VI Seminário Latino Americano de Geografia Física II Seminário Ibero Ameicano de Geografia Física Universidade de Coimbra, Maio de 2010 NATURAL HAZARDS E URBANIZAÇÃO: CONSIDERAÇÕES SOBRE RISCO E VULNERABILIDADE SOCIOAMBIENTAL EM SANTA CATARINA – BRASIL Wilson Flavio Feltrim Roseghini ([email protected]); Francisco de Assis Mendonça ([email protected]) – Universidade Federal do Paraná, Curitiba, Brasil. 1. Introdução Em novembro de dois mil e oito o Estado de Santa Catarina, passou por um dos piores desastres climáticos já registrados no Brasil. Apesar de seu histórico de grandes enchentes, foram onze grandes episódios desde o inicio da década de 80. O fato ocorrido em dois mil e oito se tornou um evento extremo sem precedentes, uma vez que, além das áreas de cheias, o grande número de deslizamentos surpreendeu a todos os estudiosos da área. Segundo a Defesa Civil do Estado mais de oitenta mil pessoas ficaram desalojadas ou desabrigadas, oitenta e cinco municípios em situação de emergência e quatorze municípios em estado de calamidade pública. Destes dados apresentados agregam-se ainda 135 mortes e dois desaparecidos, sendo que, 97% das mortes ocorreram por soterramento. Um dos fatores a ser destacado neste evento foi, segundo a defesa civil, o índice pluviométrico registrado. Entre os dias vinte e dois e vinte e três de novembro choveu mais que o dobro da media prevista para todo o mês em muitas cidades do Estado. Um exemplo a ser destacado é Blumenau, que em cinco dias foram registrados mais de 600 mm de chuva, sendo que a média mensal para a cidade é de 110 a 150 mm. Um evento desta magnitude trouxe ao Estado uma série de questionamentos quanto ao preparo das entidades para lidar com desastres. Os prejuízos vão desde a perda de vidas, danos estruturais, queda da produção da indústria, interrupção do abastecimento de gás, perdas no turismo e várias outras situações. A quem cabe a responsabilidade pelas perdas apresentadas neste evento? Ao Estado, a sociedade, a natureza, ou uma associação de ambos? Levantamentos feitos pela equipe da Epagri/CIRAM (2008) indicam que o desmatamento, a ocupação humana desenfreada e o desrespeito a Legislação Ambiental, aliados ao fato da intensa precipitação seriam os responsáveis diretos pelo desastre. Determinar estes fatos é estabelecer vulnerabilidades e riscos para a população que aí reside. 1 Tema 4 - Riscos naturais e a sustentabilidade dos territórios 2. Características Físicas 2.1. Localização Geográfica O Estado de Santa Catarina localiza-se entre os paralelos 25º57’41” e 29º23’55” de latitude Sul e entre os meridianos 48º19'37" e 53º50'00" de longitude Oeste, na Região Sul do Brasil. A superfície do Estado é de 95.442,9 km². Essa área corresponde a 1,12 % do território brasileiro e a 16,57% da área da Região Sul (Figura 1). Em dois mil e oito, este Estado teve um dos maiores eventos climáticos extremos registrados. A área de maior intensidade deste evento extremo se concentra na região centro-norte de Santa Catarina entre a zona costeira e a Serra do Mar, denominada de Vale do Itajaí, que abrange dois rios que irão desaguar no oceano na área da cidade de Itajaí. São eles: o Rio Itajaí-Açu e Rio Itajaí Mirim. Figura 1 - Localização da área mais afetada em Santa Catarina, Brasil. Fonte adap.: combinação SRTM e Mosaico Landsat GeoCover 2000, INPE, 2009. 2 VI Seminário Latino Americano de Geografia Física II Seminário Ibero Ameicano de Geografia Física Universidade de Coimbra, Maio de 2010 2.2 Características Hidrográficas e Geológico-geomorfológicas A Bacia do rio Itajaí é a maior bacia hidrográfica da vertente Atlântica do Estado, apresenta uma área de 15.500 km2, ou seja, 16,15% do território, segundo censo de 2000, 945.720 habitantes, sendo que 76% estão em área urbana. Esta bacia cobre 47 municípios e desde 1998, já tem o seu Comitê de Bacia, aprovado pelo Conselho Estadual de Recursos Hídricos. Um dos grandes problemas para o gerenciamento da Bacia do Itajaí sempre foram às enchentes. Isto decorre em razão das próprias condições naturais da bacia que recebe umidade direta do oceano. Outro aspecto relevante esta no fato do próprio desenho da costa, sem golfos ou baías que limitem a ação das marés, favorecendo a ação de represamento