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CASAMENTO E PACTO: UMA ANÁLISE A PARTIR DO
QUADRO DE REFERÊNCIA CRIAÇÃO, QUEDA E
REDENÇÃO
AUTOR:
JOSÉ ARISTIDES DOS SANTOS FILHO
Um curso do
Seminário Internacional de Miami
Miami International Seminary
14401 Old Cutler Road
Miami, FL 33158
E-mail: [email protected]
Website: www.MINTS.edu
Itaporanga D’ajuda - SE
2014
2
GUIA DO ESTUDANTE E DO FACILITADOR
Sejam muito bem vindos ao curso Casamento e pacto: Uma análise a partir do
Quadro de Referência: Criação, Queda e Redenção. Como vocês verão na introdução, esse
curso não é um modelo de aconselhamento, embora possa servir para tal. Ele é um curso que
visa dá base teológica para o aconselhamento de casais. Nele você encontrará (assim espero) o
padrão bíblico para o casamento. Encontrará especialmente que o casamento foi criado para
trazer glória ao nome de Deus e satisfação ao homem, porém o pecado estragou esse
propósito e, como pecadores, sempre damos preferência a viver o casamento para nossa
satisfação pessoal. Você verá que a obra de Cristo, traz redenção ao casamento também.
MATERIAIS PARA O CURSO

Um exemplar do livro: Reformando o Casamento: A Vida Conjugal Conforme o
Evangelho. Recife: Centro de Literatura Reformada, 2013, de Douglas Wilson, para
quem está cursando bacharelado. Para quem está cursando mestrado, além da leitura
do primeiro livro deverá também adquirir o livro: A Graça que Vem do Lar. São
Paulo: Cultura Cristã, 2002, de Susan Hunt.

Um caderno de trabalho onde escrever as tarefas

Um grupo de estudo onde participar

Estar inscrito em um dos programas teológicos da Instituição

Cumprir com todos os requisitos acadêmicos.
RESPONSABILIDADE DO ESTUDANTE

Assistir as 8 horas de conferência que dão início a matéria e as 8 horas de aulas
presenciais, em seu grupo de estudo.

Ler as 8 lições do módulo, com seus respectivos anexos, questionários e tarefas.

Para cada lição o aluno deve desenvolver em seu caderno, as tarefas respectivas e
mostrá-las ao facilitador.

Preparar e expor um tema de uma das lições em seu grupo de estudo, durante 20-30
minutos.

Preparar e apresentar um trabalho escrito, considerando todas as normas para a
apresentação de trabalhos do MINTS, sobre o pacto e o casamento. Deve ter como
3
base para este trabalho, a leitura do módulo e dos livros acima designados.
Bacharelado: 5-7 páginas. Mestrado: 12-15 páginas.

Apresentar um exame final escrito do conteúdo do curso.

Elaborar uma ficha de leitura sobre um dos livros lidos conforme modelo do MINTS.
AVALIAÇÃO DA MATÉRIA

Assistir as 8 horas de conferência e as 8 horas de aulas presenciais (10%).

Ler e desenvolver as 8 lições do livro com suas tarefas (20%). Todos os questionários
devem ser desenvolvidos.

Apresentação da ficha de leitura (10%). Cada semana o facilitador deverá revisar o
cumprimento no desenvolvimento das tarefas.

Preparação e exposição do tema de uma lição durante 30 minutos (10%). O facilitador
nomeará cada estudante, expor o tema de uma lição.

Análise escrita sobre o pacto e o casamento (30%). Cada estudante, no começo do
curso, deve definir o tema a desenvolver em seu exame.

Apresentar um exame final escrito dos conteúdos do curso (20%). Na quarta aula, o
facilitador entregará ao estudante um exame escrito para desenvolvê-lo em 45
minutos.
ESTRUTURA DO CURSO
AULA 1

Capítulos 1 e 2 do módulo

Para estudantes do bacharelado: leitura do livro Reformando o Casamento das páginas
1 a 54.

Para estudantes do mestrado: leitura do livro Reformando o Casamento das páginas 1
a 54, e leitura do livro: A graça que vem do lar das páginas 1 a 57 (Introdução e
capítulos 1 e 2).

Questionários dos capítulos 1 e 2 do módulo respondido

Exposições de 25% dos estudantes do grupo.
AULA 2:

Capítulos 3 e 4 do módulo
4

Para estudantes do bacharelado: leitura do livro Reformando o Casamento das páginas
55 a 103.

Para estudantes do mestrado: leitura do livro Reformando o Casamento das páginas 55
a 103, e leitura do livro: A graça que vem do lar das páginas 58 a 114 (Capítulos 3 a
5).

Questionários dos capítulos 3 e 4 do módulo respondido

Exposições de mais 25% dos estudantes do grupo (Total 50%)
AULA 3:

Capítulos 5 e 6 do módulo

Para estudantes do bacharelado: leitura do livro Reformando o Casamento das páginas
105 a 152.

Para estudantes do mestrado: leitura do livro O que você esperava? Reformando o
Casamento das páginas 105 a 152, e leitura do livro: A graça que vem do lar das
páginas 115 a 164 (Capítulos 6 e 8).

Questionários dos capítulos 5 e 6 do módulo respondido

Exposições de mais 25% dos estudantes do grupo. (Total 75%).
AULA 4:

Capítulos 7 e 8 do módulo

Para estudantes do bacharelado: confecção do trabalho escrito.

Para estudantes do mestrado: leitura do livro: A graça que vem do lar das páginas 165
a 208 (Capítulos 9-10 e Conclusão) e confecção do trabalho escrito.

Questionários dos capítulos 7 e 8 do módulo respondido

Exposições de mais 25% dos estudantes do grupo. (Total 100%).

Apresentação do exame final e entrega de trabalhos finais do curso.
ESTRUTURA DA AULA

Oração inicial e boas vindas (3 minutos)

Chamada (2 minutos)

Introdução ao tema da aula (20 minutos)

Esclarecer dúvidas dos estudantes a respeito das leituras e tarefas (25 minutos)

Apresentação de resumos da semana e exposição (50 minutos)
5

Assinalação para próxima aula (20 minutos)

Oração e despedida (10 minutos). Dedicar um bom tempo para orar uns com os outros.
NÃO ESQUEÇA

Na quarta aula deve entregar seu trabalho final.

Todos os estudantes devem entregar a ficha de leitura do livro designado.

Os coordenadores são orientados a primar pelos acordos que fazem com os alunos. Os
alunos que, por exemplo, não apresentarem os seus temas nos dias designados, podem
ter as suas notas diminuídas pelo coordenador.

