Veículo: A Tribuna Data: 04/12/2011 Pág: Online Vem aí um verão abaixo da média na Baixada Santista Este ano foi o décimo mais quente do mundo desde 1850, quando as medições da temperatura começaram a ser feitas. A novidade, divulgada pela Organização Mundial de Meteorologia (OMM), ligada à Organização das Nações Unidas (ONU), promete esquentar ainda mais os debates sobre o aquecimento global. Mas, do global ao regional, o que se vê é um clima de ponta-cabeça. Pois, se o mundo vem padecendo de calor este ano, a Baixada Santista, e Santos em particular, vivem uma pequena era do gelo – guardadas as devidas proporções. Segundo o físico e astrônomo Rodolfo Bonafim, até aqui, o ano de 2011 foi o mais frio na região, nos últimos dez anos. A média das temperaturas máximas neste ano está em 24,82 graus, e a das mínimas, em 18,2. Para se ter uma ideia, em 2003, essas médias estavam em 25,55 e 19,6 graus, respectivamente. A culpa do frio além da conta por estas paragens recai sobre o fenômeno La Niña, de resfriamento das águas do Oceano Pacífico, que aconteceu no fim do ano passado. Como os oceanos têm comunicação entre si, a água é uma só. Assim, o reflexo desse resfriamento invade o Oceano Atlântico e chega ao Litoral Paulista. “Perdeu força no final de janeiro, mas persistiram resquícios até abril. O resultado foi um outono bem ameno. E agora, em novembro, está voltando (a La Niña)”, diz Bonafim, que é o dono da, provavelmente, única estação meteorológica instalada em Santos, em sua casa, na Vila Belmiro. O meteorologista do site Climatempo, André Madeira, confirma o resfriamento no Sudeste brasileiro e prevê um verão menos quente. “Nesta primavera, as temperaturas estão abaixo da média. E a tendência é que permaneçam assim”. Fenômenos La Niña é o oposto de El Niño – o aquecimento das águas do Pacífico. Os fenômenos são sazonais e ocorrem intercalados, com prevalência do El Niño. Só que, nos últimos anos, essa regrinha vem sendo subvertida: a quantidade de La Niñas tem superado a de El Niños. E não é só isso: segundo a Organização Mundial de Meteorologia, o La Niña do ano passado, que se estendeu até maio deste ano, foi o mais intenso dos últimos 60 anos. Ou seja, tanto a intensidade quanto a frequência dos fenômenos parecem estar mudando. Em 2009, por exemplo, houve um inverno chuvoso, com 250 milímetros – nível equivalente ao de fevereiro, por causa do fenômeno. As causas disso são nebulosas. Mas podem estar ligadas ao propalado aquecimento global. Isso mesmo: a anomalia que faz 2011 o ano mais frio dos últimos dez, em Santos, pode ser fruto de um planeta mais quente. Padrões climáticos A razão disso é que temperaturas mais altas acirram e modificam os padrões dos fenômenos climáticos. "Uma chuva de granizo isolada em São Paulo, por exemplo, não é causada pelo aquecimento global. Mas, se você pegar as chuvas de granizo dos últimos anos e ver a intensidade e a frequência com que aconteceram, aí, sim, você pode apontar para o aquecimento”, explica o doutor em Meteorologia e especialista em mudanças climáticas Fábio Nobre, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). Da chuva de granizo à Niña tresloucada dos últimos tempos: consequências diferentes, uma (e mesma) causa possível. “Ano a ano, viemos batendo o recorde: as nove maiores temperaturas da História aconteceram nos últimos 12 anos”, ressalta Nobre. O aquecimento global é causado pela grande quantidade de gases emitidos pelo Homem, especialmente o carbono – o mais comum, na produção de energia. “Em 1960, a quantidade de gases aumentava uma parte por milhão (em proporção, na atmosfera) ao ano. Hoje, essa velocidade de aumento é de três partes por milhão”, calcula o especialista. Uma consequência extrema, e ainda muito distante, desse processo – “em um cenário de filme de Hollywood”, comenta Nobre – seria a inviabilidade da agricultura. “O clima desordenado pelo aquecimento causaria a ruptura das cadeias de produção natural. Você teria chuva, quando se esperava estio; e estiagem severa em época de chuva”. Em outras palavras, o caos. Evitá-lo é uma questão de sobrevivência. Afinal, seria triste um mundo em que o Sol despontasse sem que houvesse olhos para contemplálo.