A DIVERSIDADE DA GEOGRAFIA BRASILEIRA: ESCALAS E DIMENSÕES DA ANÁLISE E DA AÇÃO DE 9 A 12 DE OUTUBRO O “PLANEJAMENTO SEM PLANO”: EVIDÊNCIAS DE EMPREENDEDORISMO URBANO E “CITY MARKETING” NA CIDADE DE QUEIMADOS-RJ Marcelo Loura de Morais1 Resumo: Atualmente modelos urbanos de “planejamento estratégico” são vendidos às cidades da América Latina como a solução para todos os seus problemas, palavras como empreendedorismo, competitividade e planejamento estão presentes na maioria dos projetos atuais de requalificação urbana. Se em um primeiro momento a presença de arquitetos de renome, consultores privados e associações de empresários marcavam presença na produção do espaço urbano somente das grandes metrópoles, observamos hoje a chegada dessa tendência em municípios menores. Palavras-chave: Baixada Fluminense; empreendedorismo urbano; projeto de requalificação. Abstract: Nowadays urban models of strategic planning are sold to the cities of Latin America as the solution for all of your problems, words as “entrepreneurship, competitiveness and planning” are present in most of the current redevelopment urban projects. If in a first moment the fame architect’s presence, private consultants and entrepreneurs associations only marked presence in the production of space of the great metropolises, we observed the arrival of that tendency today in smaller municipal cities. Key-words: “Baixada Fluminense”; urban entrepreneurship; redevelopment project 1 – Introdução A cidade de Queimados localizada na Baixada Fluminense e na região metropolitana do Rio de Janeiro a aproximadamente 70 km de distância da capital do Estado, é uma cidade relativamente pequena com uma população de aproximadamente 142 mil habitantes e uma extensão territorial de 75.695 quilômetros quadrados (IBGE CIDADES). Contudo vem ganhando destaque recentemente devido ao seu crescimento econômico. O PIB municipal no período de 2000 a 2011 aumentou 64%, o número de estabelecimentos industriais presentes no município foi durante o mesmo período de 66 para 122, representando um crescimento de 84%. O Valor Adicionado Fiscal arrecadado aumentou de 417 mil reais aproximadamente para 977 mil reais, crescendo 134%. Esta virada econômica alimenta um discurso ideológico de que a região finalmente estaria se “libertando das amarras do subdesenvolvimento”. Consequentemente as transformações econômicas trazem a tona o debate da 1 - Mestrando do Programa de Pós-Graduação em Geografia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (PPPG- UFRJ). E-mail de contato: [email protected] 839 A DIVERSIDADE DA GEOGRAFIA BRASILEIRA: ESCALAS E DIMENSÕES DA ANÁLISE E DA AÇÃO DE 9 A 12 DE OUTUBRO necessidade de se readequar o aparato urbano local, tido como ultrapassado para uma localidade que aspira ser “moderna”. Transformações e readequações da forma urbana são colocadas como necessárias pelos agentes privados (As indústrias principalmente representadas pela FIRJAN) e pelo poder público (A prefeitura e o Governo Estadual), e teriam o objetivo de manter as taxas de crescimento econômico. As reformas previstas incluem em suas propostas o ideal urbanístico consagrado na cidade do Rio de Janeiro, valorizando o “urbano como espetáculo”, (FERREIRA, 2014), não é por acaso que o arquiteto e urbanista cotado pela prefeitura para liderar as obras é o mesmo responsável pela criação do teleférico do complexo do Alemão e da rampa de Manguinhos. O projeto que tem a parceria do Banco Mundial é definido pela prefeitura como vital para “incluir a cidade na rota de investimentos internacionais” (PREFEITURA DE QUEIMADOS, 2014, s/p) e é citado como um modelo bem sucedido e adotado nos “países desenvolvidos”. 