Nenhum aluno pode ser aprovado no módulo se não fizer o exame e não entregar o
trabalho escrito final.
6
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO.......................................................................................................................08
Lição 1. A suficiência das Escrituras por um prato de lentilhas: a troca da Escritura pela
psicologia no Aconselhamento de casais ..............................................................................13
1.1. Conceitos psicológicos ............................................................................................15
1.1.1. O problema desfocado – minimizando o pecado ..........................................17
1.1.2. Falsa Redenção ..............................................................................................21
1.1.3. Vitimização ....................................................................................................23
Lição 2. Conceitos bíblicos: abrangentes e teorreferentes – o que o conselheiro traz como
pressuposto para o aconselhamento de casais? ...................................................................28
1.2.1. O homem na criação - Santidade e com responsabilidade ante Deus ...........29
1.2.2. Fonte de entendimento e ponto de partida para a redenção dos problemas
humanos ..............................................................................................................................31
1.2.3. O problema humano e sua redenção ..............................................................32
Lição 3. O propósito de Deus para o casamento (CRIAÇÃO) ...........................................35
3.1. As Circunstâncias da Celebração ............................................................................39
3.1.1. Circunstâncias ambientais perfeitas ..............................................................39
3.1.2. Circunstâncias sociais perfeitas .....................................................................40
3.1.3. Circunstâncias morais perfeitas .....................................................................42
3.1.4. Circunstâncias espirituais perfeitas ...............................................................43
3.1.5. Obediência: A condição estabelecida ............................................................44
Lição 4. Casamento e pacto – o homem um ser pactual (teorreferência) .........................45
3.2.1. Expressar o amor e a bondade do Criador .....................................................47
3.2.2. Expressar comunhão com o Criador ..............................................................48
3.2.3. Expressar culto e adoração ao Criador ..........................................................49
3.2.4. Um Propósito mais abrangente: Glorificar a Deus ........................................51
Capítulo 5. Obstáculos ao propósito do casamento (QUEDA) ..........................................54
5.1. Pacto e Idolatria: circunstâncias, propósito e pacto revertidos ................................56
5.1.1. Propósito corrompido: começa a luta pelo poder ..........................................57
5.1.2. Autonomia e egorreferência - a incapacidade de servir aos propósitos de
Deus..........................................................................................................................................59
5.1.3. Deus versus ídolos: a perda do referencial ....................................................62
Capítulo 6. Teorreferência negativa no..............................................................64
7
6.1. Estabelecendo nosso próprio reino – o engano do coração ..............................65
6.2. Reino e as circunstâncias: meu cônjuge existe para minha felicidade? ...........67
6.3. Reino e o merecimento do cônjuge ..................................................................69
Capítulo 7. Restaurando o propósito de Deus para o casamento (REDENÇÃO) ............73
7.1. Redenção em Cristo . ...............................................................................................74
4.1.1. A Justificação pela Fé e o Casamento ...........................................................77
4.1.2. Encontrando propósito do casamento em Cristo ...........................................78
Capítulo 8. A obra de Cristo Aplicada e o Casamento ..............................................81
8.1. Perdoados e perdoando .....................................................................................81
8.2. Somos pecadores, por isso, precisamos da graça e perdão de Deus .................87
8.3. O cônjuge também é pecador, por isso precisa da graça e perdão de Deus .....88
CONCLUSÃO ........................................................................................................................91
REFERÊNCIAS .....................................................................................................................93
8
INTRODUÇÃO
O governo brasileiro sancionou uma nova lei, em Julho de 2010, na verdade uma
emenda constitucional, a 66, que desobriga os casais de entrarem com um processo de
separação para depois solicitarem o processo de divórcio.
O que era mais difícil, o divórcio, se tornou mais fácil.
O principal responsável pela mudança que acelerou o pedido de divórcio é o Instituto
Brasileiro de Direito de Família (Ibdfam). Seu presidente, Rodrigo da Cunha Pereira, diz que
as mudanças seguem uma tendência de menor intervenção do Estado na vida do cidadão, e
que os contrários à aprovação adotam um discurso moralista “perigoso”. Para ele, a separação
judicial é um instituto anacrônico, sustentado por um discurso religioso. O pleito do Instituto
Brasileiro de Direito da Família, é que as pessoas possam se divorciar com mais facilidade.
As alegadas razões para isso, diz um artigo na internet 1, são: a menor intervenção do
Estado na vida do cidadão (individualismo) e, a economia que gerará para o governo (visto
que não terão muitos processos). Registra-se uma troca da familia, instituida por Deus, pelo
individualismo e pelo dinheiro, pela economia.
Não é sem razão que o divórcio tem aumentado no Brasil. A razão é que as familias
estão estabelecendo-se em princípios da psicologia ou da sociologia, meramente humanos
como compatibilidade, finanças, e, talvez de forma mais especial, fundamentada na busca da
felicidade pessoal. Fazendo desse último um projeto inalienável.
Não é nada novo entretanto. O dr. Wadislau Gomes diz que “a crise da familia não é
de hoje. Parece nova, mas a verdade é que o processo de distância entre homens e Deus se
adapta ao tempo. Cada vez a distância é maior para o ser humano”.2
A pressão social sobre a familia é difícil de ser exagerada. O foco em carreiras
profissionais; o materialismo; o movimento feminista com a sua forte depreciação da mulher;
as constantes investidas do governo na promoção do homossexualismo e da familia
alternativa; a promoção da imoralidade por parte da mídia, são algumas das investidas que
tem trazido desorganização, falta de compromisso, pobreza de relacionamento e divórcio nas
famílias.
O perigo vem de vermos a familia como uma instituição meramente social.
1
2
http://www.conjur.com.br/2010-jul-17/lei-divorcio-acaba-possibilidade-separacao-judicial
GOMES, Wadislau Martins. Força para a Família na Crise Moderna. Brasília: Refúgio, 1995, p. 13.
9
Por outro lado, temos um esforço para fazer a familia “funcionar”. Livros estão sendo
escritos com o propósito de ajudar casais a manusearem suas dificuldades e sairem das
frequentes crises que se impõem sobre o casamento.
Como nada é feito desprovido de pressupostos subjacentes esses livros parecem trazer
uma teologia defeituosa de que com o entendimento básico de algumas técnicas de
comunicação, de resolução de conflitos, de troca de favores, de satisfação de necessidades3,
entre outros tantos temas – teremos uma familia feliz e bem estruturada.
O que temos por trás disso, em função da queda, é uma vida orientada para a idolatria,
uma vida centrada no próprio eu rebelde, ao invés de uma existência para a glória de Deus e
ainda, um defeituoso entendimento de doutrinas bíblicas essenciais ou, ainda pior, o total
desconhecimento delas. Um entendimento de que podemos, por nós próprios, alcançar um
padrão de felicidade. Assim, não temos necessidade de um Salvador, de um Redentor.
Podemos conseguir dentro de nós próprios a força que precisamos para soerguermos
casamentos e relacionamentos destruídos. Nesse caso, o nosso relacionamento é apenas no
nível humano.
Fomos criados por Deus para nos satisfazermos nele e só nele. Como pecadores,
entretanto, temos uma tendência a buscar essa felicidade em outra fonte que não o Senhor.
Fabiano Oliveira nos alerta para o fato de que
“A queda do homem no pecado não anulou este estado de coisas (o fato de que fomos
criados para nos relacionarmos com Deus), mas alterou o funcionamento da dinâmica interna
do seu coração, imprimindo-lhe uma direção apóstata. Se antes da queda o coração humano era
religiosamente qualificado pelo ser-para-Deus em amor e obediência, após a queda o coração
passou a ser religiosamente qualificado pelo ser-para-Deus em apostasia e rebelião, o que pode
ser dito de outra forma: ser-para-um-ídolo4.
Assim, permanece a estrutura, mas a direção está mudada. Não pensamos em outra
coisa, e essa tal felicidade, seja lá o que for isso, acaba sendo buscada num ídolo funcional.
Esse curso do Seminário Internacional de Miami visa mostrar que precisamos corrigir
a nossa visão sobre casamento e familia. O pensamento que domina esse trabalho é que Deus
instituiu o casamento para a sua própria glória e secundariamente, enquanto cumprimos esse
3
Dois exemplos sobre esse assunto são os livros de Larry Crabb sobre família e os livros de CHAPMAN, Gary
As Cinco Linguagens do Amor, Mundo Cristão, 1997. Esse último tem vários livros similares destinados a
adolescentes, crianças, solteiros, etc. Os pressupostos básicos desses autores é que se eu fizer algo para suprir as
necessidades do meu cônjuge, ele ou ela, fará algo para suprir as minhas. Assim, caminhamos em busca de
satisfazer as nossas necessidades manipulando os outros. Não negamos entretanto, que os livros tenham pontos
importantes e que precisam de fato ser assimilados e praticados pelas famílias. No entanto, os pressupostos onde
eles constroem são defeituosos, e claro, todo o edifício se torna defeituoso.
4
OLIVEIRA, Fabiano de Almeida. Reflexões críticas sobre Weltanschauung: uma análise do processo de
formação e compartilhamento de cosmovisões numa perspectiva teo-referente. Fides Reformata, v. XIII, n. 1,
2008.
10
primeiro propósito, sermos também felizes ao modo de Deus. Isso, como veremos mais
adiante está no pacto da criação.
O ensino bíblico acerca do pacto de Deus com o Seu povo nos mostra que essa
verdade deve ser vivida em todos os âmbitos e aspectos da nossa vida. Ela não é apenas uma
teoria relegada a admiração, mas que não tem implicações práticas.
Esse curso, devemos ter em mente logo de início, não trata necessariamente de um
método de aconselhamento, mas de pressupostos teológicos que devem nortear o nosso
aconselhamento. As leituras assignadas para os estudantes mostrarão como usar o material
para o tão necessário aconselhamento de casais. Assim esperamos.
De onde vêm os nossos problemas? Por que marido e mulher têm conflitos, e mesmo
com alguns esforços próprios não conseguem uma mudança que seja permanente? Por que
não entendemos o agir de nosso cônjuge? E mais: Qual o propósito para o qual Deus criou o
casamento? Para a nossa felicidade apenas? Ou para sua própria glória? Qual dos dois
objetivos deve ser perseguido por nós primordialmente? Existe como conciliar os dois? Não
devemos evitar a verdade de que Deus ao instituir o casamento, visava o bem e a felicidade do
homem. Nem, muito menos, devemos colocar interrogações no fato de que a vontade do
Criador é que suas criaturas se deleitem com a criação. Defenderemos que o Criador tinha um
propósito para o casamento: a Sua própria glória, e que essa busca por parte dos portadores da
sua imagem, irá redundar em sua própria felicidade e satisfação. Apenas buscando a glória de
Deus no seu casamento, é que os homens poderão encontrar a verdadeira felicidade. Isso está
posto na primeira pergunta e resposta do Breve Catecismo de Westminster. A pergunta: “Qual
é o fim principal do homem?” A resposta: O fim principal do homem é glorificar a Deus, e
gozá-lo para sempre.
Assim, desenvolveremos um esboço para a concretização dessa empreitada. O
primeiro capítulo contém uma análise bíblica de alguns segmentos da psicologia, das suas
teorias e métodos de como encontrar a felicidade. Em alguns desses segmentos encontraremos
“momentos de verdade”, mas também, encontraremos elementos negativos. Dado que
vivemos numa sociedade psicologizada, faz-se necessário fazermos aqui um contraponto com
a cosmovisão cristã. Não se trata de condenar tudo o que advogam as diversas escolas de
psicologia, mas de analisarmos o que é incompatível com a fé cristã.
No segundo capítulo teremos uma análise da visão cristã a respeito do homem. A
antropologia cristã trará contrapontos e, em algumas ocasiões uma cosmovisão
completamente diferente da esposada pela psicologia.
11
No terceiro capitulo, depois dos assuntos basilares e preliminares dos primeiros,
discutiremos de forma mais específica o casamento dentro do pacto. Usaremos para esse fim o
quadro de referência Criação-Queda-Redenção5. Assim nos capítulos três e quatro veremos o
aspecto da criação. Veremos que Deus criou todas as coisas perfeitas. E, ao criar o homem fez
um pacto com ele que atinge todas as gerações, porquanto Adão era o representante da raça
humana. Nele, Deus expressa a vontade de que o homem ande com ele. O matrimônio é uma
dádiva do Criador a todo gênero humano e não apenas aos crentes. Como um ser pactual, nos
diz Susan Hunt, todas as esferas da vida humana devem ser enxergadas sob a ótica do
relacionamento amoroso e misericordioso do Criador com as suas criaturas6. O propósito do
casamento era a glória de Deus7. Era e continua sendo.
Os quinto e sexto capítulos investigam como a desobediência do homem afeta esse
propósito. Com a queda ficou subvertida a “nossa habilidade de entender o mundo sem a
graça regeneradora de Deus”8. Obviamente isso se aplica ao casamento. A partir da queda nos
tornamos idólatras. Perdemos o referencial. E começamos a desintegrar a família porque
queremos estabelecer o nosso próprio reino. Começamos a idolatrar algumas coisas. A
idolatria é quando estou tentando suprir uma necessidade que acho que não podem suprir.
Gomes diz que escolhemos um ídolo, seja ele qual for, como forma de redenção sem Deus.9
Por fim, completando o quadro de referência, consideramos nos sétimo e oitavo
capítulos, o aspecto da redenção. Assim, como em todas as áreas, abrangentemente a redenção
está em Cristo. Nesse ponto somos instados a analisar o nosso casamento e família a partir da
redenção em Cristo. “...nada nem ninguém, nem (nós mesmos) pode suprir as nossas
necessidades, senão Deus”. Cristo é, segundo Paulo, em Efésios 5.21-33, o modelo do
casamento. No último capítulo, mostramos como encontramos propósito para o casamento em
Cristo, o segundo Adão, que cumpre o pacto integralmente. Com alguns exemplos práticos
faremos uma breve aplicação de tudo o que é discutido nesse trabalho. Com isso, queremos
mostrar que na Bíblia, encontramos os recursos que precisamos para um casamento para a
glória de Deus.
5
Esse quadro de referência bíblico serve para mostrar que nada está fora das categorias bíblicas, bem como nos
dá uma estrutura para pensarmos a vida em todos os seus compartimentos. Ele nos revela que Deus, como
realidade última e auto-existente criou o mundo para a Sua glória. Deus criou tudo perfeito. Mas, a queda do
homem em pecado danificou a criação de Deus. E esse dano, faz com que o homem absolutize algum aspecto da
criação e o torne seu deus funcional. Apesar de todas as tentativas de redenção humana, apenas em Jesus Cristo
somos redimidos. Esse quadro, como dito acima serve para nos orientar.
6
HUNT, Susan. A Graça que Vem do Lar. São Paulo: Cultura Cristã, 2002, pg. 12.
7
PIPER, John. Casamento Temporário. São Paulo: Cultura Cristã, 2011, pg. 22.
8
PEARCEY, Nancy. Verdade Absoluta – Libertando o Cristianismo de seu Cativeiro Cultural, CPAD, Rio de
Janeiro, 2006, pg. 50.
9
GOMES, Wadislau Martins. Força para a Família na Crise Moderna. Brasília: Refúgio, 1995, pg. 41.
12
Hunt nos diz que o casamento é, na realidade, uma questão de teologia10. Nele deve
está refletida a glória do Criador. O que temos de decidir é se somos bons ou maus teólogos.
Para a consecução desse trabalho, lançaremos mão do método da pesquisa
bibliográfica analisando criticamente o que é esposado pelos autores.
Um último detalhe: o aluno atento perceberá que as lições desse módulo foram escritas
em pares. As duas primeiras lições nos apresentam o assunto do aconselhamento
introdutoriamente. As lições 3 e 4 nos trabalham o propósito do casamento na criação. As
lições 5 e 6 exploram como a queda afeta o casamento. E as lições 7 e 8 abordam a redenção
do casamento em Cristo. Percebendo isso, o estudante estará em melhores condições de
entender o material.
Que o Deus do pacto, na sua misericórdia nos abençoe de forma que possamos ser
fiéis em vivermos nossos casamentos para a Sua glória.
10
HUNT, Susan. A Graça que vem do Lar. São Paulo: Cultura Cristã, 2002, p. 15. Ver também HARVEY,
Dave. Quando Pecadores Dizem Sim. São Bernardo do Campo: Fiel, 2007.
13
LIÇÃO 1: A SUFICIÊNCIA DAS ESCRITURAS POR UM PRATO DE
LENTILHAS:
A
TROCA
DA
ESCRITURA
PELA
PSICOLOGIA
NO
ACONSELHAMENTO DE CASAIS
INTRODUÇÃO:
O uso da psicologia no aconselhamento é amplamente discutido no meio evangélico.
A acirrada discussão é quanto ao uso ou não desse campo do conhecimento no
aconselhamento pastoral. A grande maioria a abraça de forma servil. Crêem que pastores,
família, amigos e a igreja têm um papel importante na vida das pessoas, mas se essas tiverem
um problema psicológico “de verdade”, devem ser, sem demora, encaminhados a um
especialista. Assim, Ruthe Reinhold conclui:
Os cristãos procuram auxílio de médicos, para todo tipo de doença física e
emocional. Eles se beneficiam dos conhecimentos científicos que não têm menção
nenhuma na Bíblia. Sem grandes reflexões e questionamentos eles incorporam em
seu dia-a-dia as descobertas da ciência e os avanços da tecnologia: aviões, imprensa,
telecomunicações, etc. Por que só a Psicologia e a Psicoterapia são excluídas? Por
que deveria ser inaceitável as descobertas nas áreas de Psicoterapia, Psicologia,
Psiquiatria.11
Indo além os cristãos seriam, numa ilustração simples, como um grupo de apoio no
meio de uma corrida. Se alguém está com sede, os cristãos entram em cena, distribuindo
copos d’água e fazendo a sua parte. Mas se alguém quebra o braço, por exemplo, chame um
ortopedista. Nesse caso oferecemos encorajamento, mas se o problema é mais sério então
“um especialista altamente treinado, como um psicoterapeuta ou psiquiatra” 12 deve ser
imediatamente acionado.
Do outro lado da discussão temos os que desprezam completamente a psicologia e
seus sistemas. Este grupo – acertadamente em algumas ocasiões, mas também
equivocadamente em outras – denuncia os erros e os pressupostos incompatíveis com a fé
cristã. Algumas vezes, “a retórica inflamatória vem disfarçada de intrépida denúncia do
erro”13, algo que certamente devemos evitar, ainda que nos seja custoso. Porém, a denúncia
deve sempre ser feita, a fim de que não incorramos numa síntese entre o pensamento bíblico e
o pensamento da Psicologia, onde estes se mostrarem opostos.
11
REINHOLD, Ruthe. Prática do Aconselhamento Terapêutico. Curitiba: Luz e Vida, 2000, p.12.
CRABB, Larry. ALLENDER, Dan. Esperança do Sofrimento. São Paulo: Sepal, 2ª. Ed., 2000, p. 111.
13
CRABB, Larry. Como Compreender as Pessoas: Fundamentos Bíblicos e Psicológicos para Desenvolver
Relacionamentos Saudáveis. São Paulo: Vida, 2001, p. 13.
12
14
Devemos lembrar “...que pressupõe-se que exista uma ideologia no início de qualquer
pensamento psicológico: a propósito, a história mostra que não há uma psicologia sem
pressupostos”14.
Nesse ponto é bom lembrar que o maior erro que cometemos é quando tentamos
encontrar equivalentes bíblicos para expressões psicológicas 15, lendo as Escrituras com os
óculos da psicologia. Ao contrário, para nos resguardarmos adequadamente, devemos ler a
psicologia com os óculos das Escrituras. E levar em mente que “a Escritura é a única
escrutinadora das observações e formuladora de ajuda. Ela não pretende ser terapêutica, ainda
que num sentido abrangente, o seja; pretende sim, ser redentiva, promovendo não a solução
dos problemas, mas o conhecimento de Deus que justifica e santifica com resultados de
transformação e cura”16. Assim, a nossa crítica à psicologia deve ser biblicamente embasada e
com a maior justiça possível. Lembrando que “as observações da psicologia podem ajudar
muito no preparo do conselheiro e na condução do processo de aconselhamento, conquanto
seja resguardada a soberania da fé revelada na Escritura...”17.
Levando isso em conta, atentemos para o fato de que a psicologia tem problemas nas
áreas da ontologia, ética, epistemologia e teleologia (e muito mais!). Para a psicologia (e
outras ramos da ciência) o homem não é o ser criado à imagem e semelhança de Deus, mas
um ser que se pretende autônomo. Não deve prestar contas a ninguém do que faz, porquanto é
padrão para si mesmo. O conhecimento que deriva do homem exclui Deus também como
aquele que revela na Sua Palavra quem é o homem que Ele criou. O conhecimento de quem é
o homem da psicologia é derivado basicamente de revelações feitas pelo próprio homem e da
observação do seu comportamento, ao invés de baseada na revelação de Deus sobre o homem.
E, finalmente, teleologicamente a finalidade do homem, para a psicologia é a autorrealização.
Assim, as psicologias têm visões diferentes e antagônicas às do cristianismo para cada
assunto citado. E, como assinalado acima, sem referência a Deus. Acertam em algumas as
observações, porém pecam nos seus pressupostos. O Dr. Davi Charles Gomes destaca que...
A despeito de uma vasta gama de ênfases e paradigmas distintos no universo da
psicologia moderna desde a época de Freud, o lastro comum a todos os seus construtos
preserva, de uma forma ou de outra, pelo menos três pressupostos que, mesmo
ostensivamente repudiados por alguns, permanecem centrais à sua superestrutura básica: (1)
determinismo (quer metodológico, quer empírico ou mesmo metafísico), (2) materialismo
14
CENCINI, Amadeo. MANENTI, Alessandro. Psicologia e Formação: Estruturas e Dinamismo. São Paulo:
Paulinas, 2ª. Ed., 1988. p. 129.
15
GOMES, Wadislau Martins. Nota de classe no Centro de Pós-graduação Andrew Jumper, Abril de 2011.
16
Idem. Coração e Sexualidade. Brasília: Refúgio, 1999, pp. 17 e 18. Ênfase do autor.
17
Idem. Aconselhamento Bíblico Redentivo. São Paulo: Cultura Cristã, 2004, pg. 9.
15
monista, e (3) confirmabilidade intersubjetiva. Essas três categorias pressuposicionais
excluem de princípio a posição cristã18.
Por essa razão, precisamos das Escrituras no aconselhamento de casais. Precisamos
dela como guia, guardiã e bússola. Guia quando nos tem algo a dizer diretamente. Guardiã
quando algum assunto não é claramente definido, nos advertindo sobre os maus e bons
caminhos de qualquer assunto, incluso a psicologia. Bússola quando indica qual a direção a
seguir19.
Talvez seja importante assinalar aqui que não estamos falando de pessoas, de cada
psicólogo ou psiquiatra individualmente, mas estamos falando do sistema – ou sistemas – de
pensamentos, de pressupostos como assinalado acima. Estamos fazendo uma análise tendo
como referencial as Escrituras Sagradas. Não cremos que todos os psicólogos são ateus, nem
que vão, de forma consciente e proposital, prejudicar a fé cristã, mas percebemos que os seus
pressupostos são, sim, negativamente teorreferentes.
Assim, analisemos os conceitos psicológicos acerca do homem e conseqüentemente do
casamento.
1.1. CONCEITOS PSICOLÓGICOS
Todos os sistemas têm as suas crenças. Cada sistema de aconselhamento tem seu
conjunto de crenças e valores que moldam o seu trabalho com os seus pacientes. É a partir
desse conjunto que abordamos aqueles que nos procuram em busca de ajuda.
Freud, por exemplo, influenciado pela ideia feuerbachiana de que Deus não passa da
projeção de um desejo, cria que a religião era uma forma distorcida de neurose 20. A religião
para Freud nada mais é “do que uma resposta imatura à consciência da impotência”21.
O dr. Davi Charles Gomes analisando as raízes religiosas do movimento psicoterápico,
nos mostra que Freud e Skinner, entre outros pensadores “teorizam quanto à psicologia
humana como uma percepção aguçada da antítese intrínseca entre a fé cristã e os seus
sistemas – tendo em comum a certeza de que a psicologia deveria finalmente, suplantar a
18
GOMES, Davi Charles. A metafísica Vantiliana: Uma incursão Preliminar. In: Fides Reformata XI, n°. 1
(2006), pg. 114. Nota de rodapé 3.
19
GOMES, Wadislau Martins. Aconselhamento Bíblico Redentivo. São Paulo: Cultura Cristã, 2004, pg. 10.
20
SCHULTZ, Duane P. SCHULTZ, Sydney Ellen. História da Psicologia Moderna. Brasil: Cengage Leraning,
2ª. Edição, 2009, pp. 380-381. É bom lembrar que no início a psicanálise de Freud foi vista com maus olhos pela
“psicologia acadêmica”. Além do fato de que os americanos viam os trabalhos dos alemães com maus olhos.
Entretanto, com o passar do tempo, notadamente a partir da década de 50, a psicologia acabou incorporando os
conceitos de Freud, sendo hoje parte da psicologia contemporânea.
21
MCGRATH, Alister. Apologética Cristã no Século XXI. São Paulo: Vida, 2008, p. 183.
16
religião 22 ”´. Freud, escreve Gomes, chega a afirmar, que a fé cristã é “tão patentemente
infantil e tão estranha à realidade que, para qualquer pessoa que manifeste atitude amistosa
em relação à humanidade, é penoso pensar que a grande maioria dos mortais nunca será capaz
de superar essa visão da vida23”.
Assim, o que desejamos ressaltar é que devemos assegurar que não existe
objetividade cientifica. Não existe nada como alguém neutro, analisando dados e chegando
friamente a resultados24. Cada sistema tem as suas crenças, repito. E como cremos, todos
esses ditos sistemas estão religiosamente orientados. Todos são teorreferentes. Positiva ou
negativamente25. O termo teorreferente
é um conceito empregado por D. C. Gomes para indicar que Deus é o ponto de
referência último de toda existência tanto do homem regenerado, pelo poder do
Espírito e da Palavra de Deus, quanto do homem não-regenerado... A
teorreferência negativa, como é qualificada a existência do homem em constante
apostasia, se dá sempre como forma de emancipação em relação a Deus e rebelião
contra a sua Palavra. A teorreferência positiva indica a existência e a apreensão da
realidade no interior de um contexto de significado redentivo ou biblicamente
orientada. A teorreferência (negativa ou positiva) é a condição originária de todo
horizonte de compreensão e interpretação humanas. Isso quer dizer que a vida-nomundo será sempre encarada no interior de um campo de significado de amor ou
de rebelião contra Deus26.
Deus é o ponto de referência para todos. Não se trata de uma repulsa a qualquer coisa
que seja escrita por um não cristão. Trata-se antes, de lembrarmos que, no mundo, temos
unicamente dois tipos cosmovisões: a do não-regenerado e a do regenerado27. O primeiro, ver
o mundo a partir de uma cosmovisão em que a revelação de Deus, nas Escrituras, não é levada
em conta. Define o homem e suas relações sem referência ao Criador, definindo-o a partir de
si mesmo. O segundo tem como ponto de partida uma teorreferência positiva, biblicamente
orientada como na citação acima.
Obviamente, os pressupostos de cada teoria da psicologia e do aconselhamento têm
repercussão sobre a forma de abordagem do homem e conseqüentemente dos problemas no
casamento, já que temos aqui dois seres humanos unidos.
22
“O ponto de vista sobre a
GOMES, Davi Charles. A metafísica Vantiliana: Uma incursão Preliminar. In: Fides Reformata XI, n°. 1
(2006), pg. 115.
23
Ibid., p. 114.
24
EDGAR, William. Razões do Coração: Reconquistando a Persuasão Cristã. Brasília: Refúgio, 2000, p. 93ss.
25
O termo teo-referente foi apresentado a mim pelo rev. Fabiano Almeida, professor do Centro de PósGraduação Andrew Jumper.
26
OLIVEIRA, Fabiano de Almeida. Reflexões Críticas sobre Weltanschauung: Uma Análise do Processo de
Formação e Compartilhamento de Cosmovisões numa Perspectiva Teo-Referente. Artigo distribuído em sala de
aula, em Agosto de 2008. Nota de Rodapé nº. 1.
27
GOMES, Wadislau Martins. Nota de classe no Centro de Pós-graduação Andrew Jumper, Abril de 2011.
17
motivação humana estabelece cada detalhe das teorias e da prática”28. E, as teorias definem os
vários problemas do ser humano, como sendo predisposição genética, impulsos reforçados
por estímulos de recompensa, co-dependência, auto-estima ou sentimento de inferioridade,
combinação astral desfavorável, demônios, etc. E, óbvio, para cada uma delas uma solução:
tomar medicação, expulsão de demônios, se resguardar em dias astrais desfavoráveis, etc.
Falando especificamente da psicologia, alguns dos mais conhecidos e propagados
autores e suas teorias de aconselhamento estão negativamente voltados para Deus. Eles estão
nos seus fundamentos religiosamente orientados. Nesse caso, numa teorreferência negativa.
É importante falarmos sobre isso, porque os casais nos procuram com uma enorme
carga psicológica, porquanto vivemos numa sociedade “psicologizada”. Não podemos ignorála nem atacá-la sem bases. Para construir um sistema de aconselhamento de casais,
precisamos lidar com a psicologia.
Na expectativa de ajudar as pessoas, precisamos entender como elas pensam para
procurar ajudá-la, apresentando-lhes à verdade eterna de Deus, e à obra transformadora de
Cristo.
1.1.1. O problema desfocado – minimizando o pecado
Vale lembrar antes que “psicólogos incrédulos não puderam evitar a constatação de
aspectos da glória divina plasmada no ser humano. Cada gênio da psicologia viu algo da luz
de Deus refletida no homem, mas nenhum deles pode ver, do seu ponto de vista, a totalidade
do homem em referência a Deus”29. O que, em última análise, caracteriza as psicologias como
reducionistas. Conquanto, os psicólogos tenham ajudado a desvendar muitos “mistérios” da
mente humana, e desenvolvido várias técnicas e explicações adequadas para os problemas
humanos por meio da observação, suas soluções são uma indicação do quanto o homem
natural é movido para viver sem Deus no mundo30.
Há que haver um diálogo, mas não pode haver uma assimilação irrestrita de tudo
quanto é ensinado pelas psicologias.
Vejamos um resumo dos pressupostos de alguns dos mais famosos e celebrados
homens da psicologia:
28
POWLISON, David. Perguntas Raio-X: Descobrindo os porquês e os motivos do comportamento humano.
In: Coletâneas de Aconselhamento Bíblico, vol. I, Atibaia: SBPV, 2004, p. 3.
29
GOMES, Wadislau Martins. Quem venceria uma luta entre o super-homem e o super-mouse? Acessado em:
30
No livro A árvore da Cura: Modelos de Aconselhamento e de Psicoterapia. São Paulo: Vida Nova, 1995. 487
pp., Roger F. Hurding, faz uma análise histórica e metodológica, bem como uma avaliação de cada uma das
correntes psicológicas bem como dos principais proponentes do aconselhamento cristão, incluindo nomes como
os de Jay Adams, Larry Crabb e outros. Com justiça ele analisa todas essas correntes.
18
a) Sigmund Freud – Freud vê o homem como um animal com impulso e fala de dois
impulsos básicos procurando satisfação: a) o impulso do prazer sexual e, b) o impulso para o
poder e a destruição. Negá-los traz problemas emocionais. A cura para o problema é: descobri