do fluxo de água vindo do continente através dos rios, potencializando o nível das enchentes (DIAS, 2008). O Estado de Santa Catarina pode ser dividido em três unidades geomorfológicas: o primeiro chamado de Planalto da Serra Geral, caracterizado por derrames basálticos continentais e arenitos eólicos da Formação Botucatu, que reunidos dão origem ao Grupo São Bento. O segundo compartimento é denominado Cinturão Orogênico da Serra do Mar, composto por rochas graníticas cristalinas da formação Mantiqueira. E por fim o terceiro compartimento formado por planícies costeiras, quaternárias, de origem flúvio-marinha (DIAS, 2008). A área de ocorrência do evento apresenta-se em vales em formato côncavo em sua grande maioria, o que predispõe a região a alagamentos e escorregamentos A litologia da região composta por granitos e granulitos, siltitos calcários e dependendo do grupo geológico a que pertence, caracterizarão os tipos de solos da área. As planícies aluviais apresentam solos do tipo gleissolo, podzólicos e solos de mangue. Para as áreas da Serra do Mar apresentarão solos do tipo cambissolo, podzolico e litólico álico, (VEADO E TROPPMAIR, 2001). Segundo estudos realizados por geólogos na região, os morros locais são cobertos por um solo vermelho, chamado de “granulitos arqueanos com manto de intemperismo”. Este tipo de solo, esta apoiado sobre rochas graníticas (Serra do Mar) de permeabilidade baixa, chegando a ter 12 metros de profundidade (DIAS, 2008). As altitudes na Bacia Hidrográfica do Itajaí variam de 0 a 1500 m. Entre os principais acidentes geográficos, destacam-se os morros do Funil (1062 m) em Taió, o Morro do Spitzkopf (913m) em Blumenau e Indaial, e o morro do Baú em Ilhota (819m). De acordo com Dias (2008), a região costeira do Estado de Santa Catarina, que se localiza entre o oceano e o Planalto da Serra Geral, está submetida a processos 3 Tema 4 - Riscos naturais e a sustentabilidade dos territórios naturais de denudação que, dadas as condições climáticas, geológicas, geomorfológicas e de uso da terra, se constitui em área com alto risco de ocorrência de desastres naturais na forma de inundações e corridas de massa. 2.3 Características Climáticas Segundo Nery (2005), o sul do Brasil, devido à sua localização latitudinal, sofre mais influência dos sistemas de latitudes médias, onde os sistemas frontais são os principais causadores de chuvas durante o ano. Com relação às temperaturas, observa-se no período de inverno maior penetração de massas de ar frio, contribuindo para a predominância de baixas temperaturas. Ainda segundo o autor, estudar a região sul do Brasil e sua dinâmica é muito complexo e requer um olhar atento sobre os diferentes sistemas que atuam nessa região. Desde já deve ser ressaltado que muitas dinâmicas explicativas das chuvas intensas ou mesmo a falta de chuva, da amplitude térmica dessa região, têm suas gênese distante dessa área do Brasil. Descrever as circulações que influenciam a área de estudo requer uma passagem sobre outras regiões fundamentais na explicação dos extremos climáticos, ao longo de anos ou décadas e mesmo a variabilidade sazonal, intra-sazonais e interanual, da região sul brasileira. Alguns eventos exigem o conhecimento da periodicidade de sua atuação: o El NiñoOscilação Sul (ENOS), visto que “*...+ provoca graves perturbações climáticas (secas anormais ou, ao contrário, ciclones e chuvas com totais pluviométricos extremamente elevados em relação às normais locais e regionais) em regiões habitualmente isentas de tais eventos” (MENDONÇA E DANNI-OLIVEIRA, 2007). Em escala regional, temos o Estado de Santa Catarina, que apresenta clima subtropical mesotérmico úmido, com duas variações: Cfa, encontrada em praticamente todo o Estado em altitudes inferiores a 800m e o Cfb, encontrado em áreas acima de 800 m, As chuvas são bem distribuídas durante o ano, mas de acordo com cada região diferenças vão aparecendo no que concerne à temperatura. Nas regiões de planalto ao norte o verão é fresco e o inverno frio, no litoral e no oeste do Estado, as temperaturas são mais quentes no verão, além disso, é mais prolongado. Em alguns pontos do Estado ocorre com freqüência a neve e as geadas. Na região do Vale do Itajaí a temperatura