INTRODUÇÃO ASTRONOMIA AGA-210 5. Sistema Solar

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Introdução à Astronomia – AGA210
Prof. Enos Picazzio
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As propostas teóricas são basicamente modelos nebulares, baseados na contração de
uma nuvem interestelar de gás e poeira. Embora o modelo atual ainda careça de
aperfeiçoamento, ele explica razoavelmente bem as características mais genéricas.
A formação estelar será tratada em detalhes em capítulo específico, por isso faremos
aqui uma pequena abordagem superficial deste assunto antes de discutirmos o caso solar.
5.17 Formação de uma estrela
As estrelas são formadas a partir de imensas nuvens interestelares de gás e poeira que,
em dado momento, perdem a sustentação e entram em colapso gravitacional. A distribuição de
matéria na nuvem não é homogênea e, por influência do campo gravitacional local, as regiões
com concentração maior de matéria crescem com o colapso da nuvem. Assim são formadas
inúmeras estrelas de diferentes massas. A figura de capa desta apostila mostra a imagem de
uma região da constelação de Órion onde inúmeras estrelas estão nascendo, obtida pelo satélite
infravermelho IRAS.
Uma característica do processo de contração é o surgimento da rotação: quanto mais a
nuvem se contrai, mais rápido ela gira. Assim, no centro de cada núcleo de contração, vai-se
formando uma proto-estrela. A rotação achata a nuvem e provoca a formação de um disco de
matéria na região equatorial. No centro o acúmulo gradativo de massa comprime o núcleo da
proto-estrela, aumentando a pressão e a temperatura. Quando a temperatura atinge cerca de 10
milhões de graus os núcleos dos átomos de hidrogênio são fundidos para dar origem ao átomo
de hélio. É a fusão nuclear do hidrogênio. Neste momento, a proto-estrela transforma-se em
estrela e passa a gerar energia. A energia da proto-estrela provém da conversão de energia
gravitacional, enquanto a energia da estrela vem da fusão nuclear. É neste estágio de fusão do
hidrogênio em hélio que a estrela passará a maior parte de sua vida.
Assim se formou o Sol há 4,6 bilhões de anos. Ele se encontra praticamente na metade
de sua vida e, ao envelhecer, passará por uma fase expansiva quando seu raio deverá atingir a
órbita de Marte. Todo o Sistema Solar sofrerá com as conseqüências dramáticas desta
expansão.
5.18 Formação do Sistema Solar
Ao se analisar as propriedades dinâmicas e físicas do SS nota-se uma certa
regularidade, a saber:
1. os sentidos de revolução e de rotação dos planetas (exceto Vênus) coincidem com o sentido
de rotação do Sol;
2. as órbitas dos planetas (exceto Mercúrio) são quase circulares e praticamente coplanares à
eclíptica;
3. as órbitas da maioria dos satélites também são quase circulares e coplanares ao equador dos
seus planetas;
4. as distâncias heliocêntricas dos planetas, assim como as distâncias orbitais dos satélites,
seguem uma lei de espaçamento regular;
5. juntos, os planetas apresentam momento angular1 muito maior que o do Sol;
1
medida da quantidade de rotação, ou movimento orbital, de um corpo. Matematicamente, a quantidade de
movimento angular é dada pelo produto “m×v×r” (m é massa, v é velocidade orbital e r é raio).
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6. os cometas de períodos longos apresentam órbitas com direções e ângulos diversos, ao
contrário dos cometas de períodos curtos e dos demais corpos do SS;
7. os planetas gasosos apresentam anéis;
8. adiante de Netuno há uma população de corpos pequenos com quase órbitas circulares, em
alguns casos altamente excêntricas;
9. os planetas apresentam composição química diferenciada, relacionada com a distância
heliocêntrica.
O modelo que explica melhor estes fatos é o da contração nebular, descrito no item
anterior. Esta teoria evolucionária foi apresentada pela primeira vez por René Descartes em
1644. Posteriormente, ela foi aperfeiçoada por Immanuel Kant (1775) e por Pierre-Simon de
Laplace (1796), mas os melhoramentos mais significativos surgiram apenas neste século.