a motivação que há por trás de tudo; amolecer a consciência ao ponto em que o motivo de
autogratificação se torne aceitável, e; promover autogratificação dentro dos limites da
realidade e da aceitabilidade pessoal. Assim, retira-se o peso da consciência. Na solução
proposta podemos claramente ver não há menção de Deus. Deus é extraído da vida humana
por Freud. De forma que o pecado é minimizado. Sua cosmovisão era orientada
negativamente em referência a Deus. A idéia de que temos de prestar contas a Deus não
aparece na cadeia de conceitos freudianos, e, como veremos, nem em alguns outros ramos da
psicologia.
Freud insistia, também, que a consciência é basicamente a voz implicante dos pais na
psique durante a infância31. Não negamos que isso seja influente na vida das pessoas, porém,
o cristão “prefere acrescentar que Deus está também agindo, buscando desafiar e educar a
consciência mediante seu Espírito” 32 , sem negar a responsabilidade da própria pessoa no
processo. Não somos apenas vítimas, também somos agentes.
Os freudianos entendem que o problema do homem é um problema apenas de ordem
instintiva. Ele ver o homem como um animal. Atribuem os problemas humanos aos instintos
sexuais básicos reprimidos. Para eles, o problema da pessoa está no seu passado e porque no
seu ambiente ela se tornou vítima de outras pessoas.
O que fazem os freudianos para solucionar os problemas das pessoas? A cura vem por
meio de um processo longo, onde se descobre a motivação que há por trás de cada detalhe
contado pelo paciente. Depois amolece-se a consciência do indivíduo de forma que ele possa
autogratificar-se dentro de limites aceitáveis.
Os problemas estão relacionados com restrições, com pessoas, etc. O homem é apenas
uma vítima das circunstâncias e instintos. Ele, segundo essa teoria psicológica tem referência
apenas a outros homens; um pai alcoólatra, cruel; ou a maligna sociedade, ou o que quer que
seja. E a cura também está num homem, o especialista.
O método que Freud usava – que ele chamou de psicanálise – envolvia três técnicas: associação livre (onde
não há intervenção do psicanalista, nem mesmo sugestões da parte deste), análise dos sonhos e analise dos atos
falhos (esquecimentos, lapsos de linguagem, etc). Especialmente no desenvolvimento da personalidade, Freud
insistiu que os problemas tinham, na sua maioria, origem na infância da pessoa. Isso pode ser visto nos períodos
Narcista, Edipiano, etc. Ver mais em BARROS, Célia Silva Guimarães Barros. Pontos de Psicologia Geral. São
Paulo: Àtica, 2ª. Edição, 1985, pp. 57-71.
32
HURDING, Roger F. A árvore da Cura: Modelos de Aconselhamento e de Psicoterapia. São Paulo: Vida
Nova, 1995, p. 87.
31
19
b) Psicologia do Ego – Essa escola de abordagem vê o homem como tendo um
embrião positivo à espera de desenvolvimento. Entende que uma pessoa com boa imagem e
autoconfiança pode arranjar bem sua vida, sem ter sérios conflitos. Coloca o foco sobre as
necessidades biológicas e estimula a auto-confiança. Fortaleça-se a auto-confiança e tudo
estará resolvido.
O que temos aqui? Um soberbo senso de independência sendo alimentado e celebrado.
Mais uma vez, estamos sem Deus no mundo. A psicologia do Ego nos lança para dentro de
nós mesmos como se tudo se resumisse à autoconfiança, como se tudo tivesse resposta dentro
do homem, como se tudo dependesse de nós mesmos.
Aqui está a ideia de que o homem é moralmente bom. Sem pecado. O que nos arruína
é o meio. O mal está fora de nós, não dentro de nós.
c) Carl Rogers – Para Rogers o homem também é bom. O problema do homem é o
ambiente onde ele está. Esse ambiente impede a pessoa de ser ela mesma. Porque quando se
impõe limite a uma pessoa ela deixa de ser ela mesma. Se ela for entregue a si mesma,
escolherá o melhor curso de ação e terá satisfação pessoal e harmonia. Isso levaria, em última
análise à autonomia porque desconhece ou desconsidera a pecaminosidade humana.
Hurding diz:
Podemos dizer que a afirmação de Rogers sobre o eu... afasta-se da auto-revelação
de Deus acerca da natureza humana. Por trás dos conceitos rogerianos, encontra-se a
perniciosa ideia da autonomia, de que homens e mulheres podem e devem ser completamente
senhores de si mesmos no que diz respeito aos seus destinos... Em Romanos 1, Paulo retrata
um quadro assustador da autonomia extremada, na qual a obstinação humana, ao desonrar e
rejeitar o Criador, leva os homens a ser abandonados por Deus e os conduz à perda final da
verdadeira natureza humana. Jesus, o homem perfeito, resistiu ao convite de ser autônomo
em cada uma das três tentações do deserto, mostrando-nos definitivamente que somos as
pessoas que devemos ser quando mais dependentes do Pai.” 33
Numa coisa, entretanto, Rogers estava certo. Para ele é de extrema importância que o
homem reconheça tudo o que é. As Escrituras também nos chamam a uma auto-análise. Mas,
não a partir de mim mesmo. É aqui que precisamos nos afastar de Rogers.
Entretanto, é bom dizer que Rogers deu uma ênfase que os conselheiros bíblicos às
vezes passam por alto. Rogers estudou a fundo as emoções e, resguardada as funções de guia,
guardiã e bússola das Escrituras, acima citadas, podemos nos beneficiar de algumas das suas
descobertas nessa área, sem carregar com elas os seus pressupostos.
33
HURDING, Roger F. A árvore da Cura: Modelos de Aconselhamento e de Psicoterapia. São Paulo: Vida
Nova, 1995, p. 142.
20
d) Skinner – O homem é uma máquina! O homem é um nada, um imenso e vazio
zero. O homem é um ser totalmente controlado incapaz de fazer escolhas e portanto, sem
responsabilidade alguma. Assim, o homem não tem culpa de nada! O problema dele é o seu
ambiente que o controla e determina seu pensamento, seus sentimentos e suas ações. Para
mudar a pessoa precisa-se mudar o ambiente. A Bíblia diz que o homem é muito mais que
uma máquina e que ele tem responsabilidade sobre os seus atos. Um animal não pode
arrepender-se, ter responsabilidade, fé em Cristo, ser justificado, etc. Ele não precisa de um
redentor.
Numa coisa, Skinner tinha razão: o ambiente, (ainda que não controle, como cremos),
influencia o comportamento das pessoas. Influencia mas não determina, que fique bem
claro!34 Se o controlasse o homem poderia alegar ser uma vítima. Isso deve ser levado em
consideração pelos conselheiros cristãos reformados.
e) Existencialismo – O homem é fruto do acaso, é um acidente. O que deve fazer é
escolher um alvo para viver (qualquer um!), afinal ele é fruto do acaso. O que temos aqui,
como ponto de contato é a estrutura da criação numa direção oposta a Deus. O
existencialismo ainda que lute contra isso, não consegue se alienar totalmente da estrutura que
Deus criou35. Os psicólogos existencialistas lançam o homem em busca de um significado. A
estrutura é reconhecida, a direção é que está errada. Deus criou o homem para que encontre
significado em Cristo.
Dito simplesmente, a concepção do homem para os existencialistas se distancia da fé
cristã, porque esta assevera que o homem é criado à imagem e semelhança de Deus e não
fruto do acaso. E só encontra significado, como dito acima, em Cristo.
Crabb nos dá um bom resumo destas teorias apresentadas:
Freud disse que o homem é egoísta e deve primeiro saber disso, depois aceitá-lo
como certo. A Psicologia do Ego diz que o homem pode se fortalecer de modo que
canalize seu egoísmo de modo bem sucedido em saídas pessoal e socialmente
aceitáveis. Rogers nega qualquer medida interior e ensina que o homem está cheio
de bondade e portanto, deve soltar-se e deixar tudo aparecer. Skinner entende que
o homem não é nem bom nem mau, que é uma massa complicada de respostas que
em termos de valor intrínseco somam um imenso zero. Como o homem pode ser
controlado, deixe que os peritos (psicólogos skinnerianos) o controlem em direção
aos fins desejados pelo controlador que é, ele mesmo controlado (um circulo
vicioso ao acaso sem quebra de continuidade). Os existencialistas não sabem se o
homem é mau (Freud), bom (Rogers), ambos (Psicologos do ego) ou nada
34
Isso, entretanto, não quer dizer que aceitamos os pressupostos de Skinner. Para Skinner, como dito o homem é
uma máquina, a Bíblia o ver como imagem e semelhança de Deus. Que tem responsabilidade, portanto, perante
Ele.
35
Na teologia reformada falamos de estrutura e direção. Cremos que a estrutura criada por Deus permanece a
mesma, porém a direção por causa do pecado, foi mudada. Uma explicação mais ampla será dada mais adiante.
21
(Skinner). O homem é logicamente absurdo, mas precisa de algo além de falta de
significado racional: portanto, deixe a racionalidade para trás e cegamente se
agarre à esperança de que alguma experiência preencha o vazio 36.
Assim, todas essas teorias começam e terminam no homem. E como vimos acima,
com uma orientação teorreferente negativa, rebelde, autônoma. Essa é a fé das psicologias.
A psicologia e o aconselhamento bíblico têm algumas coisas em comum. Uma delas,
destacada nesse estudo é que os dois se ocupam do homem, como ele atua e como ele muda.
Também é importante afirmar, que não há uma uniformidade quando falamos de
psicologia. Cada uma pensa o homem com contornos diferentes. Unanimemente, porém,
proclamam a autonomia humana.
Na psicologia o homem não é teorreferente. É autônomo, ou ao menos, se pretende
autônomo. Essa concepção, conforme assinalado acima, minimiza o pecado e intenta mudar o
homem da mesma forma que o concebe, a saber, sem referência a Deus, Sua Palavra, a obra
de Cristo e a pessoa do Espírito Santo.
Crabb fala disso de forma brilhante:
“Os psicólogos (e alguns teólogos e pastores) geralmente redefinem pecado como
falta de auto-estima ou incapacidade de amar – tudo menos rebeldia moralmente maligna,
culposa. Com as costas voltadas para um conceito radicalmente bíblico de como o pecado
permeia cada fibra da personalidade humana, eles oferecem para os problemas das pessoas
soluções que não exigem a obra expiatória de Cristo na cruz. Seus esforços de solucionar
problemas sem Cristo podem ser revestidos de teorias impressionantes e apelos a pesquisas
atuais que os planos de Deus sobre como resolver os mesmos problemas parecem
irremediavelmente generalizantes e desesperadamente antiquados”37.
1.1.2. Falsa Redenção
Falando um pouco mais de Freud, devemos falar algo de positivo dele. Segundo
Ronald Clarck, um biográfo de Freud, que não era hostil em nenhum sentido à psicanálise
escreve que “Freud... era um homem ansioso por aliviar algumas das misérias do mundo...” 38.
Creio que isso pode ser dito de todas as outras escolas da psicologia. Todas as escolas fazem
tentativas a fim de melhorar as mazelas humanas.
Ed Welch afirma que os psicólogos são “clérigos seculares”. Ele escreve:
“Embora a missão educacional da psicologia continue a ser o preparo de
profissionais da ciência, o produto dos programas de formação de psicólogos tem mais a ver,
de modo geral, com clérigos. Por exemplo, todos os profissionais psicólogos ministram uma
36
CRABB, Larry. Princípios de Aconselhamento Bíblico: Atendendo às necessidades de aconselhamento
através da Igreja. Brasília:Refúgio, 2ª. Ed. 1998, p. 34 e 35.
37
CRABB, Larry. Como compreender as Pessoas. São Paulo: Vida, 1998, p. 19.
38
WEBSTER, Richard. Por que Freud Errou. São Paulo: Record, 1995, p. 276.
22
cosmovisão e um conjunto de crenças fundamentais sobre a natureza humana. As suas teorias
estão repletas de pressuposições sobre quem somos, por que fazemos o que fazemos e para
onde estamos indo. Este é o campo de atuação dos clérigos. Talvez uma descrição mais
adequada para os psicólogos clínicos pudesse ser clérigos seculares que se apresentam como
profissionais da ciência...”39
Mas, não é apenas Welch – que é psicólogo cristão – que enxerga a Psicologia como
religião. Richard Webster também o assevera40.
Isso implica, penso, que esse campo de estudo também oferece “salvação”. E, de
acordo com o que vimos acima, podemos denominar os seus esforços como falsos redentores.
Quando tratamos de estabelecer a solução para os problemas humanos, a primeira
coisa a ser feita é estabelecer o problema. Se perguntarmos à psicologia qual o problema do
homem teremos várias respostas. Dezenas e, talvez centenas delas. Algumas escolas dirão que
os seres humanos são como animais controlados por seus impulsos, ou como uma máquina
que precisa de ajustes. As respostas são muitas.
Um exemplo: digamos que alguém procure ajuda para um problema com masturbação.
Que respostas teríamos? As respostas poderiam variar entre afirmar que não há problema
nenhum nisso, porque a pessoa está exercendo uma descoberta do seu próprio corpo; ou que
precisa vasculhar o seu passado a fim de encontrar em qual tempo ele começou a fazer isso e
porque, etc. Ora, tudo isso revela cosmovisões diferentes para um mesmo problema! De
acordo com os nossos pressupostos, diagnosticaremos o problema, e obviamente,
apontaremos a solução.
O enfoque, como podemos ver no simples exemplo acima, é sempre no ser humano e
nas circunstâncias que ele está atravessando. Obviamente não estamos contra a psicologia na
sua totalidade. Entretanto, não podemos negar que, não se faz nenhuma menção ao homem
como um ser religioso.
Davi Charles Gomes nos alerta para o fato de que a psicologia pretende nos levar à
absolutização do ser humano e dar a ele falsos redentores. Ele explica que
...quando o homem (supostamente) autônomo abraça a sua “maioridade” na
modernidade pós-kantiana e progride numa cosmovisão que cada vez mais substitui a teoreferência de toda a realidade por construtos antropocêntricos, a psicologia secular se torna o
substituto da soteriologia e da teologia propriamente dita: um meio de salvação da miséria
humana, mas sem Cristo, e uma teoria da natureza e das dinâmicas do (suposto) supremo
ponto de referência para predicação, nesse caso o próprio homem. A psicologia humana se
39
WELCH, Edward. Conversa entre Vizinhos: Um diálogo entre a psicologia secular e o aconselhamento
bíblico. In: Revista Aconselhamento Bìblico, Volume 3, Atibaia: Palavra da Vida, p. 48.
40
Ver WEBSTER, Richard. Por que Freud Errou. São Paulo: Record, 1995, pp. 276-323. De forma
interessante, ele menciona como Freud equivalia para alguns a um sacerdote a quem as pessoas faziam
confissões. Essa é a posição de um psicólogo que faz asseverações que chegam a ser blasfemas acerca da pessoa
de Cristo. Ver páginas citadas acima.
23
torna então a inevitável “teologia” do pensamento secular, e ao mesmo tempo o clímax e a
conseqüência natural dos esforços do homem que se crê autônomo na reinterpretação da
realidade à sua imagem e semelhança 41.
Ora, concluímos que, se a psicologia aparece como religião e um substituto da
soteriologia, ela apresenta, como dito acima um meio de salvação, porém, com falsos
redentores.
Conforme veremos no restante desse trabalho, uma teoria que tenta encontrar a
redenção para o homem dentro do próprio homem, não é compatível nos seus pressupostos
com a revelação de Deus. Sem compreender a profundidade do pecado, mencionada
particularmente por Paulo em Romanos 1.18-3.20, mas encontrada em toda a Escritura “não
se pode encontrar um remédio verdadeiro para a condição humana... ...A psicologia moderna
não poderia ter nem o diagnóstico nem o remédio correto...”42
1.1.3. Vitimização
Outra conseqüência da sociedade psicologizada é a vitimização. Temos rótulo de
vítimas para todo tipo de situação.
Um camarada, por exemplo, que deliberadamente sai de casa para se prostituir, ou um
homem que abusa de crianças ou de sua mulher, uma mulher que é mentirosa “crônica”, um
professor que agride seus alunos são vítimas do que, no passado, fizeram com eles.
A psicologia lança a culpa na sociedade, na família.
A psicanálise freudiana”, diz Adams, “acabou virando uma expedição arqueológica
rumo ao passado em que se dá busca a outros sobre quem lançar a responsabilidade pelo
comportamento do paciente. A idéia básica consiste em descobrir como é que os outros o
danificaram. Procurando desculpar e transferir a culpa, a psicanálise é uma extensão do
problema que tenciona resolver”43
Entretanto, é bom dizer – para não corrermos o risco de sermos injustos – que as
psicologias acertam quando dizem que o ambiente, as circunstâncias, as pessoas ao nosso
redor, etc. têm repercussão sobre nós e como criamos a nossa cosmovisão pecaminosa.
Powlison afirma:
“...as pessoas com problemas vêm de famílias ou casamentos ou subculturas onde as outras pessoas envolvidas também têm problemas. As pessoas
sofrem e são vitimizadas e mal direcionadas pelas coisas destrutivas que outras
pessoas pensam, querem, temem, valorizam, sentem e fazem. Estas podem se
41
GOMES, Davi Charles. A metafísica Vantiliana: Uma incursão Preliminar. In: Fides Reformata XI, n°. 1
(2006), p. 116. Ênfase minha.
42
Ibid. p. 123.
43
ADAMS, Jay. Conselheiro Capaz. São José dos Campos: Fiel, 2008, pg. 24. Grifo meu.
24
influências ambientais sutis: formação social via modelos de atitudes e coisas assim.
Podem ser influências traumáticas: perda ou vitimização...” 44
Elas não são determinantes, entretanto. É bom que isso fique bem estabelecido. Em
Mateus 7.15-20 e Lc 6.43-45, Jesus mostra que as ações humanas provêm do seu coração. As
nossas reações revelam aquilo que está no nosso coração. Todo comportamento tem uma
razão.
As circunstâncias não ditam o que temos que fazer; cada um de nós reage de acordo
com as inclinações do coração. Creio que elas podem nos ajudar a descobrir o que há por trás
dos maus frutos. Entretanto, é bom dizer, que devemos cuidar para não colocar uma ênfase
inapropriada sobre as circunstâncias. Elas são importantes, mas não são determinantes.
Por que elas são importantes? Porque nos permitem ver mais a fundo os nossos
pecados, ao mesmo tempo em que, pela Palavra, podemos ver como deveríamos está
reagindo. Elas não põem o mau em nosso coração, ainda que nos pressionem, nos sufoquem.
Assim, revelamos o que temos no coração. É como se as circunstâncias nos “chacoalhassem”
e fizessem sair o que temos escondido45.
E não são apenas as circunstâncias ruins. Até mesmo as coisas boas que nos
acontecem podem servir para demonstrar o ídolo do meu coração. Imaginamos que se
tivéssemos em certas condições, supriríamos as nossas “necessidades”. Imaginamos que se
tivéssemos uma igreja mais envolvida com o trabalho de Deus, filhos mais obedientes, esposa
mais atenciosa, um aumento no salário, um carro do ano, etc., seríamos crentes melhores
também. Mas, circunstâncias melhores, não nos fazem pessoas melhores.
As coisas que nos acontecem sejam boas ou más revelam o que temos no coração.
Provérbios 30.7-9 nos fala disso. O autor diz ali que tanto uma circunstância boa (a riqueza)
pode levá-lo a pecar (o pecado da presunção e a autonomia rebelde) quanto uma circunstância
ruim (a pobreza) pode levá-lo ao pecado (nesse caso, ao roubo).
Neemias 9.25 e 26 nos mostra que o povo de Israel pecou mais quando estava mais
próspero.
Há um caso típico no livro de Números que demonstra como as circunstâncias apenas
revelam o que temos no coração. É o caso do relatório dos espias, relatado nos capítulos 13 e
14. Numa mesma situação, vemos o povo, que por conta do crer no coração, vê as
circunstâncias de uma forma equivocada, e sua crença é - em consonância com o que eles têm
no seu coração - a incredulidade com relação às promessas de Deus (14.3), o temor da morte,
44
45
POWLISON, David. Ídolos do Coração e Feira das Vaidades. Brasília: Refúgio, 1996. p. 34.
Ver CARLEY, Natalie. La dinâmica del Cambio Bíblico. MINTS, 2008.
25
o desejo da segurança do Egito (14.3), e o temor dos homens ao invés da confiança nos
caminhos e no poder de Deus (14.3, 11).
Os frutos, em clara concordância com o que ele crêem são a murmuração (v. 2 e 3), a
tentativa de apedrejar Moisés (v. 10) e de levantar um novo líder que fizesse o que eles
desejavam (v. 4).
Em contrapartida, Josué e Calebe, têm uma reação completamente diferente. Eles
demonstram confiança no Senhor, dizendo que Deus entregaria os gigantes nas suas mãos
(14.8 e 9); temor a Deus ao invés de temor dos homens (v. 9).
Aí está! As mesmas circunstâncias e respostas (frutos) diferentes à ela. Por que? Por
causa da crença no coração.
A psicologia comportamentista, em especial, coloca as circunstâncias como o
elemento responsável pela atitude das pessoas, e a descrevem como vítimas delas. As
Escrituras nos mostram que há uma interação entre circunstância e crença do coração, e que
essa interação trará à luz o que temos no interior. Em Mateus 15.18ss o Redentor Jesus nos
ensina também sobre isso.
Numa sociedade psicologizada como a nossa, onde os assassinos são vítimas de genes
defeituosos; os que se prostituem são mandados para clínicas para serem “tratados” dos seus
vícios sexuais; os que comem compulsivamente são igualmente tratados e desculpados; onde
ladrões e corruptos são desculpados porque seus ambientes trouxeram a eles uma série de
problemas; onde se você perde o emprego pode processar a empresa porque perdeu a autoestima pela forma como foi demitido; onde se você estiver bêbado pode responsabilizar
alguém porque não foi advertido a parar de beber; onde mocinhas que deliberadamente saem
de casa e se entregam aos vícios da bebida e da prostituição vão parar em casas de
recuperação pagas pelo governo; não há espaço para se falar de um Deus benevolente, santo e
soberano.
Concluindo podemos dizer, grosso modo, que a cosmovisão psicológica do homem é
concebida apenas no aqui e agora. Ainda que veja o homem como ser relacional, 46 é uma
cosmovisão que leva o homem a buscar em si mesmo a plena satisfação para seus anseios, ao
invés de buscar em Deus.
46
Na teologia reformada falamos sobre estrutura e direção. Os homens, mesmo em pecado, não pode fugir do
fato de que Deus criou estruturas que são mantidas mesmo depois da queda. No caso especifico que estamos
tratando, a psicologia, acertadamente vê o homem como um ser relacional, mas que busca resolver seus
problemas de forma egocêntrica, e até usando as outras pessoas para sua própria satisfação ao invés de servir às
pessoas como é o propósito de Deus. Mantém-se a estrutura, porquanto fomos criados como seres relacionais,
entretanto, muda-se a direção. O relacionamento torna-se um trampolim para satisfação própria ao invés de
servir e satisfazer-se em Deus.
26
Na base, o que temos, é o homem como a medida de todas as coisas, seja analisando o
homem a partir dos seus potenciais e conquistas, seja analisando-o a partir dos conflitos e
indagações47. Assim, separa-o de Deus, observando todas as coisas a partir dele mesmo.
É preciso dizer, em conclusão que os psicólogos querem o bem das pessoas, desejam
encontrar o núcleo do problema para então apontarem uma solução. É uma atitude louvável,
mas sem Deus, erram o alvo, embora desejem acertá-lo.
47
GOMES, Wadislau Martin. Coração e Sexualidade. Brasília: Refúgio, 1999, pg. 20.
27
QUESTIONÁRIO
1. Segundo o autor o uso da psicologia é apropriado para o aconselhamento bíblico?
2. Em quais áreas a psicologia apresenta problemas?
3. Quais são os três pressupostos básicos da psicologia?
4. O que o autor quer dizer quando diz que a Bíblia deve ser usada como guia, guardiã
e bússola?
5. Qual a concepção de Freud sobre a fé cristã?
6. O que significa dizer que todos os sistemas são religiosamente orientados?
7. Defina teorreferência negativa e positiva.
8. Como as teorias moldam (definem) os tratamentos?
9. Você concorda que as psicologias são reducionistas?
10. Relacione:
1. Freud
( ) O homem é um embrião positivo à espera de desenvolvimento
2. Skinner
( ) O homem é um acidente
3. Carl Rogers
( ) O homem é um animal com inpulso
4. Psicologia do Ego ( ) O homem é bom, seu problema é o ambiente
5. Existencialismo
( ) O homem é uma mera máquina.
11. Como a psicologia minimiza o pecado?
12. Por que a psicologia é uma espécie de religião?
13. Como a psicologia oferece falsa redenção?
14. O ambiente determina ou apenas influencia a pessoa? Justifique.
28
LIÇÃO
2
–
CONCEITOS
BÍBLICOS:
ABRANGENTES
E
TEORREFERENTES – O QUE O CONSELHEIRO TRAZ COMO PRESSUPOSTO
PARA O ACONSELHAMENTO DE CASAIS?
INTRODUÇÃO
David Powlison examina a história de como a igreja vendeu a sua primogenitura por
um prato de lentilhas à psicologia. Acertadamente, ele entende que em algum ponto a igreja
falhou em considerar mais adequadamente os motivos subjacentes ao comportamento. E,
conclui, a igreja estava fraca onde a psicologia era forte. Então, por conta disso, houve uma
integração entre as duas, mas com um problema.
Os psicoterapeutas cristãos procuraram corrigir a fraqueza da igreja com o auxílio
das psicoterapias. Mas o processo de conversão tem seguido um caminho errado. Em vez de
exibir a visão bíblica da pessoa, primeiro à igreja e depois, aos psicólogos, os integracionistas
importaram a visão secular para dentro do cristianismo. Teoria de personalidade,
psicopatologia, saúde e mudança terapêutica têm substituído a antropologia bíblica, pecado,
graça, santidade e santificação. A autoridade cultural, social e pragmática da psicologia se
provou muito forte. A verdade bíblica pareceu insuficientemente aplicável. 48
O sistema de aconselhamento cristão precisa levar em conta as Escrituras Sagradas e
que o Deus por ela revelado, se relaciona com o homem na pessoa de Jesus Cristo.
Para o conselheiro cristão, a Palavra de Deus deve ser mais que uma rede de opções
interpretativas para a aceitação ou negação das declarações psicológicas; a Bíblia é o
instrumento prático do qual o conselheiro deriva sua autoridade funcional e final, sendo
aceito como a autoridade determinativa em antropologia. As Escrituras servem como a única
fonte confiável para a terminologia do diagnóstico e do remédio usados pelo conselheiro
cristão. A Palavra de Deus possui o sistema teórico exclusivo por meio do qual os problemas
da alma podem ser apropriadamente interpretados e resolvidos. Mais importante ainda, ela
declara possuir autoridade exclusiva em defender a significância e propósito para a vida do
ser humano. Quando colocada em justaposição com o conselho do homem, a superioridade e
abrangência da Palavra de Deus é inequívoca. O propósito de Deus para a vida do homem
prevalecerá49.
Entretanto, não basta dizer às pessoas que elas são pecadoras, porque isso seria apenas
metade da verdade. Seria ir apenas até a metade do caminho. Isto pode conduzir ao legalismo
e ao desespero (também temos nossa faceta de humanismo e de conduzir ao desespero e à
vitimização!). “Tal atitude apresenta o cristianismo como opressivo em vez de libertador, um
48
POWLISON, David. Aconselhamento Bíblico no Século XX. In: Introdução ao Aconselhamento Bíblico. São
Paulo: Hagnos, 2006, p. 337.
49
MACARTHUR, John F.; MACK, Wayne A. Introdução ao Aconselhamento Bíblico: Um Guia de Princípios
e Práticas de Aconselhamento. São Paulo: Hagnos, 2006, p. 307.
29
sistema insensível de regras difíceis de obedecer”50. Antes, devemos informar às pessoas que
elas, em Cristo, têm todos os recursos que precisam para vencer a sua situação e progredir na
prática de vida.
O conselheiro cristão reformado deve está alerta ao fato de que seu aconselhamento
deve exalar da revelação especial de Deus, as Escrituras Sagradas. “...Aqueles que se aferram
a algo menor que o Evangelho, a fim de acharem solução para os problemas da vida, não
demoram a descobrir que se agarram a uma palha...”51
Na perspectiva bíblica olhamos para o mesmo problema da psicologia, mas com
perspectiva diferente. Na verdade a concepção bíblica sobre qualquer assunto é uma
concepção que enaltece a centralidade de Deus, e que reconhece que o problema humano é
muito maior do que o que nos é apontado pelas psicologias.
O homem é pecador e culpado perante Deus. E precisa responder por isso. Mas,
também acrescente-se, pode ser redimido em Cristo, e ter uma nova vida nEle. “Todo o
conselho de Deus concernente a todas as coisas necessárias para a glória dele e para a
salvação, fé e vida do homem, ou é expressamente declarado na Escritura ou pode ser lógica e
claramente deduzido dela”.52
A Bíblia diz que o homem foi criado por Deus à sua imagem e semelhança. Que foi
criado sem pecado, mas que pela sua própria desobediência (Gn 3) se tornou pecador e
portanto, merecedor do castigo de Deus. E, ainda mais importante, não pode ser redimido
dessa condição por nada menos que a obra de Cristo, a base da nossa justificação. E, a não ser
que entendamos a grandeza da necessidade da justificação não estaremos aptos ao
aconselhamento bíblico. A menos que compreendamos o nosso estado de pecaminosidade, de
hostilidade, de rebeldia contra Deus, não compreenderemos a grande necessidade da vida e
obra de Cristo, da justificação que Ele nos trouxe através do Seu sacrifício e da conseqüente
libertação para uma vida que agrada a Deus53.
2.1. O homem na criação: criado em santidade e com responsabilidade ante Deus
50
CRABB. Princípios de Aconselhamento Bíblico: Atendendo às necessidades de aconselhamento através da
Igreja. Brasília:Refúgio, 2ª. Ed. 1998, p. 12.
51
ADAMS, Jay E. O Manual do Conselheiro Cristão. São Paulo: Fiel, 6ª. Ed., 2006, p. 47.
52
CONFISSÃO DE FÉ DE WESTMINSTER. Cap. I, Parág. VI.
53
O estudante fará bem em estudar o curso do MINTS : Antropologia Bíblica de autoria de Bruce McDowell, ou
outro de mesmo nome da autoria de Natalie Carley. Enfatizamos a absoluta necessidade de conhecer com
profundidade a Antropologia Bíblica para aplicá-la ao Aconselhamento Bíblico. O que aqui fazemos é uma
comparação rápida entre a antropologia psicológica (conforme o capítulo anterior) e a antropologia bíblica. A
ideia é demonstrar a diferença entre elas e como isso desemboca nos métodos e soluções propostos.
30
O aconselhamento bíblico coloca o homem frente a frente com Deus. Ele diz que o
homem é teorreferente. Somos seres responsáveis perante o Deus que nos criou. E todos os
nossos atos dizem respeito a Ele. Nas palavras do rev. Wadislau: “Deus é o ambiente do
homem”54. Ele não pode viver de forma autônoma ou independente de Deus, embora busque
isso. O fato de ser criado implica em dependência.
Criados à imagem e semelhança de Deus, o homem é chamado à responsabilidade
pelos seus atos. Isso contraria frontalmente a idéia da psicologia quando responsabiliza outras
pessoas pelos seus pecados. Deus é o padrão, fora de nós, pelo qual precisamos nos analisar,
ao passo que também é o juiz de nossas ações e motivações.
No pacto que Deus faz com Adão e Eva está implicada a questão da responsabilidade.
Os seres criados, nesse caso, devem dar contas das suas atitudes ao seu Criador.
Poderíamos discorrer sobre várias outras verdades sobre essa relação do homem com
Deus, mas por hora isso basta. O que queremos enfatizar nesse ponto é que o homem não está
livre para fazer aquilo que deseja. Ele foi criado com responsabilidades. O Salvador Jesus
disse que “de toda palavra frívola que proferirem os homens, dela darão contas no dia do
juízo”. (Mateus 12. 35).
Ao ser criado em santidade e à imagem e semelhança de Deus, o homem foi colocado
pelo próprio Deus nessa responsabilidade. “Por trás dessa incumbência ele nos deu o alto
chamado de conhecê-lo e confiar nele”55.
Quando as psicologias nos lança para longe de Deus, dizendo-nos que não temos
responsabilidade, colocando-nos frente a frente apenas com nós mesmos e com o ambiente
em que vivemos, nos deixam orfanados de conhecê-lo, amá-lo e confiar nele. “... Skinner nos
faria por a culpa no ambiente. Freud apontaria o dedo acusador para a perturbação psíquica
interna. Rogers empatizaria com uma pessoa reprimida à qual foi negado direito de autoexpressão. Em todos os casos a pessoa como agente responsável é perdida”.56
O rev. Wadislau disse que
“...fomos criados pelo Senhor e só seremos felizes em sujeição à Sua justiça e ao
Seu amor. Longe de Deus, no desejo de independência, só encontraremos solidão. Todos
temos em nossas almas a luta pelo poder. Queremos ser deuses de nós mesmos para fugir de