média anual, fica em torno de 20,1ºC, enquanto que a temperatura média mínima fica em torno de 15,8ºC. A precipitação total anual da região é de 1.596,2 mm. Em seu estado climático normal, onde as 4 VI Seminário Latino Americano de Geografia Física II Seminário Ibero Ameicano de Geografia Física Universidade de Coimbra, Maio de 2010 chuvas são uniformemente distribuídas durante o ano, apenas divididas em duas estações chuvosas características uma na primavera e outra no verão, com precipitação media de 130 mm/mês, e dois períodos considerados de pouca precipitação abril e agosto e no mês de novembro, com cerca de 80 mm/mês (Comitê do Rio Itajaí, 2008). Apesar das características climáticas apresentadas, a região sofreu um dos mais graves eventos climáticos extremos, em decorrência de chuvas antes regulares apresentaram-se com uma intensidade jamais vista. Muitos municípios da região apresentaram precipitações acima das marcas históricas já registradas. Após este evento, analistas se reuniram para identificar as causas desta anomalia. Um dos fatores climáticos que vem influenciando no aumento das precipitações e ocasionando enchentes paulatinamente são os eventos El Niño, que em períodos de atuação moderada ou forte, provocam intensas chuvas na região. Em maio de 1992 o episódio moderado de El Niño ocasionou inundações graduais em 77 municípios, nas regiões Oeste, Norte e Vale do Itajaí. Nos anos de 1997 e 1998, novamente inundações de forte intensidade em Santa Catarina originados pelo evento. Entre 2002 e 2003 novas inundações graduais resultantes do El Niño. Apesar de ser um evento cíclico, ele não pode estar relacionado com o evento gerado em novembro de 2008, uma vez que estávamos sob a atuação do La Niña, desta forma não se pode dizer que o evento faz parte dos padrões de variabilidade climática interanual mais conhecidos para a região, normalmente associados a eventos de escala planetária (DIAS, 2008). O que ocorreu em Santa Catarina segundo os estudiosos foi uma situação anômala para a região, conhecida como bloqueio atmosférico, influenciada por circulação de umidade proveniente do Oceano Atlântico. Este evento atuou durante quase todo o mês de novembro, caracterizado por apresentar dois sistemas meteorológicos, um sistema de alta pressão ou anticiclone (anticiclone de bloqueio) e um sistema de baixa pressão ou ciclone, que ficam semiestacionários e persistem com esta condição por um longo período de tempo, por um mínimo de 05 dias. A Figura 2 mostra o funcionamento de um bloqueio atmosférico, onde os tons de azul representam as áreas de divergência de umidade e as cores amarela e laranja as áreas de convergência. Pode se notar também a circulação dos ventos em níveis baixos da atmosfera, onde fica caracterizado um forte bloqueio no Atlântico Sul devido ao anticiclone, com centro de 1037 hPa, que abastecia de umidade a região litorânea de Santa Catarina e Paraná. 5 Tema 4 - Riscos naturais e a sustentabilidade dos territórios Por fim, esta situação sinótica favoreceu a ocorrência de chuvas orográficas sobre a região do Vale do Itajaí, ocasionando os eventos extremos investigados nesse trabalho. Figura 2 – Esquema do bloqueio atmosférico ocorrido em Santa Catarina. Fonte: Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE). Um sistema de baixa em altitude (cavado), associado ao intenso transporte de umidade do Atlântico para o continente (ventos de leste) reforçou o levantamento, intensificando a instabilidade e as chuvas, principalmente entre o leste de SC e do PR. O padrão de bloqueio estabelecido favoreceu a continuidade das chuvas, principalmente, no leste de SC. Nesta área, as chuvas ocorreram de forma intensa e os acumulados diários atingiram os 340 mm em algumas localidades (Estação de Salto Jusante). Cidades foram alagadas, mais de 115 mortes registradas, muitos feridos, milhares de famílias desalojadas/desabrigadas, dezenas de cidades decretaram Estado de Emergência/Calamidade. O evento ocorrido em Santa Catarina proporcionou uma elevada quantidade de chuva, que devido à sua continuidade ocasionou enchentes e diversos deslizamentos sobre as encostas. Não existem registros de um novembro tão chuvoso nas regiões atingidas como observado em 2008, que teve recordes históricos quebrados. Em Blumenau e Joinville, os totais do mês ficaram em torno de 1000 mm, para uma média climatológica mensal de aproximadamente 150 mm (Figura 03). 