2 – Os pressupostos da “cidade empresa” A presença de consultores internacionais e arquitetos de renome influenciando nas decisões dos gestores municipais é um fato marcante da realidade contemporânea2. Modelos urbanos bem sucedidos e de origem principalmente catalã vem sendo apresentados como a solução dos problemas das cidades da América Latina desde a década de 1990 (SILVA, 2012). O ponto de partida para entendermos como administrar uma cidade passou a se confundir com se administrar uma empresa, é a ideia de competitividade. Os avanços dos meios de transportes e de comunicações facilitaram a intrínseca capacidade do capital à mobilidade, transformando as relações entre território e investimentos, e “decuplicando a capacidade do capital de investir e reinvestir, ou seja, sua propensão à mobilidade” (CHESNAIS, 1996, p. 28). Consequentemente, neste cenário, as cidades se envolvem em uma verdadeira “Guerra fiscal” (SANTOS, SILVEIRA, 2006, p. 112), e os lugares tornam-se obrigados a oferecer todos os tipos 2 <http://www.arqbacana.com.br/internal/arq!news/read/12520/deu-no-estad%C3%A3o-arquitetos-estrangeirostra%C3%A7am-o-novo-rio> , acesso em 20/03/2014 840 A DIVERSIDADE DA GEOGRAFIA BRASILEIRA: ESCALAS E DIMENSÕES DA ANÁLISE E DA AÇÃO DE 9 A 12 DE OUTUBRO de vantagens possíveis para se transformarem em sedes das empresas e de outros tipos de investimentos. Dessa forma, a atratividade que o local é capaz de exercer para o capital internacional, se torna uma questão fundamental na gestão municipal, adquirindo importância atualmente nesta lógica as cidades que possuem uma maior capacidade de exercer o city marketing e de se promover. Isto desencadeará um ambiente de intensa competitividade: Sendo que: Se durante largo período o debate acerca da questão urbana remetia, entre outros, a temas como crescimento desordenado, reprodução da força de trabalho, equipamentos de consumo coletivo, movimentos sociais urbanos, racionalização do uso do solo, a nova questão urbana teria, agora, como nexo central a problemática da competitividade urbana. (VAINER, 2000, p. 76) Essa competição se daria principalmente pelo: (1) investimento de capital, tecnologia e competência gerencial, (2) atração de novas indústrias e negócios, (3) no preço e na qualidade dos serviços, e (4) na atração de força de trabalho adequadamente qualificada. (World Economic Development Congress & The World Bank, apud VAINER, 2000, p. 77). Um segundo ponto fundamental a ser considerado é a transformação na escala das discussões das responsabilidades sobre a gestão urbana, a partir da década de 1990, a responsabilidade sobre a intervenção no aparato urbano irá cair sobre a esfera local: os municípios. O governo local passa a se tornar o principal agente responsável pela qualificação do espaço urbano. O marco teórico fundamental dessa abordagem é o texto “As cidades como atores políticos” dos autores Manuel Castells e Jordi Borja, publicado no Brasil em 1996, em que afirmam que “as cidades adquirem, cada dia mais, um forte protagonismo tanto na vida politica como na vida econômica, social, cultural e nos meios de comunicação” (CASTELLS, BORJA, 1996, p. 152). Esse enfoque ao governo local e a arraigada ideia de que se deve competir por investimentos, irá catalisar discurso do pressuposto de que a cidade como um agente econômico privilegiado deve ser administrada como uma empresa, adotando, portanto medidas empresariais visando uma melhor eficiência. “A cidade-empresa 841 A DIVERSIDADE DA GEOGRAFIA BRASILEIRA: ESCALAS E DIMENSÕES DA ANÁLISE E DA AÇÃO DE 9 A 12 DE OUTUBRO atua no mercado de cidades e deve ser competitiva, ágil e flexível (...). Na empresa reina o pragmatismo, o realismo, o sentido prático; e a produtivização é a única lei.” (VAINER, 2000 p. 89, 90). A “cidade empresa” atua conjuntamente com a “cidade-mercadoria”, e a “cidade como pátria” (Ibid), justamente para ser vendida e para ter suas ações legitimadas. Como mercadoria a cidade tende a adotar um estilo de caraterização que evidencia seus ambientes comerciais, turísticos, geográficos, culturais e históricos. Afinal: O governo local deve promover a cidade para o exterior, desenvolvendo uma imagem forte e positiva apoiada numa oferta de infra-estruturas e de serviços (comunicações, serviços econômicos, oferta cultural, segurança etc.) que exerçam a atração de investidores, visitantes e usuários solventes à cidade e que facilitem suas "exportações" (de bens e serviços, de seus profissionais etc.). Esta oferta não tem por que ser financiada, executada ou gerida em sua totalidade pelo governo local. O papel de promotor é, precisamente, o de criar as condições que facilitem sua realização por agentes públicos ou privados (via planejamento, campanhas políticas, compensações econômicas etc.). (CASTELLS, BORJA; 1996, p. 190) A ideia de “patriotismo cívico” ocupa o papel de sustentador ideológico do discurso, e refere-se à figura do prefeito gestor, que se torna popular por resgatar uma cidade em decadência e que tem uma imagem vinculada ao sucesso dos grandes empresários. Esses três papéis que a cidade assume: “mercadoria, empresa e pátria”, no paradigma contemporâneo de planejamento urbano, podem ser encontrados nas ações recentes da prefeitura municipal de Queimados, contudo, como podemos supor, eles são levemente adaptados ao discurso de uma cidade de menor importância na hierarquia urbana e localizada em uma região periférica. 3. A chegada do “empreendedorismo urbano” às regiões periféricas: evidências do “planejamento sem plano” na cidade de Queimados Toda a discussão envolvendo o novo papel das cidades no capitalismo contemporâneo, leva em conta as metrópoles consideradas globais, ou seja, localidades capazes de oferecer uma enorme oferta de bens, serviços e 842 A DIVERSIDADE DA GEOGRAFIA BRASILEIRA: ESCALAS E DIMENSÕES DA ANÁLISE E DA AÇÃO DE 9 A 12 DE OUTUBRO infraestruturas para atrair capitais internacionais, e que possuam a capacidade de contratar arquitetos de renome internacional com a finalidade de se promoverem no cenário da competitividade. Esse modelo vendido as grandes cidades da América Latina, ganhou espaço na mídia como uma verdadeira receita de bolo para os problemas urbanos das regiões periféricas. Dessa forma, expressões como “planejamento, gestão estratégica, empreendedorismo urbano”, dentre outras com um sentido vago foram tomadas como a nova fórmula administrativa de sucesso. A Baixada Fluminense sempre foi uma região marcada pelas representações hegemônicas de violência e pobreza (ALVES, 2001). Contudo a partir da década de 1990, observamos uma ruptura no discurso, e se configura uma tentativa de se enfatizar o caráter da região de “local privilegiado logisticamente” e de uma região “projetada para o futuro”. Assim “a Baixada, como um todo, opera uma mudança da sua imagem, apagando seu passado e seu presente violento e assumindo a imagem de região que se projeta para o futuro como a alternativa mais promissora para investimentos no estado.” (Ibid, p. 171). Nesse processo é importante entender que mesmo não estando dentro desse ranking, algumas das cidades “não-globais” têm sido influenciadas pela lógica do empreendedorismo e da competição que caracterizam as cidades globais. Estas últimas são tidas como modelos, a serem imitados, especialmente os casos de um sucesso “repentino”. (SILVA, 2012, p. 295) Contudo, sendo impossível competir em nível de igualdade com as “cidades globais”, cabe a essas localidades somente tentar imitar as “tendências de se produzir cidades”, para se sobressaírem na competição regional: Como nem todas as cidades podem ter grandes projetos com consultorias ou mesmo associações de grandes obras com nomes de arquitetos de grife, mas acreditam no “mito da cidade-global” –, acabam tentando imitar as tendências de se produzir a cidade. Não se trata apenas de projetar-se no cenário internacional, apesar desse ser o sonho, mas trata-se de ao planejamento estratégico, mesmo que seja para melhorar as condições locais de competição intrarregional. Os maiores competidores estão, no caso das cidades de médio e pequeno porte, por perto. (SILVA, 2012, p.297) 843 A DIVERSIDADE DA GEOGRAFIA BRASILEIRA: ESCALAS E DIMENSÕES DA ANÁLISE E DA AÇÃO DE 9 A 12 DE OUTUBRO Essa imitação das tendências de se produzir cidade é chamada pelo autor supracitado de “empreendedorismo urbano periférico ou planejamento estratégico sem plano” (ibid, p.294). Nesse tipo de cidade “o importante mesmo é vender a beleza das áreas que rendem lucros e manter as áreas territoriais desprivilegiadas na maior passividade possível, de preferência escondidas” (ARAÚJO, 2011, p. 5). Em Queimados conseguimos perceber atualmente uma série de fatores que indicam a consolidação desse modelo de planejamento urbano previamente discutido. 