alguma dor já conhecida, mas não fomos feitos para a solidão, e ela nos machuca” 57.
54
GOMES, Wadislau Martins Gomes. Nota de classe no Centro de Pós-graduação Andrew Jumper, Abril de
2011.
55
EDGAR, William. Razões do Coração. Brasilia: Refúgio, 2000, p. 63.
56
CRABB, Larry. Aconselhamento Bíblico Efetivo: Um modelo para ajudar cristãos amorosos a tornarem-se
conselheiros capazes. 2ª. Ed. Brasília: Refúgio, 1999. pg. 39.
57
GOMES, Wadislau, Força para a Familia na crise moderna. Brasília: Refúgio, 1995. pg. 62.
31
Assim, no aconselhamento bíblico, a responsabilidade pelo pecado é colocada sobre o
pecador, não sobre o ambiente, circunstâncias ou o que quer que seja. Ele é criado à imagem e
semelhança de Deus58 e, portanto, responsável ante Deus.
Quando tratamos do aconselhamento de casais, é importante termos isso em mente,
porque como veremos adiante, tendemos a colocar a culpa nos outros apenas. Claro que num
casamento, o casal tem sua parcela de culpa nos problemas, isso porque os dois são
pecadores.
2.2. A fonte do entendimento e ponto de partida para a redenção dos problemas
humanos
Não há ninguém que conheça melhor o ser humano do que Deus que o criou. E Deus
se revela pelas Santas Escrituras acerca desse assunto. E precisamos reafirmar enfaticamente
que a análise que Deus faz do homem é autoritativa. É nela que vamos encontrar a verdadeira
e inquestionável concepção do homem.
O salmo 19 e 2 Tm 3.15-16 nos ensina que precisamos das Escrituras para entender o
homem e como habilitá-lo para viver para a glória de Deus. O salmo 19 trata de restauração
da alma, admoestação, e alegria do coração. As Escrituras falam do homem de forma
completa na sua relação com Deus. Ela é inspirada por Deus. É perfeita. É imutável,
porquanto emana do caráter imutável daquele que a inspirou como diz Paulo a Timóteo. E
nela encontramos o que precisamos para ser perfeitamente habilitado. A mudança que
precisamos para nossas vidas encontramos nela.
Assim, como Palavra de Deus, ela deve estabelecer as categorias do aconselhamento
cristão. Ela deve determinar quem é o homem, quais são os seus problemas, e como esses
problemas podem ser mudados.
Quando nos deparamos com isso compreendemos que ainda que os “especialistas” das
psicologias possam fazer observações até detalhadas do comportamento humano não podem
interpretá-las corretamente porque lhes faltam o conhecimento da Palavra de Deus e a
iluminação do Espírito de Cristo. Isso é uma questão de cosmovisão.
Se procurarmos a solução num homem, teremos com certeza, algumas soluções
esdrúxulas, como as propostas por Freud e Skinner. Se procuramos a redenção para o homem
como sendo responsável diante de Deus vamos encontrá-la em Cristo como nos diz a
58
A imagem e semelhança de Deus no homem foram desfiguradas por conta do pecado, mas não destruídas. O
homem ainda continua como responsável diante de Deus
32
Escritura. Só a Palavra de Deus vai onde a psicologia não pode ir: ao coração humano; vai no
seu maior problema: o pecado; vai onde necessita ir; mostra a situação difícil em que se
envolveu o homem; e somente ela, a Escritura, pode apontar a solução também para isso.
Aqui enfatizamos que o aconselhamento bíblico é redentivo. Sim, ele aponta, ao
contrário do que dizem as psicologias, para uma redenção. Não é determinista nesse aspecto,
nem lança o homem ao desespero. A antropologia bíblica diz que Deus tem redenção para o
ser humano.
“...No evangelho de Jesus Cristo brilha grandiosa esperança de mudança...”59.
2.3. O problema humano e sua redenção
Ao passo que as Escrituras falam em responsabilidade, ela também menciona
esperança de mudança.
O problema do homem, em todos os seus aspectos começou no Éden, quando ele
desobedeceu à ordem de Deus. A ordem era para não comer da árvore do conhecimento do
bem e do mal. Esta ordem foi quebrada. E ordem quebrada implica em punição. A punição
gera a morte. E esta morte não é simplesmente morte física do corpo, mas separação e
condenação, algo que enche o coração do homem de temor.
A queda do homem nos coloca frente a frente com uma realidade estarrecedora e
terrível: o pecado, que passa a fazer parte da história humana e, a ira de Deus, uma santa
reação de um Deus santo ante o mal.
Devemos aqui ponderar acerca da natureza do pecado e da gravidade deste novo
elemento que se coloca, se interpõe no relacionamento entre Deus e o homem.
Usualmente as pessoas não encaram pecado como uma transgressão da Lei de Deus;
não o encaram como rebeldia contra Deus. Entretanto, “se antes da queda o coração humano
era religiosamente qualificado pelo ser-para-Deus em amor e obediência, após a queda o
coração passou a ser religiosamente qualificado pelo ser-para-Deus em apostasia e rebelião, o
que pode ser dito de outra forma: ser-para-um-ídolo”.60.
O escritor John Stott define o pecado de forma magistral. Ele diz:
A ênfase da Escritura é sobre a autocentralidade ímpia do pecado. Cada pecado é
uma quebra do que Jesus chamou de o primeiro e grande mandamento, não apenas o
59
ADAMS, Jay E. O Manual do Conselheiro Eficaz. São Paulo: Fiel, 6ª. Ed., 2006. Pg. 136.
OLIVEIRA, Fabiano de Almeida. Reflexões Críticas sobre Weltanschauung: Uma Análise do Processo de
Formação e Compartilhamento de Cosmovisões numa Perspectiva Teo-Referente. Artigo distribuído em sala de
aula, em Agosto de 2008. Pg. 10.
60
33
fracasso de amar a Deus com todo o nosso ser, mas também a recusa ativa de
reconhecê-lo e obedecê-lo como nosso Criador e Senhor. Rejeitamos a posição de
dependência que o fato de sermos criados envolve e procuramos ser independentes.
Pior ainda, ousamos proclamar nossa autoindependência, nossa autonomia, o mesmo
que reivindicar a posição que somente Deus pode ocupar. O pecado não é um lapso
lamentável de padrões convencionais; a sua essência é hostilidade para com Deus,
manifesta em rebeldia ativa contra Ele.61
Não há que se duvidar que o pecado seja um desafio à santidade de Deus e a Ele
próprio; é arrogância e desejo de ser igual a Ele. Pecado é afastamento de Deus, uma ofensa a
Ele.
Calvino aponta o pecado como sendo uma desobediência. Ainda mais, Calvino referese à desobediência de Adão como sendo muito mais do que apostasia, e no seu costumeiro
linguajar carregado de expressões fortes e contundentes ele diz que isto está associado “com
vis impropérios contra Deus, por isso que Adão e Eva subscrevem as caluniosas insinuações
de Satanás, com que acusa falsamente a Deus de mentira, e de inveja e de maldade”. 62 Assim,
ele refere-se ao homem como alguém que se esqueceu de que tudo o que ele tinha vinha de
Deus. Começou a exaltar-se contra Deus e acabou no estado de miserabilidade.
Essa é a declaração de como a Bíblia ver o problema do homem. É claro que não
deixamos de considerar que os problemas pessoais podem advir em parte do ambiente
(condicionamento sociológico) e outros ídolos. Essas coisas trabalham juntas. Entretanto,
tudo começa aqui.
E, onde encontramos a solução? Em Cristo. Sim, para os problemas humanos há
redenção em Cristo. Sim, há possibilidade de mudança em Cristo. Nele estão escondidos
todos os tesouros (Cl 2.3).
O que a psicologia propõe, como assinalamos acima é uma falsa redenção 63. Davi
Charles Gomes diz que:
A psicologia secular, que toma para si a tarefa de tratar da questão do pecado e ao
mesmo tempo nega de início a sua existência, nunca conseguiria ir além de suas próprias
contradições e terminaria por “desumanizar” o próprio homem ao qual busca “redimir”
mediante o fortalecimento psicoterápico.64
61
STOTT, John R. W. A Cruz de Cristo. 6ª reimpressão. São Paulo: Vida, 1999, p. 80.
CALVINO. Institutas, Vol. II, 5.
63
Ver GOMES, Davi Charles. A metapsicologia vantiliana: Uma incursão preliminar. In: FIDES
REFORMATA XI, Nº 1, pp. 113-139.
64
Ibid. p. 121.
62
34
Deus enviou seu Filho por nós, para nos redimir, para nos libertar da culpa do pecado.
Ele cumpre a Lei e morre em nosso lugar, para sermos declarados justos diante de Deus. Isso
também se aplica ao casamento como veremos.
Não precisamos fazer tentativas de colocar a culpa em outras pessoas, nas
enfermidades, nos genes, no ambiente em que vivemos. Em Cristo temos os recursos que
precisamos. Em Cristo todas as coisas podem ser redimidas. Em Cristo meu farisaísmo pode
ser largado; não precisamos buscar álcool, pornografia, ou outro álibi para lançarmos a nossa
culpa. Porque “nenhuma condenação há para os que estão em Cristo Jesus”. (Romanos 8.1).
O conselheiro cristão, lida com o pecado confrontando-o amorosamente. Mostrando a
pessoa que Cristo pode justificá-lo diante de Deus. Falando-lhe da redenção que há em Cristo
Jesus. Essa é a maravilhosa notícia da Justificação pela fé.
O rev. Wadislau arremata:
Nada mais oferece ao coração humano tanta esperança do que a confrontação com
seu pecado. Nada é mais verdadeiro e mais real para alguém do que suas próprias
faltas. E se negarmos o reconhecimento da gravidade das faltas do coração, negamolhe também a sua própria sanidade, a capacidade de discernir. Por isso, nos cabe
levar ao homem em desespero a única esperança para o mal que nos assola, o
pecado: o confronto da cruz.65
CONCLUSÃO
Essa perspectiva do ser humano nos indica, como veremos nos próximo capítulos, que
o homem foi criado para glorificar a Deus também nas suas relações humanas. E também que
quando duas pessoas se unem, elas levam consigo um problema que a Bíblia chama de
pecado. Elas carregam consigo uma carga de dificuldades.
Uma das características da queda é a habilidade de lançar a culpa nas circunstâncias,
no cônjuge, no passado histórico, no ambiente, etc.
No aconselhamento de casais, entretanto, é mister que tenhamos como pressuposto
pelo menos algumas realidades: 1. O aconselhamento bíblico deve começar em Deus e, assim,
entender que o homem não é livre ou forçado pelo ambiente (embora esse exerça pressão
sobre aquele), mas, é um ser religiosamente orientado. 2. O homem é responsável pelas suas
atitudes perante Deus; 3. Em Cristo há redenção para os problemas humanos.
Sobre isso tratarão os próximos capítulos.
65
GOMES, Wadislau Martins. Em Terra dos Brasis. Brasília: Refúgio, 1997, p. 20.
35
QUESTIONÁRIO
1. Por que houve uma integração entre psicologia e aconselhamento bíblico?
2. O que acontece quando substituímos a Bíblia pela psicologia no Aconselhamento?
3. Qual o principal instrumento no aconselhamento cristão?
4. Qual a concepção do homem que o conselheiro traz para o aconselhamento cristão?
5. Qual a diferença da antropologia bíblica e a psicológica?
6. Por que o autor diz que a psicologia não pode ir onde a Palavra de Deus vai: ao
coração humano?
7. Qual é o maior problema humano? A psicologia pode tratar dele?
8. Qual a definição de pecado?
9. Você crer que podemos encontrar redenção para os problemas humanos? Onde?
10. Por que o autor diz que a psicologia propõe uma falsa redenção?
36
LIÇÃO 3: O PROPÓSITO DE DEUS PARA O CASAMENTO (CRIAÇÃO)
INTRODUÇÃO:
Ao falarmos sobre o propósito do matrimônio temos de partir da doutrina bíblica da
criação. Assim o fez o Redentor quando, em Mateus 19, os fariseus perguntaram acerca do
divórcio. O que Jesus menciona ali é que quando o casamento foi criado por Deus, foi criado
com um propósito, e, obviamente, esse propósito é determinado pelo Criador. Para entendêlos precisamos nos voltar para o relato da criação.
Quando Deus criou Adão e Eva deu-lhes três mandatos. Esses mandatos são
conhecidos como mandato cultural, mandato espiritual e mandato social66 (Gênesis 1). Esses
mandatos refletem a imagem de Deus no homem.
Por meio do mandato cultural o homem deveria manter um relacionamento com o
cosmos. Nesse aspecto Deus deu ao homem e à mulher a capacidade de subjugar a terra e ter
domínio sobre tudo. O mandato cultural, segundo Hoekema era “a ordem de governar a terra
para Deus e de desenvolver uma cultura que glorifique a Deus”67 e, continua ele “O homem é
chamado por Deus para desenvolver todas as potencialidades encontradas na natureza... cabelhe desenvolver não apenas a agricultura, mas também a ciência, a tecnologia e a arte” 68.
Outrossim, neste desenvolvimento o homem também deveria preservar a terra.
No mandato espiritual “a humanidade real deveria continuar em comunhão com o
soberano Criador e Senhor. O homem deveria viver sob o mandamento expresso de Deus (Gn
2.16, 17) e assim fazendo permanecer dentro da vontade do soberano Senhor...” 69. Com os
seres humanos, criados à sua imagem e semelhança, Deus estabeleceu um vínculo de amor e
de comunhão enquanto esses obedecessem ao seu mandamento de não comerem da árvore do
conhecimento do bem e do mal. Adão e Eva deveriam conhecer, amar, andar, obedecer e
adorar a Deus a cada dia.
No que diz respeito ao mandato social encontramos a família como a instituição onde
este mandato é entendido, obedecido e desenvolvido 70 . Adão e Eva deveriam atuar como
marido e mulher harmoniosamente e cumprir o mandato de frutificar e encher a terra. Esse
mandato está claro em Gênesis 1.27-28: “Criou Deus, pois, o homem à sua imagem, à
66
GRONINGEN, Gerard Van. Criação e Consumação. O Reino, a Aliança e o Mediador, volume 1. São Paulo:
Cultura Cristã, 2002, pp. 90ss.
67
HOEKEMA, Anthony. Criados à Imagem de Deus. São Paulo: Cultura Cristã, 1999, p. 27.
68
Ibid. p. 95.
69
GRONINGEN, Gerard Van. Revelação Messiânica no Velho Testamento. São Paulo: Cultura Cristã, 1995,
pp. 97.
70
GRONINGEN, Gerard Van. A Família da Aliança. São Paulo: Cultura Cristã, 1997, pp. 192.
37
imagem de Deus o criou; homem e mulher os criou. E Deus os abençoou e lhes disse: Sede
fecundos, multiplicai-vos, enchei a terra e sujeitai-a; dominai sobre os peixes do mar, sobre as
aves dos céus e sobre todo animal que rasteja pela terra”. O casamento é a mais importante
esfera do mandato social.
O casamento, não é, portanto, uma invenção cultural como querem alguns. Também
não podemos aceitar que ele se desenvolve com o tempo. Vemos na luta dos homossexuais
em constituir família uma tentativa de adequar sociologicamente um conceito constituído pelo
imutável Deus como sendo um relacionamento entre um homem e uma mulher, macho e
fêmea, com a finalidade de, entre outras coisas, procriarem. Isso obviamente exclui um
casamento entre pessoas do mesmo sexo. Embora os proponentes da nova família mantenham
a estrutura, corrompem a direção. O casamento é, portanto, criação de Deus.
Quando marido e mulher procriam, obedecendo ao mandato de Deus, eles dão à luz a
homens e mulheres que possam refletir, igualmente, a imagem de Deus.
Devemos lembrar, entretanto, que não existem divisões entre os mandatos e que eles
estão estritamente relacionados. Deus deve ser honrado em todas as esferas da vida, porque
tudo está relacionado com ele71.
Nesse aspecto precisamos enfatizar
Que é importante entender e crer que todos os aspectos da vida são estabelecidos por
Deus e pertencem a Deus. Eles devem ser reconhecidos como partes do reino sobre o qual
Cristo está atualmente reinando agora. Ele é o Senhor supremo de tudo. Ele está no cume de
todas as coisas (Cl 1.15-20). Precisamos não somente conhecer o nosso Deus triúno
pessoalmente e possuir o relacionamento eu-você, mas ser obedientes ao Senhor Jesus Cristo.
Não podemos pensar que só por sermos obedientes espiritual e socialmente já teremos
cumprido nosso serviço e obedecido ao Senhor. Nós não seremos se tivermos separado o
cultural, criacional e natural, e feito menção a eles como secular como se não fizessem parte do
reino de Deus e, portanto, sem espaço na vida religiosa de alguém 72.
Podemos igualmente afirmar, ainda que redundantemente, que cumprir os mandatos
cultural e espiritual, olvidando o social também não honra ao Senhor.
Relembremos mais uma vez que esses mandatos faziam parte da ordem criacional.
Esses três mandatos não foram excluídos quando o homem caiu em pecado. Deus
manteve o mandato cultural, ainda que tenha inserido mudanças nele. O homem agora
comeria com o suor do seu rosto (Gênesis 3.17), mas continuaria a cultivar a terra como antes.
71
72
GRONINGEN, Gerard Van. A Família da Aliança. São Paulo: Cultura Cristã, 1997, p. 189.
Ibid, p. 193.
38
O mandato social também perdura. A mulher ainda teria filhos, se relacionaria com
seu marido e da semente dela viria Aquele que esmagaria a cabeça da serpente (Gênesis 3.16).
No cumprimento do mandato social estava a esperança para a humanidade. Mais uma vez
temos aqui algumas mudanças, a mulher daria à luz em meio ao sofrimento (Gênesis 3.16).
Além disso, o relacionamento com o marido seria um relacionamento em que haveria um luta
de poder73, ao invés de um relacionamento pleno.
O mandato espiritual é claramente visto no que argumentamos acima. Visto que Deus
criou todas as coisas, somos responsáveis perante Ele, já que somos definidos como seres
humanos essencialmente na nossa relação com Deus, o que chamamos, repetimos, de
Teorreferência. Nesse caso, com a entrada do pecado no mundo, pode ser ela positiva ou
negativa.
Voltemos então à questão do casamento.
O casamento é uma dádiva de Deus para o ser humano. Ele faz parte da ordem da
criação 74 . Desde o primeiro livro da Bíblia somos informados de que Deus instituiu o
casamento para a sua glória e para a felicidade humana.
Poderíamos pensar que com a queda, essa dádiva seria retirada por Deus, mas a
verdade é que ela continua, embora exista uma pressão cultural para mudá-la, mesmo não se
podendo fugir da estrutura. Quando vemos homossexuais reivindicando direitos como casais,
e igualmente reivindicando o direito de adotar filhos para constituir família vemos que eles
não conseguem fugir do padrão estabelecido pelo Senhor, o Soberano das nações, o Deus
sobre todas as coisas.
Não há como fugirmos do fato de que o casamento foi idealizado por Deus; que a
estrutura do casamento foi estabelecida por Deus, mas que a direção está sendo mudada pelo
homem por causa do pecado. Ainda assim essas escolhas feitas são limitadas pela
administração soberana do nosso bondoso Deus.
A Confissão de Fé de Westminster nos mostra alguns propósitos para o casamento. Lá
encontramos que o casamento foi uma dádiva de Deus para a humanidade, para a felicidade
humana. Assim afirma a CFW, capítulo XXIV, seção II, “O matrimônio foi ordenado para o
73
Falaremos sobre isso no terceiro capítulo.
O. Palmer Robertson discute a questão do casamento dentro do que ele chama de aliança da criação (ele
prefere essa terminologia à aliança das obras, embora a CFW utilize a expressão pacto das obras). Na aliança
da criação, ele define, há um aspecto geral e um focal. No aspecto geral, encontramos três ordenanças: o sábado,
o casamento e o trabalho. No aspecto focal temos a ordem de não comer da árvore do conhecimento do bem e do
mal. O que nos interessa aqui é afirmar o casamento como sendo ordenado por Deus. Ver ROBERTSON, o.
Palmer. O Cristo dos Pactos. São Paulo: Cultura Cristã, 2011, 2ª. Ed.
74
39
mútuo auxílio de marido e mulher, para a propagação da raça humana por uma sucessão
legítima e da Igreja por uma semente santa, e para impedir a impureza”.
Temos aqui algumas afirmações importantes: 1. Deus desenhou o matrimônio para
auxílio mútuo entre marido e mulher. A mulher foi criada por Deus para que o homem
pudesse cumprir o mandato cultural e social 75 como exposto no item 2, a seguir; 2. Deus
desenhou o matrimônio para a propagação da raça humana, fato impossível de ser realizado
entre casais homossexuais, visto que pessoas do mesmo sexo não podem procriar; 3. Deus
desenhou o casamento para a propagação da igreja de Cristo por uma semente santa; 4.
Também para impedir a impureza.
O casamento pertence, repetimos, à ordem da criação. E não devem ser limitada ao
âmbito da igreja apenas. O casamento é algo que, ordenado por Deus, pertence às estruturas
humanas, como já vimos acima.
Na tradição judaico-cristã, o casamento não é construído pelos humanos à medida
que eles desenvolveram uma estrutura social. Antes, ele é algo dado. É uma coisa que foi
constituída na própria natureza humana para fornecer o contexto básico no qual o
cumprimento do propósito humano em edificar um lar e levantar uma posteridade fosse
realizado. Ele é uma ordenança da criação, e como tal, tem um status ontológico que
sobrepuja os desejos e os caprichos daqueles que desejariam moldá-lo à própria imagem
deles. De fato, o casamento tem um caráter transcendental que ultrapassa todas as
diferenças relativas que se levantam entre culturas diferentes76.
Precisamos ainda assinalar, portanto, que mesmo homens e mulheres que não servem a
Deus, por ter a norma de Deus entalhada na estrutura da família, podem experimentar
casamentos bem sucedidos ainda que a direção esteja equivocada. Na ordem da criação,
percebemos que a família consiste de pai mãe e filhos, e isso não é um mero ajuste ou
determinação humanos, “...isto está arraigado no modo como o sábio Criador fez a natureza
humana – arraigado na constituição familiar, emocional, social e moral dos homens e das
mulheres”77
Todos os homens tem “...alguma consciência intuitiva dessa natureza ou estrutura...”78.
Compreendidas as designações de Deus nos papéis de homem e mulher, um como líder e
outra como ajudadora, como parte do plano do Criador, eles encontram “satisfação plena e a
75
Daniel Doriani, denomina essas duas facetas como lado a lado (para cumprir o mandato cultural) e face a face
(para o cumprimento do mandato social). Ver DORIANI, Daniel. O Homem Segundo o Coração de Deus. São
Paulo: Cultura Cristã, 2004, pp. 45-73.
76
MYATT, Alan D. O que é casamento? www.monergismo.com. Acessado em 10.05.2013.
77
WOLTERS, Albert M. A Criação Restaurada. São Paulo: Cultura Cristã, 2006, pp. 106.
78
Ibid., p. 107.
40
sabedoria de Deus na criação é inteiramente revelada e exaltada79”. Disso resultam os ajustes
numa família que vive numa teorreferência negativa.
Dito isto, vamos analisar rapidamente as circunstâncias em que foram criados Adão e
Eva.
3.1. As Circunstâncias da Celebração
Quando Adão e Eva foram unidos por Deus, formando o primeiro casal, eles tinham
circunstâncias diferentes da nossa.
Em Gênesis vemos como Deus livre e soberanamente criou todas as coisas. Tudo foi
criado por Deus para a sua própria glória. Esse era o propósito supremo. Lá encontramos
Deus criando o sol, a lua, as estrelas, etc., e mencionando com certos detalhes cada coisa que
Deus trouxe à existência. Um detalhe importante é que sempre temos a repetição da satisfação
de Deus na sua criação quando reiteradas vezes vemos a expressão “e viu que era bom”. Essa
afirmação aparece em vários versos (4, 10, 12, 18, 21, 25 e 31).
No versículo 31, do primeiro capítulo, destaca-se o fato de uma sutil mudança na
linguagem e acrescentar um advérbio de intensidade: “viu Deus tudo quanto fizera, e eis que
era muito bom”. A completude da obra de Deus é vista por Ele mesmo como muito boa.
Disso depreendemos que Deus não criou nada mal. Não havia mal físico ou moral e,
portanto não havia nenhum tipo de experiência negativa entre Adão e Eva. Isso muda quando
o pecado entra no mundo. Entendendo isso somos levados a perceber que as circunstâncias
que Deus criou para o casamento de Adão e Eva eram perfeitas. Vamos analisá-las.
3.1.1. Circunstâncias ambientais perfeitas
O lugar que Deus criou para celebrar o primeiro matrimônio era perfeito. A presença
de Deus conferia àquele lugar segurança, paz, beleza e amor enchendo tudo de vida.
O lugar onde o homem e a mulher vivem é um jardim repleto de árvores e bem
regado: o jardim do Éden (Gn 2.16-17). “Há harmonia completa, desde as mais elevadas
formas de vida até as mais inferiores. Embora haja tarefas a cumprir (v. 15), o homem não
79
KOSTENBERGER, Andreas J. Deus, Casamento e Familia. São Paulo: Vida Nova, 2011, p. 32.
41
precisa lutar para extrair o sustento de uma terra hostil... a vida no Éden é a ideal... no jardim
não há mal... o pecado não existe.”80.
No mandato cultural o homem explorava a terra ao mesmo tempo em que a
preservava. O ambiente era perfeito. Não havia cardos, espinhos e abrolhos como haverá
depois da entrada do pecado no mundo (Gênesis 3.17 e 18).
Adão e Eva viviam num ambiente livre de germes, infecções, doenças transmissíveis,
etc, bem como num ambiente limpo e saudável. Nenhuma parte da criação de Deus foi criada
manchada pelo pecado81.
O jardim do Éden era um lugar sem vestígios de medo, tristeza, pranto ou morte. “O
Éden... era um lugar de vida. O vínculo de vida entre o homem e a mulher e entre Deus e os
seres humanos deveria permanecer intacto. Não existiria separação e seus efeitos
degenerativos. Resumindo, não existiria morte no Éden...”82.
O que havia era uma imensa harmonia entre o primeiro casal e a criação. Os esforços
de Adão e Eva eram coroados com o êxito. A relação de domínio com os animais era
tranqüila e pacífica. O cultivo e a exploração da terra eram feitos sem qualquer depredação e
com retorno certo e líquido.
Não havia nenhuma influência maléfica na criação que pudesse desvirtuar o propósito
do homem e da mulher de glorificar a Deus. Os problemas só vão aparecer tanto no aspecto
físico como moral e espiritual (que discutiremos depois) quando o pecado entra no mundo.
Somente quando Eva e Adão tomam do fruto e comem é que começam as deploráveis
conseqüências desse ato. Adão e Eva foram agraciados com condições ambientais perfeitas. A
presença de Deus fazia do Éden um santuário de graça. Era “...um local espiritual e social. Era
o lugar onde o casamento e a vida familiar chegariam a uma expressão rica. De fato, era o
cenário para uma vida pactual enriquecedora e completa”.83
3.1.2. Circunstâncias sociais perfeitas
Na criação, conforme a vemos em Gênesis 1 e 2, não temos problemas de ordem
social. A convivência entre Adão e Eva, que nesse momento formavam a sociedade de então,
80
LASOR, William. Introdução ao Antigo Testamento. São Paulo: Vida Nova, 1999, p. 27.
Ver VAN DIKE, Fred e outros. A Criação Redimida. São Paulo: Cultura Cristã, 1999.
82
GRONINGEN, Gerard Van. Criação e Consumação. O Reino, a Aliança e o Mediador, volume 1. São Paulo:
Cultura Cristã, 2002, pp. 95.
83
Ibid., p. 117.
81
42
era perfeita, em atitudes, palavras e ações. O companheirismo era perfeito, como também o
intercurso sexual.
A criação da mulher revela que Deus não queria que o homem vivesse isolado mas,
vivessem perfeitamente em comunidade, isso é revelado na expressão “não é bom que o
homem esteja só” (Gn 2.18), antes da mulher ser criada.
O homem não exercia sua autoridade sobre a mulher de maneira autoritária, mas
amorosa. Nunca efetivamente a rebaixava da sua dignidade, afinal era também fora criada à
imagem e semelhança de Deus. Havia, cremos, da parte do homem sacrifício abnegado,
compromisso amoroso e uma real proteção revelada em cuidados e valorização da esposa. E a
mulher lhe era uma ajudadora idônea, submissa. E via a submissão como uma dádiva de
Deus.
“Homem e mulher, Adão e Eva, viviam em perfeita harmonia um com o outro.
Não havia competição descabida, nem luta pelo poder, vingança ou recriminação. Não
existiam conspirações secretas ou palavras ásperas, não havia medo, culpa, vergonha ou
rebeldia contra a autoridade. Havia entendimento, comunicação e amor.
Não existia luta de identidade, ansiedade, depressão ou vícios. Não existiam
histórias pessoais doloridas a serem superadas. Não havia medo do que poderia acontecer a
seguir, nem havia motivações ambíguas ou luta com desejos desordenados... 84.
Na condição pura em que foram criados Adão e Eva eram dependentes de Deus e
interpendentes em relação ao próximo. “Havia unidade de propósito... unidade de visão...
unidade de valores e unidade física na relação sexual...”85.
Não havia nas atitudes de Adão ou de Eva, algo que inspirasse desentendimento ou
dificuldades. Não havia ciúmes, brigas, impaciência, stress, nada que abalasse, por mínimo
que fosse, o relacionamento. Não havia críticas, vingança, malicia, avareza, maldade, calúnia,
contenda, dolo, malignidade (Romanos 1).
Não haviam metas egoístas, autorreferentes, algo como alguém saindo em busca de
satisfazer as suas próprias necessidades sem considerar o outro.
Não havia palavras ofensivas. Visto que estas foram um dom que Deus deu aos
homens e a mais nenhuma outra criatura, as palavras são importantes. Por elas Deus se
comunicou com Adão. E, o Criador deu aos homens a dádiva da fala. E a negou ao resto da
criação. Tripp diz que “Deus elevou a fala a um lugar de altíssima importância como seu
veiculo primário da verdade. Por intermédio de palavras, aprendemos as verdades mais
84
85
TRIPP, Paul David. Instrumentos nas Mãos do Redentor. São Paulo: Nutra, 2009, p. 18.
GOMES, Wadislau Martins. Coração e Sexualidade. Brasília: Refúgio, 1999, p. 88.
43
importantes a serem conhecidas – verdades que revelam a existência e a glória de Deus, que
geram vida”86.
Digamos, ainda que de passagem, que foi também por intermédio de palavras que o
homem caiu. Quando Satanás redefiniu e reinterpretou o grande propósito de Deus,
insinuando que Deus estava retirando deles algo indispensável e que ao comer eles seriam
como Deus, o mal entrou no mundo. Satanás lança dúvida sobre o amor e a bondade de Deus
quanto às suas criaturas e apresenta a ilusão de que seria melhor uma vida sem a ingerência de
Deus.
Porém, voltando ao início da criação, tudo o que era dito, refletia a glória de Deus. A
linguagem não era usada para manipular, denegrir, ferir, ofender. Não havia gritos,
xingamentos ou condenação. Não se percebia nas palavras qualquer egoísmo, ofensa, engano
ou orgulho.
As palavras trocadas entre Adão e Eva eram cheias de verdade, pureza, amabilidade,
compreensão, e que visavam e refletiam a glória de Deus. Todas as coisas no relacionamento
deles estavam em perfeita harmonia.
Com o pecado, a unidade entre os dois se desfaz. Veremos mais sobre isso no capítulo
três.
3.1.3. Circunstâncias morais perfeitas
Do texto de Gênesis depreendemos que as condições morais também eram as ideais.
Nos é dito no capítulo 2, versículo 25, que eles estavam nus, mas não se envergonhavam. Eles
tinham uma relação perfeita, como mencionado acima, porque eram moralmente bons, ainda
que com a possibilidade de pecar. Algo, é bom que se diga, derivado da bondade do próprio
Deus, que criando o homem à sua imagem e semelhança lhe conferiu isso. “...Para Adão e
Eva que não conheciam pecado ou culpa, nada vergonhoso os separa um do outro. A ideia de
nudez sem vergonha, sugere a confiança perfeita, naturalidade e abertura deles”.87
Havia uma unidade perfeita como reflexo da unidade necessariamente perfeita que
gozava a Trindade, Pai, Filho e Espírito Santo. O homem e a mulher foram criados para
refletir essa unidade.
86
TRIPP, Paul. Guerra de Palavras. São Paulo: Cultura Cristã, 2011, p. 17. Nesse livro, Tripp faz uma longa
análise da fala a partir do quadro de referência criação-queda-redenção. Ver também ADAMS, Jay A.
Conselheiro Capaz. São José dos Campos: Fiel, 2008, capítulo xx.
87
DORIANI, Daniel. O Homem Segundo o Coração de Deus. São Paulo: Cultura Cristã, 2004, p. 56.
44
Não havia também, desvios morais tais como relações sexuais fora do casamento (até
porque eles estavam sozinhos), promiscuidade, sexo com animais, pornografia, masturbação,
homossexualidade ou qualquer outro tipo de atividade que envolvesse qualquer desvio do
propósito de Deus no tocante ao relacionamento sexual marido e mulher.
Somente com a entrada do pecado no mundo é que teremos problemas de ordem
moral, tais como, as encontramos no decorrer do livro de Gênesis: o início da poligamia
(4.19), o início da libertinagem (6.2), o início da sodomia (19.5), o início da relação sexual
entre pai e filhas (19.30-38), o início do estupro (34.2), o início da relação sexual entre
enteado e madrasta (35.22), o início da prostituição (38.12-19) e o início do desrespeito aos
compromissos conjugais (39.7-20). Só não se menciona algum caso de bestialidade (prática
sexual com animais), que, talvez, já tivesse acontecido, já que um dos mandamentos de Deus
proíbe que alguém se deite com animais (Lv 18.23). Jesus Cristo engloba todas essas