6 VI Seminário Latino Americano de Geografia Física II Seminário Ibero Ameicano de Geografia Física Universidade de Coimbra, Maio de 2010 Figura 03 – Recordes de chuvas em novembro para toda série histórica: Fonte: Epagri, ANA, Inmet – Org.: Roseghini, 2010. Levando-se em consideração as informações dos diversos órgãos de monitoramento climático, a precipitação elevada observada no litoral de Santa Catarina no período esta relacionado ao bloqueio atmosférico que gerou nuvens quentes, o que é relativamente raro na região. Formou-se um sistema muito eficiente em gerar chuva sem haver nuvens com alto desenvolvimento vertical (DIAS, 2008). De acordo com o boletim técnico do INPE (2009), os eventos em Santa Catarina foram uma sucessão de tipos de tempo favoráveis aos alagamentos e escorregamentos de encosta, pois apresentaram sinoticamente, a partir do dia 10/11/2008, chuva forte causada pela atuação de um vórtice ciclônico na troposfera média combinado com ventos de leste. O evento provocou alagamentos e deslizamentos de terra na Grande Florianópolis. De acordo com o Departamento Estadual de Defesa Civil, da 1h às 3h, choveu 30 mm, o equivalente a 24% do previsto para novembro. Em Blumenau, a ameaça de deslizamento de encosta no bairro Escola Agrícola levou a Defesa Civil proibir a permanência dos moradores. Segundo a Defesa Civil do Estado, cerca de 60 famílias foram transferidas para outro local. Nos dias que se sucederam, chuvas torrenciais continuaram castigando a região, ainda sob a influência dos mesmos sistemas sinóticos na atmosfera, deixando 660 desabrigados e desalojados, segundo a Defesa Civil. A situação mais grave foi registrada em Itapoá, onde a prefeitura decretou situação de emergência no dia 11/11/2008. O município ficou isolado e com mais de 170 pessoas desabrigadas e desalojadas. Duas pessoas desapareceram. 7 Tema 4 - Riscos naturais e a sustentabilidade dos territórios No dia 12 foi registrado 204,9 mm em São Francisco do sul, litoral nordeste de SC. Em Indaial foi registrado 67 mm. Outras cidades registraram chuvas entre 30 e 60 mm. A chuva que caiu na região desde o dia 10 deixou a Defesa Civil de Araranguá e municípios da região de Criciúma de sobreaviso. Alguns rios estiveram com o nível d’água elevado resultando no transbordamento. Em Araranguá, o nível do rio da cidade estava 70 centímetros acima do normal. A forte chuva que castigou a cidade durante toda a madrugada causou estragos em São Bento do Sul, no Planalto Norte. Os municípios de Itapoá, no Litoral Norte, e Benedito Novo, no Médio Vale do Itajaí, decretaram situação de emergência em 13/11 devido aos prejuízos. De acordo com o Departamento Estadual de Defesa Civil, aproximadamente 700 pessoas estavam desabrigadas ou desalojadas até aquele momento, com sete desaparecidas. Em Itapoá, choveu 199,8 mm em 12 horas, quantidade superior à média do mês. Entre os dias 21 a 24/11/2008 a situação se deteriorou meteorologicamente, pois criou-se um bloqueio atmoférico associado a um vórtice ciclônico com núcleo frio entre SC e PR. Ventos intensos de leste e a persistência destes sistemas durante os 4 a 5 dias posteriores provocaram chuva intensa e acumulado significativo em diversas localidades do leste de SC. Em algumas cidades, como São Francisco do Sul, o acumulado em 24 horas foi de 303 mm. Na Estação de Salto Jusante acumulou 340 mm. Diversas estações acumularam neste dia chuvas entre 100 e 250 mm. Como resultado, foram mais de 116 mortes, outras 45 cidades decretaram Estado de Emergência e ou estado de Calamidade Pública. Casas destruídas, cidades inteiras arrasadas pelas águas dos rios que transbordaram, milhares de pessoas desabrigadas/desalojadas, deslizamentos. Perdas de vidas e prejuízos incalculáveis. Várias cidades registraram recorde histórico de chuva diária e mensal. Em Joinville choveu durante o mês aproximadamente 1000 mm. 3. O Evento e suas conseqüências O Estado de Santa Catarina sempre foi marcado por eventos, que trouxeram prejuízos financeiros e de morte significativos. No continente as diversas cheias que marcou