Medicina integrativa

Propaganda
www.revistaonco.com.br
Outubro/Novembro 2010
Ano 1 • nº 2
Oncologia para todas as especialidades
Entrevista
Especialista em economia da saúde analisa
o câncer sob a perspectiva econômica
Tabagismo
Entenda a delicada relação
entre câncer e tabagismo
Do bem
Medicina
integrativa
Saiba como orientar
seu paciente nas
terapias complementares
Iniciativas da indústria farmacêutica
para pacientes de câncer de mama
geniturinário | mama | cuidados paliativos | calendário
www.revistaonco.com.br
Oncologia para todas as especialidades
com.br
www.revistaonco.
Agosto/Setembro
Ano 1 • nº 01
2010
lidades
todas as especia
Oncologia para
Câncer
Avanços em pesquisa
Novos medicamentos
Procedimentos inovadores
Responsabilidade social
desse problema
Um panorama
ca no Brasil
de saúde públi
Dor
e tratar
Como entender oncológico
e
a dor do pacient
o.com.br
istaonc
ia
Farmoác
es
risco das interaçõ
www.rev
Tudo isso e muito mais você vai encontrar
nas páginas da revista Onco& - Oncologia
para todas as especialidades.
á-las
Conheça
e saiba como evit 2010
medicamentosas
mbro
o/Nove
Outubr
nº 2
Ano 1 •
Espeescidoal
roesanual da
encontad
Destaqu especialidna de Oncologia Clínica
s as
de America
ieda
toda
a paraSoc
Oncologi
istaonomia da saúde icanaalisa
Entcialreistavem
ec
onôm
ctiva ec
rspe
Espe
sob a pe
o câncer
mo
Tabndaa agdeislicada relasmçãoo
a
Medictiinva iativos | do bem | curtas
a
r
dad
cui
g
|
ia
e log orientaros pal
teco
gin
entrevistai|n
mo
Saiba co iente nas
seu pac entares
complem
terapias
bagi
Ente
ncer e ta
entre câ
tica
Doiativbasedamindústriancerfarmdeacmêuama
Inic
de câ
cientes
para pa
ndário
s | cale
aliativo
idados p
cu
|
a
io | mam
nár
genituri
Para continuar recebendo a revista
gratuitamente, faça seu cadastro pelo site
www.revistaonco.com.br/cadastro
O objetivo dessa nova publicação da
Iaso Editora, especializada em comunicação
médica, é transformar a oncologia
em um tema mais familiar para o médico
não-especialista na área. Com artigos
e reportagens que trazem informações
de ordem prática, a Onco& pretende dar
ao profissional de saúde mais ferramentas
para a prevenção, o diagnóstico precoce
e o acompanhamento de seu paciente
durante e após o tratamento do câncer.
sumário
O oncologista e especialista em economia da saúde Nelson
Teich faz uma análise do câncer sob as lentes da economia
entrevista
8
capa
12
Medicina integrativa:
mais uma ferramenta no arsenal contra o câncer?
tabagismo
16
Câncer e tabagismo: uma relação delicada
Ricardo Meirelles
mama
22
Os dez grandes mitos sobre câncer de mama em 2010
Antonio Luiz Frasson, Betina Vollbrecht e Rafaello Frasson
geniturinário
24
Tratamento sistêmico do carcinoma de células renais
metastático: estado da arte em 2010 Igor Morbeck
cuidados paliativos
30
“Ter medo da morte é quintessencialmente humano”:
uma conversa com o psiquiatra William Breitbart
do bem
33
Com iniciativas de prevenção e apoio a pacientes de câncer
de mama, a indústria farmacêutica mostra que é rosa o ano todo
curtas
36
Notícias da indústria, iniciativas, pesquisas:
um giro pelo mundo da oncologia
calendário
38
Programe-se: eventos e congressos para anotar na agenda
Conselho
editorial
Editor clínico:
Sergio D. Simon
I – Cancerologia clínica
Oncologia clínica:
André Moraes (SP)
Anelisa Coutinho (BA)
Auro Del Giglio (SP)
Carlos Sampaio (BA)
Claudio Petrilli (SP)
Clarissa Mathias (BA)
Daniel Herchenhorn (RJ)
Fernando Medina (SP)
Gothardo Lima (CE)
Igor Morbeck (DF)
João Nunes (SP)
José Bines (RJ)
Karla Emerenciano (RN)
Marcelo Aisen (SP)
Marcelo Collaço Paulo (SC)
Maria de Fátima Dias Gaui (RJ)
Nise Yamaguchi (SP)
Oren Smaletz (SP)
Paulo Marcelo Gehm Hoff (SP)
Roberto Gil (RJ)
Sebastião Cabral Filho (MG)
Sérgio Azevedo (RS)
Sérgio Lago (RS)
Onco-hematologia:
Carlos Chiattone (SP)
Carmino de Souza (SP)
Daniel Tabak (RJ)
Jane Dobbin (RJ)
Nelson Spector (RJ)
Vânia Hungria (SP)
Transplante de medula:
Jairo Sobrinho (SP)
Luis Fernando Bouzas (RJ)
Nelson Hamerschlak (SP)
Yana Novis (SP)
II – Biologia molecular
Ada Alves (RJ)
André Vettore (SP)
Carlos Gil (RJ)
Helenice Gobbi (MG)
José Cláudio Casali (RJ)
Luíza Lina Villa (SP)
Maria Isabel Achatz (SP)
III – Cancerologia
cirúrgica
Neurologia:
Manoel Jacobsen Teixeira (SP)
Marcos Stavale (SP)
Cabeça e pescoço:
Luis Paulo Kowalski (SP)
Vergilius Araújo (SP)
Tórax:
Angelo Fernandez (SP)
Riad Naim Younes (SP)
Abdômen:
José Jukemura (SP)
Laércio Gomes Lourenço (SP)
Marcos Moraes (RJ)
Paulo Herman (SP)
Mama:
Alfredo Barros (SP)
Antonio Frasson (SP)
Carlos Alberto Ruiz (SP)
Maira Caleffi (RS)
Urologia:
Ademar Lopes (SP)
Antônio Carlos L. Pompeu (SP)
Miguel Srouji (SP)
Ginecologia:
Jorge Saad Souen (SP)
Sérgio Mancini Nicolau (SP)
Sophie Derchain (SP)
Tecido osteoconjuntivo:
Olavo Pires de Camargo (SP)
Reynaldo J. Garcia Filho (SP)
IV – Radioterapia
Ludmila Siqueira (MG)
Paulo Novaes (SP)
Robson Ferrigno (SP)
Rodrigo Hanriot (SP)
Wladimir Nadalin (SP)
V – Cuidados paliativos
e dor
Ana Claudia Arantes (SP)
Claudia Naylor Lisboa (SP)
Fabíola Minson (SP)
João Marcos Rizzo (RS)
Ricardo Caponero (SP)
Ano 1 • número 2
outubro/novembro 2010
Editorial Lilian Liang
[email protected]
Impressão: Ipsis Gráfica e Editora
Tiragem: 10 mil exemplares
Jornalista responsável: Lilian Liang (MTb 26.817)
Comercial Simone Simon
[email protected]
A revista Onco& – Oncologia para todas as especialidades, uma
publicação da Iaso Editora, especializada em comunicação médica,
traz informações sobre oncologia a profissionais de todas as
especialidades médicas. De circulação bimestral, tem distribuição
nacional e gratuita por todo o território nacional. A reprodução
do conteúdo da revista é permitida desde que citada a fonte.
Direção de arte Luciana Cury
[email protected]
Revisão Patrícia Villas Bôas Cueva
Colaboraram nesta edição: Antonio Frasson,
Bartira Betini, Betina Vollbrecht, Conceição Lemes,
Igor Morbeck, Rafaello Frasson, Ricardo Meirelles
Rua João Álvares Soares, 1223
Campo Belo – 04609-002 – São Paulo – SP
(11) 2478-6985 (redação) (21) 3798-1437 (comercial)
6
outubro/novembro 2010 Onco&
Na pauta do dia
O
câncer está na pauta do dia. Este ano,
segundo a Organização Mundial da
Saúde (OMS), a doença será a principal
causa de morte no mundo, passando à frente de
doenças cardiovasculares, que por muito tempo
ocuparam o primeiro lugar.
Esse dado inédito vem acompanhado de outra
informação interessante: estudos mostram que, ao
contrário do que se pensava, o câncer não é uma
doença apenas de ricos. Números do GLOBOCAN 2008, da Agência Internacional de Pesquisa
em Câncer (IARC, na sigla em inglês), mostram
que, em 2008, 53% dos 12,7 milhões de novos
casos e 63% das mortes em decorrência da doença
aconteceram em países em desenvolvimento.
Os números escondem uma nova realidade.
As maiores taxas de câncer refletem o controle
de doenças infecciosas, antigamente responsáveis
pela alta mortalidade nesses países. Esse controle
permitiu que pessoas vivessem mais tempo – o
suficiente para desenvolver câncer. O que se precisa agora é elaborar mecanismos eficientes para
tratar esses pacientes.
Mesmo assim, o câncer continua no final da
lista de prioridades dessas nações e da agenda
global de saúde. Além de sistemas de saúde locais fracos, hoje apenas 5% de todos os recursos
destinados ao combate ao câncer vão para os
países que concentram 80% das mortes decorrentes da doença no mundo todo.
O Brasil se encaixa nesse grupo de países.
Embora em alguns bolsões privilegiados pratique-se uma medicina quase suíça, no sistema
público de saúde, que atende a maioria da população, faltam investimento, infraestrutura, drogas. Pacientes de câncer esperam por exames,
tratamento e cirurgias, numa via-crúcis longa e
demorada. O câncer de mama dá a medida exata
da situação: altamente curável se diagnosticado
precocemente, o número de mortes pela doença
no mundo todo vem diminuindo. No Brasil, ele
só faz aumentar.
Mas já se observa uma tendência no país de se
dar mais atenção ao câncer e de enxergá-lo como
um problema de saúde pública. Um movimento
lento, mas muito bem-vindo. Nesta edição de
Onco& – Oncologia para todas as especialidades
trazemos peças únicas e importantes do grande
quebra-cabeça que é o câncer. Esperamos que ela
seja um convite para pensar na medicina que queremos oferecer ao paciente e no caminho que precisamos trilhar para atingi-la.
Boa leitura!
Lilian Liang
* Jornalista especializada na
cobertura de saúde, é editora da
Onco& – Oncologia para todas
as especialidades
Contato: [email protected]
Onco& outubro/novembro 2010
7
entrevista
O câncer na
ponta do lápis
Dois estudos inovadores abordam a doença pelo lado
econômico e decretam que é hora de encarar o câncer
como um problema de saúde pública
Por Lilian Liang
Divulgação
O
FOI MARCADO POR DUAS PUBLICAÇÕES QUE
Nelson Teich
* Fundador e presidente da COI –
Clínicas Oncológicas Integradas
Contato:
[email protected]
8
CONGRESSO MUNDIAL DE CÂNCER, REALIZADO
EM AGOSTO ÚLTIMO EM SHENZHEN, NA CHINA,
outubro/novembro 2010 Onco&
deram o que falar: a primeira, um relatório da
American Cancer Society (ACS), em parceria com a
organização Livestrong, que divulgava o impacto
econômico das mortes causadas por câncer no
mundo; a segunda, um estudo publicado no periódico Lancet, que desafia a noção de que o câncer é
uma doença de países ricos.
Ao colocar uma etiqueta de preço na doença e
inseri-la no contexto da saúde pública, esses estudos deram um passo importante: trouxeram uma
nova perspectiva às discussões sobre a doença e
alertaram para pontos antes ignorados.
Projeções da Organização Mundial da Saúde
(OMS) estimam que o câncer será a principal causa
de morte no mundo em 2010. Segundo o relatório
ACS/Livestrong, calcula-se que em 2008 o câncer
tenha custado à economia global cerca de US$ 1 trilhão em mortes prematuras e invalidez (sem considerar custos médicos envolvidos) – o equivalente a
1,5% do PIB mundial. O impacto econômico do
câncer é cerca de 20% maior que o de doenças cardiovasculares, a segunda maior causa de perdas
econômicas. Ainda de acordo com a análise, o
câncer custa mais em produtividade e vidas perdidas
que aids, malária, gripe e outras doenças infecciosas.
Esses números assumem uma dimensão ainda
mais grave com os achados do estudo conduzido pelo
Global Task Force on Expanded Access to Cancer Care
and Control in Developing Countries (GTF.CCC),
publicado no Lancet. O artigo, conduzido por especialistas de diversas áreas, conclui que, dos 7,6 milhões
de pessoas que morrem de câncer todos os anos, dois
terços estão em países em desenvolvimento. Ironicamente, porém, apenas 5% da verba destinada a prevenção e tratamento de câncer vão para países que têm
80% do peso da doença.
O estudo contesta a ideia, comum no círculo da
saúde pública, de que “o câncer não pode ser tratado
em países pobres” e compara essa noção a “argumentos infundados há mais de uma década” sobre a aids.
Para os autores, é necessário expandir a prevenção e
o controle do câncer em países de média e baixa
renda, principalmente através de novas infraestruturas de saúde e acesso a drogas mais baratas. A conclusão do estudo é que “não se pode mais diferenciar
entre doenças de ricos e de pobres”.
Profundo conhecedor de economia da saúde,
que estudou extensamente no Brasil e no exterior,
o oncologista clínico Nelson Teich é fundador e
presidente da COI – Clínicas Oncológicas Integradas, uma das maiores do Rio de Janeiro. A
seguir, ele faz uma análise dos novos estudos e os
aplica à realidade brasileira, com todas as suas incoerências e dificuldades..
Onco& – O estudo do Lancet conta com autores
de diversas áreas: clínica, saúde pública, economia, campo humanitário, associações de pacientes. O que isso diz sobre a percepção do
câncer hoje?
Nelson Teich – Essa diversidade de autores reflete
a complexidade do cuidado de uma sociedade nas
áreas de prevenção, diagnóstico e tratamento do
câncer. Podemos perceber que a parte clínica, que
se refere aos exames, procedimentos e tratamentos
usados, é apenas um dos componentes de um modelo ideal de cuidados. Com a prevalência da doença e seu impacto humano e financeiro,
nada mais natural que tratá-la como um problema de saúde pública.
O cuidado no campo humanitário também é crítico, porque o câncer
é uma doença que leva a desgaste e sofrimento intensos dos pacientes
e de seus familiares.
As associações de pacientes são importantíssimas para os pacientes.
Aquelas com maior força podem definir a quantidade de recursos que
vai ser alocada para tratar as pessoas acometidas. Um excelente exemplo são os pacientes acometidos pelo HIV. Se o Brasil é hoje uma referência na qualidade de tratamento dessa doença, muito se deve à força
da associação de famílias e pacientes acometidos pelo vírus.
Onco& – O relatório ACS/Livestrong mostra pela primeira vez o
impacto econômico do câncer. Qual a importância de se entender
uma doença como essa sob a perspectiva econômica?
Teich – É importante perceber que o impacto econômico mencionado
no relatório não se refere ao que é gasto para prevenir, diagnosticar e
tratar a doença, mas às perdas decorrentes da morte prematura e da
incapacidade trazidas pelo câncer.
O resultado do relatório é impressionante, porque apesar de o
câncer ser conhecido como a segunda maior causa de mortalidade, a
perda econômica do câncer era assumida como muito inferior à da
doença coronariana. Esses números trazem uma percepção muito mais
clara da gravidade para a sociedade da negligência nos esforços para
prevenção, diagnóstico e tratamento das doenças oncológicas.
Onco& – No Lancet, o artigo desafia a ideia de que o câncer é
uma doença de ricos, já que 2/3 das mortes decorrentes da doença
no mundo ocorrem em países em desenvolvimento. O Brasil se
encaixa nesse grupo? Por quê?
Teich – Para analisar o Brasil temos de separar os dois mundos que
coexistem neste país, sabidamente um dos mais desiguais do planeta.
No relatório da American Cancer Society os países são divididos
em quatro grupos: high income (alta renda), upper middle income (renda
média alta), lower middle income (renda média baixa) e low income
(baixa renda). O grupo que inclui low e lower middle income compreende países com PIB per capita menor que US$ 3.255. Analisando
o Brasil de forma igual, estaríamos fora desses grupos, porque o valor
do PIB per capita para o Brasil projetado para 2010 está na faixa entre
US$ 9.500 e US$ 10.000, mas estudos que avaliaram o Brasil do setor
privado mostram que esse Brasil está mais bem colocado no desenvolvimento do que China, Índia e Cingapura, por exemplo. Porém, se
analisarmos o Brasil público, sua posição em um bloco de 130 países
fica na altura da 120a posição.
Um dado que reflete nossa situação no tratamento do câncer é a
mortalidade crescente por câncer de mama no Brasil, enquanto em
países desenvolvidos ela vem diminuindo.
Onco& – O artigo do Lancet propõe medidas “simples e relativamente baratas” para prevenção, como mensagens antitabaco,
vacina contra HPV e hepatite, e tratamento com drogas mais
acessíveis. Por que isso ainda não acontece no Brasil? Ou já acontece, mas sem resultados?
Teich – As medidas propostas não são simples nem baratas. As mensagens antitabaco têm um resultado muito pequeno. Estudos na área
de neuromarketing sugerem um efeito contrário das propagandas contra o tabagismo, mesmo aquelas que mostram pessoas com doenças
graves em função do hábito de fumar. Essas pesquisas sugerem que
esses anúncios estimulam o desejo de fumar nos fumantes, ao invés
de provocar uma reação contrária. O aumento do preço do cigarro
parece ter um maior efeito, principalmente entre jovens.