“novidades” na área do sexo como “relações sexuais ilícitas” (Mt 5.32) 88 . Acrescente-se
ainda, assassinatos (Gn 4; Gn 34); ausência de bom caráter (conforme caracterizado por
Rebeca, Jacó, Labão, entre outros), etc.
Isso tudo só veio a se concretizar no seio da família depois da entrada do pecado no
mundo. E aqui mais uma vez vemos que tudo está relacionado. Os aspectos moral, social e
espiritual estão intimamente relacionados e o pecado mancha todos eles.
3.1.4. Circunstâncias espirituais perfeitas
Os homens são objetos do cuidado especial de Deus. Segundo William Lasor “o
relacionamento de Deus com a humanidade é pessoal e imediato. A humanidade recém-saída
da mão do Criador é uma pictografia da “imagem de Deus”. A ênfase aqui, portanto, recai na
fragilidade, mortalidade e total dependência da humanidade em relação a Deus”.
89
Dependência essa que deveria ser mantida por Adão e Eva em não comerem a árvore do
conhecimento do bem e do mal.
Aqui, antes da queda, Deus e Adão e Eva tinham uma perfeita comunhão. Nessa
intimidade Deus os instruía pessoalmente, deu-lhes provisões, e falava com eles na viração do
dia. Não havia tendência para adorar a criatura em lugar do Criador.
88
CÉSAR, Elber. Casamento e Família: Encantamento e Obrigações. Viçosa-MG: Ultimato, 2013. E-book, p.
8.
89
LASOR, William. Introdução ao Antigo Testamento. São Paulo: Vida Nova, 1999, p. 26.
45
É importante observar que Deus manteve e mantém um relacionamento com toda a
criação. Porém, com o ser humano esse relacionamento era impar. Gerard Van Gronigen diz
que “Deus estabeleceu um vínculo um vínculo de vida e amor entre si mesmo e o homem...
Esse vínculo é conhecido como sendo pactual”90.
Nada atrapalhava esse relacionamento de Deus com o homem. Não havia desejos de
autonomia, nem rebeldia. O homem vivia em completa dependência de Deus e para a glória
de Deus. Adão e Eva viviam em perfeita consonância com a razão para o qual foram criados:
amar e obedecer a Deus sobre todas as coisas.
Esse relacionamento, apontaremos, é interrompido pelo pecado e será restaurado em
Cristo. E, óbvio, teremos implicações dessa quebra de relacionamento também no casamento.
3.1.5. Obediência: A condição estabelecida
Cercados por todas essas perfeições, Deus fez uma exigência a Adão e Eva.
O que Deus exigia de Adão e Eva? Obediência! Assim diz o texto sagrado: “E o
Senhor lhes deu esta ordem: De toda árvore do jardim comerás livremente, mas da árvore do
conhecimento do bem e do mal não comerás; porque no dia em que dela comeres certamente
morrerás.” (Gn 2. 16-17).
Para manter o seu relacionamento com Deus Adão haveria de manter-se na condição
em que fora criado; santo, sem pecado. A lei ou ordem que Deus lhe deu é a Sua exigência
para manter este relacionamento. Se o nosso primeiro pai saísse deste estado haveria morte.
Morte física. Morte espiritual.
É natural que pensemos desta forma. Adão está num relacionamento com um Deus
que é Santo, e para se relacionar com Ele é necessário também ser santo, precisa-se estar à
altura dEle. O Rev. Moisés Bezerril explica isto:
Ora como seria estabelecida uma relação de vida entre o Deus que é todo santidade
e justiça, de natureza infinitamente superior ao homem, e o homem, uma criatura, com a
possibilidade de queda, e infinitamente inferior ao seu Criador, se não fossem dadas as
condições de serem satisfeitas as exigências divinas para esta relação? Estas condições
resumem-se na exigência que Deus fez na sua Lei, para o relacionamento entre Deus e Suas
criaturas, o que é nada mais nada menos do que a dispensação do Seu caráter e dos Seus
atributos. Isto significa que para entrar numa relação com Deus, Ele mesmo exige
condições de caráter igual ao Seu, o que está revelado em Sua Lei. Sem essas condições
ninguém pode se relacionar com Deus. Se não forem cumpridas, o homem entrará numa
relação penal com Deus por não ter atingido as suas exigências.91
90
GRONINGEN, Gerard Van. Criação e Consumação. O Reino, a Aliança e o Mediador, volume 1. São Paulo:
Cultura Cristã, 2002, pp. 84.
91
BEZERRIL. Moisés. A Dispensação do Pacto. Recife: Edição Própria, 1998, p. 9 e 10.
46
A exigência era uma só: não comer do fruto do conhecimento do bem e do mal. Se
assim o fizesse Adão teria a vida. Mas tal coisa não acontece. Adão desobedeceu à Lei de
Deus. Ele cedeu à tentação.
Mesmo cercado de todas as dádivas mencionadas acima, Adão e Eva resolveram
provar do fruto do conhecimento do bem e do mal. A partir daí tudo no mundo mudou. É o
que veremos no próximo capítulo.
47
QUESTIONARIO
1. Quais são os três mandatos que encontramos na criação?
2. Sobre o que fala o mandato cultural?
3. Sobre o que fala o mandato espiritual?
4. Sobre o que fala o mandato social? onde este mandato é entendido, obedecido e
desenvolvido?
5. Segundo a Confissão de Fé de Westminster para que Deus criou o casamento?
6. Uma pessoa não temente a Deus pode ter um casamento bem-sucedido? Explique.
7. As circunstâncias da celebração do matrimônio eram perfeitas. Quais eram?
8. Em que essas circunstâncias perfeitas influenciam no casamento de Adão e Eva?
9. Essas circunstâncias eram méritos deles ou dádivas do Criador?
10. Qual a responsabilidade de Adão e Eva, em meio a todas essas bênçãos que o Deus
Pactual lhes deu?
48
LIÇÃO 4: CASAMENTO E PACTO – O HOMEM UM SER PACTUAL
(TEORREFERÊNCIA)
INTRODUÇÃO
Um dos problemas que invariavelmente enfrentamos é quando partimos de
pressupostos não-bíblicos para fazer uma análise do casamento. Há um bom número de livros
que tratam a respeito do casamento. A maioria infelizmente trata-o numa relação meramente
humana, enfatizando e supervalorizando necessidades, que nos são dadas por Deus, mas que
nesse caso se tornam ídolos a serem satisfeitos92.
Essa é uma constatação simples! Se começamos com uma visão humana, com a
criatura em lugar do Criador como nos diz Paulo em Romanos capítulo 1, chegaremos a
práticas e convicções humanistas, pragmáticas, sociológicas em lugar dos ensinos da Palavra
de Deus. Isso, é claro, não implica em dizer que temos que descartar a sociologia, a psicologia
e outros ramos da ciência. Mas, nenhum deles pode substituir a Palavra de Deus.
Uma parte dos livros que lemos sobre o propósito do casamento nos ensina que o
propósito de Deus para o casamento foi a solidão de Adão, conforme vemos em Gênesis 2.18:
“Disse mais o SENHOR Deus: Não é bom que o homem esteja só; far-lhe-ei uma auxiliadora
que lhe seja idônea”. A partir desse texto, acreditamos que o casamento foi instituído por
Deus para espantar a solidão, e assim sejamos mais felizes e realizados com a sensação de que
pertencemos a alguém (outro ser humano); ou que estejamos seguros e nos sintamos
importantes porque estamos sendo amados93.
Obviamente não havemos de negar que o relacionamento humano é desenhado por
Deus para a felicidade humana. Porém quando pensamos dessa forma, alçando as nossas
92
Um caso muito difundido no Brasil é o livro Casamento Blindado. Neste os autores tratam de vários assuntos
sem fazer quase nenhuma referência ao fato de que o homem é um ser pactual criado por Deus. A premissa
básica desse livro é que temos de aprender que o nosso maior problema é olhar para o outro com nossas próprias
lentes de valores, experiências, etc. (p. 24). Entretanto, o que devemos aprender é olhar o outro com todo o seu
histórico e desenvolver habilidades para encontrarmos um modo de ter um casamento perfeito (blindado). O
referencial continua sendo o ser humano. Ver CARDOSO, Renato e Cristiane. Casamento Blindado – O seu
casamento à prova do divórcio. Rio de Janeiro: Thomas Nelson Brasil, 2012. Especialmente o capítulo 2: O
problema é mais embaixo.
93
Nessa linha a quantidade de livros é exorbitante. Mesmo que cristãos, abordam o casamento com pressupostos
culturais, mais que bíblicos. O número é tão grande que cito apenas uma amostra. CRABB, Larry. Como
Construir um Casamento de Verdade. Belo Horizonte: Betânia, 1995. PURNELL, Dick. Como Construir um
Relacionamento Duradouro. São Paulo: Candeia, 1997, 2ª. Ed. DRESCHER, John. Começar de Novo... São
Paulo: Mundo Cristão, 1997. CLOUD, Henry. TOWSEND, John. Limites no Casamento. São Paulo: Vida,
1990. CHAPMAN, Gary. O Casamento que Você Sempre quis. São Paulo: Mundo Cristão, 2007. LEMAN,
Kevin. Transforme Seu Marido Até Sexta-Feira. São Paulo: Mundo Cristão, 2010. Embora acertem em muitas
coisas, erram nos pressupostos, pois levam mais em consideração a imposição sociológica do que as diretrizes
bíblicas.
49
necessidades e colocando a outra pessoa num patamar de “causador da nossa felicidade”,
estamos fazendo do cônjuge um ídolo. Não são poucas as vezes que os conselheiros cristãos
têm de lidar com casamentos destroçados porque simplesmente os pares “sentem” que suas
necessidades não estão sendo supridas. Não são poucas as vezes que lidamos com problemas
graves no casamento como adultério real e virtual, problemas com pornografia, porque o
marido ou a mulher não está suprindo as “necessidades” e um ou outro “se sente” só e
justificado em sua prática pecaminosa.
Deus não fez a mulher porque Adão se sentia só como quer a nossa sociedade
narcisista. A passagem não diz nada sobre os sentimentos de Adão. Deus criou a mulher não
porque Adão sentia solidão, mas para ajudá-lo a cumprir os mandatos cultural e social dos
quais falamos acima, a saber, crescer multiplicar, encher a terra e subjugá-la. E claro, ele não
poderia fazer isso sozinho. Não era para satisfazer uma necessidade psicológica
primeiramente, mas para cumprir o propósito da raça humana. Este propósito além de
glorificar a Deus, também traz satisfação ao ser humano. Por isso, quando homem e mulher,
mesmo não-crentes, entendem o propósito do casamento, tendo filhos e, sim, se deleitando
um no outro, na relação sexual, no companheirismo e nas atividades conjuntas eles também
gozam da felicidade do casamento. Então, quando casamos, temos filhos, subjugamos a terra,
estamos construindo o reino de Deus.
O que devemos fazer é buscar uma perspectiva teocêntrica do casamento. O homem é
um ser pactual conforme vemos nas Escrituras. Deus fez um pacto com Adão e Eva. E a
quebra desse pacto conforme veremos no capítulo 3 traz graves conseqüências para o
casamento.
Quando Deus criou Adão e Eva, fez com eles um pacto, já dissemos. Mas, o que é um
pacto? Um pacto ou aliança é um contrato firmado entre duas pessoas. Estas duas pessoas
podem ou não estar em pé de igualdade. Quando se trata de um pacto firmado entre seres
humanos, este é bilateral, há igualdade de ambas as partes. Entretanto, quando se trata do
pacto de Deus com os homens, não há igualdade de ambas as partes. O Dr. Mauro Meister,
indica que este ato é chamado pelos teólogos da aliança de ‘unilateral’, de ‘monergista’ ou
seja, iniciada e garantida por Deus nos seus termos 94 . Portanto, estamos falando de uma
aliança que não envolve um acordo de duas partes, no qual não existe negociação de direitos e
94
Outro termo teológico que é usado é sinergismo, que basicamente significa que há um esforço das duas partes,
de Deus e do homem. Esse terno não é usado na teologia reformada.
50
obrigações.95 “O pacto é uma expressão da vontade de Deus, não do homem, e o homem deve
aceitar as condições que se propõem, confiar em Deus em que [estas condições] são santas,
justas e boas, e ordenar sua vida em conseqüência disto”.96
Esse pacto consistia simplesmente em que o homem deveria cumprir perfeitamente o
mandamento de Deus. Assim fazendo ele seria justificado, desta forma, Deus lhe concederia
vida.
O casamento também tem uma linguagem pactual na Bíblia. Em Malaquias 2.14 por
exemplo, lemos que “...o SENHOR foi testemunha da aliança entre ti e a mulher da tua
mocidade, com a qual tu foste desleal, sendo ela a tua companheira e a mulher da tua aliança”.
Não se trata apenas de ir para uma bela cerimônia, trata-se dos votos, de um compromisso
permanente e exclusivo de compartilhar as vidas um com o outro na presença de Deus.
Vejamos os propósitos da instituição do casamento:
4.1. Expressar o amor e a bondade do Criador
Criados à imagem e semelhança de Deus, homem e mulher deveria no seu próprio
relacionamento expressar o amor e a bondade do Criador.
O homem e a mulher relacionavam-se entre si, manifestando este amor e bondade. A
autoridade que o homem demonstrava sobre ela, não era com autoritarismo, nem com motivos
escusos. Em outras palavras, demonstrava amor e bondade. O homem refletia assim, a
bondade e amor do Criador. De igual modo, a mulher demonstrava submissão sem desejo de
controlar o marido. A esposa refletia a vontade de Deus auxiliando, apoiando, e ajudando o
marido a desempenhar seu papel de como mordomo da criação, como Deus o havia colocado.
Ambos demonstravam submissão à ordem da criação.
Embora eles se relacionassem perfeitamente, o relacionamento deles não era um fim
em si mesmo. Havia um alvo mais elevado. Eles foram criados para expressar o amor e a
bondade de Deus (esse é o nosso ponto aqui). Na aceitação um do outro, no se dar um ao
outro eles demonstravam que Deus havia criado os seres humanos em santidade e para se
deleitarem com a presença um do outro, como Ele se relaciona consigo mesmo e agora
também com toda a criação. Na aceitação um do outro eles expressavam que Deus
bondosamente havia criado o matrimônio. Ficava claro que o casamento era uma dádiva de
95
MEISTER, Mauro Fernando. Artigo: Uma breve introdução ao estudo do Pacto. In Fides Reformata. Volume
III, nº. 01. Janeiro a Junho de 1998. p. 117.
96
MACHEN. J. Gresham. Visión Cristiana del Hombre. 1 ed. (Barcelona: El Estandarte de la Verdade, 1996),
p. 153. Tradução Própria.
51
um Deus amoroso e bondoso ao homem e à mulher. Foi com a entrada do pecado no mundo
que Adão e Eva reverteram esse pensamento.
Entretanto, mesmo depois da queda, e o conseqüente enfraquecimento dessa
expressão, ainda somos chamados a expressar o amor e a bondade do Criador. E a revelamos
quando nos aceitamos um ao outro, num modelo relacional fundamento em importantes
aspectos teológicos como a doutrina da justificação, por exemplo. Nela somos aceitos não
pelo que fazemos, não pelas nossas obras (Ef 2.8-10), mas somos aceitos por causa dos
méritos do nosso Redentor. “Por mais sério que fosse o pecado humano, a vida do Deushomem era tão boa, tão exaltada e tão preciosa que o seu oferecimento na morte pesa mais
que o número e a grandeza de todos os pecados, e a reparação devida foi feita à honra
ofendida de Deus”.97 Assim, devemos expressar nos nossos relacionamentos marido e mulher,
o amor e a bondade de Deus hoje, mesmo como seres caídos. “Ele nos aceitou como seus
filhos e nos aceita em sua família, não por causa do nosso desempenho, mas por causa de sua
graça. São essas as razões pelas quais nós aceitamos e amamos uns aos outros”.98
Quando assim agimos estamos revelando o amor e a bondade do Senhor e refletindo a
glória do Deus Trino que na criação do homem mostrou esse relacionamento consigo mesmo,
quando disse: “Façamos o homem à nossa imagem e semelhança”.
4.2. Expressar comunhão com o Criador
Essa comunhão com o Criador é algo estabelecido desde o início, quando Deus disse a
Adão e Eva que não deveriam comer da árvore do conhecimento do bem e do mal. Essa
comunhão expressa não apenas por Adão, mas pelos dois, Adão e Eva, deveria ser a
demonstração de um relacionamento íntimo e perfeito com Deus, uma relação de obediência,
de dependência e responsabilidade. Essa comunhão era demonstrada no fato de que eles
falavam com Deus na viração do dia.
Essa comunhão, ressaltamos, é estabelecida por Deus, visto que Deus os trouxe à
existência. “Deus estabeleceu um vínculo de vida e amor entre si próprio e o homem... Assim
como Deus deseja e ama, assim também o portador da sua imagem, o homem. E esse vínculo
de vida e amor funciona mutuamente, dinamicamente, significativamente e é frutífero...”99.
97
STOTT, John R. W. A Cruz de Cristo. 6ª reimpressão. São Paulo: Vida, 1999, p. 108.
HUNT, Susan. A Graça que vem do Lar. São Paulo: Cultura Cristã, 2002, p. 28.
99
GRONINGEN, Gerard. Criação e Consumação. O Reino, a Aliança e o Mediador, volume 1. São Paulo:
Cultura Cristã, 2002, pp. 84.
98
52
Essa comunhão não poderia ser estabelecida por Adão, visto que é unilateral e amorosamente
imposta pelo soberano Deus.
Como vimos, esse mandato espiritual é o relacionamento mais importante do homem.
O relacionamento com a criação e entre eles dependia diretamente desse.
“Deus sabia que apesar de Adão e Eva serem pessoas perfeitas, vivendo em um
relacionamento perfeito com Ele, sozinhos não podiam entender a vida. Fomos criados para
sermos dependentes. Deus teve de explicar a eles o que eram e o que deveriam fazer de
suas vidas. Eles não precisavam de Deus porque eram pecadores. Precisavam da ajuda de
Deus por serem humanos”.100
Quando Adão e Eva obedeciam o mandato social dentro dos padrões estabelecidos por
Deus, também expressam essa comunhão com o Criador.
Isso é absolutamente importante porque vivemos numa sociedade que tenta dar
significado a uma pessoa por meio de títulos, poder, posição e posses. Só encontramos
significado em Deus e somente nele. Ele nos criou assim, para sermos dependentes dele.
Num casamento, homem e mulher, não são primeiramente dependentes um do outro,
mas são criados para serem dependentes do próprio Deus, e expressam por meio da comunhão
um com o outro a comunhão que tem com o Criador. O homem foi criado para a glória de
Deus, pois “...o casamento é uma aliança estabelecida por Deus, e vivida diante de Deus, para
expressar simbolicamente a união de Deus e o seu povo por meio de um amor real. O
casamento humano expressa todos os dias simbolicamente a Aliança de Deus conosco...”101.
Ainda que nunca houvesse pecado o homem e sua mulher continuariam dependentes
de Deus, como dito acima.
Porém, mesmo com o pecado, os homens devem manifestar a sua comunhão com
Deus por meio do relacionamento conjugal. Quando os dois vivem dentro dos padrões de
Deus, como Adão e Eva viviam, eles testemunham que foram criados para ter comunhão com
o Criador.
Tudo o que o homem faz está relacionado a Deus.
4.3. Expressar culto e adoração ao Criador
Em Romanos 1.19 em diante Paulo mostra que o homem é um ser inerentemente
adorador. Em qualquer situação, em qualquer lugar, sob qualquer circunstância o homem é
um adorador. Lloyd-Jones diz que
100
101
TRIPP, Paul David. Instrumentos nas Mãos do Redentor. São Paulo: Nutra, 2009, p. 69.
GRONINGEN, Gerard. A Família da Aliança. São Paulo: Cultura Cristã, 1997.
53
“Os antropólogos e outros pesquisadores que têm investigado esse problema
produziram... importantíssima prova: as tribos mais primitivas entre os pigmeus, no coração
da África, tribos como os aborígines da Austrália e de certas partes do noroeste do
continente americano, onde quer que se encontre o povo mais primitivo que se possa
imaginar, mesmo ali se acha este senso de um Ser Supremo. É universal na natureza
humana”102.
Paulo continua explicando que, por causa da queda, o homem no seu raciocínio falho,
acaba adorando a criatura no lugar do Criador. “Os seres humanos são criaturas inerentemente
religiosas. Não podemos viver sem um Deus, mesmo que ele seja fabricado por nós.
Precisamos de um centro, de um foco supremo, de um ponto de orientação para nossa vida.
Temos de fato duas alternativas. Ou servimos ao Senhor e obedecemos à sua vontade, ou
praticamos idolatria em desobediência.103
Quando foi criado, Adão expressa em todas as suas relações essa adoração a Deus, no
cumprimento daquilo que Deus o havia ordenado.
No casamento isso é também verdadeiro e esperado. Quando Deus criou o homem e a
mulher para a sua glória, eles deveriam expressar seu culto a Deus por intermédio da sua
relação marido e mulher. Eles deveriam glorificá-los nas palavras pronunciadas um ao outro,
nas atitudes e até no ato sexual.
Ainda depois do pecado, conforme citado acima isso continua como estrutura. Não há
grupo de pessoas que adora e outro que não adora. Todos adoram a Deus ou a alguma coisa,
um ídolo.104
Tripp nos explica o quanto isso é abrangente nas nossas vidas, ele escreve:
Lloyd-Jones. Martin. Romanos 1 – O Evangelho de Deus. São Paulo: Publicações Evangélicas Selecionadas,
1998, p. 477.
103
WALSH, Brian J. MIDDLETON, J. Richard. A Visão Transformadora – Moldando uma Cosmovisão Cristã.
São Paulo, Cultura Cristã, 2010, p. 55. Essa também é a ideia de João Calvino. No primeiro livro das suas
Institutas da Religião Cristã, ele afirma que “no espírito humano há, por inclinação natural, certo senso da
Divindade... Ora, como os próprios pagãos a confessam, não existe nação tão bárbara, nenhum povo tão
selvagem que não tenha impressa no coração a existência de algum Deus. E, por outro lado, aqueles que parecem
não diferir quase nada dos animais irracionais, não obstante sempre conservam uma semente da religião, de tal
modo esta concepção universal arraigou-se em todos os espíritos e se fixou em todos os corações. Portanto, visto
que desde o princípio do mundo não há região nem cidade nem mesmo casa alguma que não tenha nada de
religião, nesse fato nós temos uma confissão tácita de que há um senso da Divindade gravado no coração de
todos os seres humanos. Até a idolatria nos serve de grande argumento em favor desta idéia. Porque sabemos
quanto o homem se tem humilhado, contra si mesmo, e em seu detrimento tem prestado honra a outras criaturas.
Pois lhe parece melhor cultuar a madeira e a pedra do que ter fama de que não tem nenhum deus, o que mostra
quão forte é este sentimento nele impresso da Majestade divina, impressão de tal modo difícil de apagar do
espírito humano que seria mais fácil eliminar os seus afetos naturais. Como certamente estes são eliminados
quando, da sua elevação e da sua presunção, o homem se rebaixa voluntariamente e se coloca abaixo das
criaturas menos nobres da terra a fim de prestar honra a Deus. CALVINO, João. Institutas, I.iii.1. São Paulo:
Cultura Cristã, 2002, p. 56. Ênfase acrescentada.
104
TRIPP, Paul David. Instrumentos nas Mãos do Redentor. São Paulo: Nutra, 2009, p. 74.
102
54
“O objetivo de Deus era que a adoração fosse a essência da motivação das nossas
vidas. Adão e Eva foram criados para que tudo em suas vidas ganhasse sentido e propósito
a partir da pessoa, presença e propósito de Deus. Chamamos isso de referência baseada na
pessoa de Deus. Por causa disso, tudo que um ser humano faz expressa adoração. O que
você faz e a maneira pela qual faz expressa seu desejo de servir a alguma coisa...” 105
No caso de nossos primeiros pais, não havia nenhuma distorção. Eles adoravam a
Deus e o cultuavam no seu relacionamento, pois como já discutimos anteriormente não havia
pecado no mundo.
Entretanto, apesar da queda, continuamos com a estrutura, porém com a direção
corrompida.
4.4. Um Propósito mais abrangente: Glorificar a Deus.
Esse aspecto está ligado a tudo quanto dissemos anteriormente. E Adão e Eva
obtiveram êxito ao fazer isso. Eles glorificavam a Deus enquanto não haviam caído em
pecado. Esse propósito supremo era evidenciado no relacionamento perfeito que eles viviam.
Abraham Kuyper nos ensina que
“se tudo o que é existe por causa de Deus, então se segue que a criação toda deve
dar glória a Deus. O sol, a lua e as estrelas no firmamento, os pássaros do céu, toda a
natureza ao nosso redor, mas, acima de tudo, o próprio homem que, como sacerdote, deve
fazer convergir para Deus toda a criação e toda a vida que se desenvolve nela. E embora o
pecado tenha insensibilizado grande parte da criação para a glória de Deus, a exigência – o
ideal, permanece imutável, que cada criatura deve ser submergida no rio da religião e
terminar por colocar-se como uma oferta religiosa sobre o altar do Todo-Poderoso”106.
Kuyper continua explicando que o quer que o homem faça, onde quer que ele vá, ele
está diante da face de Deus e deve objetivar a glória de Deus. A religião está entranhada no
ser humano. A humanidade é possessão de Deus. “Pois Deus não apenas criou todos os
homens, ele não apenas é tudo para os homens, mas sua graça também estende-se não
somente como uma graça especial ao eleito, mas também como graça comum (gratia
communis) a toda humanidade”107.
O propósito de que fomos criados para adorar a Deus é expresso no próprio fato da
criação. O salmo 19 diz: “Os céus manifestam a glória de Deus e o firmamento anuncia as
obras das suas mãos”.
105
Id. Ibid.
KUYPER, Abraham. Calvinismo. São Paulo: Cultura Cristã, 2004, p. 62.
107
Ibid. p. 63.
106
55
Mas, cremos que não apenas na criação, incluindo homem e mulher na aliança do
casamento (Ml 2.14), mas também na consumação, Deus será glorificado, porque esse é o
objetivo maior. Isso podemos ver claramente no livro de Apocalipse quando toda a igreja,
anjos, enfim toda a criação representada glorifica a Deus pelo que Ele é, e pelos seus feitos.
Paulo também sumariza isso com grande clareza: “porque dele, e por meio dele, e para
ele são todas as coisas. Glória pois a ele eternamente amém”. (Rm 11.36). Também em
Colossenses 2.16, aparece quase a mesma expressão.
Em Apocalipse 4. 11 lemos: “Tu és digno, Senhor e Deus nosso, de receber a glória, a
honra e o poder, porque todas as coisas tu criaste, sim, por causa da tua vontade vieram a
existir e foram criadas”.
Nossa Confissão de Fé diz que “Ao princípio aprouve a Deus o Pai, o Filho e o
Espírito Santo, para a manifestação da glória do seu eterno poder, sabedoria e bondade,
criar ou fazer do nada, no espaço de seis dias, e tudo muito bom, o mundo e tudo o que nele
há, visíveis ou invisíveis”. (Capítulo IV, seção 1, grifo meu).
O comentarista da Confissão de Fé, A. A. Hodge, diz que “...Nossa confissão, mui
explicitamente, assume a posição de que o fim principal de Deus, em seus eternos propósitos,
e em sua execução temporal da criação e providência, é a manifestação da sua própria
glória”108. E acrescenta que a manifestação dessa glória tem também a maior medida possível
de bem à criatura. Um comentário bem ao modo da primeira pergunta do Breve Catecismo:
“O fim principal do homem é glorificar a Deus e gozá-lo para sempre”.
Glorificar a Deus era o grande propósito da criação do primeiro casal e deve ser o
nosso grande propósito, mesmo quando as coisas não vão bem, quando a realidade é dura, e
quando o amor vacila109. É buscando não a nossa própria glória, mas nos submetendo ao que
Deus exige de nós que o atingimos o propósito de glorificá-lo. Esse propósito passa por
submeter o casamento e decisões ao critério da Palavra de Deus, a autoridade sobre o
casamento.
Desejamos ressaltar que cada aspecto do casamento tem referência a Deus. Ele o
institui na ordem da criação. “O casamento... é um vinculo sagrado entre um homem e uma
mulher, instituido por Deus e firmado diante dele (ainda que o casal não reconheça isso),
consumado normalmente pela relação sexual”.110
108
HODGE, A. A. Confissão de Fé de Westminster Comentada. São Paulo: Puritanos, 1999, p. 121.
HUNT, Susan. A Graça que vem do Lar. São Paulo: Cultura Cristã, 2002, p. 74.
110
KOSTENBERGER, Andreas J. Deus, Casamento e Familia. São Paulo: Vida Nova, 2011, p. 82.
109
56
Essa ênfase ao propósito do casamento, bem como de todas as coisas existentes, a
saber, trazer glória ao nome de Deus, deve ser posta para o bem da própria família, por razões
expostas acima. No casamento não estamos apenas frente a frente com o cônjuge. No
casamento estamos primeira e primordialmente frente a frente com Deus. E, “numa época em
que o matrimônio, mesmo entre os crentes, está ficando cada vez mais frágil e instável... em
que a maioria das crianças cresce ignorando, segundo os moldes pagãos, tanto a Deus quanto
às suas leis...”111 precisamos ensinar que o propósito principal, e por outro lado o que também
trará unidade ao casamento de dois pecadores, homem e mulher, “é a paixão singular pela
glória de Deus”.112
Sabemos que Adão e Eva não se submeterem ao propósito de Deus em revelar o amor
e a bondade, refletir a sua imagem, em suma, em glorificar a Deus. E, como veremos mais à
frente, mesmo tenhamos claro em nossa mente que o casamento deve almejar a glória de
Deus, não significa que os problemas acabarão. Os conflitos sempre existirão, até que Cristo
nos restaure completamente, porque somos pecadores casados com pecadores.
Com a queda o homem tende a olhar para dentro de si mesmo, ao invés de para fora.
Torna a si mesmo o referencial. Ele se assume como centro do universo ao invés de aceitar
que Deus é o criador e Sustentador de todas as coisas e, conseqüentemente o centro de todas
as coisas113.
PACKER, J. I. Entre os Gigantes de Deus –Uma visão Puritana da Vida Cristã. São Bernardo dos Campos:
Fiel, 1996, p. 280.
112
HUNT, Susan. A Graça que vem do Lar. São Paulo: Cultura Cristã, 2002, p. 91.
113
SCHAEFFER, Francis A. Verdadeira Espiritualidade. São Paulo: Cultura Cristã, 2008, p. 189.
111
57
QUESTIONÁRIO
1. Qual o problema dos livros que não tratam o livro dentro do arcabouço do pacto?
2. Do ponto de vista do autor, para que o casamento foi dado por Deus aos homens?
Você concorda com ele? Explique.
3. Por que o pacto de Deus com o homem não pode ser considerado sinergista, mas
monergista?
4. Qual o primeiro propósito da instituição do casamento?
5. Como, nos seus papéis, homem e mulher expressam o amor e a bondade de Deus?
6. Qual o segundo propósito da instituição do casamento?
7. Como homem e mulher expressam por meio do casamento a comunhão com e a
dependência de Deus?
8. Qual o terceiro propósito da instituição do casamento?
9. Qual o quarto propósito da instituição do casamento?
10. Por que glorificar a Deus é o propósito mais abrangente da instituição do
casamento?
58
LIÇÃO 5: OBSTÁCULOS AO PROPÓSITO DO CASAMENTO (QUEDA)
INTRODUÇÃO:
A Confissão de Fé de Westminster faz menção ao pacto das Obras (Capítulo VII,
seção II) dizendo: “O primeiro pacto feito com o homem era um pacto de obras; nesse pacto
foi a vida prometida a Adão e nele à sua posteridade, sob a condição de perfeita obediência
pessoal”.
É importante, entretanto, salientarmos que Deus não tinha obrigação nenhuma de dá
vida ao homem, mesmo o homem cumprindo a sua parte. Deus como criador poderia exigir
isto do homem como um direito que Lhe cabia. Deus concederia vida ao homem como dádiva
e não como obrigação. J. Gresham Machen afirma: “...[Deus] não tinha obrigação nenhuma
de fazê-lo (de conceder vida), exceto no sentido em que todas as ações de Deus estão
vinculadas necessariamente à bondade infinita do seu próprio ser”.114 Esta é uma das razões
pelas quais os teólogos não gostam de falar de “Pacto das Obras”.115
Assim, pois, este pacto das obras que Deus fez com o homem foi algo gracioso,
gratuito. Ele continha uma possibilidade de morte, mas também uma promessa de vida eterna.
Se passasse pela tentação haveria vida; caso contrário haveria morte.
Assim diz o texto sagrado: “E o Senhor lhes deu esta ordem: De toda árvore do jardim
comerás livremente, mas da árvore do conhecimento do bem e do mal não comerás; porque
no dia em que dela comeres certamente morrerás.” (Gn 2. 16-17).
Adão e Eva, entretanto, escolheram a alternativa errada. Tomaram o caminho errado.
Ao pecar saíram do estado em que foram criados; escolheram o caminho da morte.
A serpente tentou a Eva dizendo que Deus dera aquela ordem porque sabia que quando
eles comessem seriam como Ele, seriam conhecedores do bem e do mal (Gn 3. 5). E o próprio
texto narra o que aconteceu a partir de então. “Vendo a mulher que a árvore era boa para se
comer, agradável aos olhos e árvore desejável para dar entendimento, tomou-lhe do fruto e
comeu e deu também ao marido, e ele comeu” (vs. 6). Em outras palavras quebraram o pacto
que Deus havia feito.
Como resultado desta decisão e da perda do estado em que havia sido criado, o homem
perde a comunhão com Deus.
114
MACHEN. J. Gresham. Visión Cristiana del Hombre. Barcelona: El Estandarte de la Verdade, 1996, p. 154.
Tradução Própria.
115