o Estado de norte a sul e no oceano a passagem do primeiro furacão 8 VI Seminário Latino Americano de Geografia Física II Seminário Ibero Ameicano de Geografia Física Universidade de Coimbra, Maio de 2010 registrado no Atlântico Sul, o Catarina. Os piores desastres registrados, pela Defesa Civil Catarinenses, ocorreram nos anos de 1974, 1983, 1984, 1995, 2004, 2005. Em novembro de dois mil e oito entre os dias 20 e 24, Santa Catarina novamente sofreu com o problema das enchentes. Durante estes dias vários municípios do Estado sofrem com chuvas intensas que ultrapassaram suas médias históricas. Esta intensidade de chuvas originou uma série de escorregamentos responsáveis pelo maior número de mortes. Segundo a Defesa Civil Catarinense, o evento deixou mais de 80 mil desabrigados ou desalojados, 14 municípios em estado de calamidade publica e mais de 85 municípios em estado de emergência. Foram contabilizadas 135 mortes, sendo que dois encontram-se desaparecidos. A figura 3 mostra os municípios atingidos pelas chuvas e que declararam emergência ou calamidade publica. Figura 3: Situação dos municípios em Santa Catarina em novembro de 2008 Fonte: Relatório Enchente de Santa Catarina, 2008. Ministério da Saúde Historicamente a região do Vale do Itajaí foi colonizada por alemães que se fixaram ao longo dos vales do Rio Itajaí-Açu e Itajaí Mirim, sempre acompanhados por períodos de cheias, as quais faziam parte do cotidiano desta sociedade. Com o passar dos anos o crescimento econômico regional proporcionou um aumento populacional significativo trazendo problemas de ordem urbanística. Apesar de diversos programas para contenção de cheias e reorganização urbana, muitos dos desalojados de enchentes anteriores a 2008, buscaram nas encostas dos 9 Tema 4 - Riscos naturais e a sustentabilidade dos territórios morros um local para construção de moradias, mesmo estando estes em situação irregular do ponto de vista ambiental. O corte da vegetação e da área a ser construída através de cortes verticais e horizontais, desestabiliza estes morros, principalmente quando efetuados nas partes mais baixas (SOUZA, 2008). 3.1. Ocupação urbana desordenada Atualmente as áreas urbanas do mundo abrigam cerca de 80% de toda a humanidade. Sendo assim, considerando a discussão ambiental, é irônico pensar que a batalha pela sustentabilidade não será vencida (ou perdida) em florestas tropicais ameaçadas, mas principalmente nas ruas das grandes cidades (COHEN, 2006). Não seria demasiado se questionar se, em escala regional e local, não seria a ocupação desordenada de áreas de risco responsável por acentuar os efeitos dos eventos climáticos extremos? Neste contexto, parece pertinente levantar algumas indagações sobre quais fatores e/ou elementos seriam responsáveis por acentuar, por um lado, a repercussão das variabilidades climáticas na Região Sul do Brasil, particularmente no âmbito de suas capitais e principais cidades médias. Por outro lado parece necessário construir alguns cenários futuros, tendo em conta as adaptações da sociedade, as novas condições climáticas globais e regionais. Estes questionamentos relacionam-se, sobretudo, à dinâmica da temperatura e da pluviosidade regional em sua interação com processos na escala global. Para a elaboração de tal estudo, é preciso considerar de um lado a dinâmica da natureza e de outro a dinâmica da sociedade que, completamente imbricadas uma na outra, desafiam os cientistas a um melhor conhecimento da realidade, bem como a tentativa de prognosticar situações futuras que colocam em risco a sociedade. Desta maneira os resultados almejados poderão auxiliar na elaboração e implementação de políticas publicas, particularmente no âmbito do planejamento e gestão urbanoregional, visando, de maneira antecipada, criar ações mitigatórias que visem anular ou minimizar os problemas advindos de eventos extremos. No inicio da década de 1980, após passar por vários episódios de enchentes e o constante aumento populacional da região, ocorrido devido ao marketing de cidade com qualidade de vida, fizeram com que esta população buscasse locais impróprios a construção de moradias. Neste caso, surgiram favelas, residências e condomínios em encostas de morros e beiras de rios, áreas