Aula 2 A gramática normativa no contexto lusobrasileiro. A NGB. Pablo Faria HL220C – IEL/UNICAMP 08/09/2014 Normatização O conceito de normatização: por que padronizar o ensino de uma língua? Normatização A Banca de Lingua Portuguesa propoe a analise de BOM na frase “O bom brasileiro zela pelo progresso do Brasil”. As respostas obtidas sao as seguintes: Adjunto atributivo; Adjunto restritivo; Adjunto limitativo; Adjunto adjetivo; Adjunto determinativo; Adjunto demonstrativo; Adjunto determinativo demonstrativo; Complemento atributivo; Complemento restritivo; Complemento limitativo; Complemento adjetivo; Complemento qualificativo; Complemento do nome, nao preposicionado. Se o professor e desses que nao arredam pe de suas conviccoes, logo logo despacha bombado o aluno que classificou o BOM de maneira diferente da sua; se e consciencioso, vai aceitando esses nomes todos, nao sem antes, e claro, pedir-lhe o titulo do livro onde estudou, ou o caderno de classe para confirmar uma denominacao estranha (Chediak, 1960, p.878, com adaptacoes).” Normatização Ensino da língua era vinculado à tradição greco-latina, baseado em antologias de textos literários consagrados, linha terminológica definida por cada professor. “a sua nomenclatura sofria de balbúrdia, falta de gradação e de ordenação; era variada, incompleta deficiente, contraditória, não correspondente aos fatos da língua” (Chediak, 1953, “Fatos da Língua Portuguesa”) Migração escolar: alunos poderiam encontrar terminologias gramaticais distintas por região do país e até no interior de um mesmo estado, cidade, bairro, e até na mesma escola. A NGB Portaria nº 152, de 24/04/1957: nomeação de comissão para elaboração de anteprojeto de simplificação e unificação da nomenclatura gramatical brasileira, contendo nomenclatura e definições. 13/08/1957: primeira versão do anteprojeto, divulgado entre representantes políticos, universidades, academias (ABL e ABF), professores e outros interessados. Foi discutido durante meses. A NGB Critérios: I. as deliberações serão tomadas pelo voto da maioria; II. a escolha de cada um dos nomes se fará depois de realizado o levantamento das várias designações correntes nas obras de autores nacionais consagrados; III.tal seleção atenderá a tríplice aspecto a)a exatidão científica do termo; b)a vulgarização internacional; c) a sua tradição na vida escolar brasileira; IV. eliminar-se-ão as denominações múltiplas, optando-se por aquela que, além de mais simples, for de uso mais geral. A NGB Comentários: Chediak (1960): “Se é difícil conciliar opiniões quanto a nomes, muito mais difícil é chegar a um acordo sobre definições e observações de ordem doutrinária. Fiquem elas a cargo dos professores e dos compendios. Não tenho dúvida em afirmar que o Anteprojeto, tal como está, atenta contra a liberdade da cátedra.” Academia Brasileira de Filologia: “a Comissão é de parecer que todas as definições e exemplificação devam ser suprimidas (...)”. A NGB Portaria nº 36, de 28/01/1959: põe em vigor o texto definitivo aprovado do projeto, padronizando, com vigor, a terminologia gramatical no ensino e aplicação da língua portuguesa do Brasil. Jucá Filho: “Mesmo os que discordam de uma terminologia única e advogam uma pretensa liberdade adaptaram seus livros à nova nomenclatura, sentiram que ela se impos, não por causa de uma Portaria Ministerial, mas por suas qualidades padronizadoras”. Enquanto isso, em Portugal... Decreto de 4 de Julho de 1963: designa o Doutor Manuel de Paiva Boléo, professor catedrático da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, para elaborar um anteprojeto de simplificação e uniformização da nomenclatura gramatical portuguesa. Trecho: “Mais feliz foi o Brasil, onde iniciativa semelhante conduziu recentemente à publicação de um diploma legal, que fixou e tornou obrigatória uma terminologia gramatical uniforme, já adoptada no corrente ano letivo.” A NGP Critérios muito semelhantes Experiencia brasileira foi levada em conta: foram analisadas as críticas feitas à NGB e os resultados dos primeiros anos de sua aplicação; além disso, a NGB exerceu algum limite às definições da NGP, visto que um dos objetivos era o de não se afastar demasiado da NGB, dada a “unidade da língua” e os interesses culturais e comerciais em comum (especialmente na área literária). Amplamente divulgado e discutido: viu-se que o interesse era mais por uniformizar, que simplificar. A NGP Portaria nº 22.664, de 28 de Abril de 1967: é aprovado o texto final da NGP. A NGP, diferentemente da NGB, adota uma estruturação terminológica ampla, flexível, abrangendo duas seções diferenciadas, claramente separadas, mas não conflitantes, possibilitando aos docentes de língua portuguesa uma gama extremamente variada de termos gramaticais, de livre escolha. A revisão da NGP Portaria n.o 1488/2004 de 24 de Dezembro: aprovação da Terminologia Linguistica para os Ensinos Basico e Secundario (TLEBS). [...] devido aos avanços proporcionados pelo desenvolvimento da linguística enquanto ciencia, a