Capitulo XLV

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Manuela Gonçalo
1. RASTREIO DO CANCRO DA MAMA
A incidência do cancro da mama tem vindo
a aumentar entre nós. Ocorrem, em média,
mais de 4.500 novos casos por ano (4.972
no Continente em 2005, correspondendo
a uma taxa de incidência padronizada de
75/100.000 mulheres), o que equivale a mais
de 13 novos casos por dia. No nosso país é
causa de morte de, aproximadamente, 1.600
mulheres/ano1. Calcula-se que 1 em cada 10
mulheres portuguesas desenvolva cancro
da mama ao longo da vida.
O único exame imagiológico que mostra
utilidade no rastreio organizado do cancro
da mama, dirigido a massas populacionais,
é a mamografia. O programa de rastreio de
cancro da mama em Portugal é implementado pela Liga Portuguesa contra o cancro,
tendo-se iniciado na Região Centro em
1990, alargando-se posteriormente ao restante território. Integra no rastreio mulheres
com idades entre os 45-69 anos, convidadas,
através de carta, a realizar uma mamografia
cada 2 anos.
O principal objectivo do rastreio é detectar
cancros em fases mais precoces, com melhor prognóstico. Os programas de rastreio
permitiram, de acordo com a maioria dos
estudos, reduzir a mortalidade por cancro da mama, na ordem dos 20-30%2-5. Há
controvérsia sobre o efeito excessivo do
diagnóstico e tratamento de alguns cancros
detectados em rastreio, uma vez que muitos
dos carcinomas in situ diagnosticados não
iriam ser fatais6!
Sabe-se que a mamografia não detecta todos os cancros da mama. Tem uma sensibilidade inferior em mamas muito densas (em
mamas com mais de 75% de tecido fibroglandular tem sensibilidade da ordem dos
30-48%) e pelo contrário sensibilidade alta
em mamas com constituição predominantemente adiposa (97-98%)2. Por outro lado,
o cancro da mama pode ter diferentes formas de apresentação, algumas delas atípicas
e que dificultam a sua detecção. Há ainda a
considerar erros de percepção durante a leitura, pelo que a maioria dos programas de
rastreio utilizam um sistema de dupla leitura cega, em que dois radiologistas fazem a
leitura sistemática de todas as mamografias,
de forma independente, seguida de interpretação dos casos discordantes, quer por
um único radiologista que não participou
na leitura anterior, quer por todos os radiologistas do programa. Há programas de detecção auxiliada por computador (CAD) para
maximizar a sensibilidade da mamografia na
detecção do cancro da mama, assinalando
imagens que merecem maior atenção pelo
radiologista. Verifica-se globalmente que
estes sistemas têm grande sensibilidade na
detecção de microcalcificações, sendo contudo inferiores na detecção de outro tipo de
lesões. Paralelamente assinalam inúmeras
supostas alterações que mais não são que
variantes normais2.
A tomossíntese é uma nova técnica que, com
dose ligeiramente superior à da mamografia,
obtém vários cortes tomográficos da mama,
resolvendo o problema da sobreposição de
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45 (Parte 2) Imagiologia da mama
– Patologia maligna
cirurgia conservadora, tentando excluir focos adicionais, particularmente nos tumores
com maior tendência para multifocalidade.
Permite boa avaliação da extensão do tumor, designadamente à parede torácica e da
invasão cutânea. Está igualmente indicada
na avaliação da resposta tumoral à quimioterapia e no estudo da mama perante uma
suspeita de cancro oculto. Após a cirurgia,
pode ter indicação na tentativa de detectar
tumor residual e no diagnóstico diferencial
entre fibrose e recidiva. É uma técnica valiosa no estudo da mama reconstruída (no
estudo de próteses e na detecção de recidiva tumoral). As principais limitações da RM
prendem-se com a especificidade relativamente baixa (especialmente nas mulheres
pré-menopáusicas), menor disponibilidade
e alto custo, e falta de equipamentos com
possibilidade de técnicas de intervenção
orientadas por RM2,7.
2.1. CARCINOMA DUCTAL IN SITU
2. IMAGIOLOGIA DIAGNÓSTICA
No diagnóstico de patologia mamária a
mamografia e a ecografia são os exames de
primeira linha, permitindo o diagnóstico da
maioria das situações. A ecografia tem-se
desenvolvido nos últimos anos, com aparecimento de sondas de alta frequência que
permitem imagens de alta definição, sendo
de particular utilidade no estudo de mamas
com elevada densidade. Permite caracterização de lesões identificadas na mamografia, muitas vezes detecta focos tumorais
adicionais e lesões ocultas na mamografia.