A formação do SS começou com a contração da Nebulosa Solar Primitiva (NSP), há 4,6
bilhões de anos (Figura 5.63). Durante esta fase, o proto-Sol ia se formando no centro da NSP,
a temperatura local aumentava gradativamente, e ele emitia radiação infravermelha. Pela lei de
conservação do momento angular2, quanto mais a NSP se contraía, mais rapidamente ela
girava. Essa rotação achatava a nuvem gradativamente criando um disco de matéria no plano
equatorial NSP.
A temperatura no disco circunsolar diminuía
com a distância heliocêntrica. Portanto, a seqüência
de condensação era comandada pela distribuição de
temperatura no disco (Figura 5.64A). Até a órbita de
Mercúrio, a temperatura era elevada o suficiente
para vaporizar até mesmo os grãos. Os planetas
telúricos formaram-se numa região relativamente
quente, portanto empobrecida de gases leves. Isto
explica a composição química desses planetas. Com
o aumento da densidade de matéria no disco, as
colisões entre moléculas de gás e/ou grãos de
poeira, já presentes na NSP, se tornaram mais
freqüentes, acelerando o crescimento dos grãos por
coalescência. Blocos maiores se formaram por
agregação, através de colisões e colapso
gravitacional (elementos com maior massa atraiam
mais fortemente a matéria das vizinhanças).
Formados por coalescência e já com dimensões
quilométricas, os planetesimais1 orbitaram o Sol.
Colisões mútuas entre eles levaram à formação de
blocos maiores, que se agregaram por colapso
gravitacional formando os planetas.
Figura 5.63 Na contração da Nebulosa Solar Primitiva,
o Sol formou-se no centro da nuvem. Os planetas e seus
satélites foram formados a partir da matéria do disco
circunsolar. (E.Cahisson e S. McMillan , 1999)
2
De acordo com as leis de movimento de Newton o momento angular de qualquer objeto deve permanecer
constante antes, durante e depois de uma mudança física. Em outras palavras, se a distância r diminui então a
velocidade v deve aumentar pois mvr é contante.
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B
A
Figura 5.64 (A) No início o material nebular estava distribuído uniformemente na nuvem. No centro da
nuvem a matéria era gradativamente comprimida e aquecida: nascia o proto-Sol. Os elementos mais voláteis
foram “soprados” da região central, concentrando-se nas regiões mais frias. Aqui formaram-se os planetas
jovianos e os cometas (Adaptado de R.R.Robbins et al.1995, pág.113). (B) Um planeta se forma acumulando
matéria de um anel circular, abrindo uma clareira anular no disco. Assim, ele pode atingir o tamanho de
Júpiter (Papaloiziu, Celestial Mechanics & Dinamical Astronomy, v.87, 2003).
Na região onde se encontram os planetas jovianos as temperaturas eram bem mais
baixas, composta predominantemente por gases, principalmente hidrogênio e hélio. O processo
de formação desses planetas, principalmente Júpiter e Saturno, assemelha-se mais ao processo
de formação das estrelas. Instabilidades gravitacionais no disco formam glóbulos de gás, que se
tornam planetas por auto-gravitação. Grãos de poeira coagulam e sedimentam no centro do
protoplaneta, formando um núcleo. O planeta abre uma lacuna (clareira anular) no disco
enquanto acumula massa (Figura 5.64B). O processo não se interrompe após o esvaziamento
do anel. O planeta continua acumulando matéria do disco no bordo do anel, através de duas
pontes que se formam unindo o planeta ao disco.
Grandes massas implicam campos gravitacionais intensos. Assim, estes planetas
atraíram para si a maior parte do gás das vizinhanças, modificando com isto a composição
química dos seus satélites que se formavam na região. Acredita-se ainda que esses planetas
passaram por um breve período de alta luminosidade, aquecendo os satélites mais próximos.
Estes dois mecanismos juntos podem explicar algumas propriedades dos satélites como, por
exemplo, o decréscimo de densidade média dos satélites galileanos à medida em que se afasta
de Júpiter3. A influência gravitacional dos planetas gigantes teria expulsado para os confins do
SS uma fração dos planetesimais que se formaram nesta região, dando origem à Nuvem de
Oort (Figura 5.65).