Quanto às vacinas, elas ainda são muito caras, principalmente a do
HPV. Os valores dessa vacina impedem o seu uso em larga escala nos
países mais pobres. Vale aqui um comentário sobre a posição do Brasil
no PIB mundial. Hoje ocupamos o 8o lugar, com expectativa de chegarmos ao posto de 5o PIB do mundo. Entretanto, esses números não refletem a realidade de um país. Muito mais fiel é o PIB per capita, que
deve ser ajustado para a desigualdade econômica/social da nação.
Sobre tratamento com drogas mais acessíveis, acredito que o estudo
se refere ao uso de medicamentos mais antigos e muito mais baratos.
Muitos desses medicamentos já perderam a patente. O que acontece é
que os novos medicamentos são muito caros e os ganhos adicionais
em tempo e qualidade de vida aparentemente são pequenos. Provavelmente estaríamos restringindo boa parte dos medicamentos hoje tratados como inovadores.
Onco& – Julio Frenk, diretor da Escola de Saúde Pública de Harvard, diz que “Nós somos literalmente vítimas de nosso próprio
sucesso”, já que hoje as pessoas sobrevivem a doenças infecciosas
e vivem o suficiente para desenvolver câncer. Só que esses “sobreviventes” não recebem tratamento adequado. Estamos saindo
de uma era de doenças infecciosas para uma era de doenças crônicas? Como os governos devem se preparar para esse novo cenário?
Teich – Esse é um ponto muito interessante, porque permite mostrar
a forma romântica como as discussões abordam o envelhecimento.
Realmente, com um maior controle das doenças infecciosas e da
doença coronariana, as pessoas conseguem prolongar seu tempo de
vida e são acometidas por doenças como o câncer, que prevalecem em
idades mais avançadas, mas não acredito que possamos dizer que o
câncer é uma doença crônica. Aumentamos a cura dos pacientes com
câncer em estádios iniciais através de diagnósticos mais precoces, melhores técnicas cirúrgicas e tratamento pós-operatório com radioterapia, quimioterapia e hormônios. Já na doença metastática, embora
tenhamos conseguido prolongar o tempo de vida das pessoas com hormônio e quimioterapia, esses benefícios são mais difíceis de ser mensurados. Estudos da década de 80 sugeriam que o benefício das
tecnologias (incluindo medicamentos) contribuiu para apenas 3% do
total da expectativa de vida. Estudos mais recentes apontam para cerca
de 10%, provavelmente porque as pessoas estão morrendo menos de
doenças infecciosas e cardiovasculares.
Olhando para o futuro, temos de ter em mente que o simples prolongamento da vida das pessoas não pode ser o único objetivo, porque
Onco& outubro/novembro 2010
9
se elas envelhecerem sem saúde, a sociedade não tem recursos financeiros nem humanos para cuidar delas. Hoje fica cada vez mais difícil
que as pessoas não trabalhem para cuidar de um doente. O Brasil tem
um problema sério com a Previdência Social. Imagine um número crescente de pessoas idosas, doentes, necessitando de cuidadores e de
cuidados em quantidade cada vez maior – essa conta não fecha.
Outro aspecto é que tentamos copiar modelos de tratamento de
países ricos, principalmente Estados Unidos. Isso é impossível. Os Estados Unidos têm uma projeção de gasto per capita anual em 2010 de
mais de US$ 7.500, enquanto no Brasil, com uma previsão otimista,
gastaremos US$ 900 por pessoa por ano.
Onco& – No estudo do Lancet, defende-se a ideia de que são
necessários esforços para prevenção e tratamento do câncer como
os dedicados a HIV/aids há alguns anos. Exagero ou realidade?
Teich – O tratamento do HIV/aids no Brasil é um exemplo para o
mundo. Grande parte da qualidade do atendimento no Brasil nessa
doença veio da força dos pacientes, mas isso prova que quando existe
determinação e compromisso é possível em países menos desenvolvidos tratar de forma exemplar doenças complexas.
Onco& – Críticos dizem que investir em vacinas caras e tratamento de câncer em países pobres é um desperdício, já que isso
é impossível nos fracos sistemas de saúde locais. Felicia Knaul,
uma das autoras do estudo do Lancet, acredita no contrário: que
iniciativas assim podem fortalecer as estruturas de saúde nesses
países. Você concorda com ela? Como podemos aplicar essa
noção no Brasil?
Teich – Acredito que não se pode abordar o sistema de saúde sem
cuidar em paralelo da educação e do saneamento básico. No estudo
da American Cancer Society, embora tenha sido colocado que 2/3 das
mortes ocorrem em países em desenvolvimento, quando falamos no
valor financeiro das perdas esse número muda completamente: 81,3%
das perdas acontecem em países chamados high income, ou seja, países
ricos. Esse número deriva do cálculo da produção perdida quando a
pessoa morre ou fica impedida de trabalhar. Nos países ricos, com alto
índice de educação, o PIB per capita é bem mais alto. Luxemburgo,
por exemplo, teve em 2008 um PIB per capita de US$ 85 mil. Uma
morte prevenível de uma pessoa jovem em um país como Luxemburgo, em função do seu PIB per capita, representa uma perda monumental para o país. Como comparação, no estudo da American Cancer
Society o impacto financeiro mundial da morte nos países pobres foi
de apenas 0,97%. No Brasil, cerca de 25% das pessoas conseguem assinar o próprio nome mas não conseguem ler o que escreveram. É como
se o nome escrito fosse um desenho. Os números medíocres da educação e do saneamento básico no Brasil são alarmantes. Salvar as pessoas no Brasil tem de ser muito mais que salvar da morte: tem de salvar
do analfabetismo, da falta de informação e da falta de cultura.
Onco& – Segundo o estudo, faltam recursos financeiros e humanos,
além de infraestrutura, para enfrentar o câncer de forma eficiente
nos países em desenvolvimento. É o caso do Brasil? Por quê?
10
outubro/novembro 2010 Onco&
Teich – Já temos parte dessa resposta na pergunta anterior. Na minha
opinião, a saúde no Brasil tem cinco problemas críticos, sendo que alguns deles se estendem além da saúde.
O primeiro deles é o subfinanciamento da saúde. Fala-se muito que
o problema do Brasil é a má gestão e não a falta de dinheiro. Esse é um
conceito totalmente equivocado. Falta muito dinheiro para financiar a
saúde no Brasil. Em países com a proposta de cobertura pública universal, como a que foi definida na Constituição brasileira de 1988, os
governos alocam 6% a 8% do PIB. No Brasil, o governo dedica pouco
mais de 3% para esse fim. Gastamos um percentual do PIB bem maior
que o gasto com a saúde para pagar os juros da dívida interna e externa,
que se avoluma devido aos gastos excessivos e crescentes do governo.
O segundo é a má gestão, que torna a situação ainda mais grave,
pois desperdiça recursos extremamente escassos.
O terceiro problema da lista é a falta de informação, um problema
que acomete todo o mundo. Não sabemos os reais benefícios e riscos das
novas tecnologias, como materiais, medicamentos, procedimentos, exames, entre outros. Os estudos são feitos com populações selecionadas,
que não necessariamente refletem as pessoas que são tratadas no dia a
dia, no mundo real. Sem informação adequada, as incorporações tecnológicas são tratadas de forma muito mais emocional do que técnica.
O quarto, já comentado, é a falta de investimento adequado em
educação e infraestrutura.
E o último e mais grave de todos é a corrupção. Existe uma correlação inversa entre o nível de corrupção de um país e o investimento em saúde e educação. Além disso, por mais que um país
possa crescer economicamente, se esse crescimento não se acompanha de crescimento social, o país entra em um processo de estagnação. A corrupção trava o crescimento social, porque os
governantes tomam decisões que os favorecem em detrimento
daquilo que seria melhor para a sociedade como um todo. A corrupção é a vitória da força sobre a justiça social.
Onco& – Numa nota mais pessoal: como o seu entendimento da
economia da saúde contribui no seu entendimento da doença?
Teich – A oncologia faz parte do grupo de doenças de alto custo. Ficou
claro que com o crescimento exponencial dos custos, mesmo na saúde
suplementar, em pouco tempo não seria possível dar tudo para todos.
Posso dizer que a economia aborda o problema da alocação de recursos escassos para desejos ilimitados. A proposta é entender o quanto
as novas tecnologias fazem diferença em termos de tempo e qualidade
de vida, para que, na hora de decidir o que não pode ser dado, que sejam
eliminados os tratamentos que não agregam para os pacientes e que, na
prática, representam apenas um giro financeiro.
Temos de lembrar sempre que o sistema de saúde é um dos maiores
empregadores em todo o mundo, e gastos crescentes não significam
obrigatoriamente algo ruim – estamos criando empregos e gerando impostos, que quando bem empregados permitem o crescimento
econômico e social de um país.
REFERÊNCIA NA 1ª LINHA
DE TRATAMENTO DO RCCm
1,2
2x mais
Sobrevida Livre de Progressão1
• 11 meses VS. 5 meses com IFNα
(IC 95%: 10,7–13,4 e 3,9–5,6, respectivamente [P<0,001])
• 46% de redução do risco de progressão ou morte (HR=0,54)
3x mais tempo em tratamento
1
• 11 meses VS. 4 meses para IFNα
4x mais resposta objetiva
1
• 47% VS. 12% (P<0,001)
Contraindicação: SUTENT* é contraindicado a pacientes com hipersensibilidade (alergia) ao malato de sunitinibe ou a qualquer outro componente da
fórmula. INTERAÇÃO MEDICAMENTOSA: Em caso de utilização concomitante com dexametasona, a dose de Sutent deve ser aumentada. (vide posologia)
Sutent* (malato de sunitinibe). Indicações: tratamento do GIST após falha de mesilato de imatinibe por resistência ou intolerância e tratamento de carcinoma metastático de células renais (CCRm) avançado. Contra-indicações: hipersensibilidade ao malato de sunitinibe ou a qualquer componente da fórmula. Advertências: alteração
da cor da pele: 30%. Hemorragias gastrintestinais, respiratórias, tumorais, do trato urinário e cerebrais. Hemorragia tumoral: 2% dos pacientes com GIST e 39% dos
pacientes com RCCm. Neutropenia Graus 3 e 4 em 13,1% e 0,9% dos pacientes, respectivamente. Hemorragia fatal com trombocitopenia. Eventos cardiovasculares (insuficiência cardíaca, cardiomiopatia e problemas miocárdicos), alguns dos quais fatais. Redução na FEVE t 20% e abaixo do limite inferior da normalidad: 2% dos pacientes com GIST e 4% dos pacientes com carcinoma de células renais. Prolongamento
do intervalo QTcF com concentrações iguais ao dobro da concentração terapêutica. Embolia pulmonar: 1,1%. Hipertensão: 16% dos pacientes com tumores sólidos e 30% dos pacientes com RCCm. Hipotireoidismo:
4% dos pacientes com GIST e 16 % dos pacientes com RCCm. Avaliação laboratorial pré-tratamento da função tireoidiana. Monitorar função tireoidiana. Aumentos na lipase sérica e amilase. Convulsões nos
indivíduos com metástases cerebrais. Atenção: Sutent* contém açúcar, portanto, deve ser usado com cautela em diabéticos. Uso durante a Gravidez: categoria D de risco de gravidez. Fertilidade: fertilidade
do macho e da fêmea pode ser comprometida. Mulheres não deverão amamentar durante o tratamento. Pacientes podem apresentar tontura (vide bula completa do produto). Interações medicamentosas: aumentam concentração plasmática de Sutent*: cetoconazol, ritonavir, itraconazol, eritromicina, claritromicina, suco de toranja (grapefruit). Diminuem a concentração plasmática de Sutent*: rifampicina, dexametasona, fenitoína, carbamazepina, fenobarbital ou Hypericum perforatum. Reações adversas: eventos adversos graves mais importantes: embolia pulmonar, trombocitopenia, hemorragia tumoral, hipertensão
e neutropenia febril. Reações muito comuns: anemia, disgeusia, cefaléia, hipertensão, diarréia, náusea, estomatite, vômito, dispepsia, dor abdominal, síndrome de eritrodisestesia palmar-plantar, rash, alteração
na cor da pele, fadiga/astenia e inflamação das mucosas, anorexia, constipação, glossodinia, alteração na cor do cabelo, pele seca, eritema, dor nas extremidades, bolhas, epistaxe, lipase aumentada, leucopenia,
hipotireoidismo, dispnéia, dor oral, flatulência, doença do refluxo gastroesofágico, alopecia, artralgia, edema, diminuição da fração de ejeção, diminuição de peso (vide bula completa do produto). Posologia: 50 mg
VO, diariamente durante 4 semanas consecutivas, seguidas por um período de descanso de 2 semanas (esquema 4/2), totalizando um ciclo completo de 6 semanas. Superdose: medidas gerais de suporte (vide
bula completa do produto). Apresentações: cápsulas de 12,5 mg, 25 mg ou 50 mg em embalagens contendo 1 frasco com 28 unidades. USO ADULTO. USO ORAL. VENDA SOB PRESCRIÇÃO MÉDICA. A persistirem
os sintomas, o médico deverá ser consultado. Para maiores informações, consulte a bula completa do produto (sut18(140)). Documentação científica e informações adicionais estão à disposição da classe
médica mediante solicitação. Laboratórios Pfizer Ltda., Rua Alexandre Dumas, 1860 – Chácara Santo Antônio, São Paulo, SP – CEP 04717-904. Tel.: 0800-16- 7575. www.pfizer.com.br. Sutent*. MS – 1.0216.0205
Referências: 1. Motzer RJ, Hutson TE, Tomczak P et al. Overall survival and updated results for Sunitinib compared with Interferon
Alfa in patients with metastatic renal cell carcinoma. J Clin Oncol. 2009 Aug 27(22):3584-3590. 2. Hutson TE. Sunitinib (Sutent®) for
the treatment of metastatic renal cell carcinoma. Expert Reviews. Anticancer Ther. 2008; 8(11):1723-1731.
A persistirem os sintomas, o médico deverá ser consultado. * Marca depositada Material produzido em setembro de 2010.
capa
Mais do que alternativa –
integrativa
Não adianta negar: o paciente oncológico usa terapias
complementares. Mas com bom senso e orientação médica,
recursos sérios podem ajudá-lo a recuperar a qualidade de vida
Por Conceição Lemes
N
ÃO PRECISAMOS DE PESQUISA CIENTÍFICA NEM
DE BOLA DE CRISTAL PARA SABER QUE HOUVE
QUEM TORCESSE O NARIZ OU IRONIZASSE AO
ler na capa desta edição de Onco& o tema deste artigo. Acertamos?
Pois essa reação é compreensível. Afinal, devido
a certas terapias alternativas, alguns pacientes com
câncer interrompem ou nem começam o tratamento convencional. Perdem, assim, a possibilidade de se curar ou, pelo menos, ter maior e
melhor sobrevida.
Mas nos deem um tempo e vão entender por
quê. A propósito, você costuma perguntar a todos
os seus pacientes oncológicos se eles usam terapia
complementar, ou alternativa, junto com o tratamento convencional? Quando a quimioterapia não
tem a eficácia esperada ou produz muitos efeitos
colaterais, você a interrompe ou substitui o esquema? Não responda por enquanto.
Em se tratando de terapia complementar, há
sempre algo mais em moda. Atualmente um dos hits
é o livro Anticâncer – Prevenir e vencer usando nossas
defesas naturais, do médico neuropsiquiatra David
Servan-Schreiber, professor da Faculdade de Medicina da Universidade de Pittsburgh e cofundador do
Centro de Medicina Integrativa dessa instituição
norte-americana. Há 17 anos ele teve câncer no cérebro. Os colegas lhe deram seis meses de vida.
“Depois da cirurgia e da quimioterapia, pedi ao
meu oncologista, que tanto me ajudara, conselhos
12
outubro/novembro 2010 Onco&
sobre a vida a levar, sobre precauções a tomar para
evitar uma recaída”, conta Schreiber. “Ele me respondeu: ‘Não há nada especial a fazer. Viva a sua
vida normalmente. Faremos ressonâncias a intervalos regulares, e se esse tumor reaparecer, nós o detectaremos mais cedo’.”
Schreiber não ficou satisfeito. Decidiu estudar
o assunto. O resultado é esse livro, em que relata
uma série de métodos naturais (que ele mesmo diz
ter adotado) para prevenção e acompanhamento
dos tratamentos convencionais e que tem empolgado pacientes brasileiros.
“De fato, muitos chegam entusiasmados, com o
livro debaixo do braço”, conta a oncologista Anelisa
Coutinho, da Clínica AMO, em Salvador, na Bahia.
“Ainda não li. Mas os pacientes contam que se sentem mais estimulados a mudar o estilo de vida, ter
alimentação mais saudável, fazer atividade física.”
“Isso tem acontecido mesmo”, relata o médico
Paulo de Tarso Lima, responsável pelo Centro de
Medicina Integrativa do Hospital Israelita Albert
Einstein, em São Paulo. “O livro tem pontos interessantes, mas há outros que não se adaptam muito
aos hábitos dos brasileiros.”
A médica Abigail Zuger, professora associada de
clínica médica da Columbia University, nos EUA,
acaba com o livro em um artigo no jornal The New
York Times. Título: “Entre a capa e a contracapa, um
informativo comercial”.
“Para cada um dos alimentos anticâncer listados
pelo Dr. Servan-Schreiber existe um fragmento de
provas científicas – normalmente experimentos em
cultura de células, por vezes pesquisas com animais
de laboratório, ocasionalmente pequenos estudos
com seres humanos”, observa Zuger. “Nenhuma
dessas evidências apoiaria, digamos assim, o licenciamento de um novo medicamento.”
“Entre os militantes de dietas anticâncer, Dr.
Servan-Schreiber é moderado”, salienta Zuger. “Ele
alerta contra a rejeição dos tratamentos convencionais em troca da terapia baseada em alimentação, e admite que muito se desconhece sobre o
quanto realmente os vegetais são poderosos.”