O Doppler ajuda a caracterizar algumas lesões e mais recentemente a elastografia parece ganhar importante papel no estudo das
lesões mamárias, permitindo, segundo vários estudos, diminuir o número de biopsias.
A RM, pela alta sensibilidade, tem indicações
crescentes no estudo de patologia maligna
da mama, nomeadamente no estudo préoperatório de doentes com indicação para
414
O carcinoma ductal in situ (CDIS) é habitualmente uma lesão infraclínica, detectada em
exames de rastreio. É responsável por 2040% dos cancros da mama detectados em
rastreio, através da mamografia (sensibilidade de 70-80%)2,6.
Traduz-se geralmente por microcalcificações
isoladas, as quais podem apresentar diferentes aspectos morfológicos (Fig. 1). As lineares e ramificadas (vermiculares), tipicamente malignas, estão associadas a carcinomas
de alto grau do tipo comedo. As polimorfas
(probabilidade de malignidade de 25-40%)
podem expressar CDIS de qualquer grau. As
amorfas (malignas em cerca de 20%) surgem
sobretudo em CDIS de baixo grau. As punctiformes são mais frequentes no subtipo cribiforme. As calcificações vermiculares e polimorfas, fortemente associadas a malignidade, deverão ser sempre sujeitas a biopsia. O
problema de orientação prende-se com as
microcalcificações de preocupação intermédia, já que a maioria é benigna.
Capítulo 45
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tecido mamário. Parece aumentar a detecção
de cancro da mama em mamas com densidade moderada a alta.
A ecografia não é uma técnica adequada
para rastreio. É altamente dependente do
operador, contudo recentemente desenvolveram-se sistemas automatizados em que é
feito um varrimento automático de toda a
mama, com análise diferida das imagens, reduzindo grandemente esta dependência. A
ecografia deverá complementar o estudo de
alguns casos chamados para a consulta de
aferição do rastreio. Sabe-se, contudo, que
a ecografia aumenta os falsos positivos, aumentando a detecção de lesões adicionais
benignas que exigirão biopsia4,5.
Apesar da grande sensibilidade da ressonância magnética (RM) não há evidência
que tenha utilidade no rastreio de cancro
da mama, a não ser numa população de alto
risco, designadamente as portadoras de mutação BRCA1 e BRCA27.
B
C
Figura 1. Mamografia. A: calcificações vermiculares – CDIS. B: calcificações polimorfas –CDI. C: calcificações
polimorfas – CDIS.
A distribuição das microcalcificações é outro
elemento fundamental na sua apreciação. A
distribuição linear, de acordo com a árvore
ductal, é a mais sugestiva de carcinoma, seguida da distribuição segmentar ou em pequenos focos. Já a distribuição regional tem
apenas um grau de suspeição intermédia.
Apesar destas distribuições preferenciais a
morfologia e distribuição das microcalcificações não é fidedigna para predizer o grau ou
o subtipo de CDIS.
O CDIS pode também apresentar-se como
uma massa, especialmente o carcinoma papilar, desenvolvido numa cavidade quística.
A ecografia tem uma sensibilidade limitada
no estudo do CDIS. Pode apresentar-se como
um ducto dilatado, com conteúdo hipoecogénico, por vezes com margens indistintas e
com calcificações, ou por vezes surge como
uma massa hipoecogénica, que no caso do
carcinoma papilar está geralmente no interior de um quisto, podendo então o Doppler
demonstrar alguma vascularização do componente sólido.
Apesar de várias séries mostrarem baixa
sensibilidade da RM na detecção do CDIS,
estudos mais recentes apontam para sensibilidade mais alta (73-95%), mas a RM é particularmente útil para avaliar a extensão do
CDIS, já que a mamografia a subestima em
cerca de 15-20%2,11.
(Parte 2) - Imagiologia da mama – Patologia maligna
O CDIS habitualmente apenas é visível nas
sequências com contraste onde tipicamente
surge como uma área de realce de distribuição linear/ductal ou segmentar, ou menos
frequentemente como foco ou realce regional. O estudo cinético (avaliação da intensidade do realce do contraste nos primeiros
minutos de injecção) tem pouco interesse
no CDIS, já que frequentemente apresentam
curvas com realce lento e progressivo (mais
características de patologia benigna)2,9,10.