A região adiante de Saturno, caracterizada pela baixíssima temperatura, é local propício
para a formação de gelos a partir da condensação de diferentes gases. Os planetesimais
formados nessa região seriam os cometas de curto e médio períodos. Urano e Netuno, teriam se
formado através da aglutinação gravitacional desses planetesimais. Comparativamente a Júpiter
e Saturno, eles possuem menos hidrogênio e hélio porque a região onde se formaram já estava
mais empobrecida destes gases. Os planetesimais que não se agregaram aos planetas
permaneceram nessa região formando o cinturão de Kuiper.
3
No caso de Io a atividade vulcânica é a principal causa da sua alta densidade média.
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Figura 5.65 Outro cenário possível na formação do Sistema Solar: por influência gravitacional
dos planetas maiores, uma parcela dos planetesimais foi ejetada para os confins do SS,
formando a Nuvem de Oort. (Adaptado de Astronomy, Fevereiro 1997, pág.49)
As diferenças observadas na composição química dos asteróides do cinturão também
encontram suporte na seqüência de condensação. Na região mais interna e mais quente
(próxima de Marte) condensaram os silicatos, enquanto os compostos de carbono se
condensaram a temperaturas mais baixas, portanto mais próximas de Júpiter. Entretanto, a
seqüência de condensação não explica a presença de asteróides metálicos (liga ferro-níquel) do
cinturão. Estes devem ter sido partes de um ou mais corpos maiores, diferenciados e resfriados
que se fragmentaram, expondo o material do núcleo.
Neste panorama, os meteoróides seriam fragmentos de material que não foram
agregados aos corpos maiores, que convivem com restos de corpos fragmentados. Os
meteoróides de baixa densidade são provenientes da crosta, enquanto os de maior densidade de
regiões mais internas.
5.19 Sistemas planetários externos
Durante muito tempo este modelo de formação planetária fundamentado nas
características do SS era apenas uma evidência teórica que permitia prever a existência de
sistemas planetários associados a outras estrelas. Embora a procura por sistemas planetários
externos tenha sido uma preocupação constante dos astrônomos, as provas mais evidentes
surgiram mais recentemente. A primeira delas surgiu inesperadamente. Na década de 80, o céu
foi mapeado com o satélite infravermelho IRAS. Os dados coletados eram calibrados através
de estrelas padrão, ou seja, os astros observados tinham seus brilhos expressos em termos do
brilho dessas estrelas. Uma dessas estrelas padrão era Vega (alfa da Lira). A análise cuidadosa
dos dados do IRAS revelou, no entanto, que Vega apresentava brilho infravermelho maior do
que o esperado. Não demorou muito para se descobrir que esse excesso de radiação
infravermelha vinha de um disco de poeira que envolvia a estrela. Assim também apareciam
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outras estrelas como Formalhaut (alfa do Peixe Austral), beta do Pintor (Figura 5.66) e epsilon
do Eridano.
Hoje, observações que envolvem técnicas mais avançadas e equipamentos mais
sofisticados revelam a existência de vários outros casos, não apenas de discos de poeira
circunstelar como também de exoplanetas, alguns pertencentes a sistemas binários4 ou strelas
mortas (pulsares).
Até março de 2007 foram catalogados 216 planetas, assim distribuídos: 208 planetas em
178 sistemas planetários, e 8 planetas associados a 8 estrelas. Praticamente a totalidade desses
planetas são gasosos, como Júpiter, alguns com Saturno. Isto é resultado do viés introduzido
pelos métodos observacionais, limitados à detecção de planetas de grande massa. Ainda
carecemos de instrumentação potente o suficiente para isolar um planeta pequeno como a
Terra.
Descobrir novos planetas não é o objetivo principal da busca. O maior objetivo é saber
como se formam e evoluem os sistemas planetários. Compreendendo o processo de formação
certamente entenderemos melhor o nosso sistema (Solar) assim como o processo de formação
de planetas sólidos e objetos menores.