A maioria dos pacientes usa
Medicina alternativa, ou complementar, pode ser
definida como “drogas ou métodos terapêuticos que
não tenham sido comprovados cientificamente” e
que, portanto, não estão incluídos dentro do “quadro
de cuidados médicos ortodoxos aceito para pacientes
com câncer”. Incluem-se aí acupuntura, dietas, psicoterapia, homeopatia, exercícios, relaxamento, ioga,
ervas, práticas espirituais, entre muitos.
Tarso Lima abre parêntese. “Terapia alternativa
seria algo que exclui o tratamento convencional.
Mas, no máximo, ela o complementa”, diz. “Uma
visão mais moderna é chamá-la de medicina integrativa, pois caminha junto com a tradicional.”
Fechado parêntese.
O fato é que, independentemente de haver ou
não evidências científicas, pacientes com câncer
buscam terapias alternativas, ou complementares.
Isso acontece no mundo inteiro. Tanto que as
despesas com esses métodos vêm aumentando significativamente. Só nos EUA já chegam a US$ 34,4
bilhões por ano.
“Em estudo que fizemos com 100 pacientes
com câncer em tratamento no nosso ambulatório,
89% já haviam utilizado medicina complementar e
63% a estavam usando naquele momento”, relata o
oncologista Auro Del Giglio, professor e chefe do
Departamento de Oncologia da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do ABC. “A maioria
– 77,7% – acredita em sua eficácia.”
“O tratamento convencional é doloroso, impõe
obrigações, horários, despersonaliza o paciente, que
fica totalmente nas mãos dos médicos”, reconhece Del
Giglio. “A terapia alternativa/complementar é algo de
que ele vai atrás. É uma forma de ele ter autonomia.”
Melhor qualidade de vida
“Algumas dessas terapias ajudam o paciente a manter a esperança, podendo se associar a efeitos psicológicos”, afirma o oncologista Ricardo Caponero,
presidente da Associação Brasileira de Cuidados
Paliativos. “Só que esse mesmo tipo de ganho terapêutico pode ocorrer quando o paciente se torna
parte integrante das decisões do tratamento convencional, mantendo a esperança. A psicologia da
sugestão é muito forte.”
“Costumo contar uma história para os pacientes. Uma paciente minha, católica, procurou
terreiro de umbanda, benzedeira e foi a centro espírita. Ela me disse que fez tudo isso porque alguma
dessas coisas iria ajudá-la”, narra Caponero. “Aí, eu
lhe perguntei: ‘Em qual você acredita?’.” “A busca
dessas diversas opções não mostra excesso de fé. Ao
contrário. Essa energia dissipada em várias direções
só mostra que, na verdade, ela não tem fé alguma
com consistência.”
A pesquisa realizada por Del Giglio com 100 pacientes com câncer constatou que oração individual
(77,5%), grupo de orações (24,7%) e terapias à base
de plantas (23,6%) foram os recursos mais usados.
A variável melhor qualidade de vida foi estudada.
Os 100 pacientes foram submetidos a três questionários. Um abrangente, que buscava informações
médicas gerais. Outro, para saber o uso de medicina complementar/alternativa. O terceiro, sobre
qualidade de vida. Foi utilizado o questionário
QLQ-C30, da Organização Europeia para Pesquisa
e Tratamento do Câncer (EORTC), que já havia sido
validado para o uso em português. A análise estatística foi realizada através do software NCSS 2000
(Utah, Estados Unidos).
Conclusão dessa pesquisa: a crença na eficácia
da medicina complementar se correlacionou significativamente com melhor qualidade de vida global.
Análise multivariada revelou ainda que rezar foi a
prática que mais se correlacionou com melhor qualidade de vida nas escalas funcionais e de sintomas.
“Os médicos não devem desencorajar o uso de
“Nosso papel é ajudar
o paciente a
restabelecer sua
saúde. Entende-se
aqui por saúde o que
a própria OMS define
como tal: bem-estar
físico, mental e
social, e não meramente ausência de
sintomas e doenças.”
Onco& outubro/novembro 2010
13
A maioria dos pacientes, no entanto, não informa
seus médicos de que associa alguma terapia alternativa/complementar ao tratamento convencional.
Na pesquisa de Del Giglio, 83,7% estavam nessa
situação. As razões mais frequentemente relatadas
para esse comportamento foram: os médicos nunca
pediram (46,2%); os pacientes não acharam que era
importante contar para seus médicos sobre o uso de
medicina alternativa/complementar (37,5%).
“Os pacientes acham que, por ser natural, não
faz mal”, alerta a oncologista Anelisa. “Porém, certas
ervas medicinais e compostos podem interagir com
quimioterápicos e outros medicamentos, anulando
ou exacerbando os seus efeitos e, consequentemente, levando à interrupção ou substituição do
tratamento. Além disso, alguns são hepatotóxicos.”
“Como muitos pacientes não relatam o uso,
conhecemos pouco as interações. Não há estudos
bem conduzidos, randomizados, que possam dar
respostas sólidas”, acrescenta Caponero. “Sabemos,
por exemplo, de relatos de alteração da função hepática devido ao chá verde (Camellia sinensis). Já a
erva-de-são-joão (Hypericum perforatum) interage
com ciclosporina, anticoagulantes cumarínicos, anticoncepcionais orais, teofilina, digoxina, indinavir
e, possivelmente, com outros agentes inibidores da
protease transcriptase reversa, prejudicando os respectivos efeitos.”
A babosa (Aloe vera) é outro exemplo. O dito
popular diz que “cura o câncer”. Aí, fazem-se garrafadas de babosa com um pouquinho de álcool.
“Essa combinação pode produzir efeitos colaterais
bem contundentes com a quimioterapia”, atenta
Anelisa. “Muitos pacientes têm náuseas, vômitos e
diarreia só por causa da babosa.”
rante o tratamento agora tem motivos para fazê-lo.
Primeiro, os doentes usam, mesmo.
Segundo, certas preparações podem causar interações com drogas e toxicidade.
Terceiro, a questão é tão importante que metade
das faculdades de medicina norte-americanas já
tem um departamento acadêmico de medicina integrativa (é como lá é frequentemente denominada
a medicina alternativa, ou complementar). Esse
serviço está presente no M. D. Anderson Cancer
Center, em Houston, no Texas, e no Memorial
Sloan-Kettering Cancer Center, em Nova York. No
Brasil, a Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) conta com esse serviço. No Hospital Israelita
Albert Einstein, em São Paulo, o setor funciona há
três anos dentro do departamento de oncologia.
“Nosso papel é ajudar o paciente a restabelecer
a sua saúde”, diz Paulo de Tarso Lima, responsável
pelo setor no Einstein. “Entende-se aqui por saúde
o que a própria Organização Mundial de Saúde e o
Ministério da Saúde definem como tal: bem-estar
físico, mental e social, e não meramente ausência
de sintomas e doenças.”
“Eu não estou falando de livrar a pessoa do
câncer”, prossegue Tarso Lima. “Mas que, apesar
da presença da doença, ela pode, sim, ter um estado de bem-estar que eu, enquanto médico, não
posso oferecer, mas posso ajudá-la a caminhar
num plano terapêutico.”
Não à toa os quatro especialistas entrevistados por
Onco& fazem a mesma recomendação: pergunte aos
seus pacientes se, além do tratamento convencional,
estão usando algum tipo de terapia complementar.
“Criticar ou ridicularizar o paciente por utilizar
esses ‘tratamentos’ não vai fazer com que ele pare
de adotá-los”, reforça Caponero. “O médico que age
assim consegue, no máximo, fazer com que o seu
doente deixe de relatar os outros tratamentos.”
“É preciso estar aberto para escutá-lo sem censura
prévia”, continua. “A partir daí, esclarecer e orientar.”
Estimule os pacientes a contar
Separar o joio do trigo
Ou seja, não adianta tampar o sol com a peneira. O
médico que eventualmente não indaga aos seus pacientes com câncer sobre o uso de outras terapias du-
Boa parte dos pacientes com diagnóstico de câncer
chega com vários fantasmas e uma ideia na cabeça:
como eu posso me livrar dessa doença?
Motivos que levam os
pacientes a buscar
terapias alternativas:
terapias complementares”, defende Del Giglio. “A
menos, claro, que se detecte o uso de algum tipo
que possa ser prejudicial à saúde dos pacientes.”
* limitações do tratamento
convencional;
Os riscos de não perguntar
* popularidade dos tratamentos
naturais, que despertam
maior interesse nos
pacientes com câncer;
* diminuição dos efeitos
colaterais das drogas
quimioterápicas;
* melhora do sistema
imunológico;
* alívio de medo, ansiedade e
depressão associados à vulnerabilidade causada pela doença;
* falta de esperança no seu
tratamento convencional
contra o câncer;
* expectativa de melhorar o
sucesso das terapêuticas
tradicionais.
14
outubro/novembro 2010 Onco&
A tendência é conversar com todo mundo, pesquisar na internet tudo o que existe de alternativo,
para saber se há mais alguma coisa que possa fazer
para ajudar na cura.
“A gente tem de ter bom senso”, recomenda a
oncologista Anelisa. “Nosso papel é pontuar o que
está cientificamente comprovado. E, dentro do que
não está, o que pode ser usado sem prejuízo e o que
pode causar problemas.”
Se, por exemplo, um paciente fala que ouviu
dizer que comer graviola faz bem, tudo bem. Se
ele acha que vai ajudá-lo, isso por si só o estimula
interiormente. Já outro diz que adoraria fazer
reiki, uma terapia tibetana que, segundo os seus
adeptos, teria o objetivo de restabelecer o equilíbrio energético por meio da imposição de mãos.
Vai fazer mal? Não.
“O x da questão não é defender o reiki, a acupuntura, a ioga ou a graviola”, diz Anelisa. “A pessoa
imbuída de esperança tem a autoestima melhorada,
tende a se cuidar melhor.”
“Já se o paciente diz que vai usar babosa, peço
para não usar”, frisa a médica. “Consulto nosso farmacêutico sempre que o paciente refere erva ou
substância que eu desconheço, para saber se há alguma interação.”
“É preciso separar o joio do trigo”, arremata
Anelisa. “Não tolha o paciente de buscar recursos alternativos que não façam mal. Deve-se, porém, fugir
das coisas extremistas, como certas dietas restritivas,
desequilibradas, assim como de substâncias tóxicas.”
“Se aquela prática vai fazer a pessoa se sentir
melhor, que direito eu tenho de vetar? Nenhum”,
diz Del Giglio, taxativamente. “Tente saber sobre os
outros tratamentos do seu paciente. Só assim vai
descobrir onde ele circula e se ele corre risco de usar
algo que interfira no tratamento convencional.”
Como fugir dos charlatões
O fato de a terapia complementar não ser cientificamente comprovada não significa obrigatoriamente charlatanismo. É o caso da homeopatia e
da acupuntura.
“Se a terapia tem um arcabouço teórico que a
sustente, não podemos falar em charlatanismo”, de-
fine Del Giglio. “Logo, desde que ela se paute pelos
princípios que a norteiam, temos de respeitar. Eu,
por exemplo, recomendo acupuntura aos meus pacientes com dores, pois ela traz benefícios, sim.”
Agora, se determinada terapia alternativa não
tem arcabouço ou foge dele, estamos, sim, diante
de um embusteiro, que explora a boa-fé e a esperança de pacientes com câncer e familiares, frequentemente visando apenas ganhar dinheiro.
“Charlatanismo não é apanágio das terapias
complementares”, Caponero põe o dedo na ferida.
“Há médicos ‘legítimos’ que utilizam técnicas não
aprovadas, objetivando exclusivamente usufruir
ganhos econômicos. Só uma boa relação médicopaciente pode solucionar esses problemas.”
Esse é mais um motivo para você se interessar
pelos tratamentos alternativos feitos pelo seu paciente. A abordagem mais pessoal aumenta a eficácia do que você prescreve. Primeiro, porque ele
tende a aderir mais ao tratamento. Segundo,
porque, conhecendo-o melhor, você irá prescrever
aquilo que ele tem condições de cumprir.
“É importante mostrar aos pacientes os potenciais malefícios, a ausência de estudos confiáveis e
diferenciar a informação obtida por pesquisa clínica
criteriosa da informação com base na crendice e em
relatos pessoais não comprovados”, volta à carga
Caponero. “Eu brinco com os pacientes, dizendo
que o melhor tratamento para o resfriado comum
é chá de limão com alho, associado a um analgésico
e antipirético e, eventualmente, um anti-histamínico, mas o chá de limão é fundamental!”
“Os grandes serviços deveriam ter pessoas especializadas em abordar temas de medicina complementar de forma científica e ética para os seus
pacientes”, sustenta Del Giglio. “Existem modalidades que podem ajudar no tratamento de alguns
sintomas para os quais a medicina alopática não
tem opções muito boas, como a sensação de ‘falta
de energia’, fadiga e alguns tipos de dor crônica.”
Del Giglio vai além: “Os fitoterápicos deveriam ser avaliados também pelo crivo científico,
assim como qualquer medicação nova alopática.
É o único jeito de irmos separando cada vez mais
o joio do trigo”.
“Terapia alternativa
seria algo que exclui
o tratamento
convencional. Uma
visão mais moderna
seria chamá-de de
medicina integrativa,
pois caminha
junto com a
tradicional.”
Onco& outubro/novembro 2010
15
tabagismo
Tabagismo e câncer
Introdução
D
Divulgação
E UM ESTILO DE VIDA ENTRE OS ANOS
Ricardo Meirelles
* Médico pneumologista da Divisão
de Controle do Tabagismo do
Instituto Nacional de Câncer (INCA);
médico responsável pela Clínica
de Tratamento do Tabagismo das
Clínicas Oncológicas Integradas
(COI); membro titular da Comissão
de Combate ao Tabagismo da
Associação Médica Brasileira (AMB);
membro da Comissão de Controle
do Tabagismo do Conselho Federal
de Medicina (CFM)
Contato:
[email protected]
16
1950
E
1970, O TABAGISMO É HOJE CONSIDERADO UMA
PANDEMIA E A MAIOR CAUSA ISOLADA DE ADOECImento e mortes precoces no mundo. A Organização
Mundial da Saúde (OMS) reconhece o tabagismo
como uma doença crônica, epidêmica, transmitida
por meio da propaganda e publicidade, tendo como
vetor a poderosa indústria do tabaco. É a maior causa
isolada evitável de adoecimento e mortes precoces no
mundo, totalizando 5 milhões de mortes por ano. Se
o padrão de consumo atual se mantiver, são esperados 10 milhões de mortes anuais em 2020, 70% delas
em países em desenvolvimento. No Brasil, dados da
Organização Pan-Americana de Saúde apontam para
200 mil mortes anuais devido ao tabagismo.1,2
A constatação de que a nicotina, presente em
todos os derivados do tabaco, é uma droga psicoativa
fez com que a OMS incluísse o tabagismo no grupo
dos transtornos mentais e de comportamento decorrentes do uso de substâncias psicoativas na Décima
Revisão da Classificação Internacional de Doenças
(CID-10).3 A dependência da nicotina obriga os fumantes a se expor cronicamente a cerca de 4.720
substâncias, muitas delas tóxicas, fazendo com que o
tabagismo seja um fator causal de aproximadamente
50 doenças, entre elas vários tipos de câncer (pulmão,
laringe, faringe, esôfago, estômago, pâncreas, fígado,
rim, bexiga, colo do útero, leucemia), doenças do
aparelho respiratório (enfisema pulmonar, bronquite
crônica, asma, infecções respiratórias) e doenças cardiovasculares (angina, infarto agudo do miocárdio,
hipertensão arterial, aneurismas, acidente vascular
cerebral, tromboses).4,5
Além dos efeitos danosos para os fumantes, o
tabagismo atinge também os não fumantes que convivem com fumantes em ambientes fechados – os
chamados fumantes passivos. A exposição involuntária à fumaça do tabaco pode acarretar desde reações
alérgicas (rinite, tosse, conjuntivite, exacerbação de
asma) em curto período até infarto agudo do miocárdio, câncer de pulmão e doença pulmonar obstrutiva
crônica (enfisema pulmonar e bronquite crônica) em
outubro/novembro 2010 Onco&
adultos expostos por longo período.6
O tabaco é um carcinógeno que atua tanto como
indutor (efeito mutagênico) como promotor (proliferação celular). São identificadas entre 60 e 70 substâncias cancerígenas na fumaça dos derivados do
tabaco, entre elas hidrocarbonetos aromáticos
policíclicos (HAP), arsênico, níquel, cádmio, polônio
210 (substância radioativa), nitrosaminas voláteis,
aminas aromáticas. Quatro delas são específicas do
tabaco: N-nitrosonor-nicotina (NNN), dimetilnitrosamina-piridilbutanona (NNK 2), N-nitrosoanabasina
(NAB), N-nitrosoanabatina (NAT)7.
Estudos já comprovaram que não existem níveis
seguros para o consumo de cigarros: quanto maior o
consumo de cigarros por dia, maior o risco de adoecer de câncer de pulmão (Tabela 1).
Sabe-se hoje que é incoerente tratarmos o
câncer, seja através de cirurgia, radioterapia e/ou
quimioterapia, e ignorarmos seu principal fator
de risco. Sem abordar o tabagismo, perpetuam-se
os efeitos nocivos do cigarro no paciente e aumentam os riscos de recidivas ou mesmo de um
segundo tumor primário.8
Estudos científicos já demonstraram que pacientes com câncer de pulmão, ao parar de fumar,
melhoraram a sobrevida em comparação aos que não
pararam de fumar.9, 10 Além disso, continuar fumando
após diagnóstico de câncer exacerba as complicações
do tratamento, como mucosite, e dificulta a cicatrização da ferida operatória.11
Tabagismo como doença
Conforme já descrito anteriormente, a OMS considera o tabagismo como uma doença devido à dependência da droga nicotina. Essa dependência,
porém, é um processo complexo que envolve a
inter-relação entre farmacologia, fatores adquiridos
(ou condicionadores), socioambientais, comportamentais, de personalidade, entre outros.12, 13, 14
De forma didática, podemos dividir a dependência da nicotina em três componentes: dependência física, dependência psicológica e condicionamentos ao fumar. Esses componentes não
atuam isoladamente, sendo que o fumante pode
apresentar mais evidências de um determinado
componente sobre os demais.12, 13, 14
Dependência física:
Define-se como a necessidade física (orgânica) de
nicotina que o fumante apresenta. A nicotina é
considerada uma droga psicoativa estimulante e
seu mecanismo de dependência é semelhante ao
da cocaína e da heroína.