1) A figura do “prefeito-empreendedor” , que é bem sucedido em vender a cidade para os setores empresariais, Max Lemos (PMDB), prefeito, é atualmente o prefeito da Associação de Prefeitos da Baixada e circula com frequência nos círculos empresariais; 2) A visita de arquitetos de renome, para planejar requalificações e reestruturações no centro da cidade, que no caso é o arquiteto é Julio Mario Jauregui do Atelier Metropolitano, que assina as obras do teleférico do Alemão e da rampa de Manguinhos; por fim; 3) A construção de um Apart Hotel de luxo, que seria responsável por atrair para a cidade as sedes das empresas que estão se instalando na Baixada Fluminense recentemente devido ao bom momento econômico vivido pela região, esta construção evidencia a necessidade atual de se investir em infraestrutura e serviços para se destacar na “competição inter-regional” por investimentos. A figura do prefeito da cidade eleito em 2008 e reeleito em 2012, com mais de 90% dos votos, se encaixa perfeitamente com os modelos descritos por Castells e Borja (1996) e Piquet (2007) de prefeito mais afeito aos negócios do que a politica. No dia 12 de abril de 2013, é noticiado um evento que o prefeito discursou e liderou em que havia representantes do Banco Mundial, estavam presentes também representantes da FIRJAN: Discutir os desafios a serem enfrentados no planejamento e na gestão da Região Metropolitana abordando as experiências internacionais relacionadas com o Rio de Janeiro. Esse foi o debate promovido pela mesa temática presidida pelo Prefeito de Queimados, Max Rodrigues Lemos, durante o seminário Rio Metrópole, que aconteceu nesta sexta-feira, 12, no Palácio Guanabara. O evento foi organizado pela Secretaria Estadual de Obras, através do Comitê Executivo de Estratégias Metropolitanas e serviu para fazer um balanço das relações técnicas e financeiras 844 A DIVERSIDADE DA GEOGRAFIA BRASILEIRA: ESCALAS E DIMENSÕES DA ANÁLISE E DA AÇÃO DE 9 A 12 DE OUTUBRO entre o Governo do Estado e o Banco Mundial representadas em programas de gestão metropolitana e desenvolvimento urbano metropolitano sustentável. (PREFEITURA DE QUEIMADOS, 2013, grifo nosso, s/p). A interlocução entre representantes do Banco Mundial, Representantes da FIRJAN e o prefeito é frequente e fica visível nos seguidos eventos promovidos pela prefeitura para debater o futuro da região da Baixada. Um documento importante que comprova essa relação muito próxima entre os círculos empresariais e os administradores municipais é o documento intitulado “Visões de Futuro”3, elaborado pelo sistema FIRJAN, e contendo uma série de recomendações que as prefeituras deveriam seguir, como se fosse uma cartilha de boa administração 4. Este documento também foi lançado em um evento que reuniu os administradores públicos e os representantes das instituições industriais. As recomendações passam por “criação, preservação e adequação de zonas industriais”, até mesmo a criação de um plano diretor estratégico. O papel de “prefeito promotor da cidade” é de vital importância para se criar o consenso da “cidade como pátria” (VAINER, 2000) onde se deve defender e realçar os fatores positivos da cidade para se sobressair na competitividade urbana contemporânea. O caráter de um gestor municipal que segue as recomendações técnicas dos órgãos empresariais é visto como superior ao politico tradicionalmente conhecido da