasta 1990 continùa, se escalará el riesgo de reducción climática de las
cosechas, a causa de intenso calor y sequías...” (Idem.). “Conforme la década
de 1990 se desarrolla, los asuntos ambientales adquieren centralidad. Los
gobiernos que no estabilicen las poblaciones de sus países antes que de las
demandas superen la producción sostenible de sus sistemas locales de apoyoa-la-vida, corren el riesgo de verse sobrepasados y abrumados por las
consecuencias de sus fallos” (Idem.: 20).
En el Informe Anual del Worldwatch Institute sobre Medio Ambiente y
Desarrollo, La situación del mundo 2000, ya se plantean claramente las
situaciones de colapso ecológico. Su director, L. R. Brown observa siete
tendencias destructoras de la naturaleza: el crecimiento de la población, la
subida de las temperaturas, el descenso de la capa freática, la disminución de
la tierra cultivable per cápita, el colapso de las pesquerías, la disminución de
los bosques y la pérdida de especies animales y vegetales (Brown, 2001). De
entre estas siete tendencias destructoras, destaquemos dos.
Durante las primeras fases de la Revolución Industrial, en el siglo XVIII,
la concentración de CO2 en la atmósfera se estimaba en 280 partículas por
millón (ppm). En 1959, ya con instrumental moderno se midieron 316 ppm, y
en 1998, 367ppm, un incremento del 39 por ciento en esos 40 años. Otra
estimación, del Hadley Centre for Climate Prediction and Research, estima que
en el año 2.020 habrán 441 ppm de CO2 en la atmósfera, y para 2.080 llegaría
a 731ppm. (Citado en Delgado, 2002: 82).
Por otra parte, el porcentaje de mamíferos, aves y peces “vulnerables o
en inminente peligro de extinción”, al año 2.000 se estimaba en: “...el 11 por
ciento de las 8.615 especies de aves, el 25 por ciento de las 4.355 especies de
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mamíferos, y se estima que un 34 por ciento de todas las especies de peces”
(p.31). En los océanos han empezado a desarrollarse crecientes “zonas
muertas” en las que la falta de oxígeno simplemente impide la vida. En otra
publicación, L. R. Brown estima que, sumando plantas y animales, hacia 1999
desaparecían unas 10.000 (diez mil) especies cada año (Brown, 1999). El
resultado sinergístico de estas tendencias destructoras es que:
...el número de especies con las que compartimos el planeta
disminuye. Según van desapareciendo cada vez más especies, los
ecosistemas locales comienzan a colapsar; y llegará un momento
en que nos enfrentemos a un colapso total de los ecosistemas
(2000:32) (énfasis ESF).
Los referidos Leakey y Lewin (1997) han sintetizado el deslizamiento de
la crisis ontológica ecológica, desde un nivel de “peligro” hasta el de
“colapso”. Señalan que, estudiando la historia natural desde perspectivas neo
evolucionistas, nuestro planeta ha vivido cinco grandes extinciones de vida,
desde el Cámbrico hasta hoy; que grandes cambios en la historia natural han
sucedido abruptamente y no gradualmente como creía Darwin; y que las
especies que sobreviven lo hacen no por selección natural sino en importante
medida por la suerte. Autores como Bright señalan cómo los colapsos
particulares de algún segmento de algún sistema ecológico, tienden y pueden
precipitarse en cascadas de efectos destructores. Así por ejemplo, C. Bright
(2000) destaca tres tipos de “sorpresas ambientales” y cuatro de “causas
importantes de discontinuidades y sinergismos”. Los tipos de sorpresa son: (1)
“Una discontinuidad.. un cambio abrupto en una tendencia o en un estado
previamente estable. La discontinuidad no es necesariamente evidente en una
escala humana; lo que cuenta es la escala temporal de los procesos
involucrados”; (2) “Un sinergismo es un cambio en el cual varios fenómenos
se combinan para producir un efecto mucho mayor del que cabría esperar de la
suma de los efectos tomados separadamente”; (3) “Una tendencia inadvertida,
aun cuando no produzca ninguna discontinuidad o sinergismos, puede producir
un importante daño antes de ser descubierta”(2000: 56).
Las cuatro causas importantes de discontinuidades y sinergismos que
señala este autor son: (1) “Un sinergismo puede producir una discontinuidad”;
(2) “Una discontinuidad puede producir un sinergismo”; (3) “Una reacción
positiva puede producir una discontinuidad (una reacción positiva es un ciclo
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de cambios que se amplifican)”; (4) “Una cascada de efectos puede llevar a
múltiples discontinuidades y sinergismos. (Una cascada de efectos se produce
cuando un cambio en uno de los componentes de un sistema produce cambios
en otro componente, que a su vez provoca el cambio de otro, y así
sucesivamente” (2000:58).
Por su parte, Gowdy (1998) destaca que:
Desde muchas perspectivas es claro que estamos llevando los
límites de la habilidad del mundo biofísico para sostener la
continua expansión del empleo de los recursos naturales y de la
capacidad asimiladora del medio ambiente. (p.66).
Según estos autores, los humanos somos una casualidad de la historia de
la vida, pero ciertamente somos la especie dominante hoy. Estamos equipados
con la capacidad de devastar la diversidad dondequiera que vayamos. Nuestra
racionalidad y nuestro conocimiento han servido para explotar colectivamente
los recursos de la Tierra en proporciones incomparables:
El homo sapiens está maduro para ser el destructor más colosal
de la historia, sólo superado por el asteroide gigante que chocó
contra la Tierra hace sesenta y cinco millones de años, barriendo
en un instante geológico la mitad de las especies de entonces (p260);
Dominante como ninguna otra especie en la historia de la vida en
la Tierra, el Homo sapiens está a punto de causar una gran crisis
biológica, una extinción en masa, el sexto acontecimiento de estas
características que habrá ocurrido en los últimos quinientos
millones de años. Y nosotros, el Homo sapiens, podríamos estar
también entre los muertos en vida (p.264-265).
Lamentablemente, más que “estar a punto de causar” el colapso
ecosocial generalizado, el ser humano ya lo está causando. Como señala el
citado Brown: “Los ecosistema locales empiezan a colapsar; y llegará un
momento en que nos enfrentemos a un colapso total de los
ecosistemas”(Brown, 2000:32) (Énfasis ESF).
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Concurrentemente con la destrucción ambiental se viene intensificando
la privatización de los ecosistemas y los recursos naturales de todo el planeta.
Este proceso es conducido ideológica, política y financieramente por el Banco
Mundial, con el apoyo de su principal dueño, los EE.UU. (Cf. Anexo I). El
programa de privatizaciones auspiciado por el BM respecto de los ecosistemas
y los recursos naturales se articula en una alianza con la Global Environmental
Facility (GEF) (llamada en español Fondo Mundial para la Naturaleza), y la
International Finance Corporation (IFC). La IFC ha estado involucrada en los
procesos de privatización que han llevado adelante los OFIs por ejemplo en
América Latina y, para este caso, también participa el Banco Interamericano de
Desarrollo (BID). La IFC “... busca financiar proyectos del sector privado en
países en desarrollo, ayudar a multinacionales del primer mundo a movilizar
capital en los mercados internacionales y proveer asesoría y asistencia técnica
a empresas y gobiernos” (Cf. www.ifc.org ).
El Banco Mundial, en su papel como agencia ejecutora de la
GEF, debería jugar el papel primordial para asegurarse el
desarrollo y administración de proyectos de inversión... El Banco
Mundial recurre a la experiencia inversionista de su afiliada, la
International Finance Corporation (IFC)... para promover las
oportunidades de inversión y para movilizar los recursos del
sector privado (Idem).
Mencionemos dos casos: primero, el Plan Puebla Panamá (PPP), el
Corredor Biológico Mesoamericano (CBM) y el Corredor Coralino
Mesoamericano (CCM); y segundo, los programas para privatizar el agua a
favor de las CTNs.
El PPP pretende “desarrollar” la vertiente caribeña de Mesoamerica,
históricamente menos “desarrollada” y poblada que la vertiente del Pacífico, por
razones climáticas sobre todo. Se trata de “abrir” y de “intercomunicar” regiones
y países, en ejes que se dirigen básicamente de sur a norte, en una especie de
reproducción a la inversa de los procesos de construcción de ferrocarriles en
México durante el siglo XIX, todos ellos dirigidos desde el centro de México
hacia diferentes puntos de la frontera con EE.UU. La red vial y de
comunicaciones del PPP similarmente, permitirá la integración territorial directa
de Mesoamérica con México y con EE.UU. Con esto, la región centroamericana
será objeto de compra por parte de intereses privados sobre todo de EE.UU., que
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explotarán sus recursos y poblaciones. El PPP promueve la bioprospección para
que las CTNs se apropien los abundantes recursos naturales biogenéticos de la
región, incluyendo recursos forestales, fibras, chicle, biodiversidad endémica y
agrícola, plantas ornamentales, resinas, agua y otros.
Simultáneamente con el PPP, los OFIs plantean desarrollar los corredores
mesoamericanos, biológico y coralino (CBM, CCM). La GEF aportó 67 de los
90 millones iniciales necesarios. El BM y la GEF prevén invertir de sus recursos
casi 900 millones de dólares en estos proyectos, y otros 4.500 provendrían de
CTNs – algunas a través de ONGs como INBIO en Costa Rica –.
La bioprospección ha sido destacada desde las primeras etapas de estos
proyectos. La bioprospección incluye la investigación sobre plantas
medicinales y demás biodiversidad con potencial comercial, incluyendo
actividades de clasificación y definición de especies, inventarios, descripción
de componentes de sustancias activas, establecimiento de métodos para su
extracción, procesamiento, certificación y acceso al mercado. En tanto
exploración de la biodiversidad para encontrar recursos comercialmente
valiosos para la genética y la bioquímica, como reconoce el BM, esta actividad
es calificada correctamente como biopiratería por algunos autores (Money,
2000; Delgado, 2003).
A partir de la bioprospección, otras posibilidades comerciales se
visualizan para los ecosistemas y los recursos mesoamericanos. La
“armonización” del PPP y de la CBM y CCM, implica la subordinación del
ambiente a su apropiación por las CTNs. El BM señala al respecto que,
...será necesario cuantificar el valor económico de todos los
bienes y servicios que suministrarán las áreas silvestres de la
región, como el agua, ecoturismo, plantas medicinales, etc.
(Véase el Anexo I, sobre el Banco Mundial; y J.Saxe-Fernández
2003 y 2004).
Respecto al agua, ya en 1998 la CEPAL anunciaba la privatizacion del
recurso en América Latina:
...casi todos los gobiernos de América Latina y el Caribe han
anunciado una política de aumento de la participación privada en
los servicios públicos relacionados con el agua... solamente en
algunos países se ha traspasado al sector privado la función de
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administrar los servicios de abastecimiento de agua y
saneamiento, si bien otras funciones dentro de esos servicios, de
carácter más técnico, efectivamente se han traspasado en muchos
países... (E)n América Latina son únicamente cuatro los paóises
en que las principales atribuciones de gestión de los servicios
públicos relacionados con el agua se han transferido al sector
privado. Sólo en uno de los cuatro, a saber en la Argentina, se ha
encomendado a empresas privadas la gestión de importantes
sistemas de abastecimiento de agua y saneamiento (CEPAL,
1998).
Esta tendencia ha creado muchas “oportunidades de inversión”, de las
cuales,
...la más interesante quizá sea la posibilidad de hacerse cargo del
servicio, ya sea mediante una compra directa o un arreglo de
concesión, pero las oportunidades no se paran ahí. Los contratos
de gestión también pueden brindar oportunidades apreciables...
(CEPAL, 1998).
En el diseño del PPP también encontramos claramente una propuesta
para privatizar el agua mesoamericana. Se prevee “la preparación de planes
estratégicos para el desarrollo de los servicios hidrometeorológicos nacionales
(incluyendo evaluaciones del marco institucional y legal, financiamente,
recursos humanos y comercialización de sus servicios); y... la creación de
marcos legales y administrativos para la comercialización de los servicios y
productos meteorológicos con valor agregado... Los Gobiernos a través de las
autoridades pertinentes se comprometen a... presentar un plan estratégico para
el desarrollo de los servicios meteorológicos e hídricos nacionales, basado en
un diagnóstico de los marcos legal e institucional de los servicios nacionales y
un estudio del mercado para productos hidrometeorológicos comerciales”.
Delgado (2003) nos ofrece un último ejemplo de la privatización del
recurso, describiendo el proyecto del Acuífero Guaraní, una de las megareservas
de agua dulce del mundo, que cubre una superficie de 1.2 millones de
kilómetros cuadrados entre Brasil, Argentina, Uruguay y Paraguay, más de dos
veces el área de Centroamérica. El desarrollo del proyecto del acuífero Guaraní
nos muestra cómo procede típicamente el Banco Mundial, que,
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...en este tipo de proyectos, devela su interés, primero, por
reconfigurar el manejo de cuencas y, segundo, por la
transferencia de recursos hídricos hacia el sector privado. Es
decir, por un lado, impulsa una concentración del manejo de
cuencas hídricas en manos de “selectos actores”; y, una vez
consolidados, busca, por el otro lado, colocar a las
multinacionales de los acreedores en el centro de la gestión y
usufructo del agua dulce (es decir, en los negocios de servicios
hídricos de almacenaje, distribución, potabilización, generación
de termo e hidroelectricidad, etc). (Delgado 2003).
Entre las empresas que se aprestan a operar, tanto en Mesoamérica como
en la cuenca del Guaraní, encontramos a Monsanto y Bechtel, esta última muy
vinculada con varios miembros del poder ejecutivo de EE.UU. y que
recientemente ha recibido jugosos contratos en Iraq.
La combinación sinergística de devastación y privatizacióncomercialización de la naturaleza aceleran el colapso ecológico mundial.
CONCLUSIONES
La sociedad humana organizada en el patriarcado tardío capitalista (Cf.
E. Saxe Fernández, 1997), ha desarrollado una determinada “intervención” o
“manipulación” sobre la naturaleza y sobre sí misma, que reduce o elimina la
forma natural y busca reemplazarla por una forma “patriarcal” – según algunas
teóricas feministas como G. Finn, se trata del deseo patriarcal de tener la
capacidad de procrear en el sentido que solamente tienen las mujeres. La
diversidad de formas materiales y mentales (máquinas o mentalidades), se
conciben, diseñan y emplean para posibilitar la mayor apropiación posible (por
parte de pequeños grupos en la sociedad humana), de riquezas materiales y de
poder político (con aspectos sociales e ideológicos incluídos). Esos pequeños
grupos están compuestos por un total de personas que podría oscilar entre 50 y
100 millones. Acumulan la mayor parte de la riqueza y el poder mundiales,
regionales, nacionales, locales y familiares. Por eso, esta forma de apropiación
y de intervención sobre la naturaleza y la misma sociedad, necesariamente
debe excluir del poder y la riqueza al “resto”, es decir, a la mayor parte (esa
“inmensa mayoría” excluida) de lo/as miembro/as de la sociedad mundial.
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También debe intervenir en la naturaleza de forma excluyente, es decir
violenta, con la utilización de procedimientos que acaban por destruir el
recurso natural, tanto el renovable como el no renovable. Este proceso se ha
venido repitiendo ya por lo menos desde el cataclismo ecológico provocado
por el imperio romano en la cuenca del Mediterráneo, pero se acentuó con el
fanatismo político, religioso y racista que emplearon las potencias europeas y
luego EE.UU., Japón y Rusia para “conquistar” y apropiarse del planeta, entre
los siglos XV y XIX. Durante los siglos XIX y XX el proceso se va acelerando,
adquiriendo una intensidad inusitada a partir de la llamada Segunda Guerra
Mundial (1939-1945) y durante todo el resto del siglo XX. A partir de la década
de 1980 y sobre todo en la de 1990, la devastación ecosocial adquiere
proporciones incontrolables y cada vez más amplias. No hay “reconstrucción”
de los países que EE.UU. o la OTAN o la ONU “devastan” para “garantizar la
libertad” política y económica; no hay “humanidad” para los excluídos pues las
guerras “humanitarias” matan a esos mismos excluídos – de la misma manera
que la “lucha contra la pobreza” tiende a convertirse en una “guerra contra los
pobres” (Cf. Techer, 2001).
Sin embargo, a partir de los atentados contra el Pentágono y el Centro
Mundial de Comercio en setiembre de 2001, los señores de la guerra ya no
necesitan pretextos pseudo humanitaristas, porque la “guerra contra el terror”
necesariamente es una guerra entre contendientes que deben y tienden a
sustentar ideologías y políticas “extremistas”, como corresponde a la necesidad
de acciones y pensamientos que promueven espirales donde se van
magnificando el terror y el similarmente terrorista contra terror.
La precipitación hacia abismos apocalípticos es entonces necesidad y
urgencia del patriarcado tardío capitalista. Los colapsos ecosociales
constituyen el ácido y explosivo fundamento de la locura característica de los
grupos minoritarios que concentran el poder y la riqueza mundiales. “Locura”
porque las acciones y pensamientos que emprenden para mantener sus
prerrogativas, incrementan las amenazas y la crisis de esas prerrogativas, y
solamente pueden responder con nuevas acciones y pensamientos que
“solucionan” algunos de los problemas, pero con el resultado de crear otros
nuevos y más difíciles y grandes problemas; los cuales, al final de cuentas en
realidad no son entonces dos tipos de problemas, sino la profundización
(incluso “profundización desviada”) de la devastación social y ecológica
universal.
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En una guerra contra el “terrorismo”, el dilema de la seguridad llega a su
clímax. La guerra contra el terrorismo precipita a las naciones al caos, la
degradación moral, el despotismo sanguinario, el fanatismo (de carácter
notablemente religioso por la percatación, consciente o no, de la inminencia y la
vivencia de cataclismos social ecológicos), la miseria y el cinismo máximos.
Toda la sociedad, los bandos contendientes así como los espectadores, los
opositores y las víctimas, tienden a ser presa de ese fatal círculo de vertiginosa
vorágine de decadencia en la que entran determinadas estructuras sociales,
políticas, económicas y militares; sociedades y civilizaciones como China,
Roma, la Rusia zarista y la URSS brezhneviana, Filipinas e Indonesia, Argentina,
Brasil y Chile durante las dictaduras militares de las décadas de 1960 y 1970, así
como Irlanda, España y otros países. El modelo de modelos de estado anti
terrorista es Israel, particularmente bajo el gobierno de Sharon, que concibe y
trata a los palestinos como terroristas. Del ejemplo israelí se nutre la
administración de Bush II, asesorada por el ejército israelí para enfrentar la
guerra de guerrillas de la resistencia a la ocupación en Iraq, por ejemplo. La
universalización de esta tendencia se orienta a presentar, a los ciudadanos y a los
estados de EE.UU. y otros 27 países “de primera categoría”, como el centro antiterrorista, y al resto de la población del mundo, y de países, como al menos
implícita o potencialmente terroristas, como el “centro terrorista”. El centro antiterrorista sería USA, que en el símil es Israel; y el centro terrorista serían los
países del “sur” y los pueblos “no blancos”, que en el símil son los palestinos.
Algunos autores hablan de “guerras por los recursos”, emprendidas por
EE.UU. y otras potencias para acaparar o apoderarse de las fuentes de
“recursos vitales” para sus economías, sociedades y aparatos militares (Klare,
2001; Heinberg, 2003). Esta orientación es característica del período posterior
al fin de la Guerra Fría, aparece notoriamente ya durante la administración
Clinton. Por supuesto, el primer recurso estratégico por el que EE.UU. y otras
potencias están dispuestas a guerrear es el petróleo. Este tipo de estrategia
tampoco es nuevo, sino más bien característico de la misma expansión
capitalista desde al menos el siglo XV: el control de materias primas y los
“recursos” humanos, provocó enfrentamientos entre las principales potencias.
Actualmente, sin embargo, su intensidad y características son mucho más
acentuadas, por las condiciones que imponen los colapsos ecológicos y
sociales. Así, el mismo Klare, para explicar las causas de este nuevo tipo de
guerras recurre a planteamientos neo o cuasi malthusianos, que establecen una
relación directamente proporcional entre el tamaño de la población y el
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consumo de recursos naturales. Según este autor, estas guerras por los recursos
tienen su origen en las demandas planteadas por una población que crece
rápidamente, por recursos cada vez más escasos. La noción de escasez es
nuevamente central, en torno a ella ha girado un debate sobre las existencias de
reservas petroleras, por ejemplo, en la que las empresas, los gobiernos y la
misma Agencia Internacional de Energía no preveen ningún problema,
mientras que numerosos críticos sostienen lo contrario, que el petróleo está
pronto a su agotamiento. Otro motivo de estas guerras de recursos, sostiene
Klare, es que esos recursos se encuentran en países “inestables” – o más bien
que tienen problemas con que EE.UU. les controle, agregamos nosotros.
Aparte del petróleo y el gas natural, el otro recurso que Klare y muchos otros
señalan como de máxima prioridad estratégica es el agua – tema muy
importante para todas las regiones que tienen mucha cantidad de ella. Esa
escasez creciente de recursos estratégicos pone a soñar a los asesores de Bush
II, quienes esperan encontrar en Marte (of all places), abundande petróleo
producto del pasado orgánico de ese planeta, así como suficiente agua como
para obtener oxígeno para respirar, e hidrógeno para propulsar los navíos de
transporte y otros. Mientras tanto, las prioridades están en controlar las áreas
principales de petróleo, entre las que Klare cita el Medio Oriente y el Asia
Central. Sobre el agua se refiere a los casos ya conocidos del Cercano y Medio
Oriente, así como al Nilo, y a otros ríos multinacionales de interés estratégico
para las potencias – incluyendo el Amazonas, por ejemplo y, como señalan
otros autores (Delgado 2002), también hasta las cuencas de los fronterizos
mesoamericanos como el Usumacinta o el San Juan.
A principios de 2004 nos hemos enterado que el gobierno de EE.UU. ha
estado ocultando información disponible, que señala el rápido agravamiento
del deterioro atmosférico planetario. La noticia ha causado honda
preocupaciòn y molestia entre “el público extranjero”, por ejemplo en Francia,
donde las temperaturas veraniegas del 2003 llegaron a los 50 grados celsius,
provocando la muerte de al menos 15.000 anciano/as. En febrero de 2004,
sesenta distinguidos cientìficos de EE.UU., incluyendo 20 que recibieran
premios Nobel, denunciaron públicamente la campaña de desinformación del
Ejecutivo del gobierno. La acelerada militarización de la crisis mundial que
lleva adelante y que desata la administración de Bush II, constituye su política
para hacer frente al colapso ecosocial en marcha.
El colapso ontológico social incluye componentes múltiples: colapsos
económicos (crisis, concentración, dilapidación de riqueza); colapsos
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antropolóticos, psicológicos, sociológicos y políticos (guerras, hambrunas,
pestes, mafización, descomposición étnico nacional,); colapsos ideo culturales
(hiper egoísmo, nihilismo, cinismo, autoritarismo, agresivismo genocida y
ontocida). Encontramos cada vez más “roces” y “choques” entre elementos,
partes y procesos sociales, de todo tipo y características. Se coordinan
dimensiones individuales, grupales, sectoriales, locales, regionales, nacionales,
internacionales, institucionales, ideacionales, lógicas, imaginarias, lúdicas y
eróticas. Pero se trata de coordinaciones cada vez más difíciles, cada vez más
entorpecidas por sí mismas y por todas las demás. Así como el trabajador no
propietario tiene que intensificar el número de horas laborales y su rendimiento
durante ese tiempo, para apenas sostener un un puesto con un salario nominal
que sin embargo cada vez tiene menos capacidad de compra, así también en el
conjunto de instituciones sociales, se requiere cada vez más esfuerzo para
“mantener” los “status quo”; aunque no pueda evitarse que en los bordes tanto
como en los centros ocurran también descomposiciones, derrumbes,
desapariciones, exterminios. Se mantiene todo aquello que se puede sostener,
hasta donde sea posible. Pero la degradación social general continúa, y tiende
a explotar en “cadenas sinergísticas” que pueden conducir a mayores colapsos
del status quo, o a tendencias reorganizativas alternativas.
El proceso social histórico ha tenido resultados devastadores sobre el
entorno planetario de la naturaleza holocénica. Se ha acelerado con y desde la
expansión y dominación de la civilización cristiana y el sistema socio
económico capitalista. Alcanza dimensiones inmanejables para los ecosistemas
tanto como por las mismas instituciones sociales en las que surgieron y se
desarrollaron. Se dan así otras sinergias entre los colapsos sociales y los
naturales, que a su vez alimentan o subtienen el “marco ontológico” en el que
operan los diferentes actores.
La prueba de esta tendencia reside claramente en que las potencias
hegemónicas, EE.UU. en primer lugar, definen la situación político militar
mundial como “guerra contra el terrorismo” (que enmarcaran o acompañan las)
“guerras de recursos”. Es decir, la civilización mundial cristiana capitalista
actual se caracteriza por: desarrollar procesos de militarización definidos en
función de un creciente dilema de seguridad – generado por los colapsos
ontológicos ecosociales. La militarización y el creciente dilema de
seguridad inciden a su vez muy fuertemente, en sentido destructivo,
amplificando esos colapsos.
74
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TRÊS MEDIÇÕES, UMA REGIÃO
TROPICAL DE FRONTEIRA, E APENAS
UM ACHADO: DESENVOLVIMENTO
SOCIOECONÔMICO DA REGIÃO
AMAZÔNICA BRASILEIRA, 1953-1996.
1
José Augusto Drummond*
Sumário: Introdução. 1. Contexto analítico; 2. Medição n.º 1 – Haller e colaboradores – testando
diretamente a hipótese de Bunker com dados macro-regionais válidos para 1970 e 1980; 3.
Medição n.º 2 – FJP, FIBGE e IPEA constroem uma base de dados original; 4. Medição n.º 3 –
mudanças anuais no Amapá, 1953-1996; Sintese e Conclusões.
Resumo: Descreve e discute três medições
independentes das condições socioeconômicas
dos habitantes da Amazônia Legal e do Estado
do Amapá, válidas para diferentes anos ou
períodos entre 1953 e 1996. Usando métodos e
bases de dados distintos e adotando diferentes
intervalos cronológicos, as três medições
revelam que na Amazônia Legal e no Amapá
houve um notável grau de melhoria das
principais variáveis socioeconômicas para as
quais existem dados. Este achado recorrente
questiona o pressuposto mais adotado e a
principal hipótese implícita ou explícita no
conjunto da literatura, que postula a ocorrência
de uma débâcle social de escala macro-regional
na Amazônia brasileira nas últimas décadas.
Argumenta-se que existe a necessidade de
realizar mais estudos de variados escopos e
empiricamente fundamentados sobre a enorme
região, capazes de relativizar ou superar o
marco catastrofista de uma literatura que
dispensa comprovações empíricas e/ou
extrapola de maneiras duvidosas achados locais
para o conjunto da região.
Abstract: It describes and discusses three
independent measurements of the socioeconomic conditions of the inhabitants of the
Legal Amazon and the State of Amapá, valid
for different years or periods between 1953 and
1996. Using methods and distinct databases
and adopting different chronological intervals,
the three measurements disclose that in the
Legal Amazon and in the State of Amapá it had
a notable degree of improvement of the main
socioeconomics variables for which there are
data. This recurrent finding questions the most
adopted presupposition and the main implicit
or explicit hypothesis in the set of the
literature, which claims the occurrence of a
social debacle of macro-regional scale in the
Brazilian Amazon in the last few decades. It is
argued that the necessity to carry through more
varied purposed and empirically based studies
on the enormous region exists, capable to
relativize or to surpass the catastrophist
landmark of a literature that need no empirical
evidences and/or surpasses in doubtful ways
the local findings for the set of the region.
Palavras-chave: Amazônia Legal; Amapá;
Desenvolvimento socioeconômico; Medição;
Fronteiras; IDH
Key-words: Legal Amazon; Amapá;
Socioeconomic development; Measurements;
Boarders; IDH.
*
Doutor em Land Resources. Professor Adjunto do CDS da Universidade de Brasília.
1
Adaptado de um paper com o mesmo título apresentado no XXIII International Congress da LASA, Washington D. C.,
September 6-8, 2001. Parcialmente baseado em pesquisas realizadas para a minha tese de Ph. D., Environment, Society and
Development: An Assessment of the Natural Resource Economy of the State of Amapá (Brazil) (Madison, Wisconsin, 1999).
Agradecimentos a Archibald Haller, Alberto Carlos Almeida, Danielle Cyreno Fernandes, Marcos Chor Maio e Neyla
Vaserstein por leituras críticas e sugestões. Produzido em parte com apoio da CAPES e do CNPq.
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INTRODUÇÃO
Este texto descreve e discute três exercícios independentes de medição
das condições socioeconômicas dos habitantes da Amazônia Legal e do Estado
do Amapá, válidas para diferentes anos ou períodos entre os anos de 1953 e
1996.2 O foco recai sobre as metodologias e bases de dados usadas, mas o texto
discute também o grau em que os seus achados contraditam o postulado e/ou a
hipótese principal da literatura.3
Primeiro, examino o contexto analítico da literatura sobre o desenvolvimento da Amazônia e o seu postulado/hipótese do desastre social e
ambiental. Em seguida, trato de cada uma das medições e destaco como elas
contraditam a literatura. Concluo com a afirmação da necessidade de revisão
do postulado/hipótese principal. Espera-se que este texto chame a atenção para
a necessidade de medições minimamente consensuais, para que os debates em
torno do presente e do futuro da Amazônia superem um marco meramente
adjetivo ou opinativo. Além disso, pretende-se que os estudiosos se
familiarizem com as bases de dados existentes ou de montagem viável, as quais
permitem tais medições, indispensáveis para um debate científico sobre uma
região tão grande e complexa.
1.
CONTEXTO ANALÍTICO
Nos últimos 20 anos, aproximadamente, surgiu uma extensa literatura
sobre mudanças sociais, econômicas e ambientais na bacia amazônica, com
76
2
Os textos que trazem essas medições são Archibald O. Haller et al, ‘The socioeconomic development levels of the people of
Amazonian Brazil — 1970 and 1980’, Journal of Developing Areas, 30 (April 1996), pp. 293-316 (versão revista deste artigo
foi publicada como Haller, A. O.; Torrecilha, R.; Haller, M. C. Del P. e Tourinho, M. M., “Os níveis de desenvolvimento
socioeconômico da população da Amazônia brasileira — 1970 e 1980”. História, Ciências, Saúde – Manguinhos, vol. VI
(suplemento), julho 2000, p. 941-973); Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento et al, Desenvolvimento
Humano e Condições de Vida: Indicadores Brasileiros. Brasília, 1998; e Drummond, J. A., Environment, Society and
Development, Capítulo 7. Um resumo dos achados e das implicações analíticas deste terceiro texto foi publicado como
“Investimentos Privados, Impactos Ambientais e Qualidade de Vida num Empreendimento Mineral Amazônico – o caso da
Mina de Manganês de Serra do Navio (Amapá)”, Manguinhos, VI (Suplemento), setembro 2000, p. 753-792.
3
O estado do Amapá mereceu atenção especial neste artigo por ter sediado o mais antigo, duradouro e bem-sucedido dos
“grandes projetos” da Amazônia contemporânea, a mina de manganês de Serra do Navio. Se algum desses “grandes
projetos” foi capaz de causar impactos – positivos e negativos – no desenvolvimento local, Serra do Navio teve a localização,
a escala, a duração e o sucesso comercial para tanto. No entanto, as abordagens aqui revistas permitem recortar e dar atenção
especial a qualquer sub-unidade da Amazônia Legal que se deseje examinar (estados, grupos de municípios ou municípios
isolados). A literatura bem que precisa de estudos empiricamente bem fundamentados e comparáveis com essas diferentes
escalas.
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ênfase para a região Amazônica brasileira.4 Dezenas de livros e coletâneas,
centenas de artigos e teses, dúzias de relatórios de consultoria e planos, além
de outros tipos de documentos produzidos por ativistas, ONGs e viajantes,
fizeram essa literatura crescer para além da possibilidade de ser acompanhada
por qualquer estudioso individual. No entanto, é fácil perceber nela um quase
consenso em torno do que eu chamo de “catástrofe social e ambiental”, um
colapso geral dos sistemas sociais e ambientais que estaria ocorrendo na
Amazônia.5 Por vezes, com base em evidências nulas ou escassas, o colapso é
narrado como fato consumado, ou tendência irreversível. A angustiante
preocupação com a possível destruição das ricas biodiversidade e
sóciodiversidade da região é o móvel principal desses estudos, mas, ela não
justifica abordagens falhas. Nesta perspectiva, nada funciona ou pode
funcionar na região, a não ser que seja “tradicional”. Os amazônidas são
retratados equivocadamente como os mais pobres entre os brasileiros. As
migrações e o aumento populacional causam pânico, como se a região só
tivesse sido habiada ou ocupada nas últimas décadas. Situações locais são
extrapoladas para toda a região sem qualquer fundamentação. A inferência
normativa lógica dessa perspectiva é que nada de “moderno” deve ser tentado
na região, a não ser com um grau de cuidado nunca registrado na história
mundial, moderna ou antiga.
4
Drummond, J. A., em “Recursos Naturais, Meio Ambiente e Desenvolvimento na Amazônia Brasileira: Um Debate MultiDimensional – Ensaio Bibliográfico”, Manguinhos, VI (Suplemento), setembro 2000, p. 1135-1177, comenta uma parte
dessa literatura.
5
Exemplos destacados são Anthony Hall, Amazônia: Desenvolvimento para Quem? – Desmatamento e Conflito Social no
Programa Grande Carajás (Rio de Janeiro, Jorge Zahar Editor, 1991); Susanna B. Hecht and Alexander Cockburn, The Fate
of the Forest: Developers, Destroyers and Defenders of the Amazon (London, Verso, 1989); Marianne Schmink and Charles
Wood, Contested Frontiers in Amazonia (New York, Columbia University Press, 1992); Stephen G. Bunker, Underdeveloping
the Amazon (Chicago, University of Chicago Press, 1986); Emilio F. Moran, Developing the Amazon (Bloomington, Indiana
University Press, 1981); Philip M. Fearnside, Human Carrying Capacity of the Brazilian Rainforest (New York, Columbia
University Press, 1986); Joe Foweraker, The Struggle for Land: A Political Economy of the Pioneer Frontier in Brazil, 1930 to
the present day (Cambridge, Cambridge University Press, 1981); Jean Hebette, ed., O Cerco está se Fechando: O Impacto
do Grande Capital na Amazônia (Petrópolis, Vozes; Rio de Janeiro, FASE; Belém, Núcleo de Altos Estudos Amazônicos, UFPa,
1991); José M. M. da Costa, Os Grandes Projetos da Amazônia: Impactos e Perspectivas (Belém, Universidade Federal do
Pará - NAEA, 1987). Juan de Onis, em The Green Cathedral (New York, Oxford University Press, 1992), em abordagem nãoacadêmica, tem cuidado com generalizações e previsões de catástrofes macro-regionais. Para abordagens acadêmicas
equilibradas, ver Anna Luiza Osorio de Almeida, The Colonization of the Amazon (Austin, University of Texas Press, 1992);
Anthony Anderson, ed., Alternatives to Deforestation – Steps towards Sustainable Use of the Amazon Rainforest (New York,
Columbia University Press, 1990); Paulo Choji Kitamura, A Amazônia e o Desenvolvimento Sustentável (Brasília, EMBRAPA,
1994); Dennis Mahar, Frontier Development Policy in Brazil: A Study of the Amazon Experience (New York, Praeger, 1979);
and Nigel J. H. Smith, The Amazon River Forest – A Natural History of Plants, Animals and People (New York and Oxford,
Oxford University Press, 1999).
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Stephen Bunker escreveu um dos mais influentes textos desta perspectiva,6
o qual usarei como representativo. Ao estudar diversos grandes
empreendimentos produtivos e de infra-estrutura na Amazônia brasileira e em
outros lugares, ele concluiu que eles causam prejuízos sociais e ambientais
permanentes e, mais, integram um processo irreversível de subsdesenvolvimento
regional. Na verdade, isso seria apenas uma instância de sua hipótese mais
abrangente do atraso necessário das regiões extrativistas de todo o planeta. Ele
sustenta que empreendimentos extrativos modernos, intensivos de capital,
danificam o ambiente natural e desmontam estruturas sociais e atividades
produtivas tradicionais. Embora Bunker use instrumentos conceituais e analíticos
perspicazes e úteis, entendo que as suas inferências não são apoiadas
adequadamente pelos dados que apresenta.
A Amazônia é para ele emblemática, pois é “uma das áreas mais pobres
do mundo”, apesar de – ou por causa de – séculos de extrativismo e exportação
de produtos in natura. Para ele, a iniciativa privada (local, nacional ou
internacional) e as próprias políticas do estado desenvolvimentista agravaram
indistintamente as condições de vida das populações locais, pois ambas
trataram a Amazônia como uma “fronteira vazia”. Assim, Bunker não espera
sequer que uma racionalidade estatal “salve” a região do seu destino.
Concordo com Bunker em que as perspectivas desenvolvimentistas das
regiões extrativistas contemporâneas são muito fracas7, mas isso não significa
necessariamente miséria absoluta ou debacles sociais. É claro que ocorrem
muitos fatos sociais normativamente lamentáveis em regiões de fronteira, mas
concordo com Haller e associados (ver abaixo) em que tais fatos são parte
intrínseca da própria condição de “fronteira”. Além do mais, eles por si não
provam a ocorrência de debacles sociais, mesmo porque eles também ocorrem
em regiões agropecuárias e urbanas. Acima de tudo, faltam nas análises de
Bunker e de muitos outros estudiosos evidências de que o conjunto da
população amazônica tenha hoje condições de vida inferiores às de, digamos,
78
6
Bunker, Underdeveloping the Amazon. Ver também, do mesmo autor, “Modes of Extraction, Unequal Exchange, and the
Progressive Underdevelopment of an Extreme Periphery: The Brazilian Amazon, 1600-1980,” American Journal of Sociology,
89(5): 1017-1064 (1984); “Staples, Links and Poles in the Construction of Regional Development Theories,” Sociological
Forum, 4(4) (1989); e “Natural Resource Extraction and Power Differentials in a Global Economy,” em Sutti Oritz and Susan
Lees, eds. Understanding Economic Process. Monographs in Economic Anthropology, 10. (1992). Ver ainda o capítulo 1
de Bradford Barham, Stephen G. Bunker and Dennis O’Hearn, eds., States, Firms and Raw Materials (Madison, The University
of Wisconsin Press, 1994).
7
Desenvolvo essa questão, com base inclusive nas formulações de Bunker, em “Natureza rica, povos pobres? – questões
conceituais e analíticas sobre o papel dos recursos naturais na prosperidade contemporânea” (aceito em Ambiente e
Sociedade, no prelo).
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30 anos atrás, pois quase sempre faltam medições minimanente consensuais
das condições sociais. Daí a relevância das três medições discutidas a seguir,
que contraditam frontalmente a hipótese central de Bunker e do conjunto da
literatura.
2.
MEDIÇÃO N.º 1 - HALLER E COLABORADORES – TESTANDO
DIRETAMENTE A HIPÓTESE DE BUNKER COM DADOS
MACRO-REGIONAIS VÁLIDOS PARA 1970 E 1980
A. O. Haller e colaboradores publicaram em 1996 o primeiro teste
deliberado da hipótese de Bunker sobre o desenvolvimento na Amazônia.8
Além do teste, fizeram uma discussão teórica relevante sobre o significado
sociológico das áreas de fronteira e sobre a incidência de anomia em tais áreas.
O seu conceito de fronteira é o seguinte:
Em termos gerais, uma fronteira pode ser vista como uma área
geográfica esparsamente habitada, dotada de instituições
relativamente fracas e fragmentárias, de estruturas sociais e
populações imperfeitamente integradas à sociedade mais ampla
da qual a área faz parte. Repentinamente, organizações
governamenais e/ou econômicas externas de grande escala
começam a investir grandes quantidades de capital nessa área, o
que atrai números crescentes de pessoas interessadas em altos
salários, ou em fontes de riqueza recentemente descobertas ou
apenas entrevistas, ainda sem dono.
A tipologia de fronteiras inclui as “de investimento concentrado” (em
torno de grandes empreendimentos), as “móveis clássicas” (ocupadas a partir
de regiões vizinhas), as “pára-quedas” (isoladas) e as “de linha” (ao longo de
estradas e rios).
Os autores recuperam, de uma maneira original na literatura sobre
fronteiras, o clássico conceito de anomia. Sustentam que as normas e sanções
sociais que funcionam em áreas “ocupadas” de uma sociedade tendem a ser
subvertidas em áreas de fronteira. Isso ocorre porque um grande número de
8
Archibald O. Haller et al, ‘The socioeconomic development levels…”.
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pessoas, sem relações entre si, com passados distintos, se desloca para um
lugar desconhecido e remoto em busca de melhores condições de vida e
convencidas de que existem meios “sem dono” de enriquecimento fácil –
tipicamente, recursos naturais (solos, minérios, árvores) com direitos de
propriedade indefinidos. Surgem assim situações anômicas, com “extrema
confusão normativa”, propícias a “suicídio, assassinato, roubo, inquietacão
social e violência organizada”. Comportamentos e expectativas contraditórios
entram em choque, e normas e sanções flutuam sem previsibilidade.
Os autores concordam que ocorre anomia na Amazônia, mas sustentam
que “não existe inconsistência lógica entre níveis médios ascendentes de
desenvolvimento socioeconômico e níveis ascendentes de violência. (…) Pelo
contrário, devemos esperar uma correlação positiva entre desenvolvimento
socioeconômico acelerado e a incidência de comportamentos anômicos” [grifo
no original]. Portanto, eles propõem que a medição do primeiro não seja
“contaminado” pelo registro de comportamentos anômicos típicos das
fronteiras. Ou seja, sustentam que o desenvolvimento socioeconômico – ou a
falta dele – em áreas de fronteira pode e deve ser estudado e medido
independente da alta incidência de comportamentos anômicos que captam
tanta atenção – e indignação – da maioria dos estudiosos da fronteira
amazônica. Melhorias socioeconômicas significativas podem, portanto,
conviver com violência, assassinatos, desagregação de famílias e outros fatos
anômicos. Fatos desenvolvimentistas são independentes de fatos anômicos e
assim devem ser abordados.
Vejamos agora como a medição feita por Haller e colaboradores
contradita frontalmente a hipótese predominante da debacle social amazônica.
Entre 1970 e 1980, apesar dos investimentos maciços ocorridos na Amazônia
Legal no período, a maioria esmagadora dos municípios amazônicos teve
melhoras socioeconômicas. Este achado, publicado em 1996, ainda não foi
contestado na literatura. Até 1998, ninguém reunira uma base de dados
comparável, e quando isso foi feito (para o cálculo do IDH no Brasil, discutido
abaixo), os achados de Haller e co-autores foram amplamente confirmados.
Entre 1993 e 1995, os autores reuniram uma grande base de dados (em escala
municipal), comparáveis em escala macro-regional, selecionaram variáveis
componentes e aplicaram métodos de análise fatorial. Para cada município
foram calculados dois escores (um para 1970 e um para 1980) de DSE/kmu
(Desenvolvimento Socioeconômico per capita por município), recalculados
numa escala de 0 a 100.
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As variáveis usadas foram: número de trabalhadores industriais por
número de pessoas empregadas, volume de transações comerciais per capita, o
inverso do número de trabalhadores agrícolas per capita, acesso per capita a
geladeira, televisão, rádio e automóvel, número de matrículas escolares no
primário per capita, número de alfabetizados per capita, número de residências
ligadas à rede elétrica per capita e consumo residencial de eletricidade per
capita. Esses dados foram recolhidos “artesanalmente” nos recenseamentos
nacionais e em bases de dados do setor elétrico e educacional. As variáveis
foram escolhidas de acordo com uma literatura internacional sobre a
distribuição de renda e o bem-estar doméstico. Algumas variáveis foram
descartadas por falta de disponibilidade em e/ou de comparabilidade para todos
os municípios da Amazônia Legal. Os escores obtidos são comparáveis para
cada município nos dois anos (1970 e 1980), para todos os municípios em cada
ano, e para conjuntos de municípios em cada ano e nos dois anos.
Eis um sumário dos achados. 325 de 327 municípios estudados (mais de
99%) tiveram escores maiores em 1980 do que em 1970. Dois outros
municípios foram descartados por causa de problemas nos dados. O escore
médio mais do que triplicou de 1970 para 1980: de 4,96 para 17,70. As cidades
maiores (como Cuiabá, Belém, Manaus e outras capitais estaduais) alcançaram
os maiores escores. No entanto, vários municípios menores também exibiram
escores consideravelmente maiores em 1980, quase todos eles localizados nas
imediações de “grandes projetos” – usinas hidrelétricas, minas, estradas, áreas
de colonização privada e pública.9 Os autores concluem que a hipótese de
Bunker foi refutada para o período em questão. De fato, não se poderia esperar,
à base da hipótese, tal quadro macro-regional de melhoras sociais e
econômicas. Não ocorreu um desenvolvimento na forma de diversificação da
base produtiva local, mas ocorreu generalizada melhora das condições sociais
e econômicas medidas. Trata-se, evidentemente, de uma diferença
sociologicamente significativa que não deve ficar soterrada sob pressupostos e
hipóteses falhos.
Como o resto do presente texto focaliza medições sobre o Amapá,
vejamos os escores dos seus municípios no teste de Haller e colaboradores. Os
dados relevantes estão na Tabela I.
9
A relação completa de escores para 1970 e 1980 consta da versão em português do artigo, acima citada, publicada em
Manguinhos.
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T A B E L A I: ESCORES DE DESENVOLVIMENTO SOCIOECONÔMICO PER CAPITA DOS MUNICÍPIOS DO
AMAPÁ, 1970 E 1980, CALCULADOS POR HALLER E COLABORADORES
ano
município
escore
1970
escore
1980
% crescimento
1980/1970
6,83
15,55
127,67
Calçoene
6,25
25,44
307,04
Macapá
26,89
69,04
156,74
Amapá
Mazagão
7,17
19,77
175,73
Oiapoque
18,46
28,49
54,33
Fonte: Haller, A. O.; Torrecilha, R.; Haller, M. C. Del P. e Tourinho, M. M.. “Os níveis de desenvolvimento socioeconômico da
população da Amazônia brasileira – 1970 e 1980”. História, Ciências, Saúde – Manguinhos, vol. VI (suplemento), julho 2000,
Apêndice.
Todos os municípios do Amapá melhoraram os seus escores. O escore
relativamente alto de Macapá (diretamente afetado pela atividade mineradora
de Serra do Navio) para 1970 ainda cresceu consideravelmente em 1980.
Percentualmente, porém, os escores de Calçoene e Mazagão (fora da área de
influência direta da mina) cresceram ainda mais. Os escores do Amapá e de
Oiapoque também cresceram.
Em suma, os municípios amapaenses não sofreram um colapso nos seus
níveis de desenvolvimento socioeconômico, como a hipótese da debacle nos
levaria a esperar quanto ao estado amazônico que hospedou o primeiro e mais
duradouro “grande projeto” da região.
3.
MEDIÇÃO N.º 2 – FJP, FIBGE E IPEA CONSTRÓEM UMA BASE
DE DADOS ORIGINAL
A segunda medição a ser discutida não é exatamente um estudo, mas uma
base de dados feita pela Fundação João Pinheiro, pelo Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística e pelo Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas para
computar o Índice de Desenvolvimento Humano brasileiro, publicada no
formato de um CD-ROM acompanhado de um livro.10 A equipe usou dados dos
recensamentos nacionais em diferentes níveis de agregação (país, região, estado
e município). O IDH é composto de variáveis ligadas à longevidade, à renda e
10 Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento et al, Desenvolvimento Humano e Condições de Vida….
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à escolaridade, o que lhe dá uma sobreposição parcial com as variáveis do índice
construído por Haller e colaboradores, parcialmente baseado em variáveis de
escolaridade e renda. Ambos usam os recensamentos nacionais como fonte
principal, mas as duas medições foram feitas de forma independente.
Não há ênfase especial na Amazônia, mas os índices do IDH revelam
notáveis diferenças regionais de padrão de vida no Brasil. Entre muitos outros
pontos, fica evidente que a Amazônia não é a região brasileira mais pobre,
título que cabe ao Nordeste (do Maranhão à Bahia), fato de que sequer se
desconfia ao ler apenas a literatura catastrófica sobre a Amazônia.
Vejamos algumas comparações entre o Amapá e o contexto regional e
nacional, com base no IDH. O ranking regional do Amapá é um primeiro
cruzamento relevante. Por hospedar a mina de Serra do Navio por mais de 40
anos, seria de se esperar, a partir da hipótese da debacle, que o Amapá ocupasse
o pior lugar no ranking regional e talvez até nacional. No entanto, os dados da
Tabela II mostram que os escores do estado cresceram significativamente ao
longo de 26 anos (com exceção de 1996) e que ele não caiu no ranking – sendo,
ao contrário, um líder regional no IDH.
T A B E L A I I: O I D H N O B R A S I L – E S C O R E S E R A N K I N G S D O A M A P Á E N T R E O S E S T A D O S
AMAZÔNICOS, 1970, 1980, 1991, 1995AND 1996 (*)
ano
escores de
IDH do Amapá
ranking do Amapá entre
os estados amazônicos
1970
.509
1/8
1980
.614
3/8
1991
.767
1/9
1995
.797
1/9
1996
.786
3/9
* A tabela inclui para todos os anos os estados da região Norte (Amazonas, Acre, Amapá, Pará, Rondônia. Roraima), mais
Mato Grosso e Maranhão. Para 1991, 1995 e 1996, a tabela inclui Tocantins.
Fonte: Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento et al, Desenvolvimento Humano e Condições de Vida:
Indicadores Brasileiros. Brasília, 1998, Tabela 2.3.
A Tabela III compara os escores de IDH do Amapá com os escores
médios dos estados da Região Norte e com os escores do Brasil. Vemos que o
Amapá sempre puxou as médias regionais para cima e que os seus escores
sempre alcançaram ao menos 83% dos índices nacionais, também
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contraditando a hipótese da debacle. Na verdade, em 1970 o Amapá foi um de
apenas seis estados brasileiros que alcançaram o nível “médio” de IDH (entre
0,500 e 0,800), chegando em 1995 e 1996 bem próximo ao nível “alto” (acima
de 0,800), alcançado por apenas um punhado de estados brasileiros.
T A B E L A I I I:
O IDH NO BRASIL – ESCORES DO AMAPÁ COMPARADOS AOS ESCORES MÉDIOS DA
REGIÃO NORTE E AOS ESCORES DO BRASIL, 1970, 1980, 1991, 1995 AND 1996.
ano
escores do
Amapá no IDH
escores médios
da região Norte no IDH
escores do Brasil
no IDH
1970
0,509
0,425
0,494
1980
0,614
0,595
0,734
1991
0,767
0,676
0,787
1995
0,797
0,720
0,814
1996
0,786
0,727
0,830
Fonte: Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento et al, Desenvolvimento Humano e Condições de Vida:
Indicadores Brasileiros. Brasília, 1998, Tabela 2.3.
O ranking nacional do Amapá em termos do IDH mostra outros fatos
que contraditam a hipótese da debacle. Segundo os dados da Tabela IV, vemos
que, depois do notável sexto lugar em 1970, o estado caiu para um pálido
décimo-terceiro em 1980, para voltar a nono em 1991 e 1995 e cair de novo
para décimo-segundo em 1996 (ano em que o seu IDH caiu em termos
absolutos). A posição do Amapá oscilou mais no panorama nacional do que no
regional, mas ele nunca ficou no piso inferior do ranking nacional. O que
ocorreu é que outros estados não-amazônicos (ver abaixo) entraram e se
firmaram nas posições mais altas do ranking nacional.
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T A B E L A I V:
O IDH NO BRASIL – NÚMERO DE ESTADOS COLOCADOS ACIMA E ABAIXO DO
RANKING DO AMAPÁ, 1970, 1980, 1991, 1995 AND 1996 (*)
ano
número de estados com escores de
IDH superiores ao do Amapá
número de estados com escores
de IDH inferiores ao do Amapá
1970
5
19
1980
12
13
1991
8
18
1995
8
18
1996 (**)
11
15
* Em 1970 o Brasil tinha 24 estados e territórios e o Distrito Federal. Em 1980 tinha 25 estados e territórios, e o Distrito
Federal. Desde 1988 tem 26 estados, e o Distrito Federal..
** Em 1996 o escore do Amapá foi igual ao de Goiás.
Fonte: Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento et al, Desenvolvimento Humano e Condições de Vida:
Indicadores Brasileiros. Brasília, 1998, Tabela 2.3.
Na verdade, o Amapá sempre esteve mais próximo dos estados
brasileiros mais desenvolvidos, conforme se vê a partir dos dados da Tabela V.
Em 1970, o Amapá, SP, DF, RS, SC e RJ foram os únicos estados com IDH
“médio”. MG e PR, por exemplo, estavam abaixo do Amapá. Em 1980 o
Amapá caiu para décimo-terceiro, embora o seu escore crescesse bastante. Os
mesmos cinco estados líderes de 1970 continuaram no topo em 1980 e nos anos
subsequentes, apenas trocando de lugar entre si. O que ocorreu em 1980 é que
o Amapá foi ultrapassado por sete estados – MG, PR, MS, ES, AM, RR e GO.
Destes, PR, MS e ES se juntaram aos cinco líderes de 1970 e 1980 e formaram
um fechado “clube dos 8 mais desenvolvidos” nos anos posteriores.
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T A B E L A V: O IDH NO BRASIL – NOMES, ESCORES E RANKINGS DE TODOS OS ESTADOS
BRASILEIROS COM ESCORES SUPERIORES AOS DO AMAPÁ, 1970, 1980, 1991, 1995 E 1996
ano
ranking
1970
1980
1995
São Paulo
1996
São Paulo
0,710
0,819
0,848
0,867
0,869
segundo
Distrito Federal
São Paulo
Distrito Federal
Distrito Federal
Rio G. do Sul
0,666
0,811
0,847
0,864
0,869
terceiro
Rio de Janeiro
Rio G. do Sul
Rio G. do Sul
Rio G. do Sul
São Paulo
0,657
0,808
0,845
0,863
0,868
quarto
Rio G. do Sul
Rio de Janeiro
Santa Catarina
Santa Catarina
Santa Catarina
0,631
0,804
0,827
0,857
0,863
quinto
Santa Catarina
Santa Catarina
Rio de Janeiro
Mato G. do Sul
Mato G. do Sul
sexto
Distrito Federal
1991
primeiro
São Paulo
Distrito Federal
0,560
0,796
0,824
0,844
0,848
Amapá
Mato G. do Sul
Paraná
Paraná
Paraná
0,509
sétimo
0,725
0,811
0,844
0,847
Paraná
Mato G. do Sul
Rio de Janeiro
Rio de Janeiro
0,723
0,784
0,842
0,844
oitavo
-
Espírito Santo
Espírito Santo
Espírito Santo
Espírito Santo
0,715
0,782
0,819
0,836
nono
-
Minas Gerais
Amapá
Amapá
Minas Gerais
0,695
0,767
0,797
décimo
-
Amazonas
décimo-primeiro
-
Goiás
décimo-segundo
-
Roraima
décimo-terceiro
-
Amapá
0,696
0,636
0,619
0,614
0,823
Rondônia
-
-
0,820
Roraima
-
-
0,818
Amapá
-
-
0,786
-
-
-
Fonte: Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento et al, Desenvolvimento Humano e Condições de Vida:
Indicadores Brasileiros. Brasília, 1998, Tabela 2.3.