2.2. CARCINOMA INVASIVO
Os cancros da mama podem apresentar diferentes formas de apresentação, que reflectem diferentes tipos histológicos. De seguida serão referidos os principais aspectos do
carcinoma ductal invasivo sem outra especificação (NOS) (o mais frequente), algumas
formas de carcinomas circunscritos, o carcinoma lobular e o carcinoma inflamatório.
2.2.1. CARCINOMA DUCTAL INVASIVO
Classicamente, na mamografia apresenta-se
como uma massa redonda ou oval, densa,
com margens espiculadas, sendo a forma de
apresentação de 70% dos carcinomas ductais invasivos (CDI) NOS, especialmente os
de menor grau histológico (Fig. 2).
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A
B
Figura 2. CDI NOS. A: mamografia: massa espiculada. B: ecografia: massa hipoecogénica irregular com maior diâmetro anteroposterior.
A margem espiculada é o elemento semiológico associado a maior probabilidade de
malignidade. A microlobulação do contorno
da massa assim como a margem indistinta,
frequentemente presentes, são também aspectos que sugerem malignidade. A distorção arquitectural e a assimetria de densidade, especialmente quando de aparecimento
recente ou em crescimento, comparativamente com exames anteriores, são também
frequentes formas de apresentação do CDI.
As microcalcificações, embora frequentes,
estão sobretudo associadas a outras alterações (já que quando ocorrem isoladamente
são mais favoráveis a CDIS). As lesões nodulares (ovais ou arredondadas), apesar de poderem ser também formas de apresentação
do CDI NOS, são mais frequentes nos tipos
especiais de CDI. Associadamente pode verificar-se espessamento e retracção cutânea
e do mamilo2,11 (Figs. 3-5).
Na ecografia é mais frequente a massa arredondada, caracteristicamente com diâmetro
anteroposterior idêntico ou superior ao diâmetro transversal da lesão (ao contrário do
que caracteristicamente se verifica nos nó-
416
dulos benignos), de limites pelo menos parcialmente mal definidos, irregulares e muitas
vezes com halo hiperecogénico (correspondente à espiculação visível na mamografia).
É também característica a atenuação posterior que estes tumores condicionam. Contudo, os tumores mais indiferenciados (G3)
apresentam-se frequentemente, pelo contrário, como nódulos globosos, bem circunscritos, em que é comum o reforço posterior,
muitas vezes simulando patologia benigna.
No Doppler é característica a hipervascularização com vários vasos penetrando na lesão.
A mamografia e ecografia associadas têm
sensibilidade da ordem dos 90% no diagnóstico do CDI, mostrando frequentemente
a ecografia focos adicionais de tumor não
identificados na mamografia, especialmente
em mamas densas.
A RM tem sensibilidade alta na detecção do
CDI, com a maioria das séries a reportar sensibilidade superior a 90%, embora com especificidade inferior (50-70%)7,11. Na RM frequentemente os tumores apenas se tornam aparentes nas sequências com contraste, 90% dos
CDI NOS surgem como uma massa de forma
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A
B
Figura 3. CDI. A: mamografia: nódulo com cerca de 1 cm, mal definido. B: ecografia: nódulo globoso heterogéneo
de limite posterior mal definido.
A
B
Figura 4. A e B: mamografia com vários fibroadenomas calcificados e área extensa de calcificações vermiculares e
polimorfas numa área de densidade aumentada. C: ecografia: área nodular hipoecogénica irregular com numerosas
calcificações internas. CDI.
irregular, com margem lobulada, irregular ou
espiculada, com realce interno heterogéneo
ou em anel, sendo o realce rápido e intenso
com posterior redução do realce: washout
(curva mais associada a malignidade). Quando é grande o componente fibrótico o realce
pode ser pouco intenso e de forma mais lenta. Na espectroscopia por RM pode haver um
pico elevado de colina, tal como sucede em
outros tumores2,7,9,10,12 (Fig. 6).
(Parte 2) - Imagiologia da mama – Patologia maligna
A RM é o exame ideal para avaliar a extensão
correcta do tumor (frequentemente superior
à esperada pelas outras técnicas) e aquele
que mostra melhor concordância com o tamanho da lesão no estudo histológico, sendo também superior às outras técnicas na
detecção de doença multifocal/multicêntrica. A RM tem contudo falsos positivos, pelo
que é fundamental comprovar a natureza
maligna (biopsia)7.