Ao atingir o cérebro, a nicotina se propaga por
todas as áreas, centros e até o córtex, interagindo
com os receptores colinérgicos presentes nas membranas de muitos neurônios, que passam a se
chamar receptores nicotínicos-acetilcolínicos
(nAChRs) e ficam distribuídos nas regiões periféricas e centrais do cérebro.15, 16
Os receptores nicotínicos liberam uma série
de neurotransmissores e neurorreguladores, como dopamina, acetilcolina, epinefrina, norepinefrina, serotonina, betaendorfina, vasopressina.
Cada um deles apresenta uma atividade cerebral
específica: prazer, alerta, diminuição do apetite,
melhora da memória, redução da ansiedade, entre
outros. O mais importante e mais estudado é
a dopamina, pois há uma grande liberação desse neurotransmissor no nucleus accumbens,
que produz uma forte sensação de prazer e euforia, consequentemente levando o indivíduo a
continuar a fumar.15, 16
O cérebro reage quando deixa de receber
nicotina, e o fumante passa a apresentar sintomas
desagradáveis: irritabilidade, tonteira, cefaleia,
agressividade, tristeza, ansiedade, dificuldade de
concentração, vertigens, distúrbios do sono e,
principalmente, forte desejo de fumar, a chamada
“fissura”. Tais sintomas caracterizam a síndrome
de abstinência da droga nicotina, mas podem não
ocorrer em todos os fumantes após a cessação do
tabagismo. Naqueles que os apresentam, os
sintomas se iniciam algumas horas após a abstinência. Sua intensidade aumenta nos quatro primeiros dias e desaparece entre uma e duas
semanas. A “fissura”, em geral, não dura mais que
cinco minutos e tende a permanecer por mais
tempo que os demais sintomas. Porém, sua intensidade diminui gradativamente, enquanto o intervalo entre episódios aumenta.14
Câncer de pulmão
1 a 9 cigarros/dia
10 a 19 cigarros/dia
20 a 39 cigarros/dia
40 ou mais cigarros/dia
Tabela 1: Percentual de câncer
de pulmão em fumantes,
comparado a não fumantes
362%
762%
1.369%
1.772%
Não existem níveis seguros para o consumo de cigarros
Fonte: Rosemberg, 2002
Dependência psicológica:
É a vontade que o fumante apresenta de acender
um cigarro para aliviar tensões como angústia, ansiedade, tristeza, medo, estresse, ou até momentos
de depressão. O cigarro passa a preencher um espaço vazio e é encarado como um companheiro em
períodos de solidão. É como se o fumante vivesse
uma relação de amizade e companheirismo com o
cigarro – parar de fumar significa, portanto, uma
separação de algo prazeroso e de que se gosta
muito. O ato de parar envolve uma tristeza muito
grande, descrita muitas vezes como “luto”.14, 17
Condicionamentos:
São as associações que o fumante faz com situações
habituais de seu cotidiano. Por estar presente em
sua rotina diária, o fumante passa a incorporar o
cigarro a determinadas situações – ele se condiciona
a fumar após tomar café, após as refeições, ao assistir televisão, ao falar ao telefone, ao ingerir bebidas
alcoólicas, ao dirigir, antes de iniciar uma tarefa que
exija concentração e até em situações em que se encontra relaxado. São associações em que ele utiliza
o cigarro de forma automática, sem se dar conta de
que está fumando.14, 17
Tratamento
O tratamento do tabagismo se baseia na abordagem
cognitivo-comportamental, cujo objetivo é detectar
situações que levam o indivíduo a fumar e, a partir
daí, desenvolver estratégias para que ele aprenda
a enfrentá-las, alterando suas crenças e atitudes
diante delas. Dessa forma, o fumante passa a viver
situações rotineiras, em que normalmente fumaria,
sem buscar o cigarro, tornando-se um agente de
mudança de seu próprio comportamento.18
Essa abordagem visa não apenas que o fumante
pare de fumar, mas, principalmente, que ele se
mantenha abstinente.
A abordagem do fumante deve ser realizada
Onco& outubro/novembro 2010
17
sempre com firmeza, mas sem agressividade ou
preconceito. É fundamental que o médico tenha
uma postura acolhedora, criando uma atmosfera de
respeito e confiança, para que o fumante sinta que
ele está realmente interessado em apoiá-lo no processo de cessação do tabagismo.17
Como o tabagismo é uma doença crônica,
deve-se manter um acompanhamento do paciente
para prevenir uma possível recaída. O acompanhamento deve ocorrer em consultas subsequentes, a partir da data do abandono do fumo,
onde serão discutidos os progressos e as dificuldades vivenciadas pelos ex-fumantes.10, 14
O mais importante é que o paciente entenda que
o tabagismo é uma doença crônica e que ele não
pode, em hipótese alguma, acender um cigarro ou
dar uma tragada, pois poderá voltar a fumar.
Caso ocorra, a recaída deverá ser aceita pelo
médico sem críticas, mantendo a atmosfera de confiança e apoio já demonstrada. É fundamental que
o paciente, ao retornar à consulta após ter recaído,
seja estimulado a tentar novamente, marcando
nova data para deixar de fumar, identificando os fatores que contribuíram para voltar a fumar e
traçando estratégias para a nova tentativa. O
médico deve ter conhecimento de que a média de
tentativas para que o paciente deixe de fumar definitivamente é de três a quatro vezes.10, 14
Tabela 2:
Teste de Fagerström
Perguntas
1. Quanto tempo após acordar
você fuma o primeiro cigarro?
18
Respostas
Dentro de 5 minutos = 3
Entre 6 e 30 minutos = 2
Entre 31 e 60 minutos = 1
Após 60 minutos = 0
2. Você acha difícil não fumar
em lugares proibidos, como
igrejas, cinemas, ônibus etc.?
Sim = 1
Não = 0
3. Qual o cigarro do dia
que traz mais satisfação?
O primeiro da manhã = 1
Outros = 0
4. Quantos cigarros
você fuma por dia?
Menos de 10 = 0
De 11 a 20 = 1
De 21 a 30 = 2
Mais de 31 = 3
5. Você fuma mais
frequentemente pela manhã?
Sim = 1
Não = 0
6. Você fuma mesmo doente,
quando precisa ficar de cama?
Sim = 1
Não = 0
outubro/novembro 2010 Onco&
Medicamentos
O uso de medicamentos tem um papel bem
definido no processo de cessação do tabagismo:
minimizar os sintomas da síndrome de abstinência
de nicotina, facilitando a abordagem do fumante.18
Eles devem ser utilizados preferencialmente nos
fumantes que apresentam dependência física média,
elevada ou muito elevada, ou a critério clínico.18 O
grau de dependência física pode ser avaliado através
do Teste de Fagerström (Tabela 2).
A dependência da nicotina pode ser resumida em
apenas duas perguntas:
- Quantos cigarros fuma por dia?
- Quanto tempo após acordar acende o primeiro cigarro?
Caso o fumante fume 20 ou mais cigarros por dia,
e acenda o primeiro cigarro do dia até 30 minutos
após acordar, ele apresenta um elevado grau de dependência física de nicotina.10, 14
Os medicamentos utilizados atualmente no tratamento do tabagismo são os seguintes:
- Terapia de reposição de nicotina (TRN);
- Bupropiona ;
- Vareniclina.
A TRN é encontrada nas seguintes apresentações:
- adesivo transdérmico;
- goma de mascar;
- pastilha;
- inalador oral;
- spray nasal;
- comprimido sublingual.
Atualmente só estão disponíveis no Brasil as
apresentações da TRN em adesivo transdérmico,
goma de mascar e pastilha.
Grau de dependência
De 0 a 2 pontos = muito baixo
De 3 a 4 pontos = baixo
5 pontos = médio
De 6 a 7 pontos = elevado
De 8 a 10 pontos =
muito elevado
A escolha de um dos medicamentos dependerá
da avaliação individual do paciente. Não havendo
contraindicações clínicas, o medicamento é escolhido segundo a facilidade de administração, em
comum acordo com o paciente, o que tende a aumentar a aderência ao tratamento. A TRN e a
bupropiona podem ser utilizadas isoladamente ou
em combinação. A vareniclina somente poderá ser
utilizada de forma isolada.18, 19
A duração do tratamento com qualquer forma
de medicamento é de 12 semanas. A TRN deve ser
iniciada no dia que o paciente escolheu para deixar
de fumar. Já com a bupropiona e a vareniclina,
deve-se parar de fumar no oitavo dia após ter iniciado o uso do medicamento.18, 19
Conclusão
Todo médico deve se conscientizar de que o tabagismo é uma doença crônica e que todo fumante
necessita de apoio e acompanhamento para con-
seguir deixar de fumar. Muitos fumantes utilizam o
cigarro não apenas porque querem fumar, mas
porque necessitam da nicotina e do papel que o cigarro desempenha em sua vida.
Pacientes com câncer devem ser sempre orientados a deixar de fumar, em qualquer estágio da
doença. A cessação do tabagismo em um paciente
com câncer deve ser encarada como uma importante etapa do tratamento do câncer. A melhora
da autoestima e da autoconfiança que o paciente
sente ao conseguir parar de fumar dará a ele
condições para enfrentar o tratamento do câncer
de maneira mais positiva.
O médico deve ter em mente que o tratamento
do tabagismo, como o de qualquer doença crônica,
deve ser contínuo. Não adianta apenas parar de
fumar. O fumante deve ser sempre acompanhado,
usando ou não medicamento, para que ele continue
sem fumar, mantendo suas conquistas, especialmente a melhora na sua qualidade de vida.
Referências bibliográficas
1. World Health Organization (WHO), 2002. The World Health Report: Reducing Risks and, Promoting Healthy Lifestyles. Geneva, Switzerland.
2. Pan American Health Organization (PAHO), 2002. Health in the Americas.
3. Organização Mundial de Saúde (OMS), 1997. Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde – Décima Revisão(CID 10). Traduzido pela Faculdade de Saúde Pública de São Paulo – Centro
Colaborador da OMS para Classificação de Doenças em Português – 4a ed. –
São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo.
4. Dube, M.F., Green, C.R., 1982. Methods of collection of smoke for analytical
purposes. Recent. Adv. Tob. Sci., 8, 42-102.
5. U.S. Department of Health and Human Services. The Health Consequences
of Smoking: A Report of the Surgeon General. U.S. Department of Health and
Human Services, Centers for Disease Control and Prevention, National Center
for Chronic Disease Prevention and Health Promotion, Office on Smoking and
Health, 2004.
6. U.S. Department of Health and Human Services. The Health Consequences
of Involuntary Exposure to Tobacco Smoke: A Report of the Surgeon General.
U.S. Department of Health and Human Services, Centers for Disease Control
and Prevention, National Center for Chronic Disease Prevention and Health
Promotion, Office on Smoking and Health, 2006.
7. Rosemberg, J.. Pandemia do Tabagismo – Enfoques Históricos e Atuais. 1ª
edição, São Paulo, (SP) Secretaria Estadual de Saúde, 2002.
8. Gonçalves, C.M.C., Meirelles, R.H.S., 2007. Cessação do Tabagismo em Pacientes com Câncer. In: Viegas C.A.A. (Ed). Tabagismo: do Diagnóstico à Saúde
Pública. Editora Atheneu, São Paulo, SP.
9. Nia PS, et al. Prognostic value of smoking status in operated non-small cell
lung cancer. Lung Cancer 2005; 47: 351-359.
10. Tammemagi, CM, et al. Smoking and Lung Cancer Survival. The Role of
Comorbidity and Treatment. Chest 2004;125: 27-37.
11. Anthonisen NR, et al. The Effects of a Smoking Cessation Intervention on
14.5-Year Mortality. Ann Intern Med. 2005; 142: 233-239.
12. Reina, S.S., Damasceno, A.G-T., Orive, J.I.G., 2003. Iniciación y mantenimiento del hábito tabáquico. El paciente que va a dejar de fumar. In: Ferrero
MB, Mezquita MAH, Garcia MT. – Manual de Prevención y Tratamiento del
Tabaquismo, www.atenciontabaquismo.com, Espanha, 2003.
13. Ministério da Saúde – Instituto Nacional de Câncer/Coordenação Nacional
de Controle do Tabagismo e Prevenção Primária do Câncer – Ajudando seu
Paciente a Deixar de Fumar, Rio de Janeiro, 1997.
14. Meirelles, R.H.S., Gonçalves, C.M.C., 2006. Como Fazer Seu Paciente Parar
de Fumar. In: Zamboni M., Pereira CAC (Eds.). Pneumologia – Diagnóstico e
Tratamento. Editora Atheneu, São Paulo, SP.
15. Rosemberg J., 2004. Nicotina Droga Universal, Instituto Nacional de
Câncer (site da internet: www.inca.gov.br).
16. Fagerström, K. Uma Breve Apresentação da Neurofarmacologia e Fisiologia
da Dependência à Nicotina. In: Gigliotti A.P.; Presman S. (Eds). Atualização no
Tratamento do Tabagismo. ABP Saúde, 2006.
17. Ministério da Saúde, Instituto Nacional de Câncer, Coordenação de Prevenção e Vigilância, Divisão de Controle do Tabagismo e Outros Fatores de
Risco de Câncer, 2005 – Deixando de Fumar sem Mistérios – Manual do Coordenador, Rio de Janeiro.
18. Ministério da Saúde, Instituto Nacional de Câncer, Coordenação de Prevenção e Vigilância - Consenso sobre Abordagem e Tratamento do Fumante,
Rio de Janeiro, 2001.
19. Fiore, M.C., Jaén, C.R., Baker, T.B., et al, 2008. Treating Tobacco Use and
Dependence. Clinical Practice Guideline. U. S. Department off Health and Humans Services, Public Health Service. Update.
Onco& outubro/novembro 2010
19
mama
Os dez grandes mitos sobre
câncer de mama em 2010
A
4
1
5
2
6
NEOPLASIA MAMÁRIA É A PRINCIPAL CAUSA DE
MORTE POR CÂNCER NAS MULHERES BRASILEIRAS.
SENDO ASSIM, O DEBATE SOBRE A PREVENÇÃO, OS
fatores de risco, as maneiras de realizar o diagnóstico
e o tratamento estão constantemente em debate na
mídia. Muitos mitos ainda persistem em 2010 sobre
o câncer de mama. O objetivo deste artigo é apresentar e discutir dez grandes mitos sobre essa doença.
Lilian Liang
MITO: “Mulheres jovens não desenvolvem
câncer de mama.”
Em primeiro lugar, é importante esclarecer que o
câncer de mama ocorre em todas as idades. Sabemos
que o risco aumenta proporcionalmente com a idade. Porém, 5% das neoplasias mamárias são diagnosticadas em mulheres com menos de 35 anos.
MITO : “Mamografia normal significa que
não há câncer de mama.”
A mamografia é o melhor exame de imagem para
realizar diagnóstico precoce do câncer de mama,
entretanto a taxa de falso-negativo varia entre 10%
e 15%. Algumas alterações na mama são diagnosticadas apenas no exame físico, como lesões em
quadrante superior interno que podem não ser incluídas nos clichês radiológicos, ou mamas densas
que diminuem a sensibilidade.
A mamografia não exclui a realização do exame
físico. Alterações no exame físico não visualizadas na
mamografia devem ser avaliadas por ultrassonografia
complementar e/ou ressonância magnética de mama.
Antonio Luiz Frasson
* Professor doutor da Faculdade
de Medicina da PUC-RS. Coordenador
do Centro de Mama da PUC-RS.
Mastologista do Hospital
Albert Einstein – São Paulo.
Contato: [email protected]
Betina Vollbrecht
* Mestre em gerontologia biomédica
pela PUC-RS. Médica do Centro
de Mama da PUC-RS.
3
Rafaello Frasson
* Acadêmico de Medicina da PUC-RS.
Bolsista de iniciação científica
do Centro de Mama da PUC-RS.
22
outubro/novembro 2010 Onco&
MITO: “Nódulo de mama é a única maneira
de diagnosticar um câncer de mama.”
Alterações na pele, descarga papilar e microcalcificações na mamografia podem ser os primeiros sintomas/sinais da neoplasia mamária. Alguns tipos
histológicos não costumam formar nódulos, como
o carcinoma lobular e tubular. Outro exemplo é o
diagnóstico de carcinoma ductal “in situ” (CDIS),
que é realizado em 80% das vezes através de microcalcificações na mamografia.
MITO: “História familiar negativa para
câncer de mama significa que não há motivos para preocupação com essa neoplasia.”
No último ano, 76% das mulheres com diagnóstico
de câncer de mama relataram história familiar negativa. O maior fator de risco para desenvolver um
câncer de mama é ser do sexo feminino, portanto
elaborar um programa de rastreamento para essa
doença é importante para todas as mulheres.
MITO: “A única história familiar importante é a materna.”
A história familiar paterna de câncer de mama é tão
importante quanto a materna. Câncer de mama hereditário pode ser materno e/ou paterno. A história familiar deve incluir no mínimo duas gerações.
MITO: “O fator mais importante na história
familiar é o número de parentes afetados.”