Assim, é notável que o Amapá tenha ocupado o nono lugar em 1991,
superando MG, GO, AM e RR e encostando no “clube dos 8 mais
desenvolvidos”. Em 1995 a situação foi a mesma: Amapá em nono, encostado
no “clube”. Em 1996, ao perder 11 pontos decimais em seu escore, o Amapá
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caiu para décimo-segundo lugar e foi superado por MG, RO e RR, empatando
com GO.11 Assim, o Amapá tem feito parte de – ou liderado – um “segundo
pelotão” de estados brasileiros no ranking do IDH, obtendo escores muito
superiores aos dos estados brasileiros mais pobres, os do Nordeste. Esse
desempenho não seria previsto a partir da hipótese do debacle amazônico.12
4.
MEDIÇÃO N.º 3 – MUDANÇAS ANUAIS NO AMAPÁ,
1953-1996
No contexto de um estudo sobre os efeitos socioeconômicos e
ambientais da mineração de Serra do Navio, fiz uma medição das mudanças
socioeconômicas ocorridas no Amapá entre 1953 e 1993.13 A disponibilidade de
dados permitiu computar escores de desenvolvimento socioeconômico, de
âmbito estadual, para esses 41 anos seguidos. Os escores foram compostos de
32 variáveis, algumas similares ou relacionadas com as usadas por Haller e
colaboradores e pelo IDH, outras distintas. A minha medição teve as seguintes
particularidades: (1) foi feita ano a ano, diferente dos dois anos (1970 e 1980)
e dos cinco anos (1970, 1980, 1991, 1995 e 1996) das medições discutidas
acima; (2) boa parte dos dados brutos foi colhida nos Anuários Estatísticos do
Amapá;14 e (3) incluiu diversas variáveis não usadas nas duas outras medições.
Pude, assim, comparar o Amapá consigo mesmo, examinando as tendências de
32 séries de variáveis ao longo de 41 anos, 37 deles dentro da fase operacional
da mina de Serra do Navio.
Na verdade, fiz um teste direto da hipótese da debacle. A minha pergunta
principal de pesquisa foi: Serra do Navio ajudou na deterioração dos padrões
de vida dos amapaenses em geral? Construí a minha resposta sem referência a
11 Destaque-se que estados fortes como o Rio de Janeiro e Minas Gerais também sofreram quedas significativas no ranking,
conforme se pode ver na mesma Tabela V. Em 26 anos o Rio de Janeiro caiu de terceiro para sétimo lugar. Minas Gerais
oscilou ainda mais fortemente e, apesar de chegar ao nono lugar em 1996, estava praticamente empatado com Amazonas e
Rondônia.
12 A mesma equipe que computou o IDH brasileiro criou e computou um outro índice, o ICV (Índice de Condições de Vida),
composto por 20 variáveis. De novo os escores da Amazônia e do Amapá desmentem a hipótese da debacle. Ver Programa
das Nações Unidas para o Desenvolvimento et al, Desenvolvimento Humano e Condições de Vida...
13 Drummond, J. A., Environment, Society and Development…, capítulo 7, contém a versão integral do teste e a análise dos
seus achados, resumidos em língua portuguesa em Drummond, “Investimentos Privados, Impactos Ambientais…
14 Governo do Território Federal do Amapá ou Governo do Estado do Amapá. Anuários Estatísticos do Amapá (Macapá, 19531994). No Apêndice II de Drummond, Society, Environment and Development, discuto a qualidade e a consistência dos
dados retirados dessa série.
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medições anteriores, pois nenhum estudo sobre a mina incluíra uma medição
precisa dos seus efeitos. Reuni e organizei dados para 49 variáveis
socioeconômicas, devidamente “per capitalizadas” pela população residente
ou estimada para cada ano. Ficou claro que a maioria das variáveis sofreu
mudanças significativas, para pior ou melhor. Numa primeira medição, criei
uma escala ordinal e classifiquei cada variável sob as chancelas de “mudança
positiva forte” (17 variáveis), “mudança positiva moderada” (12), “sem
mudança” (5), “mudança negativa moderada” (4) e “mudança negativa forte”
(11). Como 29 das 49 variáveis experimentaram mudança positiva, os dados
indicavam um grau sifnificativo de mudança, e que a ela fora para melhor.
Em seguida concebi um método de medir o resultado líquido das
mudanças de todas essas variáveis. Para tanto, (a) descartei 17 variáveis para
as quais faltavam mais de 25% dos dados, (b) estimei dados ausentes de outras
variáveis, usando médias ou modas, e (c) defini o período 1953-1993,
descartando dados coletados para anos posteriores e anteriores. Tratei os dados
com uma metodologia que não explicarei aqui.15 Algumas variáveis diferentes
das usadas nas duas medições analisadas acima foram, entre outras: números
de linhas telefônicas e de chamadas talefônicas, disponibilidade de
profissionais de saúde, tamanho de rebanhos de animais domésticos e número
de alvarás de construção. Variáveis iguais ou relacionadas às dos dois testes
foram, entre outras: números de domicílios conectados com rede de água,
esgoto e eletricidade, número de veículos auto-motores emplacados, consumo
de energia etc. Não houve, portanto, escassez de dados, mesmo usando uma
fonte local de um jovem território/estado amazônico.
Compus uma matriz 32 x 41 – 32 variáveis (percapitalizadas e
transformadas em escores z normalizados) versus 41 anos. O escore de cada
ano foi obtido pela soma dos 32 escores z normalizados, dividida por 32. Não
dei pesos diferenciados às variáveis, mas algumas entraram com sinal
negativo, por indicarem mudanças para pior (como mortalidade infantil e
número de casos registrados de doenças transmissíveis). Finalmente, os
escores brutos foram ajustados para caber numa escala de 0 a 100 – 0 sendo o
pior ano registrado, 100 o melhor. Cada escore representa, assim, as
contribuições líquidas das 32 variáveis, combinando mudanças positivas,
negativas e neutras. Chamei-os de escores de Desenvolvimento
Socioeconômico per capita (DSE/k) do Amapá. Estão expostos na Tabela VI.
15 Os procedimentos são discutidos detalhadamente em Drummond, Environment, Society and Development…, Apêndice IV.
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T a b e l a V I: E S C O R E S D E D E S E N V O L V I M E N T O S O C I O E C O N Ô M I C O P E R C A P I T A
DO ESTADO DO AMAPÁ, 1953-1993 (*)
escore DSE/k
ano
escore DSE/k
1953
ano
33.33
1974
42.31
1954
38.46
1975
44.87
1955
48.72
1976
47.44
1956
38.46
1977
46.15
1957
51.28
1978
41.03
1958
91.03
1979
34.62
1959
44.87
1980
41.03
1960
00.00
1981
76.92
1961
51.28
1982
76.92
1962
48.72
1983
76.92
1963
50.00
1984
75.64
1964
52.56
1985
64.10
1965
47.44
1986
88.46
1966
29.49
1987
96.15
1967
25.64
1988
98.72
1968
02.56
1989
94.87
1969
12.82
1990
75.64
1970
37.18
1991
94.87
1971
20.51
1992
83.33
1972
26.92
1993
100.00
1973
58.97
(*) Escores z normalizados, calculados de acordo com procedimentos detalhados no Apêndice IV de Drummond,
Environment, Society and Development.
Fontes dos dados originais: Anuários Estatísticos do Amapá, 1953-1994.
A distirbuição desses escores contradita a expectativa de Bunker e outros
quanto à ocorrência de uma progressiva deterioração das condições sociais e
econômicas em regiões extrativistas sujeitas a investimentos “modernos” e de
grande escala. A tendência do período como um todo foi a de crescimento
substancial do índice. O escore médio dos últimos 13 anos (78,99), por
exemplo, é 1,72 superior ao escore médio dos primeiros 13 anos (45,85). Na
verdade, as condições sociais e econômicas médias do Amapá melhoraram
progressivamente. É bom destacar que isso não significa que a atividade
minerária foi responsável por isso, e nem era a minha intenção descobrir ou
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provar isso.16 Para efeitos de teste da hipótese de Bunker, no entanto, bastou
mostrar que ocorreram mudanças socioeconômicas positivas na área de
influência direta de um “grande projeto” amazônico. Ninguém deteriorou o
Amapá, pois o Amapá não deteriorou – nem em escala regional, nem em escala
nacional.
SÍNTESE E CONCLUSÕES
Examinamos dados e métodos de três medições independentes e
distintas de mudanças socioeconômicas na Amazônia brasileira. Destacamos
como os seus achados apontam melhoras socioeconômicas significativas em
toda a região e como isso contradita a hipótese predominante na literatura.
As conclusões são que (a) essa hipótese precisa ser revista por outra,
mais flexível, (b) novos estudos e medições devem ser feitos à luz de bases de
dados de validade mais do que local, (c) não é aconselhável misturar o registro
de fatos anômicos com as medições de mudança socioeconômica. Esses novos
estudos, para comporem um novo marco, devem ainda ter uma sólida
fundamentação empírica, seja em escala macro-regional ou local, para permitir
comparações, ao longo do tempo e em várias escalas, das melhorias ou
deteriorações das condições materiais de vida dos amazônidas.
Brasília, março de 2002
agosto de 2004
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16 Em Drummond, “Investimentos Privados, Impactos Ambientais”, discute-se detalhadamente o significado desses escores e
a sua possível relacão com o desempenho da mina de Serra do Navio.
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EL DERECHO AMBIENTAL
EN ARGENTINA
Carlos Botassi*
Sumário: 1. Ambiente y Derecho Ambiental; 2. Los Principios Generales del Derecho
Ambiental; 3. Las Relaciones Internacionales; 4. Los Artículos 41 y 43 de La Constitución
Nacional; 5. Reparación Del Daño Ambiental; 6. Legislación Ambiental; 7. Protección
Administrativa y Judicial del Medio Ambiente; Síntesis Final.
Resumo: Este artigo trata da temática do
Direito Ambiental na Argentina. Primeiramente procura-se destacar os conceitos gerais
sobre a temática. Na segunda parte são
analisados os princípios aplicáveis à temática.
Em terceiro plano são observadas as tratativas
internacionais sobre o assunto. Depois são
analisados artigos da Constituição Federal da
Argentina, cuja decorrência será a observação
da responsabilidade para reparação dos danos
causados. Na última parte é analisada a
legislação infraconstitucional sobre o meio
ambiental argentino.
Abstract: This article deals with Environmental Law in Argentina. First it is intended
to highlight the general concepts about the
theme. The principles which can be applied to
the theme are analyzed in the second part. The
third part deals with the international treaties
on the subject. The articles of the Argentinean
Federal Constitution are then analyzed, which
will have as a result the observation of the
responsibility for the compensation of the
damaged caused. The infra-constitutional
legislation about Argentinean environment is
analyzed in the final part.
Palavras-chave:
Direito
Argentina; Ordem Jurídica.
Key-words: Environmental Law; Argentina;
Legal order.
*
Ambiental;
Universidad Nacional de La Plata, Argentina.
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AMBIENTE Y DERECHO AMBIENTAL
Si el objeto de estudio del Derecho Ambiental es el “ambiente” resulta
insoslayable intentar su definición. En rigor cabe reconocer que se han
ensayado tantos conceptos de “ambiente” como autores se han ocupado del
asunto, su mera enunciación excedería el espacio del que disponemos. Diremos
sí que la doctrina argentina ha vinculado la palabra “ambiente” con realidades
bien disímiles como son la naturaleza y los recursos que provee, el medio
urbano, la biodiversidad y el clima. En Italia la palabra ambiente fue definida
por primera vez en términos jurídicos por Massimo Severo Giannini en su
trabajo “Ambiente: saggio sui diversi suoi aspetti Giuridici, publicado en el
año 1973 en la Rivista trimestrale di diritto pubblico: 1) ambiente relacionado
con el paisaje (aqui el Derecho Ambiental tendría una finalidad
conservacionista); 2) ambiente vinculado con la defensa del suelo, el aire y el
agua (la legislación establece un sistema de control sobre las actividades que
pueden dañarlos); 3) ambiente considerado en las normas y estudios de
urbanismo (destinados a impulsar una actividad administrativa de
planificación del uso del territorio).1
Ni la Constitución Nacional Argentina ni las leyes federales que más
adelante comentaremos contienen una definición del vocablo “ambiente”. Sí la
posee la Ley Marco-Ambiental nº 11.723 (1995) de la Provincia de Buenos
Aires, al describirlo como un “sistema constituido por factores naturales,
culturales y sociales, interrelacionados entre sí, que condicionan la vida del
hombre a la vez que constantemente son modificados y condicionados por
éste”. (Anexo I, “Glosario”, palabras “ambiente”, “medio”, “entorno” y
“medio ambiente”que dicha Ley emplea como sinónimos).
En la década del ’80 el Consejo Federal de Inversiones de la Nación
consideró que los recursos naturales necesarios para atender las necesidades
vitales del hombre eran los siguientes:
1.º El suelo, es decir la capa de humus que recubre la corteza terrestre;
2.º Los yacimientos minerales sólidos, líquidos y gaseosos, entre los que
se destacan los hidrocarburos;
1
96
Pastorino, Leonardo: El daño al ambiente como instituto típico del Derecho Ambiental, Lexis Nexis, Buenos Aires, 2005, págs.
38 y 313; Crosetti, Alessandro; Ferrara, Rosario; Fracchia, Fabrizio; Olivetti Rason, Nino: Diritto dell’ambiente, Laterza, RomaBari, 2002, pág. 46.
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3.º Los recursos hidráulicos, es decir las aguas en sus diversos estados:
superficiales, subterráneas, nubes, lluvia, nieve;
4.º Flora silvestre;
5.º Fauna silvestre;
6.º El espacio aéreo;
7.º Lugares panorámicos o escénicos, que sirven para recreación y
turismo;
8.º Energía, que puede ser hidráulica, eólica, mareomotriz, térmica y
nuclear.
Como se ve estos “recursos naturales” no se diferencian de los bienes
que tutela el Derecho Ambiental. Sin embargo, mientras el Derecho de los
Recursos Naturales profundiza los aspectos económicos, amparando a aquellos
bienes debido a en que son considerados útiles para satisfacer necesidades
colectivas vinculadas con la propiedad y las transacciones comerciales, el
Derecho Ambiental atiende a su preservación en el marco de un desarrollo
sostenible (también denominado “ecodesarrollo”), entendido como la
capacidad de extraer de la naturaleza lo necesario para mejorar la calidad de
vida de la actual población sin depredar el entorno inutilizándolo para las
generaciones futuras. Este último enfoque constituye la respuesta a un reclamo
ético: postergar el empleo puramente utilitarista de las riquezas de la Tierra y
propiciar el uso racional de los recursos, para obtener su goce intergeneracional
en términos de calidad de vida. De manera que no existe diferencia ontológica
entre los recursos naturales y los recursos ambientales, se trata siempre de los
mismos elementos. Varía, en cambio, el criterio axiológico ya que ahora esos
recursos ya no son exclusivamente considerados con fines de apropiación o
económicos sino que aparecen valorados en forma holística, como bienes de
uso y disfrute, desde una óptica más o menos novedosa, “ecocéntrica” o
“biocéntrica”.
Como ha ocurrido en el resto del Mundo el surgimiento del Derecho
Ambiental argentino resultó coincidente, y naturalmente influenciado, por los
resultados de la Primera Conferencia de las Naciones Unidas sobre el Medio
Humano (Estocolmo, 1972). Las cuestiones ambientales cuya protección
constituía “un deseo urgente de los pueblos y un deber de los gobiernos”,
según se declaró entonces, no son otras que aquellas que tres décadas más tarde
continúan afligiéndonos: concentración de la población urbana, con su secuela
de ruidos enfermantes e insuficiencia de viviendas y servicios esenciales;
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desertificación y tala de bosques; contaminación del suelo, del aire y del agua;
residuos domiciliarios, industriales y peligrosos; extinción de especies
vegetales y animales; deterioro del paisaje; pérdida de patrimonio histórico y
cultural; etc. Un cambio significativo producido desde entonces – como ya se
ha dicho – ha sido el terminológico: los “recursos naturales” han devenido en
“recursos ambientales” sumando a la enumeración primigenia de hondo
contenido economicista las cuestiones del clima, la biodiversidad y la
protección del patrimonio histórico, artístico y cultural de profundo sentido
humanista.
En la República Argentina la pésima distribución de la riqueza entre los
habitantes se refleja en los asentamientos urbanos, haciendo que compartan el
territorio nacional imponentes áreas de riqueza (como los “countrys” y los
barrios cerrados) junto a oprobiosas muestras de pobreza (villas de emergencia
y asentamientos precarios de todo tipo)2. Esa misma disparidad
socioeconómica impacta en el ambiente haciendo que – según la región – se
presenten tanto los males que aquejan a los países desarrollados
(contaminación industrial, elevado nivel de ruidos, desechos no
biodegradables) como los padecimientos que soportan los estados
subdesarrollados (viviendas y transportes inadecuados, pésima atención de la
salud pública, ausencia o mala prestación de servicios esenciales como
desagües cloacales y provisión de agua potable).
Existen numerosas definiciones doctrinarias del Derecho Ambiental. En
general todas participan de notas comunes en tanto lo consideran un conjunto
de principios y normas destinados a la protección y uso racional del medio
ambiente, incluyendo la prevención de daños y el objetivo de lograr el
mantenimiento del equilibrio natural, cuya finalidad es resguardar los intereses
sobre bienes de uso y goce colectivos.3 Sus antecedentes inmediatos se
relacionan con el Derecho de los Recursos Naturales, con el Derecho Agrario
y con el Derecho de Minería y Energía.
En cuanto a su naturaleza algunos autores entienden que estamos frente
a una verdadera “rama” del Derecho y otros, en cambio, opinan que el Derecho
98
2
El Principio 5.º de la Declaración de Río de Janeiro de 1992 sobre Medio Ambiente y desarrollo establece que “todos los
Estados y todas las personas deberán cooperar en la tarea esencial de erradicar la pobreza como requisito indispensable del
desarrollo sostenible, a fin de reducir las disparidades en los niveles de vida y responder mejor a las necesidades de la
mayoría de los pueblos del mundo”. En rigor de verdad, más de una década después, nada ha cambiado en la materia y, antes
bien, la miseria y la desigualdad se han incrementado no solo en Argentina sino también en la totalidad de los países del
llamado Tercer Mundo.
3
Cafferatta, Néstor: Introducción al Derecho Ambiental, Instituto Nacional de Ecología, México, 2004, pág. 19.
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Ambiental constituye una “especialización” jurídica que atraviesa transversalmente a las ramas clásicas (Derecho Civil, Derecho Penal, Derecho
Administrativo, Derecho Laboral, etc.). Existe coincidencia en señalar que
constituye un sector de la ciencia jurídica “que estudia los recursos naturales,
la economía, el ambiente y el obrar humanos, considerados como
estrechamente vinculados, interdependientes y ordenados de acuerdo a las
leyes de la naturaleza, los procesos económicos y las demandas sociales, con
una concepción holística, sistémica y transdisciplinaria, con el objeto de
reglar las conductas y actividades individuales y colectivas de la comunidad,
para la preservación, conservación, racionalidad, protección, explotación,
industrialización, impulso y aprovechamiento sustentable de los mismos, así
como para el mejoramiento de la calidad de vida del planeta”.4
Asimismo se destaca que el Derecho Ambiental se encuentra en un
proceso de plena formación y también se reconoce que su desarrollo interesa
tanto a las relaciones de Derecho Privado (individual) como a las
comprendidas en el Derecho Público (colectivo), por ello cuando se enuncian
sus fuentes se comprenden tanto a las Constituciones Nacional y provinciales
como a los Códigos de Fondo y a las normativas específicas de cada recurso
ambiental en particular (suelo, aire, agua, energía, bosques, bienes culturales,
paisajes, etc.).
Con algunas variantes terminológicas que no llegan a incidir en los
significados se enuncian como caracteres propios del Derecho Ambiental los
siguientes: interdisciplinario; sistemático; supranacional; énfasis preventivo;
rigurosa regulación científica; primacía de intereses colectivos; participación
pública; coordinación de actuaciones; abordaje interdisciplinario.
2.
LOS PRINCIPIOS GENERALES DEL DERECHO AMBIENTAL
Desde un punto de vista teórico se considera que los principios jurídicos
son conceptos o nociones aportadas por conocimientos, actitudes y creencias
científicas que constituyen las notas fundamentales de una disciplina. Los
principios poseen una utilidad de tipo funcional: proveen soluciones para la
redacción de las futuras normas positivas, colaboran con su interpretación y, en
caso de ausencia de disposiciones concretas, actúan como fuente de derecho.
4
Bellorio Clabot, Dino: Tratado de Derecho Ambiental, Edit. Ad-Hoc, Buenos Aires, 1997, t. I pág. 40.
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Los principios de nuestra materia resultan específicos en la medida en que
poseen un objeto de estudio peculiar (el ambiente) y desde el momento en que
reviste originalidad el tipo de relación jurídica que se genera entre las personas
y el medio (objeto de tutela o bien jurídicamente protegido).
La Ley General del Ambiente nº 25.675 (publicada en el Boletín Oficial
de la Nación el 28 de noviembre de 2002), en su artículo 5 dispone que las
autoridades, de cualquier naturaleza, integrarán en todas sus decisiones y
actividades previsiones de carácter ambiental, cuidando de asegurar el respeto
de los principios que, bajo el título “Principios de la política ambiental”,
enuncia en su artículo 4, de la manera siguiente:
La interpretación y aplicación de la presente ley, y de toda otra
norma a través de la cual se ejecute la política ambiental, estarán
sujetas al cumplimiento de los siguientes principios:
Principio de congruencia: La legislación provincial y municipal
referida a lo ambiental deberá ser adecuada a los principios y
normas fijadas en la presente ley; en caso de que así no fuere, esta
prevalecerá sobre toda otra norma que se le oponga.
Principio de prevención: Las causas y las fuentes de los
problemas ambientales se atenderán en forma prioritaria e
integrada, tratando de prevenir los efectos negativos que sobre el
ambiente se pueden producir.
Principio precautorio: Cuando haya peligro de daño grave o
irreversible la ausencia de información o certeza científica no
deberá utilizarse como razón para postergar la adopción de
medidas eficaces, en función de los costos, para impedir la
degradación del medio ambiente.
Principio de equidad intergeneracional: Los responsables de la
protección ambiental deberán velar por el uso y goce apropiado
del ambiente por parte de las generaciones presentes y futuras.
Principio de progresividad: Los objetivos ambientales deberán
ser logrados en forma gradual, a través de metas interinas y
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finales, proyectadas en un cronograma temporal que facilite la
adecuación correspondiente a las actividades relacionadas con
esos objetivos.
Principio de responsabilidad: El generador de efectos
degradantes del ambiente, actuales o futuros, es responsable de
los costos de las acciones preventivas y correctivas de
recomposición, sin perjuicio de la vigencia de los sistemas de
responsabilidad ambiental que correspondan.
Principio de subsidiariedad: El Estado Nacional, a través de las
distintas instancias de la Administración Pública, tiene la
obligación de colaborar y, de ser necesario, participar en forma
complementaria en el accionar de los particulares en la
preservación y protección ambientales.
Principio de sustentabilidad: El desarrollo económico y social y
el aprovechamiento de los recursos naturales deberán realizarse
a través de una gestión apropiada del ambiente, de manera tal
que no comprometa las posibilidades de las generaciones
presentes y futuras.
Principio de solidaridad: La Nación y los Estados provinciales
serán responsables de la prevención y mitigación de los efectos
ambientales transfronterizos adversos de su propio accionar, así
como de la minimización de los riesgos ambientales sobre los
sistemas ecológicos compartidos.
Principio de cooperación: Los recursos naturales y los sistemas
ecológicos compartidos serán utilizados en forma equitativa y
racional. El tratamiento y mitigación de las emergencias
ambientales de efectos transfronterizos serán desarrollados en
forma conjunta”.
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3.
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LAS RELACIONES INTERNACIONALES:
Luego del tema de la paz y de la cooperación entre las naciones ningún
asunto interesa más a la comunidad internacional como el relativo a la
preservación del medio ambiente. Ya en el año 1910, el médico y filósofo
argentino José Ingenieros advirtió que, desde una perspectiva totalizadora,
nuestro sistema solar no es otra cosa que un punto en el Universo y en él
nuestro Planeta Tierra apenas un detalle donde todo lo que acontece en su
superficie no es más que un transitorio equilibrio químico,5 donde los
componentes del ecosistema – fundamentalmente el agua y el aire – circulan
en forma permanente sin reconocer fronteras de ninguna especie. La temática
del Derecho Ambiental Internacional ha sido dividida en cuatro categorías: 1.º)
Recursos ambientales de la humanidad (alta mar y su lecho); 2.º) Recursos
compartidos (cuencas hídricas, yacimientos no delimitados de gas y petróleo);
3.º) Efectos extraterritoriales provocados por el uso de recursos nacionales y
4.º) Alteraciones climáticas.6
Desde hace mucho tiempo – y más allá de haber sido signataria de la
Declaración de Estocolmo de 1972, de Río de Janeiro de 1992, de Kyoto de
1997 y de otros instrumentos fundamentales de la comunidad internacional –
la República Argentina ha celebrado numerosos tratados bilaterales y
multilaterales que, en forma directa o indirecta, poseen contenido ambiental. A
título de ejemplo pueden citarse los siguientes acuerdos: Caza de Ballenas
(Washington, 1946), Protección de Bienes Culturales (La Haya, 1954),
Protección de Bosques (Santiago de Chile, 1961), Prohibición de Armas
Nucleares en América Latina y el Caribe (Tlatelco, México, 1967),
Contaminación de Aguas Marítimas (Bruselas, 1969), Transporte Marítimo de
Materiales Nucleares (Bruselas, 1971), Vertimiento de Desechos en el Mar
(Londres, 1972), Prohibición de Armas Biológicas (Londres, 1972), Protección
del Patrimonio Mundial (París, 1972), Tratado del Río de La Plata
(Montevideo, 1973), Uso de Energía Nuclear (Santiago de Chile, 1976),
Protección Fitosanitaria (Roma, 1979), Protección de Especies Migratorias
(Bonn, 1979), Aguas Continentales (Buenos Aires, 1980), Convención de N.
U. sobre Derecho del Mar (Montego Bay, Jamaica, 1982), Protección de la
102
5
Ingenieros, José: El hombre mediocre, Siglo Veinte, Buenos Aires, 1979, pág. 11.
6
Cano, Guillermo: Derecho, política y administración ambientales, Depalma, Buenos Aires, 1978, págs. 18, 85 y 318. Idem:
Problemática jurídico política de los recursos naturales internacionales, La Ley 151-982.
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Capa de Ozono (Viena, 1985), Accidentes Nucleares (Viena, 1986), Transporte
de Residuos Peligrosos (Basilea, 1989), Contaminación por Hidrocarburos
(Londres, 1990), Recursos Hídricos Compartidos (Buenos Aires, 1991),
Cooperación en Materia Ambiental con Chile (Buenos Aires, 1991), Sanidad
Animal (Viña del Mar, Chile, 1991), Protección Ambiental en la Antártida
(Madrid, 1991), Transporte Fluvial (Las Leñas, Argentina, 1992), Convención
de N. U. sobre Cambio Climático (Nueva York, 1992), Cambio Global
(Montevideo, 1992), Diversidad Biológica (Río de Janeiro, 1992), Lucha
contra la Desertificación (París, 1994), Cooperación en Materia Ambiental con
Bolivia (Buenos Aires, 1994), Seguridad Nuclear (Viena, 1994), Cooperación
en Materia Ambiental con Brasil (Buenos Aires, 1996), (Desechos
Radioactivos (Viena, 1997) y Acuerdo Marco sobre Medio Ambiente del
Mercosur (Asunción del Paraguay, 2001).
4.
LOS ARTÍCULOS 41 Y 43 DE LA CONSTITUCIÓN NACIONAL:
Tal como aconteciera en Italia,7 la carencia de normas constitucionales
antes de la década de 1980 en las provincias y de 1990 en la Nación, no fue
obstáculo para el desarrollo teórico y normativo del Derecho Ambiental.
Las primeras referencias ambientales de nivel constitucional aparecieron
en las Cartas provinciales sancionadas una vez finalizado el período de
gobierno militar 1976-1983. Así las constituciones de La Rioja y San Juan de
1986, establecieron el deber estatal de preservar el medio ambiente, mientras
la Constitución de Santiago del Estero, del mismo año, colocó a cargo de las
autoridades locales la “la protección del ecosistema” y del “equilibrio
ecológico”. Más tarde todas las provincias argentinas, al igual que la Ciudad
Autónoma de Buenos Aires, incorporaron disposiciones de este tipo a sus
normas fundamentales.
En al ámbito Nacional cabe recordar que la Constitución de 1853, en su
redacción originaria, no poseía disposiciones ambientales, aunque era posible
inferir normas tutitivas del entorno humano y de la calidad de vida de algunas
7
Se considera, incluso, que la ausencia de una norma directa en la Constitución Italiana motivó una intensa actividad
normativa tendiente a llenar ese vacío, sin dejar de reconocer que el artículo 9 de aquella (protección a la cultura, al arte, a
la investigación, al patrimonio histórico-cultural y al paisaje) proporcionó el fundamento constitucional de la tutela de la
naturaleza (Crosetti, Alessandro; Ferrara, Rosario; Fracchia, Fabrizio y Olivetti Rason, Nino: Diritto dell’ambiente, Laterza,
Roma-Bari, 2002, págs. 45 y 46). También posee vinculación con nuestra materia el art. 32 de la Constitución Italiana de
1948 al disponer que “la República tutela la salud como derecho fundamental del individuo y en interés de la colectividad...”.
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de sus normas y principios fundantes. Así por ejemplo, surge del Preámbulo
que los representantes provinciales a la Asamblea Constituyente de 1853
consolidaban la unión nacional con el objeto de “promover el bienestar
general”, enumerándose entre las facultades del Poder Legislativo “proveer lo
conducente a la prosperidad del país, al adelanto y bienestar de las
provincias”. El artículo 14 bis de la Constitución Nacional, incorporado en el
año 1957, asegura al trabajador “condiciones dignas y equitativas de labor”.
En las “Primeras Jornadas Argentinas de Derecho y Administración
Ambientales (Buenos Aires, abril de 1974), se había recomendado que cuando
la Constitución Nacional fuera reformada se agregara una norma indicando que
“los habitantes, las autoridades públicas y las personas jurídicas, tienen el
deber de cumplir y de no omitir los actos conducentes a la preservación del
entorno y la calidad de vida, o a la corrección del deterioro ya sufrido por
estos”. Algún tiempo después, el “Primer Congreso Argentino del Ambiente”
(Buenos Aires, agosto de 1981), recomendó “el reconocimiento expreso, a
nivel constitucional, de un derecho subjetivo a vivir en un medio ambiente
digno”. Asimismo se había destacado la necesidad de incorporar normas
ambientales a la Constitución Nacional en el “Seminario Internacional sobre
protección jurisdiccional de intereses ambientales” (Mendoza, 1985) y en el
“Dictamen Preliminar del Consejo para la Consolidación de la Democracia”
(octubre de 1986).
Si bien no resulta imprescindible colocar el Derecho Ambiental en el
nivel constitucional8 – o en todo caso se encuentra implícito en el elemental
reconocimiento del derecho a la vida y a la salud propio de toda Carta
Fundamental, parece conveniente hacerlo para resaltar su trascendencia y para
dotar de sustento a la legislación inferior.
En Argentina, finalmente, la reforma de agosto de 1994, introdujo las
siguientes normas que aportan el fundamento constitucional del Derecho
Ambiental:
Artículo 41: Todos los habitantes gozan del derecho a un
ambiente sano, equilibrado, apto para el desarrollo humano y
para que las actividades productivas satisfagan las necesidades
presentes sin comprometer las de las generaciones futuras; tienen
8
104
Italia aún no lo ha hecho y sin embargo ha sido pionera, con su Ley de 1986, en el tratamiento de un capítulo esencial de
nuestra materia como es la responsabilidad por daño ambiental. La Ley Constitucional de Francia nº 205 data de marzo de
2005 aunque la doctrina y la jurisprudencia se ocupa del tema ambiental desde hace décadas.
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el deber de preservarlo. El daño ambiental generará
prioritariamente la obligación de recomponer, según lo
establezca la ley. Las autoridades proveerán a la protección de
este derecho, a la utilización racional de los recursos naturales, a
la preservación del patrimonio natural, cultural y de la
diversidad biológica, y a la información y educación ambientales.
Corresponde a la Nación dictar las normas que contengan los
presupuestos mínimos de protección, y a las provincias, las
necesarias para complementarlas, sin que aquéllas alteren las
jurisdicciones locales. Se prohíbe el ingreso al territorio nacional
de residuos actual o potencialmente peligrosos, y de los
radioactivos.
Artículo 43: Toda persona puede interponer acción expedita y
rápida de amparo... Podrán interponer esta acción... en lo
relativo a los derechos que protegen al ambiente, así como a los
derechos de incidencia colectiva en general, el afectado, el
defensor del pueblo y las asociaciones que propendan a esos
fines, registradas conforme a la ley, la que determinará los
requisitos y formas de su organización.
El tratamiento puntual de los contenidos de los artículos 41 y 43 de la
Carta Magna es tan variado como significativo y su breve glosa permite
exponer un panorama bastante completo del desarrollo del Derecho Ambiental
argentino:
4.1 Derecho a un desarrollo sustentable o sostenible
La Constitución reconoce el derecho de todo habitante del territorio
argentino para exigir que su salud y su calidad de vida no resulten agredidas y
para que se adopten las medidas administrativas y judiciales tendientes a
mantener un determinado nivel de equilibrio entre las necesidades del
desarrollo y el cuidado del entorno, posibilitando el tránsito desde la etapa
agroganadera de la economía a un desarrollo industrial, iniciado a mediados
del siglo pasado pero que registra un ritmo extremadamente lento. La
Argentina necesita urgentemente recuperar el nivel socio-económico que supo
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tener hasta mediados del siglo XX. Solo de esta manera podrá lograr la plena
ocupación de sus recursos humanos, ya que el elevado índice de desempleo –
que se mantiene en dos dígitos a pesar de los esfuerzos gubernamentales en
contrario – genera pobreza extrema e impone el aprovechamiento de los
importantes recursos naturales que provee la agricultura, la ganadería, la
minería y la extracción de hidrocarburos. Sin embargo todas las actividades
creadoras de puestos de trabajo y riqueza social, fundamentalmente las
industriales y proveedoras de servicios, deben llevarse a cabo evitando el
agotamiento de aquellos recursos.
De igual manera, la armonía entre la actividad humana y la naturaleza
impone el cuidado de las especies en peligro de extinción, la conservación de
la biodiversidad, de los suelos y de los bosques. El derecho de todo ciudadano
a ver satisfechas sus necesidades presentes encuentra como límite la obligación
de reconocer y garantizar ese mismo derecho a las generaciones futuras. El
principio constitucional del desarrollo sustentable condiciona la evolución
económica (la creación de bienes y servicios, necesarios y suntuarios) a la
obtención del menor sacrificio posible del entorno. Aún cuando posean
apariencia de bienes eternamente renovables, el suelo, el aire y el agua son
finitos y pueden agotarse definitivamente y, con ellos, la vida misma. Por esa
razón, frente al casi inevitable daño ambiental, el principal deber de la
humanidad será “recomponer” el recurso ambiental afectado, es decir,
restituirlo al nivel de calidad anterior y solamente en el caso en que ello no sea
posible reemplazar la recomposición por una indemnización pecuniaria
La idea de abogar por un desarrollo sustentable, en el sentido de
propiciar la evolución de la economía con un adecuado nivel de tolerancia por
parte de los recursos ambientales ya aparece en la Declaración de Estocolmo
sobre el Medio Humano de 1972 (Principios 2.º, 8.º, 10.º y 13.º) y fue ratificada
y potenciada veinte años más tarde en la Declaración de Río de Janeiro sobre
Medio Ambiente y Desarrollo, al afirmarse en forma categórica que “el
derecho al desarrollo debe ejercerse en forma tal que responda
equitativamente a las necesidades de desarrollo y ambientales de las
generaciones presentes y futuras” (Principio 3º), aclarándose que “a fin de
alcanzar el desarrollo sostenible, la protección del medio ambiente deberá
constituir parte integrante del proceso de desarrollo y no podrá considerarse
en forma aislada” (Principio 4.º). A su turno la Convención de las Naciones
Unidas sobre Cambio Climático (Protocolo de Kyoto de 1997), dispone la
reducción en la emisión de gases de efecto invernadero como una manera de
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evitar los cambios climáticos y promover el desarrollo sostenible de las
actividades agrícolas (art. 2). Finalmente cabe recordar que el Tratado de la
Constitución de la Unión Europea (Roma, 2004) expresa que
en las políticas de la Unión se integrarán y garantizarán,
conforme al principio de desarrollo sostenible, un nivel elevado
de protección del medio ambiente y la mejora de su calidad (art.
II, 97).
4.2 Deber de toda persona
El derecho de todos configura también el deber de todos. No se tolera ni
la acción ni la omisión que pueda degradar el ambiente. La obligación legal de
realizar estudios de impacto ambiental cualquiera sea el tipo de actividad que
realicen los particulares (industrial, comercial y de servicios) y la atribución
estatal de otorgar (o negar) certificados de aptitud ambiental, apunta al control
de cumplimiento de este deber esencial.
4.3 Obligación de las autoridades
La protección del entorno constituye una obligación esencial del Estado
nacional, provincial y municipal. Se ratifica así – constitucionalmente – la
existencia previa de una compleja organización ambiental (ministerios,
secretarías de Estado, áreas comunales) con competencia específica e
irrenunciable. Las autoridades deben organizar actividades de fomento
tendientes a preservar el medio (exenciones impositivas, educación ambiental,
créditos para inversiones en industrias “limpias”) y obtener la utilización
racional de los recursos naturales, la preservación del patrimonio natural y
cultural y la diversidad biológica.
4.4 Poder de policía ambiental
La complejidad de la cuestión ambiental y la cada vez más insidiosa
actividad del hombre hacen que el fomento estatal no sea suficiente. Para
implementar un adecuado control de las actividades potencialmente perjudiciales
para el entorno las normas nacionales, provinciales y municipales organizan
sistemas más o menos complejos de evaluación de impacto ambiental, conforme
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lo establecido en el Principio 17.º de la Declaración de Río de Janeiro,9 al igual
que mecanismos de fiscalización y sanción de los infractores a las normas de
protección del entorno.10 Una condición previa y necesaria para llevar a cabo esa
labor de fiscalización es contar con leyes que establezcan los niveles o estándares
de tolerancia de las actividades perjudiciales para el entorno y, debido al sistema
federal de gobierno que rige en la organización política argentina, establecer si
será el Congreso Nacional o las legislaturas locales quienes deberán dictar la
pertinente legislación. Cabe recordar en este sentido que el poder de policía
ambiental aparece compartido entre la Nación y las provincias, generando
complejos problemas de distribución de competencias o, si se prefiere, de
atribución de potestades. Como es de imaginar cada ámbito estatal reclama para
sí más y mayores incumbencias.
En el tema que nos ocupa, por efecto del artículo 41 bajo examen,
corresponde al Poder Legislativo Federal fijar los presupuestos mínimos de
protección, sancionando las pertinentes leyes-marcos que serán
complementadas por las legislaturas locales. Debido a que la aplicación
concreta (procedimiento administrativo y proceso judicial) de todas las leyes
nacionales corresponde a los gobiernos locales (con excepción de los asuntos
en que sea parte el Estado Nacional) y al imprescindible resguardo de la
efectividad de la gestión (como respuesta a la necesaria inmediación frente a
los causantes del deterioro ambiental), en todos los casos la autoridad de
aplicación será la organización administrativa ambiental provincial y
municipal.
La señalada distribución de competencias entre el Estado Federal y los
Estados locales aparece inspirada por el artículo 149.1.23 de la Constitución
del Reino de España de 1978 (a su vez consecuencia de la aplicación del
principio de subsidiariedad en la distribución de competencias entre la UE y los
países que la componen) donde se establece que el Estado Central español tiene
competencia exclusiva respecto de “la legislación básica sobre protección del
medio ambiente, sin perjuicio de las facultades de las comunidades autónomas
de establecer normas adicionales de protección”.
9
“Deberá emprenderse una evaluación del impacto ambiental, en calidad de instrumento nacional, respecto de cualquier
actividad propuesta que probablemente haya de producir un impacto negativo considerable en el medio ambiente y que esté
sujeta a la decisión de una autoridad nacional competente”.
10 Las sanciones típicas el poder de policía ambiental, que podrán ser acumulativas, son las siguientes: apercibimiento, multa,
clausura temporaria o definitiva del establecimiento, suspensión de la actividad, cancelación de la autorización para
funcionar.
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En el texto de la Constitución Argentina “legislación básica” ha sido
reemplazada por “presupuestos mínimos de protección”; “comunidades
autónomas” por “provincias” y “normas adicionales” por “normas necesarias
para complementarlas”
Ocho años después de efectuada la reforma constitucional, en medio de
un debate doctrinario sobre el alcance a otorgar a la expresión “presupuestos
mínimos de protección”, el Congreso Nacional intentó –sin éxito- cerrar la
disputa sancionando la Ley General del Ambiente nº 25.675 (2002), cuyo
artículo 6 dispone:
Se entiende por presupuesto mínimo, establecido en el artículo 41
de la Constitución Nacional, a toda norma que concede una tutela
ambiental uniforme o común para todo el territorio nacional, y
tiene por objeto imponer condiciones necesarias para asegurar la
protección ambiental. En su contenido, debe prever las condiciones
necesarias para garantizar la dinámica de los sistemas ecológicos,
mantener su capacidad de carga y, en general, asegurar la
preservación ambiental y el desarrollo sustentable.
A pesar de la transcripta definición legal, la referencia a los
“presupuestos mínimos de protección” de la Constitución Argentina, posee la
suficiente imprecisión como para generar dudas respecto de su alcance en
situaciones concretas, y sigue provocando conflictos de competencia entre las
autoridades federales y las provinciales ya que estas conservan para sí todas las
atribuciones que expresamente no hayan sido colocadas a cargo del Gobierno
Nacional por la propia Carta Magna.11 Así por ejemplo cabe preguntarse cuál
será la solución al latente conflicto entre la Ley Nacional 24.051 (1991) que
consiente y regula el tránsito interprovincial de residuos peligrosos (arts. 1, 4,
23, 26 y 30) y el artículo 28 de la Constitución de la Provincia de Buenos Aires
que, lisa y llanamente, prohíbe el ingreso al territorio bonaerense (así sea
temporario o en tránsito) de ese tipo de desechos.
Sin perjuicio de estas situaciones precisas que deberá dilucidar
paulatinamente la jurisprudencia, parece claro que la expresión “presupuestos
mínimos” aluden a un nivel de protección ambiental “de piso”, por debajo del
11 Esta es una diferencia esencial con el sistema constitucional español donde el Estado Nacional se reserva para sí aquellas
atribuciones que no hayan sido asignadas expresamente a las comunidades autónomas (art. 149.3).
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cual no le es dado ubicarse a las legislaciones locales que, en cambio, pueden
regular condiciones (o estándares) de tutela ambiental más exigentes, sin entrar
por ello en colisión con la legislación federal.
4.5 Residuos peligrosos y radioactivos
La prohibición del ingreso a territorio argentino de residuos peligrosos y
radioactivos, correlaciona con el convenio internacional de control de
movimiento de residuos peligrosos suscripto en Basilea en 1986, donde se
reconoce a todo Estado “el derecho soberano de prohibir la entrada o la
eliminación de desechos peligrosos y de otros desechos ajenos en su territorio”.
5.
REPARACIÓN DEL DAÑO AMBIENTAL
La responsabilidad de los particulares y del Estado por los perjuicios que
se ocasionen al medio es uno de los aspectos más desarrollados del Derecho
Ambiental argentino. De allí que lo tratemos con algún detenimiento.
5.1 Concepto de daño ambiental
Prácticamente todas las actividades humanas afectan en mayor o en
menor medida al ambiente natural ¿Cuando corresponde considerar que
estamos frente a un supuesto de daño que pone en marcha la responsabilidad
del agente? El Principio n.º 6 de la “Declaración de Estocolmo de 1972 sobre
Medio Humano”, reclama que se ponga fin a ciertas actividades nocivas “para
que no se causen daños graves irreparables a los ecosistemas”. La magnitud
del daño deberá medirse en relación a las circunstancias de cada caso en
particular. El artículo 2618 del Código Civil argentino (reformado en 1968),
claramente influenciado por el artículo 844 del Código Civil italiano,12
establece que “las molestias que ocasionen el humo, calor, olores,
luminosidad, ruidos, vibraciones o daños similares por el ejercicio de
12 Cód. Civil italiano, art. 844: “El propietario de un inmueble no puede impedir las emanaciones de humo o de calor, las
exhalaciones, los ruidos, las vibraciones o similares propagaciones derivadas del inmueble vecino, s i n o s u p e r a n l a
n o r m a l t o l e r a n c i a , t e n i e n d o a s i m i s m o e n c u e n t a l a s c o n d i c i o n e s d e l l u g a r”. Este artículo ha servido de
fundamento para los particulares que han reclamado indemnizaciones por daños ocasionados al ambiente y a sus propios
derechos subjetivos (Fracchia, Fabrizio: L’inquinamiento acústico, CEDAM, Milán, 2001, pág. 139).
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actividades en inmuebles vecinos, no deben exceder la normal tolerancia
teniendo en cuenta las condiciones del lugar y aunque mediare autorización
administrativa”. Este criterio, instaurado para reglar las relaciones particulares
ente vecinos, trasladado al terreno del daño colectivo ambiental (daño público),
ha hecho que solamente se admita que existe responsabilidad cuando el
perjuicio a los recursos ambientales reviste una gravedad que excede los
límites o estandares considerados normales o tolerables. La cuestión remite a
una delicada casuística y será el juez, en cada caso, quien deberá determinar la
normal tolerancia y el agravio excesivo. Nótese que el corte de un árbol –salvo
circunstancias muy excepcionales- puede considerarse un acto humano
indiferente para el medio pero la tala clandestina de todo un bosque configura,
sin duda, un daño ambiental indemnizable. Uno de los primeros amparos
ambientales prosperó para evitar la captura de unos pocos mamíferos marinos
que habitaban en la enorme la plataforma continental del Atlántico Sur y para
resolver afirmativamente el pedido de un particular preocupado por la
situación el juez interviniente tuvo en cuenta que se trataba de una especie
animal en extinción.13
En esa dirección la Ley General del Ambiente nº 25.675 (2002) define
al daño ambiental “colectivo” o “público” (es decir aquel que excede el mero
interés de una o más víctimas identificables) “como toda alteración relevante
que modifique negativamente al ambiente, sus recursos, el equilibrio de los
ecosistemas, o los bienes o valores colectivos” (art. 27). Por su parte la Ley de
Residuos Industriales n.º 25.612 (2002) ratifica este enfoque cuando manda
que las plantas de tratamiento de ese tipo de desechos operen “bajo normas de
higiene y seguridad ambientales que no pongan en riesgo ni afecten la calidad
de vida de la población, en forma significativa”(art. 29).
5.2 Factor de imputación
El Principio 13.º de la Declaración de Río sobre Medio Ambiente y
Desarrollo (1992) establece que
los estados deberán desarrollar la legislación nacional relativa a la
responsabilidad y la indemnización respecto de las víctimas de la
13 En el año 1983 la Justicia argentina revocó la autorización oficial otorgada a una empresa de acuarios japoneses para capturar
14 delfines o toninas (Causa Kattan c/ Secretaría de Intereses Marítimos, Revista La Ley 1983-D-575).
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contaminación y otros daños ambientales. Los Estados deberán
cooperar asimismo de manera expedita y más decidida en la
elaboración de nuevas leyes internacionales sobre responsabilidad
e indemnización por los efectos adversos de los daños ambientales
causados por las actividades realizadas dentro de su jurisdicción,
o bajo su control en zonas situadas fuera de su jurisdicción.
En el pasado la responsabilidad por daño ambiental en la Argentina se
apoyaba en dos instituciones jurídicas propias del Derecho Civil: la teoría del
riesgo creado por el mal uso o el vicio atribuible a una cosa14 y las molestias
sufridas por las relaciones de vecindad, contempladas en el antes transcripto
artículo 2618 del Código Civil.15 En este último caso, cuando las molestias
exceden el nivel “normal” los jueces fijan una indemnización compensatoria
del agravio a la calidad de vida y, naturalmente, pueden ordenar el cese de la
actividad dañosa. Actualmente se reconoce que la responsabilidad por daño
ambiental posee una particularidad que la diferencia de la responsabilidad civil
en su formulación primigenia: su carácter objetivo, ajeno a todo reproche de
índole subjetivo hacia el agente causante del perjuicio.16
El simple nexo causal entre la conducta del particular o del Estado y el
perjuicio obliga a restituir el nivel de calidad ambiental y/o a indemnizar los
perjuicios ocasionados, sin necesidad de acreditar dolo o negligencia. Resultan,
en este sentido, “objetivamente” indemnizables los daños ocasionados por
escapes de humos tóxicos, rotura de diques o embalses, derrames de
hidrocarburos o sustancias contaminantes en cursos de agua, etc.17 El propio
14 Código Civil, art. 1113: “La obligación del que ha causado un daño se extiende a los daños que causaren ... las cosas de que
se sirve, o que tiene a su cuidado”.
15 Código Civil, art. 2618: “Las molestias que ocasionen el humo, calor, olores, luminosidad, ruidos, vibraciones o daños
similares por el ejercicio de actividades en inmuebles vecinos, no deben exceder la normal tolerancia teniendo en cuenta las
condiciones del lugar y aunque mediare autorización administrativa para aquellas. Según las circunstancias del caso, los
jueces pueden disponer la indemnización de los daños o la cesación de tales molestias. En la aplicación de esta disposición
el juez debe contemporizar las exigencias de la producción y el respeto debido al uso regular de la propiedad; asimismo tendrá
en cuenta la prioridad en el uso. El juicio tramitará sumariamente”.
16 Se presenta así una diferencia sustancial con el régimen italiano, en tanto la Ley 349/86 di istituzione del Ministero
dell’ambiente y norme in materia de danno ambientale establece la obligación de indemnizar los perjuicios ocasionados por
“cualquier hecho doloso o culposo en violación de disposiciones legales o reglamentarias”, colocándose en el terreno de la
responsabilidad “subjetiva”.
17 Convención de Viena sobre Responsabilidad Civil por Daños Nucleares, art. IV, inc. 1.º Ley de la Nación Argentina n.º 24.051
sobre Residuos Peligrosos, art. 45. Esta última norma lleva la responsabilidad objetiva al extremo de disponer que “el dueño
o guardián de un residuo peligroso no se exime de responsabilidad por demostrar la culpa de un tercero de quien no debe
responder, c u y a a c c i ó n p u d o s e r e v i t a d a c o n e l e m p l e o d e l d e b i d o c u i d a d o y a t e n d i e n d o a l a s
c i r c u n s t a n c i a s d e l c a s o” (Art. 47).
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examen de la prueba tendiente a acreditar el nexo causal se ha visto
influenciado por el carácter tuitivo del Derecho Ambiental y las complejidades
técnicas de la materia, resolviéndose en ese sentido que, “verificado el daño
ambiental por contaminación no puede discutirse que existe un daño a la salud
indemnizable en los vecinos cercanos a la planta industrial de la empresa
contaminante”.18
El precedente criterio jurisprudencial fue consagrado en el artículo 28 de
la Ley 25.675:
El que cause el daño ambiental será objetivamente responsable
de su restablecimiento al estado anterior a su producción. En
caso de que no sea técnicamente factible, la indemnización
sustitutiva que determine la justicia ordinaria interviniente
deberá depositarse en el Fondo de Compensación Ambiental que
se crea por la presente, el cual será administrado por la
autoridad de aplicación, sin perjuicio de otras acciones judiciales
que pudieran corresponder.
Expresamente se aclara que
la exención de responsabilidad solo se producirá acreditando
que, a pesar de haberse adoptado todas las medidas destinadas a
evitarlo y sin mediar culpa concurrente del responsable, los
daños se produjeron por culpa exclusiva de la víctima o de un
tercero por quien no debe responder (art. 29).
5.3 Legitimación judicial activa y pasiva. Acciones de restitución e
indemnización:
La legitimatio ad causan no es otra cosa que la facultad de acudir ante los
jueces y requerir el dictado de una sentencia favorable. La Suprema Corte de
Justicia de la Provincia de Buenos Aires sostuvo que la legitimación viene
determinada por la posición del actor respecto de la pretensión procesal.19
Conviene recordar en este punto que el artículo 41 de la Constitución Nacional
18 Cámara Federal de La Plata, Sala I, Maceroni vs. Dirección Gral. de Fabricaciones Militares.
19 Pérez c/ Artola, 6.9.94, J.A. 1995-I-556.
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establece que “el daño ambiental generará prioritariamente la obligación de
recomponer”20 y que el artículo 28 de la Ley 25.675 impone el
“restablecimiento al estado anterior a su producción”. En lógico correlato su
artículo 30 dispone que “producido el daño ambiental colectivo, tendrán
legitimación para obtener la recomposición del ambiente dañado, el afectado,
el Defensor del Pueblo y las asociaciones no gubernamentales de defensa
ambiental, conforme lo prevé el artículo 43 de la Constitución Nacional, y el
Estado Nacional, provincial o municipal; asimismo quedará legitimado para la
acción de recomposición o de indemnización pertinente, la persona
directamente damnificada por el hecho dañoso acaecido en su jurisdicción”
(art. 30).
Aparecen así consideradas las dos acciones ambientales posibles (acción
colectiva de recomposición del entorno al estado anterior al hecho dañoso y
acción individual de cobro de la indemnización de los daños y perjuicios
sufridos por una o más personas) y su correlativo vinculo con la legitimación
procesal activa. Cuando el agravio ha sido inferido a la colectividad en su
conjunto, supuesto en el cual se ha perjudicado al entorno globalmente
considerado (daño colectivo), podrá accionar cualquier persona (“el afectado”
en la terminología del transcripto art. 30), el ombudsman y las asociaciones
civiles ambientales, con el objeto de obtener la recomposición del medio
dañado. Si la restauración del entorno no es posible se establece el monto del
perjuicio y la suma resultante debe ser depositada por el responsable en el
Fondo de Compensación que será administrado por la repartición estatal
competente. En cambio si mediante una conducta ambientalmente nociva se ha
dañado la salud, el patrimonio o la calidad de vida de una persona determinada
(daño individual) aparecerá legitimada la víctima concreta del siniestro, quien
deberá demostrar cabalmente esa condición y percibirá la correspondiente
indemnización dineraria.
Retornando al análisis de la expresión “afectado”, consideramos que los
términos amplios de los artículos 41 y 43 de la Constitución Nacional permiten
concluir que todo daño ambiental afecta el derecho colectivo, social o difuso a
vivir en un medio equilibrado y sano del que goza toda persona. Frente a la
agresión del entorno, consumada mediante la violación del deber de no
20 Es también la solución de la reciente Ley Constitucional de Francia 2005-205, al establecer que “toda persona debe
contribuir a la r e p a r a c i ó n de los daños que ella cause al ambiente, en las condiciones definidas por la ley” (art. 4)
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dañarlo, existe una facultad de reacción procesal que legitima a toda persona
por el solo hecho de habitar en el territorio argentino.21 Ratifica este criterio
amplio la previsión del art. 32 de la ley bajo análisis en tanto dispone que “el
acceso a la jurisdicción por cuestiones ambientales no admitirá restricciones
de ningún tipo o especie”.