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A
B
C
D
E
Figura 5. CDI. Mamografia. A: incidência oblíqua. B: incidência crânio-caudal: distorção arquitectural pouco perceptível. C: ampliação com compressão focada: distorção arquitectural mais aparente. D: ecografia: lesão hipoecogénica
de forma irregular, mal definida e com atenuação posterior em algumas áreas. E: radiografia da peça operatória onde
a lesão, referenciada com arpão, é mais evidente.
tar-se como calcificações isoladas, distorção
arquitectural, assimetria ou massa lobulada.
Na ecografia é geralmente uma massa irregular, hipoecogénica, com orientação vertical, com margem espiculada ou indistinta,
tipicamente com atenuação posterior. Na
RM geralmente surge como massa irregular
espiculada, com realce rápido inicial com lavagem ou com curva em planalto. Contudo,
como são por vezes pouco vascularizados o
realce pode ser lento e pouco intenso e portanto não serem visíveis (falsos negativos)2.
2.2.2. CANCROS CIRCUNSCRITOS
Figura 6. CDI, RM: massa globosa, de contorno irregular, com intenso realce heterogéneo.
O carcinoma tubular é um tipo especial de
CDI, bem diferenciado, que habitualmente
se manifesta como pequena massa espiculada na mamografia, de crescimento lento,
por vezes estável durante anos. Em cerca de
metade dos casos pode apresentar microcalcificações essencialmente de tipo amorfo ou
polimorfas. Mais raramente pode manifes-
418
O CDI NOS apresenta-se como massa circunscrita, sem calcificações, em menos de
10% dos casos, correspondendo geralmente
a tumores de alto grau histológico (G3). Os
três tipos especiais de CDI: carcinoma medular, carcinoma mucinoso e carcinoma papilar
são geralmente circunscritos. O tumor filóide maligno, em 5-25% dos casos, apresentase também como uma massa circunscrita,
assim como o carcinoma metaplásico. Os
cancros circunscritos têm muitas vezes, esCapítulo 45
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A
apresentam reforço posterior (Fig. 7). No Doppler são geralmente hipervasculares. Na RM
apresentam-se como massas circunscritas, caracteristicamente com hipersinal em T2 devido
à grande quantidade de mucina. Geralmente
realçam após contraste, podendo apresentar
diferentes tipos de curva de realce, sendo frequente o realce lento, que pode dificultar a
detecção nas sequências com contraste.
O carcinoma papilar apresenta-se habitualmente como massa sólida circunscrita, ou um
quisto complexo. Frequentemente são carcinomas in situ, mais frequentemente intraquísticos, por vezes invasivos (coexistindo os dois
componentes). Na mamografia é geralmente
uma massa densa, redonda, oval ou lobulada,
na maioria dos casos circunscrita, podendo ser
parcialmente indistinta, mas a espiculação é
rara. São frequentes as massas múltiplas, no
mesmo quadrante. Pode acompanhar-se de
calcificações que geralmente são amorfas ou
polimorfas. Na ecografia é uma massa sólida
ou quística complexa com massa intraquística
ou nódulos murais, com projecções papilares
e septos (vacularizados em estudo Doppler),
frequentemente com componente líquido heterogéneo de natureza hemática (Fig. 8). Habitualmente condiciona reforço posterior. Na RM
traduz-se por massa regular heterogénea, com
B
Figura 7. Carcinoma mucinoso. A: mamografia: nódulo lobulado, parcialmente circunscrito. B: ecografia: nódulo
ovalado, lobulado, com ecogenicidade idêntica à da gordura adjacente.
(Parte 2) - Imagiologia da mama – Patologia maligna
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pecialmente numa fase inicial, características
indistinguíveis de nódulos benignos6,11,14.
O carcinoma medular apresenta-se tipicamente como massa oval ou redonda, lobulada,
parcialmente bem delimitada, por vezes com
margem parcialmente indistinta e raramente
com calcificações. Na ecografia surge mais frequentemente como nódulo hipoecogénico, redondo/oval, lobulado, geralmente circunscrito
embora possa ser parcialmente mal definido.
Podem também ter cavidades quísticas internas por necrose e frequentemente têm grande
reforço posterior. Na RM são também nódulos
ovais, geralmente lobulados que realçam de
forma heterogénea e que podem apresentar
áreas de necrose e cinética com curvas com
realce sugestivas de malignidade10.