Ver HOEKEMA, Anthony. Criados à imagem de Deus. São Paulo: Cultura Cristã, 2004, p. 137-139. Ver
também ROBERTSON, o. Palmer. O Cristo dos Pactos. São Paulo: Cultura Cristã, 2011, 2ª. Ed.
59
Vemos que Deus dá uma ordem para não comerem da árvore que estava no meio do
jardim. E eles quebraram essa ordem, acendendo assim a ira de Deus, que é tão puro de olhos
que não pode ver o mal (Hb 1.12).
Porém falar em pecado em nossos dias e mesmo defini-lo não é tarefa fácil. O homem
moderno costuma ver o pecado como uma espécie de doença ou instabilidade. A cura pode,
naturalmente, ser encontrada com a terapia individual, a catarse, e não com o arrependimento
tendo como base um sacrifício. Pecado é até definido na atualidade como uma invenção da
igreja para levar as pessoas à igreja e ao arrependimento.
Pecado, entretanto, “é deixar-se de se conformar à lei moral de Deus, seja em ato, seja
em atitude, seja em natureza. O pecado é definido em relação a Deus e sua lei moral. Inclui
não só atos individuais, como roubar, mentir ou cometer homicídio, mas também atitudes
contrárias àquilo que Deus exige de nós”.116
Quando o homem peca é uma declaração silenciosa de que não quer estar na condição
de criatura, não quer ser dependente de ninguém em sentido algum. Quando o homem peca
está querendo a sua liberdade, a sua autonomia, a sua libertação de todas as ordens, todos os
mandamentos que Deus colocou sobre ele. Desta perspectiva pecado é uma revolta contra
Deus, contra as Suas leis; é hostilidade; é vontade sutil de estar no lugar de Deus.
Não há que se duvidar que o pecado é um desafio à santidade de Deus e a Ele próprio;
é arrogância e desejo de ser igual a Ele. Pecado é afastamento de Deus, uma ofensa a Ele.
Esta é também a posição de Agostinho com relação ao pecado. Ele via Adão como um
homem que possuía dotes intelectuais inigualáveis, que se encontrava num estado de
justificação, iluminação e bem-aventurança. Agostinho fala também da liberdade do homem,
não no sentido de incapacidade de pecar, mas de capacidade de não pecar. A vontade do
homem dedicava-se a cumprir os mandamentos de Deus, sendo, portanto, sua vontade boa.
Quando o homem cai, Agostinho aponta, o erro é inteiramente humano, enfatizando
que Deus não poderia ser, em hipótese alguma, o autor do pecado, visto que Ele cercou o
homem de todas as vantagens possíveis dando-lhe apenas uma proibição. Agostinho
asseverava que toda a culpa deve recair sobre o homem, e o fundamento do seu ato
pecaminoso foi o orgulho, o desejo de romper com Seu mestre natural, Deus, e de ser seu
próprio mestre; tomar as rédeas da sua vida; viver independente; o anseio de substituir Deus
pelo seu próprio ego.117
116
117
GRUDEM, Wayne. Teologia Sistemática. São Paulo: Vida Nova, 1999, p. 403.
KELLY. J. N. D. Doutrinas Centrais da Fé Cristã. São Paulo: Vida Nova, 1999, p. 273-274.
60
O pecado de Adão e Eva tem implicações para tudo quanto mencionamos no capítulo
2. Tudo o que era perfeito foi afetado pelo pecado humano.
5.1. Pacto e Idolatria: circunstâncias, propósito e pacto revertidos
Apesar de Deus ter cercado Adão e Eva das circunstâncias ambientais perfeitas;
circunstâncias sociais perfeitas; circunstâncias morais perfeitas e das circunstâncias espirituais
perfeitas, eles acabaram, como vimos acima, quebrando o mandamento de Deus e se fazendo
reprováveis.
Adão e Eva, mediante a astúcia e tentação de Satanás deixaram de obedecer a Deus. A
partir de então, o relacionamento com Deus já não era mais perfeito. “Eles se esconderam de
Deus. Eles estavam temerosos. Não existia mais um amor verdadeiro, espontâneo no
relacionamento eu-você. A humanidade havia se desviado, homem e mulher haviam caído.
Eles quebraram o mandamento espiritual de Deus...”.118
O termo para esse acontecimento na teologia é queda. Quando no capítulo 2 falamos a
respeito dos mandatos espiritual, social e cultural mencionamos que esses mandatos estão
entrelaçados. O homem é essencialmente ligado a Deus119 e, assim, na quebra da relação com
Deus, as outras relações mencionadas nos mandatos também ficam prejudicadas. O
relacionamento homem-Deus foi quebrado. O relacionamento homem-homem foi quebrado.
O relacionamento homem-cosmos também foi quebrado.
Com a queda, os laços familiares se dissolvem no ácido da autonomia pessoal120. A
autoridade do homem não é mais benéfica nem voltada para a proteção feminina. Mas é
voltada para si mesmo. E a submissão feminina é voltada para a luta de poder. “O pecado que
prende nosso coração faz tudo mais difícil. Ele transforma o amor em desejo egoísta. Tira a
segurança do lar, que é ordenada por Deus, e transforma o lar num lugar onde as dores
humanas mais profundas podem acontecer”121. Essa temática é vista logo no início da Queda,
quando Deus pronuncia o seu julgamento sobre o pecado humano.
5.1.1. Propósito corrompido: começa a luta pelo poder.
118
GRONINGEN, Gerard Van. A Familia da Aliança. São Paulo: Cultura Cristã, 1997, pp. 194.
OLIVEIRA, Fabiano de Almeida. Reflexões Críticas sobre Weltanschauung: Uma Análise do Processo de
Formação e Compartilhamento de Cosmovisões numa Perspectiva Teo-Referente. Artigo distribuído em sala de
aula, em Agosto de 2008, p. 11.
120
PEARCEY, Nancy. Verdade Absoluta – Libertando o Cristianismo do Seu Cativeiro Espiritual. Rio de
Janeiro: CPAD, 2006, p. 150.
121
TRIPP, Paul David. Instrumentos nas Mãos do Redentor. São Paulo: Nutra, 2009, p. 23.
119
61
Quando Adão e Eva pecaram, lançando mão da árvore do conhecimento do bem e do
mal, quebrando o pacto com Deus houve uma mudança na direção. Ao invés da busca da
glorificação do nome de Deus, estabelece-se a busca pela própria glória, uma tentativa de
estabelecimento do próprio reino.
A queda corrompe todo o propósito de Deus para o casamento. Corrompe, mas não
anula, precisamos ressaltar. Em Gênesis 3.16, vemos uma das maldições pronunciadas por
Deus. Essa diz respeito ao relacionamento marido e mulher. Aqui começa a luta pelo poder no
casamento. Aqui começa o governo autoritário do marido sobre a esposa e a tentativa
constante da esposa de liderar o relacionamento.
Eva quereria usurpar o direito de Adão de governá-la e Adão forçaria esse direito até à
maneira do autoritarismo. A maldição pronunciada por Deus por causa do pecado humano
atinge em cheio o relacionamento perfeito que mencionamos anteriormente.
Vale lembrar, entretanto, que a extensão da queda não é apenas no casamento, mas
estende-se a toda a criação. Vemos isso configurado na arte, nos negócios, na política, na
exploração da criação, na forma como a lei é aplicada, na música, etc. Porém o que nos toca
nesse trabalho é que o pecado trouxe problemas ao casamento e ao seu propósito.
Ao invés de um relacionamento pacífico, amoroso, sem egoísmo, ofensa ou engano;
ao invés de um relacionamento harmonioso e cheio de significado, porquanto cumpria o
propósito de glorificar a Deus, por meio da ajuda mútua; o relacionamento humano se tornou
um campo de batalhas. Os dois estão lutando por poder. Os dois estão lutando para terem os
seus desejos satisfeitos. É o preço do pecado.
O desejo de governar a si mesmo, tanto no homem como na mulher é apresentado logo
em seguida à queda.
“Adão e Eva escolheram o autogoverno em lugar do governo de Deus. A Queda
separou Adão e Eva de Deus, e, portanto, de sua razão de existir. Não puderam mais refletir
a glória de Deus. Refletiam culpa e vergonha... Quando Deus entrou no jardim, em vez de
correr para saudá-lo, esconderam-se. Quando o Senhor os interrogou começaram o jogo de
culpar um ao outro”122.
Vamos dar uma olhada no texto de Gênesis 3.16-17 para analisarmos mais de perto
como a queda afeta a Aliança da Criação123. Aqui, embora toquemos nos aspectos do mandato
cultural e espiritual, naturalmente nos interessa mais o mandato social que está diretamente
ligado ao casamento.
122
123
HUNT, Susan. A Graça que vem do Lar. São Paulo: Cultura Cristã, 2002, p. 68.
Também chamado de Pacto das Obras.
62
Albert Wolters diz que
No nosso mundo, não é difícil encontrar exemplos desses efeitos difundidos da
queda; A sociedade está repleta desses exemplos. A instituição criacional do casamento está
sob ataque especial no Ocidente contemporâneo – o divórcio e a monogamia (sic) em série
são exemplos da perversão e da violação do bom desígnio de Deus para a vida da
criatura124.
Porém, esses efeitos já começaram a ser sentidos imediatamente após a queda.
Em Gênesis 3.16, Deus falou com a mulher depois de pronunciar sua maldição à
serpente. O texto diz: “E à mulher disse: Multiplicarei sobremodo os sofrimentos da tua
gravidez; em meio de dores darás à luz filhos; o teu desejo será para o teu marido, e ele te
governará”.
Pelo menos dois aspectos se sobressaem aqui:
1. A gestação e o ato de dar à luz filhos da mulher seriam em meio às dores.
2. A sua relação com o marido também seria, a partir de agora com mais sofrimentos.
Ele diz: “o teu desejo será para o teu marido e ele te governará”. Algumas vezes estas
palavras são interpretadas como sendo uma sujeição forçada e completa ao marido, crendo
que isso não existia antes125; ou que o desejo do qual fala o texto tem a ver com o desejo
sexual, como se o marido a fosse subordinar sexualmente.
Porém cremos que nenhuma das alternativas faz jus ao texto. Em Gênesis 4, a palavra
“desejo” aparece outra vez, referindo-se aos desejos pecaminosos de Caim. Temos nesse texto
“a estrutura quiasmática da frase de termos pares “desejo” e “domínio”, pressupondo que seu
desejo (da mulher) será dominar”126.
O desejo da mulher seria de dominar o seu marido, portanto. O. Palmer Robertson
concorda. “A mulher “desejará” seu marido”, escreve ele, “não no sentido de dependência
excessiva, mas no sentido de determinação excessiva de dominar. Seu desejo será possuí-lo,
dominá-lo... o desejo será dirigido no sentido de domínio do seu marido”127.
Nessa luta, Deus diz algo também acerca do homem na palavra que é dita à mulher.
“ele te dominará” (conforme ARC). A mulher por causa da queda tentará exercer
indevidamente o papel de liderança e em contra partida o marido reage a essa tentativa
exagerando a sua autoridade, tendendo ao autoritarismo.
124
WOLTERS, Albert. Criação Restaurada. São Paulo: Cultura Cristã, 2006, p. 63.
DOUGLAS, J. D. O Novo Dicionário da Bíblia. São Paulo: Vida Nova, 1983.
126
WALTKE, Bruce K. Gênesis. São Paulo: Cultura Cristã, 2010, p.112.
127
ROBERTSON, O. Palmer. O Cristo dos Pactos. São Paulo: Cultura Cristã, 2011, p. 88.
125
63
Homem e mulher deixam de desfrutar a presença um do outro e passam a um conflito
porque a ordem criada estava agora sob maldição. Apesar de Deus os ter criado para espelhar
o caráter de Deus e serem felizes, eles agora, por causa do pecado, tinham um referencial em
si mesmo. Daí a luta pelo poder.
As palavras agora são de acusação. A expectativa é de se desculpar com Deus. Cada
um livrando a si mesmo. “...a mulher que tu me deste...”. Cada um tentando se justificar. E
para isso acusando o outro.
“Por causa da queda em pecado, a relação harmoniosa entre marido e mulher se
corrompeu. Ao invés daquele relacionamento peculiar em que, ainda que o marido seja o
cabeça da mulher e que ele ocupe um papel de liderança no casamento, sua mulher, não
obstante, permanece ao seu lado numa posição de igualdade, como “uma auxiliadora
idônea” (Gn 2.20), a mulher agora estará subordinada ao seu marido numa condição de
servidão e subserviência. Por causa do pecado, o governo do marido sobre a esposa tenderá
a se tornar tirânico e dominador”128
A harmonia foi perdida. As relações maritais sofrem sobre o efeito do pecado. O
mundo perfeito e as relações perfeitas ficaram para trás. O matrimônio deixou de ser um lugar
de unidade e cooperação mútua.
5.1.2. Autonomia e egorreferência - a incapacidade de servir aos propósitos de Deus
A teologia reformada considera a queda humana como um ato de autonomia e rebelião
contra a pessoa de Deus porque a partir da queda o desejo humano é sempre voltado para si
mesmo. Os homens tendem a olhar para si mesmos como o referencial para todas as coisas,
como veremos abaixo. Marido e mulher “batem cabeça” por conta dessa autonomia e
egorreferência, porquanto “...só existem dois modos de vida: a vida de pecado... voltada para
o próprio eu, e a vida de santidade, que se volta para Deus e para o mandamento divino”129.
Por essa razão, tentar aconselhar casais nessa condição tendo como pressupostos a bondade
inerente ao homem, neutralidade moral ou considerando que o seu principal problema é o
ambiente não tocará no real problema130.
Lembremos que quando Deus criou Adão e Eva eles eram perfeitos. Porém quando
pecou contra Deus eles tornaram-se escravos do pecado.
Há vários textos bíblicos que demonstram a verdadeira condição do homem.
128
HOEKEMA, Anthony. Criados à imagem de Deus. São Paulo: Cultura Cristã, 2004, p. 154.
ADAMS, Jay E. Manual do Conselheiro Cristão. São Bernardo do Campo: Fiel, 6ª. Ed. 2006, p. 118.
130
GOMES, Wadislau Martins. Aconselhamento Redentivo. São Paulo: Cultura Cristã, p. 15.
129
64
Paulo diz, por exemplo, que o homem nada entende nem busca a Deus (Romanos
3.11); diz também que os homens não podem entender as coisas espirituais porque estas lhes
são loucura (1 Co 2.14); diz que o homem está morto nos seus delitos e pecados (Ef 2.1); que
ele é inimigo de Deus (Rm 8.7) e que Satanás os cegou (2 Co 4.4).
E Paulo também afirma que os homens sem Cristo são escravizados por Satanás (Ef
2.3 e Cl 1.13 – o homem sem Cristo está no “império das trevas”).
O que se nos apresenta claramente é que com a queda de Adão todos os homens foram
afetados; o pecado tornou-se universal (ver também Rm 5.10ss). Como diz o Salmo 51 depois
da queda de Adão todos os homens nascidos de mulher são nascidos em pecado, com uma
natureza pecaminosa, com exceção, naturalmente, do Senhor Jesus Cristo. Davi diz: “Eu nasci
em iniqüidade e em pecado me concebeu minha mãe”.
A Confissão de Fé de Westminster declara que depois de cair do seu estado original os
nossos primeiros pais transmitiram o seu pecado a toda humanidade. Isto é assim expresso:
Sendo eles [Adão e Eva] o tronco de toda a humanidade, o delito de seus
pecados foi imputado a seus filhos; e a mesma morte em pecado, bem como a
natureza corrompida, foram transmitidas a toda a sua posteridade, que deles
procede por geração ordinária.
Desta corrupção original, pela qual ficamos totalmente indispostos, incapazes
e adversos a todo o bem e inteiramente inclinados a todo o mal, é que
procedem todas as transgressões atuais.131
O Catecismo de Heidelberg também expressa isto nas perguntas 6 e 7, mostrando que
o pecado de Adão atingiu a toda humanidade:
P. 6 – Criou Deus o homem assim mau e perverso?
R – Não. Ao contrário Deus criou o homem bem e à sua imagem, isto é, em
verdadeira justiça e santidade, a fim de que ele conhecesse corretamente a
Deus como seu Criador, o amasse de todo o coração e vivesse com ele em
eterna bem-aventurança.
P. 7 – De onde vem esta corrupção da natureza humana?
R – Da queda e da desobediência dos nossos primeiros pais, Adão e Eva, no
jardim do Éden; pelo que a nossa vida humana foi de tal modo envenenada
que todos nós somos concebidos e nascidos em pecados”.132
O ser humano, por conta da Queda, só pensa em si e em como se agradar; não pensa
em como agradar a Deus e tributar-lhe o seu amor. Só pode mudar de atitude mediante a ação
do Espírito Santo de Deus. Os homens estão assim numa relação de inimizade contra Deus. A
131
CONFISSÃO DE FÉ DE WESTMINSTER. Sobre a Queda. Parag. III e IV. 3 ed. São Paulo: Cultura
Cristã, 1997.
132
LIVRO DE CONFISSÕES. Catecismo de Heidelberg. São Paulo: Missão Presbiteriana do Brasil Central,
1969.
65
nossa condição é uma condição da mais completa incapacidade de nos achegarmos a Deus a
não ser por meio de Cristo. Somos rebeldes a Ele, hostis, queremos o Seu lugar, queremos nos
tornar senhores de nós mesmos, queremos destituir Deus da Sua condição de Criador. Porém
esse desejo de autonomia esbarra no fato de que Deus é soberano sobre todas as coisas. E o
homem jamais deixará de viver Coram Deo.
Apesar disso, não nos apresentamos ante o tribunal de Deus como culpados. Sempre
achamos que a culpa dos nossos problemas estão nas outras pessoas. Damos um brado de
indignação quando achamos que o nosso cônjuge fez algo errado contra nós. Obviamente isso
também é fruto da egorreferência. É a conseqüência natural de nos colocarmos no lugar de
Deus. “O inimigo dessa união é o orgulho. Foi o orgulho que entrou sorrateiro no coração de
Eva e fez com que ela declarasse a sua independência. Autonomia nunca produz unidade...”133
No casamento estamos sempre pensando: “o que é melhor para mim?”. “Como posso
satisfazer minhas necessidades nessa situação?”. “O que ganho se eu fizer isso?” Quando
Adão e Eva pecaram, acreditaram na mentira de Satanás de que a autonomia era melhor do
que a dependência absoluta de Deus; desafortunadamente creram que poderiam alcançar plena
felicidade sem Deus. Criaram o próprio reino. Deixaram o lugar de vida e inauguraram um
lugar de morte. “[Adão] ...abandonou a glória transcendente para a qual foi criado e escolheu
uma glória substituta: a de tomar para si a glória que só Deus deveria ter. [Criou um mundo]
que não tem o oxigênio do relacionamento com Deus. Não é um lugar de vida. É um lugar de
morte. ...A palavra para isso é autonomia”134.
Na autonomia (o desejo de ser livre, sem referência a Deus) e egorreferência (o eu
como referencial ao invés de Deus) substituímos a soberania e controle de Deus sobre as
nossas vidas pelo desejo de que nosso cônjuge (e todas as coisas) se submeta ao nosso
controle. Caímos no engodo de que não dependemos de ninguém. Nos justificamos apontando
para “o bem” que fazemos ao nosso cônjuge. Nesse aspecto sempre nos esforçamos para
mostrar ao cônjuge o quanto ele é pecador, e nos magoa e não nos considera importante.
Deixamos de examinar o nosso próprio coração e, inexoravelmente nos tornamos críticos
quanto aos outros na mesma medida em que temos uma visão bem amistosa com relação a
nós mesmos. Assim, o resultado é que deixamos de amar a Deus e ao próximo, e passamos a
133
134
HUNT, Susan. A Graça que vem do Lar. São Paulo: Cultura Cristã, 2002, p. 80.
TRIPP, Paul David. Em Busca de Algo Maior. São Paulo: Cultura Cristã, 2011, p. 43.
66
amar apenas a nós mesmos e abusarmos das pessoas em busca daquilo que acreditamos trará a
nossa felicidade135.
Essa é a forma como o pecado afeta o nosso casamento.
5.1.3. Deus versus ídolos: a perda do referencial
O homem foi criado bom, se rebelou e, mudou o referencial de Deus para si mesmo
(egorreferência). Nessa rebelião ao invés de orientado para Deus, é orientado para um ídolo.
O relacionamento estabelecido com Deus é quebrado, os seus planos e caminhos rejeitados e
outro plano é colocado no lugar do de Deus.
Essa perda do referencial acarreta na predisposição em colocar ídolos no lugar de
Deus. Nessa troca, como conseqüência da tentativa de ocultar os nossos pecados e nos
justificar a nós mesmos, batizamos os nossos ídolos com os nomes mais rebuscados possíveis
para dar uma áurea de significado.
Não esqueçamos do que já dissemos anteriormente: que o ser humano é
fundamentalmente uma criatura adoradora. Adão e Eva criados para adorar a Deus, revertem
esse essencial aspecto mudando-lhe a direção. “Deus criou todas as coisas boas para a sua
glória... Logo, a finalidade e a realização de todas as coisas é convergir para esse propósito (a
glória de Deus). O homem só pode se realizar vivendo de conformidade com este
propósito”136.
David Powlison faz uma acurada e sucinta análise da condição da idólatra do ser
humano. A citação é longa, mas vale a pena citá-la, visto que ele nos mostra que o apelo às
necessidades é uma forma travestida de idolatria.
...Pessoas não têm “necessidades”. Temos mestres, senhores, deuses, sejam
eles nós mesmos, outras pessoas, objetos, Satanás...
Quando as estruturas fundamentais da psicologia são “batizadas” por
cristãos, continua perdido o fundamental “ao invés de Deus” que permeia as
motivações humanas. Por exemplo, muitos conselheiros cristãos tornam absoluta a
necessidade ou anseio por amor. Como seres humanos observadores, percebem
acuradamente que pessoas caídas e sob maldição são impulsionadas a procurar
estabilidade, amor, aceitação e afirmação, e que nos voltamos aos ídolos vazios à
procura dessas bênçãos. Como cristãos comprometidos, freqüentemente queremos
levar pessoas a confiar em Jesus Cristo em vez de confiar em ídolos. Mas, acabam
introduzindo uma necessidade relacional a priori e unitária, como um anseio
135
TRIPP, Paul David. Relacionamentos: Uma confusão que vale a pena. São Paulo: Cultura Cristã, 2011, pp
38-45.
136
OLIVEIRA, Fabiano de Almeida. As Etapas Constitutivas de Nossa Cosmovisão Cristã.: Texto não
publicado, entregue em sala de aula.
67
embutido ou um tanque vazio de amor como arcabouço subseqüente divisão que o
coração faz entre fé e idolatria.
Batizam essa “necessidade” descrevendo-a como criação de Deus. A
idolatria torna-se um meio impróprio de preencher uma necessidade legítima, e
nosso fracasso em amar os outros torna-se produto de necessidades não realizadas. O
Evangelho de Jesus Cristo redefine-se como um meio de preencher necessidades
legítimas. Em tal teoria a idolatria é secundária, instrumento para a satisfação de
necessidades. Essa satisfação é construída de forma a ser o conteúdo principal das
boas novas de Deus em Cristo. Biblicamente, contudo, a idolatria é o principal fator
motivacional. Falhamos em amar as pessoas porque somos idólatras que não amam a
Deus nem ao próximo. Tornamo-nos objetivamente inseguros porque vivemos sob a
maldição de Deus e porque os outros estão na mesma condição egocêntrica que nós.
Criamos e experimentamos afastamento de Deus e dos outros. O amor a Deus nos
ensina arrependimento da “necessidade de ser amados”, vendo isto como um desejo
descontrolado, aprendendo assim a amar em vez de sermos consumidos pela luta por
conseguir amor.137
Na continuação, Powlison mostra que esses padrões de pensamentos ou de
comportamento têm um aspecto adorador. A motivação por trás disso é a idolatria. Um deus
além de Deus, o Soberano e Criador de todas as coisas. Citando o exemplo de psicólogos
humanistas e existencialistas, pregadores singulares da “necessidade de segurança” que
permeia todo o ser humano, o autor mostra que por trás disso existe um comportamento
religioso. Assim, ele afirma que quando nos movemos nessa direção somos idólatras porque
esperamos aprovação das pessoas. E arremata: “Não sou “motivado por um desejo
incontrolável por segurança”. Sou “motivado por um desejo incontrolável de segurança ao
invés de ser controlado por Deus”138.
Calvino também diz que todos somos culpados de idolatria. Nas Institutas, livro I ele
afirma: “Quando narra ele [Moisés] que Raquel havia furtado os ídolos do Pai [Gn 31.19], não
fala de outra forma senão de um vício generalizado. Do quê é lícito concluir que a imaginação
do homem é, por assim dizer, uma perpétua fábrica de ídolos”139.
Todos têm ídolos no coração embora quase sempre pensemos em ídolos como
imagens de escultura pregadas na parede. Porém, “um ídolo é qualquer coisa além de Deus da
qual dependemos para sermos felizes, realizados ou seguros”.140. É, em outras palavras algo
em que colocamos o nosso coração, que nos motiva, domina ou controla. “Em suma, é algo
que amamos e seguimos em lugar de Deus”141.
137
POWLISON, David. Ídolos do Coração e Feira das vaidades: Vida cristã, motivação individual e
condicionamento sociológico. Brasilia: Refúgio, 1996. p. 40, 44-45.
138
Ibid., p. 43.
139
CALVINO, João. As Institutas da Religião Cristã. Trad. Waldyr Carvalho Luz. 2 ed. São Paulo: Cultura
Cristã, 2006, I.xi.8, p. 123.
140
SANDE, Ken. Os conflitos no lar e as Escolhas do pacificador. São Bernardo do Campo: Nutra Publicações,
2011, p. 38
141
Ib. Ibid.
68
Esses ídolos assumiram o lugar de Deus no Éden, quando, repito a direção da adoração
foi mudada por causa da queda. Adão e Eva passaram a viver sob pensamentos, anseios,
expectativas falsas em lugar do verdadeiro Deus. Os ídolos nos levam a ignorar o verdadeiro
Deus e buscar o que pensamos serem nossas necessidades142.
Walsh define a idolatria como sendo “...essencialmente, uma declaração de autonomia
e independência de nosso Criador, nossa rejeição de seu reino legítimo”.143
Fabiano de Oliveira trabalha num tom mais bíblico-filosófico a questão da idolatria.
Ela afirma que “mesmo as coisas mais comuns e triviais da vida humana são religiosamente
qualificadas, pois também têm em Deus seu ponto de referência último”144. Estruturalmente, o
homem é religiosamente orientado para Deus em dependência absoluta. Confiar nele e em sua
Palavra dependia a sua realização. 145 Porém este estado de coisas, por causa da queda, dá
lugar à idolatria.
“A partir do relato da Queda em Gênesis 3, é possível afirmar que o amor último
do homem a Deus e sua fé na Palavra divina sofreram um deslocamento radical após
capitular diante dos ardis da serpente, ao sucumbir à tentação de ser como Deus e de
desconfiar da fidelidade de sua Palavra (Gn 3.4-6).146.
No casamento, essa idolatria toma forma na sexualidade, no controle do outro, no
divórcio por incompatibilidade de gênios e coisas semelhantes, no estabelecimento do próprio
reino. Qualquer casamento, desafortunadamente, representa em variadas formas o quanto o
pecado desfigurou a nossa relação com Deus e com o próximo.
142
FITZPRATICK, Elyse. Ídolos do Coração. São Paulo: ABCB: Associação Brasileira de Conselheiros
Cristãos, 2009, p. 25.
143
WALSH, Brian J. MIDDLETON, J. Richard. A Visão Transformadora – Moldando uma Cosmovisão Cristã.
São Paulo, Cultura Cristã, 2010, p. 56.
144
OLIVEIRA, Fabiano de Almeida. Diagnosticando os Sintomas do Nosso Tempo: Parte 1 – Um ensaio
Crítico Sobre os Ídolos da Modernidade. Fides Reformata XVI, nº 2 (2011), p. 54.
145
Ibid, p. 56.
146
Ib. Ibid.
69
QUESTIONÁRIO
1. O que é o pacto das obras? Por que alguns teólogos não gostam do termo?
2. O que quer dizer o termo teológico queda?
3. Qual é a definição de pecado do texto? Você concorda com ela?
4. Como o pecado torna o casamento um campo de batalha?
5. Como ele afeta especificamente os papéis de autoridade e submissão?
6. O que é autonomia e egorreferência?
7. De forma prática como a autonomia e a egorreferência afetam o casamento?
8. Por que o homem, por causa do pecado, está sempre em busca de ídolos?
9. Por que Calvino diz que a imaginação do homem é uma perpétua fábrica de ídolos?
10. Por que os ídolos são proibidos? Que conseqüências ele tem para o casamento?
70
LIÇÃO 6: TEORREFERÊNCIA NEGATIVA NO CASAMENTO
A teorreferência pode ser positiva ou negativa conforme já explicamos no capítulo 1.
A teorreferência, dito de forma simples, é o conceito de que o homem não pode fugir da
realidade de que Deus é o seu ponto de referência para todas as coisas. Ela se revela na
tentativa de emancipação de Deus e na constante rebelião contra sua Palavra. No caso do
homem caído, ele precisa da ação do Espírito de Deus operando pela Palavra para livrar-se
dessa rebelião147. Nessa parte do capítulo, trataremos como a teorreferência negativa concorre
para tornar o casamento uma associação de desentendimento, brigas e dificuldades entre
marido e mulher, onde cada um tenta estabelecer o seu próprio reino manipulando, acusando,
questionando, numa tentativa de colocar a si mesmo como ponto de referência. O cristão sabe
pelas Escrituras e por experiência que ainda existe um mal dentro de si (Rm 7).
6.1. Estabelecendo nosso próprio reino – o engano do coração
Nesse ponto devemos lembrar que o homem foi criado por Deus como sua imagem e
semelhança. Ele deveria refletir a glória de Deus em cuidar do jardim, desenvolver a cultura,
bem como cumprir o mandato social. Sabemos, entretanto, que o pecado, como dito acima
lançou isso por terra. A terra foi amaldiçoada e o homem e a mulher começaram a ter
problemas de relacionamentos.
Quando um homem e uma mulher se casam eles levam para os seus casamentos todos
esses problemas elencados acima. É a união de dois pecadores, que, obviamente manchados
pelo pecado são amantes de si mesmos, rebeldes, desejam autonomia e tem como referência a
si mesmos.
Aqueles que lidam com o pastoreio de casais sabem o quanto essa egorreferência
atinge os casais. Somos procurados porque “acho que meu marido (minha esposa) não me
considera importante”, ou “meu marido (minha esposa) não me dá a devida atenção”.
E para consegui essa atenção passam a manipular e controlar o outro a fim de ser feliz.
A nossa estrutura religiosamente orientada se manifesta na forma como o casal lida com os
problemas do cotidiano. “Se manifesta no vocabulário: “Decepcionada”. Revela-se nos pontos
147
OLIVEIRA, Fabiano de Almeida. Reflexões Críticas sobre Weltanschauung: Uma Análise do Processo de
Formação e Compartilhamento de Cosmovisões numa Perspectiva Teo-Referente. Artigo distribuído em sala de
aula, em Agosto de 2008.
71
de referência: “O que eu preciso”. Manifesta-se nas suposições subjacentes: “Sou assim
mesmo”148.
Esse estabelecimento do próprio reino tem contornos também na forma como abrimos
mão das ordenanças de Deus nos papéis estabelecidos de liderança e submissão em busca de
maior comodidade e melhores condições. E, mesmo quando nos divorciamos porque as
nossas necessidades não estão sendo satisfeitas.
Uma das realidades mais claras que vemos nos casamentos é que homens e mulheres
tentam encontrar sentido, realização, propósito e significado em seus cônjuges.
Desgraçadamente o pecado nos lança em busca da pessoa, mas também nos lança para longe
dessa pessoa.
Mudando o referencial de Deus para nós mesmos o que vamos encontrar é um ciclo
vicioso. Queremos que satisfaçam as nossas necessidades. “A pessoa precisa de poder sobre o
outro para autenticar-se e ao mesmo tempo deriva valor da apreciação do outro”149. O homem
e a mulher passam a uma tentativa de manipular os outros para que possam ter satisfeitas as
suas exigências. A pessoa assume o lugar de Deus, elege-se como centro do universo e
reclama que outros o adorem, fazendo a sua vontade.
O resultado que se colhe disso é o afastamento. Mas, a explicação para cada uma das
dificuldades é que temos necessidades legítimas e que elas precisam ser cumpridas pelo
marido ou pela mulher.
Entretanto, enquanto não mudamos o referencial não temos mudança, só temos o atrito
seco de engrenagens que não se encaixam, só se chocam. A mudança só ocorre quando
mudamos o referencial. Quando entendemos que apenas com o referencial em Deus podemos
interpretar o mundo, a nós mesmos e as pessoas adequadamente. E que os ídolos “são
senhores de escravos que alimentam os seus com promessas falsas. São incontroláveis. E
insaciáveis!... Ídolos não satisfazem!” 150 . Infelizmente o pecado nos cega para os nossos
próprios pecados à semelhança do que aconteceu com Davi na confrontação de Natã e cremos
piamente na mentira de que o nosso maior problema é o outro, portanto fora de nós, e não o
nosso pecado, dentro de nós.
Esse problema o sábio Salomão nos diz repousa em nossos corações. Em Provérbios 4.
23, lemos: “Sobre tudo o que se deve guardar, guarda o coração, porque dele procedem as
fontes da vida”.
148
HARVEY, Dave. Quando Pecadores Dizem Sim. São Bernardo do Campo: Fiel, 2007, p. 19.
GOMES, Wadislau Martins. Força para a Família na crise Moderna. Brasília: Refúgio, 1995, p. 18.
150
Ibid. p. 55.
149
72
Quando as Escrituras falam ao coração é num sentido metafórico. Não se refere ao
coração que bombeia o sangue (embora possa servir de análise), mas ao nosso homem
interior, ao que somos espiritualmente. Onde reside o nosso entendimento, onde reside nossa
vontade, nossos afetos, também151.
É do coração que procedem as fontes da vida. É do coração que surgem as nossas
decisões, nossas ações, nossos pensamentos, nossos sentimentos. Por isso somos instados a
