Transição do primata ao homem O papel do trabalho na transição do primata ao homem: a produção material e a autoprodução do ser humano A evolução que começou com o Australopithecus e se completou com o CroMagnon, através de uma cadeia de centenas de milhares de anos, teve como coroamento a completa e radical diferenciação entre o homem e o macaco antropomorfo. Durante essa lenta e complexa evolução, o homem desenvolveu cinco características: postura ereta, braços livres e mãos preensoras, cérebro pensante, linguagem articulada e olhos de focalização penetrante. O processo de hominização teve início no momento em que o homem assumiu uma postura ereta e, liberando os braços e as mãos, passou a fabricar instrumentos, inicialmente de pedra (lascada e polida) e, posteriormente, de metais (cobre, bronze e ferro). Concomitantemente à produção de seus instrumentos de trabalho, o homem passou também a se produzir enquanto homem. A confecção de armas e ferramentas determinou a transição da adaptação passiva, na qual a natureza dominava o homem, para a adaptação ativa, em que o homem dominou a natureza. O primitivo coletor e caçador foi-se transformando lentamente em agricultor e pastor, em produtor de artefatos e alimentos. O trabalho teve um papel determinante na transformação do primata em homem. No próprio ato de produzir instrumentos, o homem se autoproduziu, realizando a interação entre os olhos, o cérebro e as mãos. Adquiriu uma visão em perspectiva, aprimorou a capacidade psicomotora e operou a síntese entre o olhar focado e penetrante, as operações mentais e as atividades físico-musculares. A unificação do “ver”, do “pensar” e do “fazer” condicionou a interação recíproca entre a focalização visual, o desenvolvimento intelectual e o adestramento manual do ser humano. Utilizando a ferramenta como um prolongamento e apêndice de seu braço e, ao mesmo tempo, dividindo o trabalho e cooperando com outros homens, a força e a capacidade do homem individual foram multiplicadas e potencializadas no interior do clã, da aldeia ou da tribo. A necessidade de comunicação, inerente à vida em sociedade, levou o homem a moldurar os sons, a criar palavras para nomear as coisas, a combinar palavras em frases, a traduzir o pensamento abstrato em conceitos. Simultaneamente, desenvolveu a linguagem articulada que, por sua vez, cimentou ainda mais os laços comunitários estabelecidos pela divisão e cooperação no trabalho. Através do trabalho, o homem cultivou as plantas e realizou a revolução agrícola, domesticou os animais e realizou a revolução pastoril. Descobriu os metais e fez a revolução metalúrgica, substituindo as armas e ferramentas de pedra por armas e ferramentas de metais, cuja maior resistência e durabilidade permitiram-lhe a conquista definitiva do meio ambiente. O trabalho efetuou a mediação do homem com a natureza e do homem com outros homens. Ao humanizar a natureza, através do trabalho, o homem se humanizou com ela. Ao produzir seus meios materiais de existência, o homem se autoproduziu como ser humano. No trabalho e pelo trabalho o homem se hominizou, ascendendo na escala que foi do primata ao Homo sapiens, e se humanizou, como único animal dotado de inteligência, sensibilidade e espiritualidade. Fonte: MELLO, Leonel Itaussu A. e COSTA, Luís César Amad. História Antiga e medieval. São Paulo: Scipione.