Respecto del sujeto legitimado para percibir la indemnización en los
casos de daños colectivos no susceptibles de reparación en especie o restitución
de la calidad ambiental dañada, en circunstancias muy precisas, tal como
acontece en Italia,22 la jurisprudencia argentina había considerado acreedor a un
ente estatal, por considerar que son las personas públicas ideales quienes, al
representar el interés de la sociedad en su conjunto, deben percibir la
correspondiente indemnización para invertirla en la atención de asuntos de
interés general. Actualmente –como se verá seguidamente- cuando no existe
una víctima concreta e identificable del siniestro, descartada la posibilidad de
restitución del entorno al estado primigenio, los jueces establecen una
indemnización pecuniaria que debe ser depositada en el Fondo de
Compensación Ambiental reglado por la Ley 25.675.
5.4 Efectos de la sentencia
La parte final del art. 33 de la Ley 25.675 establece que “la sentencia
hará cosa juzgada y tendrá efecto erga omnes, a excepción de que la acción
sea rechazada, aunque sea parcialmente, por cuestiones probatorias”.
De manera que si la demanda no prospera debido a que el actor no ha
logrado probar algunos de los extremos fácticos vinculados con la procedencia
de la responsabilidad por el daño ambiental, el proceso podrá ser reiniciado. En
cambio si la demanda por daño colectivo es acogida, en cuyo caso el juez
siempre deberá decretar el cese de la actividad dañosa, los efectos de este
aspecto de la sentencia –como es lógico- no se limitan a las partes actora y
demanda sino que se proyectan sobre los terceros.
21 Ratificamos así nuestro criterio amplio en materia de legitimación que ya expusieramos en Botassi Carlos: Derecho
Administrativo Ambiental, Edit. Platense, La Plata, 1997, pág. 111.
22 Carlesi, Francesca: La prevenzione e la riparazione del danno ambientale como oggetto di funcione amministrativa: riflessioni
alla luce della Direttiva 2004/35/CE, comunicazione al Convegno “L’ambiente e l’attività amministrativa”, Teramo, 29-30 aprile
2005, AIDU-Università di Teramo.
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5.5 Seguro Ambiental y Fondo de Restauración:
De acuerdo a lo establecido en el artículo 22 de la Ley 25.675,
toda persona física o jurídica, pública o privada, que realice
actividades riesgosas para el ambiente, los ecosistemas y sus
elementos constitutivos, deberá contratar un seguro de cobertura
con entidad suficiente para garantizar el financiamiento de la
recomposición del daño que en su tipo pudiere producir;
asimismo, según el caso y las posibilidades, podrá integrar un
fondo de restauración ambiental que posibilite la instrumentación
de acciones de reparación.
5.6 Fondo de Compensación Ambiental:
La Ley bajo análisis dispone la creación de un Fondo de Compensación
ambiental, “que será administrado por la autoridad competente de cada
jurisdicción y estará destinado a garantizar la calidad ambiental, la
prevención y mitigación de efectos nocivos o peligrosos sobre el ambiente, la
atención de emergencias ambientales; asimismo, a la protección,
preservación, conservación o compensación de los sistemas ecológicos y el
ambiente” (art. 34).
Como antes se dijo, en este Fondo se depositan las indemnizaciones por
los daños y perjuicios irrogados al ambiente en general sin que exista una
víctima identificable (art. 28).
6
LEGISLACIÓN AMBIENTAL
No existe en la Argentina un Código del Ambiente, entendiendo por tal a
un cuerpo normativo que acumule la totalidad o el mayor número posible de
disposiciones vigentes sobre una materia dada. Están vigentes, empero, una
cantidad muy significativa de disposiciones de nivel nacional, provincial y
municipal e importantes “leyes-marcos” que enuncian los principios generales
de la materia y establecen criterios rectores para la legislación específica que
aborda el tratamiento de cada uno de los recursos ambientales en particular.
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También resulta frecuente la presencia de disposiciones claramente ambientales
en leyes destinadas a la regulación de los recursos naturales, como es el caso de
los códigos rurales provinciales o el Código de Minería de la Nación.
Las principales leyes ambientales sancionadas por el Congreso Nacional
son las siguientes:
Ley 24.051 (1991) de generación, transporte y tratamiento de residuos
peligrosos. Fue reglamentada por el Decreto del Poder Ejecutivo n.º 831/1993.
Decreto del Poder Ejecutivo nº 999/1992. Marco regulatorio para la
prestación de los servicios de provisión de agua potable y desagües cloacales.
Ley 25.612 (2002) de gestión integral de residuos industriales.
Ley 25.670 (2002) de eliminación del uso de policlorobifenilos (PCBs).
Ley 25.675 (2002). Ley General del Ambiente. Determina el bien
jurídicamente protegido, los principios de la política ambiental, el concepto de
“presupuesto mínimo”, los métodos de evaluación del impacto ambiental, la
responsabilidad por daño ambiental, la competencia judicial en la materia, la
educación e información ambientales, el Seguro Ambiental, el Fondo de
Restauración y el Fondo de Compensación Ambiental. Está considerada la
norma reglamentaria por excelencia del artículo 41 de la Constitución
Nacional.
7
PROTECCIÓN ADMINISTRATIVA Y JUDICIAL DEL MEDIO
AMBIENTE
Como hemos visto, tanto la Constitución Nacional, como las
constituciones provinciales y las leyes en general, reconocen el derecho de
todo ciudadano a vivir en un medio apto para el desarrollo humano y consagran
correlativamente el deber del Estado de proteger ese derecho. Con esta
finalidad existen variados medios a los cuales puede ocurrir cualquier persona
reclamando en sede administrativa o demandando en la instancia judicial para
obtener el dictado de un acto administrativo o de una sentencia en defensa del
medio ambiente.
Cualquier habitante puede impugnar ante la autoridad administrativa
competente la calidad de un proyecto de obra, servicio o actividad en general,
denunciando que se trata de un emprendimiento perjudicial para el entorno.
Para que este control social resulte efectivo las oficinas estatales deben hacer
públicos los listados de los estudios de impacto ambiental presentados para su
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evaluación23 y eventual aprobación. Cuando la autoridad ambiental lo
considere oportuno convocará a una audiencia pública a fin de discutir entre
empresarios y ciudadanos el impacto ambiental del proyecto. El organismo
competente no podrá expedirse avalando la obra o actividad hasta tanto
proporcione una respuesta fundada a las objeciones recibidas.
En cuanto respecta a los emprendimientos en marcha, diversas oficinas
estatales llevan a cabo diligencias de inspección y vigilancia para verificar el
acatamiento a las normas ambientales. Las infracciones son calificadas como
muy leves, leves, graves y muy graves y, según su magnitud, desembocan en
la aplicación de sanciones cada vez más severas: apercibimiento, multas,
suspensión total o parcial de la concesión, licencia o autorización oficialmente
otorgada, caducidad de la misma, clausura temporaria o definitiva, parcial o
total, del establecimiento.24
Sin necesidad de acudir previamente a la vía administrativa – excepto en
el caso en que se impugne la legalidad de un acto administrativo de
autorización para funcionar o el certificado de aptitud ambiental otorgado por
una autoridad pública- cualquier persona puede demandar judicialmente y en
forma directa el cese de una conducta nociva para el entorno. El denominado
“proceso ambiental federal”, que se desarrolla ante los jueces federales con
competencia civil ya que no existe un fuero especializado y que emplea como
base del trámite el Código Procesal Civil y Comercial de la Nación modificado
por algunas pocas disposiciones procesales de la Ley General del Ambiente n.º
25.675 (art. 7 sobre competencia judicial; art. 32 sobre acceso a la jurisdicción
y facultades del juez), es considerado un proceso “de derecho público” en la
medida en que apunte a la recomposición de un recurso ambiental y no al cobro
de una indemnización por parte de un particular.25
Hace algunos años los jueces aplicaban un criterio restrictivo en materia
de legitimación y, salvo honrosas excepciones, exigían la presencia de un
derecho subjetivo vulnerado en cabeza del accionante. Más tarde, consolidada
23 Ley de la Prov. de Buenos Aires 11.723, arts. 10, 11, 16 y 17.
24 Ley de la Prov. de Buenos Aires 11.723, arts. 69 y 70.
25 Se trata de una nota trascendente ya que el carácter “público” del proceso impone al juez dotarlo de celeridad, le permite por
su propia iniciativa ordenar medidas cautelares urgentes inaudita parte y veda la declaración de la caducidad de instancia por
inactividad de la parte actora (Cámara Federal de La Plata, Sala II, Di Dio Cardalana, Edgardo c/ Aguas Argentinas S.A.” “El
Derecho Ambiental” del 25.7.05, pág. 1, con comentario crítico de Bec, R. Eugenia y Franco, Horacio J.). Las facultades
instructorias del juez en los procesos ambientales se explican porque no se trata de un juez “desinteresado” sino de un juez
“parte, porque le interesa que el agua que bebe siga siendo fresca, cristalina, pura; porque le interesa que el aire que respira
mantenga esa condición” (Pigretti, Eduardo A.: Derecho Ambiental Profundizado, La Ley, Buenos Aires, 2003, pág. 10).
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la idea de que el mantenimiento de un ambiente sano constituye un derecho
colectivo o de incidencia colectiva o difuso (compartido entre todos los
habitantes), se consolidó paulatinamente un criterio amplio en materia de
legitimación, admitiéndose la promoción de demandas por parte de personas
que no invocaban un agravio personal diferente al que resulta de su condición
de habitantes que consideran que la calidad del entorno está siendo agredida
por la acción u omisión de terceros o del propio Estado.
SÍNTESIS FINAL
Todo lo hasta aquí expuesto permite arribar a algunas conclusiones
finales respecto de la situación del Derecho Ambiental en la Argentina en los
primeros años del Siglo XXI:
Soporte normativo e institucional
La materia ambiental posee intenso desarrollo constitucional y legal,
tanto en el ámbito federal como en el plano provincial. Asimismo existen
ministerios, secretarias de Estado, tratados internacionales e interprovinciales,
normas comunitarias, atribuciones comunales y una serie de herramientas
normativas de aplicación que permiten reconocer la presencia de una
“organización ambiental” compleja.
Cuestiones de competencia
Las constantes dificultades existentes antes de 1994 para distribuir la
competencia legislativa entre el Estado Nacional y las provincias ha
encontrado un comienzo de solución atribuyendo al primero la potestad de fijar
los “presupuestos mínimos de protección” y a las segundas la facultad de dictar
leyes complementarias en sus respectivos distritos.
Poder de policía ambiental
Apoyados en la variada normativa vigente, los numerosos organismos
administrativos ambientales de todo tipo y nivel tienen a su cargo el ejercicio
del “poder de policía ambiental”. Sin embargo la contaminación de los
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recursos ambientales (sobre todo el agua y el aire), el empleo de sustancias
cancerígenas como aceites refrigeradores de transformadores eléctricos, el
nivel de ruido urbano, la deforestación y tala de bosques siguen presentes en la
vida cotidiana. Un párrafo especial merece el tema de la pobreza extrema, sin
duda el agravio principal a un mínimo nivel de calidad de vida que conmueve
a la población y compromete a las autoridades.
Es evidente que ha faltado “eficacia”, en el sentido de existencia de
correlato entre el derecho positivo y la realidad. Si bien no es posible afirmar
que estemos ante un mero “derecho simbólico”, y es mucho lo que se ha
avanzado hacia el mejoramiento de la situación global, no es menos cierto que
la cuestión ambiental está muy lejos de ser resuelta en plenitud.
Principios ambientales
La Ley General del Ambiente n.º 25.675 enuncia y define los siguientes:
congruencia, prevención, precautorio, equidad intergeneracional,
progresividad, responsabilidad, subsidiariedad, sustentabilidad, solidaridad y
cooperación.
Daño ambiental
La responsabilidad es de tipo objetivo y genera, prioritariamente, la
obligación de recomponer el perjuicio causado. El daño colectivo cuenta con
un régimen de legitimación amplio, aunque se discute si comprende a cualquier
habitante o solamente a quien logre demostrar algún tipo de interés directo o
inmediato en el asunto.
Control judicial
Ante la falta de respuesta de la organización administrativa ambiental se
acude cada vez más a los jueces en demanda de un mayor control de la
actividad privada ambientalmente crítica y de limitación de la discrecionalidad
técnica en la valoración administrativa de los hechos. El ensanche de la
legitimación y de las facultades de los jueces, unido a los efectos erga omnes
de las sentencias ambientales, reserva al Poder Judicial un rol esencial en
nuestra materia.
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MODERNIDADE: NASCIMENTO DO
SUJEITO E SUBJETIVIDADE JURÍDICA
Maria de Fátima S. Wolkmer*
Sumário: Introdução; 1. Modernidade e Nascimento do Sujeito; 2. A Questão do Direito na
Modernidade; Conclusão.
Resumo: O artigo “Modernidade: Nascimento
do Sujeito e Subjetividade Jurídica” procura
demonstrar que a trajetória do pensamento
moderno buscou nos seus primórdios a
afirmação e emancipação da humanidade a
partir da Razão. Nesse sentido, alçou o Sujeito
à condição de centro indubitável da reflexão
filosófica, da política, da cultura e do Direito.
Abstract: The article “Modernity: Birth of the
Subject and Legal Subjectivity” aims to
demonstrate that the trajectory of the modern
thought looked for the affirmation and
emancipation of humanity from Reason in its
origin. In this sense, it raised the Subject to the
condition of doubtless center of the philosophical
reflection, of politics, of culture and of Law.
Palavras-chaves: Modernidade, Sujeito, Subjetividade Jurídica, Razão, Individualismo,
Universalismo, Racionalismo Moderno,
Niilismo, Autonomia.
Key-words: Modernity, Subject, Legal Subjectivity, Reason, Individualism, Universalism, Modern Rationalism, Nihilism,
Autonomy.
*
Mestra e Doutora em Direito pela Universidade Federal de Santa Catarina. Especialista em Direito Político pela UNISINOSRS. Profa. de “Introdução ao Estudo do Direito” na IES – da Grande Florianópolis. Coordenadora do Programa de PósGraduação em Direito da UNIPLAC-SC.
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Page 122
INTRODUÇÃO
A subjetividade é o tema central da Modernidade. Nela, a subjetividade
expressa valores, como a liberdade e igualdade. Nesse sentido, foi a afirmação
de que o homem é o que ele faz desprendido das crenças e culturas tradicionais.
O Direito, nesse âmbito, decorre das exigências da razão humana. O quadro da
reflexão jurídica altera-se de uma visão da necessidade de produzir uma ordem
igual ao cosmos – como em Aristóteles ou Platão, onde o critério do justo
estabelecia uma ordem hierárquica com cada um ocupando um lugar prédeterminado e desigual – para uma visão onde a igualdade é o critério do justo.
A partir das teorias do Contrato Social, a lei passa a fundar-se sobre a vontade
dos homens, forjando-se, com este regime da autonomia, as bases para uma
nova normatividade ética, jurídica e política que caracterizaria a Modernidade.
Assim, no presente texto serão traçadas algumas linhas desse pensamento.
1.
MODERNIDADE E NASCIMENTO DO SUJEITO
Um olhar histórico sobre a Modernidade envia-nos ao projeto sóciocultural que emergiu na Europa, a partir do século XVII, que provocou
mudanças nos diversos setores da vida social, tendo como objetivo principal a
afirmação e a emancipação da humanidade.
Como assinala Fonseca,1 a construção filosófica da Modernidade tinha
como pressuposto que todos os homens possuíam uma estrutura passional e
uma razão uniforme, e que, apesar de todas as variações espaço-temporais,
tornava possível a afirmação como regras gerais das descobertas, tanto da
razão teórica como da razão prática.
A existência, desde então, seria conduzida a partir da razão, com o
conseqüente desencantamento do mundo, ou seja, a ciência substitui Deus e a
Modernidade transfere as crenças religiosas para a vida privada. Nesse sentido,
escreve Sérgio Rouanet, o racionalismo “implicava a fé na razão, em sua
capacidade de fundar uma ordem racional, e na ciência, como instância
habilitada a sacudir o jogo do obscurantismo e a transformar a natureza para
satisfazer as necessidades materiais dos homens”.2 Assim, emancipar,
122
1
FONSECA, Ricardo M. Do sujeito de direito à sujeição... p. 79.
2
ROUANET, Sérgio. Mal-estar na modernidade. p. 97, 120 e ss.
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significava, por um lado, libertar a consciência tutelada pelo mito e, por outro,
usar a ciência, para tornar mais eficazes as instituições econômicas, sociais e
políticas, no intuito de aumentar a liberdade do homem.
Todo o percurso do pensamento moderno está assentado num
pensamento filosófico que tem na subjetividade a sua principal identificação.
A subjetividade passa, então, a ser a referência:
da política, da sociedade, do conhecimento e também do direito.
A organização do poder, a forma de encarar a sociedade, o modo
de fundamentar as reflexões e a forma de regulamentar a vida
social, tudo isso terá como referência mediata ou imediata (de
acordo com as diversas fases históricas particulares) a figura do
sujeito. Poderá se privilegiar nestes âmbitos um sujeito tomado
de uma maneira monádica e egoística (como nas concepções
mais radicais do liberalismo) ou poderá se enquadrar o sujeito
num modo coletivista e social (como, no limite, o fizeram certas
leituras do socialismo). Mas, no processo de formação da
modernidade, será progressivamente o sujeito a referência básica
da análise e o substrato do sistema político, social, científico e
jurídico. A modernidade é, por excelência, a época da
subjetividade.3
A subjetividade expressa-se através de algumas abstrações que lhe são
fundamentais e que, de acordo com Rouanet, podem ser consideradas as
seguintes características: universalidade, autonomia e individualidade.4
Pela universalidade, o ser humano é visto independentemente dos
privilégios que o Ancien Regime compreendia como inerentes a certos grupos
sociais, sendo considerado sem barreiras nacionais, étnicas ou culturais. É uma
visão anti-hierárquica, com valores universais que trazem consigo uma força
permanente de liberação dos preconceitos e das vinculações comunitárias e
opõem-nos às sociedades que se encerram, voluntária e totalmente, na procura
de suas diferenças, nos seus particularismos que os condena à cegueira e à
paralisia.5
3
FONSECA, Ricardo M. Do sujeito de direito à sujeição... p. 79.
4
Cf. ROUANET, Sérgio. Mal-estar na modernidade. p. 9 e 14.
5
Cf. TOURAINE, Alain. Crítica na modernidade. p. 335.
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O status que define o lugar que o indivíduo ocupava na sociedade foi
substituído pelo contrato, como alicerce jurídico da sociedade.
A universalidade quer significar, num primeiro momento, que a natureza
humana não se define dentro das fronteiras nacionais, condenando todos os
nacionalismos e outros particularismos, considerados como provincianos. No
dizer de Fonseca,
para o Iluminismo há o reconhecimento do princípio liberal da
auto-determinação dos povos e o repúdio a todas as formas de
imperialismos. Aceita a idéia de que entre a enorme variedade
das culturas humanas existe uma uniformidade fundamental, a
unidade da natureza humana – e, tendo-se que todas as formas de
hierarquias (como aquelas das sociedades tradicionais) são
rejeitadas por serem arbitrárias, todas as pessoas devem ser
tratadas como iguais.6
O individualismo é a afirmação do indivíduo enquanto princípio e valor,
e é mediante essa afirmação que todo aparato cultural, intelectual e filosófico
da Modernidade pode caracterizar-se e comandar um novo imaginário.
A idéia de modernidade, foi especialmente, a afirmação de que o homem
é fruto da sua vontade, devendo existir uma correspondência cada vez maior
entre a produção, “tornada mais eficaz pela ciência, pela tecnologia ou pela
administração, e a organização da sociedade, regulada pela lei e a vida pessoal,
animada pelo interesse, mas também pela vontade de se liberar de todas as
opressões.”7
O individualismo constitui um elemento essencial da subjetividade
moderna, e um dos aspectos mais libertadores da modernidade. Vale dizer:
o indivíduo, em determinado momento histórico, emerge de sua
comunidade, de sua cultura e de sua religião para ser tomado em
si mesmo, a partir de suas exigências próprias e seus direitos
intransferíveis a felicidade e a auto-realização. Nas palavras de
Rouanet, o Iluminismo ‘questiona sistematicamente o estatuto
imposto a cada um pelas circunstâncias do seu nascimento’ e o
124
6
FONSECA. Ricardo M. Do sujeito de direito à sujeição... p. 81.
7
BEDIN, Gilmar. Os direitos do homem... p. 25.
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seu ideal ‘é o da auto-formação, da Bildung Individual, o que
pressupõe a apropriação da cultura pré-existente, mas pressupõe
também a possibilidade de romper modelos e normas desta
cultura’, precisamente a partir do indivíduo. Em suma, o sujeito
é tomado em sua singular existência, como dotado das mesmas
prerrogativas que seus pares (tomados como seus iguais).8
Por fim, a autonomia tem, na leitura de Rouanet, dois sentidos diversos:
a liberdade (que se refere aos direitos de cada um) e a capacidade (que diz
respeito ao poder efetivo de exercer os direitos). O conceito de autonomia
cinde-se, também, em várias dimensões específicas: a autonomia intelectual
que deve fazer com que as pessoas adquiram sua maioridade cultural e recusem
toda a forma de tutela. A razão deve ser o guia (o único guia) no
desvendamento do mundo, devendo ser recusadas todas as crenças e opiniões
que não sejam rigorosamente guiadas por ela. Autonomia intelectual significa
rejeitar as trevas em prol da luz da razão, a qual, além de tirar os homens do
obscurantismo e da ignorância, também pode guiá-los em direção a uma
emancipação nas esferas da vida social e política. Daí, vem a segunda
dimensão de autonomia: a autonomia política, que significa a superação de
toda forma de despotismo, na valorização da liberdade civil (entendida como a
capacidade de o homem agir no espaço privado sem interferência ilegítima) e
da liberdade política (entendida como a capacidade de o homem agir no espaço
público). Há, finalmente, a autonomia econômica para poder produzir,
consumir e fazer circular bens e serviços.9
Em seus trabalhos de antropologia comparada, Louis Dumont insistiu,
com rigor, que as sociedades tradicionais, independentemente de se tratarem de
sociedades primitivas ou sociedades medievais, são caracterizadas pela
heteronomia. É necessário ressaltar que, nessas sociedades, a tradição deve ser
acatada pelo indivíduo mesmo contra sua vontade. “É-lhe imposta de fora, sob
forma de transcendência radical à qual os homens obedecem como às leis da
natureza.” Isso faz com que a existência das pessoas esteja subordinada à
tradição.10
8
FONSECA, Ricardo M. Do sujeito de direito à sujeição... p. 81-82.
9
Cf. ROUANET, Sergio Paulo. Mal-estar na modernidade. p. 11.
10 Cf. RENAUT, Alain. Filosofia política III. p. 28.
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Por oposição, a dinâmica moderna será, ao contrário, a da erosão
progressiva desses conteúdos tradicionais, minados aos poucos pela idéia de
auto-instituição, que a Revolução fará aflorar com particular vigor. Herdada
das teorias do contrato social, seu princípio consiste em fundar a lei sobre a
vontade dos homens, subtraindo-a, tanto quanto possível, à autoridade das
tradições.11
O indivíduo, na Modernidade, afirma-se enquanto valor e princípio:
enquanto valor, à medida que, na lógica da igualdade, um homem
vale tanto quanto outro, fazendo com que a universalização do
direito de voto seja a tradução política mais completa de tal
valor;
enquanto princípio, à medida que, na lógica da liberdade, apenas o homem pode ser por si mesmo, a fonte de suas normas e
leis, fazendo com que, contra a heteronomia da tradição, a
normatividade ética, jurídica e política dos modernos se filia ao
regime da autonomia.12
Esse processo redimensionou as relações interpessoais da cultura,
criando novos sistemas de representação, um novo imaginário social,
estabelecendo, na dimensão político-jurídica, a mediação do direito entre o
indivíduo e o Estado, e, na dimensão econômica, a dissolução das antigas
formas produtivas do feudalismo, com o surgimento de uma nova classe social:
a burguesia.
Com a diferenciação das esferas de valor, cada dimensão vai adquirindo
uma racionalidade, uma lógica própria, à medida que a nova visão de mundo
vai se emancipando da visão tradicional. Como aponta Rouanet, a
racionalização cultural envolve a dessacralização das visões tradicionais e a
diferenciação em esferas de valores, até então embutidas na religião: a ciência,
a moral, o direito e a arte.13
De acordo com Luiz Bicca, “é possível afirmar que somente quando a
liberdade consegue se firmar como pressuposto filosófico, em bases sólidas
11 Cf. RENAUT, Alain. Filosofia política III. p. 30.
12 Idem.
13 ROUANET, Sérgio P. O mal-estar na modernidade. p. 121.
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não-naturalistas, como critério ou ponto de vista fundamental para se pensar a
subjetividade”,14 pode a auto-conservação humana ser analisada como
princípio da ação independente de seus aspectos naturais fixos.15
A história da apreensão da investigação filosófica, diz Bicca, na qual se
insere a filosofia moderna de modo geral (a epistemologia ou teoria do
conhecimento), está dividida entre racionalismo e empirismo. De forma breve,
“é possível descrever a vertente empirista por meio da tese de que a origem
fundamental de todo conhecimento localiza-se na observação” enquanto, ao
contrário, “insistiam os racionalistas encontrar-se tal origem nos atos de
apreensão do puro intelecto, as idéias claras e distintas. Para o racionalismo
moderno (...) encontrar a verdade é algo que depende de um apelo à razão.”16
Com o racionalismo, confiava-se que a razão humana, poderia elaborar
por si mesma, ou melhor, a partir de si mesma, explicações suficientes.
Como salienta Bicca,
O racionalismo é assim, desde seus primórdios, (...), uma postura
intelectual otimista: em seu centro está a crença de que a verdade
é evidente, de que ela se revela – se não espontaneamente, ao
menos por nosso intermédio (...). O conceito central na
perspectiva do racionalismo é o da consciência de si, já
secundário, por sua natureza e significado intelectualizante, na
ótica do empirismo.17
A questão, conforme o autor, é que enquanto “os empiristas privilegiam
a objetivação do EU”, os racionalistas claramente ressaltam a subjetivação do
Eu, “fazendo da autoconsciência, como a certeza de si ou saber imediato de si,
o fundamento de todos os saberes, a base da consciência, ou seja, do saber
sobre algum outro, sobre as coisas, e sobre o mundo em geral.”18
Segundo Tugendhat, na história da filosofia da consciência, pode-se
distinguir três momentos:
14 Cf. BICCA, Luiz. Racionalidade moderna e subjetividade. p. 179.
15 Idem.
16 BICCA, Luiz. Racionalidade moderna e subjetividade. p. 146.
17 BICCA, Luiz. Racionalidade moderna e subjetividade. p. 152-155.
18 Cf. BICCA, Luiz. Racionalidade moderna e subjetividade. p. 155.
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primeiramente, a etapa do cartesianismo, início histórico da
guinada da ontologia para uma reflexão em torno da consciência,
por meio da primazia que passa a ser concedida ao problema da
fundamentação e da comprovação no conhecimento – que é
concebido sempre, como conhecimento de cada indivíduo.
Comprovar é neutralizar qualquer dúvida, estabelecendo, assim,
a certeza. Duvidar, bem como, ter certeza, remete ao próprio
indivíduo. Assim, uma primeira definição de consciência é o
saber indubitável do indivíduo de que ele se encontra numa série
de estados: sentir, desejar, querer etc. Consciência é um domínio
interior, ao qual o indivíduo tem acesso imediato.19
a etapa seguinte, a kantiana, é aquela na qual o problema do
acesso afeta as próprias questões ontológicas, ao contrário da
etapa cartesiana, que teria deixada intocada a ontologia em si
mesma.20
A análise ontológica dá lugar a uma reflexão da possibilidade da
experiência e do problema da constituição de algo como objeto.
A reflexão sobre a consciência promove um alargamento do
domínio temático sobre a ontologia pré-moderna. Kant chama
atenção para modalidades de consciência que não podem ser
compreendidas como consciência do objeto – por exemplo, a
consciência de mundo, isto é, da totalidade do que se pode
experimentar que, enquanto tal, não é um objeto. Em Kant, toda
experiência encerraria sempre uma referência ao mundo ou, dito
de outro modo, o mundo está sempre pressuposto. Ademais, para
Kant, é uma modalidade não objetiva (ou não-reificável) de
consciência que constitui a consciência de objetos.21
a terceira e última fase, a heideggeriana (Ser e Tempo), “é
marcada pelo abandono do termo ‘consciência’ em favor daquele
outro de ‘abertura’ (...) no qual ‘mundo’, que permanece um
19 In: BICCA, Luiz. Racionalidade moderna e subjetividade. p. 189.
20 In: BICCA, Luiz. Racionalidade moderna e subjetividade. p. 189-190.
21 In: BICCA, Luiz. Racionalidade moderna e subjetividade. p. 190.
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pressuposto (...), não é um substituto para a totalidade de objetos
e sim a totalidade de um contexto de sentido no qual um homem
se compreende.”22
Reconhece-se em René Descartes (1596-1650) o fundador da
subjetividade e do racionalismo moderno. Devido a sua distinção entre corpo
e alma, e, tomando-a como pressuposto, Descartes elaborou a certeza do
cogito. Na sua concepção, o lugar do “eu penso” é o do sujeito que é, sendo
independente do “eu sou”. Descartes foi o filósofo que ultrapassou “o
paradigma do ser em direção ao paradigma da consciência, ou seja, é aquele
que substitui a busca do fundamento da filosofia num substrato material (como
os gregos) ou teológico (como os teólogos medievais) para situá-la na própria
consciência do homem: a partir de agora, é a razão que passa a ser o ponto de
partida para o filosofar e o guia para desvelar o mundo.”23
Partindo da premissa de que é necessário colocar tudo em dúvida
metodicamente, escrevem Strauss e Cropsey que,
Descartes coloca em cheque toda a tradição cultural, todos os
saberes que foram transmitidos, como também todas as crenças
que são adquiridas pelos sentidos: é necessário duvidar de tudo
para a partir daí reconstruir, pela razão, o caminho que leva às
certezas. Descartes hiperboliza as dúvidas, pois o único caminho
seguro para superá-las é enfrentando-as e atravessando-as
(jamais evitando-as). É somente à medida que todas as idéias são
colocadas em dúvida – até mesmo aquelas mais claras, que o
espírito considera em princípio evidentes – é que ela permite
extrair um núcleo de certeza, que cresce à medida que ele se
radicaliza.24
Descartes se opõe à finalidade do pensamento filosófico que o
precedera, pois sua abordagem abandona as especulações, em favor do
conhecimento útil. Para o autor, só um método rigoroso pode superar o
predomínio da paixão diante da razão, à medida que “os prejuízos causados por
22 BICCA, Luiz. Racionalidade moderna e subjetividade. p. 190.
23 FONSECA, Ricardo M. Do sujeito de direito à sujeição... p. 64.
24 STRAUSS, Leo; CROPSEY, Joseph. História de la filosofía política. p. 403-404.
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nossos apetites ou paixões, desde a infância, governam nossas percepções
sensoriais e não podem ser corrigidos por um tipo de razão que, serve a ditas
paixões.” Sendo assim, todo pensamento filosófico, que o precedeu, que tinha
como ponto de partida a percepção sensorial estava eivado de erros, pois não
dispunha de um método. “O método pode sanar os defeitos naturais ou as
desproporções da natureza do homem, tomando como modelo a matemática,
que, sendo exata, não deve nada aos sentidos nem ao corpo.”25
Assim, a primeira regra do método será o abandono de todas as
opiniões que não são claras e distintas ou a mudança daquelas opiniões pouco
confiáveis que são os fundamentos de nossa própria vida.26
Nesse sentido, a dúvida é o procedimento elaborado por Descartes para
relativizar nossa confiança nos sentidos e nas imagens que deles provêm, que
formam aquilo que chama “os ensinamentos da natureza” e que ele considera
uma atitude natural.27
Descartes foi atingido pela profunda dúvida que se seguiu ao
deslocamento de Deus do centro do universo, mas colocou-o como o impulsionador, o primeiro movimento de toda criação; daí em diante, ele explicou o
resto do mundo inteiramente em termos mecânicos e matemáticos.28
Para isso, Descartes centrou-se em duas substâncias distintas:
a substância espacial (matéria) e a substância pensante (mente).
Ele focalizou, assim, aquele grande dualismo entre a ‘mente’ e a
‘matéria’ que tem afligido a Filosofia desde então. As coisas
devem ser explicadas, ele acreditava, por uma redução aos seus
elementos essenciais à quantidade mínima de elementos e, em
última análise, aos seus elementos irredutíveis. No centro da
‘mente’, ele colocou o sujeito individual, constituído por sua
capacidade para raciocinar e pensar ‘cogito ergo sum’ que era a
palavra de ordem de Descartes: penso, logo existo. Desde então,
esta concepção do sujeito racional, pensante e consciente,
situado no centro do conhecimento, tem sido conhecida como o
sujeito cartesiano.29
25 STRAUSS, Leo; CROPSEY, Joseph. História de la filosofía política. p. 403-404.
26 Cf. STRAUSS, Leo; CROPSEY, Joseph. História de la filosofía política. p. 404.
27 Cf. STRAUSS, Leo; CROPSEY, Joseph. História de la filosofía política. p. 408.
28 Cf. HALL, Stuart. A identidade cultural na pós-modernidade. p. 26-27.
29 HALL, Stuart. A identidade cultural na pós-modernidade. p. 27.
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Como escreve Ricardo Fonseca, o autor, através do “penso, logo existo”
e da “dúvida metódica”, chega a um “ponto fixo”, inquestionável, ou seja, “a
consciência que duvida e, por conseqüência, que pensa, é o limite; por outro
lado, esta consciência, enquanto ser pensante localizado, à medida que pensa
(e duvida) não pode ter sua existência colocada em dúvida.”30
Para Descartes, de acordo com Ricardo Fonseca, todo o resto pode ser
colocado em dúvida, menos a existência do pensamento que duvida. “Em
outras palavras, se eu duvido, eu mesmo, enquanto pensamento, me afirmo
enquanto tal no próprio exercício da dúvida.” Se a dúvida existe, “então o
pensamento, do qual a dúvida é uma modalidade, existe, e eu mesmo, que
duvido, logo penso, existo necessariamente, ao menos como ser pensante.”31
Sendo assim, pode-se dizer que ao identificar-se o núcleo irredutível do
conhecimento (a dúvida metódica), que Descartes menciona nas suas
Meditações “atinge-se a certeza do pensamento da dúvida e, portanto, da
existência do pensamento. Se duvido, penso; se penso, existo.”32 Constrói-se,
então, o pensamento e, conseqüentemente, a noção de consciência, como ponto
de partida básico da busca da verdade. Ainda, na assertiva de Fonseca,
O homem não encontra mais em si a verdade divina, mas
descobre a auto-evidência da verdade. Não existem mais formas
ou essências transcendentes iluminando o mundo sensível e o
processo de conhecimento, já que a verdade não se dá no céu das
idéias inteligíveis mas na imanência do pensamento. E é a
descoberta deste eu pensante em sua interioridade reflexiva que
se constitui no princípio inaugural da filosofia moderna.33
Assim, com Descartes, inicia-se uma filosofia que brota da razão e na
qual a consciência de si é o momento fundante da verdade. Certamente, com
Descartes inaugura-se “a cultura dos tempos modernos, o pensamento da
moderna filosofia. Nesse novo período, o princípio geral que regula e governa
tudo no mundo é o pensamento que parte de si próprio.” Esse ponto de partida,
“que é para si, essa cúpula mais pura da interioridade se afirma e se fortifica
30 FONSECA, Ricardo M. Do sujeito de direito à sujeição... p. 66-68.
31 FONSECA, Ricardo M. Do sujeito de direito à sujeição... p. 65-66.
32 Cf. FONSECA, Ricardo M. Do sujeito de direito à sujeição... p. 66.
33 Idem.
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como tal, relegando para o segundo plano e rechaçando como ilegítima a
exterioridade morta da autoridade.”34
A virada dada por Descartes, como se pode notar, é decisiva em toda
cultura ocidental, e inaugura um novo modo de pensar que definirá o
argumento filosófico, a partir de então. Pode-se dizer, de um modo geral, que
toda a reflexão jusnaturalista e contratualista, de certo modo, parte dos
pressupostos do cartesianismo. A filosofia da Modernidade, enquanto filosofia
da razão e da consciência, tem o seu ponto de inflexão precisamente nessa
concepção de subjetividade, é definida a partir dos seus fundamentos.
No segundo momento, a profunda reflexão de Kant, por sua vez,
manifesta-se, sobretudo, através de suas três obras fundamentais: A Crítica da
Razão Pura, A Crítica da Razão Prática e a Crítica do Juízo.35
Kant, em sua Crítica da Razão Pura, admite que o conhecimento
começa com a experiência, porém, nem todo conhecimento procede da
experiência. É necessário perguntar-se, pois, como é possível a experiência,
quer dizer, encontrar a possibilidade de toda experiência. Nesse sentido, os
juízos a priori seriam as formulações independentes da experiência; os juízos
a posteriori são os derivados da experiência.36
Kant lança, assim, o tema que irá transformar a filosofia e a estrutura de
pensamento da era moderna: a existência dos juízos sintéticos a priori, que não
derivam de nenhuma experiência e que seriam idéias puras ou categorias puras
do conhecimento.37
Na sua filosofia transcendental, a investigação ocupa-se menos dos
objetos, preocupando-se com o modo de os conhecer. E, “é aqui (no problema
de como conhecer o mundo), que ele opera uma verdadeira ‘revolução
coperniana’ na filosofia, moldando a idéia da subjetividade cognitiva.” Desse
modo, se Copérnico reformulou o paradigma do cosmo tradicional, “segundo
o qual o Sol girava em torno da Terra, Kant aduziu que não é o sujeito que se
orienta pelo objeto, mas é o objeto que é determinado pelo sujeito, ou dito de
outro modo, ao invés de a faculdade de conhecer ser regulada pelo objeto, é,
na verdade, o objeto que é regulado pela faculdade de conhecer.”38
Como bem assinala Fonseca, para Kant, a filosofia,
34 FONSECA, Ricardo M. Do sujeito de direito à sujeição... p. 67.
35 Cf. CALDERA, Alejandro S. El doble rostro de la post modernidad. p. 29.
36 CALDERA, Alejandro S. El doble rostro de la post modernidad. p. 30.
37 Idem.
38 FONSECA, Ricardo M. Do sujeito de direito à sujeição... p. 69.
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deveria se ocupar com os princípios, (...) a priori que seriam
responsáveis pelas sínteses dos dados empíricos. Tais princípios,
por sua vez, demonstram que todo conhecimento é constituído por
sínteses de dados ordenados pela intuição sensível espaçotemporal, mediante as categorias apriorísticas do entendimento.
São rejeitadas as noções de intuição intelectual (existentes na
metafísica tradicional), já que a intuição é sempre sensível, é o
modo como os objetos se apresentam a nós no espaço e no tempo,
é a condição de possibilidades para que sejam objetos. Assim, o
que conhecemos não é o real ou a ‘coisa em si’, mas sempre o real
em relação com o sujeito do conhecimento.39
Kant considera que há uma identidade entre a natureza de nossa
sensibilidade e a das sensações que emanam do mundo real. Portanto, trata-se
de um processo de complementação de um mesmo elemento radicado no
mundo real e no ser sensível.40 No entanto, ele salienta que “aquilo que capta
os nossos sentidos não é o mundo físico senão suas emanações. Kant denomina
sensações as emanações do mundo físico.” Essas são captadas pela nossa
sensibilidade à medida que ambas são da mesma natureza. As sensações que
Kant identifica “como emanações da natureza realizam uma dupla função: por
um lado, entram em contato com nossos sentidos que as captam e, por outro,
recobrem o mundo físico de tal forma que fica impossível ao ser humano entrar
em comunicação com ele.”41
De acordo com essa formulação de Kant, nós só somos capazes de
conhecer o fenômeno, porém não a substância. A ciência, portanto, é
fenomênica.42
Kant não vê a possibilidade de conhecermos a substância ou a realidade
do mundo físico por meio da ciência, porém, não nega que tal substância
exista.43
A razão que contém “os juízos sintéticos a priori realiza uma dupla
função: por um lado, organiza harmonizando as sensações de sons e de cores
e, por outro, deduz os conceitos universais, como causa, ordem, uniformidade,
39 FONSECA, Ricardo M. Do sujeito de direito à sujeição... p. 69-70.
40 Cf. CALDERA, Alejandro. El doble rostro de la postmodernidad. p. 32.
41 Idem.
42 Cf. CALDERA, Alejandro. El doble rostro de la postmodernidad. p. 32.
43 Idem.
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substância, que permitem fundar a ciência sobre a base de leis, relação de
casualidade etc.”44
De acordo com Caldera,
Quanto à primeira função de ordenamento sensorial, a razão só
conhece o que pode ordenar e organizar e, só é capaz de ordenar
o que pode conhecer. Neste caso, a organização em conceitos das
sensações que foram captadas pelos nossos sentidos equivalem
ao ato cognitivo devido a que existe uma mesma natureza das
sensações do mundo físico, do sentido e da razão.
Quanto à segunda função, que consiste em supor a existência da
substância sob as sensações, a razão as realiza mediante os juízos
sintéticos a priori que radicam em nosso eu, porém não no eu
subjetivo, porém, no eu especial que Kant denomina de eu
transcendental.45
Como descreve, ainda, Caldera,
os juízos sintéticos a priori, não provêm da experiência, são
universais, têm uma necessidade em si mesmo, existem em nossa
razão e mais exatamente em nosso eu transcendental, permitem
encadear logicamente os conceitos, estabelecer as relações de
causalidade, generalizar as proposições, formular leis, ampliar o
conceitos ao integrar o predicado no sujeito e, em conseqüência,
fazem possível a existência da ciência. Diferentemente das idéias
empíricas que se apoiam na experiência, existem idéias puras que
não derivam de nenhuma experiência e por isso mesmo são
necessárias e universais.46
Como a razão teórica inscreve-se “no campo do conhecimento (dandose a resposta à pergunta: ‘como é possível conhecer?’), é necessário avançar e
buscar a dimensão prática da razão, que determina o seu objeto mediante a
44 CALDERA, Alejandro. El doble rostro de la postmodernidad. p. 33.
45 Idem.
46 CALDERA, Alejandro. El doble rostro de la postmodernidad. p. 34.
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ação. Passa-se, pois à tentativa de responder à indagação: o que devo fazer?
Será na Fundamentação da Metafísica dos Costumes (1785) e na Crítica da
Razão Prática (1788) que Kant enfrentará a questão, na busca de respostas.”47
Na esfera da razão prática, conserva-se a crença em Deus, liberdade e
imortalidade. Essas idéias formulam-se como postulados da razão prática e,
portanto, estão inseridas na existência humana, pois, “é a razão no seu uso
moral. Uma das noções centrais de tal crítica é a da boa vontade. Kant elabora
a crítica da chamada ética dos bens, pois esta não pode proporcionar normas de
ação absoluta.” Assim, delimita como morais, “os atos que fundamentam-se na
boa vontade sem restrições. Por isso, nas divisões dos imperativos morais em
hipotéticos e categóricos, só a estes últimos compete a moralidade absoluta.”48
Por outro lado, a vontade humana é o campo dos valores morais, isto é,
o valor moral relaciona-se unicamente com a vontade humana, ou seja, a
radicalização do bem na boa vontade. É de fato com Kant que a autonomia
define-se como essência da subjetividade. Como assinala Fonseca,
cabe destacar a centralidade de noção de autonomia de vontade
na elaboração desta fundamentação para a ação. A autonomia
deve ser entendida como a faculdade de dar leis a si mesmo – e a
vontade moral será por isso vontade autônoma por excelência. É
por isso que, (...), a ação é o terreno da liberdade – e esta está por
sua vez calcada na vontade autônoma. O imperativo categórico
afirma a autonomia da vontade como o único princípio de todas
as leis morais e essa autonomia consiste na independência em
relação a toda matéria da lei e na determinação do livre arbítrio
mediante a simples forma legislativa universal de que uma
máxima deve ser capaz.49
No entanto, o conceito de liberdade em Kant deve ser entendido como
obediência a uma lei autoprescrita.
Por outro lado, para Kant, precisamente por ser a pessoa humana o
centro dos valores morais, ela é um fim em si mesma. A partir da apreciação de
cada homem ser um fim com valor absoluto, surge o reino dos fins. “Isto é
47 FONSECA, Ricardo M. Do sujeito de direito à sujeição... p. 70.
48 Cf. MORA, José Ferrater. Dicionário de filosofia. p. 1843.
49 FONSECA, Ricardo M. Do sujeito de direito à sujeição... p. 71-72.
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possível, porque todos os homens estão sujeitos à lei de que cada um deve
tratar-se a si mesmo e tratar todos os outros, nunca como simples meio, mas
sempre, ao mesmo tempo, como fim em si mesmo.” Trata-se, no entanto, de
um critério formal, pois de acordo com o imperativo categórico, “toda ação
exige a antecipação de um fim, isto é, o ser humano deve agir como se este fim
fosse realizável. Não se estabelece o que deve ou não se deve fazer, mas tãosomente um critério instrumental e procedimental para a ação. Trata-se,
portanto, de um critério formal, e não material de conduta (como os critérios
religiosos, por exemplo, o são).”50
Por último, na contemporaneidade, cabe resgatar Martin Heidegger,
como o primeiro filósofo que, desde Platão e Aristóteles, considerou
prioritariamente a questão do Ser. A mais profunda importância de seu
pensamento brota de sua preocupação com o niilismo que tem um significado
metafísico e (um significado) moral.
Heidegger enfrenta a questão do Ser em sua obra “Ser e Tempo”.
Preocupou-se, nessa obra, em “tematizar a significação do Ser (Sein), mediante
uma análise do Ser humano (Dasein) em função da sua temporalidade,
chegando a um entendimento do Ser e do Tempo, examinando como se unem
o homem e o ser histórico.”51
Para Strauss e Cropsey, a questão do Ser em Heidegger “é a fonte e o
fundamento de todas as ontologias e os ordenamentos dos seres e, portanto, de
todo entendimento humano.” Ao afastar essa questão, o homem perde a fonte
de seu próprio conhecimento e “a capacidade de questionar de maneira mais
radical, que é essencial para o pensamento autêntico e, por sua vez, para a
liberdade autêntica.”52
Para Heidegger, dizem-nos Strauss e Cropsey, o homem “se reduz a essa
besta calculadora, preocupada tão-só com sua sobrevivência e prazer, um
‘último homem’, na terminologia de Nietzche, para quem a beleza, a sabedoria
e a grandeza não são mais que palavras.”53
Para enfrentar esse niilismo, segundo Heidegger, é necessário, apontam
os autores, superar o esquecimento do Ser. Nesse contexto, a questão do Ser
fica de lado, porque este é tido como evidente, “como o mais universal porém
50 GIALDI, Silvestre. Ética. Uma reflaxão da filosofia moral. p. 35.
51 Cf. STRAUSS, Leo; CROPSEY, Joseph. História de la filosofía política. p. 836.
52 Cf. STRAUSS, Leo; CROPSEY, Joseph. História de la filosofía política. p. 836.
53 Idem, ibidem.
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o mais vazio de todos os conceitos.” Isso, de acordo com Heidegger, deve-se a
uma atribuição errada ao Ser de uma essência independente do Tempo, ou seja,
“é resultado de uma interpretação errônea da relação do Ser e do Tempo.” Na
verdade, desde Platão,
(...) o Ser tem sido interpretado em oposição às coisas reais, ou
como aquilo que está além do tempo e que não muda. Em
oposição ao âmbito imutável do Ser, as coisas reais existem no
âmbito do devenir, ou do Tempo. No entanto, o que se tornou
evidente nos tempos modernos é que esta distinção, que se
encontra no núcleo das categorias de nosso conhecimento, nos
impede de captar adequadamente nossa realidade histórica
concreta, o que Heidegger chama a facticidade da existência
humana.54
Isso significa que não há natureza humana. O homem primeiro existe e
depois se define. Nesse sentido, o homem é o “único ente que tem seu próprio
Ser como pergunta, quer dizer, o homem é o único ente que se preocupa pelo
que significa Ser, acerca do seu futuro, de suas possibilidades de Ser.”55
Para Heidegger, o homem é o que ele próprio se faz, isto é, como ele se
deseja após o impulso da existência. O homem é um projeto concebido
subjetivamente,56 ou seja, “o homem, na sua opinião, não tem um fim
determinado. Seu fim, e portanto seu futuro, sempre será uma incógnita para
ele. Nesse sentido, o homem é o único ente em verdade histórico, dedicado a
planejar e forjar o próprio futuro. Heidegger crê que o homem pode servir
como entrada na questão do Ser mesmo”57, e a considera a partir da
compreensão do Ser humano no que tange às estruturas básicas da existência
humana, “mostrando não o que é o homem senão como existe, como é no
Tempo e através do Tempo.” Sua análise existencial nasce do cotidiano, do
deslocamento da questão do ser e da verdade para o âmbito da finitude.58
Heidegger inicia
54 Idem, ibidem.
55 STRAUSS, Leo; CROPSEY, Joseph. História de la filosofía política. p. 837.
56 HEIDEGGER, Martin. Conferências e escritos filosóficos. Os Pensadores. p. 10.
57 STRAUSS, Leo; CROPSEY, Joseph. História de la filosofía política. p. 837.
58 HEIDEGGER, Martin. Conferências e escritos filosóficos. Os Pensadores. p. 207.
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com uma análise da existência cotidiana, enfocando o fato de que
o homem, sempre se encontra enquadrado num mundo que se
caracteriza por uma particular ontologia e ordem das coisas. O
homem como Ser humano é, assim, o que Heidegger, chama ‘Serno-mundo’. Por conseguinte, o homem se encontra para as coisas
e com os outros, quer dizer, dentro de uma estrutura particular
que determina as relações entre todas as coisas, que define seus
propósitos e, portanto, suas atividades, determinando como é o
homem e tudo o mais.59
Na maioria das vezes, o homem é absorvido pela ordem prevalecente,
aceitando as coisas como são, sem questionar a existência. No entanto, essa
situação é alterada quando a existência humana é confrontada com a questão
da morte. À medida que o “Ser questiona o futuro, preocupando-se com o que
vai ocorrer, o homem inevitavelmente encontra a questão da morte. Heidegger
descobre a possibilidade de compreender autenticamente a morte no fenômeno
da angústia”, sobretudo quando a consciência é interpelada pelas
possibilidades futuras do Ser. “Esta experiência da morte na angústia, libera o
homem da ordem prevalecente do Ser. É o reconhecimento da finitude do
nosso próprio Ser, e abre a possibilidade para a experiência da questão do
próprio Ser.”60
Segundo Heidegger, diz-nos Ferry, a Modernidade caracteriza-se pela
subjetividade. Se Deus não existe, o homem está condenado a ser livre.
Condenado, porque não determinou sua existência e, no entanto, livre, porque,
uma vez no mundo, é responsável por tudo o que fizer.
Isso significa que
o homem é que serve como medida e fundamento de toda verdade.
Assim, a Modernidade também é a esfera da liberdade, pois, o
predomínio da subjetividade libera o homem da estrutura
teocêntrica da sociedade cristã tradicional e o estabelece consigo
mesmo. A fonte desse novo conceito é a interpretação dada por
Descartes ao homem como consciência de si mesmo, que
estabelece sua absoluta independência como medida de todas as
59 FERRY, Luc. Filosofia política II. p. 77.
60 FERRY, Luc. Filosofia política II. p. 78.
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coisas. Daí em diante, só conta aquilo que pode passar diante do
tribunal da consciência, quer dizer, só o que pode ser percebido e
avaliado.61
Por outro lado, como advertem Strauss e Cropsey, para Heidegger, ao
perder seu lugar fixo, que a tradição ou a religião lhe davam, o homem
moderno é lançado na alienação e, portanto, na busca da segurança. O homem
diante de si, na Modernidade, passa a ser confrontado com a natureza que não
lhe fornece mais orientações pré-determinadas para o agir. Assim,
a natureza já não oferece os delineamentos para a ação humana,
agora é uma ordem incerta, e portanto perigosa, que o homem
deve dominar. Está submetido, no nível intelectual, pela ciência
moderna, que desenvolve um quadro ou modelo matemático do
mundo, reduzindo, assim, o mundo à categoria predizível e, por
isso, controlável. Heidegger chama de objetivação a este
processo.62
Esse aspecto é essencial, à medida que define o conflito fundamental da
Modernidade, relativizando outros, tais como, os decorrentes “da paixão, da
parcialidade humana, da vontade de poder, do antagonismo de classe ou
disputas pela natureza da justiça.”63 O conflito determinante, na Modernidade,
segundo Heidegger, e como observam os autores Strauss e Cropsey seria:
o resultado de tentar conseguir a liberdade humana no mundo
natural por meio da tecnologia. Por conseguinte, o conflito
também é inevitável, já que, o que significa ser ‘ser humano’ no
mundo Moderno é medir, dominar e domesticar a natureza, quer
dizer, ser tecnológico. Heidegger segue esse desenvolvimento a
partir de Descartes, passando por Leibniz, Kant, Hegel, Schelling
e Nietzsche, indo até a tecnologia universal do século XX. É a
história do crescente niilismo do pensamento moderno na viagem
do homem como sujeito, desde a autoconsciência cartesiana até a
61 Idem, ibidem.
62 Cf. STRAUSS, Leo; CROPSEY, Joseph. História de la filosofía política. p. 841-842.
63 Cf. STRAUSS, Leo; CROPSEY, Joseph. História de la filosofía política. p. 844.
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vontade de poder nietzscheano, na qual se encontra o miolo da
tecnologia mundial.64
Seria a história de degeneração do homem que culminou na formação do
homem massa. O desfecho da Modernidade, para Heidegger, dá-se com o total
esquecimento do Ser e na desumanização do homem convertido em peça de um
aparato tecnológico que tem como objetivo o seu próprio desenvolvimento.65
Desse modo, Heidegger volta-se “contra a tradição da Ilustração para
revelar o caráter sombrio da modernidade. Porém, não chama nossa atenção em
relação a este niilismo para provocar desespero ou repugnância, senão porque
acredita vislumbrar na sua profundidade a luz inicial de uma nova revelação do
Ser.”66
Evidenciar isso é demonstrar a ligação implícita que existe entre o Ser e
o nada. “O niilismo pode ser interpretado como a afirmação de que não há um
só fundamento para os entes e, portanto, não há uma norma ou ordem
imutável.” 67 O fundamento deve apresentar-se como algo separado do ente, o
que pode ser traduzido como o Ser em seu sentido primordial, ou seja, como
caos ou abismo.
Ainda que o homem não possa, de acordo com Heidegger, superar o
niilismo, está aberta a possibilidade de construir um novo projeto que
estabeleça as condições de apreensão de uma nova revelação.