guardar o nosso coração. Somos instados a colocar nessa tarefa todo o nosso empenho.
Isso porque é a partir dessas crenças do coração que tomamos as nossas decisões e
encontramos apoio para nossas ações dentro do casamento.
Tripp mostra o quanto os nossos corações estão orientados para o nosso reino em vez
de está orientado para o reino de Deus. “Trabalhamos para que pensem que estamos certos,
para sermos vistos como atraentes, para ganhar a discussão, para obter a promoção. Nós nos
esforçamos para ser o primeiro, o melhor, o centro, o mais poderoso, o mais conhecido, o
mais amado. Nós realmente nos amamos e temos um plano maravilhoso para nossas próprias
vidas”152.
É a vida ao redor e em prol de si mesmo, o estabelecimento do próprio reino que traz
grandes conseqüências aos casamentos. Porém casamentos que glorificam a Deus e que
trazem felicidades aos cônjuges são casamentos onde todas as coisas são submetidas a Cristo,
o Senhor. Casamento onde o marido e a mulher não vivem para si mesmo, mas são chamados
à obediência ao reino de Cristo. “Cristo chama cada um de seus filhos para... a morte à
prioridade do eu, morte à autorrealização em nossa vida e morte à busca do nosso próprio
plano pessoal”153. Aqui fica estabelecido que o maior problema do casamento está dentro de
cada um e não fora dele. É “o pecado que habita em mim”.
E nessa morte do “eu” é que encontramos significado, propósito e direção. Marido e
mulher deixam seus pequenos reinos de lado e juntos, de mãos dadas, avançam em
obediência, vivendo o propósito de glorificar a Deus e desfrutarem um do outro no decorrer
desse processo.
6.2. Reino e as circunstâncias: meu cônjuge existe para minha felicidade?
151
FITZPRATICK, Elyse. Ídolos do Coração. São Paulo: ABCB: Associação Brasileira de Conselheiros
Cristãos, 2009, p. 104ss.
152
TRIPP, Paul David. Em Busca de Algo Maior. São Paulo: Cultura Cristã, 2011, p. 115.
153
Ibid, p. 118.
73
A queda afetou também a forma como olhamos para as circunstâncias. O homem
caído agarra-se ao egoísmo de ter circunstâncias perfeitas para si para alcançar a felicidade no
casamento. Ora idealiza-se as circunstâncias, ora utiliza-se dela para se desculpar dos seus
pecados. Olha-se para aparência, aceitação, posses, posição, e outras coisas dessa natureza
como sendo o grande vilão ou o grande Redentor para o casamento. Vilão se as coisas não são
como queremos. Redentor porque imaginamos situações em que tudo será restaurado e trará a
paz.
Vezes sem fim colocamos a culpa do que fazemos em outros e nas circunstâncias. “Se
o meu marido fosse mais amoroso”; “se a minha esposa me respeitasse mais”; “se eu tivesse
um pouco mais de dinheiro”. Assim, o fizeram Adão e Eva. “...a mulher que tu me deste...”.
“A serpente me enganou e eu comi”. Estamos sempre procurando subterfúgios e, geralmente
isso se resume a eventos e pessoas.
Porém não somos prisioneiros das circunstâncias. Já demonstramos no capítulo 1 que
as circunstâncias são importantes mas não são determinantes. Elas não determinam o que eu
faço. Elas são apenas os eventos que me fazem mostrar o meu interior. O rev. Wadislau nos
alerta para o fato de que “...a situação não é culpada de nossa reação. A situação é a história.
E a história é a vontade de Deus trabalhando em nossas decisões e comportamentos. Nossos
comportamentos são resultados do que cremos”154.
O cristão precisa ver as circunstâncias como sendo os meios que Deus está movendo
para cumprir a sua obra: nos tornar semelhantes à pessoa de Jesus Cristo. Mesmo quando
essas circunstâncias é um cônjuge que peca contra mim.
As circunstâncias da vida acabam revelando o que temos no nosso coração. Elas não
determinam o que está lá dentro, nem coloca nada lá. Elas apenas expõem. Reagimos às
circunstâncias pecaminosamente porque somos pecadores e os nossos corações nos dirigem
nessa direção. “Por que Jesus não fica irritado, amargurado ou hostil? A resposta simples, mas
espantosa é esta: quando o seu coração era aquecido pelas circunstâncias, manifestava-se o
que havia ali: amor, misericórdia, compaixão, bondade. Cristo não reagia pecaminosamente às
circunstâncias de sua vida – até mesmo uma morte atormentadora, imerecida e humilhante
porque o seu coração era puro. O que estava em seu coração transbordava. Era amor!”155
As circunstâncias num casamento dizem muito a respeito do que eu espero do meu
cônjuge também e, são geralmente, detalhes que estão fora do nosso controle direto. São
assuntos como as palavras ditas ou que não foram ditas, sejam elas agradáveis ou
154
155
GOMES, Wadislau Martins. Coração e Sexualidade. Brasília: Refúgio, 1999, p. 82.
HARVEY, Dave. Quando Pecadores Dizem Sim. São Bernardo do Campo: Fiel, 2007, p. 64.
74
desagradáveis – “se ao mesmo meu marido demonstrasse o seu amor seria uma esposa
melhor”; “seria um marido mais amável se ela não fosse tão rude comigo”; o respeito tão
almejado – “Se ela quisesse ter um marido mais agradável, ela me trataria melhor”; o carinho
e a atenção ao final de um dia extenuante de trabalho – “minha vida seria melhor se tivesse
uma esposa que entendesse que tudo que faço é para ela mesma”; o reconhecimento do
trabalho doméstico realizado – “me sentiria melhor se me marido não me tratasse como uma
escrava do lar”. A lista é bem longa.
Apegamo-nos à mudança das circunstâncias. Achamos que temos de mudar as nossas
circunstâncias. Pensamos que os nossos cônjuges existem para a nossa felicidade.
Entretanto, precisamos ressaltar que as circunstâncias são importantes. Por que?
Porque elas mostram o que tenho alimentado no meu coração; elas revelam pecados ocultos,
que encontram ocasião para manifestarem-se somente quando a circunstância favorável (ou
desfavorável) se apresenta. Entretanto, devemos igualmente ressaltar as circunstâncias não
colocam o mal no nosso coração.
É bom percebermos que as circunstâncias estão ligadas ao nosso cônjuge. Pensamos
que tudo o que ele (a) faz deve ser para a nossa felicidade. Porém, ao colocarmos nossa
felicidade no outro, fazemo-lo um ídolo e nos ressentiremos de tudo quanto não satisfizer os
nossos planos, desejos e anseios.
Não poucas vezes temos a expectativa de que a nossa vida deveria ser mais fácil e
ficamos surpresos com as provas e dificuldades. Porém desde o pecado de Adão e Eva
vivemos num mundo caído e a Bíblia sempre nos ensina que devemos esperar por
dificuldades. Sim, circunstâncias adversas fazem parte desse mundo onde o pecado estragou a
criação de Deus (ver Gn 3; Jo 16.33; Rm 8.20-23). Porém, em Romanos 5.3ss e Romanos
8.28, somos lembrados de que não há circunstâncias que estejam fora do plano amoroso e
soberano de Deus, que está trabalhando não para nos escudar das dificuldades, mas para nos
tornar semelhantes a Jesus Cristo, assim poderemos viver de forma que Ele seja glorificado.
6.3. Reino e o merecimento do cônjuge
Mais uma vez reiteremos a questão de que o propósito do meu casamento não deve ser
a minha felicidade primeiramente. Porque quando faço isso me coloco como o referencial do
casamento. Se tudo que me importa é a minha felicidade, e por alguma razão o meu cônjuge
não se inclina em adoração aos meus desejos vou tratá-lo com frieza, com indiferença, com
75
gritos que demonstram a minha indignação e raiva, até que se cumpra a minha vontade.
Quando tudo isso irrompe no casamento, demonstra-se que trato o meu cônjuge de acordo
como seu merecimento.
Porém a Bíblia não nega que outras pessoas podem pecar contra nós. No livro de
Gênesis vemos isso claramente. Abel pecou contra Caim (Gn 4.8); Lameque diz que matou
um homem porque o feriu e um rapaz porque o pisou (Gn 4.23); Lameque também tinha
“esposas”, etc. Então, além dos efeitos dos nossos próprios pecados temos os efeitos dos
pecados dos outros sobre nós que podem gerar amargura, ressentimento, etc.156.
Certamente o lugar onde vamos encontrar os mais fortes efeitos do pecado nesse
aspecto que estamos tratando, é o relacionamento marido e mulher. Dois pecadores que
casam, que passam a conviver, observam com mais acuidade os defeitos um do outro. O
pecado torna-se mais nítido. E, com o passar dos anos ele tende a ter um efeito amplificador.
Cada vez que o mesmo pecado se repete aumentam a ira e os desentendimentos. Não muito
tempo depois, por conta da referência negativa que temos passamos a tratar o nosso cônjuge
de acordo com o seu merecimento.
No nosso precioso reino, “...nos tornamos defensivos e acusadores porque queremos
evitar o sofrimento de uma dor já conhecida”157.
O maior de todos os problemas aqui é que acreditamos em duas mentiras que já foram
apresentadas acima. A primeira é que o nosso maior problema é externo a nós. Acreditamos e
temos elementos sociológicos condicionadores para isso, que o nosso problema ou é o
ambiente (porque não temos circunstâncias que consideramos ideais) ou o nosso problema
trata-se apenas do nosso cônjuge que não satisfaz a nossa necessidade. A segunda é que
passamos a dar ao nosso cônjuge o tratamento que achamos que ele “merece”. Se ele nos trata
bem, então, vamos tratá-lo bem, e vice-versa158.
156
É bom lembrar entretanto, que a forma como respondemos ao pecados dos outros contra nós, bem como às
circunstâncias em que estamos envolvidos é responsabilidade nossa e não dos outros. Eles responderão pelo que
fazem e nós respondemos pela forma como agimos. Respondemos a essas realidades de acordo com a crença do
nosso coração. E, Paulo nos ensina que “Não vos sobreveio tentação que não fosse humana; mas Deus é fiel e
não permitirá que sejais tentados além das vossas forças; pelo contrário, juntamente com a tentação, vos proverá
livramento, de sorte que a possais suportar” (1 Co 10.13).
157
GOMES, Wadislau Martins. Coração e Sexualidade. Brasília: Refúgio, 1999, p. 85.
158
Livros como o de Gary Chapman, citado no início, levam os casais a pensar dessa forma com pouca variação.
Creio que seja justo com o autor dizer que ele crer que um pouco de técnica de comunicação e boa educação fará
com que um casamento se torne bem ajustado e dinâmico. Embora no livro “As Cinco Linguagens do Amor”,
não tenhamos exigências sendo feitas abertamente, somos ensinados a deixar as nossas exigências e necessidades
nas entrelinhas, a fim de que o cônjuge, ao perceber que estamos nos esforçando em satisfazer a necessidade
dele, também queira satisfazer as nossas. Não nego que deve haver uma troca entre os casais, afinal Deus na
Aliança da Criação, os fez homem e mulher, não apenas fazendo referência a gênero, mas também à questão de
complementarem um ao outro. Porém, nesse caso, não precisa de um Redentor. Eu causo o problema e eu
mesmo posso consertar.
76
Temos uma tendência a considerar o pecado do outro como o maior dos absurdos.
“Quando se trata dos pecados que outros cometem contra nós, a nossa tendência é falar sobre
eles de maneira destrutiva...” Porém, “mesmo quando nosso coração for terrivelmente ferido
pelos pecados de outra pessoa, precisamos protegê-lo para que não sejamos dominados pela
força destruidora do pecado. Quando sofremos os efeitos do pecado de alguém nossa
tendência é pecar”.159 Devemos registrar, entretanto, que não devemos ser passivos, devemos
reagir, porém, do jeito que Deus quer que reajamos, para não nos encontrarmos pervertendo a
justiça de Deus que tanto procuramos160.
O casal deve levar consigo a lembrança de que vive um casamento num mundo caído
e que o outro também é um ser caído. Não há nada que não esteja influenciado pela queda no
seu lar (veremos mais adiante de que não precisamos nos curvar a isso, pois Cristo veio a este
mundo, enfrentou a cruz do Calvário para que nós pudéssemos ter a certeza de que nunca
seremos abandonados).
Com a realidade da entrada do pecado no mundo não podemos negar o fato de que
ninguém é perfeito. Ninguém consegue atingir as expectativas dos outros. E, que
inversamente proporcial, somos tentados a nos movermos em direção ao outro levando em
consideração apenas o seu “merecimento”. Tripp, falando de forma mais pessoal diz que
“muitas pessoas se casam com expectativas falsas sobre a pessoa com quem estão
casando. O ponto é este: ambos trazem algo para o casamento que afeta de modo destrutivo
aquilo que um casamento precisa e deve fazer; Essa coisa se chama pecado. A maioria dos
problemas que enfrentamos no casamento não é intencional nem pessoal. Na maioria das
situações matrimoniais, você não e confrontado com dificuldades porque seu cônjuge tem a
intenção de dificultar a sua vida... o que realmente está acontecendo é que sua vida está
sendo afetada pelos pecados, fraquezas e falhas da pessoa com que você está vivendo” 161
Essa luta e essa postura em considerar o outro a partir do seu merecimento é próprio
do nosso pecado e do pecado também do cônjuge.
Saber porquê estamos casados e devemos continuar casados é essencial.
Quando a nossa perspectiva é centrada em nós mesmos, a permanência do casamento
só acontecerá se as nossas necessidades, desejos e propósitos forem satisfeitos. Porém, se ao
contrário – como veremos no capítulo seguinte – com a ajuda do Espírito de Deus, refreando
159
TRIPP, David Paul. LANE, Timothy. Relacionamentos:Uma Confusão que Vale a Pena. São Paulo: Cultura
Cristã, 2011, p. 45.
160
Ib. Ibid.
161
TRIPP, David P. O Que você Esperava?São Paulo: Cultura Cristã, 2011, p. 17-18.
77
essa perspectiva egoísta e antropocêntrica, seguirmos aferradamente uma perspectiva
teocêntrica, certamente preservaremos nossos casamentos vivendo-o para com o propósito
bendito de trazer glória ao Bendito Criador.
De fato, isso serve para corrigir o nosso rumo e corrigir-nos quando sairmos das
veredas demarcadas pelo Criador e Redentor. O que é dito acima, ajuda-nos a colocar o
casamento na perspectiva correta, apesar do nosso pecado. O casamento tem de ser vivido
para a glória de Deus. Isto nos dá uma motivação diferente.
“O primeiro propósito do casamento - além da felicidade, da expressão sexual, de
criar filhos, do companheirismo, do cuidado mútuo – ou qualquer outra coisa – é agradar a
Deus”. As outras coisas nos serão acrescentadas. Ressaltamos mais uma vez que não estamos
insinuando de que a felicidade do casal e as demais coisas mencionadas não têm importância.
É claro que tem. Elas nos foram dadas por Deus. Mas, temos um propósito principal: A glória
de Deus em todas as coisas. A glória de Deus na nossa felicidade, na expressão sexual, no
companheirismo, no compartilhar do dia, na criação dos filhos, no cuidado mútuo, etc.,
porquanto tudo isso está dentro do Pacto da Criação. O problema com tudo isso é o nosso
foco no “eu”.
Nas próximas lições veremos como em Cristo o casamento pode ser restaurado.
78
QUESTIONÁRIO
1. Qual a definição de teorreferência? Por que dizemos que ela pode ser negativa ou positiva?
2. O que acontece quando mudamos o referencial de Deus para o nosso cônjuge?
3. Qual a definição bíblica de coração?
4. Quais as características de que estamos tentando estabelecer os nossos próprios reinos no
casamento?
5. Como podemos ter casamentos que glorificam a Deus e trazem felicidade aos cônjuges?
6. Como o nosso “eu” é revelado por meio das circunstâncias? Segundo o dr. Wadislau como
as circunstâncias devem ser encaradas?
7. Qual o maior propósito das dificuldades que passamos segundo o texto de Romanos 8.28,
conforme explicado pelo autor?
8. Quais são as duas mentiras em que sempre acreditamos quando não temos as circunstâncias
que consideramos essenciais?
9. Que lembrança deve o casal levar para o seu casamento?
10. Qual o primeiro propósito do casamento?
79
LIÇÃO 7: RESTAURANDO O PROPÓSITO DE DEUS PARA O CASAMENTO
(REDENÇÃO)
INTRODUÇÃO:
Do ponto de vista da psicologia tudo o que dissemos até aqui não faz nenhum sentido.
E, naturalmente, o que diremos daqui para frente fará menos sentido ainda. Se o conceito do
problema humano está equivocado, certamente a solução também estará, conforme já
mencionamos.
As diferentes psicologias presumem a cura do homem (e, portanto, do casamento) a
partir de princípios humanistas, das idéias da bondade completa do homem ou de sua maldade
por definição, ou ainda, de sua neutralidade moral e da circunstância natural do problema
(psicológico, mental ou ambiental), oferecendo a possibilidade da solução dos problemas à
parte de Deus162.
O aconselhamento bíblico de linha reformada, parte dos pressupostos descritos nos
três capítulos anteriores. O homem foi criado bom e como tal refletia a imagem de Deus,
porém com a queda o homem se afasta do ideal de Deus, numa pretensa autonomia,
inclinando o seu coração a ídolos. Essa é a realidade baseada nas Sagradas Escrituras, a
revelação especial de Deus.
Falando mais especificamente, Deus criou o casamento (capítulo 1). Criou o primeiro
casal em condições perfeitas, santas. Porém o homem se rebelou contra os propósitos de
Deus. Para que possa ter esse propósito restaurado Deus enviou seu Filho ao mundo. A
restauração que Cristo promove não é apenas para o casamento, mas para todas as coisas, é
uma restauração cósmica163. Agora ele está nos livrando do mal do pecado pouco a pouco, e
na consumação nos livrará do mal do pecado definitiva e totalmente164.
Desde o princípio Deus desejou que o relacionamento humano (isso inclui o
casamento) manifestasse a verdadeira e sublime comunhão que ele mesmo apresenta na
Trindade.
162
GOMES, Wadislau Martins. Aconselhamento Redentivo. São Paulo: Cultura Cristã, p. 14.
WOLTERS, Albert. Criação Restaurada. São Paulo: Cultura Cristã, 2006, p. 79. Ver também WALSH,
Brian J. MIDDLETON, J. Richard. A Visão Transformadora – Moldando uma Cosmovisão Cristã. São Paulo,
Cultura Cristã, 2010, pp. 65-78.
164
EDGAR, William. Razões do Coração: Reconquistando a Persuasão Cristã. Brasília: Refúgio, 2000, pp. 118121. Walsh também fala dessa restauração completa usando a expressão intervenção cataclísmica, quando o
reino de Deus virá em toda a sua plenitude. WALSH, Brian J. MIDDLETON, J. Richard. A Visão
Transformadora – Moldando uma Cosmovisão Cristã. São Paulo, Cultura Cristã, 2010, p. 72.
163
80
Porém, como vimos, o pecado estragou esse grande propósito. O nosso pecado é uma
desonra contra Deus e acende a Sua ira. Surge aqui uma pergunta perturbadora: Como
podemos nos livrar desta ira de Deus?
Que pode nos livrar da ira vindoura? Dos estragos que o pecado causa? Nós próprios?
Não podemos! Somos incapazes de fazer qualquer coisa que apazigue a ira de Deus. A nossa
obediência e as nossas boas obras são, como diz Isaías, como “trapos de imundícia” diante de
Deus. Não podemos redimir a nós mesmos, nem outro ser humano o pode, porque um pecador
não pode justificar outro pecador. Aqui estamos no dilema que foi muito bem descrito por
Anselmo, bispo da Cantuária, teólogo do século XI: “O homem pecador deve a Deus por
causa do pecado, o que não pode pagar, e a menos que pague não pode ser salvo”.165
Analisando estas questões vemos a necessidade da justificação. O homem não pode
justificar-se. Nos apercebemos, portanto, que só Deus pode fazer alguma coisa por nós, só Ele
pode nos livrar da Sua ira. A partir de então podemos entender mais acuradamente o propósito
da encarnação, vida e obra do Filho de Deus.
“Não há Ninguém que pode trazer satisfação [pelo pecado] a não ser o próprio Deus.
Mas ninguém deve fazê-lo a não ser o homem; de outra forma o homem não oferece
satisfação. É necessário que alguém que seja Deus e homem o faça”. (Anselmo da Cantuária).
7.1. Redenção em Cristo
Ao considerarmos a seriedade da queda do homem, lembramo-nos que isto faz do
homem um devedor. O homem deve a Deus. Se deseja ser perdoado deve acertar as suas
contas com Ele. Mas, o homem é incapaz de fazê-lo. Incapaz porque ao pecar caiu da posição
em que fora criado por Deus, com potencialidade para não pecar. Agora o homem não pode
deixar de pecar. Ao pecar assumiu uma natureza pecaminosa, tendente ao pecado, tendente ao
mal (depravação total).
Deus não pode simplesmente “fazer vista grossa” ao pecado. A Sua santidade exige
que ele puna o pecado. Há que se haver uma paga, uma satisfação pelo pecado.
Desta maneira o homem agora depara-se com dois problemas seriíssimos para que
possa ser justificado: “além de ter de cumprir a exigência da Lei que não foi cumprida (aquela
obediência exigida de Adão), o homem tem que ser penalizado para que haja satisfação ou
quitação da falta cometida”.166
165
166
Citado por STOTT, John. A Cruz de Cristo. São Paulo: Vida, 1999, p. 107.
BEZERRIL. Moisés. A Dispensação do Pacto, Recife: Edição Própria, 1998, p. 16.
81
Quem poderia cumprir a Lei e ser penalizado para trazer satisfação? Tinha que ser um
homem sem pecado, puro! Quem seria o escolhido para realizar tamanha obra? Adão?
Naturalmente que não! Ele já havia pecado e não poderia mais cumpri-la perfeitamente. Se ele
no seu estado original não conseguiu cumpri-la, muito menos o conseguiria agora maculado
pelo pecado! Quem seria então? Não há outro homem que possa cumprir a lei e receber a
penalidade porque em Adão todos os homens pecaram, é o argumento bíblico (Is 59; Rm 3 e
5).
Só um homem poderia fazer isto! Só um homem que fosse Deus e homem ao mesmo
tempo poderia fazer isto. E, somente assim vamos entender o propósito da encarnação do
Filho de Deus, da Segunda Pessoa da Trindade. A incapacidade do homem levou Deus a agir
em seu favor. Deus elege um novo representante para a raça humana; Alguém com quem Ele
fará um novo pacto: o da Graça. No cristianismo a mensagem central é que Deus vem em
busca do homem na pessoa do Redentor Jesus. É o plano de Deus para salvar o homem. A
Confissão de Fé de Westminster declara a este respeito:
Tendo-se o homem tornado, pela sua queda, incapaz de ter vida por meio deste pacto
[o das obras], o Senhor dignou-se a fazer um segundo pacto, geralmente chamado o
pacto da graça; neste pacto da graça ele livremente oferece aos pecadores a vida e a
salvação através de Jesus Cristo, exigindo deles a fé, para que sejam salvos, e
prometendo o Seu Santo Espírito a todos os que estão ordenados para a vida, a fim
de dispô-los e habilitá-los a crer.167
Só Cristo é quem preenche os requisitos de Deus. Só Ele estava habilitado a cumprir
cabalmente a Lei de Deus e receber a penalidade pelos pecados, só Ele poderia trazer
satisfação à Deus.
Cristo obedeceu à Lei de Deus e entregou-se à morte, não como uma dívida porque era
sem pecado, e portanto, sem nenhuma obrigação de morrer, mas espontaneamente.
Aquilo que o homem estava incapacitado para fazer por causa do pecado, o Deushomem o fez. A Segunda Pessoa da Trindade encarnou-se para nos trazer a salvação. E, mais
uma vez encaramos a seriedade do pecado ao analisarmos que Deus teve que entregar Seu
próprio Filho para reparar o dano do pecado. Mas,
“por mais sério que fosse o pecado humano, a vida do Deus-homem era tão boa, tão
exaltada e tão preciosa que o seu oferecimento na morte pesa mais que o número e a
grandeza de todos os pecados, e a reparação devida foi feita à honra ofendida de
Deus”.168
167
168
CONFISSÃO DE FÉ DE WESTMINSTER. Sobre o Pacto, parágrafo III, 43.
STOTT, John. A Cruz de Cristo. São Paulo: Vida, 1999, p. 108.
82
Assim, devemos nos lembrar que não somos aceitos com base nos nossos méritos ou
desempenho, mas com base na justiça perfeita de Cristo, que, para fins didáticos chamados
de: sua obediência ativa (Cristo cumprindo perfeitamente a Lei de Deus durante a Sua vida) e
sua obediência passiva (Cristo levando a penalidade do pecado pelo Seu sacrifício perfeito na
Sua morte).
Somente com Cristo assumindo o nosso lugar é que podemos ser declarados justos,
baseados nos Seus méritos.
Na obediência ativa a obra de Cristo consistia em cumprir toda a justiça a fim de
merecer as recompensas da aliança não apenas para Ele mesmo, mas também para aqueles a
quem Ele representava. Paulo coloca isto, manifestando que Cristo, era um segundo
representante da humanidade, assim como Adão foi o primeiro. Adão colocou toda a
humanidade num estado de pecadores, Cristo pela Sua obra colocou os eleitos na condição de
justificados. Paulo expressa as suas idéias quanto a isto em Romanos 8. 12-19.
R C Sproul, comenta este texto afirmando que “aqui Paulo contrasta a derrota de Adão
com a vitória de Cristo, o novo Adão. Os dois, Adão e Jesus, serviram como representantes de
alianças universais”.169
A diferença é que Cristo, ao contrário de Adão, cumpriu aquilo que lhe foi
proposto, não somente fazendo expiação, mas cumprindo toda a Lei.
“A obra de Cristo envolveu mais do que oferecer uma expiação para pagar pelos
pecados do Seu povo. Ele também teve que cumprir toda a justiça a fim de merecer as
recompensas da aliança para Si mesmo e para aqueles a quem representou. Para Cristo ser
nosso Salvador Ele não só teve de morrer por nossos pecados, como teve também de viver
uma vida de obediência para que pudesse ser nossa justiça”. 170
“Cristo, o Filho de Deus, que por direito era isento de toda e qualquer sujeição, fez-se
sujeito à lei. Um homem livre redimiu um escravo, ao constituir-se fiador; Cristo decidiu
tornar-se obrigado a cumprir a lei para poder obter isenção para nós...”.171
No aspecto da obediência passiva devemos lembrar isso não quer dizer que Cristo foi
“passivo” no sentido de ter sido como uma vítima involuntária de uma obediência que foi
arbitrariamente imposta sobre Ele. Ele mesmo afirmou que entregava a sua vida
espontaneamente (João 10.18). Esta obediência refere-se a Jesus como aquele que recebeu
todas as penalidades da lei por causa da transgressão do Seu povo. A obediência passiva
169
SPROUL, R C. A Glória de Cristo. São Paulo: Cultura Cristã, 1997, p. 65.
Ib. Ibid.
171
CALVINO, João. Comentário à Sagrada Escritura: Exposição de Gálatas. São Paulo: Paracletos, 1998, p.
123.
170
83
refere-se, portanto, aos sofrimentos de Cristo, à Sua morte judicial (sofrendo as penalidades
da lei) na cruz do Calvário.
Essa é a base da nossa justificação: a justiça de Cristo. “...Justificação é a justiça
perfeita de Cristo contabilizada para nós, cobrindo as imperfeições restantes em nossa vida
com um manto de santidade sem manchas...”172
Por essa obra Cristo restaura o relacionamento dos seus eleitos com Deus (Romanos
5.1ss).
7.1.1. A Justificação pela Fé e o Casamento
Mais abaixo veremos três aspectos de como a obra de Cristo abarca vários conceitos e
como isso tem implicações para a redenção do casamento. São três aspectos escolhidos dentre
os escritos paulinos, especialmente Romanos, que ilustram o assunto e nos ajudam a
entendermos a justificação pela fé.
O relacionamento de Cristo com a sua igreja, justificando-a, com base não no seu
desempenho, deve ser demonstrada pelo marido no relacionamento com a sua mulher, e a
submissão da igreja deve ser demonstrada pela mulher na submissão dela para com o marido.
Esse é um quadro que nenhuma ciência social poderia jamais captar. Não tem a ver
com os merecimentos. Não tem a ver com o objeto do nosso amor, mas tem a ver com a forma
como Deus organizou o casamento para ser na Aliança da Criação. É porque não nos
baseamos nessas verdades e procuramos orientar o nosso relacionamento para o que o outro
nos faz, ou em outras palavras no seu desempenho, é que muitos casamentos,
desafortunadamente, naufragam quando passam por um período de grande turbulência. Claro
que isso não quer dizer que não devemos apreciar os nossos cônjuges. As qualidades de um e
outro agregam valores ao casamento, mas não devem ser a base dele. O mandamento de Deus
sim! É claro que não devemos minimizar o fato de que marido e mulher devem ter
companheirismo, prazer e alegria um na presença do outro. Mas, não com base nos
merecimentos, mas com base na redenção que há em Cristo.
Quando entendemos a graça com a qual fomos tratados por Deus, especialmente na
pessoa de Jesus Cristo então passamos a tratar o nosso cônjuge com graça. “A humildade
substituirá a arrogância e começaremos a servir em vez de esperar se servido... Nossos
172
LOVELACE, Richard. Teologia da Vida Cristã. São Paulo: Shedd Publicações, 2004, p. 66.
84
casamentos começarão a refletir a magnificência em lugar da mediocridade do egoísmo”173. É
dentro dessa esfera do Novo Pacto que o casamento deve ser celebrado.
“Cristo é o ponto de referência para todas as nossas atitudes no casamento”. 174 As
atitudes das esposas com relações aos seus maridos é a submissão “como ao Senhor” e a
atitude amorosa, de entrega e cuidado por parte marido para com a esposa deve encontrar
modelo em Cristo que “amou a igreja e a si mesmo se entregou por ela”.
Cônjuges devem depender da graça de Deus. “...pela graça, o marido reflete a graça de
Deus à sua esposa mediante a entrega, e a esposa reflete ao marido, pela fé, a submissão que
devemos ao Senhor”175. Os cristãos devem lembrar que a obra de Cristo não somente atinge o
homem no que diz respeito à salvação, ela diz respeito a tudo na vida humana, isto inclui,
obviamente, o casamento.
O casamento, podemos depreender de Efésios 5, foi planejado por Deus para ser uma
parábola, uma ilustração do relacionamento entre Cristo e sua Igreja. “...O casamento é
maravilhoso não porque traz alegria às pessoas, ou porque proporciona um ambiente para a
criação de filhos, ou porque estabiliza a sociedade (embora o casamento faça todas essas
coisas). O casamento é maravilhoso por Deus o projetou para manifestar a sua glória”176. O
casamento deve ser a encarnação da verdade de que eu sirvo a Cristo; e mais, deve demonstrar
o relacionamento entre Cristo e a Igreja.
Creio que essa é a glória do casamento. Ele representa essa relação amorosa de Cristo
com a sua igreja. Ele representa o Novo Pacto. Ele manifesta o amor de Deus para com
aqueles que Ele escolheu. Na cruz Cristo enfrentou as trevas para o Seu povo pudesse
experimentar a graça de Deus. Na cruz Cristo suportou o abandono de Deus para que marido e
mulher pudesse encontrar todos os recursos, todos os tesouros da sabedoria e do
conhecimento para viver um casamento que o glorifique (Colossenses 2.3).
7.1.2. Encontrando o propósito do casamento em Cristo
Por tudo que temos dito até aqui, é uma implicação clara dizer que não devemos amar
o nosso cônjuge baseados no merecimento ou não dele. Amar o nosso cônjuge é um
mandamento do Senhor. E, ao cumpri-lo, voltamos ao que era no principio: o casamento
encontra, outra vez, seu propósito maior: glorificar a Deus.
173
HUNT, Susan. A Graça que vem do Lar. São Paulo: Cultura Cristã, 2002, p. 89.
HARVEY, Dave. Quando Pecadores Dizem Sim. São Bernardo do Campo: Fiel, 2007, p. 23.
175
GOMES, Wadislau Martins. Coração e Sexualidade. Brasilia: Refúgio, 1999, p. 77.
176
HARVEY, Dave. Quando Pecadores Dizem Sim. São Bernardo do Campo: Fiel, 2007, p. 25.
174
85
Talvez a melhor forma de vermos como essa verdade é melhor explicada seja
olharmos para Efésios 5.22-33. Nesse texto Paulo fala do relacionamento marido e mulher,
comparando-o ao relacionamento de Cristo com a igreja.
Ali aprendemos que Cristo amou a sua igreja sacrificialmente. Amou-a entregando-se
por ela.
Aqui a doutrina da depravação total nos ajuda e verificarmos o impacto disso no nosso
relacionamento. “...uma vez que a nova aliança de Cristo com a sua igreja seja criada e
sustentada pela graça comprada com sangue, assim também os casamentos humanos visam a
manifestar essa nova aliança”. Quando falamos de Cristo e da sua igreja certamente devemos
ter em mente que a aceitação da igreja não tem caráter meritório. Marido e mulher
manifestam que no “...casamento, vive cada hora na alegre dependência do perdão e da
justificação da graça de Deus, assim como na sua prometida graça futura, e... aplica[-a] ao seu
cônjuge a todo instante – como uma extensão do perdão e da justificação de Deus e do seu
auxílio prometido”177.
Marido e mulher deve ser aperceber que “fomos criados pelo Senhor e só seremos
felizes em sujeição à Sua justiça e ao Seu amor. Longe de Deus, no desejo de independência,
só encontramos solidão...”178
Devemos lembrar que o contexto anterior imediato desse texto nos lembra que
devemos viver em sujeição uns aos outros no temor de Cristo (Ef 5. 21). Ali Paulo menciona