Baixada Fluminense como um politico paternalista/populista. O segundo elemento fundamental para comprovar nossas hipóteses acerca da mudança do papel da administração municipal é a visita de arquitetos de renome internacional, visando assinar futuras intervenções urbanísticas. Em Queimados, existe em curso um projeto de requalificação do centro da cidade, que consiste basicamente na readequação do centro com arborização, ampliação das vias, criação de ciclovias, concentração de aparatos infraestruturais mais importantes em um raio previamente definido e reforma da estação ferroviária da Supervia, seu modelo é conhecido por TOD (Transport Oriented Development) e é citado como um modelo bem sucedido e adotado nos países desenvolvidos. Uma 3 <http://portal.baixadaon.com.br/nova-iguacu/seminario-visoes-de-futuro-da-firjan-vai-reunir-prefeitos-e-vicegovernador-em-nova-iguacu> 4 Disponível em: < www.firjan.org.br/visoesdefuturo> 845 A DIVERSIDADE DA GEOGRAFIA BRASILEIRA: ESCALAS E DIMENSÕES DA ANÁLISE E DA AÇÃO DE 9 A 12 DE OUTUBRO etapa inicial já foi realizada, que é a criação de um Centro Comercial, um mini shopping, para melhorar a oferta de comércio e serviços. O principal objetivo, contudo desta reforma é retirar os comerciantes informais do local, que ocupam as proximidades da estação ferroviária que corta a cidade, na visita do arquiteto o secretário de urbanismo que o acompanhava menciona explicitamente essa intenção: O Prefeito de Queimados, Max Lemos, recebeu a direção da Supervia para iniciar os estudos de remodelação da Estação Ferroviária do Município, visando colocar o comércio informal da cidade nos espaços da empresa responsável pelos trens urbanos do Estado do Rio de Janeiro. Estiveram presentes no encontro os diretores da Supervia, Julio Marques e Luiz de Souza e os Secretários de Urbanismo, André Bianche, de Transporte e Segurança, Elias José, acompanhado do Subsecretário de Posturas, Marcelo Baldez. (PREFEITURA DE QUEIMADOS, 2013, s/p) Fica evidente que neste novo modelo urbano, em que a imagem de uma cidade moderna e apta a receber investimentos internacionais que precisa ser vendida aos atores privados, não há espaço para a presença de comerciantes informais, figuras vinculadas ao passado da Baixada Fluminense, e não ao futuro prometido. Nas palavras do secretário de urbanismo: “as visitas constantes de profissionais reconhecidos no mercado da arquitetura são indicadores do crescimento do munícipio. Queimados hoje é um ponto focal para estudo dos grandes arquitetos e urbanistas”. Harvey (1996, p. 55) afirma que neste modelo de empresariamento urbano, “acima de tudo a cidade tem que parece um lugar inovador, excitante, criativo e seguro para visitar, jogar ou consumir”. Araújo (2011, p.4) complementa que estas reformas tem o “ato de fazer com a cidade uma organização totalmente estruturada com o simples objetivo de receber instrumentos, acréscimos econômicos e um desenvolvimento voltado para a lucratividade”. Seria, portanto, justamente uma politica de embelezamento das áreas centrais, uma roupagem, que se alimenta do discurso do ordenamento territorial e do planejamento, mas na verdade realiza apenas pequenas intervenções pontuais sem 846 A DIVERSIDADE DA GEOGRAFIA BRASILEIRA: ESCALAS E DIMENSÕES DA ANÁLISE E DA AÇÃO DE 9 A 12 DE OUTUBRO atacar verdadeiramente a desigualdade de investimento entre as diferentes localidades de uma cidade. O arquiteto confirma nossa hipótese ao constatar que: O que precisamos é ampliar a arborização, adequando-a nas ruas, praças, às margens dos rios. É uma forma de colorir a cidade. Acredito nessa relação harmônica entre a massa verde e massa construída. Outra questão que vamos trabalhar é a da mobilidade urbana. Estou muito surpreso com o que vi aqui na cidade, especificamente pela escala de proximidade. É um município que cresce com ordenação das vias públicas. Vamos elaborar um projeto que trata do desenvolvimento futuro da região. (PREFEITURA DE