amparadas por lei, onde este tipo de ocupação não poderia acontecer (Figura 4): 10 VI Seminário Latino Americano de Geografia Física II Seminário Ibero Ameicano de Geografia Física Universidade de Coimbra, Maio de 2010 Figura 4 – Exemplos de ocupação irregulares (Blumenau-SC). Fonte: Defesa Civil de SC, 2008. Infelizmente os responsáveis pelas políticas públicas voltadas a habitação, não observaram, ou quiseram não observar, as conseqüências desta “vista grossa” aos fatos que estavam ocorrendo. Para piorar estimularam esta ocupação tanto no meio urbano quanto no rural, não percebendo os perigos que isto representaria. As alternativas geralmente acabam sendo áreas não apropriadas para a ocupação. No Brasil, o Plano Diretor é o instrumento legal de diretrizes e regras para o desenvolvimento do município, o Estatuto da Cidade e o Código Florestal dão o amparo legal, para que ocorra uma ocupação ordenada, mas esta nova política habitacional, só foi implementada a partir de 2003 com a Criação do Ministério das Cidades, que tem por objetivo resolver ou melhorar a questão habitacional. Este Plano Diretor, ao ser implementado nos municípios, deve ter clara a necessidade de levar em consideração as características do meio físico e o tipo de ocupação urbana a ser realizada. 4. Considerações Finais Esperamos com este trabalho contribuir, mesmo que parcialmente, para elucidar em relação aos problemas ambientais hodiernos, prezando por uma gestão ambiental mais qualificada, agindo de forma responsável através de ações mitigatórias e evitando assim transtornos futuros, fazendo uso da interdisciplinaridade e do caráter norteador da Geografia para o planejamento, entre outras questões socioambientais relevantes. 11 Tema 4 - Riscos naturais e a sustentabilidade dos territórios 5. Referencias Bibliográficas COHEN, B. Urbanization in developing countries: current trends, future projections, and key challenges for sustainability. Technology in Society, Sustainable Cities Special Issue, New York: Elsevier, v. 28, n. 1-2, 2006. DEFESA CIVIL DE SANTA CATARINA, Grupo Reação. Santa Catarina – o Maior Desastre de sua História. Disponível em: www.slideshare.net/comissaosantacatarina/defesacivil-sc Acessado em: 15/07/09 DIAS, M. A. F. S. As chuvas de novembro de 2008 em Santa Catarina: um estudo de caso visando à melhoria do monitoramento e da previsão de eventos extremos. Disponível em: www.ciram.com.br/GTC/downloads/NotaTecnica_SC.pdf Acessado em: 10/07/09 INPE – Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais. Bloqueio atmosférico provoca enchentes no Estado de Santa Catarina (SC). Disponível em: www7.cptec.inpe.br/~respload/docs/enchentes_SC_1108.pdf Acessado em: 10/07/2009. MAIS, I. L. Projeto Marca D’Água – Bacia do Rio Itajaí, Santa Catarina, 2001. Núcleo de Pesquisas em Políticas Publicas. Brasília, 2003. www.macadagua.org.br/itajai,pdf. Acessado em: 16/07/2009 Disponível em: MENDONÇA, F. A; DANNI-OLIVEIRA, I. M. Climatologia: noções básicas e climas do Brasil. São Paulo: Oficina de Textos, 2007. MINISTÉRIO DA SAÚDE. Secretaria de Vigilância em Saúde. Relatório da enchente em Santa Catarina, 2008. Disponível em: www.disasterinfo.net/PED.../BRA_Inundac251108MS.doc Acessado em: 14/07/09 MINUZZI, R. E RODRIGUES, L. Novembro com recordes de chuva em SC: 1000 mm em Blumenau. Setor de Previsão de Tempo e Clima - Epagri/Ciram . Disponivel em: http://ciram.epagri.rct-sc.br Acessado em 15/07/09. NERY, J. T. Dinâmica Climática do Sul do Brasil in: Revista Brasileira de Climatologia, ano 01, 2005. 12 VI Seminário Latino Americano de Geografia Física II Seminário Ibero Ameicano de Geografia Física Universidade de Coimbra, Maio de 2010 SOUZA, S. A. Santa Catarina Tragédia que se repete – Parte 2. Adaptação dp texto original de: SANT’ANNA, L. Ocupação errada amplificou o desastre. Jornal o Estado de São Paulo, 14/12/2008. Disponível em: http://blogs.universia.com.br/souzaaraujo/2008/12/21/santa_catarina2 Acessado em: 13/07/2009 VEADO, R. W. A e TROPPMAIR, H. Geossistemas do Estado de Santa Catarina. In GERARDI, L.H.O e MENDES, I. A. Teoria, Técnicas, Espaços e Atividades, Temas de Geografia Contemporânea. Disponível em: ww.ageteo.org.br/download/livros/2001/15_veado.pdf Acessado em 13/07/09. 13