que os cristãos devem viver cheios do Espírito Santo, e as conseqüências dessa plenitude do
Espírito que se revelará, entre outras coisas, nos relacionamentos.
Você se sujeitou a Cristo; o outro cônjuge também. E ambos... são governados por
uma lealdade superior, pela lealdade Àquele que não levou em conta os Seus direitos e
prerrogativas, mas só levou em conta vocês e sua desesperada e aterradora necessidade. Ele
se humilhou a Si mesmo, pôs de lado os Seus direitos e prerrogativas, assumiu a forma de
servo, e enfrentou a morte, sim a morte de Cruz. Olhando para Ele, e vendo como Ele veio,
não somente para livrá-los do inferno, mas para dar-lhes vida, vida mais abundante, e
encheu plenamente o seu entendimento para a Sua glória...179
Essa lealdade mencionada acima lembra-nos do que falamos sobre a Aliança da
criação. Paulo diz que no relacionamento marido e mulher estavam submissos a Deus e que
há papéis que foram definidos por Deus na criação. No princípio o homem foi criado para ser
o cabeça do lar, bem como a mulher para ser auxiliadora. Vimos também que o pecado afeta
177
PIPER, John. Casamento Temporário: Uma parábola de Permanência. São Paulo: Cultura Cristã, 2011, p.
40.
178
GOMES, Wadislau Martins. Força Para a Familia na Crise Moderna. Brasília: Refúgio, 1995, p. 62.
179
Ib. Ibid.
86
esse estado de coisas e a mulher passa a tentar, sucessivas vezes, se apoderar da liderança do
marido e o homem a liderar a mulher de forma autoritária. Mas, conforme dissemos, a
estrutura que Deus estabeleceu permanece ainda que corrompida pelo pecado. Em Cristo, na
restauração, Paulo menciona mais uma vez como Deus planejou tudo na criação e como entre
os cristãos isso era restaurado em Cristo.
A mulher, ele diz, deve ser submissa ao marido como ao Senhor, fazendo alusão ao
fato de que isso agrada a Cristo e por isso, a mulher deve agir submissamente apesar da
queda. O marido, por sua vez, lidera a esposa, com cuidado, com amor sacrificial e abnegado,
a fim de que a sua esposa seja como a igreja que Cristo apresenta sem mácula nem ruga. É
uma liderança não com autoritarismo, mas, com benevolência e auto-sacrifício.
O que percebemos aqui? Quem é a pessoa central no casamento? Cristo. A mulher se
submete ao marido, como a Igreja ao Senhor (Cristo) e o marido ama a esposa como Cristo
ama a Igreja. A redenção em Cristo, como dissemos, abarca todas as coisas. Abarca, de forma
clara, o casamento. Nele, o casamento é redimido. Isso restaura a ordem da criação.
Como vemos, nada há novo, o que temos é que “a redenção não é uma questão de
acrescentar uma dimensão sobrenatural ou espiritual à vida humana; antes é uma questão de
dar nova vida e vitalidade ao que já estava lá o tempo todo”180. Onde o pecado estragou o
casamento Cristo o redime por sua obra na Cruz e ressurreição.
É possível um casamento harmonioso? É possível viver um casamento cheio da graça
de Deus onde os conflitos são vistos como parte do processo de santificação que tem
começou? Sim, é possível. Possível porque Cristo veio a esse mundo para restaurar todas as
coisas. Cristo veio a esse mundo caído para redimir pecadores e redimir nele todas as relações
humanas.
De forma bastante apropriada Paul David Tripp ensina-nos como Cristo restaura todas
as coisas. Ele escreve:
A mudança é possível! Você pode estar no meio das mais duras realidades do
pecado e ter esperança de que Ele nunca irá desapontá-lo (Rm 5.1-5). O casamento pode
mudar. O adolescente pode mudar. A igreja pode mudar. A amizade pode mudar. A
amargura pode ser aniquilada. A compulsão pode ser quebrada. O medo pode ser derrotado.
O coração de pedra pode ser tornar generoso, e palavras doces podem vir de uma língua
antes ferina. Um cuidado amoroso para com alguém pode vir de uma pessoa que antes era
totalmente voltada para si... O lar pode ser o lugar de segurança, amor e cura. A mudança é
possível porque o Rei já veio!181
180
181
WOLTERS, Albert. Criação Restaurada. São Paulo: Cultura Cristã, 2006, p. 81.
TRIPP, Paul David. Instrumentos nas Mãos do Redentor. São Paulo: Nutra, 2009, p. 24.
87
Sim! Louvado seja Deus! Encontramos o propósito e a redenção do casamento em
Cristo. A boa notícia é que o Rei veio a esse mundo para transformar os relacionamentos.
A razão pela qual o propósito do casamento pode ser restaurado é porque Cristo, e somente
Ele, pode transformar e restaurar o coração humano. Ele é a esperança. Ele promete “...perdoar,
justificar e glorificar todos quantos se voltam para ele, deixando o pecado e recebem a Cristo
como Salvador, Senhor e tesouro supremo da vida. O casamento entre o homem e a mulher
foi planejado desde o princípio para ser reflexo e manifestação desse relacionamento pactual
consumado em sangue”182. Esse reflexo, podemos afirmar é o fato de que eles dependem da
obra de Cristo para terem um casamento que glorifica a Deus.
Devemos nos aperceber disso porque temos um incrível e maligno senso de justiça
própria. Desde a queda quando Adão e Eva tentaram cobrir a sua própria nudez e vergonha,
carregamos conosco esse desejo de nos autojustificarmos. “A justiça própria é um senso de
superioridade moral que nos revela como acusador da pecaminosidade de outras pessoas. Nos
relacionamos com as outras pessoas como se fossemos incapaz de cometer os mesmos
pecados que elas cometem...”183.
Nos momentos em que o pecado e a fraqueza do cônjuge se apresentam somos
tentados a manifestarmos a justiça própria. Somos tentados a esquecer e negar com atitudes o
sacrifício precioso de Cristo e como ele muda o nosso modo de ver a vida.
Paulo diz em Colossenses 3.12-13 que devemos agir da mesma forma como Deus
agir conosco. John Piper chama isso de “Justificação aplicada para fora”184. Sempre e, sem
titubear nem por um momento, devemos viver em nosso casamento a centralidade e
singularidade da morte de Cristo e aplicá-la ao nosso dia a dia.
182
PIPER, John. Casamento Temporário: Uma parábola de Permanência. São Paulo: Cultura Cristã, 2011, p.
28. Ênfase acrescentada.
183
HARVEY, Dave. Quando Pecadores Dizem Sim. São Bernardo do Campo: Fiel, 2011, p. 82-83
184
PIPER, John. Casamento Temporário: Uma parábola de Permanência. São Paulo: Cultura Cristã, 2011, p.
43.
88
QUESTIONÁRIO
1. Quais as pressuposições que a psicologia traz acerca do homem?
2. Por que Deus teve que se tornar homem?
3. O que quer dizer a obediência ativa e passiva de Cristo?
4. Por que o autor afirma que a concepção de casamento não pode ser captada por nenhuma
ciência social?
5. Você concorda com o autor que é por causa do desconhecimento da doutrina bíblica que
muitos casamentos naufragam?
6. Faça uma relação entre justificação pela fé e casamento? Como podemos aplicar a
justificação no casamento?
7. Qual é a glória do casamento?
8. Como marido e mulher podem encontrar o propósito do casamento em Cristo?
9. Como os papéis do marido e mulher cumprem o mandato social? Na sua opinião esse
aspecto continua depois da queda ou não? Justifique.
10. Estude a citação final da página 86 e diga em suas próprias palavras como a obra de Cristo
na cruz pode mudar a realidade do casamento.
89
LIÇÃO 8: A OBRA DE CRISTO APLICADA E O CASAMENTO
INTRODUÇÃO
É importante enfatizarmos que temos dito até aqui que homens e mulheres estão
casados com pecadores e vivendo em um mundo caído. Temos a garantia plena de que
seremos atingidos e atingiremos o cônjuge com os pecados; é o poder do pecado que ainda
permanece em nós. Certamente o nosso cônjuge pecará contra nós, nos decepcionará e terá
atitudes que certamente desconheceremos. Porém Cristo não apenas nos livrou da culpa do
pecado, mas também nos livrou do poder do pecado185
8.1. Perdoados e perdoando
Aqui, devemos lembrar de algumas nuances da obra de Cristo e dos resultados que
eles promovem àqueles que, casados com outros pecadores, são redimidos pela obra eficaz
dele na Cruz do Calvário.
Esses aspectos são mencionados por Paulo em Romanos.
Lembremos: o homem deveria morrer – Cristo morreu em sacrifício no seu lugar. Com
esse sacrifício temos: a ira de Deus é apaziguada, isto é visto na propiciação; a nossa
escravidão ao pecado é resolvida na Redenção; e, o nosso afastamento de Deus é resolvido
pelo que os escritores do Novo Testamento chamam de reconciliação. Todas estas imagens
estão ligadas ao sacrifício de Cristo. Analisemos cada uma:
a) Propiciação
A palavra propiciação aparece em Rm 3. 25; Hb 2. 17; 1 Jo 2. 2 e 4. 10. Todas as
referências referem-se ao fato de Jesus ter sido a nossa propiciação.
Propiciação pode ser descrita como o ato que anula a ira de Deus contra nós ocultando
nossos pecados da sua vista. Isto é o que Paulo ensina no livro de Romanos quando ele diz
que todos pecaram e que todos acumulam contra si mesmos ira para “o dia da ira e da
revelação do justo juízo de Deus...” (2. 5). Paulo no capítulo cinco conclui que só podemos
nos livrar da ira mediante o sangue de Jesus Cristo; só seremos justificados pelo Seu sangue.
185
Ver SCHAEFFER, Francis. Verdadeira Espiritualidade. São Paulo: Cultura Cristã, 1999, pp. 110-112.
90
“Logo, muito mais agora, sendo justificados pelo seu sangue, seremos por ele salvos da ira”
(vs. 9).
A ira de Deus, a Sua santa indignação, que não poderia ter sido apaziguada pelos
homens, foi apaziguada pelo sangue de Cristo. “É o próprio Deus que, em ira santa, necessita
ser propiciado, o próprio Deus que, em amor, resolveu fazer a propiciação, e o próprio Deus
que, na pessoa do Seu Filho, morreu pela propiciação dos pecados. Assim Deus tomou a Sua
própria iniciativa amorosa de apaziguar a Sua própria ira justa... no Seu próprio Filho ao
tomar o nosso lugar e morrer por nós”.186
Cristo apazigua a ira de Deus e nosso pecado é coberto. A ira de Deus não precisa
mais ser temida, em Cristo estamos cobertos da ira. O pecado requer uma punição por causa
da ira e esta recaiu sobre Cristo.
Como já visto acima e veremos abaixo isso tem implicações sobre o nosso casamento
e a forma como vivemo-lo no dia a dia.
b) Redenção
Outro aspecto da obra de Cristo é a Redenção que pode ser definido como “o preço
pago para resgatar algo que estava em penhor, o dinheiro pago para resgatar prisioneiros de
guerra e o dinheiro pago para comprar a liberdade de um escravo”.187
O texto de Marcos 10. 45 fala a este respeito: “Pois o próprio Filho do Homem não
veio para ser servido, mas para servir e dar a sua vida em resgate por muitos”. Cristo deu a
Sua vida em resgate, Ele com a Sua morte pagou o preço; Cristo obteve a nossa libertação da
escravidão do pecado, da morte e do diabo.
A mesma idéia de redenção vamos encontrar em Rm 3. 24; 1 Co 6. 20; 7. 22, 23; 1 Tm
2. 6; Ef 1. 7; 1 Pe 1. 18; Ap 5. 9; 14. 3, 4. Nestes últimos textos a idéia é a de assegurar a
libertação através do pagamento de um preço, que está ligada diretamente ao derramamento
do sangue de Cristo.
O texto de Hebreus 9. 12 e 15 nos mostra de forma particularmente clara que a
Redenção envolve a libertação da culpa do pecado. “...Não por meio de sangue de bodes e de
bezerros, mas pelo seu próprio sangue, entrou no Santo dos Santos, uma vez por todas, tendo
obtido eterna redenção... Por isso mesmo ele é o Mediador da nova aliança a fim de que,
intervindo a morte para remissão das transgressões que havia sobre a primeira aliança,
receberam a promessa da eterna herança aqueles que têm sido chamados”. O preço pago
186
187
STOTT, John. A Cruz de Cristo. São Paulo: Vida, 1999, p. 156.
LADD, George Eldon. Teologia do Novo Testamento. Rio de Janeiro: JUERP, 1985, p. 405.
91
substitutivamente nos redime da penalidade da transgressão. O pecador é liberto do domínio
do pecado.
Entretanto, o eleito não é somente liberto do poder do pecado, mas também dos efeitos
poluentes do pecado. Fomos limpos, purificados de toda iniqüidade (Tt 2. 14).
A redenção também nos livra do domínio de Satanás e do poder da morte. Paulo
afirma que Cristo “cancelou o escrito da dívida que era contra nós e despojou os principados e
potestades triunfando deles na cruz” (Cl 2. 13-15). “Ele nos libertou do império das trevas”
(Cl 1. 13). Cristo rompeu as cadeias que amarram o pecador ao diabo.
É dessa forma que os cristãos devem pensar e agir nos seus casamentos. Eles e seus
cônjuges foram redimidos por Cristo do pecado e da sua penalidade e efeitos poluentes, e
igualmente redimidos do poder de Satanás. Os efeitos do pecado e as ações de Satanás com o
propósito de destruir o casamento (o mesmo propósito maligno que aparece no Éden), devem
ser enfrentados pelo cristão com a graça que há em Cristo Jesus.
Em Hebreus 2. 14-15 vemos que a obra de Cristo além de destruir Satanás, destruiu
também aquilo que estava sob o seu poder: a morte. O diabo tinha o poder da morte nas mãos,
mas Cristo arrancou dele este poder. Por causa do poder da morte, os homens viviam temendo
a morte, sendo escravizados por este temor. Mas os homens por quem Cristo morreu,
deixaram de ter medo da escravidão da morte, assim como a morte passou a não ter o efeito
de penalidade. A morte para o cristão é agora a libertação dos sofrimentos desta vida. Não
mais penalidade pelos pecados, porque quando Cristo morreu, Ele pagou a morte como pena
em nosso lugar.
Esta idéia de resgate aparece claramente também no texto de Isaías 59. Todo o
contexto fala da separação dos homens de Deus por causa do pecado; não havia quem pudesse
tirá-los daquela situação visto que o texto diz que Deis “viu que não havia ajudador algum e
maravilhou-se de que não houvesse um intercessor” (vs. 16). O texto continua dizendo que,
por causa disto – porque o homem não podia fazer nada em seu próprio favor – Deus mesmo
“lhe trouxe a salvação e o seu próprio o susteve”.
No verso 20 Isaías fala acerca de um “Redentor que virá de Sião”. Interessantemente o
termo hebraico usado é goel que pode ser traduzido também por Resgatador ou Redentor
como está na Bíblia Atualizada. Esta palavra é usada no Velho Testamento com a idéia de
“que o goel era o protetor, o parente mais próximo cujo dever era, em determinadas
circunstâncias como, por exemplo, em situações de necessidade, agir como remidor”.188
188
ATKINSON, David. A Mensagem de Rute. São Paulo: ABU, 1991, p. 94.
92
A figura do resgatador está intimamente relacionada com tirar da servidão, como Deus
tirou o povo de Israel da servidão.
Retomando o texto de Isaías 59, fica claro no texto que não havia como o povo voltar
para Deus. O pecado do povo o deixou “pobres”, por assim dizer. Eles tinha de ser redimido.
Cristo é este remidor. O próprio Isaías diz no capítulo 53: “Mas ele foi traspassado pelas
nossas transgressões e moído pelas nossas iniqüidades; o castigo que nos traz a paz estava
sobre ele, e pelas suas pisaduras fomos sarados. Todos nós andávamos desgarrados; cada um
se desvia pelo caminho, mas o Senhor fez cair sobre ele a iniqüidade de todos nós” (vs. 5-6).
Ele pagou o preço para nos redimir; foi o nosso Resgatador; o nosso Redentor. Livrou-nos do
pecado, do poder do diabo e do poder da morte. Ele pagou o preço requerido por Deus. É por
isto que Paulo não só fala do sacrifício em termos da propiciação, mas também fala em termos
da “redenção que há em cristo Jesus” (Rm 3. 24-25).
c) Reconciliação
Com a Sua morte Cristo também nos reconcilia com Deus. Cristo na Cruz também nos
tira do estado de inimizade com Deus.
O homem por causa do pecado está alienado, afastado, inimigo de Deus. Cristo
restaura este relacionamento. A própria idéia de reconciliação sugere alienação. A
reconciliação é necessária, entre duas partes, quando ocorreu algo que causou o rompimento...
O pecado alienou o homem de Deus. Ele quebrou o relacionamento e tornou-se uma
barreira”.189
Reconciliação não é um termo usado na Bíblia no sentido de “encontrar paz consigo
mesmo”, embora ele insista em que somente através da perda de nós mesmos em amor a Deus
e ao próximo é que verdadeiramente nos encontramos.
Em 2 Co 5. 18-21 Paulo insiste que deve ser anunciado que Deus não tem nada contra
os homens, que a inimizade já foi tirada e que Ele agora olha com favor para os homens por
causa do sacrifício de Cristo.
Estas imagens que colocamos nos mostra que a perfeita justiça de Cristo satisfez a
todas as exigências de Deus. A Lei que fora quebrada por Adão fora cumprida perfeitamente
por Cristo. A ira de Deus por causa do pecado foi apaziguada pelo sacrifício propiciatório. “A
quem Deus propôs no Seu sangue como propiciação” (Rm 3. 25); Fomos redimidos pelo seu
sangue: “no qual temos a redenção” (Rm 3. 24); e, saímos do nosso estado de alienação, de
189
LADD, George Eldon. Teologia do Novo Testamento. Rio de Janeiro: JUERP, 1985, p. 420.
93
inimizade também pelo Seu sacrifício: “Porque nós quando inimigos fomos reconciliados com
Deus, mediante a morte do Seu Filho” (Rm 5. 10).
Assim é como se nunca tivéssemos pecado e como se sempre tivesse guardado
perfeitamente a lei de Deus.
Era absolutamente necessário que o Redentor fosse um membro da raça humana para
poder exercer a tarefa da expiação de pecados. Se Cristo não pertencesse ao tronco da raça
humana, ele não poderia fazer o papel de substituto dos homens. Somente o igual pode
substituir o igual.
Esta perfeita justiça de Cristo é imputada aos eleitos. Isto significa que nos vestimos
da justiça de Cristo. Podemos dizer que a nossa injustiça, os nossos pecados e sua penalidade
recaiu sobre Cristo; e a Sua perfeita justiça recaiu sobre nós. Paulo diz: “Para que nele
fôssemos feitos justiça de Deus” (2 Co 5. 21). Ou seja, Cristo foi feito pecado por nós.
Embora, fosse sem pecado sofreu o que devíamos ter sofrido.
Dizer que Deus imputa esta justiça de Cristo aos crentes é dizer que Deus considera a
justiça dEle como pertencente aos crentes. Romanos 4. 5 diz: “Mas, ao que não trabalha,
porém crê naquele que justifica o ímpio, a sua fé é atribuída como justiça”. Não é nossa
própria justiça, mas a justiça de Cristo que nos justifica.
Subentende-se então que recebemos esta justiça pela fé visto que somos justificados
pela fé, mas deve ficar claro que a fé não é meritória porque ela também é dom de Deus (Ef.
2.8).
Se Ele foi feito pecado por nós como afirma Paulo, é mais do que óbvio afirmar que a
justiça de Cristo é imputada àqueles por quem Ele morreu. Assim, podemos afirmar
peremptoriamente que somos justificados, declarados justos diante de Deus “Agora, pois,
nenhuma condenação há para os que estão em Cristo Jesus” (Rm 8. 1).
Assim pensemos, por maior que seja o pecado contra mim, ele já foi perdoado por
Deus. É importante dizer nesse ponto, que sim, sofremos e muito com o pecado do cônjuge,
mas à semelhança do perdão de Deus, somos chamados por ele a perdoar e a buscar a
reconciliação190.
Quando reconheço que Cristo me perdoou, apaziguou a ira de Deus, me redimiu e me
reconciliou com Deus, entendo que no meu casamento sou um agente comissionado por Deus
para a reconciliação. Quando reconheço, da mesma forma, que o meu pecado é uma
estrondosa afronta contra Deus, e que Ele mesmo trabalhou para que eu tivesse o meu pecado
190
TRIPP, David P. O Que você Esperava?São Paulo: Cultura Cristã, 2011, p. 48-51.
94
perdoado, então os pecados do cônjuge contra mim se tornam menos graves em comparação
ao quanto os meus são ofensivos a Deus. E, portanto, perdôo e busco reconciliação.
Na primeira Epístola de Pedro, vemos a aplicação desse princípio. No capítulo 2, verso
23 em diante Pedro diz que o sofrimento dele, serve-nos de modelo para sofrermos também
afronta. É claro que Pedro está falando do sofrimento da perseguição, mas pensando em
aplicação para os nossos tempos podemos, de forma legítima, aplicar esse princípio ao
casamento. Ele diz: “Porquanto para isto mesmo fostes chamados, pois que também Cristo
sofreu em vosso lugar, deixando-vos exemplo para seguirdes os seus passos, o qual não
cometeu pecado, nem dolo algum se achou em sua boca; pois ele, quando ultrajado, não
revidava com ultraje; quando maltratado, não fazia ameaças, mas entregava-se àquele que
julga retamente...”. Somos chamados a não devolver mal por mal. Ele finaliza dizendo que
devemos nos entregar àquele que julga retamente. Como Cristo, então, devemos rogar a Deus,
por santificação nossa e de nosso cônjuge. “Pai perdoa-lhes, eles não sabem o que fazem”.
Os efeitos do pecado de outros sobre nós só podem ser cobertos pelo sangue de Cristo.
Assim, em Cristo buscamos redenção para o nosso casamento. Em Cristo buscamos
reconciliação. Em Cristo podemos tratar os pecados do nosso cônjuge sem manipulação e sem
crítica, mas com a firme resolução de sermos mais unidos em Cristo. Isso é possível por causa
da pessoa de Cristo que está trabalhando em nós por intermédio do Seu Santo Espírito.
As implicações de tudo isso é que o casal deve viver não pensando em sua felicidade
pessoal, mas na pureza de coração que Cristo proporcionou com a sua obra.
Na justificação Cristo sabe o pior a nosso respeito e mesmo assim nos amou a ponto
de morrer na cruz (João 13.1), e continua nos amando sabendo quem nós somos. É sempre
impactante repetir isso: não depende de nós é graça. E também não depende de nós, Ele
continua nos dando graça.
Esse relacionamento com Cristo satisfaz perfeitamente as debilidades que temos como
pecadores. Éramos culpados, carecendo da glória de Deus, mas Ele, nos justificou assumindo
o nosso lugar. O justo pelos injustos. Éramos como aqueles que Paulo diz que andavam
segundo a vontade da carne e segundo o príncipe da potestade do ar que atua nos filhos da
desobediência (Efésios 2.1-3).
4.2.2. Somos pecadores, por isso, precisamos da graça e perdão de Deus.
95
A obra de Cristo nos faz lembrar também o que somos. Enquanto não voltarmos a
nossa atenção para o fato de que somos pecadores e suspeitarmos de nós mesmos e até da
nossa boa vontade, estaremos longe de ter um casamento para a glória de Deus.
Paulo falou acerca de si mesmo como “o maior dos pecadores” (1 Tm 1.15). Paulo
procurava entender o seu próprio coração pecaminoso. Ele procurava fazer uma auto-análise.
E declarou-se como o principal dos pecadores. Por causa disso, “nos conflitos cotidianos, eu
deveria suspeitar primeira e regularmente de mim mesmo! Suspeitar de meu próprio coração e
reconhecer duas coisas: meu coração tem um papel central em meu comportamento e uma
tendência permanente de opor-se aos caminhos de Deus”191. Muitos problemas do casamento
encontram solução aqui, quando eu me reconheço pecador e dependente da graça de Deus.
É sempre bom lembrarmos o que Jesus disse em Mateus 7.1-5. O dr. Lloyd-Jones faz
uma precisa análise desse texto. Ele assevera que a atitude de crítica para com a outra pessoa
está manchada pelo nosso próprio pecado e pela tentativa absurda de escondê-la, tão absurda
como alguém tentando esconder uma trave enquanto tira o cisco do olho de outra pessoa192.
John Stott caminha nessa mesma direção, estabelecendo alguns princípios importantes
desse texto que devemos aplicar ao matrimônio. Ele diz que não devemos nos tornar juízes,
nem hipócritas193. É importante frisarmos isso, pois “temos uma tendência fatal de exagerar as
faltas dos outros e diminuir a gravidade das nossas”. Porém “temos uma visão rósea de nós
mesmos e uma deformada dos outros. Na verdade o que geralmente acontece é que vemos
nossas faltas nos outros e nos julgamos vicariamente”.194
Somos pecadores perdoados. Ainda pecamos. E esse pecado sempre trará problemas
ao casamento. Reconhecer que somos pecadores e necessitados da graça de Deus para nos
livrar do poder do pecado é imprescindível no propósito de glorificar a Deus no casamento.
Antes de olharmos para os erros do nosso cônjuge, precisamos humildemente
reconhecer que também somos pecadores. Pecadores que ainda necessitam de graça.
Pecadores que ainda necessitam de perdão. Com esse entendimento e prática podemos
continuar firmes em um casamento cujo propósito principal é a glória de Deus.
Essa é uma ajuda que vem de fora de nós. Essa postura nos conduzirá à pessoa de
Cristo e à necessidade da sua obra para justificação.
191
HARVEY, Dave. Quando Pecadores Dizem Sim. São Bernardo do Campo: Fiel, 2007, p. 58.
LLOYD-JONES, David Martyn. Estudos no Sermão do Monte. São Bernardo do Campo: Fiel, 2009, p. 459.
193
STOTT, John R. W. A Mensagem do Sermão do Monte. São Paulo: Aliança Bíblia universitária, 1989, pp.
182-189.
194
Ib. Ibid.
192
96
4.2.3. O cônjuge também é pecador, por isso precisa da graça e perdão de Deus.
É porque Cristo cumpriu a Lei de Deus e morreu na cruz do Calvário em lugar dos
eleitos que podemos descansar. Enquanto estamos nesse mundo estamos num campo de
batalhas. O casamento está inserido aí também. As lutas, as brigas, os desentendimentos, as
palavras ofensivas, enfim todo o fruto do nosso agir pecaminoso, repetimos, é fruto de que
ainda somos pecadores. Porém não somos apenas pecadores. Somos pecadores perdoados.
Somos justificados em Cristo. Somos um com Ele.
Essa compreensão nos dá uma nova ótica sobre o casamento e o cônjuge. Primeiro, o
meu cônjuge não é o meu grande problema nem eu o dela. O grande problema é o pecado.
Dele(a) e meu! Mas, em segundo lugar, o fato de ser um pecador perdoado me coloca numa
posição de que o meu casamento pode ser maravilhoso. Está em Cristo significa que
não há causas perdas ou conflitos desesperadores. Cada dia é um dia de nova
misericórdia e poder para confessar e amar perdoar e restaurar. Melhor ainda as batalhas do
casamento deixam de ser apenas situações contra as quais lutamos para avançar na jornada,
esperando chegar até ao fim do relacionamento intacto. Em vez disso, até os nossos
conflitos têm possibilidades redentoras, porque a guerra contra o pecado é vencida em
Cristo, pela graça e poder de nosso Soberano Deus 195.
Mais uma vez lembramos que a justificação traz benefícios para o casamento também.
“A justificação traz paz com Deus verticalmente, apesar de nosso pecado. E quando
vivenciado horizontalmente, o casamento cria a paz livre de vergonha entre um homem
imperfeito e uma mulher imperfeita...” 196 . O relacionamento com Cristo deve lembrar da
graça de Deus aos cônjuges.
O fato de termos recebido perdão e graça da parte de Deus deve nos lembrar de que
como imagem e semelhança de Deus devemos manifestar isso também ao nosso cônjuge.
Dessa forma, ao invés da egorreferência característica de todos os pecadores passamos
a refletir a glória de Deus. Deixamos de lado o egoísmo, o estabelecimento do próprio reino e
criamos no nosso casamento um ambiente de graça, de amor, de manifestação da glória de
Deus. “Ao contemplar a glória de Deus, somos transformados à semelhança dele, e nos
tornamos cada vez mais compassivos, graciosos, tardios em nos irar, amorosos, fiéis e
perdoadores. Nossos lares são transformados em lugares da graça onde a glória da bondade
195
TRIPP, Paul David. TRIPP, David P. O Que você Esperava?São Paulo: Cultura Cristã, 2011, p. 26.
PIPER, John. Casamento Temporário: Uma parábola de Permanência. São Paulo: Cultura Cristã, 2011, p.
30.
196
97
dele se irradia dos que habitam ali. E não nos enganemos isso não tem nada a ver com
esforço próprio. É vida na região da graça”197.
Para se construir um casamento assim, não há que duvidarmos, precisamos da graça de
Deus. Só ela nos possibilita a vivermos refletindo a glória de Deus no nosso casamento. Só
porque Cristo veio é que podemos vivenciar assim o Evangelho.
Paulo diz que “...Deus prova o seu próprio amor para conosco pelo fato de ter Cristo
morrido por nós, sendo nós ainda pecadores” (Rm 5.8). Assim, o amor que o marido
demonstra pela esposa não deve depender de quão merecedora ela seja, ou do fato de ela está
se comportando adequadamente, ou se ela agrada ao seu marido. Deus – louvado seja o Seu
nome – não nos ama e não envia as suas bênçãos com base no nosso merecimento. Da mesma
forma os maridos são chamados a amarem as suas esposas. Da mesma sorte as mulheres são
chamadas a serem graciosas com seus esposos não os respeitando a partir do seu
merecimento; julgando aos seus próprios olhos, se ele merece o seu respeito e submissão ou
não.
197
HUNT, Susan. A Graça que vem do Lar. São Paulo: Cultura Cristã, 2002, p. 51. Ênfase acrescentada.
98
QUESTIONÁRIO
1. O que é propiciação?
2. O que é Redenção?
3. Do que nos livra a redenção de Cristo?
4. O que é reconciliação?
5. Como você poderia relacionar esses conceitos com o casamento?
6. Qual é o maior problema do casamento?
7. Como a justificação pode ser vivida horizontalmente?
8. O reconhecimento de que somos pecadores nos ajuda a viver um casamento para a gloria de
Deus? Justifique.
9. O autor afirma que o fato de sermos pecadores perdoados nos dá uma nova ótica sobre o
casamento. Você concorda? Justifique.
10. Leia a citação de Paul Tripp na página 96 e faça seu próprio comentário sobre ela.
99
CONCLUSÃO
É interessante ver que o livro de Apocalipse termina com a ideia de Deus como noivo
e a sua igreja como a noiva (Apocalipse 21 e 22). Nesse texto somos levados a ver a noiva. A
Cidade Santa é a Noiva, a esposa de Cristo (21.9). A Nova Jerusalém é a noiva do
Cordeiro.198 Ali, a comunhão entre Deus e seus filhos é tanto a mais íntima e permanente
relação de amor quanto a coisa mais gloriosa e bela do universo, é simbolizada por essa figura
do casamento.
Ao compararmos essa forma como a Bíblia trata o casamento e a forma como o
governo e outras instituições têm investido contra a família, podemos perceber o ataque de
Satanás contra o plano de Deus! Essas investidas, de fato, reforçam e tornam mais fácil a
degradação e desintegração do casamento. Entretanto, concluímos, temos um problema
interno, gritante e que não pode ser compreendido sem as categorias das Escrituras.
Não se trata de um problema de educação, de diplomas, de posses. Trata-se da nossa
pecaminosidade. Trata-se da nossa idolatria. Trata-se do problema de que, por conta do
pecado, nos vemos como o centro de tudo. Perdemos o referencial verdadeiramente único e
infinito. Nos apegamos ao nossos desejos que rapidamente se transformam em tiranos que nos
guiam em todos os aspectos da vida. Queremos o que desejamos e queremos agora. Isso
reforçado pelos estímulos externos do mundo caído, forma uma cadeia quase inexpugnável,
ou melhor dizendo, realmente inexpugnável do ponto de vista humano.
Quando aprendemos isso, reconhecemos que estamos absolutizando algo. Adorando
algo ao invés de Deus, porque somos criaturas pactuais, essencialmente adoradoras.
Mas, somos chamados por Deus a termos relacionamentos no casamento que
glorifiquem a Ele. A partir desses pressupostos teológicos de casamento e pacto, seremos
capazes de, com a sabedoria que Deus nos deu, buscarmos aplicá-los ao nosso casamento,
fazendo da glória de Deus o nosso objetivo e como resultado dessa busca gozarmos de
felicidade e alegria nos nossos relacionamentos.
O Deus que enviou Jesus Cristo para redenção nos convoca a olharmos o casamento e
tudo o mais a partir do quadro de referência proposto pelas Escrituras.
Que Ele nos livre de estabelecer o nosso próprio reino em detrimento do dEle.
198
Ver KISTEMAKER, Simon. Apocalipse. São Paulo: Cultura Cristã, 2004, p. 706ss. Ver também VIEIRA,
Samuel. Tudo Sobre Controle. Goiânia: Logos, 2006, p. 375ss.
100
E, oremos para anelar com mais e mais força e fervor que o reino de Deus se
concretize. E que os nossos corações sejam dele e somente dele. Que a nossa adoração seja
somente para Ele. Oremos para que o nosso casamento seja para a glória dele.
“Porque dele, e por meio dele, e para ele são todas as coisas. A ele, pois, a glória
eternamente. Amém!” (Romanos 11.36)
Este tipo casamento, o que glorifica a Deus, lida seriamente com os seus pecados num
ambiente de perdão baseado nos méritos de Cristo na cruz do Calvário e que é por tudo isso
pleno da graça de Deus, é um testemunho enérgico e vívido de que Deus criou o casamento
no pacto da Criação. A Ele pois seja toda glória!
101
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CRABB, Larry. ALLENDER, Dan. Esperança do Sofrimento. São Paulo: Sepal, 2ª.
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