A idade do diagnóstico é mais importante que o
número de familiares afetados. Diagnóstico de
câncer de mama em mulheres jovens é um fator de
risco importante para câncer hereditário.
História pessoal e/ou familiar de câncer de ovário,
neoplasia mamária bilateral e história de câncer de
mama em homem também aumentam o risco de
câncer hereditário.
7
MITO: “Câncer de mama deve ser imediatamente operado após seu diagnóstico para
evitar metástases.”
Câncer de mama não é uma emergência médica.
Sabemos através de diversos estudos que tumores
de mama com 1 cm de diâmetro estão em desenvolvimento há aproximadamente 8 – 10 anos.
O tratamento deve ser iniciado o mais breve possível para evitar complicações locais e sistêmicas.
Entretanto, antes de realizar os procedimentos terapêuticos é importante que a paciente e seus familiares
saibam das opções de tratamento e possam juntamente com uma equipe multidisciplinar optar pelo
tipo de cirurgia, radioterapia e tratamento sistêmico.
8
MITO: “Todos os cânceres de mama devem
ser tratados da mesma maneira.”
Não existe uma única “receita” para o tratamento da
neoplasia mamária. Existem mais de 15 tipos histológicos de câncer de mama, e o grau histológico
e a biologia molecular do tumor vão variar largamente em agressividade.
O tratamento deve ser sempre individualizado.
A escolha do tratamento depende basicamente do
tipo e grau histológico, do tamanho tumoral, do
perfil imuno-histoquímico, da presença de metástases, da idade, de comorbidades, do desejo da paciente e da experiência acumulada pela equipe
médica que realizará o tratamento.
9
MITO: “Câncer de mama é o principal inimigo da mulher.”
O principal inimigo da mulher não é o câncer de
mama, mas sim o diagnóstico tardio dele. Câncer
de mama diagnosticado precocemente é curável.
10
MITO: “Mulheres de alto risco para
neoplasia mamária não podem modificar esse risco.”
Mulheres de alto risco para câncer de mama devido
a história familiar, mutação BRCA, biópsia mamária
com alterações proliferativas ou até mesmo história
pessoal de câncer de mama podem adotar algumas
práticas de profilaxia: não fumar, ter ingestão controlada de álcool, praticar exercícios físicos regularmente, ter dieta balanceada, fazer exame físico e
mamografia (conforme a recomendação médica),
quimioprevenção e/ou cirurgias redutoras de risco.
Novas diretrizes
O câncer de mama é o segundo tipo de câncer mais
frequente no mundo e o mais comum entre as mulheres. Segundo estimativas do Instituto Nacional
de Câncer (INCA), o Brasil terá cerca de 50 mil
novos casos diagnosticados em 2010 – um risco de
quase cinco para cada 100 mil mulheres.
Apesar disso, as taxas de mortalidade em decorrência do câncer de mama no Brasil continuam
altas, principalmente devido ao diagnóstico tardio.
O câncer de mama é altamente curável se identificado e tratado precocemente: a sobrevida média
após cinco anos em países desenvolvidos é de 73%.
Esse índice na população mundial é de 61%. Nos
países em desenvolvimento, ele cai para 57%.
Os países da América Latina se encaixam nesse
perfil – diagnóstico tardio, mortalidade alta. Para tentar
reverter esse quadro, o Grupo Latino-Americano de
Investigação em Oncologia Clínica (GLICO) e o National Comprehensive Cancer Network (NCCN) se
uniram em 2009 para desenvolver diretrizes em câncer de mama e câncer de pulmão para o continente.
O resultado dessa parceria tem lançamento previsto para dezembro: um guia clínico prático, baseado
nas melhores práticas norte-americanas e adaptado à
realidade latino-americana, que seja de utilidade para
clínicos, pacientes e outros envolvidos no processo
decisório em sistemas de saúde nessas duas áreas.
Aliança formada por 21 dos principais centros de
câncer no mundo, o NCCN é uma organização sem
fins lucrativos, dedicada a melhorar a qualidade e a
eficácia do tratamento de pacientes de câncer. As diretrizes do NCCN são a bússola para política clínica
em oncologia, elaboradas por painéis multidisciplinares, que abordam temas como detecção, prevenção
e redução de risco, diagnóstico, tratamento e cuidados paliativos, revisadas e reeditadas anualmente.
O desafio inicial de criação das guias não foi nada
fácil: adaptar as diretrizes para realidades políticas,
econômicas e sociais de países completamente diferentes. Vencida a primeira dificuldade, vieram outras.
Uma delas é evitar os “modismos” na área. Os painéis
procuram ficar atentos a conceitos, procedimentos
ou novas drogas que parecem ser revolucionários à
primeira vista, mas que com o tempo são desbancados por falta de evidências ou por falta de benefício
efetivo ao paciente.
Outro obstáculo é avaliar se mudanças estatisticamente significativas – um aumento na sobrevida
livre da doença, por exemplo – se traduzem em benefício real ao paciente, considerando pontos como
preço do medicamento e toxicidade.
Esses cuidados têm um único objetivo: garantir
que os pacientes recebam o melhor tratamento possível e auxiliar o médico a tomar a decisão mais adequada nesse sentido.
PENSAMENTOS FINAIS
O câncer de mama diagnosticado precocemente em
2010 já pode ser considerado uma neoplasia
curável. Para que esse objetivo seja alcançado é importante que todas as mulheres realizem um programa de rastreamento mamográfico e exame físico
sob orientações médicas.
Para saber
* Kaufmann M, Morrow M, Mickwitz
G, et al. Locoregional Treatment
of Primary Breast Cancer. Cancer
2010; 0: 1-8.
* National Comprehensive Cancer
Network - Clinical Practice Guidelines in Oncology - Breast Cancer
V.1. 2010 www.nccn.org
* Veronesi U, Zurrida S, Viale G, et
al. Breast cancer classification:
time for a change. J Clin Oncol
2009, 27: 2427-28.
* Evens DGR, Baildam AD, et al.
Risk reducing mastectomy: outcomes in 10 European Centers. J
Med Genet 2009; 46: 254 – 58.
* Aebi S., Davidson T, Gruber G. et
al. Primary breast cancer: ESMO
Clinical Practice Guidelines for
diagnosis, treatment and followup. Annals of Oncology 21 (Supplement 5): v9–v14, 2010.
* Frasson AL, Zerwes FP, Vollbrecht
B, et al. A Polêmica da Mamografia no Rastreamento do
Câncer de Mama. Prática Hospitalar, 69; 2010: 55 – 58.
Onco& outubro/novembro 2010
23
geniturinário
Tratamento sistêmico do carcinoma
de células renais metastático:
estado da arte em 2010
Introdução
O
CÂNCER DE RIM CORRESPONDE A APROXIMADA-
MENTE
4%
DE TODOS OS NOVOS CASOS DE
Divulgação
CÂNCER NO MUNDO.
Igor Morbeck
* Oncologista clínico – ONCO-VIDA
– Brasília-DF; professor de Medicina
Interna da Universidade Católica
de Brasília; diretor do Centro
de Estudos e Pesquisas
Oncológicas – CESPO
Contato:
[email protected]
24
NO BRASIL, MAIS DE
4 mil casos foram diagnosticados em 2008, com
mais de 2,3 mil óbitos.1
De todos os casos de câncer de rim, cerca de
85% surgem do epitélio renal e são classificados
como carcinoma de células renais (CCR), 10% são
carcinomas papilíferos, 4% são carcinomas cromófobos e os demais são classificados como oncocitomas, carcinomas de ductos coletores (ou de Bellini),
entre outros muito raros.2
O prognóstico dos CCRs varia de acordo com o
estadiamento inicial e é geralmente ruim no estádio
clínico IV, com sobrevida mediana de dez meses. No
entanto, alguns estudos têm mostrado sobrevida
longa em pacientes com características clínicas específicas, como intervalo longo entre a nefrectomia
e o surgimento de metástases, sítio único de doença
e ausência de comprometimento linfonodal.3 Mais
recentemente, cinco fatores prognósticos capazes de
prever pior sobrevida foram identificados em análise
multivariada de 670 pacientes tratados no MSKCC
em Nova York4 (Tabela 1).
A intervenção cirúrgica é o tratamento primário
do CCR. A nefrectomia radical é o tratamento padrão,
sendo considerada superior aos tratamentos conservadores como nefrectomia parcial ou enucleação.
No entanto, a recorrência pós-cirúrgica ocorre em
aproximadamente 30% dos pacientes. Em pacientes
selecionados que apresentam metástases únicas, a nefrectomia radical seguida da metastasectomia pode
ser curativa.5 A nefrectomia total também deve ser
realizada na doença metastática, sem potencial curativo, mas com ganho de sobrevida.6
Até o início deste século, o carcinoma de células
renais metastático (CCRm) era considerado um dos
tumores mais resistentes da oncologia (químio e radiorresistência), sendo suscetível a imunomodu-
outubro/novembro 2010 Onco&
lação com citoquinas em pequena proporção de pacientes, cujas respostas ficavam em torno de 10% a
15%. Felizmente, nos últimos cinco anos, com o
advento das medicações biológicas alvo-específicas,
capazes de interferir com as vias de transdução de
sinais intracelulares, angiogênese e progressão tumoral, a história do tratamento do CCRm mudou
drasticamente. Embora não curativo, o tratamento
com essas novas drogas tem demonstrado aumento
de sobrevida e melhora da qualidade de vida.
Citoquinas
A remoção do CCR primário pode estimular resposta imunológica que ocasionalmente resulta em
remissão espontânea de metástases, particularmente
pulmonares.7 Dessa forma, desde o final da década
de 80, o uso exógeno de citoquinas (principalmente
a interleucina-2 e o interferon alfa) tornou-se padrão
em CCRm através do conceito de que um incremento na atividade imunológica do hospedeiro
poderia ser traduzido em benefício clínico. Em
metanálise publicada em 2005 e que envolveu mais
de 6,8 mil pacientes com CCRm e 58 estudos clínicos randomizados, concluiu-se que nenhuma
imunoterapia mostrou eficácia no CCRm8. Entretanto, uma pequena fração de pacientes parece se
beneficiar da imunoterapia, com eventual cura. A
interleucina-2 em altas doses (HDIL-2) pode resultar em regressão tumoral e respostas duradouras,
mas à custa de elevada toxicidade. Um estudo com
66 pacientes com CCRm utilizou a dosagem da
anidrase carbônica por imuno-histoquímica, na tentativa de predizer melhor resposta em subgrupo de
pacientes. De 27 pacientes que responderam a
HDIL-2, 78% apresentaram positividade da anidrase
carbônica, comparado a 51% dos não respondedores. Além disso, sobrevida prolongada, acima dos
cinco anos, foi vista apenas no subgrupo de elevada
expressão da anidrase carbônica.9 Até o momento,
o uso rotineiro da expressão da anidrase carbônica
como fator preditivo de resposta a HDIL-2 é
incerto, ficando pendente a confirmação
desses achados em uma série maior de pacientes, em ensaio randomizado e controlado.
Ainda nos dias atuais, pacientes jovens com
CCRm, histologia de células claras e bom performance status poderiam ser potenciais candidatos ao uso da HDIL-2.
Terapia alvo-molecular
Através da melhor compreensão da patogênese do CCR em nível molecular e da identificação de vias de sinalização intracelular,
principalmente a via do VEGF (vascular endothelial growth factor) e do mTOR (mammalian target of rapamicin), um rápido
desenvolvimento de drogas alvo-específicas
no CCRm ocorreu nos últimos cinco anos
(Figuras 1 e 2).
Sunitinibe
O sunitinibe é uma droga oral inibidora da
tirosina-quinase relacionada às vias dos receptores de VEGF, PDGF (platelet-derived growth
factor) e c-KIT. Essa droga tem um importante
papel no manejo inicial de pacientes com
CCRm não candidatos a uso inicial de HDIL2. A atividade antitumoral e a segurança do
sunitinibe foram demonstradas em estudos
fase II que mostraram taxas de resposta na
ordem de 34% a 40% e tempo médio até progressão de 8,5 meses.10
Mais recentemente, o sunitinibe foi avaliado
em um estudo fase III com 750 pacientes com
doença metastática, a maioria com prognóstico
bom ou intermediário. Nesse ensaio, os pacientes foram randomizados a receber o sunitinibe na dose de 50 mg, por via oral, durante
quatro semanas, com intervalo de duas semanas, ou interferon alfa 9MUI/M2 três vezes
por semana.11 Como observações pontuais
desse estudo podemos citar: aumento significativo na taxa de resposta (39% versus 8%), aumento na sobrevida média livre de progressão
(11 meses versus 5 meses) e sobrevida global
(26 meses versus 21,8 meses) com p=0,051. A
análise de sobrevida global final foi complicada,
pois houve a permissão de crossover por parte
dos pacientes que estavam no grupo do inter-
1. Performance Status- Karnofsky < 80%
2. Tempo livre de progressão < 12 meses
3. DHL >1,5 x LSN
4. Cálcio sérico >10,0
5. Hemoglobina <LIN
LSN: Limite superior normal
LIN: Limite inferior normal
Risco baixo - Score ZERO
Risco intermediário - Score 1-2
Risco alto - Score > 2
feron (cerca de 1/3 dos casos), além de aproximadamente 30% dos pacientes de ambos os
grupos terem usado outro inibidor de tirosinaquinase após completar o protocolo.
Sorafenibe
a) Pacientes previamente tratados: o sorafenibe
é um inibidor multialvos com atividade de
tirosina-quinase, com atuação no VEGFR,
FLT3, PDGFR, FGFR1, c-RAF e b-RAF.
O estudo fase III, conhecido como TARGETS, utilizou uma população de 903 pacientes que falharam previamente ao interferon
e que foram randomizados a receber sorafenibe
ou placebo.12 Nesse estudo, a sobrevida livre
Tabela 1: Critérios prognósticos
de Motzer no carcinoma de
células renais avançado
de progressão foi significativamente superior
nos pacientes que receberam o sorafenibe em
relação ao placebo (5,5 meses versus 2,8
meses, respectivamente com HR de 0,44). A
sobrevida global com sorafenibe foi de 17,8
meses e de 15,2 meses no braço controle, sem
diferença estatística. Entretanto, em análise secundária, quando os pacientes do braço do
placebo que receberam o sorafenibe após a
progressão (crossover) foram censurados da
análise, a sobrevida global tornou-se significativa (17,8 versus 14,3 meses e HR 0,78). Em
análise de subgrupos realizada no TARGETS,
os pacientes acima de 70 anos obtiveram,
aparentemente, um benefício adicional de sobrevida livre de progressão (26 semanas versus
14 semanas), sem acréscimo de toxicidade adicional nessa população.
b) Pacientes sem tratamento prévio: o papel do
sorafenibe em pacientes sem tratamento anterior é menos claro. Em estudo randomizado de
fase II, essa droga foi comparada com interferon
Epidermal growth factor receptor (EGFR) and CXCR4 activation lead to
mitogen-activated protein (MAP) kinase activation. PTEN methylation leads to
mTOR activation and increased hypoxia-inducible factor (HIF) synthesis, which,
in the presence of von Hippel-Lindau (VHL) mutations, accumulates and
stimulates HIF-mediated protein expression, closing the autocrine loop.
A variety of agents that inhibit various signaling pathways are currently under
investigation. Reproduced with permisson from: Atkins, Michael. Nephrology
Forum: Management of advanced renal cancer. Kidney Int 2005; 67:2069.
Copyright © 2005 Blackwell Publishing
Figura 1: Vias intracelulares
que contribuem para a
progressão do carcinoma renal
Onco& outubro/novembro 2010
25
livre de progressão (9,2 meses versus 4,2 meses
com HR de 0,46), favorecendo os pacientes do
braço do pazopanibe. Esse estudo permitiu o
crossover dos pacientes que progrediram com
o placebo, o que pode ter impactado negativamente para um ganho estatístico em termos de
sobrevida global.15
Figura 2: Vias de sinalização
dentro da célula endotelial
que contribuem para a progressão do carcinoma renal
Toxicidade dos inibidores
da tirosina-quinase
Vascular endothelial growth factor (VEGF) binds to its receptors
inducing vascular growth. Several agents block VEGF either by
binding to it (antibodies), blocking receptor signaling (small
molecules) or by blocking at several steps inside the endothelial
cell. Reproduced with permisson from: Atkins, Michael. Nephrology
Forum: Management of advanced renal cancer. Kidney Int 2005;
67:2069. Copyright © 2005 Blackwell Publishing
alfa na dose 9MUI três vezes por semana.13
Nesse estudo, foi permitido um escalonamento
de dose do sorafenibe de 800 mg/dia para
1.200 mg/dia para pacientes que progrediram
com a dose padrão. No entanto, o estudo falhou em demonstrar alguma vantagem na sobrevida entre os grupos de tratamento (5,7
meses versus 5,6 meses). Um pequeno estudo
de fase II, apresentado na reunião da ASCO de
2007, sugere um melhor benefício de taxa de
resposta com o escalonamento de doses (até
1.600 mg/dia)14, sem acréscimo de toxicidade.
Estudos clínicos adicionais serão necessários
Tabela 2: Recomendação de
tratamento segundo o NCCN 2010
para o carcinoma de células
renais metastático
para melhor elucidar o papel do escalonamento
de doses com o sorafenibe em CCRm.
Pazopanibe
O pazopanibe é outra droga-alvo inibidora da
tirosina-quinase, com alvo nos receptores de
VEGF, PDGF e c-Kit. Em estudo fase III com
435 pacientes sem tratamento prévio ou que
tenham utilizado alguma citoquina, a randomização ocorreu para pazopanibe ou placebo.