Sendo assim, o projeto de Heidegger, que é essa preparação, inclui:
1. libertar o homem de todas as categorias e normas metafísicas,
mediante uma reinterpretação destrutiva fundamental da história do
pensamento ocidental;
2. fomentar uma autêntica experiência do niilismo contemporâneo,
chamando o homem para confrontar-se com o absurdo e a morte;
3. convencer o homem para que aceite seu destino particular dentro do
destino de seu povo ou sua geração, que se manifestou-se na
revelação do Ser.68
64 Idem, ibidem.
65 Idem, ibidem.
66 Idem, ibidem.
67 Cf. STRAUSS, Leo; CROPSEY, Joseph. História de la filosofía política. p. 867.
68 Cf. STRAUSS, Leo; CROPSEY, Joseph. História de la filosofía política. p. 868.
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Apesar de tudo, concluem Strauss e Cropsey, Heidegger não pode
garantir que, com o seu projeto, ao induzir o Ser às circunstâncias mencionadas, este se revelará em sua essência existencial, promovendo, a partir da
força que essa revelação implica, a formação do pensamento autêntico.69
2.
A QUESTÃO DO DIREITO NA MODERNIDADE
Na Modernidade, a subjetividade jurídica será o reconhecimento dos
direitos naturais do indivíduo, entendidos como poderes ou liberdades que
expressam condições para o pleno desenvolvimento de cada um e de toda
sociedade. Assim, “reconhecer que o homem tem direitos naturais para opinar
livremente, expressar seu pensamento etc., equivale a reconhecer-lhe um certo
número de poderes que poderá eventualmente fazer valer contra o poder
mesmo, e sem os quais não seria um ser humano, quer dizer, um sujeito em
oposição aos objetos.”70 Com a afirmação do indivíduo, como já vimos,
valoriza-se o homem independente de religião e de raça, a partir de sua
dignidade que passa a ser o fundamento e centro do mundo e, também, fonte
dos valores que o Direito deverá reconhecer.
Para a doutrina do Direito natural racional, as leis seriam válidas à luz
da razão e de normas intemporalmente válidas, anteriores à lei positiva e
independentes dela.71
Na época moderna, o fundamento na natureza ou em Deus, é
abandonado e substituído pela natureza do homem. Quando se
fala no direito natural moderno (ou jusracionalismo) fala-se
também num direito que se assenta na natural razão humana e
seus atributos (...) seu traço distintivo (...) é que, agora, o direito
está ligado ao indivíduo, à qualidade específica do homem,
tornando-se a emanação deste, a expressão de suas
possibilidades inalienáveis e eternas. O fundamento do direito,
portanto, aparece, como sendo outro: o homem a sua
racionalidade.72
69 Idem, ibidem.
70 RENAUT, Alain. Filosofia política III. p. 47.
71 ROUANET, Sergio. O mal-estar na modernidade. p. 128.
72 FONSECA, Ricardo M. Do sujeito de direito à sujeição jurídica... p. 53-54.
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Como Boaventura de S. Santos muito bem acentua, o direito natural
racional parte da idéia de fundação de uma nova boa ordem, segundo a lei da
natureza, a qual se atinge através do exercício da razão e da observação. É uma
racionalidade secular e, como tal, assenta-se numa ética social secular que se
emancipou da teologia moral. Essas novas condições propiciam à nova
racionalidade um caráter universal e universalmente aplicável.73
A partir da visão racionalizadora do pensamento ilustrado, com o
processo de secularização e a crescente diferenciação das esferas de valor, o
Direito, distintamente das formas pré-modernas e pré-capitalistas dominadas
pela legitimidade carismática ou tradicional, buscará sua legitimidade no
Estado Moderno, marcado pela despersonalização do poder e pela racionalização dos procedimentos normativos.74
As hipóteses jusnaturalistas relacionadas à origem da sociedade tinham
uma função, no essencial, de crítica acerca dos conceitos tradicionais da
autoridade. Se esses conceitos tiveram um alcance revolucionário, é porque
tinham como objetivo minar os fundamentos das grandes teorias do poder
político que estiveram em vigor durante o Antigo Regime. Nesse sentido,
instauraram um verdadeiro corte nas teorias tradicionais da soberania que
estabeleciam a origem da autoridade política, tanto em Deus como no poder
paterno. Essas teorias, como se sabe, fundaram a legitimidade do poder numa
instância que se supunha transcendente em relação à subjeti-vidade – a
natureza, no caso do poder paterno, e a divindade, no caso das doutrinas do
Direito divino. Os teóricos do Direito natural, quando afirmam o caráter
puramente convencional do poder legítimo, introduzem, ao contrário, a idéia
de que o fundamento verdadeiro (quer dizer, justo) da autoridade somente pode
encontrar-se na livre vontade do povo.75
O ambiente filosófico-político que permitiu o florescimento das idéias
jusnaturalistas, reuniu duas condições essenciais.
A primeira, como aponta Renaut, seria o deslocamento do homem para
o centro do universo sendo considerado o único sujeito de direito. Nesse
sentido, natureza
73 Cf, SANTOS, Boaventura de S. Crítica da razão indolente. p. 124.
74 Cf. WOLKMER, Antonio C. Pluralismo jurídico. p. 48.
75 RENAUT, Alain. Filosofia política III. p. 54 e ss.
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no pensamento moderno assume o estatuto de objeto jurídico
sempre com referência ao homem. O surgimento da subjetividade
jurídica (dos ‘direitos subjetivos’), cuja origem cristã se reconhecerá sem dúvida, mas cujo alcance político ocorre com a escola
jusnaturalista, tem em Hobbes a ruptura com o aristotelismo e o
direito passa a ser considerado definitivamente como atributo do
indivíduo.76
Com as teorias de contrato social e do estado de natureza, vinculam-se
as noções de legitimidade e de subjetividade: “só é legítima a autoridade que é
ou foi, objeto de um contrato por parte dos sujeitos que, de alguma maneira lhe
estão submetidos. A subjetividade (adesão voluntária) fica assim estabelecida
como origem ideal de toda legitimidade, efetuando-se o enlace entre a idéia dos
direitos subjetivos (fundados por e para os sujeitos) e as condições de seus
cimentos políticos.”77 Nesse contexto, a referência a Rousseau é obrigatória
para que se possa compreender, segundo Renaut, “essa primeira possibilidade
dos direitos do homem, porque o Contrato Social, e particularmente, a teoria
da vontade geral são, seguramente, os que levam a concluir a reflexão política
jusnaturalista, elucidando as condições, a partir das quais pode o povo ser
considerado soberano, quer dizer, como sujeito verdadeiro (autor) de toda
legitimidade política.”78
A segunda condição, para Renaut, traz a questão da relação SociedadeEstado. Procura enfocar a contraposição dos direitos-liberdades e dos direitoscréditos. Nesse sentido, “os direitos-liberdades implicam os limites do Estado,
enquanto os direitos-créditos, ao contrário, implicam a intervenção e o
crescimento do Estado.”79
A lógica da Modernidade é a do individualismo e, sendo assim, pensase a política a partir daquilo que constitui a essência do individualismo, ou seja,
a liberdade é concebida como a faculdade de autodeterminação. Assinala
Renaut: “tudo aquilo que representa um obstáculo a esta autodeterminação, e
portanto à liberdade, é visto como intolerável moralmente, porque destrói a
76 Idem, ibidem.
77 RENAUT, Alain. Filosofia política III. p. 54 e ss.
78 RENAUT, Alain. Filosofia política III. p. 55-56.
79 Idem.
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individualidade e aquilo que se considera o fundamento e o fim último de toda
ordem social.”80
A dificuldade de tal princípio é passar dessa concepção individual da
liberdade para a coletiva, ou seja, a passagem da moral para a política. De
acordo com Rousseau, é necessário que se pense o povo, em seu conjunto,
como um indivíduo, quer dizer, como uma entidade suscetível de conduzir-se
livremente.81 Para o autor, segundo Renaut, duas características são
indispensáveis na constituição do povo como subjetividade:
a soberania deverá ser o exercício da vontade geral, jamais
poderá ser alienada e nem tampouco dividida. Quando Rousseau
afirma a inalienabilidade e a indivisibilidade da soberania,
contrapõe-se aos autores que consideram a liberdade de decidir
um bem que pode transferir-se a outro legitimamente, com a
única condição de que esta transferência se efetue de forma
voluntária. Para Rousseau, pelo contrário, essa transferência
não só é ilegítima, senão que carece de sentido: a liberdade e,
como conseqüência, a soberania não são bens dos quais o homem
possa dispor a seu gosto, o homem é um ser livre por natureza;
renunciando livremente a esta liberdade, estaria renunciando a si
mesmo, e delegar sua liberdade para decidir equivaleria a um
suicídio.82
Rousseau considera a soberania indivisível, pois não é senão o exercício
da vontade geral. Assim, assevera Renaut que, “a definição de povo ou de
corpo político como subjetividade livre, se realiza plenamente, pela primeira
vez na história da filosofia política, na teoria da vontade geral.”83
Em Rousseau, o contrato representa um ato de atribuição de poder que
se reproduz no corpo político que o cria. Daí, duas características – na unidade
do povo, como subjetividade – na soberania, a de ser inalienável e indivisível.84
80 RENAUT, Alain. Filosofia política III. p. 58.
81 Idem.
82 RENAUT, Alain. Filosofia política III. p. 59.
83 Idem.
84 Cf. FERRY, Luc. Filosofia política III. p. 58-59.
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Assim, conclui Rousseau que, em sendo a soberania inalienável e
indivisível, o Direito só pode ser auto-prescrito. É em razão disso que o
cidadão “não obedece senão a si próprio e não pode ser forçado a nada senão
a ser livre.”85
A problemática que Rousseau enfrenta é a da essência, uma definição
rigorosa do povo como individualidade livre. Já, a teoria política do século
XIX não será, como recorda Alain Renaut, teoria das essências, mas também
uma reflexão sobre as divisões reais (povo/governo, Estado/sociedade) que o
Contrato Social considera uma contradição com os pressupostos da liberdade.86
Com o advento do positivismo e a formação do Estado de Direito liberal
burguês, inicia-se um segundo momento na formação da doutrina jurídica da
Modernidade, em função da ascensão de uma nova epistemologia, que
substituía a razão abstrata pela experiência, desqualificando as idéias inatas.87
Ao afastar-se do jusracionalismo, e com o fortalecimento do paradigma
científico, o Direito ficou reduzido a uma questão de poder e as garantias
fundamentais ficaram desprovidas de seu referente axiológico para constituirse num fim em si mesmo.88
Naturalmente, como aponta Boaventura de Sousa Santos, com
o aparecimento do positivismo na epistemologia da ciência
moderna e do positivismo jurídico no direito e na dogmática
jurídica podem considerar-se em ambos os casos, construções
ideológicas destinadas a reduzir o progresso societal ao
desenvolvimento capitalista, bem como a imunizar a racionalidade contra a contaminação de qualquer irracionalidade não
capitalista, quer ela fosse Deus, a religião ou tradição, a
metafísica ou a ética, ou ainda as utopias ou os ideais
emancipatórios.89
Se o Direito natural partia da idéia de fundação de uma nova ordem,
segundo a lei da natureza, através da razão e da observação, com o positivismo
o Direito separar-se-ia dos princípios éticos e tornar-se-ia “um instrumento
85 RENAUT, Alain. Filosofia política III. p. 62-63.
86 Cf. RENAUT, Alain. Filosofia política III. p. 62-63.
87 ROUANET, Sérgio. O mal-estar na modernidade. p. 129.
88 CAMPUZANO, Alfonso de J. Para que algo câmbio en la teoria jurídica. p. 172.
89 SANTOS, Boaventura de S. Crítica da razão indolente. p. 124.
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dócil na construção institucional e na regulação do mercado, a boa ordem
transforma-se na ordem ‘tout court’.”90
O direito natural moderno, como se constatou, ao romper com a
Antigüidade, nos proporcionou o fundamento filosófico da noção geral dos
direitos do homem, ou seja, a individualidade livre como fundamento e limite
da autoridade.
A partir daí, começa a fortalecer-se a idéia de que a sociedade civil teria
fundamentação própria, e o pensamento liberal promove a separação moderna
do social e do estatal. Efetua-se a passagem do direito natural, como elaboração
sobre a legitimidade, e a soberania para a teoria política, como reflexão sobre
as relações entre a sociedade e o Estado.
O advento do positivismo marca uma inflexão na evolução do Direito, e
o Estado, por sua vez, neste novo contexto, passaria a ajustar-se à nova
racionalidade e às necessidades regulatórias do capitalismo liberal.
CONCLUSÃO
Com a Modernidade, o Direito passa a ser atributo do indivíduo,
buscando-se consenso através do contrato social, cuja adesão voluntária será a
base da legitimidade na formação do Estado.
A subjetividade, como adesão voluntária (como ato de vontade),
estabelece os parâmetros que possibilitam a origem ideal de toda formação
política, fundamentando-se, assim, a vinculação entre os direitos subjetivos
originados no indivíduo e a possibilidade de legitimidade política a partir da
consagração e proteção daqueles.
Nesse sentido é que a subjetividade jurídica será o reconhecimento dos
direitos naturais, entendidos como poderes ou liberdades que expressam
condições para o pleno desenvolvimento de cada um e do conjunto da
sociedade.
Na segunda etapa da modernidade houve uma inflexão na evolução do
direito e da subjetividade jurídica. À medida que o positivismo funda uma nova
forma de racionalidade jurídica, a questão da legitimidade deixa de ser uma
preocupação do Direito (enquanto norma), e este passa a preocupar-se
cientificamente com a questão da legalidade intra-sistêmica.
90 SANTOS, Boaventura de S. Crítica da razão indolente. p. 124-141.
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Todo esse conjunto de idéias, que fazem parte da Modernidade, vem
sofrendo uma série de críticas e, no que se refere à subjetividade aponta-se que,
à medida que o conceito de subjetividade ou de sujeito que se impõe desde
Descartes tentou fazer do mundo o seu império, submetendo a realidade ao seu
domínio e fazendo dela um objeto de posse, tem-se como conseqüências: uma
vontade de poder totalitária e uma falsa concepção autônoma da subjetividade,
da consciência como sendo acessível diretamente por um sujeito estável que
através da razão pode estabelecer um conhecimento sobre si mesmo e o
mundo. Sugere-se, nesse sentido, que as formações sócio-culturais exercem um
papel fundante na formação da auto-consciência.
Assim, como pensar o sujeito hoje? A crise da concepção moderna da
verdade, dos valores e do sujeito, deve-se, de um lado, à ênfase na liberdade
como desenvolvimento pessoal e à crescente preocupação com a performance
e com êxito individual a qualquer custo e, por outro lado, a viver-se num
mundo sem referências universais, sem valores absolutos ou constantes, com a
conseqüente perda da unidade e de fundamentos. Ao dizer que “Deus está
morto” iniciou-se a morte da subjetividade humana como centro e princípio da
verdade e valores que eram próprios da civilização moderna e do Direito.
No entanto, somente o sujeito, que não se confunde com o indivíduo,
num contexto de intersubjetividade, em diálogo com o outro pode fundar
valores e um projeto ético-político capaz de construir uma sociedade mais justa.
REFERÊNCIAS
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1998.
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n
2
3
A
4
C
R
POLÍTICA INDIGENISTA DO AMAZONAS:
PERSPECTIVAS E TENDÊNCIAS NO
SÉCULO XXI
Marcos Antonio Braga de Freitas*
Sumário: 1. Breve Contextualização da Política Indigenista no Cenário Nacional; 2. A Política
Indigenista do Amazonas; 3. Princípios Norteadores da Política Indigenista no Estado do
Amazonas; 4. Política Indigenista e o Movimento Indígena; Considerações finais; Referências.
Resumo: Este ensaio se propõe a perceber o
processo de construção da política indigenista,
no estado do Amazonas, compreendendo o
final do século XX e início do XXI. Procura
entender como se dá essa política indigenista a
partir de ações pontuais, sejam elas
inicialmente no campo da educação e,
posteriormente para as áreas de capacitação de
lideranças indígenas e, até ser institucionalizada com a criação de órgãos governamentais na própria estrutura organizacional do
governo do Amazonas para tratar de assuntos
indígenas. Portanto, a análise inicial é
construir uma etnografia das ações do governo
em atenção aos povos indígenas no âmbito
estadual e, perceber até que ponto está sendo
implementado uma política indigenista,
visando a garantia dos diversos grupos
indígenas do Amazonas, bem como a
valorização étnico-cultural dessas populações.
Abstract: This essay aims to perceive the
process of construction of the Indigenist
policy, in the state of Amazonas, from the end
of the 20th century to the beginning of the 21st.
It seeks to understand how this Indigenist
policy happens from prompt actions, whether
they being initially in the field of education
and, or later on the areas of qualification of
indigenous leaderships and, up to when it is
institutionalized with the creation of
governmental bodies in the proper organizational structure of the government of
Amazonas to deal with indigenous subjects.
Therefore, the initial analysis aims to construct
a ethnography of the government’s actions in
attention to the indigenous peoples in state
sphere and to perceive how far an Indigenist
policy is being implemented, aiming at the
guarantee of the diverse indigenous groups of
Amazonas, as well as the ethnic-cultural
valuation of these populations.
Palavras-chave:
Política
Amazônia; Etnografia.
Key-Words: Indigenist Policy; Amazon;
Ethnography.
*
Indigenista;
Professor do Núcleo Insikiran de Formação Superior Indígena da Universidade Federal de Roraima (UFRR). Mestre em
Sociedade e Cultura na Amazônia pela Universidade Federal do Amazonas (UFAM). E-mail: [email protected].
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BREVE CONTEXTUALIZAÇÃO DA POLÍTICA INDIGENISTA NO
CENÁRIO NACIONAL
Pensar a política indigenista do Amazonas, requer necessariamente,
conhecer como foi construída a política em atenção aos índios no plano
nacional. O Estado Brasileiro ao longo do século XX formulou uma ação de
governo por meio do Serviço de Proteção ao Índio e Localização de
Trabalhadores Nacionais – SPILTN (1910), convencionado na historiografia de
SPI e, depois pela Fundação Nacional do Índio – FUNAI (1967) centrada na
ideologia integracionista e assimilacionista dos povos indígenas à comunhão
nacional, influenciada pelas teorias do Positivismo e do Evolucionismo do
século XIX.
Nesse sentido, o demarcador dessa nova relação do Estado junto aos
povos indígenas se deu através da Constituição Federal de 1988 que reconhece
a diversidade cultural dos distintos povos indígenas que vivem no Brasil,
podendo usar suas línguas e costumes, reconhecendo a tradicionalidade dos
territórios ocupados pelos seus antepassados, bem como de usufruto
permanente para a sua sobrevivência física e cultural, conforme determina o
artigo 231 da referida Carta Magna.
Sabe-se que houve certos avanços, mas ainda há muito a ser feito,
conforme afirmam (ARAÚJO; LEITÃO, 2002: 23):
A Constituição de 1988 trouxe uma série de inovações ao
tratamento da questão indígena, indicando novos parâmetros
para a relação do Estado e da sociedade brasileira com os índios.
Embora de lá para cá tenha havido avanços significativos na
proteção e no reconhecimento dos direitos dos povos indígenas no
país, há ainda uma série de pendências que reclamam
providências e cuja solução é motivo de intenso debate entre os
atores da chamada cena indigenista.
Destacar o texto constitucional em relação ao reconhecimento
sociocultural dos povos indígenas no cenário brasileiro, como uma conquista
de luta do movimento indígena; faz-se necessário é porque em razão de essas
populações, historicamente terem sido expropriadas, perseguidas, massacradas
pela ação colonialista na tentativa de impor uma ideologia de “abranqueamento” da sociedade nacional, resquícios de um “modelo de ocidentalização”
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difundido pelo processo colonizatório europeu para o resto do mundo, a partir
do século XV.
Ao longo dos 500 anos de contato que marcou a relação de índios com
não-índios, é preciso repensar a nova prática da política indigenista que o
Estado Brasileiro pensa em implantar e/ou implementar em atenção aos povos
indígenas e, nesse aspecto, é necessário notar que o Estatuto do Índio (Lei n.º
6.001/73) ainda está em vigor, haja vista que tramita no Congresso Nacional a
elaboração de um novo Estatuto das Sociedades Indígenas1 e até o prezado
momento não foi aprovado pela falta de prioridade na agenda social do
governo brasileiro.
Nesse sentido, o que vivenciamos é uma nova conjuntura na relação com
os indígenas que se mobilizaram e assumiram a discussão de sua autonomia em
que o próprio movimento indígena vem a público reivindicar o que é
necessário para seu povo ou não, por exemplo, a COIAB (Coordenação das
Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira) criada em 1989 com o lema
“unir para organizar, fortalecer para conquistar”, isso é o resultado concreto
desse movimento que surgiu no final dos anos 70 do século XX e se fortaleceu
nos anos 80.
Entretanto, não podemos esquecer que nesse processo de articulação e
expansão do movimento indígena o apoio que teve do CIMI (Conselho
Indigenista Missionário), criado em 1972, órgão ligado à CNBB (Conferência
Nacional dos Bispos do Brasil) para oferecer uma outra ação da Igreja Católica
diferente daquela descrita e conhecida pela historiografia (evangelização e
catequização) segundo a qual não é preciso maiores detalhes acerca dessa
questão. Além de ONGs, de setores específicos de universidades brasileiras, da
Associação Brasileira de Antropologia – ABA como agentes externos e aliados
à causa indígena.
2.
A POLÍTICA INDIGENISTA DO AMAZONAS
Em se tratando do contexto amazônico que concentra a maior
diversidade etno-cultural e populacional dos povos indígenas do Brasil, é
1
Desde 1991 tramita no Congresso Nacional a reformulação do Estatuto das Sociedades Indígenas, recebendo parecer em
1994. Sendo tirado da gaveta no ano 2000 por conta do 500 anos do Brasil, mas que até o momento sem votação, porque
não integra a agenda social do governo brasileiro. Vale destacar que Interesses econômicos e políticos dos parlamentares
brasileiros impedem os avanços na votação e sua regulamentação.
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preciso refletir como o estado do Amazonas vem tratando a temática indígena
no contexto de uma ação de governo, visando uma política de valorização e
respeito à diversidade cultural, como também propiciar o seu
etnodesenvolvimento.
Com relação ao conceito de etnodesenvolvimento, este emergiu no
debate latino-americano de forma mais consistente em 1981, na cidade de São
José da Costa Rica, conforme discussão que Ricardo Verdum vem fazendo a
respeito da questão do fomento de políticas públicas para os índios. (Cf.
SOUZA LIMA, Antonio Carlos de; BARROSO-HOFFMANN, Maria (Orgs).
Etnodesenvolvimento e políticas públicas, 2002, p. 87).
Nesse contexto de formulação de políticas públicas que visam o
etnodesenvolvimento das comunidades e organizações indígenas, a
intervenção do Governo Estadual é notório, pois no final dos anos 90 do século
XX e início do XXI surgiu a proposta de se implementar uma política voltada
aos povos indígenas do estado do Amazonas, que por meio do Decreto n.º
20.825 de 04/04/2000, foi criado um Departamento na estrutura organizacional
do Poder Executivo, ligado à Secretaria de Estado de Governo para tratar das
questões indígenas no âmbito governamental. Em 2001, o referido
departamento foi transformado em Fundação Estadual de Política Indigenista
– FEPI/AM, através da Lei n.º 2.650 de 04/06/2001 para dar andamento ao
projeto de implantação de uma política indigenista para os povos indígenas.
Durante o curto período que marcou o processo de intervenção do
governo do Amazonas junto aos povos indígenas, algumas atividades foram
executadas, tanto em Manaus quanto no interior (priorizando o Alto Solimões,
Baixo Amazonas e Alto Madeira), sendo preciso necessária análise e
conhecimento do processo de construção dessa política estadual.
Diante dessa realidade, algumas ações pontuais nas áreas de educação,
cultura e produção foram realizadas, na tentativa de traçar um panorama e dar
“visibilidade” a essa política indigenista, em construção no âmbito do poder
executivo estadual. Podemos destacar as seguintes:
• I Seminário de Educação Escolar Indígena – “Cultura, Terra e Escola:
educação escolar indígena diferenciada”, no período de 11 a
14/5/1998. Foi neste seminário que foi criado o Conselho Estadual de
Educação Escolar Indígena do Amazonas – CEEI/AM;
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• II Seminário de Educação Escolar Indígena no Estado do Amazonas
– “Educação Escolar Indígena: um direito, uma conquista”, 18 e
19/09/2000;
• I Semana dos Povos Indígenas – Encontro de Culturas, 15 a
22/04/2001 (este evento nasceu da iniciativa das organizações e
instituições governamentais de apoio ao índio, com o objetivo de
promover a unidade nas ações, respeitando a autonomia de cada
instituição e a cultura dos diferentes povos indígenas que habitam o
Amazonas);
• I Feira Cultural Indígena – Sustentabilidade às Comunidades
Indígenas (artesanato, gastronomia, literatura, música, dança,
shows), 13 a 15/12/2001;
• Semana dos Povos Indígenas – Direitos e Cidadania, 15 a
19/04/2002;
• 1.ª Conferência de Pajés – Biodiversidade e Direito de Propriedade
Intelectual: proteção e garantia do conhecimento tradicional, 22 a
25/08/2002 (é importante destacar que neste evento foi elaborado a
Carta de Manaus – a idéia é reunir pajés e especialistas num espaço
onde possam ser discutidas e formuladas políticas públicas de
valorização do conhecimento tradicional desses povos [indígenas]
como valor estratégico ao desenvolvimento sustentável do país);
• Semanas dos Povos Indígenas – Lutando e Conquistando Espaços, 14
a 19/04/2003;
• Semana dos Povos Indígenas do Amazonas 2004 – Povos Indígenas
no Brasil de Todos, 02 a 19/4/2004.
Essas ações pontuais, de uma certa forma, vêm corroborar para a
formulação da política indigenista estadual, porque estes eventos envolvem
órgãos governamentais e organizações indígenas, com suas experiências e
olhares analíticos sobre a problemática da questão indígena. E assim, estão
direta e indiretamente contribuindo para o aperfeiçoamento de uma proposta de
política indigenista que está sendo gestada por meio dessas atividades;
refletindo um momento ímpar para a história, ou seja, uma forma diferente de
intervenção do Estado na relação com os indígenas, sem preconizar a priori um
“neocolonialismo”.
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3.
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PRINCÍPIOS NORTEADORES DA POLÍTICA INDIGENISTA NO
ESTADO DO AMAZONAS
Com o intuito de implantar e solidificar uma política indigenista em
atenção aos povos indígenas do Amazonas, foi que o governo estadual
elaborou uma proposta inicial tornando-a uma Declaração de Princípios, sendo
ratificada na reunião do Conselho Estadual de Educação Escolar Indígena do
Amazonas, realizada no município de Barcelos, região do Médio Rio Negro,
como parte integrante de reuniões itinerantes para envolver os atores sociais
diretamente interessados na construção dessa política oficial. Todo este
processo mostra a construção de um novo modelo de indigenismo para o
Amazonas. Vejamos na íntegra essa proposta que contém os princípios
norteadores para a base de formulação da política indigenista estadual:
Declaração de Princípios entre Governo do Amazonas e Povos Indígenas
Novos Parâmetros para a Política Indigenista
A Fundação Estadual de Política Indigenista do Amazonas (FEPI-AM)2
e os Povos Indígenas que vivem no Amazonas celebraram, em Manaus,
no dia 17 de setembro de 2001, esta Declaração de Princípios, sendo a
mesma aprovada pelo Conselho Estadual de Educação Escolar Indígena
(CEEI-AM), em reunião ordinária do dia 21 de setembro de 2001, com
o objetivo de instituir Novos Parâmetros para a Política Indigenista do
Amazonas, nos seguintes termos:
1.
2.
2
154
Ampliar espaços, promover discussões e articular as instituições
governamentais com as comunidades indígenas para garantir os
direitos constitucionais desses povos, no contexto das políticas
públicas;
Analisar as políticas públicas promovidas pelo Governo e as
propostas das Organizações Indígenas, quanto à eficácia de suas
ações, à qualidade dos serviços prestados e ao uso adequado dos
recursos naturais, em benefício das comunidades indígenas;
Hoje a FEPI está ligada à Secretaria de Estado do Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (SDS). Em 2004 passa-se
a chamar Fundação Estadual dos Povos Indígenas – FEPI, elaborando o Programa Amazonas Indígena para dar
“sustentabilidade” aos povos indígenas do estado por meio de ações como saúde, segurança alimentar, proteção territorial
e ambiental, cursos e projetos econômicos e produtivos.
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3.
4.
5.
6.
7.
8.
9.
10.
11.
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Promover intercâmbio entre as comunidades indígenas e os
formuladores de políticas públicas, no que diz respeito à
valorização das formas de saber e à apropriação de novas
tecnologias, promotoras do etnodesenvolvimento;
Promover a participação efetiva das mulheres indígenas nas
decisões das políticas públicas, fortalecendo suas organizações
sociais;
Implementar programas interinstitucionais do Governo do Estado,
com o objetivo de combater a violência, o preconceito, a
discriminação étnica e a exclusão social das comunidades
indígenas;
Criar um Fórum permanente entre o Governo, Organizações
Indígenas e Organizações Não Governamentais (ONGs), para
discussão de propostas e de estratégias que promovam o
etnodesenvolvimento;
Desenvolver programas em parceria com as Comunidades
Indígenas e Organizações Não Governamentais, garantindo o
acesso da criança indígena às ações de política pública;
Assessorar as Comunidades Indígenas quanto aos seus direitos de
propriedade intelectual, acompanhando e promovendo pesquisas
científicas;
Fortalecer as Organizações Indígenas, avaliando e ampliando as
políticas públicas quanto à continuidade de suas ações;
Promover o etnodesenvolvimento, tendo como base a Educação
Escolar Indígena Diferenciada, implementando ações que
garantam a demarcação de suas terras, a autonomia dos povos
indígenas e a valorização da participação comunitária, assegurando a reprodução física e cultural dos povos indígenas.
Respeitar as culturas indígenas, reconhecendo suas crenças, seus
costumes e suas tradições garantidos na Constituição Federal.
Estes princípios vêm oferecer o parâmetro inicial para discutir a real
política que se pretende criar para os povos indígenas no âmbito do poder
executivo do Amazonas. Para uma análise, estes precisam ser revistos e
discutidos criticamente com as comunidades e organizações indígenas para
concretizar ao final uma versão que esteja contemplando no bojo desses
princípios norteadores; as necessidades de auto-sustentabilidade e autonomia
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que o próprio movimento indígena defende e preconiza em sua bandeira de luta
e defesa de suas terras e direitos sociais e culturais.
4.
POLÍTICA INDIGENISTA E O MOVIMENTO INDÍGENA
Dando continuidade a essa política indigenista, é que o atual governo
estadual nomeou para diretor-presidente da FEPI, uma liderança indígena3 para
assumir a gestão do referido órgão. Portanto, um aspecto inovador nessas
“relações alternativas” de um modelo diferente de pensar a política indigenista
que está sendo pensada no cenário nacional, sem a pretensão de um
colonialismo resultado de uma visão etnocêntrica de tratar o outro – o diferente
como um ser culturalmente inferior.
É visível que, a cada ano, se passa à construção de um novo modelo de
política indigenista por parte dos governantes ao formular uma ação de
governo a partir do envolvimento dos indígenas na participação das decisões
governamentais para legitimar tal política. E isso só é possível quando
consegue materializar, não só através de eventos específicos, mas acima de
tudo com a participação efetiva dos próprios indígenas nas instâncias
deliberativas do governo.
Neste caso específico, de uma liderança indígena à frente do órgão
estadual, criado com a finalidade de instaurar uma ação de governo voltada aos
povos indígenas, nada mais coerente e legítimo que colocar nos quadros do
poder administrativo do Estado esses atores como pessoas interessadas na
melhoria de suas comunidades e terras indígenas. Vejamos como o indígena
Bonifácio Baniwa destaca esse reconhecimento:
Houve um avanço na nossa luta. A criação da Fepi e do Conselho
de Educação da Escola Indígena foram conquistas do movimento
indígena, que vinha lutando ao longo desses anos, e o Governo
passado reconheceu isso. No entanto, não sendo dirigido pelos
próprios índios diretamente envolvidos no movimento indígena.
3
156
Fato curioso, que essa liderança, vem da região que apresenta a maior diversidade de povos indígenas do Amazonas, a bacia
do rio Negro, que abrange os municípios de São Gabriel da Cachoeira, Barcelos e Santa Isabel do Rio Negro e Novo Airão,
historicamente tendo um movimento indígena atuante, como exemplo a criação da FOIRN – Federação das Organizações
Indígenas do Rio Negro, em 1987, bem antes da própria COIAB, que é de 1989. Terá sido essa atitude uma estratégia política
do governo estadual ou uma forma de reconhecimento desse movimento e o papel do mesmo para implementar uma política
indigenista no estado?
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Já o atual Governo reconhece isso através da nossa presença,
fazendo parte do Governo dele, (Jornal A Crítica, p. 3, 19/4/2003).
Nesse processo de inserção de indígenas na administração pública do
governo estadual acabam sendo contratados pelo estado, estes assumem o
papel de interlocutores no âmbito do governo ao discutir e formular políticas
indigenistas. Quanto a este aspecto, Antônio Brand (2002: 35) conclui
Nessa ‘nova postura do Estado’, adquire relevância o crescente
número de representantes indígenas contratados como funcionários nos diversos níveis da burocracia, fazendo co quem o próprio
índio passe a ser o interlocutor do Estado nas questões referente
à política indigenista.
Isso vale em nível estadual, no caso aqui em análise em que o Governo
do Amazonas coloca à frente do órgão indigenista uma liderança indígena para
fazer a gestão da política oficial, mostrando talvez que esteja construindo um
novo diálogo com os povos indígenas. Ao envolver lideranças indígenas na
esfera administrativa pretende-se mostrar a sociedade em geral que tem
respeitado e acatado aos interesses dos índios.
Além da participação direta dos indígenas no poder público, é preciso
destacar as experiências de autonomia que o próprio movimento indígena vem
vivenciando nos últimos anos, tendo em vista a sustentabilidade econômica e
social. Neste caso, pode-se destacar: a Associação das Mulheres Indígenas do
Alto Rio Negro (AMARN), quer dizer (NUMIA KURÁ, na língua Tukano
“grupo de mulheres”), a Associação de Produção e Cultura – Yakinõ (na língua
Hixkaryana significa “trabalho coletivo”), como também os eventos de grande
porte como o I Encontro dos Indígenas da Cidade de Manaus, 01 a
03/03/2002, saindo um manifesto para buscar soluções aos problemas que
afetam os índios”, que vivem no contexto urbano. Também foi realizado o I
Encontro das Mulheres Indígenas da Amazônia, entre os dias 26 a 29/06/2002,
em Manaus, para discutir o papel da mulher indígena no movimento da região
amazônica e em nível nacional.
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Além da política indígena, é importante lembrar a experiência do PDPI
/ MMA,4 sendo um projeto que apóia atividades nas comunidades indígenas da
Amazônia Legal, financiado pelo Governo Federal/GTZ-República Federativa
da Alemanha, por meio de ações que contemplem:
• Fortalecimento do modo de vida de cada povo indígena, sua cultura,
sua organização social e política e os conhecimentos que têm da
natureza;
• Desenvolvimento de atividades econômicas sustentáveis, melhorando, assim, as condições de vida dos povos indígenas da Amazônia
Legal e garantindo o uso exclusivo dos recursos naturais em suas
terras;
• Proteção dos territórios indígenas da Amazônia Legal.
A ação de fortalecimento da identidade cultural é exemplificada com a
edição do CD de músicas indígenas (União dos Povos, envolvendo Tikuna,
Tukano e Sateré), lançado em Manaus, no ano de 2003, resultado da
cooperação entre COIAB e PDPI/MMA.
Esse momento, mostra-se como algo “positivo”, a relação do Estado
com os Povos Indígenas merece uma discussão, pois as diretrizes do
movimento indígena são assumidas por meio de políticas públicas está
presente no discurso das lideranças indígenas, pode-se destacar o pensamento
do ex-dirigente da COIAB, a liderança indígena Euclides Pereira,5 do povo
Macuxi, de Roraima ao afirmar:
Vejo com otimismo a situação indígena [no Brasil]. Durante
muito tempo, chegamos a pensar que a nossa cultura não tinha
nenhum valor. Hoje não é mais assim. Como todo grupo étnico,
temos os nossos problemas, e a nossa evolução. Durante esse
tempo, também fomos evoluindo, como qualquer outro povo, mas
do nosso jeito. Valorizando a nossa cultura, mostramos que
também temos as nossas descobertas e que podemos muito
contribuir para a sociedade brasileira. Temos nossa medicina
158
4
Cf. Projeto Demonstrativos dos Povos Indígenas – PDPI. Informações Básicas e Formulário para a Apresentação de Projetos.
Brasília: MMA, s/d.
5
É aluno regularmente matriculado no Curso de Licenciatura Intercultural, do Núcleo Insikiran de Formação Superior Indígena
da UFRR.
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tradicional, nossa arte, nossa música. Fazemos parte do povo
brasileiro. (Revista Amazônia Vinte Um. 2000:9).
Nesse contexto, as organizações indígenas têm papéis imprescindíveis
na construção dessa política indigenista e os eventos também refletem o
amadurecimento político de sua autonomia e alteridade cultural nas questões
que são pertinentes ao seu povo. Portanto, os governos precisam ouvir as
lideranças e comunidades na criação de uma ação governamental, cabendo aos
gestores públicos conhecer a política do movimento indígena para formular sua
proposta de intervenção – assim consolidando a efetiva participação de
indígenas nas ações de políticas públicas.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Diante desse contexto, através dessas ações pontuais que foram
realizadas para os povos indígenas é possível perceber que o estado do
Amazonas está formulando uma nova relação com essas populações, quando
dá um passo diferente no sentido de propor um diálogo intercultural.
Além deste provável diálogo, é preciso que o governo elabore uma
política que realmente atenda as reais necessidades das populações indígenas,
visto que os próprios atores sociais são sujeitos partícipes do novo processo
instaurado como desafiador tanto para os povos indígenas como para o próprio
governo estadual.
Nesse sentido, essas ações mostram algumas das perspectivas que o
movimento indígena formula como sua política e, ao mesmo tempo vislumbra
prováveis tendências que estão sendo criadas e/ou pensadas em atenção aos
índios do Amazonas, no âmbito do poder executivo.
É preciso ressaltar que a própria história vai mostrar se os resultados
serão satisfatórios ou não, com o objetivo de ir ao encontro do
etnodesenvolvimento reivindicado pelos povos indígenas ou apenas o governo
estadual se utiliza dessas ações para construir um diálogo de aliança política
com os índios para afirmar que tem uma política indigenista definida e
concreta, assumindo uma perspectiva de valorização e garantia dos direitos
indígenas.
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16:31
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PARTE II
CONSIDERAÇÕES JURÍDICAS SOBRE O MANEJO COMUNITÁRIO DE ESTOQUES
PESQUEIROS: O EXEMPLO DA AMAZÔNIA BRASILEIRA
Serguei Aily Franco de Camargo
A n a C a r o l i n a S u r g i k . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .1 6 5
Introdução . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .166
1. Manejo comunitário de estoques pesqueiros na Amazônia brasileira . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .168
Considerações finais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .173
Agradecimentos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .174
REFLEXÃO DO DIREITO DAS “COMUNIDADES TRADICIONAIS”
A PARTIR DAS DECLARAÇÕES E CONVENÇÕES INTERNACIONAIS
J o a q u i m S h i r a i s h i N e t o . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .1 7 7
Introdução: delineamento de um campo jurídico . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .178
1. As Declarações e Convenções no Ordenamento Jurídico . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .183
2. O Lugar Jurídico das Declarações e Convenções . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .184
3. A Convenção n.º 169 da OIT: a consciência de si . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .188
Considerações finais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .192
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CONSIDERAÇÕES JURÍDICAS SOBRE O
MANEJO COMUNITÁRIO DE ESTOQUES
PESQUEIROS: O EXEMPLO DA
AMAZÔNIA BRASILEIRA
Serguei Aily Franco de Camargo*
Ana Carolina Surgik**
Sumário: Introdução; 1. Manejo comunitário de estoques pesqueiros na Amazônia brasileira;
Considerações finais; Agradecimentos
Resumo: No final dos anos 80 teve início uma
preocupação internacional com o manejo
sustentável dos estoques pesqueiros marinhos.
Este movimento ganhou força e orientou a
criação do Código de Conduta para a Pesca
Responsável da FAO em 1995. Este Código
adota aspectos precaucionários. É um
documento global e não-mandatário, que
estabelece princípios e padrões aplicáveis à
conservação, manejo e desenvolvimento da
pesca. No Brasil, o Instituto Brasileiro do
Meio Ambiente e dos Recursos Naturais
Renováveis passou a desenvolver projetos de
cooperação técnica internacional ainda na
década de 90. Estes projetos visam à
organização comunitária e a multiplicação de
iniciativas pré-existentes de manejo comunitário e sustentável de estoques pesqueiros na
região amazônica. A partir destas experiências, foram identificados o contexto jurídico
que envolve o manejo comunitário de estoques pesqueiros e as formas de relação entre
usuários e poder público. Os resultados desta
análise revelaram as principais dificuldades e
facilidades deste novo paradigma de sistema
de manejo de recursos naturais renováveis.
Abstract: During the end of the 80’s it was
observed the beginning of an international
concerning about the management of marine
fish stocks. This movement became politically
strong, influencing the creation of the Code of
Conduct for Responsible Fisheries, by FAO in
1995. This Code adopts precautionary aspects.
It is a global and non-mandatory document,
which establishes the principles and standards
related to conservation, management and
development of fisheries. Since the 90’s in
Brazil, the Brazilian Federal Environmental
Agency (IBAMA) has been developing
international cooperation projects. These
projects aimed at the communitarian
organization and the multiplication of preexistent initiatives of community-based
management of fish stocks in the Amazon
Region. From these experiences, it were
identified the legal context that involves the
community-based management of fish stocks
and the ways of interaction between resource
users and Brazilian State. The results of this
analysis revealed the main facilities and
obstacles of this new juridical frame of natural
resources management.
Palavra-chave: Região Amazônica; Manejo
Comunitário de Estoques Pesqueiros; Direito
Ambiental.
Key-words: Brazilian Amazon; CommunityBased Management of Fish Stocks; Environmental Law.
*
Programa de Pós-Graduação em Direito Ambiental da Universidade do Estado do Amazonas (UEA).
** Programa de Pós-Graduação em Ecologia do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia – INPA – Departamento de
Ecologia.
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INTRODUÇÃO
A atividade pesqueira é praticada há aproximadamente 100.000 anos.
Concomitantemente ao aparecimento do Homo sapiens na Europa (50.000
anos atrás), alguns estudos indicam a existência de aparelhos simples
destinados à pesca. Nesta época, os Aurignac foram os primeiros europeus a
fazer uso regular de recursos pesqueiros em rios (Sahrage & Lundbeck, 1992).
Atualmente, os peixes são os últimos animais explotados em grande
escala. As pescarias mundiais aumentaram depois da Segunda Guerra Mundial.
Durante a década de 60, se intensificaram ainda mais devido ao aumento do
esforço pesqueiro no Atlântico Norte e Pacífico Norte, aliado à abertura de
pescarias no Hemisfério Sul (Watson & Pauly, 2001). Em 2001, o desembarque
mundial de pescado foi 91.300.000t, das quais 8.800.000t provieram da água
doce (FAO, 2002).
Em nível internacional, a partir dos anos 70, o panorama das pescarias
também sofreu influência do sistema de Zonas Econômicas Exclusivas (ZEEs)
e da Convenção das Nações Unidas sobre Direito do Mar, que forneceram
novos modelos de manejo de recursos marinhos. É importante mencionar que
as ZEEs concentram cerca de 90% dos recursos pesqueiros sob influência
direta do Direito de cada Estado costeiro (FAO, 1995).
As pescarias recentes assumiram um caráter orientado pelo mercado,
que direcionou a indústria e os investimentos no setor. No final dos anos 80
ficou claro que os estoques pesqueiros não poderiam sustentar uma explotação
descontrolada e crescente, ensejando o desenvolvimento de novas formas de
manejo. A situação foi agravada pelo descontrole das pescarias em alto mar,
principalmente sobre estoques de peixes altamente migratórios (FAO, 1995).
Nesse contexto, o Comitê de Pesca (COFI) tratou do desenvolvimento
de novos conceitos sobre manejo pesqueiro, conduzindo à idéia de pesca
responsável e sustentável (FAO, 1995). A Declaração de Cancun –
México/1992 foi uma importante contribuição para a Conferência das Nações
Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (UNCED) de 1992, em
particular para a Agenda 21. Na seqüência, a Conferência das Nações Unidas
sobre Estoques Pesqueiros Migratórios e Altamente Migratórios contou com
importante apoio técnico da FAO, antecedendo o acordo internacional firmado
pela mesma agência sobre medidas de manejo pesqueiro em alto mar. Em
conseqüência da Conferência de Cancun, a FAO foi incumbida de formular um
“Código de Conduta para a Pesca Responsável” (CCPR), documento de caráter
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global e não-mandatário, que estabelece princípios e padrões aplicáveis à
conservação, manejo e desenvolvimento da pesca. O CCPR foi adotado em 31
de outubro de 1995 pela Conferência da FAO e fornece modelos de manejo
nacionais e internacionais com o escopo de direcionar a explotação sustentável
dos recursos aquáticos em harmonia com o meio ambiente. Desde então, a
FAO se comprometeu a auxiliar os Estados Membros, principalmente os países
em desenvolvimento, para a eficiente implementação do mencionado CCPR,
reportando periodicamente às Nações Unidas os progressos alcançados.
A produção brasileira de pescado em 1999 foi de 655.000t, das quais
175.000t provenientes de água doce. Porém, as informações são imprecisas. Os
dados de captura e esforço pesqueiro em geral são descontínuos e sem
padronização (Petrere, 2001).
Os desembarques pesqueiros da Amazônia foram estimados por diversos
autores (Bayley & Petrere, 1989; Isaac & Barthem, 1995), utilizando
metodologias diferentes, porém com resultados próximos a 200.000t/ano para
toda a bacia amazônica. De acordo com Ruffino & Isaac (1994), ao se
considerar o valor de primeira venda em US$1,00/kg de pescado, o movimento
financeiro bruto proveniente das pescarias amazônicas seria da ordem de US$
200.000.000,00/ano.
O pescado representa importante fonte de proteína para o homem da
região. O consumo per capita, nas cidades de Manaus e Itacoatiara foi estimado
entre 360 e 500g/dia (Cerdeira et al., 1997).
Esses dados revelam a importância do setor pesqueiro para a sociedade
e para o governo. Desde o início dos anos 90, o governo brasileiro, através do
Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis
(IBAMA), tem desenvolvido projetos de cooperação técnica internacional,
visando à implementação e a multiplicação de iniciativas de manejo
comunitário de estoques pesqueiros. São exemplos o IARA (Administração
dos Recursos Pesqueiros do Médio Amazonas: Estados do Pará e Amazonas –
financiado pelo IBAMA e GTZ), o PAPEC (Projeto de Aproveitamento dos
Açudes Públicos do Estado do Ceará – financiado pelo IBAMA e GTZ) e o
ProVárzea (Projeto Manejo dos Recursos Naturais de Várzea – financiado pelo
IBAMA, DfID, GTZ, KfW e WB-PPG7). Em todos estes casos, o IBAMA
coordenou as atividades desenvolvidas pelos usuários/comunitários com o
objetivo de manejar os estoques pesqueiros com responsabilidades
compartilhadas e descentralizar as rotinas administrativas. O IBAMA
desenvolveu mecanismos administrativos internos, permitindo a recepção dos
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acordos comunitários locais que continuam fundamentando a edição de
portarias sobre manejo de estoques pesqueiros (Fischer & Mitlewski, 2005).
Assim, o objetivo deste trabalho é analisar o contexto jurídico das práticas de
manejo comunitário de estoques pesqueiros e suas interfaces com o poder
público. O texto se apresenta de forma seqüencial, tratando em princípio das
questões jurídicas internacionais e federais, para no final abordar aspectos
administrativos e de ecologia humana.
1.
MANEJO COMUNITÁRIO DE ESTOQUES PESQUEIROS NA
AMAZÔNIA BRASILEIRA
Diferentes níveis administrativos interagem no modelo brasileiro de
manejo participativo de estoques pesqueiros. O IBAMA (órgão federal) é
representado através de suas superintendências estaduais. No caso do
Amazonas, o órgão ambiental estadual é o Instituto de Proteção Ambiental do
Amazonas – IPAAM. Os usuários são representados por organizações nãogovernamentais, como colônias de pescadores profissionais, associações e
cooperativas.
A articulação entre Estado e ONGs parte de mecanismos coletivos de
tomada de decisões, visando o manejo direto pelos usuários. Estes fóruns
regionais para formação de consenso produzem acordos comunitários de pesca,
comumente observados em reservatórios do nordeste brasileiro (Christensen et
al., 1995; Barbosa & Hartmann, 1997) e em lagos amazônicos (e.g. Portaria
IBAMA 1 de 2002; McGrath et al., 1993).
Qual o contexto legal que permite o manejo comunitário de estoques
pesqueiros e suas interfaces com o poder público brasileiro?
As principais disposições aplicáveis à matéria encontram-se na
Constituição Federal de 1988 (art. 225) referindo-se ao meio ambiente
ecologicamente equilibrado como direito fundamental para as presentes e
futuras gerações (Derani, 2002), no Código de Pesca (Decreto 221/1967),
recepcionado pela atual Constituição e, no Código Civil (Lei 10.406/2002, art.
1.228, § 1.º). São importantes também: a Lei de Política Nacional de Recursos
Hídricos (Lei 9.433/1997); o Decreto 5.382/2005, que aprova o VI Plano
Setorial para os Recursos do Mar (VI PSRM), onde são expressamente
reconhecidos os preceitos do CCPR de 1995; o Decreto 4.756/2003, que
aprova a Estrutura Regimental do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos
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Recursos Naturais Renováveis – IBAMA e; o Decreto 4.281/2002, regulamentador da Lei n.º 9.795/1999, que institui a Política Nacional de Educação
Ambiental.
O Decreto 5.382/2005 representou um importante passo para a gestão de
recursos pesqueiros no Brasil. Quando se condiciona ao CCPR/1995, orienta
juridicamente o papel do Estado e dos usuários em um sistema de gestão
integrada que se pauta principalmente pela aplicação do Princípio da
Precaução.
O Princípio 6.4 do CCPR menciona que as medidas de conservação e as
decisões sobre o manejo pesqueiro devem ser embasadas nas melhores
evidências científicas disponíveis, também se levando em consideração os
conhecimentos tradicionais das comunidades sobre a utilização dos recursos
em seu habitat, além de fatores ambientais, econômicos e sociais relevantes. Os
Princípios 6.5 e 7.5.1 dispõem que o manejo pesqueiro em seus diversos níveis
deve seguir orientações precaucionárias, visando à conservação dos estoques.
Também é mencionado que a ausência de informações científicas não deve ser
usada para adiar ou inviabilizar medidas para conservação de espécies-alvo
e/ou do sistema ecológico como um todo.
Em conjunto, o contexto legal que permite o manejo comunitário e a
gestão participativa de estoques pesqueiros no Brasil deve ser interpretado, em
sua essência, como precaucionário. A Constituição, ao dispor que a
conservação do meio ambiente é dever de todos, abre a possibilidade/dever de
participação das comunidades tradicionais usuárias de recursos pesqueiros no
sistema de gestão em seus diversos níveis. Esta participação, entretanto, deve
ser feita de forma organizada e representativa, nos moldes de atuação do
terceiro setor. Nesse sentido, o Decreto 221/1967 que regulamenta a pesca,
favorece a organização comunitária em colônias de pescadores e/ou
cooperativas.
A Lei de Política Nacional de Recursos Hídricos (Lei 9.433/1997)
menciona que a ictiofauna (como parte integrante dos recursos hídricos) deve
ser manejada sob uma perspectiva de bacia hidrográfica (em pequena ou
grande escala). Neste caso, as prioridades de manejo sustentável são definidas
pelos Comitês de Bacia, considerando a disponibilidade desses recursos
naturais e as necessidades e características sociais. As opiniões da
comunidade/usuários devem ser consideradas nas decisões administrativas dos
Comitês de Bacia. Considerando o manejo de recursos naturais no Brasil,
decisões privadas não podem prevalecer sobre o interesse público. O manejo
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deve contemplar os direitos constitucionais das gerações atuais e futuras, como
mencionado no art. 225 caput da CF/88, como forma de evitar a Tragédia dos
Comuns e contribuir para o desenvolvimento sustentável.
Conflitos pelo uso/apropriação dos recursos existem. De acordo com
Camargo (1999) e Machado (2005), os estoques pesqueiros são bens de
domínio público e uso comum. Assim, uma vez retirado de seu ambiente, o
animal passa a pertencer àquele que o pescou. Isto confere um caráter de
subtrabilidade ao recurso, ou seja, o animal capturado por um usuário não é
mais passível de apropriação por outro. Esta característica pode acirrar
conflitos em situações de escassez, dificultando práticas de manejo eficientes.
Por este motivo, os usuários capacitados devem participar dos sistemas de
gestão em parceria com o Estado, representado neste caso pelo IBAMA
(Decreto 4.281/2002 c/c Decreto 4.756/2003).
O pescador, proprietário de um animal capturado, tem direitos de usar,
gozar e dispor do bem conforme dispõe o Código Civil. Interessante observar
que apesar da visão holística atual da legislação ambiental, a compreensão dos
direitos de propriedade continua sofrendo forte influência privatista. Isto se
observa na jurisprudência, que reforça o caráter privatista da propriedade em
detrimento de sua função sócio-ambiental, preconizada constitucionalmente
(Castilho, 2003). Nesse sentido o art. 1.228 do Código Civil vem de encontro
ao entendimento tradicional do direito de propriedade, enquanto seu § 1º impõe
limites econômicos, sociais e ambientais ao seu exercício (nesta ordem). Em
uma análise sistêmica, poder-se-ia argumentar que as práticas de manejo
pesqueiro deveriam visar precipuamente o bem estar humano, priorizando os
aspectos econômicos, em seguida os sociais e por último os ambientais. Esta
ordem de prioridades não deve existir no contexto sócio-ambiental e holístico
do Direito Ambiental atual. A utilização dos conhecimentos tradicionais
associados aos recursos pesqueiros (mencionado no CCPR) como fonte de
Direito Administrativo serve para reequilibrar as correntes de interpretação
privatista e sócio-ambiental, na elaboração e implementação de planos e ações
de manejo pesqueiro.
Apesar de não se constituírem em normas legais, alguns Projetos de Lei
(PL) sobre pesca tramitaram no Congresso Nacional, fomentando amplas
discussões sobre o assunto. Assim, a explotação e apropriação dos estoques
pesqueiros foram, por muito tempo, objetos do PL-1273/1995 no Congresso
Nacional. Este documento previa possibilidades e tipos de manejo, entretanto,
em maio de 2005 a Mesa Diretora da Câmara dos Deputados determinou o seu
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arquivamento. Atualmente, encontra-se em discussão outro PL, encaminhado à
Presidência da República, em conjunto pelo Ministério de Estado da Defesa e
pela Secretaria Especial de Aqüicultura e Pesca da Presidência da República
através do E.M. INTERMINISTERIAL N.º 00425/MD/SEAP-PR, de 17 de
agosto de 2004.