Nomenclatura Gramatical Portuguesa foi, progressivamente, acusando a inexorável usura do tempo, tendo deixado, há muito, de constituir referencia para a solução de problemas que tem vindo a ser identificados no campo do ensino da língua portuguesa, [...] NGB: 50 anos depois Não houve revisões oficiais desde então O texto da NGB “é citado em nossas gramáticas com constancia, mesmo que para acrescentar-lhe algo que não tenha sido considerado pela Comissão que o propos ou para dizer que ele está irremediavelmente superado” (Henriques, 2010). NGB: 50 anos depois Panorama do ensino (Henriques, 2010): “[…] o panorama do ensino de portugues é mais crítico do que era nos idos de 1957. […] A maioria de nossos estudantes sequer tem acesso a um ensino de qualidade, já que faltam a seus professores o necessário preparo academico e uma remuneração digna.” Programa Internacional de Avaliação de Alunos (Pisa) de 2006, que avalia jovens de 15 anos: na prova de leitura, que mede a compreensão de textos, o país foi o oitavo pior, entre 56 nações. Críticas atuais sobre o ensino de gramática são pouco diferentes das feitas por Rodrigo de Sá Nogueira (anos 1920) e Otto Jespersen (em 1924). Gramática-padrão Só a nomenclatura é suficiente? Hauy (1983): da necessidade de uma gramática-padrão da Língua Portuguesa. Da ciência (linguistica) para o ensino e normatizacao: movimento deixa muito a desejar. Compêndios gramaticais existentes: terminologia obsoleta e errônea, falta de unidade de pontos de vista teórico, ausência de um tratado de gramatica descritiva que sirva de padrao. Gramática-padrão Mais problemas (Hauy, 1983): Diversidade de conceituação dos fatos gramaticais; Multiplicidade de análises, pautadas em cópias de mestres do passado e na tradução de autores estrangeiros; Ausencia de espírito crítico; Falsas definições e má exemplificação (incluindo explicações confusas e verdadeiras contradições); Falta de revisão rigorosa das edições e reedições dos compendios; O ensino gramatical parece ignorar o esforço da pesquisa [em linguística]. Gramática-padrão Problemas no estudo da oração (Hauy, 1983): Definições a partir de pontos de vista vários, com critérios ora lógicos, ora formais e ora semanticos. Oração é também chamada de frase, enunciado e proposição. Definições: A oração é expressão de um juízo (lógica formal) A oração é a expressão de um pensamento A oração é um conjunto de palavras com sentido completo A oração é uma frase com estrutura dual (S – P) Gramática-padrão A oração é expressão de um juízo (lógica formal) Se todo juízo é uma afirmação, o que fazer com as interrogativas, imperativas e optativas, isto é, não são orações? Se apenas declarativas e enunciativas se encaixam na definição, então esta é falsa. Subordinadas: sendo dependentes de outras, não poderiam por si mesmas exprimir um juízo. Gramática-padrão A oração é a expressão de um pensamento Analítica e conceitualmente falsas: Analítico: em “O que sei é que te amo” (“é o” = oração principal; “que te amo” = oração subordinada; “que sei” = oração subordinada), como aceitar que as orações são expressões de pensamentos? Conceitualmente: as estruturas de pensamento (na lógica) são o conceito (elementos do juízo), o juizo (elemento fundamental do pensamento, composto por conceitos) e o raciocinio (juízos relacionados). Definir a oração como expressão do pensamento é tomar o específico (oração) pelo geral (pensamento). Exemplo: Modus ponens (raciocínio lógico proposicional): P → Q, P ˫ Q. Ex.: P: “Todo homem” é Q:“mortal”, P:“João é homem”, então Q: “João é mortal”. Gramática-padrão A oração é um conjunto de palavras com sentido completo Algumas das definições encontradas: “Oração é a frase de estrutura sintática S – P” “Oração é frase mesmo sem a estrutura sintática S – P” “Oração é a frase construída com um verbo” “Oração é frase mesmo destituída de verbo” Gramática-padrão A oração é uma frase com estrutura dual (S – P) Se relaciona com “oração é uma frase” e “oração é qualquer enunciado com sentido próprio”. Assim, se nem toda oração tem sentido completo e é expressão de um juízo, a definição é falsa. Conclusão É de suma importancia, embora complexo, uniformizar a terminologia A NGB foi pioneira, porém acabou ficando para trás em relação às iniciativas portuguesas Apenas a nomenclatura não parece ser suficiente, pois as gramáticas existentes exibem muitas inconsistencias, incompletudes e erros de fato Uma gramática-padrão pode ser necessária, porém, como superar a polemica das definições? Referencias GHELLI, Kelma Gomes Mendonça. A Nomenclatura (Terminologia) Gramatical Brasileira. Cadernos da FUCAMP, revista, 2006. HAUY, Amini Boainain. Da Necessidade de uma Gramatica-Padrão da Lingua Portuguesa. Ensaios 99, São Paulo: Editora Ática, 1983. HENRIQUES, Claudio Cezar. A nomenclatura gramatical brasileira fez cinquenta anos: e daí? Em BARROS, LA., and ISQUERDO, NA., orgs. O léxico em foco: múltiplos olhares [online]. São Paulo: Editora UNESP; São Paulo: Cultura Academica, 2010. 365 p.