O carcinoma mucinoso caracteriza-se também por massa redonda/oval, lobulada, densa, parcialmente circunscrita, frequentemente
microlobulada. As calcificações, apesar de não
serem frequentes, podem ocorrer sobretudo
do tipo amorfo ou punctiformes. Na ecografia
são redondos/ovais por vezes mais irregulares,
microlobulados, pelo menos parcialmente circunscritos e caracteristicamente isoecogénicos com a gordura, o que torna a sua detecção
muito difícil na ecografia, especialmente quando de pequeno tamanho. Frequentemente
B
Figura 8. Carcinoma papilar. A: mamografia: nódulo bem delimitado. B: ecografia quisto com conteúdo heterogéneo e área sólida, de limite bem definido, com reforço posterior.
realce da parede, e frequentemente por massa
intraquística com realce.
O carcinoma metaplásico é um tumor raro
que inclui um grupo heterogéneo de tumores em que há simultaneamente diferenciação epitelial e mesenquimatosa. Traduz-se
geralmente por massas de grandes dimensões, palpáveis, de crescimento rápido,
parcialmente circunscritas, podendo ter diferentes densidades, com possibilidade de
calcificações variadas, de morfologia por vezes atípica (calcificação de matriz condróide
e até ossificação). Na ecografia são massas
parcialmente circunscritas de ecogenicidade variável consoante o principal componente, predominantemente hipoecogénicas, por vezes com extensas calcificações e
áreas quísticas, frequentemente com reforço
posterior. As calcificações vermiculares e polimorfas, frequentes no CDI, são menos frequentes no carcinoma metaplásico. Na RM é
habitualmente uma massa com realce rápido e intenso, sobretudo periférico2,14.
2.2.3. CARCINOMA LOBULAR INVASIVO
Representa cerca de 10-15% dos cancros da
mama. Pode ter manifestações muito subtis
420
na mamografia, o que se deve ao seu padrão
de crescimento infiltrativo, em que o tumor
gradualmente substitui o tecido fibroglandular, sem condicionar reacção desmoplásica.
Na mamografia surge mais frequentemente
como área de assimetria focal em crescimento (por comparação com exames prévios),
muitas vezes apenas perceptível numa incidência. Pode também apresentar-se como
distorção arquitectural isolada ou como massa espiculada. As calcificações são relativamente raras neste tumor (1-11%)2,7,10,13.
A mamografia tem globalmente sensibilidade baixa na detecção do carcinoma lobular invasivo (CLI) (34-72%). Para além disso,
quando o detecta, frequentemente subestima a sua extensão em mais de dois terços
dos doentes. Frequentemente são multifocais/multicêntricos e está também aumentada a incidência de cancro na mama contralateral. São habitualmente maiores que os CDI
na altura do diagnóstico, frequentemente
detectados na avaliação clínica como massa
palpável, como retracção da mama ou retracção cutânea (Fig. 9).
A ecografia apresenta valores superiores na
sua detecção, com sensibilidade da ordem
dos 88%. Frequentemente detecta CLI subtis
Capítulo 45
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ou mesmo ocultos na mamografia. Apresenta-se sobretudo como massa hipoecogénica
irregular com atenuação posterior, por vezes
como distorção arquitectural. A hipoecogenicidade pode ser acentuada com reforço
posterior, simulando um quisto. Mas também a ecografia frequentemente subestima
a extensão do tumor.
Na RM a maioria aparece como massa irregular. Contudo, em cerca de 20% dos casos,
não há verdadeira massa mas antes um realce assimétrico. Os CLI que condicionam
infiltração difusa podem condicionar apenas
realce lento e pouco intenso, sem washout,
dificultando o diagnóstico. Apesar da RM
poder ter falsos negativos, é o exame que
tem maior sensibilidade e que melhor avalia
a verdadeira dimensão do CLI2,10 (Fig. 10).
para a etiologia maligna do processo inflamatório, como sejam microcalcificações,
distorções, nódulos ou assimetrias focais
(Fig. 11). Na ecografia, para além das alterações inflamatórias, com edema acentuado,
é também possível, em algumas situações,
detectar massas ocultas na mamografia. No
Doppler, à semelhança de outros processos
inflamatórios, verifica-se aumento global da
vascularização. Na RM, nas sequências antes
do contraste, destacam-se os sinais de edema com marcado espessamento cutâneo.
Com contraste há geralmente realce intenso e rápido, regional ou difuso da mama, por
vezes com massa irregular e realce cutâneo
em áreas focais, mas muitas vezes o cancro
subjacente não é visível. Nem sempre a RM
é útil na diferenciação entre cancro inflamatório e mastite.
