Berçários Estelares : O Meio Interestelar e a Formação de Estrelas Heloísa Boechat GEA / Observatório do Valongo / UFRJ Meio Interestelar Quando observamos o céu em um lugar longe da poluição luminosa das grandes cidades, é possível visualizar uma faixa esbranquiçada que cruza o céu, devido a luz das estrelas da nossa galáxia Via Láctea, permeada por muitas manchas bastante escuras. No céu do hemisfério sul, é fácil identificar a constelação Cruzeiro do Sul (slide 2), com suas quatro estrelas que compõem a cruz e uma quinta estrela, popularmente denominada de A Intrometida. Pode-se perceber uma grande mancha preta abaixo e a esquerda do Cruzeiro do Sul, denominada nebulosa Saco de Carvão. Este nome, muito apropriado, foi dado antes do conhecimento que a composição química desta nuvem é também uma decorrência da combustão da matéria e contém fuligem, grafite, diamantes e diversos compostos de átomos de carbono. Esta nebulosa aparece escura porque contém gás molecular e poeira cósmica (partículas ou grãos), em quantidade suficiente para obscurecer a luz das estrelas localizadas atrás dela. Ampliando a região abaixo e a direita do Cruzeiro do Sul, assinalada com um quadrado, surge uma bela nebulosa de emissão, denominada IC2994 (slide 3). Esta é uma imensa nuvem de gás (contendo átomos e moléculas) e poeira onde está acontecendo a formação de diversas estrelas. Toda luminosidade observada é uma conseqüência da intensa radiação e dos forte ventos emitidos pelas estrelas recém- nascidas interagindo com a matéria ao redor, provocando a ionização, isto é, arrancando os elétrons dos átomos e das moléculas existentes. Como o elemento mais abundante é o átomo de Hidrogênio H, e nesta nuvem brilhante todo ele está ionizado, esta nebulosa denominada de Região HII, (HI corresponde ao hidrogênio neutro). Ampliando novamente uma parte desta imensa nuvem vemos vários fragmentos de nuvens muito escuras, em processo de contração ou colapso gravitacional, denominados glóbulos de Bok (slide 4 e 5). Das diversas regiões de formação estelar podemos mostrar algumas, como na constelação de Escorpião (slides 7 e 8) e na constelação de Orion (slides 9, 10 e11). Formação de estrelas A formação de estrelas com seus planetas e cometas ocorre nas nuvens moleculares gigantes, compostas de gases (H, (mais abundante) e diversas espécies moleculares, inclusive orgânicas), grãos de silicatos, grafite e diamante. As dimensões destas nuvens são gigantescas, com baixíssimas temperaturas e densidades (slide 12), que sofrem a fragmentação (slide 15), surgindo os glóbulos de Bok (slide 16). Cada glóbulo dará origem a uma estrela e quanto maior a massa deste fragmento maior será a massa M da estrela, que dada em relação a massa do Sol, MSol . Quando começam a colapsar (slide 17) a massa vai condensando, aumentando gradativamente a densidade da matéria e a temperatura. Após 100.000 anos de contração inicia-se o processo da fusão nuclear no interior da nuvem, onde quatro átomos de H fundem-se para formar um átomo de Hélio (slide 18). Estas reações nucleares geram tanta energia eletromagnética que a pressão da radiação é capaz de empurrar a matéria ao redor, em sentido oposto a contração, surgindo a proto-estrela (slide 21 e 22). Quando a pressão gravitacional entra em equilíbrio com a pressão de radiação a proto-estrela passa ser uma estrela e na nuvem circundante que restou formam-se os planetas, cometas (slide 24). Berçários Estelares Um belo exemplo de uma região onde nasceram diversas estrelas e portanto é um verdadeiro berçário estelar, é a Nebulosa gigante NGC3603, situada na constelação de Carina, vizinha ao Cruzeiro do Sul, (slide 24). Nesta região, distante cerca de 20.000 anos luz da Terra, podemos visualizar muitas estrelas em vários estágios do ciclo de vida . No centro da imagem (slide 24) está um aglomerado de estrelas, onde dezenas de estrelas extremamente massivas e quentes, do tipo O e Wolf-Rayet que nasceram de um só evento de formação estelar há cerca de 2 milhões de anos atras. Uma estrela massiva recém – nascida, assim como um bebê, nasce embebida do material que a gerou (placenta). Como são muito quentes produzem uma torrente de radiações ionizantes e forte ventos estelares, expelindo jatos de material em altas velocidades, empurrando a matéria em torno formando uma cavidade ao redor do aglomerado. A evidência da interação da radiação ionizante com o material frio da nuvem molecular está