É importante mencionar que mesmo os estoques pesqueiros sendo bens de
domínio público e uso comum, estes podem ser afetados na prática por restrições
administrativas de uso (e.g. limitação de equipamentos de pesca, defeso em
épocas de reprodução), restrições administrativas locacionais (e.g. lagos de
manutenção/subsistência) e/ou restrições administrativas temporais (e.g.
proibição temporária da pesca de uma determinada espécie para recuperação do
estoque). Em outros casos, o IBAMA pode limitar o número de barcos
pesqueiros em uma determinada área (e. g. na pesca da lagosta) durante a fase de
licenciamento administrativo da explotação desses recursos naturais. Todas estas
hipóteses devem necessariamente ter como fundamento o interesse público.
A Resolução CONAMA 003/88 regulamenta a criação de mutirões
ambientais. Desde então, o IBAMA vem capacitando comunitários como
agentes ambientais voluntários, inclusive dentro dos mencionados projetos de
cooperação técnica internacional. Os projetos IARA e ProVárzea contribuíram
com a capacitação de muitos comunitários para atuarem como agentes
ambientais voluntários, conforme se observa no próprio texto original dos
mencionados projetos (IBAMA, 1995; IBAMA, 2002), consolidando uma
nova cultura institucional do IBAMA, pautada na participação dos usuários na
gestão dos recursos. A maior contribuição destes projetos, principalmente do
Componente Monitoramento e Controle do ProVárzea, foi a edição da
Instrução Normativa IBAMA 29/2002. Esta Instrução institui procedimentos
para a implementação de acordos comunitários de pesca (que podem ter regras
de controle de acesso) e sua transformação em portarias.
O emprego de pescadores profissionais, enquanto membros/associados a
colônias de pescadores, associações e cooperativas, pode motivar a
participação da sociedade civil organizada nos processos governamentais de
tomada de decisões. Serve também como instrumento de educação ambiental,
auxiliando na formação da consciência de cidadania. Fischer & Mitlewski
(2005) anteciparam, no final da década de 90, estas práticas como instrumentos
necessários ao manejo pesqueiro eficiente no Brasil.
O art. 33 do Decreto 221/67 define que a pesca pode ser praticada em
todo o território nacional. O texto legal estabelece o máximo da abrangência da
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prática da atividade, mas não a limita a determinada área (e.g. bacia, sub-bacia,
lago). A limitação de acesso aos estoques pesqueiros pode ser feita através de
restrições no licenciamento. Esta prática precaucionária visa à proteção da
fauna aquática e a manutenção das populações tradicionais que dela depende.
Estas restrições podem ser estabelecidas em relação à área de exercício da
atividade pesqueira, ou ao número máximo de licenças permitidas por
pescador. Este entendimento está perfeitamente de acordo com o contexto legal
examinado, principalmente em nível constitucional, respaldando-se também na
aplicação prática do Princípio da Precaução.
Os procedimentos exigidos na Instrução Normativa IBAMA 29/2002
não são realizáveis em curto prazo. Resultados positivos puderam ser
observados em Santarém (PA) durante a execução do Projeto IARA (IBAMA,
1999; Castro, 2000; Begossi, 2002), e na Portaria IBAMA 01/2002, sobre
pesca de lagosta no Estado do Ceará, que foi decidida durante uma negociação
que envolveu diversos grupos de interesse.
Por outro lado, um problema freqüente relacionado aos acordos
comunitários é a falta de enforçabilidade das regras estabelecidas. Em muitas
comunidades pesqueiras do Brasil, a territorialidade é um requisito para o
manejo local, e está ligada à aceitação pública das regras estabelecidas pelos
grupos de interesse durante os procedimentos participativos descritos na
Instrução Normativa/IBAMA 29/2002. Áreas comuns são usualmente
determinadas por laços de amizade e parentesco (Begossi, 1996). As regras de
manejo pesqueiro são constituídas por uma combinação da cultura local e da
estrutura social. As regras da comunidade regulam como a pesca deve ser
praticada, determinam os locais permitidos, as épocas do ano, os tamanhos
mínimos das espécies-alvo e a tecnologia (equipamentos de pesca) a ser
empregada (Acheson & Wilson 1996). Neste contexto, o principal propósito do
manejo comunitário de estoques pesqueiros é suportar uma atividade pesqueira
sustentável, contribuindo para a melhoria da qualidade de vida das famílias dos
pescadores, assim como de suas comunidades.
Em última análise, é esperado que estas práticas de manejo contribuam
para se evitar a Tragédia dos Comuns (Hardin, 1968). Berkes (1985) alerta que
sociedades não industriais são capazes de sobre-explotar um recurso e que não
haveria grandes estoques pesqueiros em situações e locais de livre acesso.
Assim, os mecanismos presentes em sistemas de manejo comunitário, são
vulneráveis a estresses que incluem (Berkes, 1985):
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• A perda do controle comunitário sobre o recurso, causando a falência
do sistema de propriedade usual, conduzindo ao livre acesso;
• Comercialização, como conseqüência de flutuações ou modificações
da demanda de mercado, podem motivar a sobre-pesca de alguns
estoques;
• Rápido crescimento populacional, colocando grande pressão sobre os
estoques (c.f. Petrere 1986a and 1986b; Camargo & Petrere, 2004);
• Rápidas mudanças tecnológicas.
Em síntese, o manejo comunitário de estoques pesqueiros obterá
melhores resultados em sistema fechados, considerando o contexto social e a
cultura da comunidade. A gestão desta atividade, no entanto, deve seguir os
pressupostos de integração com os demais recursos naturais, tendo por base a
bacia hidrográfica (Lei 9.433/97).
A demanda de mercado pelo pescado sempre deve ser considerada pelos
gestores ambientais. As relações externas da comunidade com outros centros
de comercialização podem motivar a sobre-pesca. A análise de risco aplicada
ao manejo pesqueiro em Tucuruí, PA, exemplifica o processo de tomada de
decisões administrativas, subsidiando medidas precaucionárias na região
amazônica (Camargo & Petrere, 2004).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O setor pesqueiro no Brasil tem avançado no desenvolvimento e
implementação de sistemas participativos de manejo de estoques. Neste caso,
as principais linhas políticas para a pesca artesanal devem considerar os
seguintes pontos:
i) o manejo comunitário de estoques pesqueiros pressupõe
descentralização administrativa e recepção de usos e costumes pelo
IBAMA;
ii) o interesse público ao meio ambiente ecologicamente equilibrado
demanda controle de acesso aos estoques pesqueiros;
O manejo comunitário de estoques pesqueiros deve ser analisado como
exemplo. Os procedimentos para se obter um acordo de pesca (Instrução
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Normativa/IBAMA 29/2002), devem ser estendidos para outros recursos
naturais renováveis. O manejo de estoques pesqueiros possui uma
particularidade: a incerteza determinada pela dinâmica populacional das
espécies-alvo e outros fatores ecológicos. Este tipo de obstáculo é ausente em
situações onde os estoques podem ser medidos precisamente (e.g. recursos
florestais), facilitando a implementação de sistemas participativos de gestão.
AGRADECIMENTOS
Os autores agradecem ao Programa de Pós-Graduação em Direito
Ambiental da Universidade do Estado do Amazonas, à Fundação de Amparo à
Pesquisa do Estado do Amazonas, ao Instituto Nacional de Pesquisas da
Amazônia e ao CNPq.
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REFLEXÃO DO DIREITO DAS
“COMUNIDADES TRADICIONAIS”
A PARTIR DAS DECLARAÇÕES E
CONVENÇÕES INTERNACIONAIS
Joaquim Shiraishi Neto*
Sumário: Introdução: delineamento de um campo jurídico; 1. As Declarações e Convenções no
Ordenamento Jurídico; 2. O Lugar Jurídico das Declarações e Convenções; 3. A Convenção
n.169 da OIT: a consciência de si; Referências
Resumo: Vários povos e grupos sociais
organizados em movimentos sociais passaram
a reivindicar direitos, que sempre lhes foram
negados pelo Estado brasileiro. Embora
tivessem participado da maioria das
discussões, ampliando os espaços e canais de
participação política, não lograram políticas
públicas efetivas. No contexto desse processo,
deve-se observar a importância da ratificação
de diversos dispositivos internacionais pelo
Brasil, que reafirmaram o reconhecimento
desses povos e grupos sociais, enquanto
sujeitos portadores de identidade étnica ou
coletiva. Este artigo pretende analisar a
importância desses dispositivos internacionais
no contexto de mobilização e organização
desses povos e grupos sociais.
Abstract: Several organized peoples and
social groups in social movements had started
to demand rights, which had been always
denied to them by the Brazilian State.
Although they had participated in the majority
of the quarrels, extending the spaces and canals
of political participation, they had not achieved
effective public policies. In the context of this
process, the importance of the ratification of
several international devices by Brazil must be
observed, which had reaffirmed the
recognition of these peoples and social groups,
while citizens entitled of ethnic or collective
identity. This article intends to analyze the
importance of these international devices in the
context of mobilization and social organization
of these peoples and groups.
Palavras chave: comunidades tradicionais,
movimentos sociais, dispositivos internacionais
Key-words: Traditional communities; Social
movements; International devices.
*
Advogado. Professor do Programa de Pós-graduação em Direito Ambiental da Universidade do Estado do Amazonas (PPGDA/
UEA). Coordenador do Grupo de Pesquisa: Direito, Comunidades Tradicionais e Movimentos Sociais. Pesquisador do Projeto
de Pesquisa “Nova Cartografia Social na Amazônia” (PPGSCA/ UFAM/ Fundação Ford).
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INTRODUÇÃO: DELINEAMENTO DE UM CAMPO JURÍDICO
Uma reflexão acerca da importância dos diversos dispositivos jurídicos
internacionais que foram “acordados”, “assinados” e “ratificados” ou não pelos
diversos países e, em especial, pelo Brasil, nas últimas décadas, e que se
encontram referidos de forma direta ou indireta às “comunidades tradicionais”1
tal como são designados os diversos povos e grupos sociais portadores de
identidade étnica ou coletiva no país, é de extrema relevância para o processo
em curso, de reconhecimento pleno desses, enquanto grupos sociais, distintos
e autônomos, organizados e mobilizados em torno das garantias e
reivindicações de seus direitos.
Nesse sentido, o intenso processo vivenciado pelos povos indígenas,
povos quilombolas, seringueiros, castanheiros, quebradeiras de coco
babaçu, faxinalenses e comunidades de fundo de pasto2 dentre outros
relevam o grau de complexidade do que está ocorrendo no Brasil e sua relação
direta com outros países, onde se tem verificado situações análogas às
apresentadas, sobretudo no que diz respeito à relação e à forma jurídica de lidar
com essas questões, as quais vem sendo tratadas de formas diferenciadas pelos
Estados, ora se ocupando em reconhecer e ampliar os direitos,3 ora adotando
1
Em 24 de dezembro de 2004, por meio de um Decreto Federal, foi criado a Comissão Nacional de Desenvolvimento
Sustentável das Comunidades Tradicionais. Entre vários, ela tem como objetivo principal “estabelecer a Política Nacional de
Desenvolvimento Sustentável das Comunidades Tradicionais” (inciso I do referido Decreto).
2
Almeida vem sistematizando as diversas situações vivenciadas por esses povos e grupos sociais no país. A propósito, ler :
ALMEIDA, Alfredo Wagner Berno de. Terras de quilombo, terras indígenas, “babaçuais livres”, “castanhais livres”, faxinais e
fundos de pasto: terras tradicionalmente ocupadas. Manaus: PPGSCA-UFAM, 2006.
3
É possível listar uma série de países, sobretudo na América Latina, que vivenciam situações consideradas análogas as das
“comunidades tradicionais” do Brasil. A maioria desses países alteraram seus dispositivos jurídicos constitucionais e infraconstitucionais para reconhecer o caráter “pluricultural” e “multiétnico” de suas sociedades e assim para poder atender as
demandas desses “povos” e “grupos sociais”, que se encontram no interior dos Estados nacionais, as quais são múltiplas
e complexas (TOMEI, Manuela; SEWPSTON, Lee. Povos indígenas e tribais: guia para a aplicação da Convenção n.169 da
OIT. 1. ed. Brasília: Organização Internacional do Trabalho, 1999).
De outro lado, diversos países de democracia liberal têm sentido a necessidade de debater a reformulação dos seus
dispositivos jurídicos e do próprio Estado para acomodação dos diversos grupos sociais portadores de identidade. No caso,
o debate intelectual de fundo tem se dado entre o “liberalismo político” e o “pluralismo cultural”. Em alguns países como
o Canadá, Bélgica e Espanha, o debate tem ocorrido em torno da reorganização política do Estado pela “assimetria federal’,
já que os grupos sociais constituem unidades políticas territoriais que coexistem no interior do Estado. Para uma leitura a
esse respeito, ver: FOSSAS, Enric; REQUEJO, Ferran. Asimetría Federal y Estado Plurinacional. El debate sobre la
acomodación de la diversidad en Canadá, Bélgica y España. Madrid: Editorial Trotta, 1999.
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medidas de cunho nitidamente discriminatórias4 em relação a eles, afastandoos de qualquer possibilidade de serem reconhecidos enquanto “sujeitos de
direito”.
Tem-se, ainda, para os chamados “operadores do direito”5 uma possibilidade impar de ir consolidando a constituição do que poderia ser de um
campo jurídico do “direito étnico”6 e, portanto, de uma forma própria de refletir
o direito, a partir das situações vivenciadas por esses povos e grupos sociais,
porquanto é possível observar que essa dinâmica tem provocado no âmbito
interno do direito, pelo menos, três movimentos que podem ser assim
delineados:
a) o deslocamento de disciplinas tidas como “tradicionais”, a saber: o
direito civil, o direito agrário e o próprio direito ambiental;
b) a relativização e reorganização hierárquica de determinadas normas e
regras consagradas pelos interpretes; e
c) a reafirmação e ampliação de dispositivos jurídicos internacionais de
proteção de direitos humanos.
4
Sobre a reformulação de dispositivos jurídicos de cunho discriminatório em países de democracia liberal, ver as discussões
e as mobilizações em torno da política de imigração Norte Americana, que impôs uma série de medidas legais com objetivo
de impedir a imigração e o processo de reconhecimento de direitos dos imigrantes já residentes (Folha de São Paulo, 2 de
maio de 2006. p. A 9). Ao que parece essas medidas legais de caráter discriminatório tem se espraiado por outros países,
como é caso da Lei que foi aprovada recentemente na França, que impõe restrições a imigração, estabelecendo critérios
seletivos ao imigrante como o da maior escolaridade e do padrão econômico (Folha de São Paulo, 18 de junho de 2006. p.
A15). No Japão, há uma discussão em torno da política migratória que afetará de forma direta os diversos brasileiros, os
chamados “dekasseguis”. Ela tem a intenção de acabar com o visto especial para descendentes de japoneses e de exigir o
conhecimento da língua local a todos que solicitarem visto para trabalharem no país (Jornal Nippo Brasil . São Paulo, 21 a
27 de junho de 2006; p. 4 Brasil no Japão).
A despeito do Brasil ser o destino de muitos imigrantes (Folha de São Paulo, 18 de junho de 2006), essa discussão não vem
sendo enfrentada .
Contrariando essas políticas que vêm sendo adotadas indistintamente pelos mais variados países, o Relatório do
Desenvolvimento Humano 2004 do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) além de rejeitar que as
diferenças seriam fontes de discórdia e de “conflitos culturais”, reafirma a sua importância como princípio do
desenvolvimento humano.
5
Essa noção de “operadores do direito” tomada no texto é indistinta, servindo para referir tanto aos professores dos cursos de
direito, como os demais profissionais: advogados, juízes, promotores, procuradores...
6
Não entendo que o direito possa ser compreendido de forma fragmentada, tal como é ensinado nos cursos jurídicos. As
questões são por demais complexas para serem compreendidas a partir de uma única disciplina do direito, além do mais,
não se pode esquecer que este tipo de especialidade, que enseja uma “carreira jurídica”, sempre está a sujeitar-se aos
padrões determinados pela própria disciplina, acabando por restringir as possibilidades de interpretação e análise , isto é:
“Para ser um especialista, você tem de ser credenciado pelas autoridades competentes; elas ensinam a falar a linguagem
correta, a citar as autoridades corretas, a sujeitar ao território correto” (SAID, 2005: p. 81).
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Tal movimento que se verifica no interior do direito, decorre de
profundas transformações que está ocorrendo na órbita nacional e
internacional, e ocorre pelo fato do direito não vir conseguindo responder de
forma plena e satisfatória as demandas e reivindicações dos movimentos
sociais, que afetam de forma direta e indireta a vida dos “povos” e “grupos
sociais”. Em outras palavras, o “desrespeito” às diferenças existentes entre os
distintos sujeitos, materializado numa política de universalização dos direitos,
vem provocando um aprofundamento dos problemas.
Tem-se observado enormes dificuldades jurídicas operacionais,
sobretudo, em face da total impossibilidade de se “enquadrar” as situações
vivenciadas aos modelos jurídicos preexistentes, os quais têm norteado e
estruturado todo ordenamento jurídico; mesmo que esses modelos possam
estar referidos de alguma forma as essas situações sociais, como é o caso dos
dispositivos referidos ao direito ambiental.
Os resultados mais visíveis da aplicação desses dispositivos podem ser
observados nas unidades de conservação de uso direto, que, inicialmente,
foram incorporadas como instrumentos de defesa de direitos pelos movimentos
sociais e, que, hoje em dia , têm sido visto com certa cautela pelos próprios
movimentos, principalmente pelos problemas que tem gerado em torno de sua
implantação,7 constituindo muitas vezes um empecilho a reprodução física e
cultural desses povos e grupos sociais.
Para efeito desse entendimento de que os direitos devem ser plenos,
trata-se de garantir a esses povos e grupos sociais a sua reprodução física e
social, consubstanciada numa determinada “prática social”,8 que se relaciona a
7
O modelo de reserva extrativista que se desenvolveu a partir da experiência dos seringueiros do Acre, é um bom exemplo
desses problemas as quais estou me referindo, sobretudo às reservas extrativistas de babaçu, que, a despeito de terem sido
criadas em 1992, têm sérias dificuldades de se implementar, pois esse modelo tem como ponto de partida as práticas
extrativas dos seringueiros, que em muito se diferem das chamadas quebradeiras de coco babaçu. A respeito dessas
questões, ver: SHIRAISHI NETO, Joaquim. Babaçu Livre: conflito entre a legislação extrativa e práticas camponesas.
ALMEIDA, Alfredo Wagner Berno de; SHIRAISHI NETO, Joaquim; MESQUITA, Benjamin Alvino de. A Economia do Babaçu:
levantamento preliminar de dados. 2º ed. São Luís: MIQCB/ Typographia Balaios, 2001. pp. 57-64.
Com relação às dificuldades entre a realidade e aplicação da Lei, para as reservas de desenvolvimento sustentável (RDS), ver
BENTES, Genise de Melo. Desenvolvimento Sustentável: da realidade à legislação no Estado do Amazonas. Manaus:
Programa de Pós-graduação em Direito Ambiental da Universidade do Estado do Amazonas, 2006. (Dissertação de
Mestrado).
8
180
No interior dessa “prática social” , observa-se uma série de “práticas jurídicas” que se relacionam, sobretudo, as formas de
acesso e uso comum dos recursos naturais e da terra. No entanto, essas não podem ser confundidas com o direito
consuetudinário, já que há entendimento prevalente no direito de que o costume é regra que do uso decorre, sendo que por
isso mesmo os doutrinadores têm se esforçado em identificar os seus requisitos que envolvem uma prática reiterada,
constante e uniforme de determinado ato que é produzido pela vontade geral de todos (BATALHA, Wilson de Souza Campos.
Lei de Introdução ao Código Civil. Fontes e Interpretação do Direito. São Paulo: Max Limonad, Vol.1. pp. 259-329).
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um modo de “criar”, de “fazer” e de “viver”. Essa forma própria de viver a vida
está garantida no inciso II do art. 216 da Constituição Federal de 1988, bem
como do que pode ser extraído da Convenção de n.º 169 da OIT, que trata sobre
os “povos indígenas e tribais”.9
Observa-se que em determinados momentos, o direito tal como
tradicionalmente formulado, tem servido mais como “obstáculo” às pretensões
desses povos e grupos sociais, evidenciando assim o grau de disputas internas no
campo jurídico, em que se coloca em questão a própria forma de dizer o direito.
Convém enfatizar que para além das reivindicações dos povos e grupos
sociais se está diante de uma luta interna no campo jurídico, onde há um
enfrentamento dos “operadores do direito” do direito em dizer o direito.10
A referida disputa identificada inicialmente no plano dos operadores
strictu sensu, não pode se desgatar ou mesmo se paralizar em torno das
discussões dos procedimentos operacionais formais para efetivação de direitos
já consagrados nos textos e que reconhecem a existência social desses povos e
grupos sociais. Sublinha-se que os direitos os quais se está referindo se
encontra no bojo dos direitos fundamentais e, portanto, de aplicação imediata,
conforme determina o texto constitucional.11
Já não se trata, com efeito, de simplesmente se utilizar dos mecanismos
jurídicos cirúrgicos para determinar a validade ou não dos dispositivos legais,
decepando aquelas normas tidas como inconstitucionais, mas de admitir a
coexistência dos diversos instrumentos disponíveis para a efetivação desses
direitos. Trata-se de reafirmar as suas respectivas fontes,12 que além de serem
múltiplas e complexas, estão profundamente enraizadas em situações
localizadas, ampliando as possibilidades de interpretação e de efetivação de
direitos, os quais devem ser plenos.
9
Promulgada pelo Brasil por meio do Decreto n.º 5.051, de 19 de abril de 2004.
10 Para P. Bourdieu “o campo jurídico é o lugar de concorrência pelo monopólio do direito dizer o direito, quer dizer a boa
distribuição (nomos) ou a boa ordem , na qual se defrontam agentes investidos de competência ao mesmo social e técnica
que consiste essencialmente na capacidade reconhecida de interpretar (de maneira mais ou menos livre ou autorizada) um
corpus de textos que consagram a visão legitima, justa do mundo social.” BOURDIEU, Pierre. A força do direito. Elementos
para uma sociologia do campo jurídico. O Poder Simbólico; trad. Fernando de Tomaz. Rio de Janeiro: Editora Bertrand Brasil
S.A , 1989. pp. 209-254.
11 §1º, do art.5º. “As normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata.”
12 André Jean Arnaud e Maria José Fariñas Dulce vêm atualizando as discussões sobre os sistemas jurídicos. Para eles, com a
globalização, o direito tem se apresentado cada vez menos como se fosse de uma única fonte. Há uma multiplicidade de
fontes do direito e esse fenômeno é designado como “policentricidade”, que exclui a pirâmide de Kelsen, organizando outras
estruturas , que podem ser assemelhar a um sistema de “circularidade” ou de “rede”. ARNAUD, André-Jean; DULCE, Maria
José Farinas. Introdução à Análise Sociológica dos Sistemas Jurídicos; trad. Eduardo Pellew Wilson. Rio de Janeiro: Renovar,
2000. pp. 381-405.
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A dinâmica vivenciada por esses povos e grupos sociais na busca pelo
direito de viver a diferença, joga luz no direito, pois esse se vê obrigado a
reconhecer outras “práticas jurídicas”, que se encontram coadunado com outras
formas de saber, mais localizados, situados nas experiências de cada grupo
social. Contudo, não se pode ignorar que essa forma de “saber” sempre esteve
sujeitado aos sistemas formais.13
Por isso, trata-se de refletir sobre os esquemas de pensamento jurídico
dominante, cuja implicação primeira é de rever determinadas noções e
princípios profundamente cristalizados e que se encontram “inculcados” nos
“operadores do direito”, a fim de reorganizá-los esquematicamente em nosso
pensamento, inclusive, hierarquicamente, no interior do sistema jurídico. O
que se propõe é submeter as “práticas jurídicas” a um exercício de reflexão
crítica, no sentido da sociologia reflexiva de Pierre Bourdieu, colocando em
“suspenso” as noções e os princípios que são tomados indistintamente como
“naturais”, no sentido de “afastarmos” de qualquer possibilidade que possa
servir como restrição de direitos.
No caso das situações sociais que envolvem esses povos e grupos
sociais, entendo que se trata de atribuir ao “princípio da pluralidade” o mesmo
valor que é atribuído ao “princípio da dignidade humana”, que de forma
criteriosa tem orientado a elaboração de toda dogmática crítica do direito.
O deslocamento do “princípio da dignidade humana” no interior do
sistema jurídico, favorecendo o princípio da pluralidade, que o equipara
hierarquicamente na estrutura jurídica, provoca uma necessidade inicial de
releitura dessa dogmática crítica, que, com razão, tem afirmado esse princípio
como supremo.
Nesse sentido, aquele esquema esboçado por Kelsen de que o direito
poderia ser apresentado como se fosse uma pirâmide e que tanto tem
influenciado os esquemas de pensamento jurídico ocidental, inclusive, a
organização do sistema hierárquico de valores – tão caro aos interpretes do
direito. Os valores que sinalizam a produção e interpretação das normas
acabam cedendo lugar a outras estruturas, talvez menos geométrico e, portanto
mais livres desses esquemas, que aprisionam o pensamento jurídico.
O significado mais visível dessa leitura dinâmica do direito é que ele
possa ir “recuperando” e “atualizando” seus significados, no interior da
13 A respeito, ver FOUCAULT, Michel. Em Defesa da Sociedade; trad. Maria Ermantina Galvão. São Paulo: Martins Fontes, 1999.
pp. 3-26.
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“sociedade plural”, que se encontra em processo de profunda transformação.
Há necessidade, também, de se afastar no âmbito das disputas jurídicas, do que
se tem identificado como “crise do direito”, pelo fato de que esse esquema
científico interpretativo do direito vir se apresentado como permanente, estável
e duradouro, reforçando a idéia de que mais tem servido para alimentar o
discurso jurídico dominante.
1.
AS DECLARAÇÕES E CONVENÇÕES NO ORDENAMENTO
JURÍDICO
Até bem pouco tempo atrás sequer poderíamos imaginar, em função do
grau de “universalização” e “abstração” do direito, que os instrumentos
internacionais das Declarações e das Convenções aqui utilizados pudessem
estar referidos as situações diretamente vivenciadas por povos e grupos sociais.
Em outras palavras, a utilização efetiva dos instrumentos internacionais para
amparar legalmente as situações, que se encontram na maioria das vezes
circunscritas a uma determinada unidade de espaço e de tempo. Não se pode
esquecer que o próprio direito sempre viveu como sendo “universal”,
“abstrato” e, portanto, a – histórico. Para além dessas noções, que se encontram
profundamente enraizadas num direito estatal, o direito tem reivindicado uma
“homogeneidade universal”, compromissada com um “projeto global de
sociedade”.14
Em muitos países, o fato do direito vir se apresentando como se fosse
único,15 mais tem servido para justificar a sua total indiferença e o seu desprezo
às noções de “local”, de “realidade” e de “pluralidade”.
Uma decorrência de tudo isso foi à criação de “ficções jurídicas”, como
a do “sujeito de direito”, que se encontra destituído de suas raízes profundas.
A primazia da forma em detrimento do conteúdo tem levado os “sujeitos de
direito” a uma espécie de “invisibilidade”, destituindo esses sujeitos de
quaisquer elementos que possam qualificá-los, perdendo as suas
especificidades enquanto tal, como parte de determinado povo ou grupo social.
14 Para Bourdieu há um intenso movimento que tem a pretensão de criar uma “homogeneização jurídica”, a fim de que possa
atender os propósitos de determinados grupos econômicos dominantes que atuam em toda parte. BOURDIEU, Pierre.
Contrafogos 2: para um movimento social europeu; trad. André Telles. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2001. p. 107.
15 RANCIÈRE, Jacques. O Desentendimento; trad. Ângela Leite Lopes. São Paulo: Editora 34, 1996. p. 110.
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Ao incorporar essas “novas” dimensões e conteúdos explicitadas nos
dispositivos internacionais, mesmo sabendo que esses representam formas de
dominação aqui tomando a noção de Michel Focault sobre o significado de
dispositivo, é possível vislumbrar uma dimensão do direito, que extrapola as
noções pré-determinadas, obrigando-nos a um mergulho em um “novo” modus
operandi, cuja força motriz faz com que se reflita acerca das estruturas e o seu
modo de funcionamento.
Os dispositivos internacionais dos direitos humanos são igualmente
universais e, por isso, passíveis das críticas ora formuladas. Contudo, a
existência desses instrumentos de proteção dos indivíduos revela, inicialmente,
um dado importante destacado pela maioria dos interpretes do direito
internacional, de que os indivíduos, não são meros objetos, mas sim, “sujeitos
de direito”; corroborando uma leitura que relativiza a soberania absoluta dos
Estados, na medida em que é possível a intervenção para proteção desses
“sujeitos de direito”, que são mais importantes que os próprios Estados.
Os recentes dispositivos internacionais “acordados”, “assinados” e
“ratificados”, ou não, pelo Brasil, deram ênfase a outros elementos
constitutivos da noção de sujeito de direito, permitindo um alargamento e uma
melhor qualificação do sujeito, que além da dimensão individual,16 inscrita em
vários desses dispositivos internacionais de proteção dos direitos humanos,
incorpora uma outra dimensão de sentido coletivo e que se refere à noção de
povos e grupos sociais.
Portanto, o exercício que ora se propõe é tomar os dispositivos
internacionais ratificados ou não pelo Brasil e analisá-los à luz do contexto
brasileiro.
2.
O LUGAR JURÍDICO DAS DECLARAÇÕES E CONVENÇÕES
O primeiro passo para a nossa reflexão é de explicitar a força da forma,
situando essas Declarações e Convenções no interior do sistema jurídico
brasileiro. Trata-se de guardar o papel das Declarações, cujo conteúdo serve
como “princípios jurídicos” orientadores dos demais instrumentos e ações,
16 Importa assinalar que outros dispositivos internacionais já se referiam a uma noção de coletivo, como a Convenção do
Genocídio que foi aprovada pelo Brasil por meio da Lei n.º 2.889, de 01 de outubro de 1956, que “define e pune o crime de
genocídio”.
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bem como das Convenções, que por serem tratados,17 vinculam os países na
órbita internacional, impondo todo tipo de sanções, sobretudo aquelas de
natureza comercial, cujos resultados podem ser mais imediatos.
Para a análise, serão tomadas preferencialmente as Declarações às quais
o Brasil é signatário, especialmente: a “Declaração Universal dos Direitos
Humanos” de 1948, a “Declaração de Durban” e a “Declaração Universal
sobre a Diversidade Cultural”, ambas de 2001. Além das Declarações, as
Convenções já ratificadas: a “Convenção Relativa à Proteção do Patrimônio
Mundial, Cultural e Natural” de 1972,18 a “Convenção sobre a Diversidade
Biológica”19 e a Convenção n.º 169 da OIT.
Neste contexto, deve-se assinalar que a “Convenção Relativa à Proteção
do Patrimônio Mundial, Cultural e Natural” representou um “marco jurídico”
desse processo, pois além de permitir a realização da distinção entre o
patrimônio cultural e o natural, enfatizou a importância desses bens para o
desenvolvimento da humanidade.
A despeito de não ter sido ratificada pelo Brasil, a “Convenção sobre a
Proteção e a Promoção da Diversidade de Expressões Culturais” faz parte
desse repertório de instrumentos internacionais e, desta forma, serve para
refletir as situações vivenciadas pelos povos e grupos sociais no Brasil.
É o §2.º, do art. 5.º, da Constituição Federal de 1988, que garante a
possibilidade de recepção dos direitos enunciados nesses dispositivos,
conferindo aos tratados que versam sobre questões relacionadas aos direitos
fundamentais, em particular, natureza hierárquica de norma constitucional e de
aplicação imediata,20 tal como preceitua o §1.º, do art. 5.º, da CF de 1988, que
assegura aplicação imediata de normas definidoras de direitos e garantias
fundamentais.
17 A incorporação de tratados internacionais no sistema jurídico nacional é matéria reservada aos Estados, por isso, as
exigências podem variam de Estado para Estado. Em geral, o processo de formação dos tratados tem início com os atos de
negociação. A simples assinatura do tratado, não irradia efeitos jurídicos. No Brasil, após a negociação e assinatura que é
de competência do Poder Executivo (inc. VIII, art.84 da CF), é encaminhado ao Poder Legislativo para aprovação por meio de
Decreto Legislativo (inc. I , art. 49 da CF). Na seqüência desse processo há o ato de ratificação, que é realizado pelo Poder
Executivo por meio de Decreto e somente após a sua ratificação é que o tratado passa a ter valor e produzir efeitos jurídicos.
Como etapa final, esse instrumento há de ser depositado em um órgão que assuma a sua custódia para produzir efeitos
internos e externos. Uma decorrência de seu descumprimento é a responsabilização do Estado violador.
18 Promulgada pelo Brasil por meio do Decreto n.º 80.978, de 12 de dezembro de 1977.
19 Promulgada pelo Brasil por meio do Decreto n.º 2.519, de 16 de março de 1998.
20 A propósito dessa temática da hierarquia dos tratados internacionais de direitos humanos, conferir: PIOVESAN, Flávia. Direitos
Humanos e o Direito Constitucional Internacional. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2006. pp. 51-103.
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2.1 O Reconhecimento das Diferenças nas Declarações e
Convenções
A Convenção n.º 169 foi adotada pelo Organização Internacional do
Trabalho (OIT) em 1989. Entrou em vigor em 1991 após ter sido ratificada por
dois Estados-membros, revogando a Convenção n.º 107, de caráter
“integracionista” ou “assimilacionista”, cujo objetivo era integrar esses povos
e grupos a sociedade nacional. Ela partia de modelos explicativos que
pressupunham uma espécie de irreversibilidade do processo de “integração” ou
de “assimilação”. Essa posição foi revista pela Convenção n.º 169, a qual
incluiu a noção de que a vida dos “povos indígenas e tribais” é permanente e
perdurável, fazendo com que diversos Estados passassem a se reconhecer
como “multiétnicos” ou “pluriculturais”.
Na última década, diversos Estados reformularam suas Constituições e
passaram a reconhecer que se trata de Estados com uma diversidade cultural, a
exemplo do próprio Brasil, que em 1988, outorgou uma Carta reconhecendo a
diversidade social e cultural do país, como consta do Preâmbulo:
Nós, representantes do povo brasileiro, reunidos em Assembléia
Nacional Constituinte para instituir um Estado democrático,
destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e
individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o
desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos
de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos,
fundada na harmonia social e comprometida , na ordem interna e
internacional, com a solução pacífica das controvérsias,
promulgamos, sob a proteção de Deus, a seguinte Constituição da
República Federativa do Brasil. (G.N.). (Preâmbulo da
Constituição Federal de 1988).
Este posicionamento foi co-extensivo aos Estados membros que, ao
elaborarem a suas Constituições Estaduais a partir de 1989, reconheceram de
forma explícita as diversas situações envolvendo povos e grupos sociais
distintos.
Como se não bastasse, as Constituições federal e estaduais deram
tratamento específico as questões culturais, que também são tidas como direito
fundamental, em decorrência das declarações internacionais e regionais de
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direitos humanos (“Declaração Universal de Direitos Humanos” e “Declaração
Americana dos Direitos e Deveres do Homem”). Para esses instrumentos , a
cultura não se trata somente de criação e de produção artística e intelectual,
mas inclui também uma forma própria, que serve para a realização existencial
das pessoas enquanto pessoas.
Nesse sentido, os textos das Constituições Estaduais acabaram indo ao
encontro com o disposto na Constituição Federal de 1988, cujo entendimento
é de que a cultura se relaciona a uma forma de “criar”, de “fazer” e de “viver”
dos povos e grupos sociais (inciso II do art. 216). Sentido esse reafirmado na
“Declaração Universal sobre a Diversidade Cultural”, onde se lê já nas
considerações iniciais o que se segue:
Reafirmando que a cultura deve ser considerada como conjunto
dos traços distintivos espirituais e materiais, intelectuais e
afetivos, que caracterizam uma sociedade ou um grupo social e
que abrange, além das artes e das letras, os modos de vida, as
maneiras de viver juntos, os sistemas de valores, as tradições e as
crenças.21 (G.N).
Explicitamente essa “Declaração Universal sobre a Diversidade
Cultural” afirma que:
A defesa da diversidade cultural é um imperativo ético,
inseparável do respeito à dignidade humana. Ela implica o
compromisso de respeitar os direitos humanos e as liberdades
fundamentais, em particular os direitos das pessoas que
pertencem as minorias e os dos povos autóctones. Ninguém pode
invocar a diversidade cultural para violar os direitos humanos
garantidos pelo direito internacional, nem para limitar seu
alcance. (G.N.) (art.4.º).
Além disso, a diversidade cultural seria também uma das fontes do
desenvolvimento entendido num sentido amplo (art.3.º). Já para a “Convenção
sobre a Proteção e a Promoção da Diversidade das Expressões Culturais”, a
21 Ela se dá conforme as conclusões da Conferência Mundial sobre as Políticas Culturais (MONDIACULT), que ocorreu em 1982,
no México; da Comissão Mundial de Cultura e Desenvolvimento (Nossa Diversidade Criadora) de 1995; e da Conferência
Intergovernamental sobre Políticas Culturais para o Desenvolvimento , que aconteceu em 1998, em Estocolmo.
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diversidade cultural é tratada explicitamente como princípio para o
desenvolvimento sustentável:
A diversidade cultural é uma grande riqueza para as pessoas e as
sociedades. A proteção, a promoção e a manutenção da
diversidade cultural é uma condição essencial para o
desenvolvimento sustentável em benefícios das gerações aturais e
futuras. (G.N.) (item 6 do art. 2 da Convenção).
Observa-se que está havendo uma tendência em aliar a defesa da
diversidade cultural e da cultura ao desenvolvimento humano, equiparando a
noção de desenvolvimento sustentável, tão caro ao direito ambiental. Esse
movimento muito se assemelha ao da preservação e da conservação da
natureza, cuja intensidade se verificou, sobretudo na década de 1990,
influenciando diversos instrumentos normativos e desencadeando um conjunto
de políticas públicas e de ações, como a própria Constituição Federal de 1988,
que tem um Capítulo sobre o Meio Ambiente (art. 225).
3.
A CONVENÇÃO N.º 169 DA OIT: A CONSCIÊNCIA DE SI
Sobre a Convenção n.º 169 da OIT é importante afirmar que além de ser
um tratado, tem uma especificidade por tratar-se de matéria relacionada aos
direitos dos “povos indígenas ou tribais”, que são tidos como fundamentais,
cujas implicações é a sua aplicação imediata (§1.º do art. 5º) e o
reconhecimento de que esse dispositivo se situa no mesmo plano hierárquico
da CF de 1988, a exemplo de todos os direitos fundamentais.
Contudo, determinados autores têm enfatizado duas omissões
importantes22 da Convenção n.º 169: o fato de não ter tratado sobre a
propriedade intelectual; e que não prevê formas de controle da sua aplicação.
Em relação a essa primeira omissão, trata-se de ler essa com a “Convenção
sobre Diversidade Biológica”, no sentido de qualificar os sujeitos portadores
dos conhecimentos tradicionais.
22 A esse respeito, ler: CHAMBERS, Ian. El Convenio 169 de la OIT: avance y perspectivas. GÓMEZ, Magdalena (coord.).
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A leitura conjunta dessas Convenções tem uma enorme conseqüência no
plano jurídico, sobretudo no sentido de equiparar as relações que são
rigorosamente formais e fechadas às realidades sociais. Ela é realizada
propositalmente, uma vez que permite reafirmar a presença dos povos e grupos
sociais nessa arena de disputas.
Uma conseqüência em deixar de fazê-lo, seria tratar indistintamente
todo conhecimento como passível de ser apropriado ou mesmo, pensá-lo por
sua utilidade e necessidade, tal como se estrutura o pensamento jurídico
dominante, que tem como pressuposto o aperfeiçoamento das relações
mercantis entre sujeitos, tidos como iguais. Atenta-se o fato de que a essa
“Convenção sobre a Diversidade Biológica” designa “comunidades locais” e
“populações indígenas” ao invés de “povos indígenas e tribais” como faz a
Convenção n.º 169.
Os interpretes da Convenção n.º 169 da OIT tem dividido esse
instrumento em três seções principais e cada uma delas em várias partes. A
primeira diz respeito à política geral; a segunda, a vários temas substantivos; e
a terceira, assuntos gerais e administrativos.
Em relação à Convenção n.º 169, vale repassar alguns artigos, que são
importantes para a nossa reflexão jurídica. Ela fala dos “povos indígenas” e
“tribais”, não fazendo nenhuma distinção de tratamento em relação a esses
grupos sociais. Ambos têm o mesmo peso diante da Convenção.
As situações vivenciadas por esses povos e grupos sociais não se
vinculam necessariamente a um período temporal ou a um determinado lugar.
O que deve ser considerado no processo de identificação é a forma de “criar”,
de “fazer” e de “viver”, independentemente do tempo e do local, importando
assinalar que referido critério distintivo da noção de “povo” não é o mesmo do
direito internacional (item 3 do art. 1º da Convenção n.º 169).
Ressalta-se que essa noção de povo desloca-se da noção de população,
de caráter “integracionista” ou “assimilacionista”, como pode ser observado no
item 2 do art. 1.º:
A consciência de sua identidade indígena ou tribal deverá ser
considerada como critério fundamental para determinar os
grupos aos que se aplicam as disposições da presente Convenção.
(G.N.).
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Para a Convenção, o critério para distinguir os sujeitos é o da
consciência, em outras palavras, é o da auto-definição... é o que os sujeitos
dizem ser por estarem referidos a algum povo ou grupo social e, por isso
mesmo, tem provocado e promovido de forma deliberada uma verdadeira
ruptura no mundo jurídico, que sempre esteve vinculado aos interpretes
autorizados da Lei. Para Pierre Bourdieu, o campo jurídico se constitui num
universo social autônomo e específico, organizado único e exclusivamente
pelos “operadores do direito”, que por meio de um mandato, “usurpam”
qualquer forma de participação.
No Brasil, não há “povos tribais” no sentido estrito em que há em outros
países, mas existem povos e grupos sociais distintos que vivem em sociedade
e essa distintividade é que aproxima da noção de “povos tribais”.
Desde que os povos e grupos sociais se definam enquanto tal devem ser
“amparados” pela Convenção. A Convenção não define a priori quem são esses
“povos indígenas e tribais”, apenas dá instrumentos para que o próprio sujeito
se defina diante de seu grupo, como o da “consciência de sua identidade”,
sendo que compete a cada país a decisão sobre quais povos e grupos sociais
recaí a aplicação dessa Convenção. Neste caso, ela faz acertadamente, pois se
definisse de antemão, excluiria uma infinidade de povos e grupos sociais desse
precioso dispositivo.
Entendo que a Constituição Federal dá um tratamento especial a essas
situações reafirmando os critérios de identidade, uma vez que essas noções
podem ser retiradas de uma leitura criteriosa do art. 3, quando ele afirma que a
resolução dos problemas regionais (inc. III do art.) passa pela construção de
uma “sociedade livre”, “justa” e “solidária” (inc. I do art.), sem qualquer tipo
de discriminação (inc. IV).
Um aspecto diretamente relacionado ao da identidade , é o da ocupação
e uso das terras, do território. De acordo com o item 1 do art.14 da Convenção:
Dever-se-á reconhecer aos povos interessados os direitos de propriedade e de
posse sobre as terras que tradicionalmente ocupam... (G.N.).
Essa noção de terra, que compreende o conceito de território, incluiu
uma totalidade que diz respeito: as formas de ocupação e uso da terra e dos
recursos naturais (item 2 do art.13); às culturas e os valores vinculados a essa
terra ou territórios (item 1 do art.13); ao direito sobre os recursos naturais
existentes. Ele abrange também o de “...participarem da utilização,
administração e conservação dos recursos mencionados.” (item 1 do art.15).
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Na possibilidade dos recursos pertencerem ao Estado, mesmo assim
deverão ser consultados com procedimentos apropriados, participar dos
benefícios e receber indenização eqüitativa (item 2 do art.15).
Além de tudo isso, o item 1 do art. 14, resguarda a possibilidade desses
povos e grupos sociais utilizarem as terras não ocupadas, mas que venham
sendo utilizadas de forma tradicional. Trata-se de reconhecer o instituto da
servidão, que foi utilizado em situações que se assemelham as da presente, tal
como os chamados “castanhais do povo” no Estado do Pará, onde por meio de
Decreto, o Estado assegurava aos castanheiros, o livre acesso e uso dos
castanhais. Para essas situações, fica condicionado ao Estado adotar medidas
para salvaguardar esse direito desses povos e grupos sociais.
Em relação à Convenção n. 169, dois aspectos ainda são merecedores de
notas, pois se encontram diretamente referidos ao a auto-definição. Eles dizem
respeito ao processo de participação e de consulta envolvendo os povos e
grupos sociais.
Segundo o art. 6º, os governos devem estabelecer os meios para que os
povos e grupos sociais interessados possam participar das decisões em todos os
níveis no âmbito legislativo e administrativo (letra a e b do item 1 do art. 6.º).
Os meios, segundo a letra c, implicam em criar condições próprias para que
possam participar efetivamente (inclusive alocando recursos, investindo na
formação e capacitação e no fortalecimento institucional dos grupos...).
Pelo visto, há uma mudança radical de por fim a qualquer forma que
enseje algum tipo de tutela, sempre presente nos dispositivos jurídicos, que
notadamente vêem esses povos e grupos sociais como sujeitos inferiorizados,
incapazes de discernirem sobre seus próprios atos. No caso, o “princípio da
igualdade” deve ser o pressuposto e não o objetivo a ser alcançado, pois a
emancipação decorre do reconhecimento da existência da diversidade e das
diferenças de cultura, que envolucram distintos sujeitos que conhecem
perfeitamente as suas necessidades mais imediatas e mediatas.
Mais do que isto, entendo que o Estado deverá condicionar as suas
políticas e programas as ações dos grupos sociais; deverá, ainda, se estruturar
de forma diferenciada para atendimento das demandas que são múltiplas e
complexas, determinado “novas” maneiras de pensá-las. Isso tudo implica
numa mudança do Estado na forma de organizar e operacionalizar suas ações,
que não pode ficar restrita as competências administrativas firmadas
previamente.
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A importância desse instrumento, assim como dos outros referidos, salta
aos olhos. Ele permite refletir uma série de políticas, programas e ações. A
aplicação efetiva desses dispositivos jurídicos internacionais pode e deve
significar uma mudança nas estruturas do Estado, que sempre foram esboçadas
e operacionalizadas de forma universal, sem deixar margem para o tratamento
das diferenças sempre existentes.
Convém destacar um outro artigo que também se encontra diretamente
relacionado à afirmação das identidades e ao direito de participação desses
povos e grupos sociais, é a previsão contida no item 1 do art. 7.º:
Os povos interessados deverão ter direito de escolher suas
prioridades no que diz respeito ao processo de desenvolvimento,
na medida em que ele afete as suas vidas, crenças, instituições e
bem estar espiritual, bem como as terras que ocupam e utilizam
de alguma forma, e de controlar, na medida do possível, o seu
próprio desenvolvimento econômico, social e cultural. Além
disso, esses povos deverão participar da formulação, aplicação e
avaliação dos planos e programas de desenvolvimento nacional e
regional suscetíveis de afeta-los diretamente. (G.N).
identifica-se aqui pelo menos dois pontos importantes: o direito do
grupo definir o que quer, o que quer para si, de definir suas prioridades
quaisquer que sejam; e o direito de participar de todas discussões que possam
lhe afetar.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Como visto, os dispositivos jurídicos internacionais apresentam uma
atualidade em face das situações vivenciadas pelos povos e grupos sociais no
Brasil. O fato de garantir que os sujeitos se definam a partir de sua própria
consciência, rompe com uma maneira de pensar o direito, alargando a
compreensão das “práticas jurídicas”, que se encontram referidas ao campo
jurídico.
Ademais, uma leitura das Declarações e das Convenções internacionais
possibilita o deslocamento do poder de dizer o direito, na medida em que
“inverte os papéis”, atribuindo aos “operadores do direito” um papel menos
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“ativo” e mais “passivo” nesse processo, sobretudo porque cabe ao “operador”
reconhecer o que foi expressamente definido pelos sujeitos. Além disso, esse
procedimento que garante o reconhecimento das diferenças faz com que ocorra
um revigoramento dos povos e grupos sociais, que se mobiliza no sentido de
garantir o reconhecimento de suas especificidades, tidas como imprescindíveis
para o desenvolvimento da sociedade.
Vale ressaltar que a despeito desse processo desenhado no campo
jurídico, tem-se a necessidade de, a exemplo do que ocorre em outros países, a
construção de uma política jurídica de caráter étnico, a fim de atender e
garantir a reprodução física e social desses povos e grupos sociais, o que vai
implicar numa “nova maneira” de se pensar as relações e as estruturas do
Estado brasileiro.
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PARTE III
A FUNÇÃO SÓCIO-AMBIENTAL
COMO NOVO PARADIGMA DA PROPRIEDADE CONTEMPORÂNEA
A l a i m G i o v a n i F o r t e s S t e f a n e l l o . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .1 9 9
Introdução . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .200
1. As diferentes percepções de propriedade privada . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .201
2. A contribuição do Direito Romano . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .201
3. A diferenciação no período medieval: o feudalismo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .202
4. A Revolução Francesa como marco do Direito Moderno . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .203
5. A visão de alguns pensadores católicos sobre a propriedade . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .204
6. A Propriedade na visão privatista tradicional e na visão constitucional contemporânea . . . . . . . . . . . .205
7. A função sócio-ambiental da propriedade como novo paradigma biocêntrico . . . . . . . . . . . . . . . . . . .207
Conclusão. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .212
ANÁLISE DA CULPABILIDADE E DA RESPONSABILIDADE DO DANO AMBIENTAL:
REFLEXÕES A PARTIR DE UMA MISSÃO DE FISCALIZAÇÃO DO IBAMA NO INTERIOR DO ESTADO DO PARÁ
D a n i e l A b r a h ã o d o N a s c i m e n t o . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .2 1 7
Introdução . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .218
1. Desenvolvimento: Conhecendo o cenário e o começo dos “crimes” . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .219
2. A Insuficiência do aparelho estatal e o legado de um modelo de desenvolvimento . . . . . . . . . . . . . . .222
3. A culpabilidade e a responsabilidade do dano ambiental Considerações Finais . . . . . . . . . . . . . . . . . .227
Considerações finais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .235
SOCIEDADE CIVIL RESÍDUOS SÓLIDOS E CONSCIENTIZAÇÃO
M a r i a R o s a l v a d e O l i v e i r a S i l v a . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .2 3 9
1. Conceitos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .240
2. Competência . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .241
3. Classificação dos Resíduos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .242
4. A Problemática do Lixo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .243
5. Sociedade Civil . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .246
6. Conscientização. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .249
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A FUNÇÃO SÓCIO-AMBIENTAL
COMO NOVO PARADIGMA DA
PROPRIEDADE CONTEMPORÂNEA
Alaim Giovani Fortes Stefanello*
Sumário: Introdução; 1. As diferentes percepções de propriedade privada; 2. A contribuição do
Direito Romano; 3. A diferenciação no período medieval: o feudalismo; 4. A Revolução Francesa
como marco do Direito Moderno; 5. A visão de alguns pensadores católicos sobre a propriedade;
6. A Propriedade na visão privatista tradicional e na visão constitucional contemporânea; 7. A
função sócio-ambiental da propriedade como novo paradigma biocêntrico; Conclusão.
Resumo: O instituto da propriedade tem se
consolidado dentro de uma concepção
individualista desde a época do direito
romano. A Declaração dos Direitos do Homem
e do Cidadão, de 1789, serviu como marco
histórico moderno da propriedade como
direito absoluto. Esse modelo, baseado no
Estado Liberal, foi sendo reproduzido pelo
ensino jurídico de forma a não permitir
reflexões críticas acerca da necessidade do seu
reexame com base numa visão social. Mesmo
com a inserção da função social da
propriedade na Constituição Federal de 1988,
o inconsciente coletivo continuava a
reproduzir o modelo anterior, que se esgotou
por não contemplar os interesses da
coletividade. Surge espaço para o crescimento
das diferentes noções de propriedade
contemporânea, baseada na função sócioambiental como novo paradigma biocêntrico.
Abstract: The institute of property has been
consolidated within an individualistic
conception since the time of the Roman law.
The Declaration of the Rights of the Man and
the Citizen, of 1789, served as modern
historical landmark of property as an absolute
right. This model, based on the Liberal State,
had been reproduced by the legal education in
order to not allow critical reflections
concerning the necessity of its reexamination
based on a social vision. Even with the
insertion of the social function of property in
the Federal Constitution of 1988, the collective
unconscious continued to reproduce the
previous model, which has been depleted for
not contemplating the interests of the
collectiveness. Space for the growth of the
different notions of contemporary property
appears, based on the socio-environmental
function as a new biocentric paradigm.
Palavras-chave: Direito Ambiental; Direito
Constitucional; Propriedade; Função Social;
Key-words: Environmental Law; Constitutional Law; Property; Social Function;
*
Advogado da Caixa Econômica Federal em Manaus – Gerente Jurídico Regional. Mestrando em Direito Ambiental pela
Universidade do Estado do Amazonas – UEA/AM. Pós Graduado em Direito Civil e Processo Civil pela FADIVALE-MG.
Conselheiro Editorial da Revista de Direito da ADVOCEF. Presidente do CEDAM – Centro de Estudos em Direito Ambiental da
Amazônia.
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INTRODUÇÃO
O estudo que se pretende apresentar no presente artigo terá como escopo
a propriedade no contexto contemporâneo, já relativizada pela função social e
ambiental insertas na Constituição Federal de 1988 e no Código Civil de 2002.
Trata-se de um novo paradigma da propriedade que rompe com o absolutismo
do Direito Privado tradicional, o qual está baseado no poder total do dono
sobre o bem apropriado.
Embora não se tenha a intenção de limitar o tema apenas sob o enfoque
da propriedade imóvel e privada, este aspecto será explorado neste artigo na
parte que trata da evolução histórica das noções propriedade, para demonstrar
que as concepções criadas ao longo do tempo, principalmente acerca da
propriedade rural, influenciaram nas demais formas de apropriação de bens
pelo homem. Contudo, também será analisada a propriedade de bens imateriais
e ambientais.
Antes disso, porém, faz-se necessário contextualizar o assunto. Para
tanto, é preciso entender como as concepções do Estado Liberal foram sendo
firmadas ao longo do tempo e reproduzidas com base no sistema jurídico
romano de propriedade. Tais concepções sofreram poucas alterações e
consolidaram-se na Revolução Francesa, que influenciou boa parte dos
Códigos Civis ocidentais.
A reprodução deste modelo de propriedade ocorreu por meio de um
ensino jurídico que, via de regra, apenas reproduz conceitos dentro de uma
concepção monista e positivista, sem se preocupar em analisar de forma crítica
o sistema legal vigente, o qual gera desigualdade social e exclusão, tendo por
base a concentração de propriedade.
Esse ensino jurídico conservador, lastreado no inconsciente coletivo dos
alunos, vai fazendo com que algumas importantes mudanças no ordenamento
jurídico demorem muito para terem eficácia social. A função sócio-ambiental da
propriedade é um exemplo disso.
Foi essa modalidade de ensino jurídico que reproduziu as concepções
liberais de propriedade, originadas do Código Civil Francês, dentro de uma
metodologia de “mera transmissão do conhecimento”,1 ou de simples
transferência de informação, sem qualquer preocupação pedagógica,
1
200
MARTINEZ, Sérgio Rodrigo. Manual da Educação Jurídica. Curitiba: Juruá, 2004, p. 32.