Todos os pacientes eram de risco bom ou intermediário. Os resultados desse estudo mostraram um significativo ganho na sobrevida
Prognóstico da população Primeira linha
Prognóstico bom
Sunitinibe
IFN-a + bevacizumabe
Pazopanibe
Prognóstico intermediário
Sunitinibe
IFN-a + bevacizumabe
Pazopanibe
Prognóstico ruim
26
outubro/novembro 2010 Onco&
Temsirolimus
Sunitinibe
IFN-a + bevacizumabe
Pazopanibe
Primeira linha
Segunda linha
VEGFR-TKI
Everolimus
Imunoterapia
Sorafenibe
Sunitinibe
Embora existam diferenças no perfil de toxicidade dessas drogas, alguns efeitos são comuns
a todas elas.
1) Hipertensão arterial e toxicidade renal:
tanto o sunitinibe quanto o sorafenibe estão
relacionados à hipertensão e menos comumente à insuficiência renal.16 No geral, a
hipertensão ocorre em 23% dos pacientes17 e
os pacientes devem ser monitorizados para a
ocorrência de hipertensão arterial e tratados
apropriadamente.
2) Tromboembolismo arterial: sunitinibe, sorafenibe e pazopanibe apresentam risco relativo de 3,0 comparado ao controle (1,4%
dos casos).18
3) Cardiotoxicidade: toxicidade cardíaca,
manifestada como a diminuição da fração de
ejeção ventricular esquerda, insuficiência
cardíaca ou isquemia miocárdica. Pacientes recebendo essa classe de drogas devem receber
monitorização clínica à procura de sinais e sintomas de falência cardíaca. Até 1/5 dos pacientes pode apresentar alguma perda da
fração de ejeção ventricular, mas a maioria é
reversível e não está associada a um pior desfecho clínico.
4) Hipotireoidismo: esse tipo de disfunção
tem sido mais visto com o uso do sunitinibe.
Uma série da Cleveland Clinic chegou a relatar uma incidência de hipotireoidismo
clínico e/ou laboratorial em até 85% dos pacientes tratados.19
5) Toxicidade cutânea: a síndrome mão-pé é
uma manifestação comum com o uso dos inibidores da tirosina-quinase, embora seja vista
com maior frequência com o uso do sorafenibe (30%-60%) do que com o sunitinibe
(10%-20%). O manejo dessa manifestação
cutânea irá depender do grau de severidade
das reações. Habitualmente emolientes tópicos, corticoides tópicos ou mesmo suspensão
temporária da droga nos casos mais graves
(grau 3) poderão se fazer necessários.
6) Pancreatite: elevação de enzimas pancreáticas (lipase e amilase) tem sido relatada com o
uso do sunitinibe e do sorafenibe, embora a
ocorrência de pancreatite seja incomum.
7) Hepatotoxicidade: toxicidade hepática severa
e ocasionalmente fatal foi observada nos estudos clínicos do pazopanibe. Pacientes em tratamento com essa droga devem ser monitorados
para alguma evidência de hepatotoxicidade, e
o tratamento deverá ser interrompido se tal alteração for observada.
Bevacizumabe
O bevacizumabe é um anticorpo monoclonal
capaz de exercer efeito antiangiogênico através
da ligação e neutralização do VEGF circulante.
A evidência primária de que o bevacizumabe
poderia apresentar algum efeito no CCRm veio
de estudo fase II randomizado, no qual o anticorpo monoclonal ou o placebo foram
usados nos pacientes que progrediram com
citoquinas.20 Dois estudos fase III (AVOREN e
CALGB 90206) mostraram resultados semelhantes, demonstrando um ganho significativo
de sobrevida livre de progressão com a combinação do interferon e bevacizumabe versus interferon isolado.21 No estudo AVOREN, o
benefício da sobrevida livre de progressão foi
Regime
Paciente sem
tratamento prévio
Paciente refratário
a tratamento
(≥ segunda linha)
de 10,2 meses versus 5,5 meses, com HR de
0,63, além de maior taxa de resposta (31% versus 13%). Entretanto, nenhuma diferença estatística foi observada na sobrevida global entre
os dois braços.22 No estudo do CALGB 90206,
de desenho e resultados semelhantes ao estudo
anterior, nenhuma diferença em sobrevida
global foi também demonstrada. Tal resultado
pode ser explicado pelo fato de mais da metade
dos pacientes de ambos os braços ter recebido
tratamento de segunda linha com drogas-alvo.
No geral, o bevacizumabe apresenta boa
tolerância, mas a incidência de efeitos adversos
foi mais comum no braço de combinação com
o interferon. Os efeitos colaterais mais observados foram os fenômenos tromboembólicos
e a perfuração gastrointestinal. A hipertensão
arterial também tem sido vista frequentemente
no tratamento com o bevacizumabe, e seu
manejo deve seguir as diretrizes ou consensos
de tratamento. Nos estudos AVOREN e
CALGB, os pacientes com metástases cerebrais
foram excluídos em virtude da preocupação
de sangramento cerebral com o uso do antiangiogênico. Todavia, o risco de sangramento no
SNC foi baixo nos estudos subsequentes,
demonstrando ser seguro o uso do bevacizumabe na metástase cerebral.
Temsirolimus e everolimus
Essas drogas são capazes de inibir a enzima
mTOR, que desempenha um papel central
Subgrupo
Terapia
no controle e na regulação de vias de sinalização intracelulares, envolvidas no crescimento e proliferação celular, resposta a
hipóxia e apoptose. Dessa forma, os inibidores da mTOR suprimem as vias de sinalização responsáveis pela regulação do ciclo
celular e angiogênese.
O temsirolimus é administrado por via endovenosa. Em estudo fase III, 626 pacientes
com CCRm, de prognóstico ruim de acordo
com os critérios do MSKCC, foram randomizados em três grupos para receber o temsirolimus, o interferon alfa ou a combinação de
ambos. O objetivo primário desse estudo foi a
sobrevida global, que foi significativamente
maior nos braços de tratamento com o temsirolimus. Foi o primeiro estudo a demonstrar
benefício com uma medicação em uma população de prognóstico ruim com CCRm.23
O everolimus é um inibidor oral da enzima mTOR. Em estudo fase III com 410 pacientes com CCRm que falharam com
terapias de primeira ou segunda linha (a
maioria com inibidores da tirosina-quinase),
os pacientes foram randomizados a receber
everolimus ou placebo. O objetivo primário
desse estudo foi a sobrevida livre de progressão. O estudo foi fechado precocemente
após a segunda análise interina, que mostrou
uma diferença significativa entre os dois grupos (4 meses versus 1,9 meses e HR 0,30
com p<0,0001).24
Opções
Risco MSKCC: alto
ou intermediário
Sunitinibe
Bevacizumabe
+ IFN-a
Pazopanibe*
IL-2 em altas doses
Sorafenibe
Estudo clínico
Observação
Risco MSKCC: baixo
Temsirolimus
Sunitinibe
Estudo clínico
Refratário
a citoquina
Sorafenibe
Bevacizumabe
Sunitinibe
Pazopanibe
Refratário
a inibidor de
tirosina-quinase
Everolimus
Estudos clínicos
* Apenas diretrizes do NCCN
MSKCC = Memorial Sloan-Kettering
Cancer Center
Tabela 3: Recomendação de
tratamento segundo a Escola
Europeia de Uro-Oncologia
Escudier, et al. Ann Oncol. 2009;20(S4):iv81-iv82;
EAU Guidelines on Renal Cell Carcinoma. 2009;
de Reijke, et al. Eur J Cancer. 2009;45:765-773; NCCN Clinical
Practice Guidelines in Oncology: Kidney Cancer–v.2.2010.
Onco& outubro/novembro 2010
27
Discussão
O rápido desenvolvimento de terapias-alvo capazes de bloquear vias de sinalização, tais como
a VEGF (sunitinibe, sorafenibe e bevacizumabe)
e mTOR (temsirolimus e everolimus), estabeleceu tais classes de drogas como as preferíveis no
tratamento paliativo do CCRm. Atualmente não
há dados que permitam fazer comparações di-
retas entre essas moléculas, e cada uma das drogas tem sido utilizada em diferentes situações
clínicas e de uma maneira sequencial. Dessa
forma, diretrizes de tratamento tem sido propostas com o objetivo de melhor definir as estratégias de uso (Tabelas 2 e 3).
No geral, as drogas-alvo são mais bem
toleradas pelos pacientes oncológicos do que
a quimioterapia tradicional ou, eventual-
Referências bibliográficas
1. Globocan 2008. Cancer Incidence and Mortality Worldwide in 2008.
http://globocan.iarc.fr/
2. Herbert T. Cohen, M.D., and Francis J. McGovern, M.D. Renal Cell Carcinoma.
Review article. N Engl J Med 2005; 353:2477-2490.
3. Elson PJ, Witte RS, Trump DL. Prognostic factors for survival in patients with
recurrent or metastatic renal cell carcinoma. Cancer Res. 1988 Dec 15;48(24 Pt
1):7310-3.
4. Motzer RJ, Mazumdar M, Bacik J, Berg W, Amsterdam A, Ferrara J. Survival
and prognostic stratification of 670 patients with advanced renal cell carcinoma.
J Clin Oncol 1999 Aug; 17(8): 2530-40.
5. Giuliani L, Giberti C, Martorana G, Rovida S. Radical extensive surgery for
renal cell carcinoma: long-term results and prognostic factors. J Urol. 1990
Mar;143(3):468-73; discussion 473-4.
6. Flanigan RC, Salmon SE, Blumenstein BA, Bearman SI, Roy V, McGrath PC,
Caton JR Jr, Munshi N, Crawford ED. Nephrectomy followed by interferon alfa2b compared with interferon alfa-2b alone for metastatic renal-cell cancer. N Engl
J Med. 2001 Dec 6;345(23):1655-9.
7. Vogelzang NJ; Priest ER; Borden L. Spontaneous regression of histologically
proved pulmonary metastases from renal cell carcinoma: a case with 5-year followup. J Urol 1992 Oct;148(4):1247-8.
8. Coppin C, Porzsolt F, Awa A, Kumpf J, Coldman A, Wilt T. Immunotherapy
for advanced renal cell cancer. Cochrane Database Syst Rev. 2005 Jan
25;(1):CD001425.
9. Atkins M, Regan M, McDermott D, Mier J, Stanbridge E, Youmans A, Febbo P,
Upton M, Lechpammer M, Signoretti S. Carbonic anhydrase IX expression predicts outcome of interleukin 2 therapy for renal cancer. Clin Cancer Res. 2005
May 15;11(10):3714-21.
10. Motzer RJ, Michaelson MD, Redman BG, Hudes GR, Wilding G, Figlin RA,
Ginsberg MS, Kim ST, Baum CM, DePrimo SE, Li JZ, Bello CL, Theuer CP, George
DJ, Rini BI. Activity of SU11248, a multitargeted inhibitor of vascular endothelial
growth factor receptor and platelet-derived growth factor receptor, in patients
with metastatic renal cell carcinoma. J Clin Oncol. 2006 Jan 1;24(1):16-24. Epub
2005 Dec 5.
11. Robert J. Motzer, M.D., Thomas E. Hutson, D.O., Pharm.D., Piotr Tomczak,
M.D. et al. Sunitinib versus Interferon Alfa in Metastatic Renal-Cell Carcinoma.
N Engl J Med. 2007 Jan 11;356(2):115-24.
12. Escudier B, Eisen T, Stadler WM, Szczylik C, Oudard S, et al. Sorafenib in
advanced clear-cell renal-cell carcinoma. N Engl J Med. 2007 Jan
11;356(2):125-34.
13. Di Lorenzo G, Cartenì G, Autorino R, Bruni G, Tudini M, et al. Phase II study
of sorafenib in patients with sunitinib-refractory metastatic renal cell cancer. J
28
outubro/novembro 2010 Onco&
mente, as citoquinas. No entanto, alguns
efeitos comuns a todas essas medicações não
podem ser negligenciados, como fadiga,
hipertensão e diarreia. A condução e o manejo do tratamento com drogas-alvo específicas devem ficar a cargo de oncologista
clínico com experiência no uso dessas medicações, preferencialmente com o suporte de
equipe interdisciplinar.
Clin Oncol. 2009 Sep 20;27(27):4469-74. Epub 2009 Aug 3.
14. Amato, RJ, Harris, P, Dalton, M, et al. A phase II trial of intra-patient dose-escalated sorafenib in patients (pts) with metastatic renal cell cancer (MRCC). (Abstract). J Clin Oncol 2007; 25:241s.
15. Sternberg, CN, Szczylik, C, Lee, ES, et al. A randomized, double-blind phase
III study of pazopanib in treatment-naive and cytokine-pretreated patients with
advanced renal cell carcinoma (RCC) (abstract #5021). J Clin Oncol 2009;
27:240s.
16. Wu S; Chen JJ; Kudelka A; Lu J; Zhu X. Incidence and risk of hypertension
with sorafenib in patients with cancer: a systematic review and meta-analysis.
Lancet Oncol. 2008 Feb;9(2):117-23. Epub 2008 Jan 24.
17. Zhu X; Stergiopoulos K; Wu S . Risk of hypertension and renal dysfunction
with an angiogenesis inhibitor sunitinib: systematic review and meta-analysis.
Acta Oncol. 2008 Aug 27:1-9.
18. Choueiri TK; Schutz FA; Je Y; Rosenberg JE; Bellmunt J. Risk of arterial thromboembolic events with sunitinib and sorafenib: a systematic review and metaanalysis of clinical trials. J Clin Oncol. 2010 May 1;28(13):2280-5. Epub 2010
Mar 29.
19. Rini BI; Tamaskar I; Shaheen P; Salas R; Garcia J; Wood L; Reddy S; Dreicer
R; Bukowski RM . Hypothyroidism in patients with metastatic renal cell carcinoma
treated with sunitinib. J Natl Cancer Inst. 2007 Jan 3;99(1):81-3.
20. Yang JC; Haworth L; Sherry RM; Hwu P; Schwartzentruber DJ; Topalian SL;
Steinberg SM; Chen HX; Rosenberg SA A randomized trial of bevacizumab, an
anti-vascular endothelial growth factor antibody, for metastatic renal cancer. N
Engl J Med 2003 Jul 31;349(5):427-34.
21. Escudier B; Pluzanska A; Koralewski P; Ravaud A; Bracarda S; Szczylik C;
Chevreau C; Filipek M; Melichar B; Bajetta E; Gorbunova V; Bay JO; Bodrogi I;
Jagiello-Gruszfeld A; Moore N Bevacizumab plus interferon alfa-2a for treatment
of metastatic renal cell carcinoma: a randomised, double-blind phase III trial.
Lancet. 2007 Dec 22;370(9605):2103-11.
22. Rini BI; Halabi S; Rosenberg JE; Stadler WM; Vaena DA; Ou SS; Archer L;
Atkins JN; Picus J; Czaykowski P; Dutcher J; Small EJ. Bevacizumab plus interferon alfa compared with interferon alfa monotherapy in patients with metastatic
renal cell carcinoma: CALGB 90206. J Clin Oncol. 2008 Nov 20;26(33):54228. Epub 2008 Oct 20.
23. Gary Hudes, M.D., Michael Carducci, M.D., Piotr Tomczak, M.DTemsirolimus, Interferon Alfa or Both for Advanced Renal-Cell Carcinoma. N Engl J
Med. 2007 May 31;356(22):2271-81.
24. Motzer RJ, Escudier B, Oudard S, Hutson TE, Porta C, et al. Phase 3 trial of
everolimus for metastatic renal cell carcinoma: final results and analysis of prognostic factors. Cancer. 2010 Sep 15;116(18):4256-65.
cuidados paliativos
Quintessencialmente
humano
Por Lilian Liang
E
RA A PRIMEIRA CONSULTA DA PACIENTE, QUE TINHA UM CÂNCER INCU-
RÁVEL. O PSIQUIATRA A RECEBEU E A OUVIU FALAR SOBRE SUA DOENÇA.
ELA TAMBÉM CONTOU SOBRE COMO TODAS AS NOITES SE DEBRUÇAVA
sobre o berço de sua filha de 1 ano e pensava que nunca a veria ir à escola, nem dançaria em sua festa de casamento.
O psiquiatra escutava, atento, e a certa altura perguntou se ela pensava na morte.
“Você sabe de algo que eu não sei?”, perguntou ela. “Meu médico
lhe disse alguma coisa?” O volume de sua voz começou a aumentar,
enquanto ela ficava cada vez mais alterada. O marido, alarmado, entrou
na sala. Ao encontrá-la gritando, aos prantos, perguntou ao psiquiatra:
“Você não falou com ela sobre morrer, falou?”.
Foi necessário mais de uma hora para conseguir acalmá-la. Quando
voltou a si, a paciente explicou: “Olhe, doutor, eu tenho certeza de que
você é um homem muito gentil. Você obviamente quer falar sobre a
morte. Eu não. Mas se um dia eu quiser, eu ligo para você”.
Depois de dois meses, o psiquiatra recebeu um telefonema. “Quero
falar sobre a morte”, disse a paciente, já no hospital.
Quando ele chegou, o marido estava ao lado da cama com o bebê. A
jovem mãe disse ao marido que o amava e pediu desculpas por morrer
tão cedo. Disse que o perdoava por qualquer coisa que tivesse feito. Disse
que amava a filha e contou os planos que tinha para ela. Tudo isso aconteceu em dez minutos. Cinco minutos depois, ela havia falecido.
O psiquiatra era o professor William Breitbart, responsável pelo
Serviço de Dor e Cuidados Paliativos do Departamento de Neurologia
do Memorial Sloan Kettering Cancer Center, em Nova York, um dos
maiores centros de tratamento de câncer no mundo. Ele foi um dos
palestrantes do 11o Congresso Brasileiro de Psico-Oncologia e do IV Encontro Internacional de Cuidados Paliativos em Oncologia, realizado em
setembro, no Rio de Janeiro, onde falou sobre cuidados paliativos, compaixão e a necessidade de preparar o paciente para a morte.
Ao se falar da morte, não se vai exatamente contra o conceito de
dar esperança ao paciente?