nos pilares gasosos à direita e abaixo a esquerda do aglomerado. Nuvens escuras no alto a direita são os chamados glóbulos de Bok, que provavelmente estão no estágio inicial da formação estelar (slide 26). As Plêiades (slide 27), outro exemplo de um berçário de estrelas, as recém-nascidas ainda estão envoltas em suas placentas, assim como em na nebulosa de Orion (slide 28). Já na nebulosa de Roseta a matéria no seu centro já foi expelida deixando o aglomerado à vista. As estrelas passam a vida produzindo elementos químicos como os átomos de Hélio (He), Carbono (C), Oxigênio (O), Nitrogênio (N), usando o Hidrogênio como combustível para as suas reações nucleares, reações estas, responsáveis pelo intenso brilho que elas emitem. Quando envelhecem, o combustível vai se esgotando e elas jorram as suas produções para o espaço interestelar. Desde o nascimento até a morte, características como o raio da estrela a luminosidade e a temperatura vão alterando durante a vida. A classificação das estrelas em função desde parâmetros é mostrada no diagrama de Hertzsprung e Russel (HR), (slide 31). Neste diagrama temos, por exemplo que estrelas na fase intermediária das suas vidas (cerca de 90% do tempo de vida), ocupam uma posição no diagrama denominada seqüência principal. No final da vida e dependendo da massa inicial, uma estrela pode se torna uma Anã Marrom, uma Anã Branca, uma Estrela de Nêutrons ou um Buraco Negro (slide 32 e 33), em ordem crescente de massa. Formação de Moléculas Em resumo, os elementos químicos são sintetizados no centro da estrela, que quando esta atinge uma certa idade, ela ejeta os elementos na sua atmosfera (slide 35). Já nas atmosferas estelares são formadas moléculas como os hidrocarbonetos (compostos de átomos de C e H), e diversos tipos de partículas sólidas como os grãos de silicatos e de carbeto de silício SiC, que são soprados para o meio interestelar através dos ventos estelares ou pela ejeção das camadas externas quando tornam-se Nebulosas Planetárias (slide 36). Os grãos de poeira cósmica são compostos de, além dos citados silicatos e SiC, compostos de carbono como, grafite, diamante (slide 37) e muitas pedras preciosas como safiras, rubis. Estas partículas expelidas pelas estrelas literalmente enriquecem o Meio interestelar. Na superfície destes grãos interestelares, moléculas como CO2, NH3 são congeladas formando um manto de gelo ou uma sopa de moléculas congeladas (slide 40). Os raios ultravioleta de estrelas próximas incidem nestes mantos provocando a fotoquímica, isto é, a quebra das ligações químicas dos compostos, cujos fragmentos recombinam-se em novas estruturas, podendo formar os hidrocarbonetos aromáticos policíclicos (slide 39), as quinonas (cetonas aromáticas), e talvez até moléculas tão complexas como as moléculas precursoras da vida (slides 41, 42 e 43). Assim, o Meio Interestelar é enriquecido quimicamente pelas estrelas e são nestas nuvens contendo moléculas tão complexas como os amino ácidos que nascerão novas estrelas que por sua vez, irão sintetizar mais elementos, iniciando novamente um novo ciclo. (slide 50 e 52). Acredita-se que o Sol seja uma estrela que nasceu de uma nuvem enriquecida pela quinta geração estelar contendo complexas moléculas orgânicas. As evidências foram obtidas pelas análises da composição química dos cometas. Sabe-se que quando um cometa desprende-se da região fria onde foi formado, chamada nuvem de Oort ele é atraído pelo Sol e ao aproximar-se deste começa a evaporar, soltando uma grande quantidade de matéria, trazendo informações da nuvem primordial na qual o Sol foi formado. Acredita-se também que os meteoritos foram os responsáveis por trazer moléculas orgânicas extraterrestres para a Terra, pois diversos amino ácidos foram encontrados no meteorito Murchison. Estes compostos orgânicos foram resultado da fotoquímica interestelar no começo da formação do Sistema Solar. A Astroquímica, química dos astros, é uma ciência que está na interface entre a Astronomia, a Química e a Física e trata dos processos químicos e fisico-químicos que ocorrem em diversos ambientes astrofísicos, como atmosferas planetárias, cometas, nebulosas e nuvens interestelares. Esta área da ciência, estudada nos últimos anos, está começando a ganhar um grande investimento, na procura da descoberta de como estas moléculas se formam e como elas se ligam, necessitando portanto do conhecimento de como elas interagem com fótons e elétrons.