QUEIMADOS, 2014, grifo nosso, s/p) Por fim, o ultimo elemento que comprova a influência das práticas urbanas empreendedoras na esfera local da administração pública, é a futura inauguração de um apart hotel de luxo, que está sendo construído no centro da cidade, anunciado cheio de pompas pela prefeitura em um evento que reuniu mais uma vez, prefeito, e importantes empresários do setor imobiliário e industrial. No evento de apresentação do empreendimento foram apresentados pela empresa Zoneeg engenharia uma série de slides, e através deles podemos perceber como se torna fundamental a adoção desses dogmas administrativos para a gestão municipal atualmente (figura1.): Figura 1. “Por que Investir em Queimados?” Fonte: ROCHA (2014) 847 A DIVERSIDADE DA GEOGRAFIA BRASILEIRA: ESCALAS E DIMENSÕES DA ANÁLISE E DA AÇÃO DE 9 A 12 DE OUTUBRO Uma série de elementos teóricos que apresentamos fica evidente nesta imagem, o município é apresentado literalmente como uma mercadoria, onde se define “afinal, por que investir em Queimados?”, competitividade, gestão urbana mercadófila, e forte relação entre público e privado na definição dos rumos da cidade são conceitos que não mais somente estão presentes nas ditas cidades-globais, mas também já fazem parte das cidades menores, comprovando a força ideológica destas ideias. Atualmente, 70% dos seus 156 apartamentos já estão vendidos, localizado no centro do município será um dos primeiros edifícios com altura superior a quatro andares nas proximidades, e poderá alavancar o setor imobiliário na região, afinal, só com o anuncio do empreendimento o já podemos imaginar um aumento considerável do valor do solo urbano na região. 4 – Considerações Finais Harvey (1996) foi enfático ao afirmar que O novo empresariamento urbano se caracteriza, então, principalmente pela parceria público-privada tendo como objetivo politico e econômico, imediato muito mais o investimento e o desenvolvimento econômico através de empreendimentos imobiliários pontuais e especulativos do que a melhoria em um âmbito especifico (HARVEY, 1996, p. 53) E que: Os investimentos tomam cada vez mais a forma de uma negociação entre o capital financeiro internacional e os poderes locais, os quais fazem o melhor possível para maximizar a atratividade local para o desenvolvimento capitalista. (ibid, p. 50) Podemos concluir, portanto, que a cidade de Queimados tenta se inserir no cenário de intensa competição regional, se utilizando de suas vantagens logísticas, e cultivando a imagem de ser o local “que mais cresce na região”, o forte crescimento econômico dos últimos anos a colocou na rota dos investimentos internacionais, e, por consequência seu aparato urbano considerado inadequado para uma cidade que 848 A DIVERSIDADE DA GEOGRAFIA BRASILEIRA: ESCALAS E DIMENSÕES DA ANÁLISE E DA AÇÃO DE 9 A 12 DE OUTUBRO pretende superar o estigma de região periférica está passando por seguidas reestruturações a fim de se criar um “ambiente favorável aos negócios” (HARVEY, 2011). E adaptar a cidades aos exigentes padrões competitivos contemporâneos. Contudo, um modelo importado de outra realidade que desconsidera o contexto em que será implementado, pensado para cidades globais e incorporado muito mais como um discurso baseado em práticas pontuais, não como propriamente um modelo, dificilmente será capaz de apresentar as soluções para os nossos conhecidos e debatidos problemas sócio-urbanos. Referências Bibliográficas ALVES, José Claudio Souza. Dos barões ao extermínio: Uma história da violência na Baixada Fluminense. Duque de Caxias, RJ: AOOH, CLIO, 2003. ARAÚJO, Flávia. Empresariamento Urbano: concepção, estratégias e críticas. In: Anais do I circuito de debates acadêmicos. Ipea. [Rio de Janeiro, 2011]. Disponível em: <http://www.ipea.gov.br/code2011/chamada2011/pdf/area7/area7-artigo7.pdf> Acesso em 20 fev. 2015. CASTELLS, Manuel; BORJA, Jordi. As Cidades como Atores Políticos. 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