Claro que não. Em 25 anos de experiência, depois de ter tratado milhares de pacientes, eu poderia contar nos dedos de uma mão o
número de pacientes que se sentiram desconfortáveis ao falar da morte.
As pessoas que estão enfrentando a morte se preocupam com ela. É
sua maior preocupação, seu maior medo. E muitas vezes não é só o
30
outubro/novembro 2010 Onco&
medo, as pessoas têm outros sentimentos em relação à morte. Alguns
não têm medo da morte porque a veem como um estado indolor. Outros acreditam que vão para onde estavam antes de nascer. Já outros
têm medo de sofrer, de não existir ou do que acontece depois da morte.
Ter medo da morte é quintessencialmente humano.
Temos uma parte de nosso tronco cerebral que trabalha como um sistema de alarme e que nós temos em comum com répteis primitivos. Ele
dispara quando estamos em perigo e nos faz correr e fugir. Eu digo isso
não tanto em termos de sobreviver à morte, mas reviver sua vida em face
dela. A consciência da morte salva sua vida, o acorda para o fato de que
você realmente precisa vivê-la de forma autêntica e genuína. Ajudar o paciente a enxergar isso, a abordar a vida dessa forma diante da morte, é
um jeito de dar esperança.
Um exercício muito interessante que fazemos em nosso centro é o de
esperanças para o futuro. Há a ideia de que quando o paciente perde a
esperança de cura, ele perde toda a esperança. Não é verdade. Ela é substituída por outros tipos de esperança, que são tão importantes quanto a
da cura: a esperança de não sofrer, de terminar as coisas que são importantes, de perdão, de redenção, de deixar um legado.
“Quando meu avô estava doente, um
pouco antes de morrer, encontrei-o
olhando para fora da janela. A paisagem era bonita e havia uma certa tristeza em seu
semblante. Ele suspirou e disse: ‘Estar vivo é tão
maravilhoso. É uma pena ter de deixar tudo isso’.”
Quais são os objetivos dos cuidados paliativos?
O primeiro deles é prolongar a vida. A literatura mostra que pacientes
que vão para hospices e recebem cuidados paliativos vivem mais do que
aqueles que não estão em hospices – talvez porque lá eles não estejam
recebendo uma quimioterapia de que não precisam e que só vai prejudicá-los. Mas prolongar a vida não é nosso alvo principal.
O segundo objetivo é proteger a vida – evitar dor ou desconforto
desnecessário, certificar-se de que o paciente morra numa casa limpa,
numa cama limpa, se possível não negligenciado. Mas será que isso
significa não discutir a morte porque achamos que vai aborrecê-lo?
Será que é essa a idea dos cuidados paliativos, quando há pesquisas
que mostram que pacientes mais informados têm resultados melhores?
Não. Portanto, proteger a vida, sim, mas quando possível.
O terceiro é preservar a vida – e esse objetivo, sim, deve-se procurar
atingir sempre. Nosso papel é ajudar pacientes a manter a essência do
que são como seres humanos. Preservar o que é único do indivíduo,
manter a dignidade e a humanidade. Esse é o nosso trabalho.
– “Papai, Deus existe?
– Sim, Samuel.
– Existem bilhões de pessoas no
mundo, certo, papai? Deus tem de cuidar de todas
essas pessoas? É muita gente. Será que existe a
“Quando meu filho Samuel nasceu, possibilidade de Deus passar batido por mim e eu
eu olhava para ele e dizia: ‘Meu não ter de morrer?”
Deus, o que foi que eu fiz?’. Eu tinha O que é a aceitação da morte?
pouca noção da responsabilidade que tinha nas Segundo o modelo de Kübler-Ross [Elisabeth Kübler-Ross descreveu
mãos. Aos poucos, me dei conta de que teria de em seu livro On Death and Dying, de 1969, os cinco estágios da morte:
educar, ensinar valores e princípios. Mas como eu negação, raiva, barganha, depressão e aceitação], a aceitação é um dos
estágios da morte. O paciente aceita a situação sem sentimentos de
daria a notícia a ele de que a vida é finita, tem- hostilidade, dando tempo para enfrentar a realidade da morte de
porária? Como explicaria a ele que a morte é maneira construtiva. Não é uma explicação extensa, mas o que eu enparte da vida? Como diria a ele ‘Olhe, não se fatizo aqui é a ausência de hostilidade, agitação ou desespero – isso
acostume muito a estar vivo, Samuel, porque não parece ser algo importante nessa noção de aceitação da morte. Essa
noção evoluiu e hoje entendemos que se trata de um conceito muito
vai durar para sempre’?”
Como você avalia os cuidados paliativos hoje? O alvo final é a
aceitação da morte?
Nós estamos fazendo um bom trabalho em termos de controlar a
dor e os sintomas físicos do paciente. Se você perguntar a um
médico experiente qual seu papel como especialista em cuidados
paliativos, ele vai dizer “Meu trabalho é me certificar de que
ninguém morra com dor”. Mas se perguntar “Você vê como seu papel
ajudar o paciente a aceitar a morte? Você vê como parte de seu trabalho ajudar o paciente a olhar para trás em sua vida e achar sentido
nela?”, a maioria vai dizer que esse é o trabalho do padre, do rabino,
do imamo.
As pesquisas mostram que o paciente tem uma relação íntima
com o médico e ele quer falar sobre esses assuntos. Mas os médicos
dizem “Eu não tenho ferramentas. Eu tenho opioides. Eu tenho
medicamentos para constipação. Mas eu não sei lidar com questões
existenciais”.
Interessante lembrar que o conceito de cuidados paliativos não
nasceu com médicos, cientistas ou acadêmicos, mas com a comunidade
religiosa. Não havia drogas, opioides ou tecnologia, havia o lado espiritual dos cuidados, para que o paciente morresse com uma aceitação
pacífica. Há muito as pessoas pensam na morte, no que vem depois
dela, como encará-la e aceitá-la. Mas nos últimos 30 anos houve uma
revolução em cuidados paliativos e a porção espiritual e existencial foi
removida. Estamos prestando atenção somente na dor física.
Temos de expandir nosso conhecimento e habilidades para proporcionar cuidados paliativos completos, que incluam os domínios psicossociais e espirituais do cuidado. Já fizemos grandes progressos nessa
área. Mas será que tudo isso deve culminar num esforço para ajudar
os pacientes a uma aceitação da morte? Acho que não.
mais complexo, que tem porções cognitivas, emocionais e comportamentais que nem sempre estão em sincronia.
Mas talvez aceitação não seja a melhor palavra. Talvez seja melhor
usar uma aceitação cognitiva pacífica, um reconhecimento intelectual do
prognóstico. Se pacientes têm uma consciência pacífica da morte, eles
têm melhor qualidade de morte, melhores resultados físicos. Estudos
mostram que, paradoxalmente, pacientes que têm um entendimento mais
completo da gravidade de sua doença têm menos tendência à depressão.
Há também o que se chama de middle knowledge – uma consciência
de que se está doente de maneira terminal e de que se vai morrer, mas
que não é constante. Essa consciência oscila, o paciente se move em
diferentes graus de negação. A pessoa sabe que vai morrer, compra o
jazigo, diz para a esposa onde estão os papéis do seguro, mas, quando
conversa com o médico ou o psicólogo, nega a possibilidade da morte.
É como se estivesse operando em trilhos paralelos. Uma parte do cérebro está preparando para a morte, e a outra parte está negando, para
que a pessoa continue vivendo.
A questão não é tanto como o paciente aceita a morte. Quando se
enfrenta a morte, é como chegar a uma parede. Ao se deparar com ela,
você é forçado a virar e olhar para trás para a sua vida, examiná-la e decidir: “Eu posso aceitar essa vida que vivi? Eu estou em paz com ela? Se
não, o que preciso completar com o tempo que me resta?” Nosso desafio
real é o seguinte: como ajudar o paciente a aceitar a vida que viveu para
encarar a morte com um sentimento de paz e equanimidade.
“Alguns pacientes me dizem: ‘Todos se
preocupam tanto com a morte, por
que não nos preocupamos tanto em
relação a onde estávamos antes de nascer? Onde
Onco& outubro/novembro 2010
31
eu estava antes de nascer? E provavelmente vou
voltar para o mesmo lugar. E antes de nascer não
havia desespero, não havia agitação. E depois da
morte vai ser a mesma coisa’.”
Como você aconselha os pacientes a viver diante da morte iminente?
Antes de qualquer coisa, eu enfatizo o fato de ele ainda estar vivo. Portanto, ele precisa viver de pé. Não se enterre antes de ter morrido, você
vai ter tempo suficiente para isso. Mantenha-se de pé. Continue a ter
coragem – coragem para querer, para ter desejos, para viver.
Depois, procuro encorajá-lo a se manter completo, conectado a pessoas e coisas que dão sentido, valor e propósito à vida. É importante que
ele se relacione, não se isole.
Em terceiro lugar, é preciso viver cuidadosamente. Lembrar de cuidar
de si mesmo, da própria saúde. Preservar a energia para viver, se manter
conectado, cuidar das pessoas que ama, terminar as coisas que quer terminar, deixar um legado.
Mas a regra de ouro para passar tudo isso ao paciente é a compaixão.
“Ao invés de dizer ‘A quimioterapia
não funcionou para você’ ou ‘Não
podemos lhe oferecer mais nada’, temos de ensinar o médico a dizer ‘Neste momento,
não há mais nenhuma alternativa de tratamento
para curar sua doença. Os tratamentos disponíveis
só vão fazê-lo se sentir mal e não vão ajudá-lo a
viver mais. Agora queremos mudar o foco para mantê-lo confortável, ajudá-lo a enfrentar os sintomas
e a lidar com suas preocupações em como viver
diante da morte’. Eles nem precisam acreditar nisso,
mas precisam saber o que dizer e perguntar – dar
aos pacientes a oportunidade de falar.”
Como ensinar o médico a se comunicar melhor sobre a morte com
o paciente?
Nós tentamos fazer isso através de pesquisa, ensino, ao tentar demonstrar que, quando se fala com pacientes terminais sobre a morte, obtêmse melhores resultados clínicos. Existem coisas piores do que a morte:
o sofrimento intolerável, não ter a dor controlada, ser abandonado.
Há muitos outros sentimentos envolvidos também: culpa, tristeza. E
os pacientes que têm oportunidade de falar sobre isso têm resultados
melhores, têm menos depressão.
Os médicos não sabem disso, por isso temos em nosso centro programas de treinamento em comunicação em que ensinamos não apenas como falar com pacientes sobre estudos clínicos de quimioterapia,
32
outubro/novembro 2010 Onco&
mas como dar notícias ruins, como falar sobre passar de cuidados curativos para paliativos, como falar sobre questões existenciais.
Mas é um trabalho difícil falar dez vezes por dia “Sinto muito, mas
sua doença progrediu” ou “Você teve uma recidiva” ou “O câncer se
espalhou para o cérebro”. Não dá para julgá-los ou criticá-los por, no
desespero do momento, quando eles dão as más notícias, não conseguirem focar muito no que ainda pode ser feito.
“Uma senhora idosa foi internada
em nosso centro e seus filhos pediram para que não lhe dissessem que
tinha câncer.
– Mas esse é um centro de câncer. Você tem certeza
de que ela não vai notar a palavra câncer no uniforme das enfermeiras e dos médicos, na roupa de
cama, no cardápio, nas placas pelo hospital? E
você realmente acha que, das 50 pessoas com
quem ela vai interagir durante o dia, nenhuma
delas vai mencionar a palavra câncer? Você realmente acha que ela não vai notar?
Depois que a família foi embora, a senhora me
chamou num canto.
– Doutor, eles não querem que eu saiba, mas sei que
tenho câncer. Só não quero preocupar meus filhos.”
As pessoas querem falar da morte?
A morte é um tópico tabu. Nós vivemos num mundo em que a morte é
escondida, onde ela ocorre em hospitais e asilos. Você pode chegar aos
70 anos e nunca ver alguém que você conhece morrer. Vivemos numa
cultura em que não vemos a morte. Há 80 anos as pessoas tinham familiaridade com a morte, era parte da vida. E, agora, vivemos numa época
em que tentamos não envelhecer, nem morrer. E esse esconder da morte
foi incorporado até ao local onde ela ocorre, no hospital. Mas, por causa
da cultura, nós não falamos sobre isso nem onde é relevante.
O problema não é apenas que médicos não falam com os pacientes,
mas maridos e mulheres, pais e filhos não falam sobre o assunto entre
si. Pacientes chegam ao hospital e sussurram: “Não conte à vovó que
ela tem câncer”. A vovó sabe que ela tem câncer! Mas ela também não
quer que os filhos se alarmem. Ou o homem que não fala com a mulher sobre o prognóstico ruim de seu câncer, porque acha que tem de
ser forte para ela. E ela não conversa com ele sobre o assunto porque
não quer que ele se preocupe sobre como ela fará com o financiamento
da casa e os filhos pequenos.
Em vez de se relacionar, eles estão se isolando, sentados sobre as
preocupações. Estão longe numa hora em que eles precisam estar
perto, na hora mais importante da vida.
do bem
Calendário rosa
No mês oficial de conscientização do câncer de mama,
uma amostra de que para a indústria farmacêutica o que
vale é dar às pacientes apoio e informação – o ano todo
Por Bartira Betini
R
OSA É A COR OFICIAL DO MÊS DE OUTUBRO, PELO
MENOS QUANDO O ASSUNTO É CÂNCER.
É NESSA
ÉPOCA DO ANO QUE MONUMENTOS NO MUNDO
todo são iluminados com holofotes cor-de-rosa para
chamar a atenção para o câncer de mama. Criada na
Califórnia em 1997, a iniciativa Outubro Rosa ganhou
notoriedade ao iluminar de rosa marcos do imaginário
mundial como a Torre de Pisa, na Itália, o Arco do
Triunfo, na França, e a Pirâmide de Giza, no Egito.
No Brasil, foi o Cristo Redentor, no Rio de
Janeiro, que recebeu as luzes neste ano, pela terceira
vez consecutiva. Com o mote “Sem investimento o
câncer de mama não tem tratamento”, a campanha,
encabeçada pela Federação Brasileira de Instituições
Filantrópicas de Apoio à Saúde da Mama (Femama),
reuniu celebridades e especialistas para conscientizar
Simone Simon
Cristo Redentor iluminado
de rosa, no lançamento da
campanha Outubro Rosa
população e governo sobre a importância do diagnóstico precoce e do acesso ao tratamento.
Assim como as associações de pacientes e as sociedades de especialidades, a indústria farmacêutica
também já entendeu a importância de campanhas de
incentivo e prevenção do câncer de mama no país.
Para ela, o ano todo é rosa, com investimento consistente e criativo em programas para estimular o diagnóstico precoce, para melhorar a adesão da paciente
ao tratamento e para educar familiares e cuidadores.
Prevenção nos 12 meses
Segundo Luciana Holtz, presidente do Instituto
Oncoguia, são diagnosticados seis novos casos de
câncer de mama a cada hora no Brasil e cerca de um
quarto das mulheres diagnosticadas tem menos de 50
anos. Dados do Instituto Nacional de Câncer (INCA)
preveem que cerca de 50 mil novos casos de câncer
de mama serão diagnosticados só este ano no país.
Embora os números sejam assustadores, o
prognóstico da doença pode ser muito bom se o tumor
for detectado precocemente, com chances de cura de
95%. Por causa disso, muitos laboratórios têm investido maciçamente em campanhas de prevenção.
É o caso da gigante Roche, que, inspirada pelo
espírito cor-de-rosa, lançou em agosto, na capital
baiana, a campanha Dia Rosa. A ideia é alertar as
brasileiras com mais de 40 anos sobre a necessidade de reservar um dia por ano para a mamografia, uma das principais aliadas no combate ao
câncer de mama no país.
A campanha Dia Rosa, que já foi lançada também
em Natal, Brasília, Curitiba e Rio de Janeiro, tem
madrinhas nas principais capitais brasileiras, como a
jornalista Ana Paula Padrão, a ex-primeira dama do
Onco& outubro/novembro 2010
33
"Essas ações fazem
a diferença, são
gratuitas e podem
mudar a perspectiva
de muitas
pacientes."
estado de São Paulo, Lu Alckmin, e a vereadora Mara
Gabrilli. A tarefa não é simples: mobilizar ações de
conscientização, incluindo palestras em empresas e
locais públicos, eventos para exibição de documentários, além da iluminação de monumentos locais.
Já o laboratório GlaxoSmithKline Brasil (GSK),
através da campanha Pink Day, cuja primeira edição
aconteceu em 2009, procura atuar dentro de casa
antes. Com a iniciativa, seus mais de 1,5 mil funcionários recebem informações sobre prevenção do
câncer de mama através de palestras e material educativo, além de atuarem como multiplicadores ao
levar o conhecimento a familiares e amigos.
Neste ano a campanha Pink Day teve o lema
“Câncer de mama: a prevenção está em suas mãos”,
que reforça a ideia de que a mulher deve prestar
atenção no próprio corpo e ressalta a importância
do autoexame como aliado na identificação precoce
do câncer de mama.
A GSK colabora também de forma indireta para
o combate ao câncer de mama. “Sem interferir,
damos suporte e apoiamos projetos de associações
de pacientes e sociedades, como estamos fazendo
com a Race for the Cure, que escolheu o Rio de
Janeiro para realizar a sua primeira corrida no
Brasil”, diz Cátia Duarte, gerente de marketing na
área de Oncologia da GlaxoSmithKline no país.
A Race for the Cure é uma corrida organizada
pela parceria entre a instituição norte-americana
Susan G. Komen for the Cure e as organizações
brasileiras Femama, Instituto Oncoguia, Sociedade
Franco-Brasileira de Oncologia, Sociedade Brasileira de Mastologia e Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica. Cerca de 1,5 milhão de pessoas são
esperadas nas praias do Leblon, Ipanema e Copacabana no dia 24 de outubro.