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perpetuando o discurso hegemônico liberal do “ensino jurídico da
propriedade”,2 como ensina Erouths Cortiano Junior.
Aos poucos, porém, uma nova realidade começa a ser construída nos
cursos jurídicos. A didática, as noções de pedagogia, a educação transdisciplinar
que se preocupa em fazer com que o direito dialogue com as demais ciências,
contribui para que os meros reprodutores de informações comecem a dar lugar
àqueles que ensinam a pensar e a criar, fazendo com que a teoria jurídica interaja
com a realidade social na busca de alternativas emancipatórias.
1.
AS DIFERENTES PERCEPÇÕES DE PROPRIEDADE PRIVADA
Não se pretende no presente trabalho analisar todos os tipos de
propriedade e as diferentes concepções formuladas por diversos teóricos desde
os mais remotos tempos. Far-se-á um breve estudo contextualizado sobre
algumas percepções de propriedade ao longo da história, que permita construir
um cenário que servirá de palco para desenvolver o tema principal, analisando
a propriedade contemporânea dentro de um novo paradigma social e ambiental.
2.
A CONTRIBUIÇÃO DO DIREITO ROMANO
Para Orlando Gomes,3 na evolução histórica da propriedade interessa
relembrar a noção deste instituto para os romanos, pois é o modelo que
“predomina no regime capitalista” até hoje. Segundo o autor, a propriedade
romana passou por longo processo de individualização, conferindo poderes
exagerados e exaltando a concepção individualista do proprietário.
Fernanda de Salles Cavedon,4 por sua vez, afirma que o Direito Romano
influenciou os principais sistemas jurídicos ocidentais, em especial no âmbito do
Direito Privado. Para a autora, a noção de propriedade para os romanos foi sofrendo
alterações, deixando de ser exclusivamente individualista quando começou a
restringir as formas de uso que trouxessem prejuízo à propriedade alheia.
2
JUNIOR, Eroulths Cortiano. O Discurso Jurídico da Propriedade e suas Rupturas. Rio de Janeiro: Editora Renovar, 2002.
3
GOMES, Orlando. Direitos Reais. 19.ª ed. Atualizada por Luiz Edson Fachin. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2005, p. 115.
4
CAVEDON, Fernanda de Salles. Função Social e Ambiental da Propriedade. Florianópolis: Editora Momento Atual, 2003, p. 8.
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De qualquer forma, independente dos contornos restritivos que o uso da
propriedade romana possa ter tido, a concepção mais marcante deste período é
o direito de usar, fruir e dispor da propriedade, possuindo o proprietário um
direito absoluto oponível erga omnes que influenciou o Direito Civil ocidental.
Neste sentido, Roberto Senise Lisboa5 afirma que “no decorrer da história do
império romano, podem ser constatadas etapas em que a propriedade
individual possuiu maior ou menor importância. Entretanto, é inegável que o
individualismo, de forma geral, prevaleceu”.
3.
A DIFERENCIAÇÃO NO PERÍODO MEDIEVAL: O FEUDALISMO
Já no período medieval a propriedade diferencia-se no que tange à
exclusividade, “tendo como traço dominante a multiplicidade e o
desmembramento do domínio, representado pelo regime feudal”.6 Para
Orlando Gomes7 é a “quebra desse conceito unitário”, havendo concorrência
de proprietários sobre o mesmo bem.
O período feudal caracteriza-se, pois, por uma mudança no domínio e
uso da terra, fruto da desigualdade social e das “invasões das propriedades
privadas”8 que estavam ocorrendo. O individualismo e o poder absoluto são
relativizados, dando lugar ao compartilhamento da terra entre o senhor feudal
e o vassalo, em que pese haverem obrigações recíprocas, não consideradas
eqüitativas.
Cabe destacar, mesmo assim, o encontro de interesses daqueles que não
possuíam terras, mas desejavam e precisam plantar para sobreviver, com
aqueles que possuíam propriedades improdutivas e nelas não queriam
trabalhar. Essa relação, porém, por ser excessivamente onerosa para o vassalo,
aos poucos vai gerando o esgotamento deste modelo, diminuindo os direitos do
senhor feudal. Novamente, aos poucos a propriedade volta a adquirir contornos
individualistas que se consolidariam, posteriormente, com a Revolução
Francesa de 1789.
202
5
LISBOA, Roberto Senise. Manual de Direito Civil. Volume 4: Direitos Reais e Direitos Intelectuais. São Paulo: 3.ª ed., revista
e atualizada. Editora Revista dos Tribunais, 2005, p. 163.
6
CAVEDON, Fernanda de Salles. Op. cit., p. 13.
7
GOMES, Orlando. Op. cit., p. 115.
8
BLANC, Priscila Ferreira. Plano Diretor Urbano e Função Social da Propriedade. Curitiba: Editora Juruá, 2004, p. 27.
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A REVOLUÇÃO FRANCESA COMO MARCO DO DIREITO
MODERNO
A Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, oriunda da
Revolução Francesa, concebe a propriedade como um direito sagrado e
inviolável. Trata-se do marco histórico e ideológico do Direito Moderno,
baseado nos ideários de liberdade, igualdade e fraternidade da Revolução.
Todavia, esta concepção de liberdade foi assegurada como um direito do
proprietário usar de qualquer forma seus bens, agindo sem precisar se preocupar
com a coletividade, dando origem ao Liberalismo que projetava a propriedade
restrita ao aspecto individualista. “Só homens livres podem ser proprietários,
podem adquirir propriedade, porque faz parte da idéia da propriedade a
possibilidade de adquiri-la e transferi-la livremente”.9 Retorna-se, pois, ao
modelo ideológico de propriedade semelhante ao conceito que os romanos
adotavam, de usar, fruir e dispor de maneira absoluta dos seus bens.
Essa concepção de propriedade foi defendida pelo modelo dogmático
positivista desde a Revolução Francesa. De acordo com Plauto Faraco de
Azevedo, este ainda é o arquétipo dominante na atualidade, apesar de estar
sendo combatido nas últimas décadas. Segundo o autor, “este modelo pode ser
compreendido com a ascensão da burguesia ao poder político, após a
Revolução Francesa. Com o Código Civil Francês, o Código de Napoleão,
surge a Escola da Exegese, que proíbe a interpretação do direito”.10
Porém, ao contrário do que se possa imaginar, a transformação de terras
em propriedade privada na concepção atual, não é um fenômeno universal,
“nem histórica nem geograficamente”, conforme afirma Carlos Frederico
Marés de Souza Filho.11 De acordo com o autor, trata-se de uma construção
humana recente, como vimos acima, construída com base no mercantilismo
dos séculos XVI, XVII e XVIII, bem como nos confrontos, violência e guerras
dos séculos XIX e XX, o que ocasionou o “esgotamento teórico e prático” 12
deste modelo.
9. SOUZA FILHO, Carlos Frederico Marés. A função social da terra. Porto Alegre: Sérgio Antonio Fabris. Editor, 2003, p. 18.
10. AZEVEDO, Plauto Faraco de. Ecocivilização: ambiente e direito no limiar da vida. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais,
2005, p. 37.
11. SOUZA FILHO, Carlos Frederico Marés. Op. cit., p. 17.
12. Ibidem, p. 18.
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A VISÃO DE ALGUNS PENSADORES CATÓLICOS SOBRE A
PROPRIEDADE
A Igreja Católica teve um papel relevante na defesa de uma propriedade
mais voltada aos interesses coletivos. Neste aspecto, Carlos Marés,13 citando
Eduardo Rubianes, lembra São Basílio, que por volta do século V teria indagado:
Quem é ladrão? Quem é avaro? Avaro é aquele que não se
contenta com o suficiente. E, se chamamos de ladrão aquele de
desnuda quem está vestido, terá outro nome aquele que não veste
quem está desnudo, podendo fazê-lo? O pão que guardas, é do
faminto; os vestidos que conservas no guarda-roupa, é do
desnudo; o dinheiro que guardas enterrado, é do necessitado.
De forma semelhante, Santo Tomas de Aquino também pregou que a
propriedade não poderia “se opor ao bem comum ou a necessidade alheia”.14
Essa tendência vai “desde Santo Ambrósio, propugnando por uma sociedade
mais justa com a propriedade comum, ou Santo Agostinho, condenando o
abuso do homem em relação aos bens dados por Deus”.15
Como se observa, as posições acima são totalmente opostas à
propriedade no sentido individual, pregando que cada um deveria possuir
apenas o suficiente para sua sobrevivência e necessidade, devendo
compartilhar todos os bens que não sejam necessários com aqueles que não os
possuem. Não haveria, na concepção destes pensadores, acúmulo de bens.
Todavia, essa concepção de socializar os bens não teve espaço
significativo para crescer ao longo da história, predominando a visão
capitalista do acúmulo de propriedade como símbolo de poder na sociedade.
Esse é o pensamento que permanece até hoje. Trata-se do predomínio do
“ter”, em detrimento do “ser”; ou seja, na sociedade contemporânea valorizase o acúmulo de riquezas (propriedades no sentido geral), menosprezando-se
os demais valores humanos. Para Carlos Marés,16 esta é a lógica da
13 Ibidem, p. 20, tradução livre. Citado por Eduardo Rubianes em seu livro El domínio de los bienes segun la doctrina de la
Iglesia, publicada em Quito, pela PUC- Ecuador, em 1993.
14 Ibidem, p. 21.
15 MALUF, Carlos Alberto Dabus. Limitações ao Direito de Propriedade. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2005, p. 73.
16 SOUZA FILHO, Carlos Frederico Marés. Introdução ao Direito Socioambiental. In, O Direito para o Brasil Socioambiental.
LIMA, André. (org.). Porto Alegre: Sérgio Antonio Fabris Editor, 2002, p. 29.
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modernidade, lastreada num sistema onde todos têm direito a serem
proprietários, por isso, já não são mais chamados de cidadãos, mas sim de
consumidores ou usuários.
Ou seja, na sociedade atual valorizam-se aqueles que podem consumir e
adquirir propriedades. Esses bens materiais passaram a ser mais relevantes do
que valores imateriais como ética, respeito, dignidade e paz. Nesta lógica, a
pessoa só será sujeito de direito se for proprietário.
6.
A PROPRIEDADE NA VISÃO PRIVATISTA TRADICIONAL E NA
VISÃO CONSTITUCIONAL CONTEMPORÂNEA
O objetivo deste estudo não é estabelecer definições e conceitos de
forma absoluta, mas sim fazer uma análise crítica descritiva das diferentes
visões acerca do tema propriedade. Optar-se-á por esta metodologia por
entendermos que o direito precisa ser visto e praticado de uma forma dinâmica
que permita ir além de conceitos prontos e acabados, buscando auxiliar na
construção de viabilidades jurídicas que contribuam para uma sociedade mais
plural e eqüitativa.
Neste sentido, temos a visão contemporânea do direito de propriedade,
onde já não prevalece, apesar de ainda existir, “aquele absolutismo pernicioso
que imperava no conceito do direito de propriedade, conferindo ao titular desse
direito prerrogativas excepcionais [...] em detrimento dos interesses que seriam
os mais caros da coletividade”.17
José Afonso da Silva18 explica que:
o direito de propriedade fora, com efeito, concebido como uma
relação entre uma pessoa e uma coisa, de caráter absoluto,
natural e imprescritível. Verificou-se, mais tarde, o absurdo dessa
teoria, porque entre uma pessoa e uma coisa não pode haver
relação jurídica, que só se opera entre pessoas... Demais, o
caráter absoluto do direito de propriedade, na concepção da
Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1789 foi
sendo superado pela evolução, desde a aplicação da teoria do
17 MALUF, Carlos Alberto Dabus. Op. cit., p. 17.
18 SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 12.ª edição revista. São Paulo: Malheiros, 1995, p. 263.
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abuso do direito, do sistema de limitações negativas e depois
também de imposições positivas, deveres e ônus, até chegar-se à
concepção da propriedade como função social, e ainda à
concepção da propriedade socialista, hoje em crise.
Importante destacar a opinião acima, vista sob a ótica constitucionalista,
mostrando a superação privatista do conceito de propriedade pelas normas do
direito público. Para o autor, o conjunto de normas constitucionais sobre
propriedade faz com ela não seja mais considerada como instituição de Direito
Privado, uma vez que a perspectiva civilista não “alcança a complexidade do
tema, que é resultante de um complexo de normas jurídicas de Direito Público
e de Direito Privado”.19
Para Gustavo Tepedino20 a Constituição Federal de 1988 introduziu
profundas transformações na disciplina da propriedade, sendo que “os
civilistas, à época, não se deram conta de tais modificações em toda a sua
amplitude, mantendo-se condicionados à disciplina da propriedade prévigente”. O autor afirma que:
a propriedade, portanto, não seria mais aquela atribuição de
poder tendencialmente plena, cujos confins são definidos
externamente, ou, de qualquer modo, em caráter predominantemente negativo, de tal modo que, até uma certa
demarcação, o proprietário teria espaço livre para suas
atividades e para a emanação de sua senhoria sobre o bem. A
determinação do conteúdo da propriedade, ao contrário,
dependerá de centros de interesses extraproprietários, os quais
vão ser regulados no âmbito da relação jurídica de propriedade.21
Observa-se, pois, a mudança de concepção de propriedade,
principalmente após a Constituição Federal de 1988 que lhe atribuiu uma
função social. Logo, vista sob as lentes constitucionais, a propriedade só será
garantida, nos termos do artigo 5.º, XXII, desde que atenda a sua função social,
conforme estabelece o artigo 5.º, inciso XXIII.
19 Ibidem, mesma página.
20 TEPEDINO, Gustavo. Temas de direito civil. 3.ª edição. Rio de Janeiro: Renovar, 2004, p. 304.
21 Ibidem, p. 317.
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Carlos Frederico Marés de Souza Filho comenta que a propriedade e sua
função social foi um dos temas mais polêmicos no processo constituinte de
1988, pois de um lado estava a questão social propugnando por uma
propriedade relativizada. De outro lado, a “velha propriedade do século XIX,
absoluta, protegida a qualquer preço, como coisa sacrossanta, intocável, como
se fosse o supremo direito de cada um e o paradigma único de liberdade”.22
Neste mesmo sentido o novo Código Civil de 2002, em seu artigo 1.228
reconheceu que o proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa,
mas que o direito de propriedade deve ser exercido em consonância com as
suas finalidades econômicas e sociais, preservando a flora, a fauna, as belezas
naturais, o equilíbrio ecológico, o patrimônio histórico e artístico, evitando a
poluição do ar e das águas.
O disposto no artigo 1.228 do Código Civil explicita uma outra função
que a propriedade deve atender, que é a função ambiental. Para Juliana Santilli,
“o novo ordenamento constitucional obrigou o estatuto civil a redimensionar o
direito de propriedade, dando-lhe nova estrutura e novos contornos
conceituais”.23
Na verdade, tal artigo está em consonância com o disposto na Constituição
Federal, no seu artigo 225, que trata do meio ambiente como bem de uso comum
do povo. De igual forma no inciso II do artigo 186 da Constituição, que trata da
propriedade rural e vincula a função social à preservação do meio ambiente.
Ainda, a título ilustrativo, no artigo 170 da Constituição, nos princípios gerais da
atividade econômica aparecem a propriedade privada, a função social da
propriedade e a defesa do meio ambiente.
7.
A FUNÇÃO SÓCIO-AMBIENTAL DA PROPRIEDADE COMO
NOVO PARADIGMA BIOCÊNTRICO
Na evolução histórica da propriedade observamos que para os Romanos
destacava-se a prerrogativa de usar, fruir e dispor sobre os seus bens. No
feudalismo ocorreu o compartilhamento da propriedade rural, possibilitando
22 SOUZA FILHO, Carlos Frederico Marés. Introdução ao Direito Socioambiental. Op. cit., p. 22 e 23.
23 SANTILLI, Juliana. Socioambientalismo e novos direitos. São Paulo: Peirópolis. IEB – Instituto Internacional de Educação do
Brasil e ISA – Instituto Socioambiental. 2000, p. 89.
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que mais pessoas tivessem acesso a terra. A Revolução Francesa apresentou a
propriedade como um direito sagrado e inviolável, que foi sendo reproduzido
pelo capitalismo, estando ainda hoje presente no inconsciente coletivo
reproduzido pelo ensino jurídico liberal, baseado na dogmática positivista.
Importante destacar a Constituição de Weimar, ou Constituição do
Império Alemão de 11 de agosto de 1919, em seu artigo 153; bem como a
Constituição Mexicana de 31 de agosto de 1917, em seu artigo 27. Para Carlos
Marés, ambas Constituições “adotam como fundamento do direito o conceito
de que a propriedade, para mais de ser um direito é um dever: ‘A propriedade
obriga’, define a Constituição de Weimar; ‘a nação terá sempre o direito de
impor à propriedade privada as regras que dite o interesse público’, arremata a
Constituição Mexicana”.24 Trata-se de uma importante evolução para
chegarmos à propriedade nos moldes hoje conhecido.
A propriedade contemporânea enseja novas observações que indaguem
se os bens apropriados atendem à função social e ambiental preconizadas pela
Constituição Federal e pelo novo Código Civil. Logo, nesta fase, deve-se voltar
os olhos para os tipos de propriedade onde residem interesses da coletividade,
a exemplo da propriedade ambiental.
Essa função sócio-ambiental da propriedade se mostra importante para o
presente trabalho, na medida em que se compreende melhor a transformação
dos bens oriundos da natureza em propriedade privada. Ou, na visão de Juan
Antonio Senent de Frutos, la naturaleza como propriedad común del género
humano a su apropriación privativa.25
Na perspectiva de uma reflexão crítica sobre apropriação do meio
ambiente, observar-se-á como ocorre a transferência de um bem ambiental da
coletividade para a esfera patrimonial individual, por meio do acesso às suas
informações genéticas, o que Cristiane Derani denomina como direito de
acesso como terceira dimensão da apropriação. Neste sentido:
Este direito de apropriação do novo século é chamado de direito
de acesso, numa síntese do direito de acessar informações
contidas em um bem. Assim, é possível que este direito de acesso
gere direitos de propriedade individualizado, podendo, sem risco
24 SOUZA FILHO, Carlos Frederico Marés de. O Renascer dos Povos Indígenas para o Direito. Curitiba: Juruá Editora, 2005, p.
173.
25 FRUTOS, Juan Antonio Senent de.Sociedad del conocimento, biotecnologia y biodiversidad. Revista de Direito Ambiental da
Amazônia – HILÉIA. Manaus: Ano 2, nº 2, 2004, p. 119.
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de conflito ou sobreposição, falar-se em direitos privados de
propriedade sobre um bem, tutelado pelo Código Civil e direitos
privados de propriedade às informações contidas naquele bem,
tutelado pela propriedade intelectual pertencentes a titulares
distintos.26
A conseqüência do acesso à informação genética contida numa planta,
por exemplo, como visto acima, constitui-se numa forma de apropriação, que
irá gerar uma propriedade privada oriunda da biodiversidade. Faz-se necessário
avaliar esta complexa relação da apropriação de bens ambientais cujo interesse
diz respeito à coletividade, (nos termos do artigo 225 da Constituição),
relacionando-o com a função social da propriedade. Para Cristiane Derani,
“esse tratamento da relação de propriedade marca a diferença entre Estado
liberal e Estado social. Enquanto o primeiro garante a propriedade privada
contra terceiros, o segundo preocupa-se com a melhoria da vida social a partir
dessa apropriação privada de bens”.27
A Constituição Federal de 1988, em seu artigo 5.º, expressa essas duas
vertentes aparentemente antagônicas, quando garante o direito de propriedade
no inciso XXII, mas estabelece que ela atenderá a sua função social no artigo
XXIII. Ou seja, a antinomia aparente entre os dois incisos citados resulta da
diferença de percepção ideológica do Estado Liberal e do Estado Social.
Portanto, essa é a análise efetuada no presente artigo, de onde infere-se
que toda propriedade, seja pública ou privada, móvel ou imóvel, corpórea ou
incorpórea, deve atender e cumprir sua função sócio-ambiental. Neste sentido,
Paulo Luiz Neto Lobo esclarece:
A concepção de propriedade, que desprende da Constituição, é
mais ampla que o tradicional domínio sobre coisas corpóreas,
principalmente imóveis, que os códigos civis ainda alimentam.
Coenvolve a própria atividade econômica, abrangendo o controle
empresarial, o domínio sobre ativos mobiliários, a propriedade
de marcas, patentes, franquias, biotecnologias e outras
propriedades intelectuais. Os direitos autorais de software
26 DERANI, Cristiane. Tutela Jurídica da Apropriação do Meio Ambiente e as Três Dimensões da Propriedade. Revista de Direito
Ambiental da Amazônia – HILÉIA. Manaus: Ano 1, nº 1, 2003, p.71.
27 DERANI, Cristiane. A Propriedade na Constituição de 1988 e o conteúdo da “função social”. Revista de Direito Ambiental. São
Paulo: Editora Revista dos Tribunais. Ano 7, nº 27, 2002, p.59.
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transformaram seus titulares em megamilionários. As riquezas
são transferidas em rápidas transações de bolsas de valores,
transitando de país a país, em investimentos voláteis. Todas essas
dimensões de propriedade estão sujeitas ao mandamento
constitucional da função social (grifamos).28
Como se percebe, a função social incide sobre várias formas de
propriedade, principalmente se nelas recair algum interesse da coletividade.
Logo, as informações genéticas oriundas da biodiversidade, por exemplo,
quando apropriados e transformados em propriedade privada, estão sujeitas,
também, ao princípio da função social e ambiental previstos no ordenamento
jurídico pátrio.
Neste aspecto, Paulo Luiz Neto Lobo ressalta que o meio ambiente é
bem de uso comum do povo e “prevalece sobre qualquer direito individual de
propriedade, não podendo ser afastado até mesmo quando se deparar com
exigências de desenvolvimento econômico (salvo quando ecologicamente
sustentável)”.29
Trata-se, pois, de um novo paradigma da propriedade, sob forte
influência das regras constitucionais ambientais. É o que José Robson da
Silva30 denominou de “Paradigma Biocêntrico: do Patrimônio Privado ao
Patrimônio Ambiental”.
Com esse novo “Paradigma Biocêntrico que se detecta no sistema
constitucional brasileiro”,31 percebe-se que a influência do discurso da
propriedade vista de forma absoluta, reproduzida pelo ensino jurídico por
séculos, finalmente começa a ceder espaço para uma nova concepção baseada na
função social e ambiental da propriedade. Neste sentido, Juliana Santilli afirma:
Os manuais de Direito Ambiental costumam incluir a função
sócio-ambiental da propriedade entre os princípios desse novo
ramo autônomo do Direito, com base numa releitura ‘ambiental’
da função social da propriedade. Consideramos que a função
28 LOBO, Paulo Luiz Neto. Constitucionalização do Direito Civil. Revista de Informação Legislativa, Brasília, n. 141, p. 99-109,
jan./mar. 1999, p. 107.
29 Ibidem, p. 106.
30 SILVA, José Robson da. Paradigma Biocêntrico: do Patrimônio Privado ao Patrimônio Ambiental. Rio de Janeiro: Editora
Renovar, 2002.
31 Ibidem, p. 375.
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sócio-ambiental da propriedade é muito mais do que um princípio
específico do Direito Ambiental: é um princípio orientador de
todo o sistema constitucional que irradia os seus efeitos sobre
diversos institutos jurídicos. A função sócio-ambiental da
propriedade permeia a proteção constitucional à cultura, ao meio
ambiente, aos povos indígenas e aos quilombolas.32
Essa concepção contemporânea de propriedade busca cumprir sua
função sócio-ambiental, não se aplicando apenas para bens imóveis e
corpóreos, incidindo, por exemplo, em bens do patrimônio cultural, do meio
ambiente, do patrimônio genético e da propriedade intelectual. Trata-se de um
reordenamento do sistema jurídico que inseriu obrigações aos proprietários em
relação à coletividade, ocasionando o deslocamento do instituto da propriedade
do Direito Privado para o Direito Público.
Para Carlos Frederico Marés de Souza Filho, “deve ficar claro que o que
interessa ao Direito Socioambiental é o caráter coletivo destes direitos e não
sua realização individual”.33 Esse interesse coletivo se constitui na essência da
função social da propriedade. Exemplo disso é o direito de todos ao meio
ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo,
competindo à coletividade e ao Poder Público, nos termos do artigo 225 da
Constituição Federal de 1988, defendê-lo e preservá-lo para as presentes e
futuras gerações.
A incidência deste direito da coletividade sobre os bens ambientais se
sobrepõe ao direito individual. Neste aspecto, Juliana Santilli destaca que
“independentemente do domínio público ou privado, o interesse coletivo
condiciona e restringe a utilização que o proprietário público ou particular faça
dos bens sócio-ambientais”.34 Ou seja, a função sócio-ambiental da propriedade
altera a própria essência do instituto da propriedade.
32 SANTILLI, Juliana. Op. cit., p. 86.
33 SOUZA FILHO, Carlos Frederico Marés. Introdução ao Direito Socioambiental. In, O Direito para o Brasil Sócio-ambiental.
LIMA, André. (org.). Porto Alegre: Sérgio Antonio Fabris Editor, 2002, p. 32.
34 SANTILLI, Juliana. Op. cit., p. 89.
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CONCLUSÃO
Como foi afirmado anteriormente, a intenção deste artigo não é buscar
conceitos e definições que tenham a pretensão de estabelecer verdades
absolutas. Tão pouco o espaço disponível para o trabalho nos permite esgotar
o tema, até mesmo por não ser esse o propósito.
O que se almejou foi demonstrar uma percepção sobre o instituto da
propriedade dentro de uma visão contemporânea, onde concluímos existir um
novo paradigma biocêntrico que ultrapassa as fronteiras do Direito Privado
para encontrar abrigo no Direito Público.
Esse fenômeno, também chamado de constitucionalização do direito
civil, retirou da propriedade seu caráter individualista, fazendo-a cumprir sua
função social e ambiental. “A propriedade tornou-se um tema de direito
público, isto é, de interesse público e como tal passou a ser tratada pela
Constituição”.35
De qualquer forma, na concepção trabalhada neste artigo, buscou-se
demonstrar a necessidade de construirmos um ensino jurídico crítico,
reflexivo, criativo, transdisciplinar e voltado para a realidade social como
forma de melhor compreender os novos paradigmas da propriedade, focado
nos interesses da coletividade, afastando-se da dogmática positivista. Neste
aspecto, Plauto Faraco de Azevedo afirma:
o positivismo exegético, explicável, à sua época, hoje constitui um
óbice à formação e ao raciocínio jurídicos, estiolando o
pensamento e concorrendo à formação da ‘mão-de-obra sem
cabeça’, contribuindo à submissão de número ponderável de
juristas ao status quo, seja ele qual for – hoje o neoliberal.36
Sérgio Rodrigues Martinez37 explica como foi sendo consolidado este
arquétipo liberal nos cursos jurídicos nacionais, oriundos da Faculdade de
Direito de Coimbra do século XIX, cuja base teórica fundava-se no discurso
científico jus-racional do liberalismo positivista. O autor registra que no
primeiro centenário da criação dos cursos de Direito no Brasil, em 1927,
35 SOUZA FILHO, Carlos Frederico Marés. Introdução ao Direito Socioambiental... op. cit., p. 23.
36 AZEVEDO, Plauto Faraco de.Ecocivilização: ambiente e direito no limiar da vida. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais,
2005, p. 38.
37 MARTINEZ, Sérgio Rodrigo. M a n u a l d a E d u c a ç ã o J u r í d i c a . Curitiba: Juruá, 2004, p. 25..
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surgiam as primeiras críticas às aberturas indiscriminadas de Faculdades de
Direito, surgindo o termo “fábrica de bacharéis” em alusão ao “modelo
fordista”38 de produção de automóveis.
Esse arquétipo liberal ainda se faz presente em parte dos cursos de
Direito e no inconsciente coletivo de muitos alunos. Pode-se entender por
inconsciente coletivo os padrões automatizados que vão sendo repetidos de
forma geral, quase sempre instintivamente e por impulsos, praticamente de
forma mecânica, consolidando-se no senso comum e reproduzindo-se subliminarmente.
No inconsciente coletivo predomina o entendimento que o bom
professor continua sendo aquele que tem uma boa oratória, com uma retórica
baseada em palavras difíceis que impressione seus alunos, independente de
preocupar-se com a qualidade do conteúdo que se está ensinando. Ou, ainda,
muitas vezes pensa-se que o bom professor será aquele que atingiu êxito
profissional na sociedade onde vive, sendo que na maioria das vezes esse
entendimento costuma ser confundido com sucesso financeiro. Nem sempre,
porém, um bom profissional da área jurídica será um bom professor de direito,
assim como o inverso também é verdadeiro.
As mudanças no modelo de ensino jurídico tradicional, aos poucos têm
contribuído para modificar as concepções de propriedade, permitindo que a
função sócio-ambiental insculpida na Constituição Federal seja difundida para
além da propriedade imóvel e aumente sua eficácia social.
Exemplo disso são os direitos de propriedade intelectual, vistos num
primeiro momento como direitos exclusivamente individuais, que hoje
começam a ser rediscutidos em alguns casos como direitos coletivos de
propriedade intelectual.
Essa vertente ganha mais força quando se trata de propriedade
intelectual oriunda de bens ambientais, principalmente por meio da
biotecnologia, onde muitas vezes para fabricar novos produtos para o mercado,
as empresas se utilizam de conhecimentos dos Povos Indígenas e das
populações que sobrevivem da floresta.
Fica evidenciada a incidência da função social da propriedade sobre
estes bens oriundos da natureza, uma vez que pertencem à coletividade, não
podendo perder esta característica quando são apropriados por meio de um
38 Ibidem, p. 30
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registro de patente, principalmente se esta apropriação não respeitar os direitos
dos povos detentores dos saberes tradicionais sobre a natureza.
Disso decorre a necessidade de se fazer uma nova leitura da Lei 9.279
de 14 de maio de 1996, a Lei de Propriedade Industrial, levando-se em conta o
princípio constitucional da função sócio-ambiental da propriedade incidindo
sobre os direitos de propriedade intelectual.
Logo, resta a certeza de que o ensino do direito deve alargar seus
horizontes, debruçando-se sobre o estudo da função sócio-ambiental da
propriedade intelectual como um fator de desenvolvimento tecnológico e
científico, respeitando o direito dos povos e das gerações presentes e futuras ao
meio ambiente equilibrado como base de uma sadia qualidade de vida, nos
termos almejados pelo legislador constituinte.
Conclui-se, pois, que a propriedade contemporânea, seja móvel ou
imóvel, não pode mais ser vista numa concepção individualista dissociada dos
interesses da coletividade e da preservação do meio ambiente.
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vida. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2005.
BLANC, Priscila Ferreira. Plano Diretor Urbano e Função Social da
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CAVEDON, Fernanda de Salles. Função Social e Ambiental da Propriedade.
Florianópolis: Editora Momento Atual, 2003.
DERANI, Cristiane. Tutela Jurídica da Apropriação do Meio Ambiente e as
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HILÉIA. Manaus: Ano 1, n.º 1, 2003.
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Ano 2, n.º 2, 2004.
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GOMES, Orlando. Direitos Reais. 19.ª ed. Atualizada por Luiz Edson Fachin.
Rio de Janeiro: Editora Forense, 2005.
JUNIOR, Eroulths Cortiano. O Discurso Jurídico da Propriedade e suas
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LISBOA, Roberto Senise. Manual de Direito Civil. Volume 4: Direitos Reais e
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LOBO, Paulo Luiz Neto. Constitucionalização do Direito Civil. Revista de
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MARTINEZ, Sérgio Rodrigo. Manual da Educação Jurídica. Curitiba: Juruá,
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Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2005.
SANTILLI, Juliana. Socioambientalismo e novos direitos. São Paulo:
Peirópolis. IEB – Instituto Internacional de Educação do Brasil e ISA- Instituto
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Patrimônio Ambiental. Rio de Janeiro: Editora Renovar, 2002.
SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 12.ª edição
revista. São Paulo: Malheiros, 1995.
SOUZA FILHO, Carlos Frederico Marés. A função social da terra. Porto
Alegre: Sérgio Antonio Fabris. Editor, 2003.
SOUZA FILHO, Carlos Frederico Marés. Introdução ao Direito
Socioambiental. In, O Direito para o Brasil Socioambiental. LIMA, André.
(org.). Porto Alegre: Sérgio Antonio Fabris Editor, p. 21-48, 2002.
SOUZA FILHO, Carlos Frederico Marés de.
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ANÁLISE DA CULPABILIDADE E DA
RESPONSABILIDADE DO DANO
AMBIENTAL: REFLEXÕES A PARTIR DE
UMA MISSÃO DE FISCALIZAÇÃO DO
IBAMA NO INTERIOR DO ESTADO DO PARÁ
Daniel Abrahão do Nascimento*
Sumário: Introdução; 1. Desenvolvimento: Conhecendo o cenário e o começo dos “crimes”; 2.
A Insuficiência do aparelho estatal e o legado de um modelo de desenvolvimento; 3. A
culpabilidade e a responsabilidade do dano ambiental Considerações Finais; Referências.
Resumo: O artigo é uma análise da
culpabilidade nos crimes ambientais. Procurase fazer seu estudo com base no aspecto socialantropológico da população. A temática
centraliza-se na discussão da culpabilidade
criminal no projeto de assentamento de PlacasPA. Demonstra a desatenção dos órgãos
estatais com os problemas locais. Procura
relacionar o descaso estatal com a exploração
dos trabalhadores do projeto por parte das
madeireiras. Demonstra como o INCRA é
omisso ao não fiscalizar as áreas em que
concede permissão para assentamentos. Os
erros dos projetos de assentamento resultam
na degradação do meio-ambiente, em face das
carências dos habitantes locais. Desse fato,
decorre que várias famílias são assentadas em
áreas de preservação permanente, o que é
considerado crime. Por meio de uma análise
penal, aborda o autor a relação “culpado e/ou
vítima”. Observa a necessidade da equiparação
de valores culturais e sociais para a imputação
dos crimes ambientes. Reflete sobre a
necessidade da utilização do meio ambiente
equilibrado na melhoria da qualidade de vida.
Sustenta que a proteção ao meio ambiente é
necessária para a garantia desse predicado.
Assim, sintetiza a problemática do direito de
punir do Estado de acordo com o grau de
culpabilidade dos indivíduos.
Abstract: The article is an analysis of
culpability in environmental crimes. It is
intended to accomplish this study based on the
social-anthropological aspect of the population. The thematic is directed to the discussion
of criminal culpability in the settlement project
of Placas-PA. It demonstrates the inattention of
State organs towards the local problems. It
seeks to relate the State negligence to the
exploitation of workers from the project by the
Lumber Companies. It demonstrates negligent
INCRA is when it does not control the areas in
which it concedes permission for settlements.
The mistakes of the settlement projects result
in the degradation of the environment, in
relation to the local inhabitants’ needs. Many
families are settled in permanent preservation
areas due to that, which is considered a crime.
By means of penal analysis, the author
approaches the relation “guilty and/or victim”.
He observes the necessity of equalization of
cultural and social values for the imputation of
environmental crimes. He also reflects about
the necessity of the utilization of a balanced
environment for improvement of quality of
life. It is sustained that the environment
protection is necessary to guarantee this
predicate. Thus, it summarizes the State’s right
to punish according to the subjects’ culpability.
Palavras-chave: Crime Ambiental; Fiscalização do IBAMA; Culpabilidade.
Key-words: Environmental Crime, IBAMA’s
Inspection, Culpability.
*
Engenheiro Agrônomo, Advogado, Analista Ambiental do IBAMA, Mestrando do Programa de Pós-graduação em Direito
Ambiental da Universidade do Estado do Amazonas e Bolsista do Programa BECA-IEB/Fundação MOORE
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INTRODUÇÃO
A partir da antropologia, analisando os conceitos de etnocentrismo,
relativização, diferença, identidade, alteridade, e também com fundamento nos
texto de Pierre Clastres,1 Neide Esterci2 e José Helder Benatti,3 buscar-se-á
realizar uma reflexão sobre fatos ocorridos em uma missão fiscalizatória do
IBAMA (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais
Renováveis) do Plano DESMATE4 e sobre a aplicação do direito ambiental a
essa realidade.
Trata-se, notadamente da situação dos lotes dos agricultores assentados
do Projeto de Assentamento Placas, no Município de Placas no Pará e suas
autorizações de desmatamentos,5 bem como das autuações diante da apuração
de irregularidades principalmente, no que tange a desmatamentos em áreas de
preservação permanente.
Em um cenário de crime ambientais, busca-se analisar a culpabilidade
dos atores envolvidos, o desencadeamento da responsabilização administrativa, civil e penal do dano ambiental, partindo de uma visão antropológica,
sociológica da realidade. Ao demonstrar as repercussão jurídicas, propõem as
formas de responsabilização e composição para a defesa e recuperação do meio
ambiente.
Assim, em um primeiro momento será realizado o relato da missão de
fiscalização do IBAMA no Projeto de Assentamento Placas, no Município de
Placas no Pará. No segundo momento, pretende-se analisar e avaliar,
respectivamente, o papel do estado e o modelo de desenvolvimento econômico
implantado na região, onde ocorreu a referida missão fiscalizatória, para
identificar a causa da prática dos danos ambientais apurados e fazer uma
reflexão sobre a culpabilidade e a responsabilização dos infratores. Por fim, ao
demonstrar a repercussão no direito ambiental passa a propor as formas de
composição na defesa e na recuperação do meio ambiente.
218
1
CLASTRES, Pierre. “A Sociedade contra o Estado” In: A Sociedade contra o Estado – pesquisas de antropologia política. São
Paulo: Cosac & Naify, 2003.
2
ESTERCI, Neide. “Conflitos Ambientais e Processos Classificatórios na Amazônia Brasileira” In: Boletim Rede Amazônia ano1
n.°1, 2002, pp. 51 a 62.
3
BENATTI, José Helder. “A Titularidade da Propriedade Coletiva e o Manejo Comunitário”. In: Boletim Museu Paraense Emílio
Goeldi, série antropologia, 18 (2), 2002, pp. 127-165.
4
Plano de Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazônia, por ordem e iniciativa de decisão política do governo federal,
que a finalidade era apurar os desmatamentos detectados por imagens de satélites e fazer as fiscalizações de rotina.
5
Ato administrativo que autoriza a conversão do uso do solo, os procedimentos deste ato, nos imóveis e propriedades rurais
da Amazônia Legal, são definidos pela Instrução Normativa n.°3 de 04/03/2002 do Ministério do Meio Ambiente.
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CONHECENDO O CENÁRIO E O COMEÇO DOS “CRIMES”
A equipe do IBAMA dirigiu-se ao município de Placas,6 ao Projeto de
Assentamento do INCRA, e constatou in loco que quase todos os lotes deste
projeto se localizavam em áreas de preservação permanente,7 Alguns dos
assentados já haviam desmatado uma parte dos seus lotes, para o uso
alternativo do solo, ou seja, para plantarem cacau, mogno e algumas lavouras
temporárias (mandioca, amendoim etc.). Alguns agricultores assentados
alegaram que não sabiam da proibição de se desmatar áreas de preservação
permanente, nem mesmo sabiam o que significava o termo APP (Área de
Preservação Permanente). E como haviam recebido o crédito para o plantio do
cacau através do PRONAF,8 tiveram que “abrir áreas para o plantio” e “hoje,
vem o Ibama e nos proíbe de usar as áreas e quer nos multar”, afirmou um dos
assentados.
Foi observado que havia dentro do Assentamento várias estradas e sinais
de exploração ilegal de madeira. A equipe do IBAMA em busca dos responsáveis
pela exploração ilegal de madeira, encontrou na saída do Assentamento uma
empresa madeireira totalmente irregular onde foram feitas as medições e
apreensões das madeiras, os equipamentos foram lacrados e a atividade
embargada. Vale destacar que o IBAMA – Instituto Brasileiro do Meio Ambiente
e dos Recursos Naturais Renováveis, é uma autarquia federal, foi criado pela Lei
7735/89, de 22 de fevereiro de 1989. Ele está vinculado ao Ministério do Meio
Ambiente – MMA sendo o responsável pela execução da Política Nacional do
Meio Ambiente e desenvolve diversas atividades para a preservação e
conservação do patrimônio natural, exercendo com poder de polícia
administrativa, o controle e a fiscalização sobre o uso dos recursos naturais.
Destaque-se ainda que ao realizar o levantamento de informações sobre
o comércio da madeira na região, constatou-se que: os madeireiros compram
6
Município do Oeste do Pará, com população de 13.394 habitantes (Censo de 2000) e área territorial de 7.173,15 km2 fonte:
BNDES. Acesso - http://www.federativo.bndes.gov.br/destaques/bdg/bdg_mun.asp?idgeo=150565
7
Área protegida nos termos dos arts. 2.º e 3.º do Código Florestal, coberta ou não por vegetação nativa, com a função
ambiental de preservar os recursos hídricos, a paisagem, a estabilidade geológica, a biodiversidade, o fluxo gênico de fauna
e flora, proteger o solo e assegurar o bem-estar das populações humanas.
8
Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar. O Pronaf tem duas linhas de crédito específicas para os
assentados. Um deles, o chamado Pronaf A, é destinado àquelas famílias que acabaram de receber a terra e precisam montar
toda a infra-estrutura básica para iniciar a produção. O outro, conhecido como Pronaf A/C destina-se aos produtores que
estão em uma fase de transição de assentados para agricultores familiares. Ou seja, eles já receberam os investimentos do
grupo A e agora precisam de novos recursos para dar continuidade à produção.
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desses agricultores a madeira por um preço irrisório (R$ 25,00/m2) e vendem,
para exportação, a um preço absurdamente superior (US$ 800,00); os
assentados, através das autorizações do IBAMA, só podem explorar 3,0
hectares por ano, ou seja, 60 m2/ano, perfazendo um valor anual apurado de R$
1500,00 (menos do que metade de um salário mínimo/mês).9 Os madeireiros
para garantir ainda mais a “exploração”, fazem o pagamento adiantado,
“ajudam” na construção de estradas dentro do próprio assentamento e
providenciam as formas de obtenção, oficial e oficiosa, dos recursos naturais,
contratando profissionais para elaboração de projetos de manejo florestal e
autorizações de desmatamentos, oferecendo assistências técnica aos
“detentores” dos recursos naturais dos lotes.
Na ocasião dessa missão, a equipe foi convidada a comparecer à Câmara
Municipal do Município de Placas para dar satisfação à comunidade da
presença no município. Na realidade, a presença do IBAMA provocou uma
mobilização das pessoas, que assustadas procuraram à prefeitura pedindo
explicações, os representantes do comércio, das madeireiras, enfim dos
segmentos sociais, solicitaram explicações ao governo municipal do ocorrido.
Uma reunião foi marcada na prefeitura e outra na Câmara Municipal, para o
Ibama explicar sua atuação na região.
O coordenador da equipe de fiscalização e em nome da instituição
agradeceu e elogiou a iniciativa popular de ser convidado a dar explicação e
ressaltou que essa preocupação e iniciativa deveriam ocorrer, não só com a
presença do IBAMA na região, mas sempre que houvesse seção, porque o que
se trata na Câmara Municipal é do interesse do povo. Disse que uma, dentre as
tarefas mais importantes da fiscalização ambiental é, sobretudo, prevenir o
dano ambiental, sendo muito mais importante do que punir, porque muitas das
vezes o dano ambiental é difícil e irreversível de ser sanado ou recuperado. E
prevenir só se consegue com informação e com educação ambiental e por isso
disse que se encontrava à disposição para prestar qualquer informação e
cumprir o objetivo maior da presença da equipe no município.
Com muita propriedade um dos representantes do comércio local fez
uma breve análise histórica da colonização do município, dizendo da época em
9
220
Levantamento de informações feito pela equipe de fiscalização do IBAMA, coordenada pelo autor do presente artigo, realizado
na ocasião da “Operação Zoraide” no período de 07 de julho a 06 de agosto de 2005; para promover ações fiscalizatórias
referentes ao Plano de Prevenção e Combate do Desmatamento na Amazônia – Plano Desmate, nos municípios de Placas,
Rurópolis e Uruará; conforme Ordem de Fiscalização n.º 047/2005; priorizando os casos de desmatamentos recentes e em
andamento.
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que o projeto de governo Médice era promover a ocupação da Amazônia, onde
se incentivava a derrubada da mata para a agricultura e pecuária para promover
o “desenvolvimento” e ocupação do local, o lema era “ocupar para não
entregar”. Principalmente, no eixo da Transamazônica,10 para onde diversas
pessoas provenientes de toda parte do Brasil, vieram viver e desenvolver o
lugar. Hoje, apesar de Placas ser um município pequeno (zona urbana), vive da
extração da madeira, da agricultura e da pecuária.
Além disso, diversos foram os questionamentos referentes ao papel do
IBAMA e dos órgãos públicos no município. Muitos cidadãos alegaram que se
fechassem as madeireiras, muitas pessoas iriam morrer de fome, pois são
sustentados através do trabalho nessa atividade. Outros reclamaram do Incra,
outros chegaram a falar e questionar sobre a demora do Zoneamento Ecológico
Econômico11 para a região.
Em resposta as indagações, sustentou-se que, apesar dos inúmeros
problemas de ordem burocrática por parte dos órgãos do governo,
principalmente do Ibama, o que não se pode admitir é o fato de algumas
madeireiras trabalharem legalmente e outras trabalharem ilegalmente,
instalando-se uma verdadeira concorrência desleal. Quanto ao Ibama fechar
uma madeireira que está trabalhando ilegalmente, tal ação ocorre justamente
para aplicar a legislação, com isso se estabelecer um controle.
A equipe do Ibama marcou outra reunião com todas as organizações de
assentados da área, Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Placas, Incra,
Secretaria Municipal de Agricultura, alguns vereadores e demais segmentos do
município. Foram esclarecidas as dúvidas das exigências da legislação
ambiental em vigor, as alternativas de exploração das áreas de floresta e
orientações para o Manejo Florestal. Na reunião o Incra reconheceu o equivoco
10 Ao tomar posse como presidente do país, o general Emílio Garrastazu Médici (ditador de 1969 a 1974) prometeu conduzir
o Brasil “à plena democracia”. O conduziu rapidamente, com punho de aço, para aqueles que foram chamados de “anos de
chumbo” de repressão brutal. Diz uma adocicada história oficial que, no dia 6 de junho de 1970, o presidente foi ao semiárido nordestino e emocionou-se diante do drama da seca. Dentro do avião que o trazia de volta a Brasília decidiu pela
construção da Transamazônica, para convidar “os homens sem terra do Brasil a ocuparem as terras sem homens da
Amazônia”. Ao longo do trecho, o plano previa a construção de “agrovilas” (conjuntos de lotes com casas instaladas no
espaço de 100 ha, que deveriam contar com uma escola de 1.º grau, uma igreja ecumênica e um posto médico), de
“agrópolis” (reunião de agrovilas fornecidas com serviços bancários, correios, telefones e escola de 2.º grau) e de
“rurópolis” um conjunto de agrópolis. Na prática, foram implantadas poucas agrovilas e apenas uma agrópolis (Brasil Novo)
e uma rurópolis (Presidente Médici). O custo da construção da Transamazônica, que nunca foi acabada, foi de US$ 1,5
bilhão. Fonte: http://www.comciencia.br
11 Zoneamento Ecológico-Econômico da área de influência da BR-163, um instrumento de ordenamento e regulação do uso
racional do território. http://www.ufpa.br/portalufpa/imprensa/
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da falta de estudos prévios na área, e se dispôs a fazer um estudo para retirar
as pessoas das áreas de preservação permanente, reassentá-las em outras áreas.
Finalmente, diversos foram os esclarecimentos e as advertências, no
Sindicato dos Trabalhadores Rurais com a presença dos representantes dos
Assentamentos, com a obrigação de dar publicidade e divulgar para todos os
seus representados. Foi comunicada a gerência do IBAMA a necessidade da
imediata composição de uma nova equipe com a finalidade específica de
retornar ao assentamento para apurar os crimes (devido à quantidade de lotes a
serem vistoriados necessitaria de uma equipe maior e com disponibilidade de
fazer todo o procedimento), suspender as autorizações de desmatamento ou
emissão de qualquer ATPF (Autorização de Transporte Florestal). Enfim, este
foi o cenário.
2.
A INSUFICIÊNCIA DO APARELHO ESTATAL E O LEGADO DE
UM MODELO DE DESENVOLVIMENTO
Observa-se, no relato do caso, uma primeira falha nas ações do Estado,
particularmente através do INCRA (Instituto Nacional de Colonização e
Reforma Agrária), que assentou famílias em áreas de preservação permanente,
consequentemente demonstra a falta de um estudo prévio de impacto
ambiental. A resolução do Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA)
Nº. 289, de 25 de outubro de 2001 prevê Licenciamento Ambiental para os
Assentamentos de Reforma Agrária, como medida de precaução, como bem
explica a sua introdução:
O CONSELHO NACIONAL DO MEIO AMBIENTE-CONAMA,
tendo em vista as competências que lhe foram conferidas pela Lei
nº 6.938, de 31 de agosto de 1981, regulamentada pelo Decreto
n.º 99.274, de 6 de julho de 1990, e tendo em vista o disposto nas
Resoluções CONAMA nºs 237, de 19 de dezembro de 1997 e 001,
de 23 de janeiro de 1986 e em seu Regimento Interno, e
Considerando a necessidade de uma regulamentação específica
para o licenciamento ambiental de projetos de assentamento de
reforma agrária, tendo em vista a relevância social do Programa
Nacional de Reforma Agrária;
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Considerando a necessidade de solucionar a injustiça social e os
graves conflitos pela posse da terra, ocorrentes em quase todas as
regiões do território nacional, impedindo que a tensão social leve
a episódios que ponham em risco a vida humana e o meio
ambiente;
Considerando que a redução das desigualdades sociais pela
ampliação do acesso à terra constitui-se em objetivo fundamental
do Pais nos termos da Constituição Federal, em prioridade e
compromisso nacional constantes da Carta do Rio, da Agenda 21
e de demais documentos decorrentes da Rio-92; e
Considerando a importância de se estabelecer diretrizes e
procedimentos de controle e gestão ambiental para orientar e
disciplinar o uso e a exploração dos recursos naturais,
assegurada a efetiva proteção do meio ambiente, de forma
sustentável nos projetos de assentamento de reforma agrária;
Considerando que a função principal do licenciamento ambiental
é evitar riscos e danos ao ser humano e ao meio ambiente sobre
as bases do princípio da precaução, resolve:
Art. 1.º Os procedimentos e prazos estabelecidos nesta Resolução
aplicam-se, em qualquer nível de competência, ao licenciamento
ambiental de projetos de assentamento de reforma agrária. [...]12
A previsão legal encontra, no presente caso, uma perfeita aplicação,
todavia, na época da criação do projeto de assentamento de Placas, não fora
aplicada. Hoje, através desta resolução do CONAMA, se vislumbra a
importância da unidade substancial entre as normas de Direito Agrário e de
Direito Ambiental para aliar e interagir a atividade agrária à preservação dos
recursos naturais (Benatti, 2002). Ou seja, se houvesse, através da resolução
citada, a aplicação de uma análise prévia da possibilidade da efetivação de um
projeto de assentamento para fins agrários sem prejudicar o meio ambiente,
estaria se aplicando o princípio da precaução. Enfim, somente através do
12 Resolução CONAMA n.º 289, de 25 de outubro de 2001.
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licenciamento ambiental, os órgãos competentes do Estado (INCRA e
IBAMA) teriam procedimentos e controles articulados na efetivação de um
projeto de assentamento aliado à preservação do seu meio ambiente.
Aplicando-se os procedimentos preconizados para o licenciamento ambiental,
vislumbrariam as possibilidades de implantação do projeto de assentamento e
o seu respectivo impacto no meio ambiente.
A falta da aplicação de um licenciamento ambiental e de um estudo de
aptidão agrícola teve conseqüências desastrosas tanto para a natureza quanto para
os próprios beneficiários dos lotes de Reforma Agrária. As pessoas são assentadas
em uma área imprópria, insistem em um modelo econômico convencional por não
terem uma efetiva assistência técnica por parte do aparelho estatal, com isso, não
encontram opções mais adequadas que as tirem dessa situação de
subdesenvolvimento e ficando vulneráveis as explorações de um sistema
opressor, representado no caso, pelos madeireiros intermediários e ilegais.
Os agricultores assentados são obrigados, para suprirem suas
necessidades imediatas, a buscar na natureza, a qualquer preço, sua
sobrevivência e passam a ser alvos dos “oportunistas” compradores de
madeiras. Mais uma vez o Estado é substituído pelo a força de um sistema
opressor que cresce na sua ausência.
E em detrimento, de uma Reforma Agrária que busca aos objetivos
propostos de um projeto social, econômico e sustentável, ficaram-se os
passivos desastrosos (ambientais, sociais e econômicos). Com referência a
obra de Pierre Clastres, onde a antropologia política demonstra que as formas
de acumulação do capital influenciado pelo Estado na sociedade primitiva
eram muito prejudiciais, podendo se concluir que melhor seria se não houvesse
esse Estado. Como na sociedade primitiva, que pelo menos não haveria a
possibilidade dessa concorrência desigual, como afirma Clastres:13
Na sociedade primitiva, sociedade essencialmente igualitária, os
homens são senhores de sua atividade, senhores da circulação
dos produtos dessa atividade: eles só agem para si próprios,
mesmo se a lei de troca dos bens mediatiza a relação direta do
homem com seu produto [...] .
13 CLASTRES, Pierre. “ A S o c i e d a d e c o n t r a o E s t a d o ” In: A Sociedade contra o Estado – pesquisas de antropologia
política. São Paulo: Cosac & Naify, 2003. p. 215.
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O modelo econômico ora implantado desde sua colonização e até hoje
utilizado, não tem trazido benefício, do ponto de vista econômico e social, de
forma eqüitativa para o povo da Amazônia. Como demonstra Fearnside:14
Nas décadas de 60 e 70 os Planos de Desenvolvimento da
Amazônia foram direcionados para favorecer a implantação dos
“Grandes Projetos”, através de subsídios e incentivos fiscais
governamentais e do acesso facilitado a terras para grandes
grupos privados, que causaram profundas transformações
econômicas e sociais nas áreas atingidas. Dentre as graves
conseqüências e contradições do modelo implantado, citam-se:
aumento da concentração fundiária e conflito no campo,
aceleração do desmatamento, desorganização do espaço social e
cultural das comunidades locais, alagamento de florestas e áreas
habitadas por populações tradicionais e desequilíbrios
ecológicos, causados pelas hidroelétricas, poluição dos rios por
mercúrio, falta de integração territorial e econômica dos projetos
na região e exclusão da produção familiar, pauperização da
população rural e inchaço das cidades.
Constata-se que o passivo ambiental é enorme neste tipo de modelo,
porque o nível de degradação ambiental é visto sem nenhuma dificuldade.
Derrubar a floresta para fazer plantios, seja para agricultura ou para pecuária,
e até mesmo para a exploração irracional de madeiras, não é e nunca vai ser a
opção mais viável e sustentável. Os estudos mostram que a floresta dá muito
mais lucro “em pé” do que derrubada, através da exploração de óleos,
essências, frutos e folhagens, um exemplo é o que mostra o texto a “renda
invisível”15:
A floresta oferece remédios, comidas, fibra e caça para seus
moradores. Para medir a importância da floresta na economia
doméstica, 30 famílias da comunidade de Quiandeua, no Rio
Capim, em 1994, pesaram todos os produtos florestais que elas
14 Fearnside, P.M. 1998. Agrosilvicultura na política de desenvolvimento na Amazônia Brasileira: A importância e os limites de
seu uso em áreas degradadas. Pp.293-312 In: C.Gascon & P. Moutinho (eds.) Floresta Amazônica: Dinâmica, Regeneração
e Manejo. Instituto nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA), Manaus. 373 pp.