O primeiro registro de procura por exoplanetas pode ter sido de Cristian Huygens, no
final do século 17. Porém apenas nos meados do século 20 surgiram os primeiros relatos
oficiais de busca. Peter van de Kamp passou décadas fotografando o movimento próprio5 da
“estrela de Barnard”, uma estrela de brilho débil da constelação do Ofiúco, a 6 anos-luz. Sua
conclusão final foi a de que a oscilação na posição da estrelas era causada pela presença de um
planeta com massa cerca de 1,6 vezes maior que a de Júpiter. Cáculos posteriores mais
refinados sugeriam a presença de dois outros planetas, com massas equivalentes a 0,7 e 0,5
massa e Júpiter. Peter van de Kamp morreu em 1995 sem ver suas provisões confirmadas.
A primeira observação concreta de planetas orbitando uma estrela do tipo solar foi a de
“upsilon Andromeda”, anunciada em 15 de abril de 1999. O planeta mais interno, com período
de apenas 4,6 dias, foi o primeiro a ser descoberto. Posteriormente, foram descobertos outros
dois, com períodos de 240 e 1267 dias. Há duas características peculiares nesses planetas:
progressivamente com o aumento dos períodos as órbitas tornam-se mais excêntricas e as
massas aumentam, ou seja, quanto mais distante o planeta, mais excêntrica é sua órbita e maior
é sua massa. À primeira vista essas características fortalecem a teoria de migração dos planetas,
onde planetas gigantes formam-se nas regiões mais frias (distantes) do disco protoplanetário,
abundantes em material, e a interação gravitacional move um ou mais planetas para as regiões
mais internas do sistema, enquanto outros planetas são ejetados para fora do sistema. Nesse
cenário, os planetas do sistema upsilon Andromeda são gigantes gasosos como Júpiter,
inadequados para abrigar vida. Porém, esse planetas podem ter satélites rochosos com Júpiter e,
estando mais próximos de suas estrelas do que Júpiter está do Sol, as chances de se encontrar
mundos propícios à vida aumentam.
Outro ponto importante a se considerar sobre as evidências da migração planetária é
que a estrutura do Sistema Solar é o “resultado final” dessa migração, ou seja, nos primórdios a
configuração e a constituição podem ter sido bem diferentes do que é atualmente. Do ponto de
vista biológico isto tem implicações profundas. Como as condições mudam com a evolução do
sistema, locais propícios para o desenvolvimento da vida podem tornar-se indadequados com o
tempo, enquanto outros que eram inadequados podem adquirir condições favoráveis. Em outras
palavras, a vida pode ter caráter migratório.
4
Sistema composto de duas estrelas que giram em torno do centro de massa do sistema. Este assunto será
abordado no capítulo Estrelas.
5
movimento da estrela relativamente às demais estrelas do campo.
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Figura 5.66 Imagem da estrela beta da constelação do Pintor mostra um disco protoplanetário estenso.
A temperatura é indicada pela cor: do branco (quente) ao azul (frio). Visto em detalhe (foto inferior) a
parte central do disco apresenta uma inclinação do plano do disco, possivelmente provocada por um
planeta de grande massa. A inclinação oscila para cima e para baixo. A estrela, que fica na parte central,
é muito mais brilhante que o disco por isso foi artificialmente ocultada. (Smith & Terrile, 1987)
A figura 5.67 apresenta a distribuição de apenas 156 exoplanetas, segundo o semi-eixo
maior da órbita. Um fato surpreendente é que a maioria dos planetas, muitos de grande massa,
estão bem mais próximos de suas estrelas que Júpiter está do Sol. Em alguns casos, a distância
do planeta à estrela é bem menor que a distância heliocêntrica de Mercúrio. Por ora esse fato é
explicado pela migração.
Referências
B.A.Smith, R.J.Terrile (1987), Bulletim of American Astronomical Society, vol.19, p.829.
E.Chaisson e S.McMillan (1999), Astronomy Today, Prentice Hall.
R.R.Robbins, W.H.Jefferys, S.J.Shawl (1995), Discovering Astronomy, John Wiley & Sons, Inc.
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Júpiter
Figura 5.67 Distribuição de 156 exoplanetas, em ordem de semi-eixo maior
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