Período negro, incentivo rosa
As pacientes já diagnosticadas e em tratamento
também recebem atenção especial da indústria, por
meio de campanhas de apoio e incentivo. Pesquisas
comprovam: pacientes mais informadas e motivadas têm maiores taxas de adesão ao tratamento
e, consequentemente, melhores resultados.
Para atingir essas pacientes, os laboratórios contam com os próprios médicos como aliados. São
eles os responsáveis não apenas por divulgar tais
iniciativas, mas também por selecionar as pacientes
que mais se beneficiariam delas.
34
outubro/novembro 2010 Onco&
“A indústria não poderia simplesmente
disponibilizar programas e não contar com uma
avaliação médica que levasse em conta a necessidade de a paciente aderir a uma campanha e
quanto tempo ela precisa de uma ajuda especializada”, explica o oncologista clínico Gilberto
Amorim, do Rio de Janeiro, adepto de programas
desenvolvidos pela indústria.
Para os laboratórios, é importante o envolvimento do médico na iniciativa, junto com o paciente. “Os programas de tratamento para a paciente
já diagnosticada com câncer selecionam os participantes após uma análise do médico e com o acompanhamento dele, que é quem vai avaliar os
impactos”, completa Amorim.
Nesse cenário, uma iniciativa tem se destacado
pela originalidade e pelo impacto que tem gerado: é
a Campanha Esperança e Vida, do laboratório AstraZeneca. Além de distribuir material educativo, a
ação promove palestras e atividades lúdicas para despertar a autoestima da paciente com câncer de mama.
“Em 2009, a campanha, que já existia, ganhou o
enfoque inédito de atender a mulher em tratamento.
Daí surgiu o ‘Encontro com a Autoestima’, que ajuda
a mulher a ganhar mais confiança para superar as dificuldades do tratamento (fase em que os cabelos
podem cair, a pele pode ficar mais sensível e
ressecada, e a paciente pode sentir enjoos e dores),”
diz Selma Kochen, diretora adjunta da área de oncologia da AstraZeneca.
A campanha é desenvolvida em clínicas e hospitais que se dispõem a hospedá-la. Os médicos são os
responsáveis por selecionar as participantes. “Recebemos 40 convites e escolhemos as pacientes segundo a
necessidade emocional apresentada durante o tratamento”, diz a oncologista clínica Gláucia Ribeiro Albino, que indicou pacientes para o evento do Hospital
Regional do Vale do Paraíba, em setembro de 2010.
Da definição da data do evento até a ação, existe
um acompanhamento para avaliar o interesse das pacientes selecionadas e sua necessidade efetiva de participar de programas de apoio. Durante o encontro
há atividades relacionadas ao tema, como palestras
com médicos, psicólogos e ex-pacientes, sempre com
interação para a troca de informações.
O ponto alto do programa é o Dia de Modelo –
uma sessão fotográfica em que a paciente é clicada
por profissionais. “É essa ação que faz toda a diferença. A mulher se depara com um estúdio e rou-
Divulgação
pas selecionadas para causar impacto. Ela pode se
vestir de princesa, rainha ou ainda escolher um
vestido de festa, caprichar na maquiagem e perceber que sua beleza independe da doença”, diz Luciana, uma das palestrantes da campanha.
No evento também são distribuídos três guias
explicativos sobre a doença – um para as pacientes, outro para parceiros e familiares, e um terceiro para crianças e adolescentes. Entre os temas
abordados estão os principais tratamentos existentes, dicas de qualidade de vida, autoestima e
sexualidade, além de conselhos para familiares lidarem melhor com a situação.
Luciana conta também que o programa dá uma
ênfase especial à alimentação. “Mostramos a importância do nutricionista. Como muitas medicações para câncer de mama engordam, se a mulher
estiver mal orientada, desanimada e com autoestima baixa, o ganho de peso é certo. Isso atrapalha
ainda mais a nossa busca pelo equilíbrio dessa paciente”, explica.
Segundo a oncologista Gláucia, o impacto da
ação no hospital em que trabalha foi melhor do
que o esperado. “O que percebemos depois do encontro foi a felicidade das participantes e algumas
até querendo mais”, diz.
O laboratório Pfizer preferiu concentrar seus esforços nas consumidoras de seu produto, o Aromasin. O programa Mais Mulher, criado em 2007,
traz materiais educativos sobre a doença e o tratamento e dicas práticas para ajudar no dia a dia.
Glauco Marcondes, diretor da Unidade de Negócios Especialidades da empresa, conta que o programa é constituído de folders educativos sobre o
câncer de mama e seu tratamento, além de uma revista que traz informações sobre a doença e dicas de
saúde e bem-estar.
É o médico quem avalia se a paciente precisa
participar do programa Mais Mulher. Essa medida
assegura que as participantes tenham o acompanhamento constante de um profissional. Se a paciente aceitar participar do programa, ela se cadastra
via contato telefônico, com a prescrição de Aromasin
em mãos. Sua participação no programa também
garante a entrega do medicamento em endereço determinado pela paciente.
“O câncer causa impactos importantes não só
físicos como psicológicos nos pacientes. No caso do
câncer de mama, esse impacto é ainda mais impor-
tante. Por isso, além de desenvolver os medicamentos para tratar a doença, a Pfizer busca maneiras de
oferecer suporte educacional às pacientes e ampliar
seu alcance a informações”, diz Marcondes.
AstraZeneca: fotos
do Dia de Modelo
foram selecionadas para o
calendário 2010 da empresa
Efeito positivo
O médico que trata da paciente com câncer de
mama tem um desafio difícil à sua frente: diagnosticar e tratar a doença, sem deixar de lado as questões psicológicas.
“Tenho a preocupação de oferecer o melhor custobenefício à paciente, além de analisar como estão sua
autoestima e sua capacidade de concentração em outras atividades além da cura”, diz o oncologista
Amorim. “Se tivermos alicerces para ajudar a paciente
do ponto de vista emocional, melhor ainda.”
Por causa disso, ele ressalta que os programas de
apoio da indústria farmacêutica são bem-vindos.
“Essas ações fazem a diferença, são gratuitas e podem
mudar a perspectiva de muitas pacientes”, elogia.
A oncologista Gláucia também acredita no
efeito positivo que ações de autoestima têm sobre
mulheres com câncer de mama.
“Não conseguimos um levantamento estatístico
de quanto essas campanhas de resgate do bem-estar
e do amor-próprio podem colaborar para o tratamento. Mas o impacto é nítido, ao avaliarmos a disposição, o incentivo e a preocupação em manter o
tratamento, mas junto a isso continuar a viver em sociedade, trabalhando, produzindo, encontrando
prazer mesmo com algo grave a superar”, conta.
"O impacto é nítido,
ao avaliarmos a
preocupação em
manter o tratamento,
mas junto a isso
continuar trabalhando,
produzindo,
encontrando prazer."
Onco& outubro/novembro 2010
35
IRIN
curtas
Nova unidade do Centro
Paulista de Oncologia
O Centro Paulista de Oncologia (CPO)
inaugurou em fim de agosto sua terceira
unidade, no bairro do Tatuapé, na zona norte
de São Paulo. Apoiada numa equipe multidisciplinar e em medicamentos de ponta, a
nova unidade manterá a mesma estrutura que
as unidades Europa e Higienópolis, acreditadas plenamente pela Organização Nacional
de Acreditação (ONA) e que registram cerca
de 800 consultas médicas e 850 aplicações
mensalmente. Foram investidos cerca de
R$ 800 mil na nova unidade.
Reprodução
II Corrida e Caminhada
Com você, pela vida
36
A II Corrida e
Caminhada
Com você, pela
vida – Doe Medula Óssea será
realizada em 12
de dezembro na
Praia de Copacabana, no Rio
de Janeiro, e
pretende reunir
2,5 mil pessoas. Promovido pela Fundação do Câncer, o evento abre a Semana de Mobilização Nacional para Doação de
Medula Óssea. A inscrição, no valor de R$ 35, será revertida
para projetos do Centro de Transplante de Medula Óssea do Instituto Nacional de Câncer (INCA).
Além de informar sobre o diagnóstico precoce do câncer e
estimular a adoção de práticas saudáveis de vida, o objetivo do
evento é conscientizar as pessoas para a importância da doação
de medula óssea. No dia da corrida, que terá seis quilômetros,
uma unidade móvel do Hemorio estará no local para captar
doadores voluntários. No ano passado, 200 pessoas se cadastraram como doadoras.
outubro/novembro 2010 Onco&
Duas drogas para câncer
detêm o HIV em
experimento laboratorial
Num experimento em laboratório, pesquisadores da
Universidade de Minnesota dizem ter descoberto
um potencial tratamento para HIV, usando uma mistura de duas drogas anticâncer que já estão no
mercado. As drogas gemcitabina e decitabina “conseguiram deter o vírus da aids ao fazer com que ele
desenvolvesse mutações que o levassem à morte”, segundo os pesquisadores.
A combinação ainda está sendo testada em animais, mas os resultados são animadores, “pois se trata
de uma nova forma de atacar o vírus e porque as drogas não são experimentais – elas já foram aprovadas
pelo FDA para outros usos”, disseram os cientistas.
Benefícios de cirurgias para
redução de risco em portadoras dos genes BRCA estimados
Mulheres com mutações BRCA que se submetem a mastectomia profilática ou salpingo-ooforectomia reduzem seus riscos
de câncer de mama e ovário, segundo um estudo observacional
no Journal of the American Medical Association (JAMA).
Pesquisadores estudaram cerca de 2,5 mil mulheres com
mutações BRCA1 e BRCA2. Cerca de metade das pacientes
se submeteu a cirurgia para redução de risco. Depois de uma
mediana de 3,5 de acompanhamento, foram notados os
seguintes resultados:
• Nenhuma das mulheres que se submeteram a mastectomia
teve episódios de câncer de mama no acompanhamento, versus 7% das que não fizeram a cirurgia.
• Da mesma forma, salpingo-ooforectomia profilática foi associada com menor risco para câncer de ovário.
• Salpingo-ooforectomia também foi associada com um risco
reduzido para câncer de mama, tanto para portadoras de
BRCA1 quanto de BRCA2.
Cetuximabe aponta melhora significativa na sobrevida
de pacientes com câncer de cabeça e pescoço
A Merck Serono, uma divisão da Merck, anunciou os resultados de duas pesquisas que demonstram a relevância do cetuximabe no
tratamento do câncer de cabeça e pescoço. Apresentadas no 35o Congresso da Sociedade Europeia de Oncologia (ESMO), realizado
de 8 a 12 de outubro em Milão, na Itália, as pesquisas mostram que o cetuximabe, associado à quimioterapia, é padrão de tratamento
do câncer de cabeça e pescoço localmente avançado e do tipo recorrente ou metastático, sem tratamento anterior.
Os resultados da pesquisa em câncer de cabeça e pescoço recorrente e/ou metastático, sem tratamento anterior, baseada nos registros
de pacientes de 256 especialistas na França, Alemanha, Itália e Espanha, mostram que, em 2009, a combinação de tratamento com base
no cetuximabe foi utilizada em cerca de 60% dos casos dessa doença, sem tratamento prévio. Tais descobertas refletem o impacto do
estudo EXTREME, de fase III, na prática clínica. Publicado em 2008, o estudo demonstrou a primeira melhora significativa na sobrevida
geral de pacientes com esse tipo de câncer em 30 anos. O medicamento continua sendo a única terapia-alvo a oferecer esse benefício no
tratamento de câncer de cabeça e pescoço.
Uma pesquisa semelhante com os registros de pacientes com câncer de cabeça e pescoço localmente avançado revelou que a utilização do tratamento com cetuximabe aumentou de 9,1% para 35,7%, no período de 2006 a 2009. O medicamento, em conjunto
com a radioterapia, evolui para se tornar tratamento padrão, além de estar substituindo a quimiorradioterapia como principal tratamento para a doença.
60% dos fumantes com câncer
não largam o vício
Um levantamento realizado pelo Instituto
do Câncer do Estado
de São Paulo (Icesp)
aponta que 60% dos
fumantes com câncer
não conseguem largar
o cigarro mesmo após
descobrirem a doença.
Segundo a pesquisa, de todos os atendimentos realizados este ano no Instituto, 35% dos pacientes afirmaram ser
tabagistas quando começaram o tratamento.
Os efeitos nocivos do tabagismo no paciente de câncer
são muitos. O cigarro dificulta a cicatrização, prejudicando
pacientes submetidos a cirurgia oncológica. Além disso,
eleva a pressão arterial e o risco de doenças cardiovasculares
e infecções respiratórias. A função pulmonar também é altamente afetada, o que pode aumentar o risco de complicações durante o período de radioterapia.
Outra dificuldade provocada pelo cigarro nos pacientes
oncológicos é durante o período de quimioterapia. Para
quem é tabagista, alguns quimioterápicos podem surtir efeito
bem menor no organismo, o que prejudica o tratamento. Os
efeitos colaterais, como náuseas, vômitos, perda de apetite e
sintomas respiratórios, também são intensificados.
Pode ser o câncer,
não a quimioterapia
Confusão mental e dificuldade
de concentração que persistem
mesmo depois do fim do tratamento são reclamações comuns
de sobreviventes de câncer que
passaram por quimioterapia.
Um estudo, porém, sugere que
o problema pode não estar limitado a pacientes submetidos
ao tratamento.
Pesquisadores analisaram dados reunidos entre 2001 e 2006 pelo
National Health and Nutrition Examination Survey de 9.819 adultos
com 40 anos ou menos, dos quais 1.305 tinham histórico de câncer. Os
participantes responderam perguntas incluindo “Você é limitado de alguma forma devido à dificuldade de lembrar ou por experimentar períodos de confusão?”.
Enquanto 8% dos respondentes que nunca tiveram câncer relataram
limitações, 14% daqueles com histórico de câncer relataram problemas.
Depois de ajustar as diferenças entre os grupos, como idade, educação e
saúde geral, os pesquisadores concluíram que pessoas com histórico de
câncer tinham 40% mais probabilidade de relatar dificuldades de memória.
Segundo Pascal Jean-Pierre, da Miller School of Medicine, da Universidade de Miami, que apresentou os resultados em conferência da American
Association for Cancer Research, os problemas podem estar relacionados ao
tratamento, como químio, rádio ou hormonioterapia, a algo relacionado à
própria doença que muda a química do cérebro ou ao estresse psicológico.
Onco& outubro/novembro 2010
37
calendário
Evento
Data
Local
Informações
The International Federation
of Head and Neck Oncologic
Societies 2010 World Tour
25 a 27 de outubro
Rio de Janeiro, RJ
www.ifhnosworldtourrio2010.org
II Simpósio Multidisciplinar de
Cuidado com o Paciente Oncológico
28 a 30 de outubro
São Paulo, SP
ensino.einstein.br/portal
28 a 30 de outubro
Rio de Janeiro, RJ
www.gastrinca2010.com.br
IV Fórum da Rede Proteômica
do Rio de Janeiro
3 e 4 de novembro
Rio de Janeiro, RJ
www.inca.gov.br
Imagem e Tratamento
no Câncer de Mama
5 de novembro
Curitiba, PR
www.sbbmn.org.br
Workshop de atualização em
metástases hepáticas colorretais
5 de novembro
São Paulo, SP
www.accamargo.org.br
HEMO 2010
5 a 8 de novembro
Brasília, DF
www.hemo2010.org.br
III Simpósio Internacional de
Oncologia Gastrointestinal
do Hospital A.C. Camargo
6 de novembro
São Paulo, SP
www.hcancer.org.br/centrodeensino
Frontiers in Cancer
Prevention Research
7 a 10 de novembro
Filadélfia, PA, EUA
www.aacr.org
IX Jornada de Fisioterapia
em Oncologia
17 a 19 de novembro
Rio de Janeiro, RJ
www.inca.gov.br
X Curso de Radioterapia
de Última Geração
18 e 19 de novembro
São Paulo, SP
www.hospitalsiriolibanes.org.br
III Seminário em Centro Cirúrgico e
Centro de Material de Esterilização
26 de novembro
São Paulo, SP
www.hcancer.org.br/centrodeensino
San Antonio Breast Cancer
Symposium 2010
8 a 12 de dezembro
San Antonio, TX, EUA
www.sabcs.org
IX Congresso da Sociedade
Brasileira de Cirurgia Oncológica
IV GASTRINCA
IV Fórum Nacional do Consenso
Nacional em Nutrição Oncológica
38
outubro/novembro 2010 Onco&
Instituto Oncoguia
a voz do paciente com câncer
Associação sem fins lucrativos dedicada à Defesa dos Direitos
dos pacientes com câncer e da população em geral por meio de
informação de qualidade e do empoderamento para um autocuidado
em saúde, qualidade de vida e cidadania ativa e responsável.
Nossos pilares: Advocacy, Suporte e Educação
Portal Oncoguia: o mais completo portal
informativo sobre câncer, tratamentos,
qualidade de vida e direitos dos pacientes.
Manual dos direitos dos pacientes com
câncer: disponível no portal e em versão
impressa.
Espaço interativo: depoimentos,
entrevistas e troca de experiências.
Atuação política para a garantia e defesa
dos direitos dos pacientes.
Conversando sobre o câncer: programa de
rádio exclusivo com entrevistas e atualidades.
Envolvimento e participação dos
pacientes nos nossos comitês.
Redes sociais: meu Oncoguia, Twitter,
Facebook e Orkut.
Fale conosco: suporte e esclarecimento de
dúvidas.
MAIS INFORMAÇÕES:
www.oncoguia.org.br
[email protected]
www.meuoncoguia.com.br
www.twitter.com/oncoguia
Mudando a expectativa
em sobrevida global
1
Wyeth uma empresa do grupo Pfizer.
Download