2.2.4. CARCINOMA INFLAMATÓRIO
Caracteriza-se na mamografia por assimetria mamária global com aumento difuso da
densidade mamária e espessamento cutâneo e trabecular que confere às imagens da
mama um aspecto reticulado. Em associação
pode haver outras alterações que orientem
(Parte 2) - Imagiologia da mama – Patologia maligna
2.3. DOENÇAS HEMATOLÓGICAS
(LINFOMA E LEUCEMIA)
Geralmente a mama é atingida secundariamente pela doença sistémica. Contudo, especialmente no linfoma, pode a mama ser
atingida de forma primária.
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Figura 9. CLI. Mamografia bilateral: retracção da mama esquerda em consequência de extensa infiltração tumoral.
Figura 11. Carcinoma inflamatório. Mamografia bilateral com aumento global da densidade da mama esquerda
com marcado espessamento dos tegumentos, especialmente da região areolar e evidente distorção arquitectural na
região central. De notar também a presença de uma adenopatia densa na axila esquerda, na incidência oblíqua.
As lesões mamárias podem ter diferentes
apresentações, desde assimetrias focais
até mesmo nódulos (solitários/múltiplos)
mais ou menos circunscritos, caracteristicamente sem espiculação ou calcificações. Pode também ocorrer na mama de
forma difusa, com aumento global da
densidade, com espessamento trabecular
e da pele. Na ecografia geralmente correspondem a lesões hipoecogénicas que
podem variar desde circunscritas até mal
definidas, ou ter textura mais heterogé-
422
nea com áreas de diferentes ecogenicidades misturadas (Fig. 12).
Na RM as lesões mamárias sofrem usualmente realce rápido.
Em especial nas formas secundárias, é frequente a existência de adenopatias axilares
múltiplas (uni ou bilaterais) arredondadas,
densas na mamografia e acentuadamente hipoecogénicas na ecografia. Em consequência da obstrução linfática que condicionam,
pode verificar-se aumento global da mama
por edema com espessamento cutâneo.
Capítulo 45
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Figura 10. CLI. RM: vários focos tumorais (na mamografia e ecografia apenas era visível a lesão mais volumosa).
B
Figura 12. Linfoma. A: mamografia nódulo mal definido nos quadrantes externos da mama esquerda. B: ecografia:
nódulo acentuadamente hipoecogénico, lobulado.
2.4. METÁSTASES
As metástases mamárias apresentam-se habitualmente como um ou vários nódulos,
com morfologia arredondada, bem circunscritos, raramente com calcificações, sólidos
na ecografia, hipoecogénicos (Fig. 13). Na
RM são massas habitualmente com realce
rápido, por vezes em alvo.
A mama é mais frequentemente atingida
por via hematogénica, sendo o principal tumor primário o melanoma. Podem também
provocar metástases mamárias os tumores
do pulmão, ovário, rim, sarcomas de tecidos
moles, entre outros menos frequentes.
3. INTERVENÇÃO
A galactografia consiste na cateterização de
um ducto, injecção de produto de contraste
iodado e posterior realização de duas incidências mamográficas (crânio-caudal e perfil). Está indicada em situações de corrimento mamilar uniporo, essencialmente de tipo
hemático, serohemático ou seroso. A grande
(Parte 2) - Imagiologia da mama – Patologia maligna
maioria das situações são condicionadas por
patologia benigna, contudo subjacente ao
corrimento mamilar, especialmente hemático, pode também estar uma causa maligna.
Especialmente o CDIS pode ter, como única
expressão, corrimento mamilar. Os carcinomas invasivos, embora possam produzir
corrimento mamilar, expressam geralmente
outras alterações. Apresentam-se na galactografia mais frequentemente como defeitos
de repleção e irregularidade do contorno
do ducto, geralmente dilatado, encarceração, distorção e até por vezes amputação do
mesmo. A galactografia permite a localização
precisa da lesão intraductal (Figs. 14 e 15). É
um exame invasivo que exige a cateterização
do ducto afectado, procedimento que pode
ser difícil e demorado e doloroso para a doente. Tem sensibilidade aceitável na detecção
de patologia ductal e especificidade baixa já
que não há sinais específicos que permitam a
diferenciação entre patologia benigna e maligna15,16. Mais recentemente, técnicas de RM
permitem também o estudo dos galactóforos
de forma não invasiva, globalmente com resultados idênticos, reduzindo grandemente
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A
Figura 14. Galactografia: CDIS numa doente com corrimento hemático uniporo (mamografia e ecografia normais):
dilatação de ductos com várias imagens de subtração e amputação de ductos.