15 SHANLEY, Patrícia Frutíferas e Plantas Úteis na Vida Amazônica. Belém: CIFOR, Imazon, 2005.
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extraíram. Os resultados mostram que, durante um ano, os cipós,
a caça, as frutas, que uma família média consumiu foi o
equivalente a 25% da renda de um agricultor da comunidade.
Bons caçadores ganharam mais que a metade de sua renda com
as caçadas, se eles tivessem que comprar esses produtos gastaria
tempo, transporte e dinheiro. Da floresta fechada, no Quiandeua,
foram extraídos 85% dos cipós, 87% das frutas e 82% da caça
consumidos pelas famílias. É importante fazer esses cálculos
quando queremos vender madeira ou terra. Devemos lembrar que
é possível negociar e guardar partes de nossa floresta onde
existem árvores úteis. Com planejamento, é possível manejar a
floresta e extrair tanto produtos madeireiros como frutas, cipós,
óleos e caça.
É fundamental a apropriação dos recursos naturais pelo povo da
Amazônia, estimulando-o a ter um sentimento de pertencimento dos recursos
do meio ambiente, de forma que impedisse que essa riqueza fosse minada por
apenas “meia dúzia” de pessoas. Como foi citado anteriormente, o valor da
madeira comprada nos assentamentos e vendida para exportação, indica que o
povo continua sendo explorado e o meio ambiente degradado.
Foi dito, oportunamente, em discussão na Câmara Municipal de Placas,
que o modelo econômico adotado, apesar de muitos sobreviverem por ele, não
é o mais interessante para o povo, precisando urgentemente e de forma gradual
ser substituído por um mais igualitário e beneficente para a maioria. Não é
difícil chegar à conclusão ao olhar em volta e ver as condições de vida do povo
e a infra-estrutura básica do local. O município de Placas, bem como os
municípios vizinhos, não apresenta saneamento básico, nenhum m2 de asfalto,
sem falar na precariedade dos serviços básicos em contraste com as riquezas
que saem desses lugares em termos de madeira extraída.16
A partir desse evento pode-se chegar a algumas conclusões, as pessoas
obtêm, de certa forma, informações deturpadas sobre seus direitos e deveres
como cidadãos, da função dos órgãos públicos e das oportunidades que os
recursos naturais poderiam lhes proporcionar, porque estão a serviço da
manipulação de um modelo econômico desigual, explorador e opressor com
suas formas de perpetuação. A omissão do aparelho estatal é uma das formas
16 Informações levantadas e observadas na ocasião da fiscalização nos municípios da Transamazônica.
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de se deixar estabelecer essas informações errôneas (muitos confundem com
desinformação), no sentido da ausência dos serviços de extensão e educação.
Em suma, conseqüências de um modelo desenvolvimentista evasivo de
sustentabilidade, deixando um legado de degradação e de desordenamento e
uma falta de eficácia do aparelho estatal no estudo, planejamento e execução
dos projetos capazes de buscar soluções para este legado.
Nestes contextos de ausências, de misérias, os assentados dessa região
lutam pela sobrevivência e são expostos a atitudes e comportamentos que
certamente vão extrapolar para o mundo jurídico, onde o crime ambiental se
torna uma conseqüência de uma opção de sustento. Como culpar o indivíduo
nesta situação, onde ele é vítima e/ou criminoso?
3.
A CULPABILIDADE E A RESPONSABILIZAÇÃO DO DANO
AMBIENTAL
Para se iniciar o exame e a reflexão da culpabilidade e responsabilidade
do dano ambiental, dentro do contexto explicitado, são necessárias as devidas
referências legais. A começar pela carta magna (CF/88) que através do § 3.º do
seu artigo 225 reza: “As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio
ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais
e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos
causados”. Verifica-se no referido dispositivo que no dano ambiental ocorre à
coexistência das responsabilidades penal, administrativa e civil, bem como a
possibilidade na delimitação dos responsáveis como sendo pessoas físicas e
jurídicas. Diante disto, é fundamental aplicar a norma ao fato e demonstrar que
a presente análise é dividida pelas esferas distintas das responsabilidades
(penal, civil e administrativa) em relação à culpabilidade:
3.1 Culpabilidade e responsabilidade penal
A Lei nº. 9.605/98 é aonde se encontra a disciplina básica da
responsabilidade penal ambiental. Através da leitura do seu artigo 2.º revela
que foi adotada a teoria monista no que concerne ao concurso de agentes, pois
estabelece que: “quem, de qualquer forma, concorre para a prática dos crimes
previstos nesta Lei, incide nas penas a estes cominadas, na medida da sua
culpabilidade”. Verificando que a responsabilidade penal por delitos
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ambientais está baseada na culpabilidade e há previsão de responsabilidade da
pessoa jurídica e, como no Código Penal, estabelece esta culpabilidade como
coeficiente para aplicação da pena.
É fundamental, para a continuidade da análise, ter conhecimento de
alguns conceitos jurídicos em matéria criminal:
Culpabilidade:
Conforme a Teoria finalista da ação, a culpabilidade não é
elemento do crime. É a possibilidade de declarar culpado o autor
de um fato típico e ilícito; é um pressuposto para a imposição da
pena.
Integram a culpabilidade a imputabilidade, a potencial
consciência de ilicitude e a exigibilidade de conduta diversa. Na
falta de qualquer um desses elementos, o fato não deixa de ser
típico, mas passa a ser inculpado o agente, merecendo sentença
absolutória.17
Imputabilidade Penal: “É a capacidade de entender o caráter ilícito do
fato e determinar-se de acordo com esse entendimento. Em regra, todo o agente
é imputável, a não ser que ocorra causa excludente de imputabilidade” .18
Potencial Conhecimento da ilicitude:
Trata-se de elemento intelectual da culpabilidade, ou seja, da
possibilidade de o agente conhecer o caráter ilícito da conduta.
Para que se opere a exclusão, não basta que o agente ignore
formalmente a lei, mas, sim, que não saiba e nem possa saber que
seu comportamento contraria o ordenamento jurídico. O erro da
proibição afasta o potencial conhecimento da ilicitude. Se
inevitável, excluía culpabilidade, isentando a pena o réu. Será
evitável o erro quando se verificar ser possível ao agente diante
das circunstâncias, atingir a consciência da ilicitude do fato.
17 ESCOBAR, Fernanda Maria Zichia. Resumão Jurídico – Direito Penal - Parte Geral. São Paulo: BF&A 2004
18 ESCOBAR, Fernanda Maria Zichia, op. cit. p. 3.
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Nesse caso, haverá responsabilização penal, mas a pena será
diminuída de um sexto a um terço. 19
Exigibilidade de conduta diversa como causa de exclusão da
culpabilidade, funda-se no princípio de que só podem ser punidas as condutas
que poderiam ser evitadas. No caso, a inevitabilidade não tem força de excluir
a vontade, que subsiste como força propulsora da conduta, mas certamente a
vicia de modo a tornar incabível qualquer censura ao agente. A exigibilidade
de conduta diversa pode ser excluída por duas causas: a coação e a obediência
hierárquica (ESCOBAR, 2003).
Diante dessas afirmativas e conceitos, como decidir a situação desses
agricultores do assentamento de Placas em relação a sua culpabilidade do dano
ambiental? E a concorrência no crime por parte do INCRA, como pessoa
jurídica de direito público (no papel de Estado) na culpabilidade, através do
assentamento em área de preservação permanente e da omissão do
licenciamento ambiental?
De fato ocorreram os crimes previstos nos artigos 38 e 39 da lei 9.605/98
e de fato houve os autores. Observe a análise da adequação tipificada dos
referidos artigos feita de forma bem apropriada por Marinho: 20
[...]Art. 38. Destruir ou danificar floresta considerada de
preservação permanente, mesmo que em formação, ou utiliza-la
com infringência das normas de proteção:
Pena – detenção, de um a três anos, ou multa, ou ambas as penas
cumulativamente.
Parágrafo único. Se o crime for culposo, a pena será reduzida à
metade.
Elementos descritivos objetivos:
19 Ibid, mesma página.
20 MARINHO, Vânia Maria do P. Socorro. “Tutela Penal da Cobertura Vegetal de Preservação Permanente”. In: Hiléia: Revista de
Direito Ambiental. V. 1, n.º 1. Manaus: Edições Governo do Estado do Amazonas/Secretaria de Cultura/Universidade do Estado
do Amazonas, 2003. pp. 170-172
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Bem jurídico tutelado: o meio ambiente, a preservação do
patrimônio natural, especialmente a conservação das florestas de
preservação permanente. Trata-se de crime material.
Núcleo do tipo: São três os verbos núcleos do tipo em análise,
quais sejam destruir, danificar ou utilizar. Cuida-se de crime de
múltipla ação (várias condutas); não importa se o agente
praticou uma única ou várias condutas ao mesmo tempo descritas
no tipo penal: responderá por um só delito. É um crime
comissivo, exigindo uma ação por parte do agente.
Resultado: Trata-se de crime de dano, pois o efeito lesivo concretizase com a exteriorização das ações destacadas no tipo. Consuma-se o
delito com a prática de qualquer das ações incriminadas.
Sujeito ativo. Qualquer pessoa imputável (física ou jurídica).
Sujeito passivo. A coletividade.
Objeto material. É a floresta considerada de preservação
permanente, mesmo que em formação.
Elemento normativo:
Exige-se a autorização para eventual destruição da floresta para
fins de utilidade pública. É, portanto, um elemento normativo com
referência à ilicitude. Há também o elemento normativo de índole
jurídica, quando qualifica “considerada de preservação
permanente”.
Elemento pessoal:
Dolo genérico. Aqui, admite-se o crime na modalidade culposa.
Art. 39. Cortar árvores em floresta considerada de preservação
permanente, sem permissão da autoridade competente: Pena –
detenção, de um a três anos, ou multa, ou ambas as penas
cumulativamente.
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Elementos descritivos objetivos:
Bem jurídico tutelado: o meio ambiente, a preservação do
patrimônio natural, especialmente a conservação das florestas de
preservação permanente. Trata-se de crime material, a exemplo
do artigo anterior.
Núcleo do tipo: O verbo núcleo do tipo em análise é cortar,
separar uma parte do todo, sem a prévia autorização da
autoridade competente. Trata-se de crime comissivo, exigindo
uma ação por parte do agente.
Resultado: Trata-se de crime de dano, pois o efeito lesivo
concretiza-se com a exteriorização das ações destacadas no tipo.
Consuma-se o delito com o corte da árvore, entendendo a
doutrina que o crime se consuma ainda que tenha o corte de uma
única árvore.
Sujeito ativo. Qualquer pessoa imputável (física ou jurídica).
Sujeito passivo. A coletividade.
Objeto material. É a árvore localizada em floresta considerada de
preservação permanente.
Elemento normativo:
Exige-se a permissão da autoridade competente para o eventual
corte da árvore em floresta de preservação permanente. Há
também o elemento normativo de índole jurídica, quando
qualifica “considerada de preservação permanente”.
Elemento pessoal:
Dolo não se admitindo o crime na modalidade culposa.
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Como agir nestas situações, onde há as evidências: o flagrante e a cena
do crime, mas os agentes diretos, no caso os assentados não possuíam certa
culpabilidade por não terem a potencial consciência da ilicitude do fato (como
descrito: “não sabiam nem o que significava área de preservação permanente APP”) e por ocorrer inexigibilidade de conduta diversa (foram assentados na
APP e receberam crédito do próprio Estado para plantar)? Com o caso, o
INCRA se for responsabilizado (assentar em APP e tendo o direito real sobre a
área) como pessoa jurídica de direito público, configura uma hipótese de auto
punição do Estado, confundindo-se a pessoa do réu a do Juiz. 21
Nos artigos acima analisados, por possuírem pena mínima de um ano,
será possível a aplicação do instituto da suspensão condicional do processo ou
o chamado sursis processual, previsto no art. 89 da Lei 9.099/95 e no art. 28
da Lei 9.605/98. Conforme a descrição dos conteúdos poderá ser proposta a
condição de reparação do dano ambiental por parte do responsável pelo
Assentamento. E o Ministério Público pode deixar de denunciar, excluindo a
punibilidade dos Assentados pelo estado de necessidade que foram submetidos.
3.2 Culpabilidade e responsabilidade civil
Em relação à responsabilidade civil, não há de se falar em culpa no
Direito Ambiental, devido o instituto da responsabilidade civil objetiva, mas
especificamente, que de forma majoritária, se adere à teoria do risco integral,
(uma das justificadoras da responsabilidade objetiva), pela qual quem exerce
determinada atividade deve suportar os riscos advindos desta, de sorte que nem
mesmo a inexistência do nexo causal desobriga o dever de indenizar. Tal teoria
vem ganhando espaço no campo da responsabilidade por danos ao ambiente. E
mesmo que a conduta do agente causador do dano ao meio ambiente seja lícita,
autorizada pelo poder competente e obedecendo aos padrões técnicos para o
exercício de sua atividade. Porém deve-se levar em consideração outras teorias
e o próprio nexo de causalidade, como afirma Solange Teles da Silva,22 citando
KRELL (1998):
a m b i e n t a l . Site do Curso de Direito da
21 MEZZOMO, Marcelo Colombelli. R e s p o n s a b i l i d a d e
UFSM.SantaMariaRS.p09.Disponívelem:http://www.ufsm.br/direito/artigos/ambiental/responsabilidade_ambiental.htm>.
Acesso em: 16 out. 2006
22 SILVA, Solange Teles da. “Capítulo 13 – Responsabilidade Civil Ambiental” IN PHILIPPI JR., A., ALVES, A.C..Curso
Interdisciplinar de Direito Ambiental. São Paulo: Manole, 2005, p 440
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[...] A conseqüência da adoção da teoria do risco-proveito é a
possibilidade de admitir fatores capazes de excluir ou de diminuir
a responsabilidade. Dentre estes fatores citem-se o caso fortuito e
a força maior, o fato criado pela própria vítima ou ainda a
intervenção de terceiro.
KRELL (1998) indaga sobre a possibilidade da responsabilidade
civil objetiva ambiental no ordenamento brasileiro ter como
fundamento a teoria do risco-proveito, admitindo-se em certos
casos as excludentes de responsabilidade, já que com a adoção da
teoria do risco integral “não é possível levar em consideração
[por exemplo,] a participação do próprio prejudicado na
participação do dano” (p. 27). Alega o autor que há casos em que
“o Estado falha em preencher essa função e emite licenças que
permitem impactos ambientais nocivos, não é justo repassar a
responsabilidade ao particular, especialmente nos casos em que
ele podia ser confiante na certidão da autorização e na
regularidade e licitude de sua atuação. O primeiro guardião dos
interesses da coletividade como do bem difuso meio ambiente
ainda é o Estado e não o cidadão” (p. 31). [...]
Torna evidente que a referida teoria do risco-proveito se enquadra
melhor no fato, onde o INCRA falhou em assentar as pessoas em áreas de
preservação permanente (APP) e ainda beneficiou com crédito para plantio
(uso alternativo do solo) das áreas e o IBAMA emitiu as autorizações de
desmatamento sem vistoria prévia, porque no caso de assentamentos é
facultativo por ser menos de 3,0 ha,23 passa a apurar o crime e pune os
“responsáveis”. Assim, o próprio Estado age com co-responsabilidade e depois
vem repassar a responsabilidade somente para os assentados – não é justo!
Adiante, nas conclusões se verificará a proposta para esse impasse.
23 Conforme previsto no Art. 10 da Instrução Normativa do Ministério do Meio Ambiente n.° 3 de 4 de março de 2002: “Para
concessão da autorização de desmatamento acima de três hectares/ano, é indispensável à realização de vistoria técnica
prévia nas respectivas áreas”.
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3.3 Culpabilidade e responsabilidade administrativa
Diante dessas reflexões de culpabilidade nas esferas penal e civil, resta a
análise na esfera administrativa. Sendo na prática realizada em primeiro plano, ou
seja, desencadeada pelo responsável da apuração do dano e a responsabilização
surge pelo seu devido processamento administrativo no órgão ambiental. Diante
da realidade analisada em primeiro plano pelo próprio fiscal da apuração, tendo a
consciência da culpabilidade do Estado e dos infratores/vítimas no caso
apresentado, torna-se uma tarefa um tanto que complicada. Mas na prática como
agir, quando se presenta o Estado, e tem consciência da sua parcela de culpa?
Como deve agir um funcionário do órgão ambiental, com o poder de policia no
qual é investido e passivo de responsabilização da própria legislação, no caso de
omissão? A lei 9605/98 é clara, quando afirma:
Art. 68 – Deixar, aquele que tiver o dever legal ou contratual de
fazê-lo, de cumprir obrigação de relevante interesse ambiental:
Pena – detenção de um a três anos, e multa. E mais no Art. 70 § 3.º
– A autoridade ambiental que tiver conhecimento de infração
ambiental é obrigada a promover a sua apuração imediata,
mediante processo administrativo próprio, sob pena de coresponsabilidade.
Certamente não poderá trazer a responsabilidade para si e piorar ainda
mais a situação, deve apurar e ser o mais transparente possível, contribuindo
com os julgadores para a compreensão mais lúcida dessa complexa realidade.
É difícil querer ser justo na ilegalidade, como é difícil ser legal na
injustiça. É uma questão de escolhas, é saber discernir o direito posto do direito
pressuposto (GRAU 2000) e procurar fazer justiça. Cabe a indagação: como
punir com multa pessoas que mal conseguem se sustentar, que lutam para
conseguir o que comer? A multa certamente nunca será paga, apenas servirá para
banalizar o poder coercitivo do Estado. Mas também, sem descambar para o
extremo, querer, em nome de práticas costumeiras de uma realidade injusta,
“encobrir” mais injustiças. Por isso, a contráriosensu não se deve permitir, em
nome de um possível bom senso, que essas pessoas continuem praticando crimes
ambientais. Como bem salienta Benatti,24 em relação ao direito consuetudinário:
24 BENATTI, José Helder. “A Titularidade da Propriedade Coletiva e o Manejo Comunitário”. In: Boletim Museu Paraense Emílio
Goeldi, série antropologia, 18 (2), 2002, p. 160.
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Assim, desde que o direito consuetudinário não seja contra lege
ele tem plena vigência na propriedade comum. Em outras
palavras, não se sustenta o costume que pode levar à extinção a
fauna e a flora, ou praticas de desmatamentos em área de
preservação permanente do imóvel rural.
Sendo assim a defesa do meio ambiente deve ser feita, a qualquer custo,
mas muito mais que isso é a defesa do direito á vida, no qual está intrínseco o
direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Diante o exposto, como encontrar a melhor forma para evitar ser injusto
ou ilegal? Esta é a reflexão: um fato, como o descrito, permite a possível
confusão da noção do justo (fazer justiça) e a do legal (cumprir puramente a
lei). Torna-se uma ousadia determinar ou julgar, sem refletir e sem ter um
retrato holístico da realidade. Quem é vítima ou criminoso numa realidade tão
complexa que é a Amazônia? É uma tarefa difícil, mas segue as seguintes
proposições para dirimir o conflito, defender e recuperar o meio ambiente:
O IBAMA, através do fiscal e como o órgão ambiental deve apurar o
crime, dimensionar os danos e proceder às autuações,25 com as seguintes
ressalvas: se o projeto de assentamento já se emancipou, ou seja, se os
assentados já têm o título definitivo da terra, as autuações têm que ser em nome
destes; se não for o caso, o INCRA deverá ser autuado e os assentados punidos
por envolvimento no crime. De qualquer forma a área deverá ser embargada
para sua regeneração natural. Cabendo os infratores a apresentação da defesa
em 20 (vinte) dias corridos, a partir do dia seguinte da lavratura do auto de
infração, para pagar a multa ou apresentar a defesa dirigida à autoridade
competente do IBAMA. Será aberto o processo administrativo em que o
autuado terá amplo direito para dar vistas ao processo, se defender e será feita
a comunicação de crime ao Ministério Público. Há a possibilidade da
suspensão da exigibilidade de cobrança da multa através de Termo de
25 Artigos 38,39 e 70 da Lei 9.605/1998 c/c artigos 1.°, 25 e 26 do Decreto 3.179/1999.
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Compromisso de reparação do dano ambiental, aprovada pela autoridade
competente, conforme a legislação vigente,26 sendo esta, a forma mais justa e
razoável de solucionar o conflito para este caso. É de suma importância no
relatório da fiscalização do IBAMA, mencionar apuração dos indícios de
exclusão de ilicitude devido o estado de necessidade dos assentados.
Em relação ao INCRA, como proposta de reparação do dano ambiental,
deve proceder a retirada urgente dos assentados das áreas de preservação
permanente e assentá-los em uma área ambientalmente e tecnicamente
adequada. Contribuindo para a regeneração natural das áreas degradadas.
Evitando assim, eventuais proposituras de ações coletivas tais como: Ação
Civil Pública27 para reparação imediata do dano por parte do IBAMA ou
Ministério Público Federal ou Associação dos Assentados (com mais de um
ano de constituição); ou a propositura de Mandado de Segurança Coletivo28 por
parte do Sindicato dos Trabalhadores Rurais ou Associação dos Assentados; ou
Ação Popular29 por qualquer cidadão.
Quanto à atuação do Ministério Público Federal deverá, como fiscal da
lei, reconhecer a exclusão da ilicitude dos assentados, conforme explicado
acima, não oferecendo a denúncia pelo o estado de necessidade dos mesmos.
Podendo também agir para a reparação do dano ambiental, se for o caso,
através de propositura da Ação Civil Pública ou mesmo na exigência e na
composição de Termos de Ajustamento de Conduta30 ou no próprio Termo de
Compromisso de reparação do dano ambiental.
26 Art. 17 da Lei 9.605/1998 c/c Art. 79-A do Decreto 3.179/1999.
27 Art. 5.° da Lei 7.347 de 24 de julho de 1985.
28 Art. 5.° LXX, “b” da CRFB/88.
29 Art. 5.° LXXIII CRFB/88.
30 Art. 5.° § 6.° da Lei 7.347/85.
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SOCIEDADE CIVIL RESÍDUOS
SÓLIDOS E CONSCIENTIZAÇÃO
Maria Rosalva de Oliveira Silva*
Sumário: 1. Conceitos; 2. Competência; 3. Classificação dos Resíduos; 4. A Problemática do
Lixo; 5. Sociedade Civil; 6. Conscientização.
Resumo: O artigo trata dos problemas da
poluição ocasionados por resíduos sólidos.
Abarca conceitos sobre sociedade civil e seu
poder de conscientização. Classifica os resíduos
em grupos com o fim de esclarecer suas
peculiaridades. Dispõe ainda sobre as competências de cada esfera do Poder Público em face
dos problemas estudados. Demonstra que a
conscientização da população é valorosa, tendo
em vista a onerosidade da recuperação do meioambiente. Por isso, a responsabilidade social é
um grande passo para a amenização do problema.
Tal premissa é perfeitamente observada mediante
o fato da população não fazer o uso devido do
lixo. Muitas vezes não conhece o destino correto
de cada grupo de resíduos. É neste contexto que
as entidades da sociedade civil se revestem de
valor. As mesmas têm a finalidade de transmitir o
conhecimento necessário para um melhor
aproveitamento do lixo. A difusão das informações trará melhorias na qualidade de vida,
diminuição dos gastos públicos e o aproveitamento racional de recursos.
Abstract: The article deals with the pollution
problems caused by solid residues. It includes
concepts about civil society and its power of
awareness. It classifies the residues in groups
in order to enlighten their peculiarities. It takes
account of the competences of each sphere of
the Public Power in relation to the problems
analyzed. It demonstrates that the awareness
of the populations is valuable, due to the
recovery of the environment being so onerous.
That is why the social responsibility is such a
great step towards the softening of the
problem. This premise is perfectly observed
once the population does not make the proper
use of garbage. They many times do not know
the correct value of each group of residues. It
is due to this situation that the civil society’s
entities are revested in value. Their goal is to
transmit the necessary knowledge for a better
utilization of the garbage. The diffusion of
information will bring improvement in life
quality, reduction of public expenditure and
rational utilization of resources.
Palavras-chave: Sociedade civil; Resíduos
Sólidos; Conscientização.
Key-words: Civil Society; Solid Residues;
Awareness.
*
Advogada, mestre em Direito Ambiental pela Universidade do Estado do Amazonas, assessora jurídica do Tribunal de Justiça
do Estado do Amazonas, professora de Direito Municipal da Universidade Federal do Amazonas e de Direito Processual Civil
da Escola Superior Batista do Amazonas).
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CONCEITOS
Por meio dos conceitos aqui estabelecidos, pretende-se desenvolver um
texto que permita o exato alcance da atuação do segmento nominado como
sociedade civil organizada, no que concerne à conscientização da Sociedade e
do Poder Público para com os resíduos sólidos lançados no solo ou nos
recursos hídricos.
À sociedade civil, pode-se atribuir o conceito de segmentos personificados ou não, que atuam no seio da sociedade e em seu benefício, seja pela
reunião de pessoas que se associam para a realização de objetivos (gerais ou
específicos), seja pela formação de um patrimônio suficiente também para
alcançar os fins estabelecidos no instrumento de sua constituição (estatuto
social).
Assim, esse segmento, quando formalmente constituído, apresenta-se na
forma, ora de associação,1 ora de fundação,2 e, em qualquer delas, não visam a
fins lucrativos.
Segundo Roberto Senise Lisboa, pode-se definir associação como “a
entidade de direito privado sem fins econômicos que se constitui formalmente
da convergência de vontades de duas ou mais pessoas, inserida em um
documento escrito denominado ata constitutiva, cujo regime jurídico é adotado
na forma de estatuto”3 inclusive pode ter por objetivo a proteção e a
preservação ambiental. Já as fundações, segundo o autor, podem ser
conceituadas como:
Entidade de direito privado, constituída por ato de dotação
patrimonial, inter vivos ou mortis causa, para determinada
finalidade não econômica.
[...]
Opera-se a constituição da fundação tão-somente com a dotação
de bens livres, que passam a se tornar inalienáveis, exceção feita
à deliberação judicial que autorize a venda .4
240
1
Art. 53 do Código Civil Brasileiro.
2
Art. 62 do Código Civil Brasileiro.
3
LISBOA, Roberto Senise. M a n u a l d e D i r e i t o C i v i l . 3.ª ed. vol. I. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003. p. 374.
4
I d e m , 2003, p. 383-384.
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O segmento também pode manifestar-se por meio de grupos desprovidos
de personalidade jurídica, podendo ser citados, entre eles, os movimentos, os
foruns, os conselhos e as redes.5
Resíduo sólido “é qualquer material resultante de atividades humanas
descartado ou rejeitado por ser considerado inútil ou sem valor”.6 Para a
Agenda 21, resíduos sólidos são “todos os restos domésticos e resíduos nãoperigosos, tais como os resíduos comerciais e institucionais, o lixo da rua e os
entulhos de construção”.7
Depreende-se, portanto, que os resíduos sólidos são uma produção
humana e, que dependendo do tipo do material descartado, podem inclusive,
além de poluir o solo e as águas, causar danos à fauna e à saúde do homem.
2.
COMPETÊNCIA
Os resíduos sólidos recebem a denominação popular de “lixo” e a
limpeza pública, coleta, tratamento e destinação deste, por expressa disposição
constitucional, são da competência dos municípios,8 que podem delegá-la
mediante processo licitatório. O que é indelegável é a organização,
administração, fiscalização e gestão do sistema municipal de limpeza pública.9
Os resíduos industrias não-compreendidos pela Associação Brasileira de
Normas Técnicas – ABNT 10.00410 podem ser coletados como lixo domésticos
cabendo ao Município proceder à coleta e à adequada destinação deste. Em se
tratando de resíduo industrial perigoso, este só poderá ser disposto no meio
ambiente quando se transforma em resíduo comum depois de tratado e, para
isso, deverá assegurar:
5
Alianças coletivas, cujo objetivo é o fortalecimento do segmento, mediante capacitação para intercâmbio de experiências e
informações - SILVA, Maria Rosalva de Oliveira. A Atuação do Conselho Municipal de Desenvolvimento e Meio Ambiente e
da Sociedade Civil Organizada na Política Ambiental do Município de Manaus. Manaus: Universidade do Estado do Amazonas
- UEA, 2004 Dissertação (Mestrado em Direito Ambiental). p. 139.
6
TRIGUEIRO, André (coordenação). Meio Ambiente no Século 21. Rio de Janeiro: Sextante, 2003. p. 361. O art. 1.º, I, da
Resolução CONAMA n. 5, de 5 de agosto de 1993, também define resíduos sólidos.
7
Capítulo 21 (21.3).
8
Art. 30, I, da Constituição Federal, e art. 302, da Lei Orgânica dos Municípios (LOMAN).
9
Parágrafo único do art. 302, da LOMAN.
10 ABNT NBR 10.004, de setembro de 1987 – Classifica os resíduos sólidos quanto aos seus riscos potenciais ao meio
ambiente e à saúde pública, para que estes resíduos possam ter manuseio e destinação adequados.
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a) a eliminação das características de periculosidade do resíduo;
b) a preservação dos recursos naturais; e
c) o atendimento aos padrões de qualidade ambiental e de saúde
pública.11
A Lei Orgânica do Município de Manaus – LOMAN também proíbe
expressamente a instalação de fábrica de processamento de lixo e ponto de
depósito terminal da coleta no limite do centro urbano da cidade, estando
também incluídas nessa vedação as áreas de interesse científico ou ecológico (art.
308). Contudo essa proibição não foi observada, visto que o Aterro Sanitário de
Manaus se encontra localizado dentro do perímetro urbano12 da Cidade.
O Plano Diretor Urbano e Ambiental do Município de Manaus13 prevê
expressamente a elaboração de um Plano de Gerenciamento dos Resíduos
Sólidos contendo a estratégia geral do Poder Executivo Municipal para a
gestão desse material, de modo a proteger a saúde humana e o meio ambiente.
Deverá ainda, especificar medidas que incentivem a conservação e a
recuperação de resíduos naturais, além de oferecer as condições para a
destinação final adequada dos resíduos.
Ao Estado, coube o controle das atividades industriais que ocasionam
poluição em qualquer de suas formas,14 principalmente aquelas que sejam
realizadas em áreas próximas de cursos d’água (artigo 230, XI, da Constituição
do Estado).
3.
CLASSIFICAÇÃO DOS RESÍDUOS
Segundo Patrícia Mousinho há diversas formas de classificação dos
resíduos sólidos entre elas, aponta: quanto à composição química (orgânico ou
inorgânico), quanto à fonte geradora (residencial, comercial, industrial,
agrícola, de serviço de saúde etc.) e quanto aos riscos (perigosos, inertes e nãoinertes).15
11 Art. 10 da Resolução CONAMA n.º 5/1993.
12 Lei Municipal n.º 644, de 8 de março de 2002.
13 Art. 117, da Lei Municipal n.º 671, de 4 de novembro de 2002.
14 Art. 2? da Resolução CONAMA n.º 6, de 15 de junho de 1988.
15 TRIGUEIRO, André (coordenação). Meio Ambiente no Século 21. Rio de Janeiro: Sextante, 2003. p. 361. Cf., Resolução
CONAMA n.º 23, de 12 de dezembro de 1996.
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A NBR 10.004, da Associação Brasileira de Normas Técnicas, apresenta
três classes de resíduos sólidos: Classe I – resíduos perigosos; Classe II –
resíduos não-inertes e, Classe III – resíduos inertes.
O Projeto de Lei da Política Nacional de Resíduos Sólidos optou por
adotar uma outra classificação para as fontes geradoras de resíduos, sendo elas:
a) resíduo domiciliar, b) resíduo público, c) resíduo industrial, d) resíduo de
serviço de saúde, e) resíduo de serviço de transporte, f) resíduo de mineração,
g) resíduo de estabelecimento rural.16
Comumente, os resíduos de saúde provenientes de hospitais, clínicas e
postos de saúde são denominados de resíduos hospitalares e requerem
tratamento, coleta e disposição diferenciados. Ocorre, entretanto, que se está
esquecendo de não serem esses resíduos exclusivos dos ambientes
anteriormente citados, porque podem ser encontrados no denominado lixo
doméstico, pois, onde houver um doente, por certo haverá resíduo de saúde, daí
por que esta denominação parece ser mais apropriada.
4.
A PROBLEMÁTICA DO LIXO
Manaus não é diferente de outras cidades do Brasil,17 onde o lixo se
tornou um problema sério, não só pela quantidade produzida18 – isso revela
apenas um custo elevado para coleta e depósito arcado pelo Poder Público e,
consequentemente, pela sociedade – como também pelo fato de que o depósito
inadequado do lixo pode acarretar doenças19 à população.
A Prefeitura Municipal de Manaus no Projeto SOS Igarapés (1999)20 –
desenvolvido em parceria com a Secretaria Municipal de Limpeza e Serviços
Públicos (SEMULSP), Secretaria Municipal de Meio Ambiente (SEMMA) e
Secretaria Municipal de Educação (SEMED) – retira os resíduos dos igarapés de
Manaus e mobiliza as comunidades mediante a coleta seletiva e educação ambiental.
O Projeto retira diariamente dos igarapés de Manaus trinta toneladas de
lixo aproximadamente,21 e assim, o custo operacional para manutenção do
16 Art. 5.º Projeto de Lei n.º 203/1991.
17 SISKIS, Alfredo. Ecologia Urbana e Poder Local. Rio de Janeiro: Fundação Onda Azul, 1999. p. 111.
18 No 1.º semestre de 2005, foram recolhidas 391.460,716 toneladas de lixo em Manaus.
19 Ex. Hepatite, parasitores intestinais, leptospirose.
20 Cf., SILVA, Maria. op. cit. p. 161.
21 Fonte: Secretaria Municipal de Limpeza e Serviços Públicos (SEMULSP). 2004.
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Projeto onera toda a sociedade e revela que a população de Manaus precisa
estar consciente de sua responsabilidade para com o meio ambiente, pois sua
proteção e defesa é dever de todos (Poder Público e coletividade).22
COMPOSIÇÃO DE CUSTOS
EQUIPAMENTOS, SERVIÇOS E MATERIAIS.
D E S C R I Ç Ã O . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .R $ / t
Locação de balsa com rebocador . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .16,00
Locação de escavadeira . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .23,20
Remoção mecânica dos resíduos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .19,13
Bote com motor de 30HP (2) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .0,26
Ferramentas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .0,25
Combustível e lubrificante . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .2,40
S U B T O T A L ( 1 ) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .. 6 1 , 2 4
CUSTO COM PESSOAL
D E S C R I Ç Ã O . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .R $ / t
Salários e vantagens . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .30,09
Fardamento . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .0,16
Roupa de mergulho . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .1,20
Equipamentos de proteção individual (EPI) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .0,20
S U B T O T A L ( 2 ) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .3 1 , 6 5
CUSTO ADMINISTRATIVO
D E S C R I Ç Ã O . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .R $ / t
Transporte de pessoal . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .3,14
Transporte de ferramentas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .3,44
Refeição . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .1,16
Fiscalização e apoio . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .1,05
S U B T O T A L ( 3 ) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .8 , 7 9
T O T A L G E R A L ( 1 ) + ( 2 ) + ( 3 ) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1 0 1 , 6 823
22 Artigo 225 da Constituição Federal de 1988.
23 Fonte: Secretaria Municipal de Limpeza e Serviços Públicos (SEMULSP), 2004.
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Em face da Concorrência Pública n.º 001/2003, duas empresas realizam
a coleta de lixo em Manaus: LIMPEL e TUMPEX. Pelo contrato assinado entre
a Prefeitura de Manaus, essas empresas estão obrigadas a ter um grupo
composto por doze pessoas que devem atuar na educação ambiental,
coordenadas por uma assistente social e um engenheiro ambiental. Mesmo
assim, essas empresas, juntas, coletaram, no 1.º semestre de 2005, 346.868,710
toneladas (88,61%) do lixo recolhido em Manaus. Terceiros (supermercados,
indústrias, e outros) representam apenas 11,39%, que perfaz o montante de
44.592,007 toneladas24
O custo disso para a Prefeitura de Manaus apenas do 1.º semestre foi de
R$ 13.503.065,89 (treze milhões, quinhentos e três mil, sessenta e cinco reais
e oitenta e nove centavos). A sociedade assume esse custo pelo pagamento da
Taxa de Lixo (art. 145, II, da CF/88). Não há dados disponíveis do montante
reciclado em Manaus, o que deixa um questionamento: Quanto desse lixo está
sendo colocado no lixo sem a devida reciclagem ou reutilização?
TABELA I - COLETA POR ESPÉCIE DE RESÍDUO
Quantidade de lixo coletado, em toneladas, no Primeiro Semestre de 2005
SERVIÇOS
1.º Semestre
de 2005
Janeiro de
de 2005
Fevereiro de
de 2005
Março de
de 2005
Abril de
de 2005
Maio de
de 2005
Junho de
de 2005
Coleta Total
391.460,716
61.613,000
54.513,459
76.233,312
78.638,243
64.452,933
56.009,759
Coleta Domiciliar
178.968,286
33.077,000
27.143,940
31.771,848
32.843,900
27.918,998
26.212,600
Coleta Hospitalar
1.314,064
226,000
200,330
250,844
246,840
224,650
165,400
Remoção Mecânica 141.357,303
18.401,000
15.881,336
31.417,585
31.743,269
24.951,669
17.972,345
23.485,351
2.737,000
1.967,620
2.758,211
5.356,450
5.310,429
5.355,641
Coleta de Poda
1.548,520
18,000
299,661
394,472
200,706
310,381
325,280
Coleta Seletiva
185,185
-
22,633
48,684
43,716
25,022
45.130
44.592,007
7.154,000
7.997,929
9.591,589
8.203,362
5.711,784
5.933,363
Remoção Manual
Terceiros
FONTE: Relatório semestral da Secretaria Municipal de Limpeza e Serviços Públicos (SEMULSP), 2005.
24 Fonte: Secretaria Municipal de Limpeza e Serviços Públicos (SEMULSP), relatório 1.º semestre de 2005.
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Segundo Renato Nalini, “o Brasil desperdiça 85 milhões de toneladas de
entulhos por ano. É o que deixa de ser reciclado e que seria suficiente para
pavimentar 3.500 quilômetros de estradas”.25
Faz-se necessário um combate ao desperdício, ao consumismo
exagerado e a economia da transitoriedade apresentada por Alvin Toffler em
sua obra O Choque do Futuro,26 que, de forma sintética, pode ser traduzida
como o planejamento da curta durabilidade dos produtos, podendo aqui ser
incluído até o avanço tecnológico visto que produtos como celulares e
computadores, em brevíssimo espaço de tempo restem defasados e poluam o
meio ambiente.
5.
SOCIEDADE CIVIL
Vários atores que compõem esse segmento vêm atuando em parceria
com o Poder Público Municipal e/ou com as comunidades em projetos de
reciclagem, coleta seletiva e educação ambiental.
T A B E L A I I - O R G A N I Z A Ç Õ E S N Ã O - G O V E R N A M E N T A I S ( O N G S)27
ENTIDADES
NATUREZA
ÁREA DE ATUAÇÃO
Amigos da Amazônia (Ada)
Associação - Ambientalista
Reciclagem de Lixo e Coleta Seletiva
Associação Florestal para
Conservaçào do Ecossistema Amazônico
Associação - Ambientalista
Educação Ambiental
Associação Mata Viva – Amav
Associação - Ambientalista
Reciclagem de Lixo,
Coleta Seletiva e Educação Ambiental
Associação Selva Amazônica
Associação - Ambientalista
Educação Ambiental
Instituto Ambiental Amigos Da Natureza - Iaan Associação - Ambientalista
Educação Ambiental
25 NALINI, Renato. Ética Ambiental. 2.ª ed. Campinas: Millennium, 2003. p. 134-135.
26 TOFFER, Alvin. O Choque do Futuro. 5.ª ed. Rio de Janeiro: Artenova, 1973. p. 44.
27 Termo usado pela Organização das Nações Unidas em 1946, significando toda organização não-estabelecida por acordo
intergovernamental, conforme relata DAGNINO, Evelina. Sociedade Civil e Espaços Públicos no Brasil. Rio de Janeiro: Paz e
Terra, 2002. p. 106.
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Instituto de Educação Profissional,
Ambiental e Desenvolvimento Cooperativo
da Amazônia – Iepadecam
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Associação – Ambientalista
Reciclagem de Lixo e
Educação Ambiental
Instituto de Preservação do Meio Ambiente
e dos Recursos Naturais da Amazônia – Ipram Associação – Ambientalista
Reciclagem de Lixo e
Educação Ambiental
Movimento Socioambiental Institucional
Cidadão da Água – Mosaica
Movimento – Ambientalista
Coleta Seletiva, Reciclagem de
Resíduos e Educação Ambiental
Organização Cívica da Amazônia - Oca
Associação – Ambientalista
Educação Ambiental
Sociedades dos Amigos
do Lixo Urbano
e Turismo Harmonioso – Salutarma
Associação – Ambientalista
Educação Ambiental e Capacitação
Profissional em Reciclagem e
Reutilização
Ong Mais
Associação – Ambientalista
Reciclagem de Resíduos
e Educação Ambiental
Associaçào Uga-Uga de Comunicação
Associação – Objetivos Diversos
Informação Ambiental
Associação Brasil Sei-Bsgi (Soka Gakai)
Associação – Objetivos Diversos
Educação Ambiental
Associação para o desenvolvimento
Coersivo da Amazônia – Adcam
Associação – Objetivos Diversos
Educação Ambiental
Associação Para O Desenvolvimento
Integrado E Sustentável – Adeis
Associação – Objetivos Diversos
Educação Ambiental
Caritas Arquidiocesana De Manaus
Associação – Objetivos Diversos
Educação Ambiental
Coordenação das Organizações Indígenas
da Amazônia Brasileira – Coiab
Associação – Objetivos Diversos
Educação e Informação
Ambiental Indígena
Fundação Amazônica
Fundaçào – Objetivos Diversos
Educação Indígena
Fundação Rede Amazônica
Fundaçào – Objetivos Diversos
Educaçào Ambiental e Coleta de Lixo
Dentre as, aproximadamente, duzentas e quarenta e nove Associações de
Bairros existentes em Manaus,28 alguns projetos desenvolvidos por Órgãos
municipais, registram a participação comunitária em áreas relativas à educação
ambiental, reciclagem e coleta seletiva de resíduos.
28 Números fornecidos pela Federação Amazonense de Comunidades - FAC e pela Central Única de Comunidades (CUC).
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TABELA III: Atuação das Associações Comunitárias – Projetos
PROJETO /
ESPAÇO
GEOGRÁFICO
ANO
*Programa
UNIAMBIENTE 29
Local: Manaus
Ano: 1999
** Projeto Bodozal
Local: Compensa
Ano: 1998
Projeto SOS
Igarapés
Local: Toda Manaus:
Igarapés
Ano: 1999
RECURSO
FINANCEIRO
2003:
R$ 190.000,00
2004: R$
210.000,00
ENVOLVIDOS
MUNICÍPIO/
COMUNIDADE
P o d e r P ú b l i c o:
10 pessoas e um
coordenador.
OBJETIVO
Realizar cursos e
oficinas de trabalho
em matéria
ambiental.
Realizou 7 cursos e
oficinas, atendeu 34
grupos comunitários
e distribuiu 390
apostilas.
Desenvolvimento
de atividades
socioeducativas,
políticas públicas
para a sensibiliza
ção da questão
ambiental.
Finalista do Prêmio
Super Ecologia
(2001).
Finalista do Prêmio
Itaú-Unicef (2001).
Tem por objetivo a
atuação do Poder
Público na retirada
de lixo e a
mobilização da
comunidade na
educação ambiental
e coleta seletiva.
No 1.º momento, a
comunidade era
agente passivo da
operação. Hoje, os
líderes comunitários
desenvolvem ações
ambientais próprias.
C o m u n i d a d e: 34
grupos
comunitários.
A SEMED informou
que não existe uma
dotação específica
para o Projeto,
somente dotação
geral para
Programas e
Projetos
Pedagógicos e de
Educação
Ambiental.
Poder Público:
SEMED: 15 pessoas
SEMMA:
Palestrantes
(depende da
atividade).
SEMULSP:
Custo Operacional
Unitário: R$ 101,68.
Poder Público:
SEMULSP: 31
pessoas
SEMMA E SEMED:
Não possuem uma
dotação específica.
SEMED e SEMMA:
Equipe de Educação
Ambiental:
RESULTADOS
Comunidade:
Associação dos
Moradores da
Compensa II 1.000 pessoas
Entre 1998-2000, a
SEMED avalia que
houve melhoria do
ambiente: 20,72%
nas ruas do bairro;
22,04% no bairro;
16,76% no igarapé;
18,76% na escola e
21,69% nas casas.
C o m u n i d a d e:
Presidentes de
Associações
* Fonte: Secretário Municipal de Desenvolvimento e Meio Ambiente, Fernando de Melo Carvalho (2004). **Fonte: Divisão de Ensino
Fundamental – Educação Ambiental da SEMED e Coordenador do Projeto Bodozal, João Batista dos Santos.
29 Universidade do Meio Ambiente.
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Embora os projetos das ONGs e Associações Comunitárias promovam a
reciclagem do lixo mediante a coleta seletiva, devem ser colocadas sob
avaliação três situações complexas. A primeira, relativa à situação de risco dos
catadores de lixo,30 que trabalham em locais insalubres e desprovidos de
equipamentos adequados. A segunda, relacionada com a primeira, pois, em
alguns casos, essa atividade é a única fonte de renda familiar; e a terceira, a
ausência de políticas públicas que incentivem a cultura da separação do lixo
domiciliar.
6.
CONSCIENTIZAÇÃO
A Constituição Federal, em seu art. 225, é clara em afirmar que compete
ao Poder Público e à coletividade o direito/dever de preservar e defender o
meio ambiente para as presentes e futuras gerações (solidariedade
intergeracional).31
Em uma análise superficial do artigo, poder-se-ia inferir que essa defesa
seria judicial. Para que a preservação ambiental seja efetiva, mais do que
reprimir condutas ambientais lesivas, é necessário evitá-las, por meio de
instrumentos preventivos, notadamente a informação32 e a educação
ambiental,33 que subsidiam a sociedade na formação de uma conscientização
ambiental.
Informar vai além de simplesmente divulgar dados e indicadores
ambientais. Pressupõe dar condições à população para que ela possa fazer, com
consciência, as suas escolhas no desenvolvimento das cidades.
Dessa conscientização, evolui-se para uma mobilização social, em que
as ONGs e as Associações Comunitárias têm um papel importante, pois,
através delas arregimentam-se pessoas que irão atuar como multiplicadores de
conhecimento e auxiliar em projetos ambientais, que visem a diminuir o
desperdício (reduzir) por meio da reciclagem e da reutilização.
30 MARQUES. José Roberto. Meio Ambiente Urbano. Rio de Janeiro: Forense, 2005. p. 123.
31 Cf., WOLKMER, Antonio Carlos; LEITE, José Rubens Morato (orgs.). Os Novos Direitos no Brasil. São Paulo: Saraiva, 2003.
p. 241- 253.
32 Lei Federal n.º 10.650, de 16 de abril de 2003, dispõe sobre o acesso público aos dados e informações existentes nos
Órgãos e Entidades integrantes do SISNAMA.
33 Lei Federal n.º 9.795, de 27 de abril de 1999, que instituiu a Política Nacional de Educação Ambiental, regulamentada pelo
Decreto Federal n.º 4.281, de 25 de junho de 2002.
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Sem dúvida, nesse primeiro momento, o grande chamariz da reciclagem
é ser ela uma fonte de renda, que pode auxiliar na melhoria da qualidade de
vida das comunidades mais carentes, a fim de que possam usufruir dos direitos
mínimos garantidos no artigo 6.º da Norma Fundamental.
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PARTE IV – RESUMOS
A INCIDÊNCIA DE MALÁRIA NAS OCUPAÇÕES DESORDENADAS DO MUNICÍPIO DE MANAUS,
NO PERÍODO 1999 – 2003, COMO CONSEQÜÊNCIA DE VIOLAÇÕES AOS DIREITOS À HABITAÇÃO,
SAÚDE E AO MEIO AMBIENTE ECOLOGICAMENTE EQUILIBRADO . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .253
A COMPETÊNCIA DOS ESTADOS-MEMBROS DA FEDERAÇÃO BRASILEIRA EM MATÉRIA DE
POLICIAMENTO JUDICIÁRIO AMBIENTAL: O CASO DO AMAZONAS . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .254
A EDUCAÇÃO AMBIENTAL NO PROCESSO DE VALORIZAÇÃO CULTURAL PARA A CONSERVAÇÃO
DO PATRIMÔNIO CULTURAL IMATERIAL DAS COMUNIDADES LOCAIS . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .256
CONHECIMENTOS TRADICIONAIS ASSOCIADOS AO PATRIMÔNIO GENÉTICO E DIREITO
INTELECTUAL: UMA ABORDAGEM JURÍDICA . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .257
A EFICÁCIA DA NORMA AMBIENTAL NA PROTEÇÃO DO MEIO AMBIENTE . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .258
ASPECTOS E PERSPECTIVAS SÓCIO-JURÍDICAS SOBRE O TRATAMENTO DA POLUIÇÃO POR
RESÍDUOS SÓLIDOS URBANOS NA CIDADE DE MANAUS . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .259
A REPARAÇÃO DO DANO ECOLÓGICO: A AÇÃO CIVIL PÚBLICA COMO MEIO
PARA A DEFESA AMBIENTAL . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .260
PATRIMÔNIO CULTURAL – O TOMBAMENTO COMO INSTRUMENTO DE PRESERVAÇÃO . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .261
MEIO AMBIENTE DO TRABALHO: PREVIDÊNCIA SOCIAL BRASILEIRA E A QUALIDADE DE
VIDA DO TRABALHADOR . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .262
O MANEJO DE JACARÉS PELAS POPULAÇÕES DO INTERIOR DO ESTADO DO AMAZONAS E
SUAS IMPLICAÇÕES JURÍDICAS . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .263
ANÁLISE JURÍDICO-AMBIENTAL DA POLUIÇÃO DO IGARAPÉ DO ALVORADA . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .264
ESPAÇOS TERRITORIAIS ESPECIALMENTE PROTEGIDOS: A REGULAÇÃO JURÍDICA DAS
RESERVAS PARTICULARES DO PATRIMÔNIO NATURAL . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .265
ORDENAÇÃO DAS CIDADES E O PAPEL DO DIREITO URBANÍSTICO: O LICENCIAMENTO
URBANÍSTICO NO MUNICÍPIO DE MANAUS . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .266
RESÍDUOS DE SERVIÇOS DE SAÚDE NO MUNICÍPIO DE MANAUS: RESPONSABILIDADE
CIVIL DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA E DOS ESTABELECIMENTOS GERADORES . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .267
A CONTABILIDADE COMO INSTRUMENTO DE ENQUADRAMENTO DAS EMPRESAS ÀS
NORMAS DE PROTEÇÃO AO MEIO AMBIENTE . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .268
RESPONSABILIDADE CIVIL AO PATRIMÔNIONATURAL POR EMPRESAS
DE MANAUS: CASOS JULGADOS . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .269
A LEI DO SILÊNCIO:POLUIÇÃO SONORA POR EQUIPAMENTOS DE SOM NA CIDADE DE MANAUS . . . . . . . . . . . . .271
A ATUAÇÃO DO CONSELHO MUNICIPAL DE DESENVOLVIMENTO E MEIO AMBIENTE E
DA SOCIEDADE CIVIL ORGANIZADA NA POLÍTICA AMBIENTAL DO MUNICÍPIO DE MANAUS . . . . . . . . . . . . . . . . .272
REGULAÇÃO JURÍDICA DO ACESSO AOSCOMPONENTES DA BIODIVERSIDADE:
ITULARIDADES COMPLEXAS . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .273
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A DISCRICIONARIEDADE ADMINISTRATIVA NA LICENÇA AMBIENTAL BRASILEIRA . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .275
O PRINCÍPIO POLUIDOR-PAGADOR E USUÁRIO PAGADOR NA GESTÃO DE RECURSOS
HÍDRICOS NO AMAZONAS . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .276
O ESTUDO PRÉVIO DE IMPACTO AMBIENTAL (EPIA)COMO INSTRUMENTO DE PROTEÇÃO
AO MEIO AMBIENTE DO TRABALHO . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .277
A PROTEÇÃO JURÍDICA DOS FRAGMENTOS FLORESTAIS URBANOS . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .278
O PODER PÚBLICO E A GESTÃO DOS BENS DE USO COMUM DO POVO AS PRAÇAS DE MANAUS . . . . . . . . . . . .279
ANÁLISE DA EFETIVIDADE DA LEI DE CRIMES AMBIENTAIS NO MUNICÍPIO DE
MANAUS (JANEIRO/1998 A JULHO/2003) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .281
POLUIÇÃO TRANSFRONTEIRIÇA: SUA PROTEÇÃO JURÍDICA EM FACE DA SOBERANIA . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .282
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Page 253
A INCIDÊNCIA DE MALÁRIA NAS OCUPAÇÕES
DESORDENADAS DO MUNICÍPIO DE MANAUS, NO PERÍODO
1999 – 2003, COMO CONSEQÜÊNCIA DE VIOLAÇÕES AOS
DIREITOS À HABITAÇÃO, SAÚDE E AO MEIO AMBIENTE
ECOLOGICAMENTE EQUILIBRADO
Mestranda:
Alcinéia da Silva Rodrigues
Banca Examinadora: Profa. Dra. Clarice Seixas Duarte (Orientadora)
Prof. Dr. Wanderlei Pedro Tadei (INPA)
Profa. Dra. Solange Teles da Silva (UEA)
Resumo: Este estudo analisa a alta incidência de malária nas ocupações
desordenadas do município de Manaus, nos últimos cinco anos, como
conseqüência de violação ao direito ao meio ambiente ecologicamente
equilibrado expresso no art. 225 da Constituição Federal de 1988, que dispõe:
todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso
comum do povo e essencial á sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder
Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo, para as presentes
e futuras gerações. Para consecução dos objetivos, referida análise articulou o
problema apresentado com os demais direitos sociais, econômicos e culturais,
com ênfase no direito à moradia e à saúde, considerando a interface desses
direitos que se integram na medida em não se postula apenas o direito à mera
sobrevivência, mas o direito à vida com dignidade. A problemática do tema
envolve questões como: a existência de um expressivo déficit habitacional no
município, a influência do processo cultural da população acerca da defesa e
preservação dos bens ambientais, a oferta deficiente e insuficiente de serviços
públicos e de equipamentos básicos sociais, e a omissão do Poder Público pelo
não cumprimento de direitos fundamentais constitucionalmente positivados,
no sentido de prover prestações positivas, materializadas nas políticas públicas.