424
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Figura 13. Metástases de melanoma: mamografia e ecografia: múltiplos nódulos regulares, sólidos hipoecogénicos,
bem delimitados.
a necessidade de execução de galactografia.
Além disso, a possibilidade de fusão com imagens de RM mamária (com contraste ev) permitem uma melhor apreciação da verdadeira
dimensão das lesões16.
A citologia e biopsia devem ser executadas
com controlo imagiológico, já que aumenta a
sua eficácia. Sempre que possível utiliza-se a
ecografia, exame mais cómodo, mais económico, mais rápido, que não utiliza radiações
ionizantes e permite acompanhar a agulha
na recolha do tecido durante todo o procedimento (Fig. 16). Quando a lesão não é visível
na ecografia poderá recorrer-se à estereotaxia,
desde que a lesão seja visível na mamografia.
Se a lesão apenas for visível na RM terá de ser
usada esta técnica para guiar o procedimento.
A citologia aspirativa com agulha fina (FNAC)
está indicada em lesões nodulares. Usam-se
agulhas de 25 a 22 G. A acuidade aumenta
com a experiência do citopatologista e com
(Parte 2) - Imagiologia da mama – Patologia maligna
a sua presença no decurso da recolha de material. As amostras insuficientes são mais frequentes quando o procedimento é orientado
por estereotaxia (23-39%) do que por ecografia (10-15%). A acuidade global é de 77%
nos procedimentos ecoguiados e de 58% nos
guiados por estereotaxia8. Pode haver resultados falsos positivos.
A biopsia globalmente tem acuidade de
97,5% e não tem falsos positivos. Permite
distinção entre carcinoma in situ e invasivo
e estudo dos receptores. Usa preferencialmente agulhas de 16 a 14 G (microbiopsia),
não havendo aparente benefício em usar
agulhas de calibre superior em lesões que
se manifestam como massas2. Nas microcalcificações é útil a obtenção de fragmentos
maiores, geralmente com agulhas de 10-11
G preferencialmente com sistema de vácuo
que permite recolha de fragmentos de maiores dimensões e consequentemente maior
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Figura 15. Galactografia: CDI numa doente com corrimento hemático: ducto dilatado e obstruído. Há microcalcificações associadas.
B
Figura 16. Biopsia ecoguiada de nódulo. A: agulha de biopsia encostada à lesão antes do disparo. B: durante a
colheita de material.
aproximação diagnóstica, tanto mais que em
cerca de 35% dos casos de microcalcificações
coexiste patologia benigna e maligna associadas. Neste caso é também fundamental o
estudo radiológico dos fragmentos retirados
para nos certificarmos que a colheita incluiu
calcificações (Fig. 17). Quando as calcificações são visíveis na ecografia a probabilidade
de serem malignas é maior, devendo a biopsia ser orientada para a componente visível
na ecografia, onde é maior a probabilidade
de haver componente invasivo8.
Sempre que haja a possibilidade da lesão ser
removida durante o procedimento deve ser
colocado um clip metálico que facilitará posterior localização da lesão (Fig. 18). Também
após a realização de biopsias por RM deve
ser colocado um clip para a lesão poder ser
localizada na mamografia. Em doentes com
tumores localmente avançados, antes de
iniciarem quimioterapia neoadjuvante deve
também ser colocado um clip para marcação
do tumor pois, caso se verifique uma boa
resposta, ele pode tornar-se imperceptível.
No caso da biopsia percutânea não ser possível ou não ser conclusiva, pode haver necessidade de recorrer à biopsia cirúrgica, que no
caso de se tratar de lesão infraclínica deverá
ser marcada com arpão, orientado por imagiologia. Depois do arpão colocado, é feita
marcação cutânea (com lápis dérmico) da localização da lesão para orientação do cirur-
426
gião e são feitas duas incidências mamográficas (crânio-caudal e perfil) que permitem
confirmar a marcação da lesão e verificar o
trajecto do arpão na mama (Fig. 19).
O arpão é também imprescindível na localização pré-operatória de tumores infraclínicos. Depois da cirurgia deverá ser feita
radiografia/ecografia da peça operatória
para confirmar a excisão da lesão, o que é
particularmente importante no caso de se
tratar de microcalcificações. Sempre que a
lesão se estenda até à margem da peça, isto
deve ser comunicado ao cirurgião para possível alargamento da margem, contudo não
é possível o radiologista pronunciar-se sobre
a negatividade das margens.