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Page 254
A COMPETÊNCIA DOS ESTADOS-MEMBROS DA FEDERAÇÃO
BRASILEIRA EM MATÉRIA DE POLICIAMENTO JUDICIÁRIO
AMBIENTAL: O CASO DO AMAZONAS
Mestrando:
Aluísio Celso Affonso Caldas
Banca Examinadora: Profa. Dra. Clarice Seixas Duarte (Orientadora)
Profa. Dra. Maria Paula Dallari Bucci (UNISANTOS)
Prof. Dr. Ozório Jose de Menezes Fonseca (UEA)
Resumo: A estrutura política do Estado brasileiro se desenvolveu ao longo de
um processo histórico, onde a descentralização do poder se verifica de forma
cíclica. A forma unitária do Estado monárquico demonstra a gênese de uma
tradição política centralizadora, a cuja influência se renderam todas as
iniciativas de descentralização, dentre as quais a adoção da forma federal, no
final do século XIX, que desde então tem revelado uma cultura federalista
centralizadora, distante da realidade política esperada de um Estado federal.
Esse fato se contrapõe às expectativas de desenvolvimento na dimensão
territorial do Brasil, onde se verificam múltiplas realidades sócio-culturais, ao
mesmo tempo em que desafia a visão antropocêntrica da ordem jurídicoambiental dessa federação. A discussão perpassa, inevitavelmente, pela
distribuição constitucional de competências em matéria de meio ambiente, com
relevância ao policiamento judiciário ambiental no contexto das políticas
públicas que concorrem para a realização e manutenção do conceito da sadia
qualidade de vida, em cujo contexto se questiona a competência e o grau de
autonomia dos estados-membros para a realização dessa política, considerando
as características do federalismo cooperativo e utilizando o Estado do
Amazonas como estudo de caso, numa abordagem qualitativa do tema a partir
de uma leitura crítica das fontes consultadas. Procura-se, assim, demonstrar
que as competências para as ações estatais em matéria ambiental são
constitucionalmente conferidas como deveres a todos os entes federados, uma
vez que são comuns as responsabilidades, conforme art. 23 da Constituição
brasileira. Além disso, evidencia-se o fato de que, nos diferentes contextos e
níveis culturais das populações que habitam o território do Estado do
Amazonas, a eficácia na realização do policiamento judiciário ambiental está
vinculada à existência de uma cultura social mínima, o que se manifesta no
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discernimento dessas populações sobre a importância do bem ambiental para
as suas próprias vidas, ou seja, se não houver uma clara noção ou mesmo
relevância dos valores ambientais na consciência popular, o policiamento
judiciário ambiental se manifestará incompatível com o perfil democrático da
realidade brasileira. Impõe-se ao Estado-membro, portanto, a adoção de ações
estruturantes dessa política, quer quanto ao aparelhamento, quer quanto à
capacitação de recursos humanos para a persecução penal e para a formação de
uma consciência ambiental institucional, sendo necessário considerar as sóciodiversidades dos povos da floresta, ou, em outras palavras, as diversidades
culturais das populações tradicionais que integram o conjunto social
amazonense. Dessa forma, diante das peculiaridades verificadas na realidade
de cada estado-membro da federação brasileira, demonstra-se que o
policiamento judiciário para a proteção e defesa do patrimônio ambiental, dado
o interesse difuso que lhe acomete, não poderia jamais ser da competência
exclusiva de um único membro da federação, mas antes se afirma como dever
do poder público estadual e direito de todos.
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A EDUCAÇÃO AMBIENTAL NO PROCESSO DE VALORIZAÇÃO
CULTURAL PARA A CONSERVAÇÃO DO PATRIMÔNIO
CULTURAL IMATERIAL DAS COMUNIDADES LOCAIS
Mestranda:
Carla Brum Carvalho
Banca Examinadora: Profa. Dra. Cristiane Derani (Orientadora)
Profa. Dra. Ana Virgínia Moreira Gomes (UNISANTOS)
Prof. Dr. Fernando Antonio de Carvalho Dantas (UEA)
Resumo: A conservação do patrimônio cultural imaterial brasileiro é, sem
dúvida, um dos grandes desafios a serem enfrentados pelos cidadãos, a
sociedade civil e o Estado neste século que se inicia. Ainda que um tanto
quanto tardiamente, emerge a consciência de que o avanço da sociedade não
pode se concretizar às custas da dizimação da biodiversidade natural e da
herança construída pelas comunidades humanas ao longo dos séculos e, neste
sentido, a presente dissertação tem como principal objetivo colocar em
discussão o aspecto de educação ambiental, que representa a principal
possibilidade de reversão do atual cenário de ameaça, não apenas à fauna e
flora – já tão gravemente afetadas pelo avanço do chamado “progresso” da
civilização – mas, também, à existência futura de inúmeras comunidades locais
estabelecidas em todo o país. Mas para que uma realidade mais otimista possa
surgir no médio prazo, é importante que se desenvolva uma comunicação mais
fluente entre os chamados “especialistas”, que muitas vezes, possuem idéias
antagônicas a respeito do que, idealmente, deveria ser realizado no sentido do
Brasil vir a se tornar um país que possa, não apenas oferecer condições dignas
de vida a seus habitantes mas, além disso, estimular a preservação e o
fortalecimento da diversidade natural e cultural, que, a cada dia, vem-se
tornado um bem mais escasso no planeta.
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CONHECIMENTOS TRADICIONAIS ASSOCIADOS AO
PATRIMÔNIO GENÉTICO E DIREITO INTELECTUAL:
UMA ABORDAGEM JURÍDICA
Mestrando:
Edson de Oliveira
Banca Examinadora: Prof. Dr. Fernando Antonio de Carvalho Dantas (Orientador)
Prof. Dr. Eroulths Cortiano Junior (UFPR)
Prof. Dr. Ozório Jose de Menezes Fonseca (UEA)
Resumo: O objetivo geral deste trabalho consiste em identificar a regulação
internacional e nacional referentes a conhecimentos tradicionais associados à
biodiversidade assim como identificar a regulação nacional e estadual referente
ao acesso ao patrimônio genético e a conhecimentos tradicionais. A pesquisa
baseou-se nos conteúdos de documentos, sobretudo legislativos, como leis
federais, leis estaduais, projetos de leis federais e projetos de leis estaduais que
dispõem sobre o acesso a recursos genéticos e seus produtos derivados assim
como à proteção ao conhecimento tradicional a eles associados. Além desses
documentos legislativos, basicamente oriundos do Congresso Nacional e de
Assembléias Legislativas, foram também coletados textos de várias entidades
que atuam e possuem interesse no problema da pesquisa, bem como
levantamento de artigos em revistas. Foram também visitados órgãos
envolvidos com o problema em estudo, tais como a representação do INPI,
Universidade Federal do Amazonas etc. A pesquisa faz uma análise da
Convenção sobre Diversidade Biológica na parte referente a medidas de
conservação e uso sustentável da biodiversidade assim como questões de
acesso aos recursos biológicos. Tendo como referência esse material de
pesquisa o problema em questão foi analisado sob o aspecto jurídico seja
quanto à definição de conhecimentos tradicionais associados à biodiversidade,
seja quanto o aspecto legal do acesso a esses conhecimentos tradicionais
associados. Faz o trabalho uma abordagem do acesso a conhecimentos
tradicionais e patrimônio genético em terras indígenas. Por fim, a pesquisa
examina a questão do direito intelectual ligado à conhecimentos tradicionais e
patrimônio genético, discutindo um sistema sui generis de proteção de
conhecimentos tradicionais.
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A EFICÁCIA DA NORMA AMBIENTAL
NA PROTEÇÃO DO MEIO AMBIENTE
Mestranda:
Ezelaide Viegas da Costa Almeida
Banca Examinadora: Prof. Dr. Edson Saleme (Orientador)
Prof. Dr. Ana Virgínia Moreira Gomes (UNISANTOS)
Prof. Dr. Sandro Nahmias Melo
Resumo: A preocupação com a proteção do meio ambiente não recente e
atualmente ultrapassa fronteiras nacionais. Em todos os relatórios e estudos até
hoje editados sobre meio ambiente, observa-se que é responsabilidade de todos
a preservação do mesmo para que se tenha o equilíbrio ecológico. Identificado
como um bem jurídico fundamental, o meio ambiente possui instrumentos
administrativos e jurídicos para protegê-lo de transgressões das mais variadas
espécies. Normas constitucionais e infraconstitucionais servem ao propósito da
preservação desse bem inestimável. Existem normas que inclusive prevêem
sanção na hipótese de violação. Tais normas são fruto do avanço normativo em
matéria ambiental e pode-se dizer que as Convenções Internacionais trouxeram
as principais recomendações em termos de meio ambiente. A eficácia da norma
ambiental na proteção do meio ambiente, utilizando análise doutrinária, é vista
como resultante de normas jurídicas auto-executáveis, muitas não necessitando
complementação para produzirem efeitos. Observa-se, contudo, que a proteção
do meio ambiente para ser efetivada não necessita apenas de normas jurídicas.
Depende, sobretudo de fiscalização dos órgãos encarregados de gerir a Política
Nacional de Meio Ambiente e conscientização, por meio de políticas
educacionais, de todos os cidadãos no sentido de se proteger os recursos
esgotáveis, tal como observado no Relatório Brutland e na Agenda 21.
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ASPECTOS E PERSPECTIVAS SÓCIO-JURÍDICAS SOBRE O
TRATAMENTO DA POLUIÇÃO POR RESÍDUOS SÓLIDOS
URBANOS NA CIDADE DE MANAUS
Mestrando:
Fábio Pacó de Matos
Banca Examinadora: Prof. Dr. Sérgio Rodrigo Martinez (Orientador)
Prof. Dr. Zulmar Antonio Fachin (PUC/PR)
Profa. Dra. Clarice Seixas Duarte (UEA)
Resumo: Nas últimas décadas, o lixo urbano, por ser oriundo de uma fonte
inesgotável estimulada pela massificação do consumo, vem tornando-se um sério
problema para as autoridades e órgãos públicos responsáveis pela limpeza
urbana, pois diariamente grandes volumes de resíduos de toda natureza são
descartados nos centros e nas periferias das grandes cidades, necessitando um
destino final adequado. Apesar dos esforços das autoridades competentes no
sentido de ordenar a disposição destes resíduos em conformidade com o que
prevê a legislação existente, fatores tais como, a escassez de recursos técnicos,
informacionais e financeiros vêm limitando estas iniciativas, e por conseqüência
os resíduos sólidos urbanos terminam por serem lançados diretamente no solo,
no ar e nos corpos d’água existentes no entorno dos centros urbanos. Isso acarreta
a poluição do meio ambiente e reduz a qualidade de vida da população. Diante
desse quadro, pretendemos prestar um esclarecimento mais específico sobre a
problemática dos resíduos sólidos urbanos, privilegiando a análise dos aspectos
sócio-culturais e sócio-jurídicos, assim como a inter-relação dos hábitos de
consumo da sociedade moderna com a excessiva geração de resíduos. Destacase, ao final, algumas alternativas de intervenção neste problema, fundamentadas,
em primeiro lugar, na Educação Ambiental, contemplada como um primeiro
passo para se tentar reverter o quadro de poluição por resíduos sólidos urbanos;
e em segundo lugar, apoiado no conceito de Gestão Comunitária do Lixo, a
realização de uma ação conjunta através da articulação entre o Poder Público, a
Universidade do Estado do Amazonas – UEA, e toda a sociedade amazonense, a
qual incluirá, uma ampla campanha de sensubilização e educação ambiental
estimulando a prática da coleta seletiva no interior de lares, escolas, empresas e
outros setores da sociedade. Visualiza-se ainda, o ensino de técnicas simples de
compostagem e aterramento sanitário dos rejeitos em local apropriado.
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A REPARAÇÃO DO DANO ECOLÓGICO: A AÇÃO CIVIL
PÚBLICA COMO MEIO PARA A DEFESA AMBIENTAL
Mestranda:
Gláucia Maria de Araújo Ribeiro
Banca Examinadora: Prof. Dr. José Augusto Fontoura Costa (Orientador)
Profa. Dra. Adriana Diaféria (PUC/SP)
Prof. Dr. Ozório Jose de Menezes Fonseca (UEA)
Resumo: Sob a preocupação de que preservar a diversidade e a integridade do
patrimônio natural implica em meio ambiente ecologicamente equilibrado, balizado
como pressuposto para o atendimento de outro valor fundamental – o direito à vida
– prescreve a Constituição de 1988 garantias e mecanismos capazes de assegurar à
cidadania os meios de tutela judicial desse bem: dentre outros, a ação civil pública.
Embora a Lei da Ação Civil Pública não tenha sido a precursora, foi a partir do seu
advento que, a doutrina processual brasileira passou a estudar a defesa em juízo
dessa modalidade de interesses. E, com a promulgação da Constituição Federal de
1988, elevou-se à categoria de garantias constitucionais determinados valores
tutelados pelas demandas coletivas, recepcionando-a integralmente, aprimorando-a,
um imenso campo de incidência. A pesquisa irá se arregimentar nos preceitos legais
vigentes e na legislação específica para aplicação da referida garantia constitucional
na manutenção do equilíbrio ecológico, considerando o meio ambiente como
patrimônio público a ser necessariamente assegurado e protegido. A Carta Magna e
legislação infraconstitucional dotaram a pessoa, seja física ou jurídica, de
instrumentos processuais eficazes para apuração e punição ao dano ambiental.
Assim, ação civil pública tornou-se imprescindível na complementação do estudo
da responsabilidade civil por dano ecológico. E é o que observaremos no Capítulo
I deste trabalho, uma vez que a referida ação é dotada de instrumentos processuais
capazes de efetivar a conservação e a reparação do meio ambiente. O Capítulo II terá
por objetivo discorrer sobre o dano ambiental, seu conceito e suas características a
fim de demonstrar que sua repercussão influencia drasticamente na impetração da
ação civil pública. A ação civil pública é a via processual adequada para impedir e
reprimir danos aos bens coletivamente tutelados, encontrando-se disciplinada pela
Lei n.º 7.347, de 24.07.1985. A efetivação do dano traz o dever de legal de sua
reparação, em sua integralidade, seja de forma natural ou em pecúnia. É o que
veremos no decorrer desta dissertação, disposto, também, em nosso Capítulo III.
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PATRIMÔNIO CULTURAL – O TOMBAMENTO COMO
INSTRUMENTO DE PRESERVAÇÃO
Mestranda:
Heloysa Simonetti Teixeira
Banca Examinadora: Prof. Dr. Edson Ricardo Saleme (Orientador)
Profa. Dra. Ana Virgínia Moreira Gomes (UNISANTOS)
Profa. Dra. Andréa Borghi Moreira Jacinto (UEA)
Resumo: Preservar o meio ambiente é preservar a vida do planeta. Este é um
tema sempre presente, relevante que é para as atuais e futuras gerações.
Quando se refere ao meio ambiente é imprescindível se ter em mente que este
não é apenas o natural, muito mais enfatizado, mas também o cultural.
Preservar a cultura é manter viva a memória coletiva de uma sociedade, é
permitir o conhecimento, de geração em geração, da história, das raízes de seu
surgimento. Portanto, o patrimônio cultural possui, hoje, acepção bastante
abrangente, que inclui todas as formas de expressão da cultura de um povo. É
imprescindível, para preservar os traços culturais da sociedade brasileira, a
utilização de meios adequados de proteção dos bens culturais, a exemplo do
tombamento, instituído pelo Decreto-lei 25/1937. Reconhece-se, contudo, que
não são suficientes os instrumentos de proteção para atuação do poder público,
necessita-se, também, do envolvimento da sociedade, além da implementação
de políticas fiscalizadoras, a permitir a conservação desses bens e evitar as
investidas danosas contra o patrimônio cultural.
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MEIO AMBIENTE DO TRABALHO: PREVIDÊNCIA SOCIAL
BRASILEIRA E A QUALIDADE DE VIDA DO TRABALHADOR
Mestranda:
Iza Amélia de Castro Albuquerque
Banca Examinadora: Prof. Dr. Sandro Nahmias Melo (Orientador)
Prof. Dr. Georgenor de Sousa Franco Filho (UNAMA/PA)
Prof. Dr. José dos Santos Pereira Braga (UFAM)
Resumo: Pretende-se, neste trabalho, realizar um estudo sobre o meio
ambiente do trabalho, um dos aspectos do meio ambiente geral, compreendido
como pressuposto para que o trabalhador possa gozar de vida digna. Desta
forma, este estudo foi estruturado em quatro partes. Inicialmente, vencidos os
meandros conceituais do meio ambiente do trabalho, aborda-se a questão da
tutela jurídica do meio ambiente do trabalho sob a ótica do Direito Ambiental,
do Direito do Trabalho e do Direito da Seguridade Social. Em seguida
enfrenta-se a questão dos riscos ocupacionais no ambiente do trabalho, ao se
considerar que o desafio maior, na atualidade, a ser enfrentado pelo Estado,
como também pela sociedade, trata-se do elevado índice de acidentes do
trabalho, causando lesões e ceifando a vida de milhares de trabalhadores,
acidentes estes que podem ser evitados com a devida prevenção. Aborda-se,
também, sobre a proteção previdenciária, considerando que não há como falar
sobre a qualidade de vida do trabalhador, sem mencionar a Seguridade Social,
que se constitui na espinha dorsal de um Estado de Direito. Por fim, há que se
abordar os reflexos acidentários na vida dos trabalhadores, assim como a
eficácia do direito ao meio ambiente do trabalho equilibrado.
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O MANEJO DE JACARÉS PELAS POPULAÇÕES DO INTERIOR
DO ESTADO DO AMAZONAS E SUAS IMPLICAÇÕES
JURÍDICAS
Autor:
João Ferreira de Santana Neto
Banca Examinadora: Prof. Dr. Sérgio Rodrigo Martinez (Orientador)
Prof. Dr. Zulmar Antonio Fachin (PUC/PR)
Profa. Dra. Andréa Borghi Moreira Jacinto (UEA)
Resumo: A pesquisa realizada propõe uma reflexão acerca da persistência de
impedimentos legais, que porventura possam obstar a adoção de planos de
manejo extensivo de jacarés pelas populações do interior do Amazonas. A
referida atividade extrativa animal é responsável, há décadas, pela
movimentação de recursos obtidos através do tráfico de animais silvestres e de
seus produtos, sem que isso tenha, nas mesmas proporções, resultado numa
melhoria das condições de vida daquelas populações. Para tanto, fez-se
necessária a revisão bibliográfica acessível acerca do tema discorrido, que se
caracteriza pela inter-relação de várias disciplinas e campos do conhecimento
humano comuns à matéria ambiental. Assim, adotou-se o método dedutivo,
tendo em vista a imprescindível inserção das experiências de outros países e de
outros estados da Federação sobre o uso sustentável desse recurso da fauna,
bem como sobre a evolução do direito brasileiro pertinente à fauna silvestre.
Outrossim, analisou-se a importância social e econômica da utilização do
jacaré como um recurso natural e de sua importância para a melhoria da
qualidade de vida do amazonense do interior, adequando-a às suas práticas
tradicionais e fortalecendo a necessidade de se preservar não só a espécie
utilizada, mas também, proteger as áreas em que se encontram, assegurando o
desejado desenvolvimento sustentável.
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ANÁLISE JURÍDICO-AMBIENTAL DA POLUIÇÃO
DO IGARAPÉ DO ALVORADA
Mestrando:
João Francisco Wanderley da Costa
Banca Examinadora: Profa. Dra. Andréa Borghi Moreira Jacinto (Orientadora)
Prof. Dr. Joaquim Shiraishi Neto (UFPR)
Prof. Dr. Ozório Jose de Menezes Fonseca (UEA)
Resumo: O estado de degradação dos igarapés que integram as micro-bacias
hídricas do perímetro urbano de Manaus vem ensejando, nos últimos anos,
uma considerável discussão acadêmico-científica, em que são polarizados
como vetores do dano ambiental, de um lado a ação das populações que
ocupam irregularmente os espaços urbanos marginais e adjacentes aos cursos
d’água e, de outro, as intervenções e/ou omissões do Poder Público frente a
essa realidade. A agressão ao meio ambiente é real e extremamente graves as
suas conseqüências em relação aos ecossistemas envolvidos. Às variáveis de
caráter sócio-ambientais e público-administrativas que sedimentam o
conhecimento científico acerca da degradação dos igarapés de Manaus, se
acrescentará no presente trabalho a análise das competências e
responsabilidades do Poder Público, e da violação ao ordenamento jurídico,
pertinentes ao tema. No primeiro capítulo serão analisadas a ocupação urbana
e a degradação hídrico-ambiental de Manaus; a dinâmica da demografia
humana e o contexto demográfico brasileiro; a expansão demográfica, o espaço
e o planejamento urbanos, a malha hidrográfica e a poluição hídrica em
Manaus. No segundo capítulo serão tratados os temas meio ambiente,
legislação, competências e intervenções do Poder Público; meio ambiente e sua
análise conceitual; degradação ambiental; desenvolvimento sustentável; Poder
Público e a desordenada ocupação de áreas de igarapés; regime jurídico dos
recursos hídricos; intervenções públicas e Estatuto da Cidade. No terceiro e
último capítulo, que constitui o Estudo de Caso acerca da poluição do Igarapé
do Alvorada, serão abordados a contextualização da área de estudo, os
processos de ocupação e degradação desse curso d’água e os resultados da
pesquisa de campo ali empreendida.
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ESPAÇOS TERRITORIAIS ESPECIALMENTE PROTEGIDOS: A
REGULAÇÃO JURÍDICA DAS RESERVAS PARTICULARES DO
PATRIMÔNIO NATURAL
Orientado:
Júlio Cezar Lima Brandão
Banca Examinadora: Prof. Dr. Fernando Antônio de Carvalho Dantas (Orientador)
Profa. Dra. Maria Paula Dallari Bucci (UFPR)
Profa. Dra. Andréa Borghi Moreira Jacinto (UEA)
Resumo: Trata-se de pesquisa que versa sobre os espaços territoriais
especialmente protegidos com ênfase na regulação jurídica das reservas
particulares do patrimônio natural. A investigação se inicia com uma
abordagem, em nível mundial, acerca das áreas protegidas, e se desenvolve
com a identificação dos principais instrumentos normativos existentes no
ordenamento jurídico brasileiro, a partir de sua regulação constitucional, com
o propósito de demonstrar que a criação dessas áreas constitui-se em
importante estratégia de proteção da diversidade biológica brasileira. Em
seguida, os estudos são dedicados especificamente as reservas particulares do
patrimônio natural, ocasião em que são abordadas relevantes questões
jurídicas envolvendo a criação, alteração, supressão dessas áreas. Logo depois,
a pesquisa é dedicada à análise da proteção penal desses espaços territoriais,
culminando com a discussão acerca da competência jurisdicional para
processar e julgar os crimes ambientais praticados nessas unidades de
conservação. Finalmente é realizada investigação a propósito da
compatibilidade jurídica das reservas particulares com os demais espaços
territoriais especialmente protegidos existentes no ordenamento jurídico
brasileiro.
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ORDENAÇÃO DAS CIDADES E O PAPEL DO DIREITO
URBANÍSTICO: O LICENCIAMENTO URBANÍSTICO NO
MUNICÍPIO DE MANAUS
Mestranda:
Jussara Maria Pordeus e Silva
Banca Examinadora: Prof. Dr. Edson Ricardo Saleme (Orientador)
Prof. Dr. José Cretella Netto (UNIP/SP)
Profa. Dra. Andréa Borghi Moreira Jacinto ( UEA)
Resumo: O licenciamento urbanístico, focalizando-se a cidade de Manaus,
constitui o objeto de estudo desse trabalho, cujo principal objetivo foi
sistematizar o conjunto de normas urbanísticas referentes ao licenciamento e
das ações do Poder Publico Municipal, buscando sugerir novas formas de
controle preventivo, concomitantemente e repressivo, para o controle
urbanístico, em decorrência do visível desordenamento urbano dessa cidade.
Para alcançar seus objetivos, esse trabalho comporta uma abordagem histórica
do surgimento das cidades e das regras urbanísticas e particularmente das
normas específicas do licenciamento, assim como os princípios que regem a
matéria. Também foi objeto de analise a política implementada pelo Poder
Municipal, como o principal ator nessa matéria do direito. Para complementar
o estudo bibliográfico, foram realizadas entrevistas, com o intuito de avaliar a
percepção dos operadores das instituições governamentais sobre o
ordenamento de ações pertinentes aos novos paradigmas constitucionais,
representados pela função social da propriedade, assim como da própria
cidade.
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RESÍDUOS DE SERVIÇOS DE SAÚDE NO MUNICÍPIO DE
MANAUS: RESPONSABILIDADE CIVIL DA ADMINISTRAÇÃO
PÚBLICA E DOS ESTABELECIMENTOS GERADORES
Mestranda:
Lúcia Maria Corrêa Viana
Banca Examinadora: Profa. Dra. Solange Teles da Silva (Orientadora)
Prof. Dr. José dos Santos Pereira Braga ( UFAM)
Prof. Dr. Fernando Antonio de Carvalho Dantas (UEA)
Resumo: Para tratar da problemática dos resíduos de serviços de saúde partese da análise dos riscos que estes geram à saúde e ao meio ambiente.
Apresenta-se a classificação teórica e legal desses resíduos, com relevância aos
aspectos do manuseio, acondicionamento, separação, coleta, armazenamento e
transporte nas principais fontes geradoras de resíduos de serviços de saúde no
Município de Manaus, observando-se os riscos de tais atividades para a saúde
humana. Os procedimentos e legislação referentes ao tratamento e disposição
final dos resíduos de serviços de saúde também constituem parte dessa análise.
Destaca-se nesse estudo a questão da responsabilidade civil da Administração
Pública e dos geradores de resíduos de serviços de saúde. A título de ilustração
da problemática, dois estudos de casos são relevantes: o do processo de
licenciamento do aterro controlado do Município de Manaus, e a ação civil
pública de responsabilidade por danos ambientais tendo como objeto o
mencionado aterro controlado desse município.
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A CONTABILIDADE COMO INSTRUMENTO DE
ENQUADRAMENTO DAS EMPRESAS ÀS NORMAS DE
PROTEÇÃO AO MEIO AMBIENTE
Mestrando:
Marco Antonio da Cunha Evangelista
Banca Examinadora: Prof. Dr. Serguei Aily Franco de Camargo (Orientador)
Prof. Dr. José Cláudio Monteiro Britto Filho (UFPA)
Prof. Dr. Sandro Nahmias Melo (UEA)
Resumo: O Meio Ambiente se apresenta como alvo de preocupação da atual
geração, visando sua proteção como fator garantido da própria existência
humana; É evidente que as empresas tem se aparelhado para minimizar o
impacto da suas atividades no meio ambiente. Mas não basta estar
ecologicamente correto: Faz-se necessário demonstrar ao público tal conduta.
Dentre tantas formas de demonstrar as atitudes empresariais para a proteção ao
meio ambiente, a contabilidade se mostra como um meio sem igual para
embasar tal demonstração; não apenas pelo fato de ser a contabilidade a ciência
do patrimônio por excelência, já detendo em seu método as ferramentas de
controle das decisões empresariais, mas especialmente por proporcionar ao
público e usuários de informações empresariais um retrato do comportamento
econômico da empresa. Tomando essa utilidade da ciência contábil, pode-se
utilizá-la para dar efetividade ao cumprimento do Princípio Ambiental de
Informação que, através de um relatório contábil denominado “Balanço
Social”, poderá tornar público quanto (e se) a empresa investe em ações que
beneficiem e protejam o meio ambiente.
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RESPONSABILIDADE CIVIL AO PATRIMÔNIO
NATURAL POR EMPRESAS DE MANAUS:
CASOS JULGADOS
Mestranda:
Maria da Conceição Leal
Banca Examinadora: Prof. Dr. José Augusto Fontoura Costa (Orientador)
Profa. Dra. Adriana Diaféria (PUC/SP)
Profa. Dra. Andréa Borghi Moreira Jacinto (UEA)
Resumo: O presente trabalho tem como cerne a verificação da efetividade das
decisões judiciais proferidas pela Vara do Meio Ambiente e Questões Agrárias,
em decorrência de danos ambientais perpetrados por pessoa jurídica de direito
privado na Cidade de Manaus. Dentre os danos provocados ao ambiente
natural tomou-se a poluição hídrica como objeto de estudo em razão da
unicidade e fonte geradora do dano, o derramamento de óleo por empresas
fornecedoras de energia elétrica. Além da pesquisa doutrinária essencial para o
entendimento e solução das questões tratadas voltou-se para a pesquisa
documental, objetivando a comprovação dos fatos, a elucidação da lide e a
busca pela efetividade das decisões prolatadas pela Vara Especializada do Meio
Ambiente e Questões Agrárias. Buscou-se caracterizar o meio ambiente e o
tratamento a este dispensado pela Constituição de 1988, como um bem difuso,
atribuindo a todos direito de fruição, mas também dever de sua reparação pelos
danos causados. Essa responsabilidade pode ser administrativa, civil ou penal,
tanto das pessoas físicas quanto jurídicas, inclusive com a aplicação da
desconsideração da personalidade jurídica nos casos de uso indevido ou de
abuso de poder por seus representantes. A responsabilidade ambiental foi
enfatizada como conseqüência do dano ambiental, voltada inicialmente para a
recomposição ou recuperação, trazendo o ambiente o mais próximo possível do
seu status quo ante e, se comprovada essa impossibilidade, voltar-se para a
reparação pecuniária, com gerenciamento pelos fundos e aplicação primordial
nos locais atingidos pela degradação. Entretanto, não basta que as decisões
possuam eficácia e possibilidade de virem a ser cumpridas. É necessário que
haja efetividade, que sejam executadas. Caso contrário, além de se criar
descrença no judiciário, gera expectativa de impunidade. Assim, buscou-se
comprovar a adimplência das decisões prolatadas com relação à poluição
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hídrica praticada por pessoas jurídicas no período 1997, ano de criação da Vara
Especializada do Meio Ambiente e Questões Agrárias, até 2003. Procurou-se
demonstrar a necessidade de se priorizar nas decisões judiciais a prática
educacional além da imposição de elementos sancionadores, ensejando, ao
lado de seu cumprimento, a inibição para a prática delituosa e, em
conseqüência, a preservação ambiental.
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A LEI DO SILÊNCIO:
POLUIÇÃO SONORA POR EQUIPAMENTOS
DE SOM NA CIDADE DE MANAUS
Mestranda:
Maria do Perpétuo Socorro Puga Ferreira
Banca Examinadora: Profa. Dra. Solange Teles da Silva (Orientadora)
Prof. Dr. José dos Santos Pereira Braga (UFAM)
Profa. Dra. Andréa Borghi Moreira Jacinto (UEA)
Resumo: A cidade de Manaus enfrenta ruídos gerados pelas várias atividades
econômicas, aeroportos, casas de diversão, templos religiosos, residências, aos
quais se somam os ruídos decorrentes da própria vida social urbana,
constituindo-se a poluição sonora um dos mais graves problemas, causador de
danos físicos, mentais e sociais, além de privar os manauaras do sagrado direito
ao sossego. Assim, o presente trabalho teve como objetivo conhecer a
dimensão da problemática da poluição sonora por equipamentos de som e a
ação efetiva do Poder Público na proteção dos interesses difusos da população
ao sossego, à saúde e melhor qualidade de vida. Abordou-se o processo de
ocupação e urbanização da cidade de Manaus, a fase áurea da borracha (18901911), seguida de uma fase de estagnação da economia regional e depois sua
transformação num importante pólo de industrialização, com a implantação da
Zona Franca de Manaus, a partir de 1967, comparando-se os sons da Manaus
antiga com os sons da Manaus moderna. Foram enfocados os aspectos técnicocientíficos e jurídicos da poluição sonora, as principais fontes poluidoras e a
ação compartilhada dos órgãos ambientais na defesa e proteção dos interesses
difusos além da atuação ainda embrionária da Sociedade Civil. A título de
ilustração dessa problemática, foram apresentados casos de poluição sonora
julgados pela Vara do Meio Ambiente e Questões Agrárias (VEMAQA),
demonstrando a atuação do Judiciário e também do Ministério Publico no
tratamento dessas questões.
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A ATUAÇÃO DO CONSELHO MUNICIPAL DE
DESENVOLVIMENTO E MEIO AMBIENTE E DA SOCIEDADE
CIVIL ORGANIZADA NA POLÍTICA AMBIENTAL DO
MUNICÍPIO DE MANAUS
Mestranda:
Maria Rosalva de Oliveira Silva
Banca Examinadora: Profa. Dra. Solange Teles da Silva (Orientadora)
Profa. Dra. Adriana Diaféria (PUC/SP)
Prof. Dr. Serguei Aily Franco de Camargo (UEA)
Resumo: A maioria dos problemas ambientais no Município de Manaus está
concentrada no espaço urbano, cabendo ao Poder Público e à coletividade
combater a poluição e preservar o meio ambiente. Para isso, é necessário que
a sociedade civil possa participar efetivamente da tomada de decisões, seja
através da formulação de políticas públicas seja pela sua execução, quer dizer,
é preciso implementar mecanismos de participação, assegurando o exercício da
cidadania ambiental. Tornar efetiva a participação da sociedade civil pode
ocorrer de maneiras diversas, e este estudo analisa a forma plural da atuação do
Conselho Municipal de Desenvolvimento e Meio Ambiente (COMDEMA) e
da Sociedade Civil organizada na política ambiental do Município de Manaus.
Para tanto é realizado um diagnóstico da composição e atuação do
COMDEMA e da Sociedade Civil organizada, destacando-se que embora
embrionária, a participação desse segundo segmento é fundamental para a
formulação e execução de políticas públicas ambientais e assim para a
preservação e conservação da sócio e biodiversidade.
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REGULAÇÃO JURÍDICA DO ACESSO AOS
COMPONENTES DA BIODIVERSIDADE:
TITULARIDADES COMPLEXAS
Mestrando:
Raimundo Sérvulo Lourido Barreto
Banca Examinadora: Prof. Dr. Fernando Antônio de Carvalho Dantas (Orientador)
Prof. Dr. José Antonio Peres Gediel (UFPR)
Profa. Dra. Cristiane Derani (UEA)
Resumo: A presente Dissertação objetivou a análise da regulação jurídica do
acesso aos componentes da biodiversidade, aqui entendidos como patrimônio
genético e conhecimento tradicional associado, os quais em função da
importância estratégica que representam no cenário da economia globalizada,
despertam o interesse das empresas transnacionais de biotecnologia em
contraposição aos interesses das populações indígenas e tradicionais.
Primeiramente, procurou-se situar o bem ambiental na Constituição, bem
merecedor de tutela por constituir-se como pressuposto para o exercício do
direito à vida e à dignidade da pessoa humana. Em seguida, demonstrou-se que
os componentes da biodiversidade não se apresentam como categorias
isoláveis, em função da estreita interdependência na relação existente entre as
populações tradicionais com a biodiversidade, sempre através da cultura.
Discutiu-se a evolução do conceito de propriedade, o surgimento e evolução do
princípio da função social da propriedade e sua relação com o meio ambiente.
Assim, o ordenamento jurídico vigente condiciona o exercício do direito de
propriedade a uma função social. Evoluindo para a questão da regulação
jurídica do acesso aos componentes da biodiversidade, constatou-se que a
dinâmica da apropriação e os direitos de propriedade são diretamente
influenciados por fatores políticos, sociais e econômicos, daí porque uma das
questões centrais envolvendo a regulação do acesso a biodiversidade é
justamente o regime de propriedade sobre a mesma, por isso sua titularidade é
complexa. A ausência de clareza na regulação do tema dificulta o debate. Se
por um lado, como decorrência do dinamismo tecnológico verifica-se um
avanço nas formas de apropriação e controle dos componentes da
biodiversidade que, inclusive, passa a ser reconhecida pelo próprio Estado. Por
outro, os mecanismos tradicionais de proteção não se apresentam adequados
e/ou suficientemente flexíveis para proteger a biodiversidade, o que acaba por
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desequilibrar a troca que há entre a salvaguarda de direitos e o interesse
público. Verificou-se ainda que, a abrangência dos acordos internacionais,
como o Acordo TRIP’s são uma imposição unilateral dos países desenvolvidos
com vistas a criar um sistema de proteção intelectual uniforme no cenário das
relações comerciais internacionais. Por fim, constatou-se a lacuna entre a
previsão normativa constitucional e infraconstitucional e a realidade da
regulação do acesso aos componentes da biodiversidade, o que está a exigir do
poder público e da sociedade políticas públicas que garantam a efetividade dos
direitos das populações indígenas e tradicionais, no qual a releitura do direito
de propriedade, seja material ou imaterial, torna-se imprescindível.
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A DISCRICIONARIEDADE ADMINISTRATIVA
NA LICENÇA AMBIENTAL BRASILEIRA
Mestrando:
Ruy Marcelo Alencar De Mendonça
Banca Examinadora: Prof. Dr. Edson Ricardo Saleme (UEA)
Prof. Dr. José Cretella Neto (UNIP/SP)
Prof. Dr. Serguei Aily Franco de Camargo (UEA)
Resumo: A presente pesquisa versa sobre a licença ambiental, instrumento de
tutela administrativa do meio ambiente no Brasil. Aborda, em específico, a
fenomenologia da discricionariedade da Administração Pública Brasileira no
ato de outorga da licença de atividades e empreendimentos potencialmente
lesivos ao meio ambiente. A investigação objetiva o discernimento das
características, extensão e profundidade da liberdade volitiva do órgão que
expede a licença ambiental de modo a contribuir para os operadores do direito
delinearem o verdadeiro papel da Administração no processo decisório relativo
ao controle prévio das atividades danosas ao meio ambiente, contribuindo para
a aferição das possibilidades de revisão e controle judicial da atuação
administrativa.
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O PRINCÍPIO POLUIDOR-PAGADOR E USUÁRIO
PAGADOR NA GESTÃO DE RECURSOS HÍDRICOS
NO AMAZONAS
Mestrando:
Sebastião Marcelice Gomes
Banca Examinadora: Prof. Dr. Ozório Jose de Menezes Fonseca (Orientador)
Prof. Dr. Andréa Viviana Weichman (UFAM)
Prof. Dr. Solange Teles da Silva (UEA)
Resumo: A água, fluido que dá vida a todos os sistemas ecológicos do planeta,
sejam naturais ou artificiais é um bem público, é também um bem de uso comum
do povo, podendo ser utilizada por pessoa física ou jurídica, de direito público ou
privado, desde que observado o direito de fruição da coletividade. Este trabalho
examina os aspectos jurídicos e institucionais da gestão dos recursos hídricos no
Brasil focalizando sua aplicabilidade no Estado do Amazonas, especialmente no
que se refere à utilização dos princípios usuário-pagador e poluidor-pagador. A
questão começa a ser avaliada pela descrição das características, propriedades e
distribuição no Mundo, no Brasil e na Amazônia, para em um segundo momento
se proceder à análise do regime jurídico das águas nas constituições brasileiras,
na legislação federal, na Constituição e legislação infraconstitucional do Estado
do Amazonas buscando, fundamentalmente, compreender a problemática do uso
racional da água. Nesse sentido aborda-se o tratamento legal da gestão dos
recursos hídricos dado pela Lei federal n.º 9.433/97 e pela Lei n.º 2.712/2001 do
Estado do Amazonas. Destaca-se em seguida conceitos, características, função e
implementação do princípio poluidor-pagador e usuário-pagador na gestão dos
recursos hídricos, analisando-se a cobrança pelo uso dos recursos hídricos como
mecanismos para a implementação desses princípios. Discute-se a natureza da
cobrança pelo uso da água e conclui-se que se trata de preço público. Observase que a implementação do princípio poluidor-pagador e do princípio usuáriopagador associado à educação ambiental pode se constituir em um instrumento
eficaz para a utilização racional da água. Todavia, no Estado do Amazonas por
falta de regulamentação da Lei n.º 2.701/2001, que disciplina a Política de
Recursos Hídricos e estabelece o Sistema de Gerenciamento dos Recursos
Hídricos ainda não foi implementada a cobrança pelo uso de recursos hídricos
nos rios de domínio do Estado e por falta de regulamentação pela União, também
não foi implementada a cobrança nos rios federais que situam-se em território
amazonense.
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O ESTUDO PRÉVIO DE IMPACTO AMBIENTAL (EPIA)
COMO INSTRUMENTO DE PROTEÇÃO AO MEIO AMBIENTE
DO TRABALHO
Mestrando:
Sérgio Cláudio Menezes Ferreira
Banca Examinadora: Prof. Dr. Sandro Nahmias Melo (Orientador)
Prof. Dr. José Cláudio Monteiro Britto Filho (UFPA)
Prof. Dr. Serguei Aily Franco de Camargo (UEA)
Resumo: Tem como cerne esta pesquisa o estudo do meio ambiente do
trabalho, direito fundamental previsto no art. 225 c/c inciso VIII, do art. 200 da
Constituição Federal de 1988, seus meandros e peculiaridades, tendo como
ênfase à indicação de um mecanismo, constitucionalmente previsto, como
meio de conferir efetividade ao referido direito. Este instrumento, o estudo
prévio de impacto ambiental tem sido utilizado de maneira equivocada quando
se presta apenas a defesa do aspecto natural do meio ambiente. No nosso
ordenamento jurídico, o referido estudo está inserido como ato formal atrelado
ao processo de licenciamento ambiental razão pela qual buscamos mostrar que
o mesmo deve ser utilizado obrigatoriamente – tendo como referencial o meio
ambiente como uno e indivisível – como instrumento de proteção ao meio
ambiente do trabalho. A nova perspectiva da sociedade – e não do indivíduo –
ao influir na decisão final de projetos materializa-se também pela participação
nas audiências públicas, atuação de índole democrática como uma nova
pedagogia, na gestão das políticas públicas pressionadas por organizações
internacionais, a exemplo da OIT e CNUED. Identifica-se da necessidade de
impor limites para alterabilidade do meio do trabalho, que não comprometam
de modo irreversível a saúde do trabalhador.
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A PROTEÇÃO JURÍDICA DOS
FRAGMENTOS FLORESTAIS URBANOS
Mestranda:
Silma Pacheco Ramos
Banca Examinadora: Prof. Dr. Serguei Aily Franco de Camargo (Orientador)
Prof. Dr. José Helder Benatti (UFPA)
Prof. Dr. Ozorio Jose de Menezes Fonseca (UEA)
Resumo: O objetivo desta dissertação é analisar os aspectos da legislação
ambiental e urbanística brasileira aplicáveis à proteção de fragmentos florestais
urbanos. A interpretação das normas foi realizada com base na literatura
jurídica nacional. Envolve também o estudo das tutelas administrativa, civil e
penal dos fragmentos florestais urbanos e dos aspectos referentes ao Direito
Urbanístico aplicáveis ao tema. No estudo da tutela administrativa utilizou-se
como base o Código Ambiental de Manaus, lei municipal que representa a
atuação legislativa do Município na defesa do meio ambiente urbano e o
Decreto Federal n.º 3.179/99. O estudo da tutela penal envolveu a análise de
dispositivos da Lei de Crimes Ambientais, em especial dos crimes contra a
flora. A tutela civil foi abordada a partir da responsabilidade civil objetiva do
infrator ambiental, com base em normas gerais, expressas no art. 225 §3.º da
Constituição Federal e no art. 14 §1.º da Lei da Política Nacional do Meio
Ambiente. Neste contexto, buscou-se realizar uma abordagem sistemática e
integrada dos vários dispositivos legais visando demonstrar a existência, no
ordenamento jurídico brasileiro, de importantes instrumentos protetivos dos
fragmentos florestais urbanos. No mesmo sentido, foi possível inferir sobre a
existência de uma ampla possibilidade dos entes federativos atuarem na
criação de outras normas de proteção e na execução das leis existentes. O
conhecimento do arcabouço jurídico apresentado reveste-se, portanto, de
importância substancial na defesa da qualidade de vida nos centros urbanos.
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O PODER PÚBLICO E A GESTÃO DOS BENS
DE USO COMUM DO POVO AS PRAÇAS DE MANAUS
Mestrando:
Sócrates Mesquita Batista Filho
Banca Examinadora: Prof. Dr. Fernando Antonio de Carvalho Dantas (Orientador)
Prof. Dr. Joaquim Shiraishi Neto (UFPR)
Profa. Dra. Andréa Borghi Moreira Jacinto (UEA)
Resumo: Este trabalho é um estudo das praças de Manaus sob o ângulo da
gestão de um bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida.
A pesquisa mostra que o surgimento das praças, no Ocidente, remonta a Idade
Média, como um espaço da espontaneidade e liberdade. Tornou-se um
logradouro público por excelência, com relevantes funções sociais e
ambientais. Em Manaus, elas despontam com a cidade, e, a princípio,
ocupavam um espaço considerável. Desde sempre, sua administração esteve
sob a responsabilidade do Poder Público, que acumulava as prerrogativas de
titular e gestor, outorgando-se todos os elementos inerentes à propriedade,
amparado pela sistematização feita pelo Direito Civil, em relação aos bens. Sob
esse império, as praças de Manaus, bem de uso comum do povo, foram criadas,
reformadas, descaracterizadas e alienadas pela só vontade do Estado. Motivada
pelo próprio ordenamento legal, a Administração não consultava a população
e nem patrocinava qualquer ato de desafetação. Os bens do domínio público do
Estado recebiam o mesmo tratamento dos bens chamados do domínio privado
do Estado. Estudos realizados com o advento da Constituição Federal de 1988,
demonstram que os bens de uso comum do povo adquiriram nova estrutura,
novo conteúdo jurídico. Principalmente, mudaram de proprietário e
ascenderam ao status de bem ambiental, situação diferente daquela anterior
estabelecida pelo direito civil, e adotada pelo direito administrativo. Os
resultados revelam que, como conseqüência, as responsabilidades se
repartiram: à coletividade coube a titularidade das praças, sua fiscalização e
defesa, e ao Município a sua gestão, com limites. Essa administração deixou de
ser exclusiva do ente municipal. Dispõe, agora, de regras claras: passa a ser
democrática e participativa, em oposição à democrática representativa. Tanto
um como outro têm, portanto, direitos e obrigações na administração, que não
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se exaurem no presente, uma vez que esses bens devem, também, ser
resguardados para as futuras gerações. Com esta perspectiva, conclui-se que
em caso de alienação, em situações especiais, os titulares terão,
obrigatoriamente, que ser consultados para se manifestarem sobre a
desafetação. O ato deixa de ser discricionário. Na mesma esteira, restringe-se
o uso especial desses logradouros públicos, para que não se desvirtue a sua
finalidade.
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ANÁLISE DA EFETIVIDADE DA LEI DE CRIMES AMBIENTAIS
NO MUNICÍPIO DE MANAUS (JANEIRO/1998 A JULHO/2003)
Autora:
Vânia Maria do Perpétuo Socorro Marques Marinho
Banca Examinadora: Profa. Dra. Solange Teles da Silva (Orientadora)
Prof. Dr. José Heder Benatti (UFPA)
Prof. Dr. Fernando Antonio de Carvalho Dantas (UEA)
Resumo: A análise da efetividade da Lei de Crimes Ambientais na proteção ao
meio ambiente ecologicamente equilibrado é realizada no presente trabalho, a
partir dos casos ajuizados e julgados na Vara Especializada de Meio Ambiente
e Questões Agrárias, no período de janeiro de 1998 a julho de 2003. Nesse
sentido, este estudo destaca particularmente a importância da opção pela
justiça consensual em sede de tutela ambiental, enfatizando-se os institutos
despenalizadores da transação penal e da suspensão condicional do processo.
Tais institutos, introduzidos no sistema normativo pátrio pela Lei no 9.099 de
26.12.1995, foram adotados com características próprias inerentes à
especificidade do bem jurídico tutelado, o meio ambiente e os bens ambientais
que o integram, a partir da entrada em vigor da Lei no 9.605 de 12.02.1998,
pedra angular da sistematização das sanções penais ambientais. Busca-se assim
auferir a efetividade da aplicação da norma penal na proteção ambiental em
face das situações jurídicas concretas trazidas a Juízo no município de Manaus,
identificando-se os obstáculos a efetividade dessa tutela e apresentando-se
sugestões que possibilitem a concretização no plano fático dos princípios
informadores da tutela ambiental: a prevenção do dano ambiental e, na
impossibilidade desta, a reparação específica do bem ambiental lesionado de
modo a restabelecer-se o equilíbrio ecológico necessário à garantia da sadia
qualidade de vida das presentes e futuras gerações.
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POLUIÇÃO TRANSFRONTEIRIÇA:
SUA PROTEÇÃO JURÍDICA EM FACE DA SOBERANIA
Mestrando:
Vitor Hugo Mota De Menezes
Banca Examinadora: Prof. Dr. José Augusto Fontoura Costa (Orientador)
Prof. Dr. Joaquim Shiraishi Neto (UFPR)
Prof. Dr. Serguei Aily Franco de Camargo (UEA)
Resumo: Trata-se de um estudo aliado a um possível caso de poluição
transfronteiriça, a ser detectada em igarapé ou pequeno rio de água doce,
denominado Santo Antônio, que corta duas cidades localizadas na região
amazônica: do lado brasileiro (Tabatinga) e do lado colombiano (Letícia). Essa
poluição foi causada principalmente pelo estabelecimento de uma usina
termoelétrica na cidade de Letícia (Colômbia), que utilizava esse pequeno rio
para o descarte de água resultante do resfriamento dos geradores. Ocorre que,
após esse escoamento, o pequeno rio Santo Antônio passa pela cidade
brasileira (Tabatinga) e deságua no rio Solimões, um bem natural de
fundamental importância para todos na região. O principal objetivo deste
trabalho, entretanto, foi o de organizar procedimentos metodológicos cabíveis,
especificamente para prevenir ou tutelar esse bem ambiental em casos de
poluição transfronteiriça, quais sejam águas doces, visto ser matéria pertinente
ao Direito Internacional Público do Meio Ambiente (DIPMA), um dos mais
recentes ramos do Direito Internacional Público, que ainda se encontra em fase
de consolidação. Ao atingir esse principal objetivo, este trabalho poderá vir a
colaborar para o ordenamento do DIPMA, em casos específicos de poluição
transfronteiriça em águas doces.
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NORMAS EDITORIAIS
As normas editoriais da H i l é i a - R e v i s t a d e D i r e i t o A m b i e n t a l d a A m a z ô n i a são as seguintes:
1) A revista é de periodicidade semestral, observando-se
o caráter de interdisciplinaridade no que tange ao
papel crítico do periódico e constitui-se em um
veículo para publicação de artigos, ensaios e
resenhas críticas, bem como à livre circulação de
idéias e opiniões sobre temas relacionados ao Direito
e, especialmente, ao Direito Ambiental, sendo de
inteira responsabilidade de seus autores as opiniões
expressas nos artigos publicados.
9) Para deliberação quanto à aprovação dos artigos com
indicação para publicação, o Conselho Editorial
adotará os seguintes critérios:
•
Interesse acadêmico – serão priorizados os trabalhos
cuja reflexão mantenham pertinência com as linhas de
pesquisa do Programa, quais sejam: C o n s e r v a ç ã o
dos recursos naturais e desenvolvimento
s u s t e n t á v e l, que engloba: tutela jurídica do meio
ambiente; unidades de Conservação; Ecoturismo;
educação ambiental; espaço urbano; recursos
naturais; mecanismos de resolução de conflitos;
desenvolvimento sustentável; direito ao desenvolvimento; políticas públicas e D i r e i t o s d a s ó c i o e
b i o d i v e r s i d a d e , que engloba: biodiversidade;
biossegurança; bioética; direito dos povos, povos
indígenas e populações tradicionais; agricultura
sustentável; direito ambiental econômico e
empresarial; meio ambiente do trabalho.
•
Relevância e atualidade jurídica – os textos deverão
trazer para o debate questões cuja abordagem jurídica
ensejem o diálogo interdisciplinar entre o direito, o
direito ambiental e as demais áreas do conhecimento.
•
Rigor acadêmico – os textos deverão seguir,
rigorosamente, a metodologia científica, oportunizando o debate acerca do conhecimento jurídico.
2) Os artigos serão submetidos à aprovação do Conselho
Editorial.
3) O recebimento do artigo, ensaio ou resenha não
implica a obrigatoriedade de sua publicação.
4) Não será efetuado qualquer pagamento ou
contraprestação pela publicação dos artigos
selecionados. Serão enviados 5 (cinco) exemplares
do número correspondente para cada autor de artigo,
ensaio ou resenha publicado.
5) Os trabalhos deverão ser inéditos e conter os dados
de identificação (título, nome do autor, vinculação
institucional) e, obrigatoriamente conter sumário,
resumo em português e em inglês, devendo ser
acompanhados de currículo resumido do autor.
6) Além dos trabalhos que integrarão as sessões, a
revista terá um espaço reservado para publicação das
atividades desenvolvidas pelos Núcleos e Projetos de
Pesquisa e pelo Programa de Pós-graduação em
Direito Ambiental.
7) A formatação, citações e referências deverão
obedecer às normas da ABNT e, no que couber, as
Normas Técnicas internas do Programa.
10) Artigos, ensaios ou resenhas recebidos e não
publicados no número correspondente à chamada
editalícia do envio, integrarão banco de trabalhos e
poderão ser publicados posteriormente, em número
subseqüente,
mediante
comunicação
e
consentimento prévio do autor.
8) Os trabalhos deverão ser entregues em disquete ou
como anexo de e-mail, digitados com fonte Times
New Roman, tamanho 12, com espaçamento entre
linhas de 1,5, margens superior e esquerda de 3 cm e
margens inferior e direita de 2 cm, em editor
compatível com o Word, comportando entre 15 a 20
laudas para artigos e ensaios e entre 5 a 10 laudas
para resenha, incluídas as referências.
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Esta obra foi composta em Manaus pela
Kintaw Design, em Times 11/14.
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JUL-DEZ
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A
Hiléia – Revista de Direito Ambiental da Amazônia, se constitui em espaço destinado à apresentação e divulgação
das reflexões produzidas no processo de construção do conhecimento humano, jurídico e humanístico-jurídicoambiental, desenvolvido no âmbito do Programa de Pós-Graduação em Direito Ambiental da Universidade do Estado do
Amazonas.
Nesse sentido, refletir desde os contextos da existência, significa proporcionar e criar os espaços de lutas. Lutas pelo
conhecimento, pelo direito, pela vida e dignidade humana. Assim, este periódico científico que se consolida como
espaço para divulgação e reflexão do direito ambiental, tem no contexto amazônico e brasileiro e, em sentido mais
ampliado, em trocas geopolíticas e cognoscitivas mais iguais na correlação sul-norte/norte-sul, espiralando a seara da
complexidade do mundo sóciobiodiverso. Almeja-se, portanto, constituir-se, pelo diálogo, em âmbito plural e
heterogêneo para convergências de conhecimentos e alternativas, com perspectivas transdisciplinares nas abordagens
e conteúdos, assim como interinstitucional e translocal nos sujeitos.
ANO-2, N.º 3 – JULHO-DEZEMBRO/2004 – ISSN: 1679-9321
Revista de Direito
Ambiental da Amazônia
Os contextos diversos e complexos do mundo contemporâneo, em relação constante e paradoxal, com o acirrado
processo de globalização econômica e cultural, implicam em transformações sociais, jurídicas, econômicas e políticas,
gerando novos problemas e conflitos, especialmente no que concerne ao direito e ao seu estudo. A verticalidade do
discurso global que busca legitimar os processos de universalização da cultura do mercado quer seja na vertente única
da produção e do consumo capitalistas, transformando tudo em mercadoria, ou, na imposição de modelos de
normatividade supostamente eficazes para proporcionar o desenvolvimento, provocam uma certa idéia de que não existe
solução fora desses parâmetros, favorecendo um renovado processo econômico neocolonial.
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