4. ESTUDO DA AXILA
A mamografia apenas mostra gânglios axilares do nível I. Os gânglios normais aparecem
como nódulos de morfologia ovalada, reniformes, bem delimitados com cortical fina e
centro com densidade de gordura. Apesar
de poder mostrar gânglios patológicos (globosos, densos, com espessamento cortical e
com redução ou até perda da gordura central e por vezes com microcalcificações), não
é adequada para o estudo da axila, apresentando uma sensibilidade baixa na detecção
de adenopatias metastáticas.
Capítulo 45
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A
B
Figura 17. A: biopsia por estereotaxia de microcalcificações. B: radiografia dos fragmentos retirados com agulha 11
G e sistema de vácuo com numerosas microcalcificações. Estudo histológico: CDIS.
A
B
Figura 18. A: colocação de clip metálico em foco de microcalcificações após a biopsia. B: excisão deste foco, orientada com arpão.
A ecografia é o exame mais adequado para
estudo da axila, apresentando sensibilidade
da ordem dos 56-72% e especificidade de
70-90% na detecção de metástases axilares
de cancro da mama2. O tamanho não tem
qualquer relação com invasão já que gânglios normais com 3-4 cm são frequentes e
muitas vezes são detectadas metástases infracentimétricas.
(Parte 2) - Imagiologia da mama – Patologia maligna
Os gânglios normais têm, à semelhança
da mamografia, morfologia ovalada com
cortical fina, hipoecogénica e centro hiperreflectivo. Em Doppler apresentam vascularização com ramificação a partir do hilo,
e geralmente os vasos são escassamente
visíveis na cortical. Espessamentos ligeiros
e uniformes são mais frequentemente reaccionais.
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A
C
B
D
E
Figura 19. A: ecografia de pequeno CDI com 3 mm já com biopsia. B: arpão atravessando a lesão na ecografia. C
e D: mamografia depois do arpão colocado, atravessando a lesão. E: radiografia da peça operatória confirmando a
excisão do tumor e referenciação da lesão com uma agulha para o serviço de anatomia patológica.
Os gânglios metastáticos podem apresentar
espessamento cortical, mais frequentemente
assimétrico, em áreas focais, por vezes mesmo com aspecto nodular, redução marcada
ou até obliteração do centro hiperecogénico, e pode o gânglio perder a sua morfologia
habitual tornando-se mais globoso. Quando
a cápsula ganglionar é ultrapassada podem
apresentar irregularidade do contorno por
vezes mesmo com evidência de massa hipoecogénica com crescimento extraganglionar (Fig. 20). No Doppler há frequentemente
fluxo detectável de forma mais exuberante
nas porções periféricas do gânglio por vezes
com vasos transcapsulares e distribuição
anárquica da vascularização (especialmente
nos gânglios maciçamente metastizados).
Na RM os gânglios patológicos podem apresentar aspectos idênticos aos referidos com
as outras técnicas (espessamento cortical,
428
obliteração do hilo), contudo a RM tem pouco poder discriminativo benigno/maligno e
consequentemente pouco valor na caracterização dos gânglios axilares neste contexto.
O estudo da axila por ecografia deve ser
sistematicamente efectuado perante um
cancro da mama, designadamente antes da
cirurgia uma vez que o conhecimento duma
axila positiva vem inviabilizar a execução
da técnica do gânglio sentinela e obriga ao
esvaziamento axilar. Perante uma ecografia axilar suspeita ou duvidosa, impõe-se a
confirmação que pode ser feita através de
citologia (FNAC) ecoguiada ou microbiopsia
(Fig. 21). A citologia tem grande acuidade no
estudo destes gânglios, devendo o citopatologista estar presente na altura da colheita
para de imediato avaliar da qualidade do
material e eventual necessidade de repetição das colheitas.
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A
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C
D
Figura 20. Aspectos de gânglios metastáticos na ecografia. A: gânglio infracentimétrico com normal morfologia mas
com perda do centro hiperreflectivo. B: gânglio com espessamento global da cortical e centro hiperecogénico reduzido a uma fina linha. C: gânglio mais globoso, de limite anterior indefinido e com massa hipoecogénica procidente
para além do gânglio traduzindo crescimento extracapsular. D: nódulo metastático na periferia de um gânglio que
na porção restante tem características normais.
Bibliografia
Figura 21. FNAC de um gânglio metastático que apresenta ligeiro espessamento uniforme da cortical. A
ponta da agulha é visível como um ponto branco na
cortical hipoecogénica.
(Parte 2) - Imagiologia da mama – Patologia maligna
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